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O processo de Socialização

DEMONSTRAR COMO NOSSOS COMPORTAMENTOS SOCIAIS SÃO AQUISIÇÕES SOCIOCULTURAIS QUE

TEM INÍCIO NA INFÂNCIA, PERÍODO COMPREENDIDO COMO SOCIALIZAÇÃO PRIMÁRIA.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Uma das importantes questões para a Sociologia é compreender o que nos diferencia dos demais animais. O

que nos torna humanos? A humanidade, ou seja, o que nos diferencia dos animais, é uma característica

inata ou é fruto da construção social da própria humanidade?

A Sociologia e as demais ciências sociais (Ciência Política e Antropologia) afirmam que nossa humanidade é

resultado do processo de interação a qual somos submetidos desde o nosso nascimento. Assim, o que

consideramos exclusividade dos humanos, como andar ereto e falar, por exemplo, não são habilidades

inatas, aprendemos no nosso processo de socialização.

Émile Durkheim, ao definir o objeto de estudo da Sociologia, como fatos sociais, demonstra que os

fenômenos sociais são maneiras de ser e de agir que moldam nossos comportamentos e que são impostos

pelas instituições sociais (família, escola, governo, igreja, etc.)

Tais fatos sociais são impostos pela sociedade aos indivíduos porque são exteriores à nós, ou seja, são

determinadas condutas que assimilamos e reproduzimos. Mas, não foram por mim construídas, já estavam

prontas quando nasci, seja meu papel como filho/a, pai/mãe, etc. Seja meu comportamento religioso ou

posicionamento político, estão fora de mim, fora da minha consciência individual. Além disso, essa

consciência pública reprime todos os atos contrários à conduta estabelecida/convenções. Não há o que me

obrigue a falar meu idioma mas, não é possível agir diferente.

Tais maneiras de ser e de agir não são orgânicas e nem psíquicas (posto que só existem na mente e através
dela), são sociais. São maneiras de ser e de agir aquelas provenientes de uma ordem jurídica, moral,

religiosa, financeira. Portanto, estão presentes em organizações bem definidas.

Pensando em fatos sociais como o casamento, a natalidade e o suicídio fica difícil, a primeira vista,

dissociá-los dos casos particulares: casou por amor, teve os filhos que queria, matou-se por que não

aguentou...etc., mas, ao analisarmos enquanto um fato social, os números (estatística) demonstram que os
casos particulares não são importantes, visto que há uma generalidade, ?um certo estado de alma coletiva?.

A sociedade e suas regras, precede o individuo.

A socialização então, inicia-se com nosso primeiro contato com outros humanos e só se encerra, ao

morrermos. Há nesse longo processo uma divisão. A socialização primária encerra-se, como colocam Berger

e Berger (1980) quando a criança é capaz de expressar-se plenamente, por meio da linguagem. A secundária
tem início aí e nos acompanha por toda nossa vida. Por isso, a cada novo contato sociocultural, com grupos

distintos, somos passíveis de mudar de ideia, opinião, gostos, religião, enfim, de mudar nossa visão de

mundo.

A socialização primária é de suma importância na disciplina de Sociologia da Educação. Compreender os

mecanismos pelos quais aprendemos, o quê e quando aprendermos é essencial para a prática e teoria

escolar.

Ao nascermos, a sociedade está estabelecida. Somos inseridos em um conjunto de regras, horários, práticas

e linguagem do grupo social a que pertencemos. Na medida em que vamos crescendo, todo esse conjunto é,

paulatinamente, imposto à nós, simbólico e fisicamente.

O exemplo mais ilustrativo é o horário das refeições. Se a criança é alimentada somente

em horas determinadas, seu organismo é forçado a adaptar-se a esse padrão. E, ao realizar

o processo de adaptação, suas funções sofrem uma modificação. O que acaba acontecendo

é que a criança não apenas é alimentada em horas determinadas, mas também sente fome

nessas horas. (BERGER e BERGER, 1980:201)

Nesse ponto, os autores demonstram que cada cultura definirá o que é melhor às suas crianças. No que se
refere ao momento de comer, como ser treinado para a toilete, etc.

Em relação à isso, é digno de nota um exemplo de um povo indígena do Brasil. Entre os Xikrin, povo que
vive próximo ao rio Bacajá – PA, não é aconselhável que deixem crianças pequenas chorarem. Ao primeiro

choro da criança, alguém se responsabiliza de acalentá-la. Tal padrão é assim definido por considerarem
que, ao chorar, o Karon da criança (numa aproximação em língua portuguesa = alma) pode se desligar dela,

levando-a à morte. (COHN, 2002)


Berger e Berger (1980) afirmam que em um primeiro momento, as experiências que os padrões impõem às

crianças é compreendida pelas mesmas como sendo absolutos. Isso quer dizer, que as crianças
compreendem que tais regras, ritos, etc., são os únicos que existem. Isso se dá pelo poder que os adultos

tem sobre as crianças e pela sua ignorância de mundo. No entanto, cada grupo social terá um modelo
cultural, o que torna o processo de socialização muito relativo. As regras são absolutas para as crianças

mas, relativas no mundo socialmente construído.


Uma das caracteíristicas mais marcantes e sentidas pelos adultos ocorre quando a criança se torna

“respondona”. Essa característica demonstra o quanto a criança nesse processo de socialização não é
puramente passiva, como ainda se crê no nosso cotidiano.

A reciprocidade da criança, isto é, sua capacidade de exercer uma ação individual e


independente sobre o mundo e as pessoas que o habitam, cresce na razão direta da

capacidade de usar a linguagem. No sentido literal da palavra, a criança nessa fase


começa a responder aos adultos. (p. 206)
Além de responderem, as crianças aprendem a desempenhar papéis, em geral aquele dos outros
significativos, pessoas que mantém com maior frequência, interação e vínculos afetivos. Assim,
desempenham o papel de mãe, pai, educador e, esse processo, é identificado através da linguagem. Antes de
identificar os outros significativos, a criança diz coisas como: mamãe não quer que eu me suje, no processo

seguinte, a fala muda: a gente não deve se sujar. A criança percebe então, que as regras não são
particulares e sim, universais.

Todo esse processo vai sendo interiorizado na consciência das crianças. A consciência é basicamente a
interiorização (...) dos comandos e proibições de ordem moral vindos do exterior. (p. 211)
Nesse desenvolvimento, o eu é nossa consciência como reflexo de uma individualidade mais espontânea e o
me, a parte da individualidade já moldada pela socialização. Em razão disso, crianças diferentes reagem
diferentemente à situações iguais. Por exemplo: um menino que cresceu em uma sociedade cujos valores
impuseram à ele a coragem e a engolir o choro, ao cair, o seu eu sentirá a dor mas, o me, decidirá que não

deve chorar. Em razão disso, devemos relativizar as diversas socializações e reações dos indivíduos, crianças
ou adultos.

ATIVIDADE FINAL

Leia as afirmações abaixo e na sequencia clique na alternativa que

contém as afirmações corretas:

I - A socialização primária é o processo que inicia-se na família.

II - Na socialização primária as crianças adquirem a linguagem, o que

possibilita a comunicação com o mundo a sua volta.


III - A criança se torna respondona em razão de valores morais menos

rígidos.

A. II

B. I e II
C. I e III

D. I

REFERÊNCIA
BERGER, Peter e BERGER, Brigitte. Socialização: como ser um membro da sociedade in: FORACCHI,
Marialice Mencarini e MARTINS, José de Souza. Sociologia e Sociedade. Leituras de introdução à
Sociologia. Rio de Janeiro: LTC, 1980.
COHN, Clarice. A experiência da infância e o aprendizado entre os Xikrin in: SILVA, Aracy, Lopes da;
MACEDO, Ana V. L da Silva e, NUNES, Angela (orgs.) Crianças Indígenas: ensaios antropológicos. São

Paulo: Global, 2002.


DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. 3ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
A cultura como conceito das Ciências
Sociais
O OBJETIVO DESSA AULA É DEMONSTRAR COMO O CONCEITO CULTURA, APROPRIANDO-SE DE SUA

DEFINIÇÃO ANTROPOLÓGICA, É EXTREMAMENTE RELEVANTE PARA ENTENDERMOS AS RELAÇÕES

AMISTOSAS E CONFLITUOSAS PRODUZIDAS EM NOSSA SOCIEDADE E, CONSEQUENTEMENTE, EM

NOSSA ESCOLA.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Quando pensamos a escola na atualidade, muitas vezes a relacionamos às notícias veiculadas nos meios de

comunicação. Em geral essas notícias trazem pequenas e grandes tragédias do cotidiano escolar: aluno que

agride professor, professor que agride aluno, desperdício de material didático, mal uso dos recursos, etc.

Por outro lado, quando lembramos da nossa escola fica impossível não nos lembrarmos das relações de

amizade que estabelecemos, das descobertas sexuais, das festas, dos estilos musicais apreciados, das gírias,

das roupas da moda, etc.

A escola hoje concentra essas mesmas ações porque todas elas, as do primeiro e as do segundo exemplo, são

parte constitutiva de nossa sociedade e, portanto da escola. São modos de ser e de agir apreendidos no

contato social: é a cultura.

O conceito de cultura é essencial para o entendimento do que é a escola e para a mediação de conflitos,

inerentes a um ambiente com tantas diferenças. Nos apropriaremos do conceito de cultura elaborado pela

Antropologia e que pode ser definido através do seguinte excerto: ...tomado em seu amplo sentido

etnográfico é este todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou
qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade. (TYLOR
apud LARAIA, 2009:25)
Podemos acrescentar ainda que a cultura é como um código simbólico. E, como todo código precisa ser

decifrado e decodificado para aqueles não pertencentes ao grupo, e este é o trabalho da Antropologia. Tais

maneiras de agir e de pensar não nos são passadas geneticamente, adquirimo-las partilhando as

experiências do grupo a qual pertencemos. A cultura é essa capacidade de aprender. É uma condição

essencial para a experiência humana.

Nos tornamos humanos a partir da interação com outros seres humanos. Falar e andar, que são ações

pensadas como naturais somente são apreendidas e apreendidas no contato com outros. Assim, a partir do

momento em que nascemos e fazemos parte do primeiro grupo social que é a família, estamos sendo

inseridos na cultura .
No filme de Werner Herzog, O Enigma de Kaspar Hauser, encontramos a história, supostamente verídica, de

um rapaz que permaneceu dezoito anos em um cativeiro, sem contato com o mundo exterior ou com

pessoas. Ao ser libertado, passa por todo o processo de socialização e de aquisição cultural, numa clara

demonstração de que ações tão “naturais” ao ser humano, como falar e andar, e também o medo, a alegria e

a tristeza são apreendidos nas relações sociais que pautam nossas vidas. Mas, onde deixamos de pertencer

ao estado natural e passamos ao estado da cultura?

Claude Lévi Strauss (1908-2009) antropólogo francês, aponta que temos um momento na história dos povos

em que saímos do estado de natureza e passamos à cultura: o estabelecimento do tabu do incesto. Lévi-

Strauss trabalha com a possiblidade de que as relações de parentesco definem o estado de cultura do

humano.

Assim, o momento em que essa transição se dá é o momento em que os indivíduos de um dado grupo social

escolheram com quem manter relações sexuais, retirando das possibilidades as pessoas com quem tinham

laços sanguíneos muito próximos, dessa forma, o ser humano se diferencia dos animais. Dessa forma, os

seres humanos estão produzindo cultura.

O que nos diferencia dos animais, a partir dessa discussão é a produção da cultura. A cultura de um dado

agrupamento humano é o modo como este vê o mundo, como estabelece relações com seus conterrâneos, e

como se relaciona com o outro.

Assim, a moral constituída e propagada em determinado grupo social é parte de sua cultura. Enquanto
modos de ser, temos a criação de nossos valores e crenças que vão constituir a nossa moral, enquanto

construção social do grupo em que sou membro. Condiz com minha visão de mundo, e como tal, é a que
considero correta.

A cultura é sempre dinâmica, mudando no tempo e no espaço. Por isso, não podemos falar em cultura pura,
pois toda sofrem influências de outras culturas, em maior ou menor grau, num caminho de mão dupla. Além

disso, entendemos a cultura de um povo a partir de sua própria lógica, portanto, não temos como defini-la
em gradações, como superior ou inferior. As culturas são diferentes.

No entanto, há uma característica comum a todos os povos, a atitude de considerar sua cultura a correta, a
melhor. A essa atitude damos o nome de etnocentrismo.

Alguns equívocos são construídos nessa definição e aparecem-nos como determinismos. Um deles, é o
determinismo biológico. Essa ideia do que seja cultura leva em consideração que comportamentos

socialmente construídos e impostos sejam transmitidos geneticamente. Assim, justifica-se as diferenças


culturais impostas à homens e mulheres, e à brancos e negros, por exemplo.

Em outras palavras, se transportarmos para o Brasil, logo após o seu nascimento, uma
criança sueca e a colocarmos sob os cuidados de uma família sertaneja, ela crescerá como

tal e não se diferenciará mentalmente em nada de seus irmãos de criação. (LARAIA,


200:17)
O determinismo geográfico parte da suposição de que diferenças presentes no ambiente físico determinam
comportamentos culturais. Um bom exemplo seria a moda-praia. Poderíamos justificar os biquínis e sungas

usadas nas praias brasileiras em razão da alta temperatura em nosso verão. No entanto, essa determinação
deixa de fazer sentido no momento que analiso como os islâmicos vão à praia em cidades do Oriente Médio,

tão ou mais quentes que as nossas. Uma vez que não se apresentam tão desnudos como é de nosso hábito.
O padrão cultural, que engloba desde nosso idioma até nossas crenças religiosas é que media nossos

comportamentos sociais.

REFERÊNCIA
LARAIA, Roque de Barros – Cultura: um conceito antropológico. 23ª edição, Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

LEVI-STRAUSS, Claude – As estruturas elementares do parentesco. 3ª edição, Petrópolis: Vozes, 2003.


THOMAZ, Omar Ribeiro – A Antropologia e o mundo contemporâneo: cultura e diversidade in: SILVA, Aracy

Lopes e GRUPIONI, Luís Donizete Benzi – A temática indígena na escola: novos subsídios para professores
de 1º e 2º graus. Brasília: MARI/MEC/UNESCO, 1995.

Filmografia:
O Enigma de Kaspar Hauser. Diretor: Werner Herzog, 110 minutos, 1974.
O negro na sociedade brasileira
O OBJETIVO DESSA AULA É DISCUTIR OS PROBLEMAS ENVOLVIDOS NAS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS,

ABORDANDO A CONSTRUÇÃO DA IDEIA DE RAÇA E O RACISMO CONTRA OS AFRO-BRASILEIROS.

DISCUTIREMOS TAMBÉM AS PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES DOS POVOS AFRICANOS À FORMAÇÃO DE

NOSSA CULTURA.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

A partir do conceito de cultura que estudamos, faz-se importante discutir como as relações étnico-raciais

marcam nossa história enquanto povo, desde a chegada dos europeus aqui na América até os dias de hoje.

Um dos principais conceitos a ser discutido é o de raça. Raça é um termo utilizado para categorizar uma

população de uma mesma espécie. Portanto, enquanto seres humanos, somos de uma mesma espécie.

Biologicamente, já nos foi provado que nossas diferenças são tão ínfimas que não podemos ser

categorizados como sendo de raças diferentes.

No entanto, essa categorização da população em raças humanas ocupou o centro das discussões científicas

durante todo o século XIX, estendendo-se ao século XX. Tais discussões são fomentadas desde o contato

dos europeus com os povos dos continentes americano e africano séculos antes.

Os relatos da Inquisição Moderna (século XV ao XIX) descrevem o Diabo, por exemplo, como sendo um

negro. Após a descoberta das Américas o negro é ilustrado com cocares tropicais, numa demonstração de

total confusão com as novas gentes. Lilia Moritz SCHWARCZ (1996) apresenta um relato de como esses

povos eram apresentados em ilustrações e quadros de época: presença de canibalismo; indígenas com

armas de fogo e brancos presos; caldeirões e diabos com cocares e lutas indígenas.

Mesmo que no século XVIII, o Iluminismo apresentasse a teoria de que todos os homens são iguais, no
século XIX Charles Darwin e sua “A Origem das espécies” (1859) sedimenta a ideia de poligenismo na

Europa (de que homens têm diferentes origens) e suas ideias são divulgadas rapidamente justificando tudo,

inclusive que essas diferentes origens são as causas das diferenças intelectuais das “raças”.

Surge neste momento, então, o determinismo racial: a raça determina o modo como um grupo se

desenvolve. No entanto, já vimos na aula anterior, que aquilo que molda nosso desenvolvimento enquanto

grupo social são nossas escolhas culturais, não mediadas por determinismos.

Esse determinismo racial pensa raça como um fenômeno essencial dos seres humanos, leva em

consideração que o indivíduo é reflexo de seu grupo rácio-cultural e propõe a eugenia como prática política

de intervenção, no sentido de “cuidar da raça”.

Essa interpretação racial surge no momento em que o Brasil deveria discutir a questão de cidadania, posto

que nesse período deu-se abolição da escravidão e a Proclamação da República, no entanto, estávamos

discutindo práticas “científicas” de branqueamento da população.


Na Europa a discussão pautava-se pelo o que seria pior: raças puras inferiores ou as raças mestiças? Para

os homens da ciência, a mestiçagem era o pior dos problemas, pois esta só poderia derivar degeneração da

raça. No Brasil, o maior expoente desse grupo foi o médico Nina Rodrigues, para ele a mestiçagem era um
mal, era o sinal de nossa degenerescência e de nosso atraso. (SCHWARCZ:1996)

Ainda que no plano científico essas categorizações já tenham sido refutados, graças a inúmeros trabalhos

no campo da Antropologia, no ideário de muitos povos prevalece a ideia de superioridade racial. Temos

diversos exemplos recentes na história do mundo que pautaram-se por essa ideia: o Nazismo e as

experiências japonesas na Segunda Guerra Mundial e as guerras preconizadas na região dos Balcãs, são

exemplos.

