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1. Introdução
ainda, por atos de seus habitantes reputados como ilícitos internacionais. Também
há responsabilidade internacional por atos que não são necessariamente ilícitos, mas
que causam danos e, por isso, devem ser reparados.
As principais teorias sobre os requisitos exigidos para a existência da respon-
sabilidade são:
a) a teoria da responsabilidade subjetiva ou por culpa: é admitida não apenas
quando o ato (ação ou omissão) imputado ao Estado é contrário ao Direito
Internacional, como se exige do Estado a culpa;
b) a teoria da responsabilidade objetiva, denominada sem culpa ou por risco,
ainda que o ato imputável ao Estado seja contrário ao Direito Internacional.
Para alguns autores existiria, ainda, um terceiro elemento: o dano, já que con-
sideram que sem este não haveria lesão para reparar e, por conseguinte, tampouco
responsabilidade. Esclareça-se, outrossim, que esse dano não significa sempre que
seja de ordem material, podendo, não raro, manifestar-se como uma ofensa moral ao
um Estado, a seus súditos ou patrimônio histórico e cultural.
A responsabilidade civil, conforme anota Varella (2009, p.366), “não exige pre-
visão específica em tratado”. Além disso, prossegue o autor:
O número de situações que podem ensejar a responsabilidade é bem su-
perior à quantidade de práticas consideradas ilícitas pelo direito interna-
cional. Isso, não há listas de atos proibidos, mas apenas normas genéricas,
que se referem aos danos. Caso assim fosse, os Estados cujos nacionais
praticam atos potencialmente danosos ou com a intenção de lesar outros
poderiam simplesmente não se engajar perante os tratados sobre a maté-
ria e escapar de uma eventual indenização, em caso de danos.
Portanto, no caso dos danos causados por objetos espaciais, o Estado será ob-
jetivamente responsabilizado pelos danos causados, mesmo que o lançamento tenha
sido promovido por pessoas jurídicas de direito privado.
O Convênio Sobre a Responsabilidade Internacional por Danos Causados por
Objetos Espaciais, de 29 de março de 1972, afirma em seu artigo 2º que “um estado
lançador será responsável absoluto pelo pagamento de indenização por danos causa-
dos por seus objetos espaciais na superfície da Terra ou a aeronaves em vôo”.
A mesma norma internacional prevê, ainda, a responsabilidade solidária quan-
do afirma, em seu Artigo 4º, § 2º que:
[...] se não for possível estabelecer o grau de culpa de cada um desses es-
tados, o ônus da indenização deve ser dividido em proporções iguais entre
os dois. Tal divisão se fará sem prejuízo do direito que assiste ao terceiro
Estado de procurar a indenização total devida nos termos desta Convenção
de qualquer ou de todos os Estados lançadores que são, solidária e indivi-
dualmente responsáveis.
1
Efetivamente tem seu início em 4 de outubro de 1957, com o lançamento do primeiro satélite artifi-
cial para fora da atmosfera terrestre, feito esse realizado pela ex- União Soviética. A década seguinte
foi extremamente rica em atividades e experiências no espaço, gerando diversos tratados internacio-
nais sobre o tema.
2. Responsabilidade
Manifestação
Os atos que ensejam a responsabilidade internacional do Estado podem ser pratica-
dos por qualquer um dos seus três poderes, de qualquer nível federativo (se for o caso), e,
também, por atos de seus particulares bem como por uma Organização Internacional.
O Poder Executivo é, sem sombra de dúvidas, o mais produtor de atos que ense-
jam a responsabilidade internacional dos Estados, uma vez que a esse Poder compete
a representação externa do Estado. Assim, são comuns os danos provocados por atos
do pessoal diplomático ou militar quando em missões externas ao seu território.
Quanto ao Poder Legislativo, deve-se ter em conta que a esse Poder corresponde
a função típica de fazer leis; e é nessa atividade que ele pode editar norma contrária ao
Direito Internacional, ou, ainda, deixar de revogar ou alterar norma interna diante de
previsão convencional internacional posterior sentido contrário. Se dessa omissão de-
correr um dano imputável ao Estado, poderá haver a responsabilidade internacional.
Um exemplo dos mais sintomáticos sobre responsabilidade do Estado por omis-
são legislativa refere-se ao Caso Alabama.
Durante a guerra civil americana, conhecida com a Guerra de Secessão, movida
entre Estados do norte da federação americana (mais desenvolvidos e industrializa-
dos), contra os estados do sul, de economia essencialmente agrícola e que baseava
sua atividade exclusivamente na mão de obra escrava, o Reino Unido da Grã-Breta-
nha declarou-se neutra na contenda.
