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Sócrates e o nascimento da antropologia

Quem foi Sócrates?


•Para Nietzsche não era Aristóteles, mas Sócrates, a autêntica
personificação da petrificação intelectualista da filosofia.
•Os pensadores do mundo arcaico formavam o quadro da época
trágica dos gregos. Nessa época estavam equilibradas as forças
do apolíneo e do dionisíaco que Nietzsche empenhava-se por
unificar.
•Ao conceder a primazia ao elemento apolíneo-racional, Sócrates
destruiu a tensão entre esse elemento e o dionisíaco irracional,
quebrando a harmonia.
•Com isso o que ele fez foi moralizar, intelectualizar a concepção
trágica do mundo. Mas seria esse o verdadeiro Sócrates?
 
Concepção aristotélica
• Aristóteles: há duas coisas que com justiça devem ser
atribuídas a Sócrates: a determinação dos conceitos
universais e o método indutivo de investigação.
• Sócrates deve ser considerado o fundador da filosofia
conceptual e moral. Fugindo da natureza para se limitar ao
campo moral, tentou fundamentar uma sabedoria da vida
orientada para o aspecto prático.
• Mas, o Sócrates que essa teoria nos apresenta parece ser
uma mediocridade e sua filosofia dos conceitos uma
banalidade. Os ataques de Nietzsche se voltam contra esse
pedante homem dos conceitos.
Platão e Xenofonte
• Xenofonte – “Memoráveis” – Sócrates foi um cidadão
do Estado Ateniense altamente patriótico, piedoso e
justo que tributava seus sacrifícios aos deuses,
consultava os adivinhos, cumpria ponto por ponto
seus deveres de cidadão.
• Nos diálogos de Platão, Sócrates aparece como o
filósofo que expõe a teoria das idéias.
• Nos conceitos gerais aprendidos de Sócrates, Platão
via o verdadeiro ser, arrancado ao mundo do eterno
fluir.
Sócrates: libertador do homem
• A peculiar grandeza de Sócrates não se pode medir
pela pauta de um pensador teórico.
• Devemos encará-lo como o criador de uma atitude
humana que define o apogeu de uma longa e
laboriosa trajetória de libertação moral do homem
por si próprio.
• Sócrates proclama o domínio do evangelho do homem
sobre si próprio e da “autarquia” da personalidade
moral. Isto faz dele a contrafigura ocidental de Cristo e
da religião oriental da redenção.
Sócrates educador
• A figura de Sócrates torna-se o eixo da história da
formação do homem grego. Para Jaeger, ele é o mais
espantoso fenômeno pedagógico da história do
ocidente.
• Não é apenas o defensor da teoria das idéias. É
numa dimensão inteiramente distinta que se
desdobra a importância dessa figura. Não vem
continuar nenhuma tradição científica. É o homem
do momento num sentido elementar.
• Seu ponto de partida é a natureza humana.
Ciência socrática: antropologia
• Sócrates adota um ponto de vista antropológico ao estudar
a natureza: são o homem e a estrutura do corpo humano o
ponto de partida de suas conclusões.
• Com efeito, a ciência da natureza na época de Sócrates não
inclui apenas a Cosmologia e a Meteorologia, mas também
a medicina.
• Tal como a medicina do seu tempo, é na natureza do
homem, a parte do mundo que melhor conhecemos, que
ele descobre a base firme para sua análise da realidade
• Cícero: Sócrates desce do céu a filosofia e instala-a nas
cidades e na morada dos homens.
Ideal do saber: Indução (técne)
• O que os antigos fisiólogos denominavam conhecimento
era aos olhos de Sócrates uma grandiosa fantasmagoria.
Como observa Aristóteles, ele procede de modo indutivo.
• O seu método tem algo da sobriedade do método empírico
dos médicos. O seu ideal do saber é a técne, tal qual a
medicina a encarna, até na subordinação do saber a um
fim prático.
• Sócrates é um autêntico médico, a ponto de não se
preocupar menos com a saúde física dos seus amigos do
que com o seu bem estar espiritual. Mas é o médico do
homem interior.
Dialética socrática
• Praticava a sua filosofia nos ginásios e nos
banquetes. Surgiu assim uma ginástica do