No cotidiano brasileiro convivemos com diversas atitudes racistas. O racista é aquele que considera a

existência de raças humanas (branca: caucasianos; preta: africanos; amarela: asiáticos e vermelha: povos

indígenas) e tem na sua, a raça superior. Assim, suas ações irão pautar-se pelas ideias de que sua raça age

corretamente, de que sua raça tem a melhor aparência física e é a mais inteligente. (GUIMARÃES, 1999)

No caso brasileiro o racista é, em geral, branco. A raça inferior é a negra. Dessa maneira, reproduzem-se na

sociedade brasileira diversos preconceitos que originam discriminações com os afrodescendentes. Desde

piadas preconceituosas e xingamentos até discriminação religiosa.

Na escola isso não é diferente e, em se tratando da escola pública, temos uma quadro ainda mais

problemático. O tratamento dado ao negro, que infelizmente, ocupa as regiões mais pobres e constituem
boa parte da classe baixa, beira a normalidade.

Entretanto, o racismo à brasileira guarda algumas peculiaridades. Oracy Nogueira redige em 1954, o artigo
Preconceito racial de marca e preconceito racial de origem, onde compara Brasil e Estados Unidos (EUA).

Nesse artigo, NOGUEIRA demonstra que aqui, nosso preconceito é sobre a cor, e nos EUA, sobre a origem.
Aqui então discriminamos a partir da aparência, lá, pela descendência. Isso é visível no modo como as

identidades são criadas, pois temos gradações de cor que não existem em outros países. Somos morenos,
morenos claros, moreninhos e pardos, justificando a mestiçagem, mas negando a ascendência negra.

Autores como Antônio Sérgio A. GUIMARÃES e Roberto DAMATTA, vão pontuar que o fato de nosso
racismo ser “invisível”, torna-o mais difícil de ser combatido. Desde a abolição da escravatura não houve

uma distinção legalmente constituída entre brancos e negros, como a que ocorreu nos Estados Unidos. Em
contrapartida, as práticas sociais não se alteram por força das leis, e os negros brasileiros permaneceram à

margem da sociedade e da cidadania plena. A visibilidade do preconceito e da discriminação nos Estados


Unidos até a década de 1960, com total segregação entre brancos e negros, criaram as possibilidades para

que os movimentos civis exigissem mudanças nas leis lá aplicadas, porque, em grande medida, as práticas
sociais já vinham alterando-se.

Nossa atualidade é a do preconceito e da discriminação com as pessoas negras, que são agravadas pelos
problemas educacionais que não criam condições de ascensão social aos pobres e negros, com a indústria e

a publicidade que afirmam as características brancas como bonitas: pele branca, cabelo liso, etc., com a
dificuldade de implementação de políticas afirmativas que buscam diminuir a distancia entre brancos e

negros no que se refere à acesso à educação de qualidade, ingresso no mercado de trabalho e,


principalmente, direitos civis e humanos iguais.

A formação do povo brasileiro: a herança africana


Os povos escravizados vindos do continente africano, foram constituídos por três grupos: das culturas
sudanesas, Yoruba (nagô), Dahomey (gegê) e Fanti-Ashanti (minas); das culturas islâmicas/ norte da

Nigéria, Peuhl, Maninga, Haussa (identificados na Bahia como male e no Rio de Janeiro como alufa) e, do
Congo, Angola e Moçambique, os Bantu.

Num primeiro momento o negro teve pouca influencia na formação da cultura brasileira, pois era um
agente mais passivo que ativo. O modo de produção já estava estabelecido pelos brancos, os aspectos

geográficos do novo país eram muito diferentes dos de suas origens, de modo que não sabiam como, por
exemplo, trabalhar a terra. No entanto, é como se a cultura negra desse liga à cultura brasileira, já

miscigenada pelos povos indígenas, de forma sutil, mas contínua.


O continente africano é povoado de inúmeras línguas e dialetos, embora semelhante em outros aspectos

culturais, o que trouxe muitas dificuldades quando escravizados, por isso os escravos passaram a incorporar
as palavras da língua geral.

Por não falarem a mesma língua entre si, os escravos não partilhavam a mesma cultura, muitos eram
inimigos em sua terra e trouxeram a vendeta para cá, além disso, os senhores não permitiam que grupos de

uma mesma etnia permanecessem agrupados. Isso não permitiu a união dos escravos e nem a conservação e
disseminação de sua cultura de forma explícita. Sem contar, é claro, que a escravidão desumaniza qualquer

ser humano.

...qualquer povo é desapropriado de si, deixando de ser ele próprio, primeiro, para ser
ninguém ao ver-se reduzido a uma condição de bem semovente, como um animal de

carga; depois, para ser outro, quando transfigurado etnicamente na linha consentida pelo
senhor, que é a mais compatível com a preservação dos seus interesses. (RIBEIRO,

2006:106)

Darcy Ribeiro discute o fato de que os índios e os negros conseguiram permanecer humanos, num processo

de auto-reconstrução em meio ao processo de destruição. Conseguem, talvez, pela esperança, sempre


nutrida, de fuga, seja pelo suicídio ou a fuga propriamente dita.

Mas, ainda assim, para além da influência física no brasileiro, essa influencia aparece nos ritmos e nos
sentimentos especiais.

ATIVIDADE FINAL

Sobre o uso do conceito de raça, é correto afirmar que:

A. é reforçado no século XIX, com as descobertas da Biologia, onde Darwin terá um papel central
B. é um conceito que tenta mostrar a realidade, na qual existe superioridade entre as raças humanas
C. surge no século XX, entre àqueles que defendem a superioridade do homem branco
D. traz consigo a possibilidade de repensarmos as possibilidades de análise em relação ao homem

vivendo em sociedade.
REFERÊNCIA
GUIMARÃES, Antônio Sérgio Alfredo – Racismo e anti-racismo no Brasil. São Paulo: Fundação de Apoio à

Universidade de São Paulo/Editora 34,1999.


RIBEIRO, Darcy – O povo brasileiro. 4ª reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
SCHWARCZ, Lilia Moritz – As teorias raciais, uma construção histórica de finais do século XIX. O contexto
brasileiro – in: SCHWARCZ, Lilia Moritz e QUEIRÓZ, Renato da Silva (Orgs.) Raça e Diversidade. São Paulo:

EDUSP, 1996.
DAMATTA, Roberto – O que faz o brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1996.
O índio na sociedade brasileira
O OBJETIVO DESSA AULA É PROSSEGUIR NA DISCUSSÃO ÉTNICO-RACIAL TRATANDO DE UM OUTRO

GRUPOS RACIAL, TAMBÉM DISCRIMINADO EM NOSSA SOCIEDADE, OS POVOS INDÍGENAS. ALÉM DISSO,

ESSA AULA PRETENDE APRESENTAR AS PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES DOS POVOS INDÍGENAS À

FORMAÇÃO DA CULTURA BRASILEIRA.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Quando os portugueses chegaram no início do século XVI ao território que hoje constitui o Brasil, estima-

se que cerca de um milhão de índios do tronco Tupi habitassem o litoral. À título de comparação, Portugal,

à época, tinha mais ou menos a mesma população.

O antropólogo Darcy RIBEIRO (1922-1997) em seu livro O Povo Brasileiro, estima que no século XVI

existiam cerca de quatro milhões de pessoas no território que hoje é o Brasil. Estas falavam cerca de 1300

línguas, muitas delas sem nenhum falante nos dias de hoje.

Durante todo o período de colonização e até o final do Império, os indígenas não possuíam qualquer

direito, somente em finais do século XIX é que ganham estatuto jurídico, no entanto, são tutorados pelo

Estado. Na década de 30 do século XX, surge o SPI (Serviço de Proteção ao Índio) que tem como objetivo

cuidar da integridade física do índio para que ele alcance o estágio final de integração no Brasil, em uma
clara postura tutora em relação ao indígena.

A partir da década de 70 a FUNAI (Fundação Nacional do Índio que substitui o SPI) passa a se preocupar

com essa identificação étnica/demarcação de suas terras, buscando reconhecer esses povos a partir de
características e caracterizações não comuns aos diversos povos que aqui habitavam e habitam. Assim, cria

as funções de cacique, pajé e conselheiro, que devem ser encontrados em qualquer etnia indígena, em um
claro desrespeito e desconhecimento da diversidade étnico-racial.

Os povos indígenas deixam de ser tutelados pelo Estado a partir da Constituição de 1988. Desde então,

temos assistido diversos conflitos em relação à demarcação de terras, enfrentamentos desiguais com os

latifundiários e mineradores em suas terras e, descaso do Estado em relação às questões culturais.

Hoje, no Brasil, vivem 817 mil índios, cerca de 0,4% da população brasileira, segundo

dados do Censo 2010. Eles estão distribuídos entre 688 Terras Indígenas e algumas áreas

urbanas. Há também 82 referências de grupos indígenas não-contatados, das quais 32

foram confirmadas. Existem ainda grupos que estão requerendo o reconhecimento de sua

condição indígena junto ao órgão federal indigenista. (FUNAI)


A formação do povo brasileiro: a herança indígena

Darcy RIBEIRO é categórico em afirmar que os primeiros brasileiros são os mamelucos. Esse termo foi usado

para nomear os filhos de moças índias com homens brancos. Alguns povos indígenas praticavam o que o

autor chama de cunhadismo, trata-se do hábito de incorporar estranhos à família ao casarem-se com uma

moça índia. No entanto, o mesmo estrangeiro casa-se com outras moças índias. Alguns documentos

relatam casos de europeus com mais de 80 casamentos e suas longas relações. Todos os parentes viravam

mão-de-obra, um grande conforto para os estrangeiros.

A prática do cunhadismo foi essencial para o que RIBEIRO chamou de criatório de gente mestiça. Com o

cunhadismo vão surgindo vários núcleos de mamelucos em toda a costa brasileira. No entanto, tal prática
começa a ameaçar os interesses da Coroa. Em 1532,o governo português lança o regime de donatarias:

posse de grandes áreas de terras para quem tivesse a intenção de povoá-las e nelas produzir. O problema é

que não havia quem quisesse vir, e então, vem os degredados e alguns nobres. Mas apenas homens

desembarcam.

De 1551 a 1559 chegam apenas 19 moços, conforme dados apresentados por RIBEIRO, o que não era nada de

significativo na constituição do povo brasileiro, ou seja, moças para os solteiros, apenas as moças

mamelucas ou índias.

As moças mamelucas são consideradas, então, as mães primárias, não são nem índias e nem portuguesas:

são brasileiras? São elas também as responsáveis pela difusão do catolicismo, uma vez que viram as vítimas
dos jesuítas que buscam catequizá-las, em troca de abrigo e casamento, em razão de não terem posição

social definida.
Quando os jesuítas aqui chegaram os maiores povos eram os Tupinambá e os Guarani, estes possuíam

semelhanças em suas línguas. Como o objetivo era catequizar os índios, os jesuítas formaram na soma das
duas línguas mais o português, a Língua Geral, ou Tupi-guarani, também chamada de Nheengatu que foi a

língua dos brasileiros paulistas até o século XVIII. No Nordeste, logo se implantou o português, por isso
que, em São Paulo, quase tudo tem nome tupi.

ATIVIDADE FINAL

Darcy Ribeiro fala em criatório de gente mestiça. Sobre esse termo,

podemos associar:

A. O Indianismo
B. O tupi-guaraní

C. A colônia de povoamento
D. O cunhadismo

REFERÊNCIA
RIBEIRO, Darcy – O povo brasileiro. 4ª reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
Fundação Nacional do Índio – FUNAI. Disponível em: http://www.funai.gov.br/ (http://www.funai.gov.br/)
acesso em 28/09/2013.
Questões de gênero
ESSA AULA TEM COMO OBJETIVO APRESENTAR AS DISCUSSÕES ACERCA DA TEMÁTICA DE GÊNERO,

QUE INCLUI AS RELAÇÕES ENTRE HOMENS E MULHERES, BEM COMO AS DISCUSSÕES ACERCA DA

HOMOSSEXUALIDADE E HETEROSSEXUALIDADE, DEMONSTRANDO COMO ESSAS RELAÇÕES ENQUANTO

SOCIAIS/CULTURAIS APRESENTAM-SE NATURALIZADAS EM NOSSA SOCIEDADE.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Ao pensar a sociedade brasileira remetemo-nos facilmente à algumas características típicas, algumas delas

já discutidas aqui, como o preconceito com o negro e com o indígena e outras que ainda discutiremos, como

a desigualdade social. Além disso, percebemos a sociedade brasileira como machista e sexista. O machismo

se faz presente nas relações entre homens e mulheres e nas relações que envolve a questão hétero-

homossexualidade.

O que possibilita essa ideia de superioridade do homem é a naturalização que essa tem em nosso

imaginário. Naturalizar significa tornar essa superioridade, que é socialmente e historicamente construída,

como um dado da natureza: os homens seriam naturalmente superiores às mulheres e, a condição

masculina heterossexual, também seria uma condição da natureza. Assim sendo, o contrário à essas

posturas é antinatural, é uma aberração da natureza, daí a formação do preconceito e a agressão aos

indivíduos que transgridem a ordem natural das coisas.

O machismo e as mulheres

Pierre BOURDIEU, no livro A Dominação Masculina (1995), trata a relação entre homem e mulher a partir

de uma violência simbólica, definida da seguinte maneira:

violência suave, insensível, invisível a suas próprias vítimas, que se exerce

essencialmente pelas vias puramente simbólicas da comunicação e do conhecimento, ou

mais precisamente, do desconhecimento, do reconhecimento ou, em última instancia, do

sentimento. (1995:4)

Afirma ainda que essa relação social é da ordem do ordinário, ou seja, comum e cotidiano. Nesse sentido, a

oposição entre masculino e feminino opera de forma arbitrária assim como alto/baixo, na frente/atrás,

claro/escuro, etc. Arbitrariamente divididos em um esquema de pensamento que, entendidos como dados

naturais, contribuem para fazer existir ao mesmo tempo que as “naturalizam”, inscrevendo-as em um

sistema de diferenças, todas igualmente naturais em aparência(...) (BOURDIEU, 1995:13)


Ao entendermos a dominação masculina dessa forma, seja em relação às mulheres ou em relação à

homofobia, encontramos inúmeras situações do cotidiano que confirmam a teoria do autor. Além disso,

precisamos pensar que o machismo não está presente apenas nas ações do dominador, elas são

reproduzidas pelos dominados, especialmente, pelas mulheres.

A busca pela independência econômica, que levaria à emancipação feminina, começou na segunda metade

do século XX, no entanto, análises sobre o papel da mulher no trabalho demonstram que, na ordem

capitalista a mulher é ainda mais explorada que o homem.

ANTUNES (1999) demonstra que boa parte do trabalho mais qualificadas ainda está nas mãos masculinas; o

trabalho intensivo, mais elementar, nas das mulheres, ou seja, as mulheres são mais exploradas pelo

capital. Em pesquisa realizada no Japão, França e Brasil essa divisão é visível e, uma vez demonstrado que

algumas funções eram melhor exercidas por mulheres, isso não foi enxergado como qualificação, caindo na

naturalização das funções.

Quando pensamos o papel dos sindicatos, nota-se a exclusão das mulheres trabalhadoras, bem como a

exclusão dos terceirizados e/ou precarizados. Além disso, a mulher trabalhadora realiza o trabalho

duplamente, dentro e fora da fábrica ou dentro e fora da casa, sendo duplamente explorada.

Mas, no universo da vida privada, ela consome horas decisivas no trabalho doméstico,
com o que possibilita (ao mesmo capital) a sua reprodução, nessa esfera do trabalho não-

diretamente mercantil, em que se criam as condições indispensáveis para a reprodução da


força de trabalho de seus maridos, filhos/as e de si própria. Sem essa esfera da reprodução

não-diretamente mercantil, as condições de reprodução do sistema de metabolismo social


do capital estariam bastante comprometidas, se não inviabilizadas. (ANTUNES, 1999)

O problema da dominação masculina proveniente da violência simbólica, extrapola esse campo e chega à

violência psicológica e física. Ademais, essa dominação não guarda relação com classes sociais ou etnias,
ela perpassa todas essas outras categorizações sociais.

Quando observamos categorias de trabalhadores, percebemos uma clara divisão sexual. A formação de
professores para a educação infantil é uma especialidade que atrai as mulheres. Os cursos de Pedagogia tem

um percentual mínimo de homens, em razão da naturalização do cuidado com as crianças, função


entendida como feminina, por conta da maternidade.

Somando-se a reprodução nestes padrões na família, percebemos os estereótipos em livros didáticos, onde
as mulheres aparecem como sentimentais e aptas para a família, incompetentes para a ciência e para

exercer funções onde se exige a força física. (SOUZA, 2006)


A heterossexualidade e a homossexualidade

Também a homossexualidade é percebida pelo viés machista. Uma vez que o homem, culturalmente, é
percebido como o sexo forte e a heterossexualidade como norma. As características naturais da mulher,

como a sensibilidade, os passos curtos, o modo de sentar e falar e a delicadeza, quando vistos em um
homem, caracteriza-o como semelhante à mulher, portanto, deixa de ser homem. No entanto, todos os

atributos femininos acima, nada são além de uma construção social, desde o início da vida de uma menina.
Às meninas são ensinados modos de sorrir, cor preferida, mundos ideais (da princesa, da mãe e da dona de
casa), brincadeiras de menina, enfim, um mundo da casa, da vida doméstica. Ações presentes nas atitudes

da mãe, da professora e dos homens, que assim enxergam tais ações. Aos meninos, revela-se o mundo da
rua, com as brincadeiras violentas, com a atitude racional, a audácia e a força física. (DAMATTA, 1996)

Um dado ainda mais arbitrário é o fato de atribuirmos cores ao mundo feminino e ao masculino. Desde a
mais tenra idade, a cor de rosa é a cor feminina, jamais encontrada nos brinquedos dos meninos.