Ocorre, todavia, que no curso das atividades bélicas os estados sulistas, os con-
federados, encomendaram a diversos estaleiros britânicos várias belonaves e que
foram utilizadas indiscriminadamente no conflito americano. Dentre aqueles vasos
de guerra destacava-se o Alabama, tido como uma espécie de nau capitânea, com
alto poder de fogo.
Essa frota infringiu enormes danos às tropas federalistas (do norte) bombar-
deando vários paióis, fortificações e afundando diversos navios do norte, além de,
certamente, terem causado a morte de inúmeros combatentes federados.
Ora, essa frota devastadora foi adquirida ilegalmente do ponto de vista do di-
reito internacional uma vez que a Inglaterra ao declarar-se, unilateralmente como é
de praxe, neutra no conflito americano não poderia ter permitido a venda daquelas
embarcações bélicas por súditos britânicos.
Os EUA interpelaram politicamente a Inglaterra sobre a flagrante quebra da
neutralidade britânica, pois o governo não coibiu aos seus súditos as negociações
que culminaram na venda e entrega efetiva daqueles navios o que foi, como é óbvio,
prontamente rebatido pela coroa inglesa.
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A exiguidade do texto não nos permite analisar em profundidade este tópico. Para tanto, remetemos
o leitor para a lição de Riccardo Monaco, La responsabilità internazionale dello Stato per fatti di
individui, In Rivista di Diritto Internazionale, anno XXXI, série III - vol. XVIII (1939), fasc. I- II-III.
Roma: Società Editrice “Athenaeum”, 1939.
tidos pelo súdito para verificar se ele agiu em nome do Estado ou se agiu em caráter
privado e, mesmo assim, se houve dolo. Mesmo assim, só se poderá imputar ao Es-
tado o ato ilícito e danoso quando houver omissão, negligência ou imperícia desse
mesmo Estado na apuração dos fatos.
Suponhamos que um indivíduo – e aqui, nem é preciso que seja nacional do Es-
tado – pratique um ato lesivo a alguém ou a algum Estado, no plano internacional. Por
exemplo, atire no Papa que está em visita ao país e os motivos são de ordem particular.
Poderia esse país ser responsabilizado pelo atentado? A resposta deve ser: depende.
Em primeiro lugar, se logo após a infração o aparato estatal responder adequa-
damente e de acordo com sua legislação interna para a apuração dos fatos e da auto-
ria e mesmo assim, não seja possível determinar as circunstâncias do ato criminoso
e de sua autoria, não há que se falar em responsabilizar o Estado.
Por outro lado, se na condução do inquérito policial/judicial que se seguisse ao
atentado, as autoridades locais agissem com leviandade, com desprezo pelos pro-
cedimentos legais de apuração dos fatos, neglicenciando informações vitais para o
esclarecimento do ato lesivo, resultando na não apuração do autor do crime aí, então,
poderia o Estado ser responsabilizado internacionalmente. Todavia, não pelo atenta-
do mas, sim, pela inércia ou omissão de seu aparato legal repressivo.
Interesse neste ponto, anotar a lição de Epitácio Pessoa,3 em seu Projecto de Co-
digo de Direito Internacional Publico, quando prevê que a responsabilidade de um
Estado decorre de atos de seu governo, de seus representantes no estrangeiro e dos seus
funcionários no interior, de suas forças de terra ou mar, em território ou águas estran-
geiras, de particulares residentes no seu território e sujeitos à sua autoridade efetiva,
sempre que houver negligência do estado em impedir ou deixá-los impune. (art. 21).
Outro ponto interessante é a equiparação de estrangeiros aos nacionais para
pleitear a responsabilidade de um Estado (art. 22). Mesmo em caso de guerra civil
cabe aos forasteiros submetidos a uma jurisdição estatal tal pedido, sempre que o
ato lesivo for praticado contra este por ser estrangeiro ou por ser nacional de certo
Estado. (art. 23)
A reparação do ato lesivo será pelo restabelecimento ao status quo ante, ou pela
indenização nos casos de perda e danos; além disso, poderá se dar pela satisfação,
por explicações públicas ou desculpas por via diplomática. (art. 25)
3
Delegado do Brasil na Comissão de Jurisconsultos encarregada da codificação do Direito Internacio-
nal. Foi Presidente da República (1919-1922) e Juiz da Corte Permanente de Justiça Internacional de
Haia (1923-1930).
Mais adiante, informa o citado autor que houve uma vasta jurisprudência inter-
nacional en matéria de responsabilidad de los Estados, respecto a la protección de
los derechos de los particulares extranjeros.