pensamento (dialética), que logo teve tantos
partidários e admiradores como a do corpo.
• A dialética socrática era uma planta indígena
peculiar, a antítese mais completa do método
educativo dos sofistas. Os sofistas são mestres
ambulantes vindos de fora. Citar p.523.
• Sócrates , de modo contrário, é um cidadão simples,
a quem todos conhecem.
Exortação e indagação
• Segundo Platão, duas são as formas fundamentais
que resumem o modo socrático peculiar: a
exortação (propreptikos) e a indagação (elenchos).
Citar, Platão, p. 526.
• A filosofia professada por ele não é um simples
processo teórico de pensamento: é ao mesmo
tempo uma exortação e uma educação. A serviço
desses objetivos estão ainda o exame e a refutação
socrática de todo saber aparente e de toda
excelência (Arete) imaginária. 
Cuidado com a alma
• O homem deve cuidar dos bens mais importantes. Sócrates
exige que em lugar de se preocupar com os ganhos, o homem
se preocupe com a alma.
• Para o homem de hoje isto não tem nada de surpreendente,
antes constitui uma coisa banal. Mas este postulado não era
tão evidente para os gregos daquele tempo como é para nós,
herdeiros de uma tradição de dois mil anos de cristianismo.
• Necessidade de cuidar da alma. Sócrates fala como um médico,
cujo paciente fosse não o homem físico, mas o homem interior.
Sócrates define o cuidado da alma como um cuidado através do
conhecimento do valor e da verdade, phronesis e aletheia.
Significado da alma em Sócrates
• Mas que é a alma ou a psyche? Coloquemos essa
questão num sentido filológico.
• O sentido que Sócrates dá a essa palavra não pode ser
explicada nem a partir do eidolon épico de Homero, a
sombra do Hades, nem a alma-sopro da filosofia
jônica, nem o dáimon-alma dos órficos, nem a psyché
da tragédia antiga.
• O movimento órfico, por exemplo, separa a alma do
corpo e admite que ela habita no cárcere do corpo
para depois da morte regressar a uma pátria divina.
Significado da alma em Sócrates
• No entanto, segundo, Werner Jaeger, o conceito socrático
de alma está desprovido de todos esses traços
escatológicos ou demonológicos.
• Foi Platão quem os entreteceu no seu adorno mítico da
alma e do destino. A teoria da imortalidade do Fédon e até
a teoria da preexistência no Mênon tem origem
claramente platônica.
• A posição socrática em face do problema da preexistência
da alma aparece certamente bem definida na Apologia,
onde em presença da morte, não se diz qual será a sorte
desta.
Alma não separada do corpo
• Em Sócrates não deparamos com qualquer afirmação
referente à realidade da alma: esta não é uma substância,
como é para Platão. Sócrates não se decide se ela é ou não
é separável do corpo.
• Servir a alma é como servir a Deus, não por que ela é um
espírito de remotas regiões celestiais, mas por que ela é
espírito pensante e razão moral.
• Não há, portanto, traços cristãos no conceito socrático de
alma. A alma de que Sócrates fala só pode ser
compreendida, com acerto, se é concebida em conjunto
com o corpo.
Alma e corpo: simetria das partes
• Alma e corpo são dois aspectos distintos da
natureza humana. No pensamento de Sócrates
o psíquico não se opõe ao físico.
• Ponderação, justiça e piedade são excelências
da alma no mesmo sentido em que a saúde, a
força e a beleza são virtudes do corpo.
• A virtude física e a virtude espiritual não são
mais do que a simetria das partes em que corpo
e alma se assentam.
Alma: autodomínio
• A nota nova trazida por Sócrates é a de que não é
através da expansão e satisfação da sua natureza
física, que o homem pode alcançar essa harmonia
com o ser, mas sim pelo domínio completo sobre si
próprio.
• O eudemonismo grego de Sócrates deriva desta
entrega do homem à alma, entrega que o conduz à
auto-afirmação em face da crescente ameaça que a
natureza exterior e o destino fazem pesar sobre a
sua liberdade.

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