Temos diante de nós, uma visão binária, que enxerga as características femininas e masculinas como as
corretas, características essas que são fruto de uma construção histórico-social e não, naturais como essa

visão determina.

Esta visão binária do mundo e das relações de gênero identifica o masculino e o feminino
como termos opostos, ainda que complementares: eles podem conviver um com o outro,

mas nunca um no outro. Os atributos considerados femininos são positivos se


encontrados em mulheres, mas desqualificam os homens que os possuem, o mesmo se

dando com a masculinidade em relação às mulheres. Neste caso, a natureza explica a


essência de cada sexo, e perverter esta distribuição de atributos é perverter a própria

natureza, sempre sábia em suas "decisões". Neste domínio do binário, as práticas e


comportamentos sexuais e afetivos que não obedecem esta distinção dual serão tomadas,

como desvio, perversão, "vão ser categorizadas para serem assim melhor excluídas da
norma, do 'normal'. (TORRÃO FILHO, 2005)

Conhecimento para a igualdade social


Enquanto educadores, precisamos entender que o preconceito contra as mulheres e contra os homossexuais

parte de uma compreensão equivocada do que seja o feminino e masculino e as orientações sexuais, homo e
heterossexualidade. Além disso, é preciso salientar que, enquanto orientação sexual não estamos falando

de algo inato ou meramente influenciado por uma cor ou por uma brincadeira, e muito menos uma opção.
A busca pela igualdade social deve permear o entendimento do educador, uma vez que as pequenas atitudes

cotidianas em sala de aula, mostram-se eficientes promotores dessa igualdade social. Não diferenciar
atitudes de menina das dos meninos, bem como atividades, cores e orientações sexuais podem contribuir

com a formação de adultos menos machistas e menos preconceituosos.


A adoção de material didático e paradidático que leve em consideração a diversidade cultural (como
exemplos, a questão étnico-racial, a religiosa e a de gênero) é parte do caminho para a igualdade social.

ATIVIDADE FINAL

Pensando na dominação masculina debatida neste tópico, podemos

afirmar que:
A. ela se dá simbolicamente apenas, onde a violência com as palavras oferece a maior tortura de todas,
que é a psicológica.

B. ela se dá simbolicamente e fisicamente, fruto de uma ausência de aceite social por parte do universo
masculino, que desfere tanto agressões físicas, quanto psicológicas sobre o feminino.
C. ela se dá fisicamente apenas, pois a caracterização da violência sópode ser feita quando existe uma
comprovação visual do fato.

D. ela transparece através da insatisfação feminina que sem nenhum motivo, quer compertir com o
homem no mercado de trabalho.

REFERÊNCIA
BOURDIEU, Pierre – A Dominação Masculina. Tradução Maria Helena Kuhner, 2ª edição, Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2002.

DAMATTA, Roberto – O que faz o brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1996.
SOUZA, Érica Renata de. Marcadores sociais da diferença e infância: relações de poder no contexto escolar.
Cad. Pagu, Campinas , n. 26, jun. 2006 . Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?
script=sci_arttext&pid=S0104-83332006000100008&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 21 out. 2013.

http://dx.doi.org/10.1590/S0104-83332006000100008.
TORRAO FILHO, Amílcar. Uma questão de gênero: onde o masculino e o feminino se cruzam. Cad. Pagu,
Campinas , n. 24, jun. 2005 . Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?
script=sci_arttext&pid=S0104-83332005000100007&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 21 out. 2013.

http://dx.doi.org/10.1590/S0104-83332005000100007.
Pensando a sociedade a partir do
positivismo
O OBJETIVO DESSA AULA É APRESENTAR A EDUCAÇÃO ATRAVÉS DA ANÁLISE DURKHEIMIANA, ONDE

OS PRECEITOS CIENTÍFICOS DA SOCIOLOGIA E DO POSITIVISMO FAZEM-SE PRESENTES. ALÉM DISSO, A

AULA APRESENTA SUCINTAMENTE O OBJETO E OS OBJETIVOS DA SOCIOLOGIA ELABORADOS POR ESSE

AUTOR.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Émile Durkheim, como já comentado na primeira aula desse curso, foi o responsável pela

institucionalização da ciência Sociologia, ciência esta que em sua criação, sofreu grande influência do

Positivismo na definição do objeto, bem como no método adotado.

A definição do objeto enquanto fatos sociais, obedeceu aos seguintes critérios: fato social é todo fenômeno

social que acontece sempre em uma sociedade, que independe da minha vontade individual e que exerce um

poder sobre nós. Suas características, então, são: a generalidade, a exterioridade e a coercitividade. A partir

dessas características podemos facilmente identificar os fatos sociais em nossa realidade.

O casamento, por exemplo, é um fato social: as pessoas se casam frequentemente, até mais de uma vez,

ainda que os divórcios sejam crescentes. Além de o casamento ser algo visível para o restante da sociedade

e, de uma certa forma, quem não se casa sempre é motivo de algum tipo de comentário.

O método definido por DURKHEIM estabelecia que os fatos sociais deveriam ser tratados como coisas. Esse

tratamento exigia do pesquisador um distanciamento do objeto estudado, afastando todas as pré-noções

(ideia proposta pelo filósofo Francis BACON no século XVI) e nossas pré-concepções, de forma que o objeto

não sofresse nenhuma interferência da subjetividade do pesquisador.


Esse método foi a base do Positivismo e surge inspirado nos métodos das Ciências naturais. Nas Ciências

Humanas, tal método perdeu sua validade, justamente, porque o objeto das Humanidades não é uma coisa.

O objeto das Ciências Humanas são os indivíduos, são as relações sociais, são os fatos históricos, a

interação do homem com a natureza, as construções simbólicas, portanto, são objetos com vida, com

vontades, gostos, preferencias, opiniões, etc.

Do mesmo modo, para o pesquisador não há a possibilidade de uma neutralidade, como preconiza o

Positivismo. Neutralidade significaria desprezar a subjetividade do pesquisador e do objeto.

Em Ciências Sociais buscamos a objetividade, assim, objetivamos nossa subjetividade: transformamos a

subjetividade em objeto a ser analisado, questionando-o, buscando o que há de social nas relações

naturalizadas pela sociedade e explicando como os fenômenos sociais acontecem.


DURKHEIM percebe a educação como um fato social. Assim, sendo a educação um objeto sociológico, ele a

estuda e publica o livro Educação e Sociologia, em 1922.

Nesta obra encontramos um primeiro esforço na definição de educação. O autor vai demonstrar que a

educação varia no tempo e em cada sociedade, mas verifica também que em todas as sociedades a educação

cumpre uma função social. Como exemplo, ele afirma que, nas cidades gregas e latinas, a educação

preparava o indivíduo a subordinar-se cegamente à coletividade; a se tornar joguete da sociedade. Hoje ela
se esforça por torná-lo uma personalidade autônoma. (DURKHEIM, 2011: 28) O sistema de educação é
múltiplo, pois existem diversos tipos de educação e de sociedade, e esta varia conforme classes sociais e

regiões.

O caráter positivista, de buscar o ordenamento da sociedade, se impõe na função que a educação deve ter

em uma sociedade. Ele afirma que é necessário entender que cada época apresenta um tipo de educação e

que devemos ser fruto de nossa época. Contrariar os preceitos educacionais, adotando princípios arcaicos

ou muito avançados, nos levaria à uma inaptidão à vida normal.

Portanto, só é possível compreender um modelo de educação se considerarmos sua historicidade. Nesse

sentido, a localizamos no tempo e no espaço, de modo que temos de considerar também, a ideia de uma

herança cultural na educação.

Herança cultural entendida como a transmissão dos saberes e práticas de um povo às suas crianças. Cada

sociedade forma um ideal de homem, ou tem essa pretensão, e esse ideal é o centro da educação. A
educação fixa as obrigações, as práticas para a convivência harmônica e busca homogeneizar um grupo

social, impondo padrões de comportamento. A partir disso, DURKHEIM elabora sua definição de educação,
que permanece uma definição clássica:

A educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre as que ainda não estão
maduras para a vida social. Tem por objeto suscitar e desenvolver na criança certo

número de estados físicos, intelectuais e morais dela exigidos tanto pela sociedade
política em seu conjunto quanto pelo meio especial ao qual ela está particularmente

destinada. (DURKHEIM, 2011: 37)

Enquanto sujeitos, somos constituídos por dois seres, o individual e o social. A educação se encarrega de
formar o social, ela cria no homem um ser novo. Assim, a ideia de dom é totalmente superada pela

educação, assim como as qualidades da inteligência.


Se forma um novo ser, forma também seus valores e crenças, sua visão de mundo a partir de uma

determinada sociedade em um determinado momento histórico.


Dessa maneira, podemos entender que o homem é o fruto da sociedade. Se dele tiramos todos essas ações

que se impõem, teríamos um animal. Os saberes produzidos por uma geração serão relegados à próxima. E,
ainda que estes saberes possam se alterar ao longo do tempo, há grande chance de termos acesso aos

detalhes, registrados em livros, ferramentas e utensílios diversos.


É a sociedade, como efeito, que nos retira de nós mesmos, que nos obriga a ter em conta
interesses além dos nossos, é ela que nos ensina a dominar nossas paixões, nossos

interesses, a regra-los, a nos incomodar, a nos privar, a nos sacrificar, a subordinar nossos

fins pessoais a fins mais elevados. (DURKHEIM, 2011: 42)

ATIVIDADE FINAL

Para Durkheim, fato social é

A. Tudo que a Sociedade pune, quando não é realizado à contento

B. Tudo que a Sociedade toda faz


C. Tudo que é observado na Sociedade

D. Tudo que é geral, exterior e coercitivo

REFERÊNCIA
DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

_________________ Educação e Sociologia. Petrópolis: Vozes, 2011.


DURKHEIM. Grandes Cientistas Sociais. Vol. 1, 8ª edição, São Paulo: Ática, 1998.
Pensando a sociedade de maneira
progressista
O OBJETIVO DESSA AULA É DEMONSTRAR O PAPEL DETERMINANTE QUE O SISTEMA CAPITALISTA TEM

SOBRE AS INSTITUIÇÕES SOCIAIS. NESSE SENTIDO, APRESENTAR OS PRINCIPAIS CONCEITOS

MARXISTAS E COMO POSSIBILITAM EXPLICAR A REALIDADE.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Karl MARX (1818-1883) foi um influente pensador alemão. Suas obras versam sobre Economia, Filosofia,

Ciência Política e Sociologia e tem como tema principal, a crítica ao capitalismo. Não há em MARX uma

discussão profunda sobre o papel da escola, mesmo porque, no momento em que analisa a história, a escola

é em grande medida, restrita à burguesia. No entanto, a análise da sociedade que este autor faz, bem como

o caráter determinante desta sobre o indivíduo, são suficientes para pensarmos a escola, uma vez que esta é

parte do que MARX denomina superestrutura de uma sociedade.

Para MARX a sociedade é dividida em duas partes: a infraestrutura e a superestrutura. A primeira refere-se

ao sistema econômico vigente que, na contemporaneidade é o capitalismo. A segunda, sempre subjugada

pela primeira, refere-se a todas as instituições sociais, tais como o Estado, a escola, a família, a religião, os

meios de comunicação e as regras jurídicas. As instituições sociais são responsáveis por nos ensinar modos

de ser e de agir, ensinando-nos como conduzir nossas vidas, através da formação dos nossos valores e da

nossa moral.
Uma vez que a infraestrutura determina o modo de ser e de agir dos indivíduos através da superestrutura,

nossa existência e nossa consciência dependem das condições materiais de produção.

As ideias (Gedanken) da classe dominante são, em cada época, as ideias dominantes; isto

é, a classe que é a força material dominante da sociedade é, ao mesmo tempo, sua força

espiritual dominante. (...) As ideias dominantes nada mais são do que a expressão ideal

das relações materiais dominantes, as relações materiais dominantes concebidas como

ideias; portanto, a expressão das relações que tornam uma classe a classe dominante;

portanto, as ideias de sua dominação. (MARX e ENGELS, 1999:72)

Validando sua teoria, o autor analisa a maneira pela qual as sociedades historicamente produziram sua

sobrevivência material, e o faz buscando as contradições internas a cada um dos momentos históricos

responsáveis pela alteração do modo de produção material da vida. Este método foi nomeado de
Materialismo Histórico Dialético.

Dessa forma, ele demonstra, por exemplo que a transição da Idade Média para a Moderna deu-se em razão

das contradições internas à Igreja Católica. Durante o período feudal, a principal instituição social era a

Igreja Católica e, enquanto parte da superestrutura, mantinha o sistema feudal. O voto aos pobres,

principal dogma da Igreja era suficiente para manter os servos nesta condição. Aliado à isso, a Igreja passou

a vender as relíquias e indulgências, além de condenar a usura. No momento em que Martinho Lutero

contradiz tais ações, instala-se um processo de desestabilização na principal instituição social, de modo

que as bases que asseguravam as relações de dominação do Feudalismo começam a ruir. Sabemos que o

processo histórico não é dessa forma fragmentada e que, existem diversos eventos que contribuem para o

fim do feudalismo, no entanto, na perspectiva do método marxiano, a Reforma Protestante é, justamente, a

contradição ou a antítese que surge na superestrutura, propiciando o rompimento da relação de

interdependência entre a superestrutura e a infraestrutura no período medieval.

Transferindo essa concepção ao nosso tempo, podemos afirmar que as ideias da burguesia capitalista são as

nossas ideias, traduzidas na necessidade de nos igualarmos uns aos outros pela via do consumo, pelo

individualismo, pela ausência de crítica produzidas por essa ideologia e pela alienação do mundo do

trabalho, não é a consciência que determina a vida, mas sim a vida que determina a consciência. (MARX e

ENGELS, 1999:72)

O trabalho é entendido como a mediação do homem com a natureza e que promove sua sobrevivência
material, no entanto, na contemporaneidade ele obedece a muitas divisões. Há uma divisão social do

trabalho, que segmenta o trabalho braçal e o intelectual; o trabalho feminino e o masculino; a divisão entre
campo (agrícola) e cidade (industrial) e ainda, por ocupações, como o religioso, o administrativo, o político,

etc. Essa fragmentação do trabalho na ordem capitalista, caracterizada pela repetição e pelo
distanciamento do trabalhador em relação ao produto final, aliena-o. A alienação é entendida aqui como

ausência do reconhecimento de seu trabalho. O trabalhador alienado não se realiza através do trabalho e
não percebe a exploração efetuada sobre sua força de trabalho.

A divisão social do trabalho relaciona-se com a estrutura de classes sociais. Na atualidade temos duas
classes: a dos capitalistas e a dos trabalhadores. As relações sociais são criadas na interação dos homens de

acordo com o meio de produção. Dessa forma, se os meios de produção se alteram, o mesmo acontece com
as relações sociais existentes entre os indivíduos de um grupo social. Mudando a maneira de produzir nossa

existência, mudam-se as relações sociais, logo muda a maneira como nos vemos.
Não se trata de um determinismo econômico, a superestrutura é fundamental para definir o tipo de

sociedade e as alterações ocorridas no modo de produção a alteram, assim, em última instancia, é a esfera
econômica que decide.

Em meados do século XIX, MARX acreditava no potencial da classe trabalhadora como a classe
transformadora da sociedade, que colocaria fim a sociedade dividida em classes sociais. Tal transformação

ocorreria quando os trabalhadores tivessem consciência de classe, consciência de que pertenciam a uma
mesma classe, a explorada. No entanto, essa transformação não se efetivou até o momento. Em grande

medida, isso não ocorreu em virtude da ideologia ter cada vez mais força alienante, além de o capitalismo
ter adotado estratégias de maior manipulação do trabalhador, tais como a flexibilização do trabalho, a
desterritorialização e a precarização do trabalho presentes nos regimes de part-time, de terceirização e de

informalidade. (ANTUNES, 1999)


Mas, como a escola aparece nesse interim? A escola para MARX é somente uma das instituições sociais

presentes na superestrutura das sociedade. Assim, ela é parte constituinte da formação de nossa
consciência alienada pelo capitalismo, pois transmite a ideologia da classe dominante, apresentando-a

como a única possível. Entretanto, apesar deste autor apostar na tomada de consciência de classe por parte
dos trabalhadores para a abolição das classes, não vê a escola como a instituição capaz de ser a antítese de

nosso tempo. Neste curso, veremos autores marxianos, tais como Louis Althusser e Antonio Gramsci, que
trabalharão a escola como instituição social importantíssima para o rompimento com a ideologia

capitalista e a alienação por ela imposta.