E aí está o problema que afligia a doutrina e a prática internacional: as repara-
ções destinavam-se apenas aos estrangeiros. A pergunta que não calava era quanto
aos nacionais em seu próprio Estado: caberia a eles alguma forma de proteção aos
seus direitos lesados exatamente pelo Estado que deveria protegê-los?
Importante assinalar que na busca de um sistema internacional efetivo de prote-
ção aos direitos humanos se encontra o reconhecimento por parte dos Estados de que
as normas e obrigações assumidas por eles com o advento da Carta da ONU são de
caráter geral atingindo mesmo os estados que não fazem parte do sistema onusiano.
Na continuidade da lição de Braga (2002:141-142) um terceiro elemento fun-
damental para o surgimento da proteção internacional dos direitos humanos repousa
por aquela – reveste-se de um caráter supranacional, visto que ao decidir com defi-
nitividade, formando, inclusive, coisa julgada, sobrepõe-se efetivamente às próprias
Constituições nacionais. (Jayme, 2005, p.66).
Neste sentido a CIADH reconhece em suas sentenças o caráter supranormativo
da Convenção:
em relação ao ordenamento jurídico interno, inclusive em relação a
normas constitucionais, porquanto o Direito Internacional dos Direitos
Humanos não reconhece hieraquia das normas internas, de modo que,
mesmo a norma constitucionaol violadora de direitos humanos deve ser
afastada para dar lugar à norma internacional de proteção dos direitos
humanos. (Fernando G. Jayme, 2005, p. 67)
É a CADH que em seu artigo 63, § 1º, reafirma a submissão do Estado à sua
responsabilidade internacional ao prelecionar que:
Há, portanto, responsabilidade por risco no caso de poluição dos mares por
vazamento de petróleo.
No mesmo sentido, várias convenções internacionais adotaram o regime da
responsabilidade por risco, dentre as quais, a Convenção sobre Responsabilidade
Civil por Danos Nucleares (Viena, 1963); a Convenção sobre a Responsabilidade
Civil no Estabelecimento de um Fundo Internacional para Compensações por Da-
nos de Poluição de Óleo (Bruxelas, 1971); a Convenção sobre a Responsabilidade
internacional por Danos Causados por Objetos Espaciais (Londres, Moscou e Wa-
shington, 1972); a Convenção sobre a Responsabilidade Civil por Dano decorrente
de Poluição de Óleo, resultante de Exploração e Explotação de Recursos Minerais
do Subsolo Marinho (Londres, 1977).
É imperioso sublinhar que algumas Convenções prevêem a responsabilidade
objetiva. Assim, por exemplo, a Convenção de Bamako, Relativa à Interdição da
Importação de Rejeitos Perigosos para a África e ao Controle da Movimentação
Transfronteiriça e a Gestão desses Rejeitos na África (Bamako, 1991), no seu art.
4º., alínea 3, letra “b”: “impõe a responsabilidade objetiva e ilimitada, assim como a
responsabilidade conjunta e solidária aos produtores de rejeitos perigosos”.
No mesmo sentido, tanto a Convenção sobre a Responsabilidade Civil no Cam-
po da Energia Nuclear (Paris, 1960, art. 3º), celebrada pelos países membros do Or-
ganismo Europeu para a Energia Nuclear, como a Convenção sobre a Responsabili-
dade Civil no Campo da Energia Nuclear (Viena, 1963, art. 4º), concluída no âmbito
da Agência Internacional de Energia Atômica (AEIA), imputam a responsabilidade
automaticamente ao país explorador daquela tecnologia. Da mesma forma, a Con-
venção Internacional sobre a Intervenção em Alto Mar em Caso de Acidente que
Provoque ou Possa Provocar uma Poluição por Hidrocarbonetos (Bruxelas, 1969,
art. 3º), concluída no âmbito da Organização Marítima Internacional (IMO), imputa
a responsabilidade ao proprietário do navio e a Convenção sobre Diversidade Bioló-
gica (Rio de Janeiro, 1992, art. 14, alínea 2), patrocinada pela ONU, prevê que:
A Conferência das Partes deverá examinar, com base em estudos que
se levarão à cabo, a questão da responsabilização e reparação, incluin-
do a recuperação e a compensação por danos causados à diversidade
biológica, salvo quando esta responsabilidade seja uma questão pura-
mente interna.
Tendo em vista que o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo de-
corrente da poluição, as autoridades nacionais devem procurar promover
a internalizarão dos custos ambientais e uso de instrumentos econômicos,
levando na devida conta o interesse público, sem distorcer o comércio e os
investimentos internacionais.
Conclusão
Referências
Recebido: 22/9/10
Aprovado: 6/12/10