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DISCIPLINA: Teoria Geral do Processo.

PROFESSOR: Daniel Amorim Assumpção Neves.


MATÉRIA: Teoria Geral do Processo.

Indicações bibliográficas:
• Manuais: “Manual de Processo Civil Vol. Único”, Daniel Amorim Assumpção Neves;
“Processo Civil”, Humberto Theodoro Jr.; “Curso de Processo Civil”, Fredie Didier; “O Novo
Processo Civil Brasileiro Vol. Único”, Alexandre Câmara; “Processo Civil Vol. Único”,
Cássio Scarpinella Bueno;
• Códigos Comentados: “Código Processual Civil Comentado”, Daniel Amorim Assumpção
Neves; Marinoni.

Leis e artigos importantes:


• Novo Código Processual Civil de 2015.

Palavras-chave:
• Jurisdição;

TEMA: JURISDIÇÃO E EQUIVALENTES JURISDICIONAIS

PROFESSOR: DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES

TEORIA GERAL DO PROCESSO


Existem 3 institutos processuais que fazem a base da Teoria Geral do Processo: Jurisdição,
Ação e Processo.

JURISDIÇÃO

CONCEITO
Tradicionalmente a jurisdição é conceituada com fundamento em 4 elementos.

ATUAÇÃO ESTATAL

Matéria: Teoria Geral do Processo – Prof: Daniel Assumpção


O Primeiro elemento do conceito de jurisdição é a ideia da atuação estatal. Ou seja, ela é
uma das várias formas de atuação estatal. Nesse caso específico, a atuação estatal se dá por meio
do processo. A atividade jurisdicional é justamente o exercício da jurisdição no processo no caso
concreto, exercida pelo agente estatal investido na jurisdição, que é o juiz.

Ao falar que a jurisdição é uma função estatal, pode surgir um questionamento a respeito da
arbitragem. Cada vez mais e mais doutrinadores defendem a ideia de que a arbitragem também
tem natureza estatal – e é óbvio que ela é atividade privada. Então, não causa surpresa ouvirmos
a expressão “jurisdição privada”. Para aquele que têm esse entendimento, o processo seria
considerado jurisdição estatal.

APLICAÇÃO DO DIREITO OBJETIVO AO CASO CONCRETO


E essa atuação estatal que se desenvolve pelo processo se presta a qual finalidade? Surge
o segundo elemento: a aplicação do direito objetivo ao caso concreto. Por meio desta, nós temos a
solução da chamada lide jurídica. Ou seja, tenho uma crise jurídica, que decorre de uma violação
ao direito e a partir do momento que o juiz aplica o direito ao caso concreto ela acaba com essa
lide. Isso é o chamado escopo jurídico da jurisdição.

Além do escopo jurídico, a jurisdição tem um escopo social, político e educacional.

E percebemos haver uma mutação no entendimento do escopo jurídico da jurisdição. Porque


se pensarmos em uma concepção clássica, como Chiovenda, a sua ideia básica era de que aplicar
o direito ao caso concreto era atuar a vontade concreta da lei. Carnelutti entendia que isso seria
tornar a norma geral na norma específica para resolver o caso concreto. Então, aplicar o direito se
limitava a aplicar a lei. Afinal, essas concepções tradicionais são baseadas em um positivismo
acrítico, que hoje não se sustenta mais. Esse entendimento era fundado em uma ideia de
supremacia da lei que hoje não consegue mais ser sustentado.

A atual concepção do escopo jurídico da jurisdição vem do Marinoni. Basicamente, a ideia é


que dizer o direito é a criação no caso concreto da chamada norma jurídica. A norma jurídica é a
norma legal (não há ruptura completa com o positivismo, para não cair em juízo de equidade),
porém é uma norma legal inspirada pelos direitos fundamentais e pelos princípios constitucionais.
Ou seja, não é a simples aplicação da norma legal; esta norma legal atende aos direitos
fundamentais e aos princípios constitucionais. E essa é uma preocupação que vem sendo já
trabalhada em outras áreas do Direito, até pelo fenômeno da constitucionalização do direito.

SOLUÇÃO DA CRISE JURÍDICA COM DEFINITIVIDADE


O terceiro elemento do conceito de jurisdição é a solução de crise jurídica com definitividade.
Essa tarefa de solucionar as crises jurídicas não é exclusiva da jurisdição. E isso, porque além da
jurisdição eu tenho outras formas de solução de crise jurídica. São os equivalentes jurisdicionais –
algo que cumpre a mesma tarefa, o mesmo resultado, mas não é jurisdição.

Essa definitividade é uma das características da jurisdição. Ela vem de um fenômeno


chamado de coisa julgada material, que é o que torna imutável e indiscutível a solução da crise
jurídica.

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Esse fenômeno jurídico de coisa julgada material é exclusivo da jurisdição. Isso justifica a
não definitividade perante o judiciário das soluções administrativas de solução do conflito.

PACIFICAÇÃO SOCIAL
Essa solução da crise jurídica com definitividade leva-nos a 4º elemento: a pacificação social. Esta
nada mais é que o escopo social da jurisdição.

A pacificação social como exercício da jurisdição é o apaziguamento dos ânimos entre os sujeitos
envolvidos. Em um processo que se tenha vencedor e vencido, é uma utopia imaginar que todos
saiam satisfeitos.