ATIVIDADE FINAL

Sobre infra-estrutura e superestrutura, é correto afirmar que:

A. A superestrutura é dominada pela a infra-estrutura

B. A superestrutura compõe o grupo de instituições sociais, como Cinema, Escola, mídia, etc...
C. A infra-estrutura é composta pela economia

D. Todas as alternativas estão corretas

REFERÊNCIA
MARX. Coleção Grandes Cientistas Sociais. Sociologia. Volume 10, 8ª edição, São Paulo: Ática, 1996.
MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. O Manifesto do Partido Comunista. 9ª edição, São Paulo: Global Editora,

2000.
___________________________ A Ideologia Alemã (Feuerbach). 11ª edição, São Paulo: Hucitec, 1999.
Pensando a sociedade a partir da
teoria da ação social
O OBJETIVO É APRESENTAR A TEORIA WEBERIANA PARA PENSAR A SOCIEDADE E A ESCOLA NA

CONTEMPORANEIDADE SOB O SISTEMA ECONÔMICO CAPITALISTA. TRABALHAR OS CONCEITOS DE

BUROCRATIZAÇÃO E RACIONALIZAÇÃO COMO FUNDAMENTAIS AO ENTENDIMENTO DAS SOCIEDADES

CAPITALISTAS.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Max WEBER (1864-1920) integra o grupo dos clássicos das Ciências Sociais, com Émile Durkheim e Karl

Marx. WEBER analisa a sociedade e as suas mudanças a partir das relações que os indivíduos mantém entre

os membros de seu grupo social, sem apostar nos determinismos presentes nas teorias durkheimiana e

marxiana.

A sociologia weberiana é também conhecida como Sociologia Compreensiva ou Interpretativa, pois veem as

ações individuais como as responsáveis pela mudança social no momento em que tornam-se relações

sociais, ou seja, quando fazem sentido ao outro.

A Sociologia interpretativa considera o indivíduo [...] e seu ato como a unidade básica,

como seu “átomo” – se nos permitirem pelo menos uma vez a comparação discutível.

Nessa abordagem, o indivíduo é também o limite superior e o único portador de conduta

significativa... Em geral, para a Sociologia, conceitos como “Estado”, “associação”,

“feudalismo” e outros semelhantes designam certas categorias de interação humana. Daí

ser tarefa da Sociologia reduzir esses conceitos à ação “compreensível”, isso é, sem

exceção, aos atos dos indivíduos participantes. (WEBER, 1979: 74)

Para WEBER a sociedade ou realidade social não pode ser compreendida em sua totalidade como

pressupunha DURKHEIM, justamente em razão de sua complexidade. Sendo assim, não há como

estabelecermos leis gerais que possam explicá-la, uma vez que esta ciência deve compreender os

fenômenos a partir de suas singularidades. Tais singularidades são perceptíveis na pluralidade das ações

individuais, portanto, a Sociologia deve estudar as ações sociais.

A teoria weberiana da ação social contradiz as teorias deterministas de DURKHEIM e MARX, que veem o

indivíduo como condicionado ou determinado pela sociedade, como o ser que precede seu grupo social e

que sempre será coagido, controlado e moldado a partir das instituições sociais.
Segundo WEBER, existem 4 tipos de ação social (como tipos ideais):

- tradicional: orientada por costumes. Ex.: pedir a benção, batizar o filho não sendo fiel religioso, etc. São

reflexos adquiridos pela prática.

- afetiva: orientada por estados emocionais, sem levar em conta os resultados. Ex.: quebrar algo no

momento de raiva, festejar o final do campeonato de futebol, etc.

- racional com relação à valores: crença em um valor, agimos de acordo com nossos princípios sabendo dos

riscos da ação, porque é racional. Ex.: o celibato, a participação em um protesto, etc.

- racional com relação a fins: orientada pelo cálculo racional, estabelecendo objetivo e os meios para seu

alcance. Ex.: a ciência, uma ação econômica, a construção de uma obra, etc.

As ações sociais quando organizadas, quando encontram reciprocidade nas ações de outros indivíduos,

tornam-se uma relação social. A partir dessa metodologia, o autor demonstra que o surgimento do

capitalismo guarda estrita relação com o modo de vida dos protestantes, na clássica obra A Ética

Protestante e o Espírito do Capitalismo. A ação individual do burguês encontra reciprocidade na ação social
racional do protestante.

A análise weberiana procura compreender o processo de organização e consolidação do trabalho no mundo

capitalista, buscando o espírito do capitalismo. Para tanto, verificou que entre os motivos/características da

consolidação da sociedade moderna não estavam presentes o aumento da população ou o acúmulo de

riqueza e nem a ganância pelo lucro e, sim, a racionalização em todas as esferas da vida: religiosa,
econômica e política.

Verificou uma organização formal e racional do trabalho livre; a organização racional da indústria, voltada
para o mercado; a separação entre economia doméstica e empresarial e o uso da contabilidade racional

através da previsão. O resultado dessas praticas foi um lucro via superioridade técnica, eliminando dos
negócios as relações sentimentais, que afastam o cálculo racional.

Então, qual é o espírito do capitalismo? A busca pelo lucro e racionalidade do trabalho. Mas isso já existira
antes, porque só o capitalismo produziu estes resultados que hoje encontramos?

WEBER observou a presença de muitos protestantes entre empresários e trabalhadores qualificados.


Verificou que os princípios e as práticas protestantes iam ao encontro daqueles encontrados nas condições

que propiciaram a consolidação do capitalismo.


A ética protestante pauta-se pelo entendimento de que a perda de tempo é o principal pecado, portanto, há

a condenação da preguiça, da poupança e da aposentadoria. Além disso, associa o lazer à descanso, desde
que com o propósito de, apenas, reabilitar o corpo para o trabalho, desprezando o teatro e as atividades

estéticas e artísticas (prazeres mundanos). Tudo isso leva à riqueza, ao contrário dos católicos, para os
quais a riqueza é (era) entendida como pecado.

Certo que conduzia sua vida corretamente dentro dos preceitos religiosos, o burguês podia agir segundo os
seus interesses pecuniários, e assim devia proceder. Desse modo, a riqueza deveria ser sempre reinvestida
para gerar novas formas de trabalho. Os baixos salários pagos aos trabalhadores e a desigual distribuição de
riqueza, era justificada pela garantia de que isso fazia parte da Divina Providência, com seus mistérios

desconhecidos do homem. Além disso, essa ética produziu a ideia de que ‘qualquer trabalho é melhor do
que nenhum trabalho’. E a racionalização se transformou na ética burguesa do trabalho.
A racionalização apresenta-se na burocracia instituída na ordem capitalista. No Brasil, associamos
erroneamente o termo burocracia a todos os processos administrativos lentos. No entanto, a burocracia

guarda características bem definidas por WEBER que darão a tônica da atual administração pública e
privada, podendo ser notada, então, nos princípios que regem a educação da nossa sociedade.

As principais características da burocracia são o ordenamento do funcionamento das instituições pela


adoção de leis ou normas administrativas; o estabelecimento de hierarquia dos postos e dos níveis de

autoridades; a adoção dos registros das atividades (os arquivos); há a necessidade de treinamento
especializado e, consequentemente, a avaliação do desempenho a partir das regras estabelecidas. O

discurso da burocratização e da racionalização é o da superioridade técnica em detrimento de qualquer


outra forma de organização.

Nesse sentido, a educação para WEBER cumpre o papel de formar os especialistas que ocuparão os postos
na burocracia. A ideia de um “homem culto” preconizado pela educação de sociedades tradicionais,

justificava as posições sociais das classes dominantes.


Portanto, a educação enquanto processo formal de aprendizagem social, está envolvida numa pedagogia de

treinamento com vistas a formar especialistas, que possuem uma competência técnica específica destinada
a ocupar um lugar na vasta organização social burocratizada (estado, empresa, vida social).

Esse tipo de educação, perceptível na atual realidade neoliberal (que será discutida nas próximas aulas),
desvincula o aprendizado escolar dos valores humanistas, o que pode dificultar a transformação da

realidade social.

ATIVIDADE FINAL

Sobre a a ação social envolvida no espírito do capitalismo, se


relacionada à ética protestante, podemos dizer que:

A. é uma afirmação da ação afetiva, sobre a ação racional com relação à valores, fazendo a primeira se

permear através da primeira.


B. é uma afirmação da ação racional com relação à fins, sobre a ação racional com relação à valores,

fazendo a última se permear através da primeira.


C. é uma afirmação da ação racional com relação à fins, sobre a ação tradicional, fazendo a última se

permear através da primeira.


D. é uma afirmação da ação racional com relação à valores, sobre a ação racional com relação à fins,

fazendo a última se permear através da primeira.

REFERÊNCIA
WEBER, Max – Ensaios de Sociologia. 4ª edição, Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979.
_____________ A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. 15ª edição, São Paulo: Editora Pioneira, 2000.
A teoria crítico-reprodutivista
O OBJETIVO DESSE TÓPICO É EXPOR A DISCUSSÃO QUE FICOU CONHECIDA COMO TEORIA DA ESCOLA-

REPRODUTIVISTA, TENDO COMO GRANDES EXPOENTES DESSA CORRENTE, OS FRANCESES LOUIS

ALTHUSSER E PIERRE BOURDIEU. OS DOIS AUTORES VÃO DEMONSTRAR COMO A ESCOLA É A

PRINCIPAL INSTITUIÇÃO QUE PODE PROPICIAR A REPRODUÇÃO DA DESIGUALDADE SOCIAL.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Em meados do século 20, alguns teóricos propõem um novo modelo para pensar a sociedade. Nem o modelo

positivista-funcionalista proposto por DURKHEIM e nem o modelo compreensivo postulado por WEBER.

Tais teóricos, especialmente os franceses Louis Althusser e Pierre Bourdieu vão demonstrar que a escola

pode propiciar a reprodução das desigualdades sociais, ainda que a partir de perspectivas diferentes.

Louis Althusser e os Aparelhos Ideológicos de Estado

Louis ALTHUSSER (1918/1990) foi um filósofo francês influenciado diretamente pelas ideias de Karl MARX.

Em sua obra, Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado (1977), trabalha com os conceitos marxistas de

Estado, como infraestrutura, superestrutura, ideologia, classes dominantes entre outros.

O autor parte da concepção marxiana de Estado, presente no Manifesto do Partido Comunista que define o

Estado como apenas uma comissão que administra os negócios comunitários de toda a classe burguesa,

nesse sentido, como uma das principais instituições sociais. No entanto, ALTHUSSER pensa o Estado como

a parte repressora, nomeando-o como Aparelho de Estado (AE) e, as demais instituições sociais como os

Aparelhos Ideológicos do Estado (AIE).

O aparelho de Estado é constituído pela polícia, tribunais, prisões, governo, administração e exército.

Funciona através da violência posta ao serviço das classes dominantes.


Os aparelhos ideológicos do Estado (AIE) são esferas da sociedade que Durkheim chamou de instituições

sociais. Assim, temos o AIE religioso, AIE escolar, AIE familiar (que também é reprodutora da força de

trabalho, da unidade e do consumo), AIE jurídico, AIE sindical, AIE político (partidos), AIE da informação

(as mídias em geral) e AIE cultural.

O AE é sempre público, é o próprio Estado. Nesse sentido, são as instituições sociais com a legitimidade da

violência (polícias, forças armadas). Os AIE, em geral, aparecem como privados, uma vez que tais

instituições não são reguladas pelo Estado. No entanto, estamos trabalhando com os conceitos de

infraestrutura e superestrutura que Karl MARX nos apresentou, demonstrando como a ideologia capitalista

determina toda a superestrutura.

Portanto, ALTHUSSER vai afirmar que não existe Aparelho de Estado sem ideologia. Em um primeiro

momento, os AIE são puramente ideológicos. Embora muito diferentes entre si, os AIE funcionam

embasados pela ideologia da classe dominante. E uma classe só se mantém dominante se exercer poder nos
AIE e sobre os mesmos.

ALTHUSSER então questiona qual a relação dos AIE com as relações de produção? Em grande medida essa

relação é assegurada pelo poder exercido pelos AIE e pelo AE, que é repressivo. Por serem variados e

distintos, os AIE aparecem como relativamente autônomos, enquanto o AE é mantido pela organização

central dos representantes da classe dominante presentes no governo.

As formas contraditórias pelas quais a ideologia dominante se apresenta nos AIE é parte do processo de

alienação a que somos submetidos (por exemplo, os meios de comunicação condenam o consumismo ao

mesmo tempo que vendem seu espaço à anunciantes).

A partir de uma análise marxiana da história ocidental, o autor afirma que o AIE número um do Feudalismo

foi a Igreja Católica. A Reforma Protestante e as revoluções burguesas a derrubaram deste posto e, ao

contrário do que se pensa, não foi substituída pelo AIE político e, sim, pela escola. O AIE Igreja-família foi

substituído pelo AIE escola-família.

Assim, todos os AIE visam a reprodução das relações de produção e, consequentemente das relações de

produção capitalistas. Todos levam à isso: o político impondo a ideologia do Estado (democracia); o da

informação impõe ideias vinculadas ao capitalismo (individualismo, consumismo, liberalismo), assim como

o cultural (que determina o que é cultura e o que não é) e dessa maneira, em todos os AIE.

Entretanto, para ALTHUSSER, o mais importante Aparelho Ideológico do Estado é o escolar.

Desde a infância até à adolescência a escola inculca nas crianças os saberes próprios e práticos das classes
dominantes, para depois estes se transformarem na maioria dos trabalhadores desqualificados. Alguns

seguem estudando, chegam a cargos médios, outros ascendem aos cargos de mando, ou seja, à classe
dominante, tem ainda os que serão parte do Aparelho repressor e também, os profissionais da ideologia

(professores, padres).
Vistos a partir da ideia de papéis sociais, temos o explorado (com consciência profissional, moral e apolítica

mais desenvolvida); o agente da exploração (que sabe mandar); os agentes da repressão ( que sabem
mandar e serem obedecidos sem discussão) e os profissionais da ideologia (que tratam as consciências com

o respeito, isto é, com o desprezo, a chantagem, a demagogia que convém...p. 66).


ALTHUSSER aponta o caminho para a mudança:

Peço desculpa aos professores que, em condições terríveis, tentam voltar contra a
ideologia, contra o sistema e contra as práticas em que este os encerra, as armas que

podem encontrar na história e no saber que “ensinam”. Em certa medida são heróis. Mas
são raros, e quantos (a maioria) não tem sequer um vislumbre de dúvida quanto ao

“trabalho” que o sistema (que os ultrapassa e esmaga) os obriga a fazer, pior, dedicam-se
inteiramente e em toda a consciência à realização desse trabalho (os famosos métodos

novos!). Têm tão poucas dúvidas, que contribuem até pelo seu devotamento a manter e a
alimentar a representação ideológica da Escola que a torna hoje tão “natural”,

indispensável-útil e até benfazeja aos nossos contemporâneos, quanto a Igreja era


“natural”, indispensável e generosa para os nossos antepassados de há séculos.
Pierre Bourdieu e a herança cultural
Pierre Bourdieu propõe outra forma de ler a escola. No lugar de igualdade de oportunidades, meritocracia e

justiça social, o autor vê reprodução e legitimação das desigualdades sociais. Para ele a escola não é
transformadora, ela é a instituição que legitima os privilégios. A primeira obra a tratar do assunto é Os

herdeiros (1964) e, em seguida, com Jean-Claude Passeron, A Reprodução (1970).


O autor chama a atenção a um ponto muito importante a se considerar: os alunos não são abstrações e não

são iguais na escola. Cada um aluno traz uma bagagem cultural e social diferente da dos demais e que pode
ser mais ou menos rentável na escola.

Bourdieu discute que a escola cobra do aluno, independente de sua origem, os gostos, as crenças, as
posturas e os valores do grupo social dominante, que são apresentados de forma dissimulada, como sendo

uma cultura universal. Assim, ao definir o currículo e o método, por exemplos, a escola reproduz as
desigualdades sociais.

Ela legitima as desigualdades sociais dissimulando as bases sociais, transformando as diferenças sociais em
diferenças acadêmicas e cognitivas e, que, por isso, relacionam-se à métodos e a algo inato.

Bourdieu critica as teorias que veem no sujeito, enquanto individuo, uma grande capacidade autônoma e
consciente de suas ações, teorias estas que chama de subjetivistas e que levam em consideração as

representações, escolhas e ações individuais. Oposto à isso, Bourdieu afirma o caráter social das nossas
atitudes. Tudo em nós é construído socialmente, dos gostos mais íntimos, preferências, postura corporal,

até a entonação da voz, passando inclusive pela aspiração da carreira.


Também critica as teorias ‘objetivistas’ como o estruturalismo que, segundo ele, reconhece as propriedades

que estruturam mas, não demonstram o processo, ou seja, a operação que estrutura dentro das práticas
sociais, pois partem de explicações, em geral, da linguística ou socioeconômicas.

Segundo Bourdieu, a estruturação dos comportamentos individuais dá-se de dentro para fora e o conceito
habitus permite a compreensão dessa ideia. A introjeção desses gostos, crenças e preferências, que é o
habitus, entendido como um conjunto de disposições da sua família ou grupo social, é atualizado em
diferentes espaços de socialização. Esse conjunto de disposições são princípios de orientação e são

adaptáveis às diversas situações.


Trata-se de uma relação dinâmica, não determinada previamente e que vai se perpetuando através do

próprio sistema de disposições no qual foi criado e nas condições onde tais disposições fossem aplicadas.
Mas não é rígido e nem mecânico.

Na educação, Bourdieu nega a existência de um sujeito autônomo e, também a de um sujeito condicionado


ou determinado estruturalmente. Se de um lado cada individuo traz uma bagagem socialmente herdada, por

outro lado, existem componentes objetivos, externos e que podem beneficiar o sujeito em seu sucesso
escolar, modificando o modo de agir. Para isso, a ideia de capital é pensada em outras esferas, além do
capital econômico. Assim temos o capital social (relacionamentos sociais influentes da família) e o capital

cultural (domínio dos saberes cultos e principalmente títulos escolares).


A bagagem familiar inclui componentes que constituem a subjetividade individual e aparece,
principalmente, como capital cultural. Apreendemos esse capital cultural por meio de nossa família, como
uma herança social e abrange gostos e preferências em relação à arte, à gastronomia, à decoração, ao
vestuário, aos esportes, saber a língua culta, conhecer o sistema de ensino, etc. Na análise bourdieusiana o
capital cultural tem o maior impacto no sucesso escolar, e o econômico é diminuído na explicação das

desigualdades circunscritas à esse ambiente.


O capital cultural leva ao aprendizado de conteúdos e códigos escolares, as referências culturais, os
conhecimentos tidos como legítimos que os alunos trazem de casa funcionam como uma ponte entre a casa
e a escola, ajudando na aprendizagem. Na escola há todo um capital cultural a ser apreendido. Assim, para

os que não tem tal capital cultural, a escola é sempre estranha, para dizer o mínimo.
O capital cultural também contribui para aumentar o desempenho dos alunos nos processos de avaliação,
pois estes encerram um julgamento moral, cultural e de conteúdo. A cobrança é por escrever e falar bem,
comportar-se socialmente, ser curioso intelectualmente falando, comprometido e disciplinado. Isso só é

possível de ser alcançado se os alunos adquiriram esse capital desde a interação em família.
Além disso, o capital cultural pode fornecer informações sobre a estrutura do sistema de ensino, que
engloba, entre outros elementos, a hierarquização e a noção de qualidade, atributos que só pais professores
ou com amigos conhecedores, podem oferecer. Assim, o capital social contribui para o capital cultural.

O capital econômico quando transformado em viagens de estudo, em visitas à museus e exposições, ao


acesso a literatura, só melhora o desempenho escolar do aluno se este tiver como bagagem familiar o
capital cultural para compreensão dessas atividades.
Ainda em relação à família, Bourdieu afirma que os grupos agem de acordo com suas experiências de

sucesso ou fracasso, constituindo um saber prático que é utilizado como um conjunto de disposições que
orientará os investimentos futuros.
Esses investimentos são da ordem dos capitais. No caso de educação esse habitus vai levar ou não o filho ao
curso superior X ou Y ou colocará um fim na sua instrução. E são pensados levando-se em consideração o

retorno do investimento, tanto no mercado de trabalho como em outros mercados simbólicos, como o
matrimonial.
As classes e o investimento em educação.
As classes populares investem pouco capital econômico pois não dispõem do mesmo. Na lógica do custo-

benefício, este último é incerto e a longo prazo. Não há grande acompanhamento do desempenho por parte
dos pais, busca-se educação rápida e para o trabalho. Em geral, elevam-se ligeiramente em relação aos pais,
até por conta do que ele chama de inflação dos títulos.
As classes médias disporão de muito capital econômico, pois como não possuem grande capital cultural,

esperam que seus filhos o tenham. Dessa forma, adotam três componentes: o ascetismo, o malthusianismo
e a boa vontade cultural. O primeiro resulta em gastos cada vez menores com prazeres para propiciar
melhor educação ou, para benefício futuro, tem maior disciplina e maior autocontrole. O segundo se traduz

num número menor de filhos, menor que as classes populares e maior que a elite e, o terceiro, em busca de
cultura, adquirindo capital cultural, ou seja, a cultura legítima: compra de livros, visita à eventos culturais,
etc.
As elites investem pesadamente na educação, no entanto, o sucesso escolar é algo “natural”, e não demanda

tanto esforço familiar. Já possuem capital cultural, social e econômico, não lutam para ascender, pois seu
lugar ou sua posição no campo já está definida.
A escola e o processo de reprodução das desigualdades sociais
Em uma dada sociedade complexa como a nossa, existe uma diretriz de ensino a ser seguida. Tal diretriz ou
parâmetros apresentam os conteúdos que devem ser apreendidos em cada etapa da educação básica. As
diretrizes não distinguem as classes sociais, portanto, toda escola deve trabalhar o conteúdo proposto, seja
ela a escola para as classes alta e média, que em nossa sociedade é a escola privada ou a escola para a classe

baixa, nossa escola pública.


Se os conteúdos são os mesmos e, muitas vezes o método adotado também, por que a escola pode propiciar
a reprodução das desigualdades sociais? É a partir da ideia de um arbitrário cultural que Bourdieu vai
apresentar a resposta a tal pergunta.

O capital cultural de cada grupo não está fundamentado em princípios racionais e objetivos, ele é
“escolhido” de forma arbitrária. Bourdieu se apropria do conceito de cultura desenvolvido pela
Antropologia, para demonstrar que não existe um capital cultural superior à outro, existem diferentes
capitais. No entanto, a imposição de um sobre os outros, pode legitimá-lo como superior e, principalmente,

como o único possível.


Um arbitrário cultural só é entendido como legítimo se entendermos como se dão as relações de grupo em
uma sociedade e da disputa pelos seus arbitrários. Em uma sociedade de classe, a imposição da classe
dominante se dará também no campo cultural. Nesse sentido, a escola a partir de uma autoridade conferida

pelo fazer pedagógico, apenas legitimaria o arbitrário cultural produzido pela classe dominante. É preciso
refletir que esse fazer pedagógico só é garantido se o arbitrário cultural da elite for dissimulado,
apresentando-se como legítimo e neutro.
Para funcionar, ou seja, favorecer os mais favorecidos e desfavorecer os menos favorecidos, é preciso que a

escola ignore a origem dos alunos. Assim ao tratar formalmente de modo igual, em direitos e deveres, quem
é diferente, a escola privilegiaria, dissimuladamente, quem, por sua bagagem familiar, já é privilegiado.
(NOGUEIRA e NOGUEIRA, 2012)
Para o aluno se beneficiar do conteúdo que a comunicação pedagógica elabora, é preciso que ele domine os

códigos utilizados nessa elaboração e, isso, apenas aqueles com capital cultural em sua origem, conseguem.
Aqueles que não conseguem, são entendidos como inaptos, como diferentes na capacidade (dons desiguais),
quando na realidade não dominam o código em sua origem. Assim, a

reprodução seria garantida pelo simples fato de que os alunos que dominam, por sua

origem, os códigos necessários à decodificação e assimilação da cultura escolar e que, em


função disso, tenderiam a alcançar o sucesso escolar, seriam aqueles pertencentes às
classes dominantes. A legitimação das desigualdades sociais ocorreria, por sua vez,
indiretamente, pela negação do privilégio cultural dissimuladamente oferecido aos filhos

das classes dominantes. (NOGUEIRA e NOGUEIRA, 2012)

Os filhos das classes dominantes percebem sua ‘facilidade’ como inerente à sua personalidade, não como
uma herança cultural e, os das classes dominadas, da mesma forma, sua dificuldade como parte de sua

personalidade. A inclusão da cultura legítima em detrimento da cultura de origem não é a maior parte da
violência simbólica que a escola impõe, a maior é reconhecer tal cultura como legítima e superior àquela de
sua origem.
Além disso, a escola valoriza o que é herdado culturalmente, como algo inato: a elegância verbal e a

desenvoltura intelectual, já que essas características não são adquiridas na escola.


É também uma pedagogia do implícito, que está presente no fato de que a escola comunica algo que supõe,
implicitamente, um capital cultural de origem.
Essa abordagem recebeu algumas críticas, elas recaem sobre a questão do arbitrário justamente porque

muitos dos conhecimentos transmitidos pela escola não são arbitrários, são conhecimentos considerados
válidos e legítimos na esfera epistemológica, e não arbitrários da classe dominante. Mas, também pode ser
o inverso, uma vez que estes conhecimentos são válidos, a classe dominante apropriou-se dos mesmos.
Outra crítica recai sobre o fato de que os professores, a escola, os princípios pedagógicos e os métodos são

diferentes. Diversas iniciativas que procuram aproximar a cultura de origem à da escola parecem propiciar o
adiamento da desistência dos alunos com um menor capital cultural.
A análise de Bourdieu permanece importante para pensarmos a escola. Precisamos pensar que o autor
apresenta a escola como a instituição que contribui para conservar a desigualdade social, portanto, ela pode

também fazer o contrário.

ATIVIDADE

A escola não é uma instituição neutra. Marque a alternativa que


apresenta a explicação correta dessa frase.

A. Essa afirmação tem por base a Teoria da Escola Reprodutivista, que tem como principais autores
Karl Marx e Pierre Bourdieu.

B. Os principais conceitos que explicam essa frase são ideologia, racionalização e burocratização.
C. A ideologia da classe dominante determina os conteúdos ensinados na escola, a partir do que

Bourdieu chamou de arbitrário cultural.

D. Segundo Louis Althusser, o aparelho ideológico de Estado não tem qualquer relação com as classes
dominantes.

REFERÊNCIA
ALTHUSSER, Louis – Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado. 3ª edição. Editoral Presença, 1977.
BOURDIEU, Pierre. Escritos de Educação. 12ª edição, Petrópolis: Vozes, 1998.
________________ e PASSERON, Jean-Claude. A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de

ensino. Petropólis: Vozes, 2011.


NOGUEIRA, Cláudio Marques Martins; NOGUEIRA, Maria Alice. A sociologia da educação de Pierre

Bourdieu: limites e contribuições. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 78, abr. 2002 . Disponível em

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302002000200003&lng=pt&nrm=iso>.
acessos em 02 nov. 2012. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302002000200003

(http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302002000200003).
A escola e o disciplinamento
O OBJETIVO DESSA AULA É PROPOR UMA ANÁLISE DA ESCOLA A PARTIR DE SUA CARACTERÍSTICA

DISCIPLINADORA E ADESTRADORA, PARTINDO DOS CONCEITOS PROPOSTOS PELO FILÓSOFO MICHEL

FOUCAULT.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Já vimos que a escola pode ser entendida como a instituição social que pode propiciar a desigualdade social

através da ideologia capitalista, vimos também que essa instituição pode reproduzir os mecanismos

próprios do capitalismo como a racionalização e a burocratização e, nessa aula discutiremos como a escola

pode reproduzir as atitudes de hierarquização, vigilância e adestramento típicas de outras instituições

sociais, como os presídios.

Michel FOUCAULT (1926-1984) foi um importante filósofo francês. Seus trabalhos versam, em geral, sobre

os mecanismos de poder que se instauram nas sociedades. Para tanto, o autor pesquisou a instituição

prisional, os manicômios, as relações de gênero, entre outros.

Partimos do princípio de que a escola é moderna, no sentido de herdar características da modernidade,

dessa forma, é possível compará-la à outras instituições sociais modernas, afirmando que, desde o século

XVIII é a instituição que melhor molda e disciplina os indivíduos.

FOUCAULT não faz uma análise da escola, e sim do nascimento de diversas instituições de nosso tempo,

como a prisão e os manicômios. No entanto, as demais instituições sociais podem ser pensadas a partir do

mesmo ponto de partida: tais instituições são francamente diferentes das instituições anteriores à

modernidade e as relações de poder estabelecidas nestas, também.

Do período do Iluminismo, vieram as disciplinas e uma descoberta do corpo como objeto e alvo do poder
(...) corpo que se manipula, se modela, se treina, que obedece, responde, se torna hábil ou cujas forças se
multiplicam. (FOUCAULT, 1991:125 apud FERRARI e DINALI, 2012)
Sendo a Idade Moderna o início do pensamento científico, os métodos são criados para controlar as

operações mínimas do corpo, sujeitando-lhe, impondo-lhe a docilidade e a utilidade.

O poder é agora um poder disciplinar, indiscreto, posto que está em todos os lugares, e altamente discreto,

uma vez que opera em silêncio.

FERRARI e DINALI (2002) ao analisarem uma escola, percebem na fala dos alunos a presença da ordem da

vigilância. A escola é percebida como uma prisão, com grades para todos os lados, corredores longos e salas

de aulas por eles dispostos, as portas são sempre trancadas e as carteiras enfileiradas.

Também nota-se a disposição do professor à frente da sala e as janelas altas não permitindo a visão da

parte externa ao prédio. Além disso, temos os regimentos, os livros de ocorrência, etc., que registra os

desvios. O que é o desvio? É o comportamento que foge dos enquadramentos.


Graças às técnicas de vigilância, a “física” do poder, o domínio sobre o corpo se efetuam

segundo as leis da ótica e de mecânica, segundo um jogo de espaços, de linhas, de telas,

de feixes, de graus, e sem recurso, pelo menos em princípio, ao excesso, à força, à

violência. Poder que é em aparência ainda menos “corporal” por ser mais sabiamente

“físico”. (FOUCAULT, 2002:148)

A punição, na disciplina, não passa de um elemento de um sistema duplo: gratificação-sanção. E é esse


sistema que se torna operante no processo de treinamento e de correção. (FOUCAULT, 2002:150)
A escola opera com cercas, algumas visíveis, outras invisíveis. Tais cercas impõem o maior controle sobre os

corpos. Existem lugares em que os alunos podem frequentar, outros não e, em momentos específicos, a

disciplina impõe definir as posições, como em uma fila. Todos dispostos nos seus respectivos

enquadramentos sociais.

A nota, a partir das avaliações, é outro dispositivo disciplinar, pois propicia o estabelecimento da

hierarquia. Essa hierarquização só conhece dois polos, o positivo e o negativo. Assim temos o ‘bom’ e o

‘mau’ aluno.

O exame combina as técnicas da hierarquia que vigia e as da sanção que normaliza. É um


controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar, classificar e punir.

Estabelece sobre os indivíduos uma visibilidade através da qual eles são diferenciados e
sancionados. (FOUCAULT, 2002:154)

Essa visibilidade acontece na escola, especificamente quando a nota é publicizada, levando à ridicularização

os “maus” alunos e à glorificação, os “bons”. A punição dos “maus”, acontece pela repetição daquilo que é
considerado o correto.

O tempo, e seu controle, é parte do processo disciplinar. Divide-se o tempo na escola em: hora-aula,
intervalo, lazer, tarefas, etc., ajustando o corpo ao tempo. Os currículos e os programas educacionais

funcionam na mesma lógica. A escola busca ensinar o que cabe num determinado tempo, e não o contrário.
O professor, à frente da sala, vigia, ensina e repreende os “indisciplinados”. A chamada no início da aula é

uma forma de controle e vigilância, sobre os presentes e os faltosos.


A escola analisada por FERRARI e DINALI (2002) tem como símbolo a coruja, que também é o animal

símbolo da Pedagogia. É possível pensarmos que a escolha deste animal, não se deu apenas por ser um
animal símbolo da sabedoria. A coruja é atenta, vigilante, tem uma cabeça que vira a quase 180º, possui

audição e visão excelentes.


Se a escola opera pela vigilância, traço elementar do processo disciplinador, terá também seus castigos. O

regimento interno/disciplinar prevê sempre “medidas educativas”, da repreensão verbal até o “convite” para
a transferência do aluno para outra escola, passando pelo registro no livro de ocorrência e contato com os

responsáveis do aluno.
O que não faz parte do que é considerado disciplina, é indisciplina, que vão desde a ausência de uniforme,
uso de boné em sala de aula, usar palavras inapropriadas à desrespeitar o professor. Mas o castigo

disciplinar tem um caráter de correção, assim, é da ordem do exercício, da repetição, da intensificação, da


gratificação, da multiplicação de um aprendizado.
Mas, o poder, pensado como presente em todas as relações, só tem uma face negativa? Não, ele também tem
uma face positiva, uma vez que produz coisas, não pesa só como força que diz não, mas que de fato ele

permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso. (FOUCAULT, 1998:8 apud FERRARI e
DINALI, 2012)

O problema que reside nesse processo disciplinador, é que a escola tende a formar adultos
disciplinados/adestrados que facilmente se inserem na lógica do mundo do trabalho, em que há controle

dos corpos e das mentes. A escola então, formaria corpos dóceis, submetidos ao trabalho.
Nesse sentido, encontrar outras formas de subjetivação que se oponham a esse processo, no sentido de

resistir, de transgredir, de sabotar, buscando espaços de liberdade e ética pautadas pelo cuidado de si e do
outro, deveria ser o objetivo da escola.

E essa pratica encontra-se em uma ética da inconformidade, da rebeldia, da rejeição à

normalização, encontra-se na prática do fazer diferente. Daí o sentido de liberdade, de


transgredir o diagrama do poder-saber. O que estamos defendendo é que as possibilidades

de espaços de liberdade na escola são inúmeros, infinitos. E, no mesmo sentido, criar


formas diferentes de subjetividades singulares, alheias ao sujeitamento objetivado pelas

relações de dominação.
(...) A liberdade, para Foucault, está ligada a uma ontologia do presente. Dá-se como

prática do impensado, ou seja, transgredir os limites que nos são impostos. Assim se
configura a ética em Foucault: como uma prática da liberdade, um convite a sair da

passividade. A crítica foucaultiana está inserida, então, nessa luta diária, na batalha
contra os lugares comuns. Temos de saber lidar com os acontecimentos do presente para

podermos transgredi-lo. E sair da passividade diz respeito à promoção de novas formas de


subjetividades, recusando as que nos são impostas. (FERRARI e DINALI, 2012)

ATIVIDADE

Leia as afirmações abaixo e, em seguida, marque a alternativa que

contém as afirmações corretas:

I - O caráter disciplinador e vigilante da escola tem o intuito de formar

cidadãos que respeitam as regras da sociedade, entendidas como


necessárias para a boa convivência em uma sociedade como a nossa.
II - A rebeldia, a transgressão e a inconformidade são características

necessárias para a transformação da educação segundo a perspectiva de

Michel Foucault.

III - A escola moderna tem como característica o modelo disciplinar,


formando corpos dóceis.

A. I e II

B. I e III
C. II e III
D. I, II e III

REFERÊNCIA
FERRARI, Anderson; DINALI, Wescley. Herança moderna disciplinar e controle dos corpos: quando a escola

se parece com uma "gaiola". Educ. rev., Belo Horizonte, v. 28, n. 2, jun. 2012 . Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-46982012000200018&lng=pt&nrm=iso>.
acessos em 24 nov. 2012. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-46982012000200018
(http://dx.doi.org/10.1590/S0102-46982012000200018).

FOUCAULT, Michel – Vigiar e Punir: história da violência nas prisões. 26ª edição, Petrópolis; Vozes, 2002.
As estratégias neoliberais sobre a
escola
O OBJETIVO DESTA AULA É APRESENTAR AS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA ATUAL FASE DO

CAPITALISMO, NOMEADA COMO NEOLIBERALISMO. ALÉM DISSO, APRESENTAR AS RELAÇÕES

EXISTENTES ENTRE O MERCADO A POLÍTICA NEOLIBERAL E AS ESTRATÉGIAS EDUCACIONAIS

ADOTADAS NA ATUALIDADE.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

O neoliberalismo surge como uma contraposição às políticas do Estado de Bem Estar Social que tinha em

KEYNES (1978) seu principal teórico. O keynesianismo, como ficou conhecida tal política, parte do princípio

de que o Estado deve intervir na economia de uma nação com o objetivo de alcançar o pleno emprego.

Resumidamente, tal política propõe que o Estado assegure, por meio de diversas políticas de distribuição de

renda, o acesso ao consumo, que leva a uma maior produção de bens. O aumento da produção propicia o

aumento no número de vagas no mercado de trabalho.

O Estado de Bem Estar Social foi implementado nos EUA depois da quebra da bolsa de valores de 1929 e em

alguns países europeus após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), com o intuito de erguer as economias

europeias.

Essa política durou até os anos de 1970, quando, impulsionado pela crise do valor no preço do petróleo

(subiu demais!), o dinheiro ficou mais escasso e, consequentemente, os juros dos empréstimos que

financiava os países nesse estado que “tomava conta das pessoas”.

Assim, com o dinheiro mais caro e, consequentemente, com os estados cada vez mais individados - para

manter tais políticas de bem-estar, organizou-se uma reunião com os líderes dos Estados mais importantes
do mundo, os quais decidiram colocar fim a essas políticas de bem-estar para a população, fazendo com que

todos os países passassem a ter gastos mínimos nessa seara.

Esse arrocho implementado nas políticas do Welfare State ficou conhecido como Neoliberalismo, onde a

primeira ministra Britânica Margareth Thatcher e o presidente dos EUA Ronald Reagan ocuparam lugar de

destaque.

Os governos neoliberais partem dos pressupostos do livre comércio, redução do setor público e diminuição

da intervenção estatal na economia, no mercado e, como já dito, nas políticas sociais.

A partir disso, condena-se a existência de programas de distribuição de renda, de empresas estatais, da

regulamentação de setores da economia e fomenta-se a privatização dos serviços sociais (saúde, educação,

transporte público, etc.): plano de saúde, vaga em escola, previdência privada, pedágio na estrada... tudo

pode ser comercializado!! Isso gera perda de cidadania!


A discussão posta por MARX e ENGELS no Manifesto do Partido Comunista (1848) sobre o processo de

expansão do modelo capitalista, cabe perfeitamente na discussão do neoliberalismo, mesmo que esses

estivesse escrevendo sobre o Liberalismo. Mas, como o nome coloca, o neoliberalismo é um liberalismo neo:

o velho transvestido de novo:

A burguesia, pela sua * exploração do mercado mundial, configurou de um modo

cosmopolita a produção e o consumo de todos os países. Para grande pesar dos

reacionários, tirou à indústria o solo nacional onde firmava os pés. As antiquíssimas

indústrias nacionais foram aniquiladas, e são ainda diariamente aniquiladas. São

desalojadas por novas indústrias cuja introdução se torna uma questão vital para todas as

nações civilizadas, por indústrias que já não laboram matérias-primas nativas, mas

matérias-primas oriundas das zonas mais afastadas, e cujos fabricos são consumidos não

só no próprio país como simultaneamente em todas as partes do mundo. Para o lugar das

velhas necessidades, satisfeitas por artigos do país, entram [necessidades] novas que

exigem para a sua satisfação os produtos dos países e dos climas mais longínquos. Para o

lugar da velha auto-suficiência e do velho isolamento locais e nacionais, entram um

intercâmbio omnilateral, uma dependência das nações umas das outras. (MARX e
ENGELS, 2000:79)

Assim, o fato de adquirirmos mercadorias produzidas em um país longínquo, com know-how das grandes

nações capitalistas, em nada difere do processo inicial do capitalismo. Mas, o discurso que permeia essa
ação, pautado pela rapidez tecnológica, que supostamente une os mais distantes e diferentes povos,

esconde a exploração que assola países como China, Taiwan e Índia.


As políticas neoliberais reforçam a ideia preconizada por MARX e ENGELS (2000) de um exército industrial

de reserva, assegurando a importância de uma taxa natural de desemprego, para abrir uma maior
possibilidade de exploração. Os salários dos menos qualificados tem progressivamente diminuído, em uma

relação inversa ao nível de exigências solicitadas.


A mistura entre Estados e mercado, gera uma situação em que as empresas começam a mandar mais que

estes, pois dependem do recolhimento dos impostos vendidos por essas corporações.
Com isso, o mercado governa sob o rótulo de uma democracia e temos, tanto nos países da periferia quanto

nos do centro, um progressivo esvaziamento e enfraquecimento das instituições democráticas.


Assim, como conciliar essa emergência dos mercados frente à democracia, posto que o primeiro se qualifica

pela exclusão social, econômica e política da população, com o segundo tendo por princípio o oposto? Pois,
democracia é sinônimo de uma maior organização do poder social, de baixo para cima, abrangendo

igualdade jurídica e autonomia dos cidadãos. A resposta é que o mercado é incompatível com a democracia
como princípio.

Mas os teóricos liberais colocam que a compatibilidade entre mercado e democracia se assenta sobre dois
princípios: que o capitalismo daria conta da igualdade, e que as instituições democráticas seriam

suficientes para corrigir possíveis desequilíbrios do mercado.


Porém, isso não aconteceu e não acontece: basta vermos os indicadores sociais e as crises gigantescas que
esse modelo tem trazido para as mais diversas sociedades.

Como o mercado necessita apenas dos mecanismos da democracia para se manter existindo com
legitimidade, esse concede à democracia um papel dentro dessa encenação mercadológica, com a hierarquia

democrática, os rituais de votação e a máquina do estado lhes avalizando para manter o povo domesticado
e sem causar problemas.

Mas não se deve elogiar demais o papel do Estado no mercado, pois, no limite, se o público for elogiado, por
que é que necessitarei do universo privado para manter minha vida funcionando.

Assim, segundo BORON (Op. Cit., 179), o neoliberalismo é um mestre na arte de desacreditar a política e o
espaço público, tomando-o como o lugar da ineficiência, da irracionalidade, corrupção e, assim, toda essa
desvalorização tende também a induzir a apatia política.

(...) a democracia não pode se sustentar sobre sociedades marcadas pela desigualdade e
pela exclusão social. Para que o regime democrático funcione é necessário que todas as

sociedades superem um determinado limite de igualdade social, e a igualdade, como


lembrava o próprio Adam Smith, deveria ser de condições e não só de oportunidades.

(BORON, 2001:191)

Dito isso de outra forma, tanto os teóricos de esquerda como os liberais concordam que a igualdade social

seja premissa básica para o funcionamento da democracia. E então, como fica a situação do indivíduo, com
pouca ou nenhuma cidadania, que pertence à um Estado dito democrático com seu direito/dever ao voto

como sinônimo de participação popular?


O cidadão vota, na América Latina, a cada dois anos. O mercado, vota todos os dias, pressionando o

governo a adotar medidas que visem beneficiá-lo através de empréstimos e especulação na bolsa. Nosso
voto é permeado por uma série de intempéries: impotência em reorganizar as políticas governamentais;

pouca ou nenhuma transparência dos valores de campanha (que subjugam partidos menores); partidos com
acessos desiguais aos meios de comunicação; possibilidade de fraude na contagem de votos e, falsos

sistemas de representação.

Até que ponto pode ser considerado como democrático um estado que apresenta tamanha

desigualdade no exercício dos direitos políticos? Podemos chamar de “democrático” um

regime político desse tipo, um tapa-sexo que mal dissimula a vigência de uma dominação
plutocrática recoberta por uma fachada plebiscitária e que em nada tem a ver com sua
real estrutura e funcionamento? Essa democracia, em suma, acaso não é uma forma
benigna de “ditadura burguesa”? (BORON, 2001:194)
São muito poucos os que chegam ao mercado e, a vontade popular fica presente somente nos discursos. É
nele que vemos o disfarce democrático ao permitir-se o sufrágio universal e, vemos também, os efeitos

ideológicos carregando a ideia de igualdade cidadã. As decisões tomadas pelos eleitos pouco ou nada tem
em comum com as demandas do “demos”, quem decide o que o corpo político fará, é o mercado, numa clara
“dualidade de poderes”. E BORÓN deixa claro que a classe média, os pequenos proprietários e, claro, os
trabalhadores, estão longe dessa última esfera.

Porém, na América Latina, não temos nem consumidores e nem cidadãos. Se, na lógica do mercado, os
consumidores podem apresentar suas demandas na hora da compra, aqui as desigualdades sociais
profundas incluem uma massa de pobres que não tem condições de serem consumidores e, temos também,
um simulacro de democracia, porque ao votarmos a cada dois anos não decidimos nada, as decisões ficam a

cargo de outro poder, que não o “demos”, provavelmente o “pluto” (do grego ploutos: riqueza).
O Neoliberalismo e a Escola
Dentro do projeto neoliberal, a escola tem como meta preparar os alunos para a competitividade, e este é
um valor da esfera econômica e não da social. SILVA (2010) demonstra que há uma grande incoerência no

discurso neoliberal. Tal discurso defende a não intervenção do Estado na esfera econômica, no entanto, o
Estado torna-se o mercado para os produtos e, o mesmo Estado subsidia a produção.
A maior contradição neoliberal, e extremamente eficaz, está depositada no fato de que o discurso de mais
liberdade e menos regulação do Estado opõe-se à transformação, na Educação, de mais governo e controle.

Haja visto, as cartilhas da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo.


Dentre as estratégias que o projeto neoliberal utiliza para justificar-se a si mesmo, uma delas é fazer os
problemas sumirem. Parece impossível não perceber os diversos problemas sociais, entretanto, o discurso
neoliberal apaga a sua origem, que vem do próprio projeto capitalista, transferindo a solução dos problemas

para a ordem do individual.


Assim, os valores da sociedade vão também cedendo lugar aos valores da lógica capitalista: igualdade,
justiça social e cidadania dão lugar à produtividade, eficiência e qualidade. SILVA afirma não ser possível a
luta contra tal estratégia utilizando as mesmas categorias com que elas avançam a passos rápidos. É preciso

criar novas categorias para o entendimento do mundo.


O discurso neoliberal é o da eficácia técnica, como se todos os problemas sociais fossem resultantes de
ineficácia técnica, como se a sociedade não estivesse presa às relações de dominação próprias do sistema
capitalista. O processo de racionalização e burocratização analisados por Weber (1979) dentro da lógica

capitalista tem no discurso neoliberal seu melhor modelo.


A escola pública é, então, apresentada como aquela que não sabe administrar seus recursos, onde há
desperdício dos mesmos, onde há baixa ou nenhuma produtividade, uso de métodos atrasados e

ineficientes. Tais referenciais não são da educação ou da área social, são da lógica do mercado e, nesse
sentido, são negativas mesmo. No entanto, a partir dessa lógica, todos os problemas seriam resolvidos com
soluções técnicas de mercado: privatização, busca de produtividade, estímulo à concorrência, etc.
SILVA (2010) compara, inclusive, o método construtivista e verifica a similaridade que guarda com o projeto

neoliberal: o primeiro visa construir um sujeito emancipado, participativo, autônomo, flexível, que tem
habilidade para resolver problemas, que tem iniciativa, etc., atributos estes que o segundo espera encontrar
no trabalhador.
A educação pública não se encontra no presente e deplorável estado principalmente por
causa de uma má gestão por parte dos poderes públicos, mas sim, sobretudo, porque há
um conflito na presente crise fiscal entre propósitos imediatos de acumulação e
propósitos de legitimação (os governos estaduais não remuneram mal os professores

apenas porque os governadores são “maus” ou pouco iluminados, mas porque isso
compete com objetivos de financiamento – necessários aos processo de acumulação –
mais imediatos). (SILVA, 2010: 19)

Nesse quesito, o dos financiamentos, há toda uma discussão sobre os reais objetivos dos organismos
internacionais, como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Fundo
Monetário Internacional (FMI). O Banco Mundial, semelhante a qualquer banco comercial, oferece
empréstimos, muitas vezes com juros do mercado. (TORRES, 1995)

No entanto, sob a lógica neoliberal, esses empréstimos tem exigido cada vez mais contrapartidas sociais,
estamos falando de um ajuste estrutural. FONSECA (1995:194) analisa o processo de cooperação técnica
entre o Banco Mundial e a educação brasileira no período compreendido entre 1971 e 1990 e afirma que
este tem se mostrado financeiramente dispendioso e pouco relevante do ponto de vista dos seus resultados

educacionais (...).
É de extrema importância ressaltar que as “soluções” que o projeto neoliberal aponta são da ordem dos
negócios. Vão desde a privatização da educação à subsídios do Estado para custear a educação dos filhos.
Assim, a democracia está prevista no fato de que os pais podem escolher em que escola o filho irá estudar,

de acordo com o valor do subsídio que recebe.


Supor, nesse sentido, que a escolha se dará livremente e racionalmente, apesar de todas as desigualdades
existentes, é propiciar que alguns “escolham” melhor que outros, em razão da já existente desigualdade
social.

O ponto de partida da educação deve ser o do reconhecimento da desigualdade social existente, que implica
na relação de todos os envolvidos. O ponto de partida neoliberal parte da competitividade e do lucro
necessários às empresas, com a mercantilização da educação e o treinamento para o trabalho reforçando as
desigualdades existentes e cria novas.

Nos EUA, o neoconservadorismo se alia ao neoliberalismo e cria novas incoerências, uma vez que os
neoconservadores querem que o Estado se sobreponha à vida privada, em questões como aborto e direitos
dos homossexuais, e na educação com o Estado controlando e reprimindo a vida social mas, não
interferindo na economia. (APPLE, 2010)

Para SILVA (2010:27), a solução dos problemas atuais na educação deve partir de uma contra ideologia. No
entanto, é preciso entender contra o quê devemos atacar e o autor elenca as diretrizes do atual modelo
econômico: 1) o mercado é o mecanismo ideal de regulação da economia e da vida social; 2) a educação,
como a saúde e outros domínios da vida social, pode e deve funcionar tal como o mercado na economia.
São essas as ideias que a educação não deve aceitar, uma vez que contraria os ideais da educação e da ideias
constitutivas da cidadania e da democracia plenas. É preciso compreender que a memória popular de lutas
por direitos (que não foram tão numerosas em nossa sociedade) não deve ser apagada e que ainda falta

muito pelo o que lutar, e a igualdade (de gêneros, étnicos, sociais) ainda está longe de ser conquistada.
É preciso criar outras categorias que nos permitam entender o mundo a partir de nossa realidade e, que os
professores se reconheçam como trabalhadoras/es culturais envolvidas/os na produção de uma memória
histórica e de sujeitos sociais que criam e recriam o espaço e a vida sociais.(Op. Cit.:28)

ATIVIDADE FINAL

Sobre a política Neoliberal e a educação, podemos dizer que:

A. transformou-a em algo vendável, o que é bom para o governo, pois, ao ser vendável, a escola que

demandava investimentos (gastos públicos), passa a gerar lucro (com os impostos pagos ao governo,
pelos donos das escolas particulares).
B. por uma escolha, sucateia as instituições públicas de ensino fica e politicamente, como também, para
esse segundo quesito, sucateia as instituições particulares.

C. compromete o futuro de uma nação como um todo, pois, sem pensar, qual nação pode avançar
verdadeiramente?
D. Todas as alternativas presentes estão corretas

REFERÊNCIA
ANTUNES, Ricardo - Os sentidos do trabalho. 6ª edição, São Paulo: Boitempo Editorial, 1999.
BORÓN, Atílio A. Os novos Leviatãs e a pólis democrática in: A coruja de Minerva: Mercado contra
democracia no capitalismo contemporâneo – CLACSO, Editora Vozes, Petrópolis, 2001.

APPLE, Michael W. – O que os pós-modernistas esquecem: capital cultural e conhecimento oficial in: SILVA,
T. T. da e GENTILI, Pablo A. A. (orgs.) Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação. 13ª edição, Petrópolis:

Vozes, 2010.

FONSECA, Marília – O Banco Mundial e a Educação: reflexões sobre o caso brasileiro in: GENTILI, Pablo
(org.) – Pedagogia da Exclusão: crítica ao neoliberalismo em educação. Petrópolis: Vozes, 1995

KEYNES, John Maynard. Keynes, Coleção Grandes Cientistas Sociais. São Paulo: Ática, 1978.

MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. O Manifesto do Partido Comunista., São Paulo: Global, 9ª ed., 2000
SILVA, Tomaz Tadeu da . A "nova" direita e as transformações na pedagogia da política e na política da

pedagogia in: SILVA, T. T. da e GENTILI, Pablo A. A. (orgs.) Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação. 13ª
edição, Petrópolis: Vozes, 2010.

TORRES, Carlos Alberto. Estado, Privatização e Política Educacional: elementos para uma crítica ao

neoliberalismo in: GENTILI, Pablo (org.) – Pedagogia da Exclusão: crítica ao neoliberalismo em educação.
Petrópolis: Vozes, 1995.
____________________. Estado, privatização e política educacional: elementos para uma crítica do

neoliberalismo in: GENTILI, Pablo (org). Pedagogia da exclusão: critica ao neoliberalismo em educação.
Petrópolis: Vozes, 10ª ed., 2002

WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. 4ª edição, Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979.
Marxismo e Educação
APRESENTAR CONTRIBUIÇÃO DO MARXISMO PARA O DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO E SUA

RELAÇÃO COM A SOCIEDADE.

A perspectiva marxista de análise da sociedade em muito contribui para que a educação possa ser

visualizada como um elemento que leve o homem a perceber-se dentre tantas relações sociais. Por meio

desta visão de mundo, a educação não forma o indivíduo apenas para a reprodução social, mas para

emancipa-lo e propor outro modelo de sociedade.

Karl Marx e Engels formularam no século XIX uma série de interpretações históricas, filosóficas,

sociológicas e econômicas sobre as sociedades. Ambos se pautaram na luta de classes para estudar as

relações entre os indivíduos ao longo dos séculos. Acreditava-se que um conjunto de elementos levava as

estruturas sociais a se transformarem de acordo com as necessidades criadas pelos homens. Disto, resultava

uma linha de constantes mudanças socioeconômicas dando origem a outra base de sustentação estrutural.

Seria por isto que Marx e Engels apontaram para uma linha de superação histórica. Sociedades primitivas,

feudalismo, capitalismo, socialismo e comunismo eram as etapas a que chegariam os homens em coletivo.

Há a identificação de um elemento comum em quase todo o desenvolvimento histórico, a luta de classes.

Este foi o motor que levou homens a se diferenciarem socialmente e a construírem mundos conflituosos. No

capitalismo, fase mais desenvolvida da economia industrial, estava as principais contradições entre

possuidores dos meios de produção e trabalhadores (que vendiam sua força de trabalho).

O contraste criado pela relação direta entre os proprietários dos meios de produção e os

produtores diretos revela a estrutura de todo edifício social, ou seja, a classe social passa

a ser entendida como a posição ocupada na estrutura a partir da apropriação privada dos

meios de produção.

CARVALHO E SILVA, 2006, P. 45

Assim, a visão de mundo ficava associada à posição ocupada por cada um no processo produtivo.

Para os marxistas, o fim da exclusão social e da exploração humana só ocorreria quando houvesse a

emancipação do homem desta situação. É então que uma nova sociedade seria erguida pelos trabalhadores,

o socialismo como fase intermediária para que se chegasse ao comunismo onde o homem já não

necessitaria da organização do Estado para regular a vida coletiva.


É nesta transição entre estes dois momentos que haveria uma mudança qualitativa na concepção do

homem. Ele procuraria reconhecer-se a si mesmo e ao mundo ao qual estava inserido. De tal forma uma

relação de essência e aparência entraria em jogo. A aparência construída pelo capitalismo numa relações de

exploração e conflito deixaria de existir, portanto, a tarefa imprescindível era a transformação do mundo e

não apenas refletir sobre ele. (MARX, 1987).

É neste processo que a educação tem papel importante a desempenhar. É por meio dela que a sociedade em

seu conjunto realizaria mudanças de concepções de valores, de filosofia e de aspectos sociais. Marx afirmava

que o próprio educador precisaria ser educado. Neste caso o educador era o próprio homem, independente

de estar dentro dos estabelecimentos de ensino. Isto porque a visão marxista de educação pensa um modelo

educacional no qual aprendemos constantemente em nosso cotidiano, nas experiências vividas.

A escola cumpre um papel fundamental de trazer conhecimentos sistematizados sobre diferentes partes

que constituem a vida social. No entanto, complementação tão importante quanto ela a ligação que se tem

com o mundo ao seu redor. Somente assim estariam articulados o conhecimento de si e o conhecimento

para si e, por consequência, a práxis não mais alienada, mas sim clara e objetiva (MARX, 1987).

Para entender qual educação, Marx começa pensando sobre o que não se quer como escola. Uma vez crítico

da sociedade capitalista não concebia para o povo ser educado aos moldes da escola burguesa. Ele

sustentava que a escola era um espaço de conhecimento e de consciência sobre as coisas. Portanto, a

maioria, os trabalhadores, não poderia continuar educada por uma ideologia burguesa que escondia os
conflitos sociais e potencialidade revolucionária do povo.

Marx não escreveu um livro específico sobre o que pensava sobre a educação para o trabalhador. Suas
reflexões estão dispersas em suas inúmeras obras, em especial no livro O Capital. No geral defende o ensino

público e universal marcado com fortes aspectos da luta de classes. O conhecimento a ser produzido pela
escola não poderia ser fragmentado em ensino de qualidade para os burgueses e uma escola fraca e

reafirmadora da divisão de classes para os trabalhadores.


Maria Alice Nogueira afirma que a crítica se voltaria sempre à burguesia que se limitava a encobrir as

lacunas educacionais existentes. A reprodução, marca principal da educação burguesa, era um dos alvos a
serem combatidos.

Em seu lugar Marx propõe uma outra concepção de educação. Esta, voltada para a maioria trabalhadora,
harmonizaria o trabalho intelectual e o trabalho manual. Ou seja, todos seriam capazes de ocupar os mais

diversos espaços produtivos desde as funções mais simples até as mais complexas do processo produtivo.
Por meio disto o homem seria um todo complexo e completo, sem ser apenas embrutecido pelo trabalho

manual nem apenas intelectualizado e distante da realidade da maioria.


E a escola, qual estrutura requeria para alcançar o que Marx defendia? Nela o aluno, de acordo com sua

faixa etária, teria um tempo para o conhecimento intelectual com o saber sistematizado vindo com as
disciplinas do currículo e outro espaço do dia para alguma atividade manual politécnica. Mas Marx ao

entender o homem como um todo pensava também educação física para que o homem conseguisse
disposição para as várias tarefas do dia-a-dia. Introduziu a educação física como outro tripé que comporia a

escola.
De acordo com Nogueira (... ) a divisão do tempo para as duas etapas formativas e o trato do corpo levariam

a um maior raciocínio e dinamismo dos indivíduos.


Mas, como dito no início desta aula, a educação não se resume ao espaço oficial escolar. É no tempo livre
que a reflexão e o entendimento do mundo se faria. O contato com leituras, artes, viagens, ciência e tudo o

mais que a vida oferecia era elemento intelectual para se reconhecer e reconhecer ao outro.
Conclui-se que a educação marxista não supõe oposição entre saber e trabalho mas sim uma interlocução

de forma a formar um homem pleno de suas capacidades e ações políticas e sociais.

ATIVIDADE FINAL

A partir da leitura da aula é possível concluir que a educação marxista


tem como característica a seguinte concepção:

A. A educação marxista é complexa levando em consideração o trabalho manual e o intelectual.

B. A educação burguesa é aquela que entende e compreende as necessidades da sociedade


trabalhadora.

C. A escola é o espaço privilegiado para a formação intelectual dos trabalhadores.


D. Ideologia é um conjunto de ideias e valores pensados por todos e construídos por todos.

REFERÊNCIA
MARX, K. Manuscritos econômicos-filosóficos e outros textos escolhidos. SP: Nova Cultural, 1987.
NOGUEIRA, Maria Alice. Educação, saber e produção em Marx.

CARVALHO E SILVA. Sociologia e Educação. Campinas: Avercamp, 2006.


A escola
ESTA AULA TEM COMO OBJETIVO DISCUTIR DE QUE MODO A EDUCAÇÃO E A CULTURA SÃO CAPAZES DE

MODIFICAR A SOCIEDADE. NESSE SENTIDO, IREMOS DEMONSTRAR A IMPORTÂNCIA DOS ESTUDOS DO

CIENTISTA POLITICO ITALIANO ANTONIO GRAMSCI.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Karl Marx acreditava no potencial da classe trabalhadora para a transformação da sociedade capitalista em

uma sociedade mais justa. Seu ponto de partida era a tomada de consciência de classe, que romperia com a

ideologia dominante e com as relações de opressão e dominação estabelecidas pelos capitalistas num

processo denominado luta de classes.

No entanto, é Antonio Gramsci quem vai analisar como essa tomada de consciência de classe pode se

configurar e possibilitar a transformação da sociedade.

Antonio Gramsci (1891-1937) foi um cientista italiano e inimigo do regime fascista de Benito Mussolini.

Como um dos fundadores do Partido Comunista Italiano em 1921, foi preso em 1926 quando era o principal

dirigente e sua pena suspensa somente em 1937 seguida de sua morte. A maior parte de sua obra foi escrita

no cárcere, de onde origina o nome dos seus escritos mais importantes: Cadernos do Cárcere. Gramsci é

responsável pela elaboração de importantes conceitos, tais como cidadania e hegemonia.

Na sociedade capitalista Gramsci enxerga a escola e o partido como responsáveis pela aquisição de

consciência crítica por parte da maioria, os proletários e os camponeses. Sua análise recai sobre o processo

de reforma educacional empreendido na Itália, no entanto, tal análise assemelha-se à história brasileira.

Encontramos aqui transformações “pelo alto”, a incorporação das demandas populares e ao mesmo tempo a

dos grupos dominantes pela mão do Estado. Também semelhante ao Estado italiano, tivemos um
capitalismo tardio que somado às demais transformações operadas pelo Estado, podemos nomear o Estado

brasileiro como uma revolução passiva, claramente no Estado Novo e no Golpe de 1964.

É na grandiosa obra Cadernos do Cárcere que o autor vai analisar o papel da cultura e da educação como

conhecimentos necessários para a transformação da sociedade a partir da concepção de consciência e luta

de classe.

Gramsci afirma que a luta do proletariado acontece em três frentes econômica, política e ideológica. Cada

uma dessas frentes guarda suas especificidades. A econômica ocorre por força mesmo das condições em que

se encontram os trabalhadores e, de certa forma, é espontânea e, não necessariamente, revolucionária. A

política, entendida como acesso às decisões políticas e limitação do Estado burguês, acompanha a frente

econômica e a espontaneidade também não é suficiente, pois essa esfera implica em consciência. E a

consciência para Gramsci, assim como para Marx, é determinada ideologicamente pela classe dominante.
Assim, a pergunta que se coloca é: como propiciar essa tomada de consciência de classe, tão importante à

teoria de Marx e ao processo de transformação da sociedade? E por que não se consolida?

A distancia entre o saber, o sentir e o compreender é parte da discussão que o autor faz sobre a relação

entre os intelectuais e a educação. O elemento popular “sente”, mas nem sempre compreende ou sabe; o

elemento intelectual “sabe”, mas nem sempre compreende e, menos ainda, “sente”. (GRAMSCI apud
COUTINHO, 2011)

Mas, quem são os intelectuais de uma sociedade? Cada grupo que se forma a partir de uma função essencial

do mundo da produção econômica terá uma parte constituída por aqueles que dominam a técnica, na

indústria, na economia, etc.

O empresário já possui uma elaboração social superior, já caracterizada por uma certa capacidade

dirigente e técnica (isto é, intelectual).(GRAMSCI, 2011:203) O empresário deve possuir além da técnica
referente à área de sua atividade, deve ampliar seus conhecimentos para a área de produção econômica –

como comercializar seu produto, como dirigir os trabalhadores, etc. Deve ainda possuir uma capacidade de

organizar a sociedade, inclusive no organismo estatal com o intuito de propiciar um terreno apto para seu

crescimento. Se não ele, um corpo de funcionários que o faça, têm-se nos dois casos o que o autor chama de

intelectual “orgânico”.

No entanto, a massa camponesa não cria nenhum intelectual “orgânico” nem assimilam algum de outra

classe, ao contrário dessa, ou dessas que, muitas das vezes extraem dos camponeses seus intelectuais.
Cada grupo ‘essencial’ que se forma a partir de uma estrutura econômica dada e como consequência dessa

dispõe de um grupo de intelectuais preexistentes, o exemplo mais ilustrativo é o grupo de eclesiásticos. Tal
grupo teve o domínio por séculos da ideologia religiosa, da filosofia e ciência, da escola, da moral, da

justiça, etc. A igreja dividia a propriedade da terra com os senhores feudais, desse modo, pode-se associá-la
à aristocracia feudal como sua intelectualidade “orgânica”.

Como dito anteriormente, os escritos de Gramsci sobre a educação ocorreram como reação a reforma feita
pelo ministério da educação do governo fascista. Tal reforma propôs duas escolas: uma escola “completa”

para as classes altas e uma escola para a formação profissional, aos pobres, filhos de trabalhadores.

A tendência atual é a de abolir qualquer tipo de escola “desinteressada”(não

imediatamente interessada) e “formativa”, ou de conservar apenas um seu reduzido


exemplar, destinado a uma pequena elite de senhores e de mulheres que não devem

pensar em preparar-se para um futuro profissional, bem como a de difundir cada vez mais
as escolas profissionais especializadas, nas quais o destino do aluno e sua futura

atividade são predeterminados. (Op. Cit.: 213)

O pensador italiano reagiu propondo uma escola única, que fosse capaz de formar culturalmente e
humanisticamente todas as crianças. O autor entende que a escola deva formar intelectualmente e

manualmente, colocando as crianças em contato com a historia humana e com a história das “coisas”, sob
o controle do professor. (Op. Cit.:231)
A escola unitária, ou de cultura geral, deve ter como atribuições inserir os jovens na atividade social, após a
aquisição de uma certa autonomia e maturidade intelectual que possibilitem o pensar e o fazer. Isso deve

ser feito tendo o Estado como responsável pela formação em termos de custos.
Tal escola deve ser contra as concepções tradicionais e ser dividida em fases. A última fase é, então, a mais

interessante, pois compreende estudo e aprendizado dos métodos criativos na ciência e na vida(...). Tais
conhecimentos são monopólio da universidade ou apreendido ao longo da vida de forma ocasional e isso

deve ser incorporado à escola.

O advento da escola unitária significa o início de novas relações entre trabalho intelectual
e trabalho industrial não apenas na escola, mas em toda a vida social. O princípio

unitário, por isso, irá se refletir em todos os organismos de cultura, transformando-os e


emprestando-lhes um novo conteúdo.(...) Num novo contexto de relações entre vida e

cultura, entre trabalho intelectual e trabalho industrial, as academias deveriam se tornar


a organização cultural (...) daqueles elementos que, após a escola unitária, passarão para

o trabalho profissional, bem como um terreno de encontro entre esses e os universitários


(Op. Cit.: 219)

O legado gramsciano refere a educação como ponto de partida para a tomada de consciência de classe de
que tanto Marx tratou.

ATIVIDADE FINAL

Leia as afirmações e marque a alternativa que apresente as afirmações

corretas:

I - Antonio Gramsci e Karl Marx se diferenciam quando tratam do


processo de tomada de consciência de classe.

II - Karl Marx e Antonio Gramsci tem visões antagônicas sobre o modo

como funciona a sociedade capitalista.


III - Para Gramsci, é pela educação e cultura que o proletariado terá

consciência de classe social.

A. I e II
B. I e III

C. II e III
D. I, II e III
REFERÊNCIA
COUTINHO, Carlos Nelson (Org.) O leitor de Gramsci. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011.

GRAMSCI, Antonio – Cadernos do Cárcere. Volume 2: Os intelectuais. O princípio educativo. Jornalismo.


Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011.
O professor
ESTA AULA VISA ASSIMILAR ALGUNS DOS CONTEÚDOS ESTUDADOS NO SENTIDO DE PROPICIAR

OUTRAS ORIENTAÇÕES SOBRE A FORMAÇÃO DO DOCENTE PARA A TRANSFORMAÇÃO DA REALIDADE

SOCIAL.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

Alguns dos importantes teóricos que vimos apresentaram a escola como a instituição social que melhor

impõe a padronização dos comportamentos. Émile Durkheim é determinante quando trata da força que a

escola tem na padronização dos comportamentos dos indivíduos. E, nesse sentido, nossa atual escola

parece-se muito com a escola analisada por Durkheim. No entanto, o autor não estudou as ideologias, e sim

os fatos sociais.

Para outros, que analisaram o processo ideológico, a escola reproduz a ideologia dominante e a

consequente reprodução da desigualdade social. Compartilham dessa verdade Louis Althusser e Pierre

Bourdieu. Essa verdade fica mais nítida quando analisamos as políticas neoliberais e sua relação com as

políticas educacionais.

Entretanto, temos um paradoxo, a mesma instituição que propicia a reprodução da ideologia dominante, é

a que pode transformar a realidade social. E isso só acontecerá com uma educação que prime por uma

metodologia, cujo objetivo seja a transformação social, com métodos que se aproximem da cultura dos

alunos. Estamos falando dos alunos das camadas populares, posto que Bourdieu já nos demonstrou que a

cultura escolar é aquela familiar à das classes dominantes, logo, precisamos de uma metodologia e de

métodos e de conteúdos que se aproximem do objeto, qual seja, o aluno. Inserir no currículo escolar o

capital cultural do aluno é o primeiro passo para a transformação da realidade.


A LDB e os PCNs deixam claro que as escolas devem adaptar o currículo as características culturais e

regionais. E por que isso não acontece regularmente?

Já apontamos em aulas anteriores que a própria LDB bem como o currículo mesmo de Sociologia tende a

privilegiar uma visão liberal sobre o papel da educação.

O autor afirma que os professores de primeiro e segundo graus parecem ter muito preconceito com o capital

cultural dos alunos pobres. Além disso, parecem crer em capacidades herdadas geneticamente que

propiciariam bom ou mau desempenho escolar.

Dito isso, só podemos afirmar que existe ainda uma grande barreira para alcançarmos alguma mudança pela

via educacional. Portanto, é através da formação de professores que devemos pensar a mudança social.

Quando tratamos no início do curso das questões étnico-culturais e das questões de gênero, salientamos a

importância do professor ter domínio de um tipo de conhecimento que não permita a naturalização das

relações sociais, que atribuem a opressão e a dominação a características naturais.


Associar currículo a controle e poder, porém, não significa julgar que, no currículo em

uso, os propósitos de dominação sejam mecanicamente aceitos por alunos e professores.

(...).

O segundo ponto (...) é a necessidade de considerarmos a cultura de origem e a

experiência de vida do aluno como pontos de partida de uma prática pedagógica voltada

para os interesses dos setores populares. (MOREIRA, 2008:38)

MOREIRA (Op. Cit.) aponta-nos alguns caminhos para a mudança social. Um deles é pensar a questão do

etnocentrismo. Como BOURDIEU (2011) já havia apontado, em A Reprodução, a cultura escolar funciona

como um arbitrário cultural. Assim, a cultura escolar apresenta-se como a cultura correta, a cultura

melhor, opondo-se à cultura popular, a cultura inferior.

A consciência da pluralidade cultural e o confronto constante do pensamento com os

variados universos que se renovam ao longo da história podem ajudar o futuro professor a

superar preconceitos, a acreditar na capacidade de aprender do aluno e a considerar com


mais seriedade as condições de vida, crenças, esperanças, anseios, experiências e lutas

das camadas subalternas. (MOREIRA, 2008:39)

Além disso, considerar que o língua culta seja a única forma de expressão permitida, é também uma postura

etnocêntrica, e a crença dos professores de que não podemos nos expressar de diferentes formas nos

diferentes espaços de socialização que todos partilhamos.


Uma outra questão fundamental é instrumentalizar o professor e o aluno, para que sejam capazes de

perceber a ideologia presente na escola e na sociedade. Seja no texto do material didático, seja na fala do
governo, nos discursos midiáticos, etc. Perceber a ideologia por trás dos diversos discursos significa

perceber a que interesses ela serve e como as práticas sociais são por ela influenciada e/ou determinadas.
Por último, o autor trata da questão que dá nome à essa aula, é preciso pensar o professor como um

intelectual transformador. Isso significa levá-los a pensar sua prática social e pensar o porque de não
observarmos mudanças mais significativas.

Considerar os professores como intelectuais exige também que se analise com clareza por
que determinados preconceitos e predisposições vêm persistindo ao longo dos tempos.

Exige situar historicamente esses preconceitos e predisposições na rede de relações,


hierarquias, posições sociais e conflitos da sociedade mais ampla e compreendê-los a

partir de especificidades de classe social, faixa etária, gênero e raça. (Op. Cit.: 45)
A formação do professor que possibilite discutir e compreender as questões propostas, possibilitará a
formação de alunos conscientes das relações de opressão e dominação presentes na sociedade, com

consciência para questionar e propor mudanças.

ATIVIDADE FINAL

Ser um professor intelectual refere-se a:


I - sua formação em nível de graduação, pós-graduação e pesquisa,

possibilitando o entendimento do grupo a sua volta.

II - a prática e conhecimentos teóricos que possibilitam enxergar a

ideologia presente nos materiais didáticos, por exemplo.


III - um constante exercício de repensar sua prática, com o intuito de

formar crianças e jovens capazes de se impor sobre a ideologia

dominante.

Marque a alternativa que apresenta as afirmações corretas.

A. I e III
B. I e II

C. II e III
D. I, II e III

REFERÊNCIA
BOURDIEU, Pierre e PASSERON, Jean-Claude. A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de
ensino. Petropólis: Vozes, 2011.

MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa – A formação de professores e o aluno das camadas populares: subsídios
para debate. in: Alves, Nilda (Org.) – Formação de Professores: Pensar e Fazer. São Paulo: Cortez Editora,

10ª edição, 2008.


Florestan Fernandes e Darcy Ribeiro
ESTE TÓPICO TEM COMO OBJETIVO APRESENTAR BREVEMENTE AS CONTRIBUIÇÃO À EDUCAÇÃO

BRASILEIRA FEITAS PELO SOCIÓLOGO FLORESTAN FERNANDES E PELO ANTROPÓLOGO DARCY

RIBEIRO.

AUTOR(A): PROF. RENE ESTEBAN ROJO

A atual educação brasileira é organizada pela Lei de Diretrizes e Bases, que foi promulgada em 1996 sob os

auspícios da redemocratização e das políticas neoliberais. Dentre os principais cientistas sociais que

ajudaram a pensar a educação de nosso país, não só neste período histórico, destacam-se o sociólogo

Florestan Fernandes (1920-1995) e o antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997).

Além de serem contemporâneos, guardam outras similaridades. Ambos são considerados intérpretes do

Brasil, ao lado de Sérgio Buarque de Holanda, Antônio Cândido, Aziz Ab’Saber, Caio Prado Junior, Celso

Furtado, Gilberto Freyre, Milton Santos entre outros. O grupo é assim nomeado pelo esforço intelectual em

compreender a identidade nacional, buscando as influências históricas, econômicas, políticas e culturais

que propiciaram, mantiveram e transformaram nossa identidade.

Florestan Fernandes e Darcy Ribeiro foram, para além de intelectuais, militantes políticos e políticos

profissionais ligados ao processo de redemocratização e em defesa da educação brasileira.

Florestan Fernandes e a ‘segunda natureza’

Florestan Fernandes, socialista, tem uma trajetória ímpar na intelectualidade brasileira. Nasceu em família
pobre, filho de mãe solteira e empregada doméstica. O contato com uma família rica, os patrões de sua mãe,

na forma de um capital social, despertou-o para os estudos, propiciando a aquisição de um capital cultural
que o levou às Ciências Sociais, tornando-se um dos mais importantes sociólogos do Brasil e da América

Latina.

É o responsável pela consolidação da disciplina acadêmica em nosso país, tendo preocupado-se e estudado

largamente as questões do método e da teoria sociológicas. Entretanto, desde muito cedo no ofício de

sociólogo, Fernandes foi defensor da escola pública e do ensino de Sociologia no Ensino Médio.

Para o autor, a educação foi a mediação que propiciou o surgimento de uma “segunda natureza”, já que a

primeira é biológica. Essa segunda natureza se faz no sentido de pensar a realidade a partir dos “dilemas

de nossa época”, dos “problemas dos outros”, como a essência da educação:

Dessa maneira SAVIANI faz uso do conceito habitus de Bourdieu, no sentido desses elementos serem

incorporados à prática social. E explica a ideia de uma segunda natureza, posta por FERNANDES, porque é

socialmente adquirida pela prática educativa, ao passo que a primeira, é herdada geneticamente.
um processo que visa à transformação interna dos sujeitos pela incorporação de

elementos que não são dados naturalmente e nem adquiridos espontaneamente mas que,

uma vez incorporados pela mediação da ação educativa, passam a operar como se fossem

naturais. (SAVIANI, 1996)

Para FERNANDES, a sala de aula constituiu-se como o laboratório de que dispõe as ciências naturais, e que

possibilita a análise, as inferências e as mudanças no percurso da investigação científica. Neste caso, a sala

de aula possibilitou a aquisição dos saberes didático-pedagógico-científicos.

Como o pesquisador, o professor precisa reduzir o conhecimento acumulado previamente

ao que é essencial e, mais que o pesquisador, deve defrontar-se com o dever de expor tal

conhecimento de modo claro, conciso e elegante (...). Ao atingir esse patamar, o ensino

perdeu, para mim, o caráter de um 'fardo' e a relação com os estudantes passou a ser

altamente provocativa e estimulante para o meu progresso teórico como sociólogo"

(FERNANDES, 1975:176 apud SAVIANI, 1996)

Além disso, Florestan Fernandes, compreendia que as Ciências Sociais devessem ser incluídas desde o

secundário, antigo Ensino Médio, uma vez que

seria a condição natural para a formação de atitudes capazes de orientar o


comportamento humano no sentido de aumentar a eficiência e a harmonia de atividades

baseadas em uma compreensão racional das relações entre os meios e os fins, em


qualquer setor da vida social. (FLORESTAN, 1980: 106)

Darcy Ribeiro e o processo legislativo

Darcy Ribeiro (1922-1997) notabilizou-se na área de Ciências Sociais como antropólogo que debruçou-se
sobre a identidade nacional brasileira. Seus estudos tratam das populações indígenas, das sociedades

industriais e da educação. Sua trajetória política, assim como a de Florestan Fernandes está ligada aos
processos histórico-políticos pelos quais o país passou.

Diferente do amigo Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro ocupou diversos cargos burocrático-administrativos
no Estado. Em 1947 ingressou no então Serviço de Proteção ao Índio ? SPI que, anos mais tarde, em 1967,

transformou-se na Fundação Nacional do Índio ? FUNAI. Nos anos seguintes tomou contato com diversas
populações indígenas que originaram muitos estudos etnológicos.

Em 1955 o antropólogo foi convidado a colaborar com a elaboração da nova lei de diretrizes e bases,
estando lado a lado com Florestan Fernandes e, em 1959, designado a planejar a criação da Universidade de

Brasília ? UnB. Em 1962 Darcy Ribeiro foi nomeado Ministro da Educação e esteve à frente do cargo até o
retorno da forma de Estado Brasileiro.
Com o golpe de 1964, Darcy Ribeiro foi exilado e só retornou ao Brasil em 1979, com o processo de anistia.

Filia-se ao Partido Democrático Trabalhista ? PDT e assume como vice-governador do Rio de Janeiro em
1982. Nesse período ocupa também a Secretaria de Ciência e Cultura, onde desenvolveu e implantou um

grande projeto educacional. Os CIEPs ? Centro Integrado de Educação Pública, foram pensados para
atender às crianças de forma integral, tanto no que se refere ao tempo de permanência na escola, quanto à

formação.
Foi eleito para o Senado, em 1990 e esteve a frente do processo de elaboração da Lei de Diretrizes e Bases

de 1996, como relator do processo.


A LDB e os antagonismos

No ano de 1959 começa a Campanha em Defesa da Escola Pública, organizada em razão da aprovação da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação, defendendo a educação em suas relações recíprocas com a sociedade o

que significa que o processo educativo deve ser dirigido não apenas à adaptação mas à transformação
social. (Op. Cit.)
A proposta defendida pelo grupo denominado liberais-idealistas foi aprovada, e FLORESTAN posicionara-
se opostamente à esse grupo, cuja visão de educação atribui ao homem a prerrogativa, ou a essência da

liberdade, da autonomia e da originalidade. Dessa forma, a Lei nº4.024 de 20 dezembro de 1961, se descola
de uma educação pensada historicamente e socialmente.

Limitamo-nos a defender idéias e princípios que deixaram de ser matéria de discussão

política nos países adiantados. Tudo se passa como se o Brasil retrocedesse quase dois
séculos, em relação à história contemporânea daqueles países, e como se fôssemos

forçados a defender, com unhas e dentes, os valores da Revolução Francesa! E uma


situação que seria cômica, não fossem as conseqüências graves, que dela poderão advir. A

nossa posição pessoal pesa-nos como incômoda. Apesar de socialista, somos forçados a
fazer a apologia de medidas que nada têm a ver com o socialismo e que são, sob certos

aspectos, retrógradas. (Fernandes, 1966:427 apud SAVIANI, 1996)

A militância de Florestan Fernandes intensifica-se quando é eleito, em 1986 pelo Partido dos

Trabalhadores - PT, para a Assembléia Constituinte, que redigiu a Constituição promulgada em 1988.
Por ocasião da discussão do projeto que originou a lei nº 9.394/96, Darcy Ribeiro e Florestan Fernandes
entraram em conflito por defenderem pontos de vista diferentes. O conflito tornou-se público e, em artigo

veiculado na grande mídia e 1995, Florestan afirma que:

Darcy Ribeiro preferiu optar pelos caminhos batidos das nossas tradições parlamentares,

entregando-se a uma concepção cerebrina e elitista do processo de elaboração legislativa,


segundo a qual os que "sabem" e "devem cuidar" das leis, com exclusividade, são os
políticos consagrados pelo sufrágio eleitoral. Aqueles que possuem vivência pedagógica
das escolas não teriam um lugar próprio para participar da atividade produtiva do

legislador. Faltar-lhes-ia "competência" para tanto.


Essa circularidade do pensamento enfeixa, no tope, as decisões capitais sobre a
continuidade e a inovação do ensino. Oliveira Viana já demonstrou o quanto esse
"idealismo legal" dissocia a lei da realidade. A lei, formalmente perfeita, mas

substancialmente vazia. No caso da educação, impunham-se consultas variadas e


profundas aos agentes educacionais, fundindo-se na mesma peça, o "legal" e o
"pedagógico". Enfim, separou-se a mudança educacional do poder inibidor dos que
"sabem" e "mandam", conforme seu arbítrio e interesses extrapedagógicos. (FLORESTAN,

1995 apud LOBO NETO, 2010)

A crítica de Florestan refere-se à proposta de democratização da gestão escolar, tão custosamente


defendida por ele e, a arbitrariedade da lei, como se dela emanasse o saber incontestável. Além disso, o

autor critica Darcy Ribeiro pela maneira como conduziu os trabalhos de relatoria, impondo um projeto
paralelo ao que estava sendo discutido há 4 anos (de 1988 a 1992).
Quanto à Darcy Ribeiro, este responde ao artigo de Florestan Fernandes, de forma irônica:

Como voz do PT e da CUT na Câmara dos Deputados, Florestan nos surpreende por sua
paciência para ouvir tantos imbecis falando de educação e com seu inesperado
populismo. Não é que nosso eminente sociólogo decide deixar a educação brasileira aos
cuidados de quem a pratica, como os donos de escola, professores, alunos e funcionários?

Seu Conselho Federal corporativista seria uma ação entre amigos, na qual nenhum
educador teria voz. Florestan não se inquieta com o milhão de alunos do proletariado
estudantil, que pagam caro para estudar, quase sempre à noite, em escolas péssimas,
montadas para fazer lucros empresariais, enganando-os. Abandona-os à sua sorte.

(RIBEIRO, 1995 apud LOBO NETO, 2010)

Essa última parte foi a mais contundente e ofensiva crítica à Florestan, principalmente se lembrarmos que

o autor nasceu muito pobre e que frequentou a escola noturna depois do expediente como garçom.
Ironizar a capacidade de a comunidade escolar e/ou universitária de organizar e administrar a educação é o
exercício contumaz que as atuais políticas educacionais tem feito, principalmente sob o viés neoliberal.
Não que Darcy Ribeiro estivesse, pretensamente, defendendo tais ideais mas, na atualidade, a

despolitização da educação pública é uma constante nos discursos públicos e privados sobre educação.
Diversos estudos apontam para a necessidade de uma gestão democrática da educação e, infelizmente,
permanecemos no ponto em que as decisões são unilaterais
O capítulo III, Art. 205, define que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa,
seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Esse preparo para o exercício da cidadania deve ser respaldado por, entre outros itens: igualdade de

condições, liberdade de aprender e pesquisar; pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas,


valorização dos profissionais do ensino, com plano de carreira e ingresso exclusivamente por concurso
público, gestão democrática do ensino público e, garantia de padrão de qualidade.
Quando relacionamos esses princípios às atuais políticas neoliberais que incidem sobre a educação,

percebemos claramente, que a maior parte deles não foi efetivada. As condições não são as mesmas para
todos os brasileiros, não só na educação como em nenhum outro direito social. Não há pluralismo de ideias,
e estamos muito distantes de uma gestão democrática, uma vez que o neoliberalismo, inclusive, tem o
poder de despolitizar a educação. E, a qualidade assinalada na Constituição de 1988, não se coaduna com o

discurso de qualidade propagada pela atual política educacional, que tem a qualidade como propriedade
assim, somente quem pode pagar, tem uma educação de qualidade. No entanto, no que se refere à
qualificação para o trabalho, encontramos correspondência com as políticas neoliberais: a escola pública
prepara para o trabalho desqualificado, a privada para o trabalho em cargos médios e os cargos superiores.

Entretanto, entendemos que o educador, ou seja, aquele cuja existência é mediada pelo entendimento do
“problema dos outros”, pela consciência de uma “segunda natureza”, poderá plenamente exercer seu papel
de transformador da sociedade, na busca por igualdade e justiça social, empoderando, seus alunos para uma
prática cidadã. Empoderamento como tradução livre do inglês empowerment, sentido de propiciar

elementos que permitam, coletivamente, a participação nos processos decisórios que constituem uma
sociedade. Esse empoderamento deve, obrigatoriamente, começar na escola.

ATIVIDADE FINAL

Acerca da discussão que esse tópico traz, é correto afirmar:

A. Para Florestan Fernandes, a sala de aula funciona como um laboratório, onde podemos reproduzir as
condições existentes na sociedade.
B. A LDB/96 sofreu as interferências das políticas neoliberais que foram implementadas aqui no começo
dos anos 90.

C. Florestan Fernandes e Darcy Ribeiro tinham formações muito parecidas, com grande influência das
teorias marxistas.

REFERÊNCIA
Darcy Ribeiro: http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/biografias/darcy_ribeiro
(http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/biografias/darcy_ribeiro)
FERNANDES, Florestan ¿ A sociologia no Brasil: contribuição para o estudo de sua formação e

desenvolvimento. 2ª edição, Petrópolis: Vozes, 1980.


LOBO NETO, Francisco José da Silveira ¿ Há quinze anos, sobre a LDB: dois intelectuais em duas posições.
Revista Trabalho Necessário, ano 8, nº 11, 2010. Disponível em:
http://www.uff.br/trabalhonecessario/images/TN11%20F.J.S.%20LOBO%20NETO.pdf

(http://www.uff.br/trabalhonecessario/images/TN11%20F.J.S.%20LOBO%20NETO.pdf ) Acesso em
22/11/2013.
SAVIANI, Dermeval. Florestan Fernandes e a educação. Estud. av., São Paulo , v. 10, n. 26, abr. 1996 .
Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-

40141996000100013&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 24 nov. 2013. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-


40141996000100013.

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