Então, como se consegue a pacificação social? Deve-se tornar a parte vencedora satisfeita
e que a parte vencida esteja conformada com o resultado. Se for oferecido para as partes um
processo com ampla participação, célere, barato e que demonstre ter chegado a uma solução justa
– esses são os ingredientes para buscar que a parte vencedora saia satisfeita e que a parte vencida
saia conformada. É claro que na realidade a jurisdição não consegue resolver a lide social, apenas
a lide jurídica.

EQUIVALENTES JURISDICIONAIS (FORMAS DE SOLUÇÃO DO CONFLITO NÃO


JURISDICIONAIS)
Já havíamos mencionado anteriormente sobre tal tema. Tais equivalentes são algo que cumprem
a mesma tarefa, o mesmo resultado; mas não é jurisdição. Ou seja, trabalharemos aqui de formas
de solução do conflito não jurisdicionais.

A questão da nomenclatura vem enfrentando divergência. “Equivalentes jurisdicionais” casa


bem com outro termo: formas alternativas de solução do conflito; é sinônimo.

Porém, há ainda quem chame essas formas de solução de conflito de meios adequados à
solução do conflito. O problema é que se a gente diz que esses são os meios adequados,
automaticamente estamos dizendo que a jurisdição seria um meio inadequado. O ideal seria dizer
que os meios adequados são todos os meios – até porque a adequação vem do caso concreto, não
pode dizer previamente antes.

AUTOTUTELA
É a primeira forma conhecida de solução do conflito. Ela é baseada em dois elementos: sacrifício
integral do interesse (ou seja, trabalharemos com um sacrifício integral do interesse do vencido) e
o exercício da força (que será exercido pela parte vitoriosa – essa força do vencedor que acaba
com o conflito).

Essa autotutela é compatível com o Estado Democrático de Direito? Afinal, pode nos fazer lembrar
dos tempos anteriores à própria formação da sociedade. Para ser admitida essa estranheza no
sistema, nós trabalhamos com duas realidades quando se fala em autotutela;

A primeira é que a autotutela é excepcional e depende de previsão expressa em lei.

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Há ainda uma segunda característica dessa autotutela que nos diferencia daquela pré-histórica: as
consequências e adequação da solução do conflito são jurisdicionalizáveis, ou seja, são passíveis
de análise jurisdicional.

AUTOCOMPOSIÇÃO (CONCILIAÇÃO)
Aqui temos dois elementos: sacrifício integral ou parcial de interesses e a vontade das partes. É
uma das espécies de forma consensual do conflito, porque deriva da vontade das partes.

Essa autocomposição é tradicionalmente dividida em 3 espécies: a renúncia, a submissão e a


transação.

Na renúncia e na submissão nós trabalharemos com um sacrifício integral do interesse e com


a ideia de vontade unilateral. Ou seja, a vontade é exercida apenas por uma parte; a parte que
exerce a vontade tem o seu interesse sacrificado.

O ser humano, por natureza, é altruísta. Os atos de altruísmo são exceções. Por isso que a
autocomposição se apresenta com mais frequência na ideia de transação: sacrifícios recíprocos em
vontade bilateral. EXEMPLO: Acho que me deve 10 e ele acha que não deve nada. Concordamos
em receber apenas 5.

O CPC/15 chama a transação de conciliação.

Autocomposição com Efeito Jurisdicional.


Devemos fazer uma observação: a autocomposição pode perfeitamente ocorrer durante um
processo. Ou seja, ela busca evitar o processo, mas nada impede que se concilie durante o
processo.

No dia que essa sentença homologatória transitar em julgado, ela irá produzir a coisa julgada
material. Conforme nós vimos anteriormente, a coisa julgada material é um fenômeno exclusivo da
jurisdição. Nesse caso in comento, a solução do conflito se deu pela autocomposição. O que
acontece nesse caso?

Não há dúvida de que nessa hipótese o conflito não foi resolvido por jurisdição, já que não foi o juiz
que resolveu o conflito, e sim as partes. Não por outra razão, essa sentença de mérito é chamada
de sentença de mérito impura/falsa, nas lições de Dinamarco, porque ela é uma estranha no ninho.

Então, nós temos uma autocomposição com efeito jurisdicional. É apenas um efeito reflexo da
autocomposição, pois não é esta que transita em julgado, mas sim a decisão do juiz homologatória.
É um conteúdo de autocomposição (está dentro da solução do conflito) com efeito de jurisdição
(que se projeta para fora).

MEDIAÇÃO
A mediação é uma solução de conflitos que deriva da vontade das partes.

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Mediação e Autocomposição são espécies de formas consensuais de solução do conflito.
Quando o art. 3º, §2º, do CPC/15 diz que o Estado sempre que possível buscará a forma consensual
de solução do conflito, se refere à mediação e autocomposição.

Qual a distinção entre ambas? Por que uma difere da outra? Porque na mediação não há sacrifício
de interesses. Tem partes em conflito e nenhuma delas tem seu conflito sacrificado. É a melhor
forma de solução de conflitos, pois não é impositiva e não gera conflitos. O foco da mediação não
é o conflito, mas sim as causas do conflito. Não se trabalha o conflito em si, mas as causas do
conflito.

O CPC/15 tem o art. 3º, §2º, diz que o Estado, sempre que possível, promoverá a solução
consensual. Ou seja, não só o judiciário, mas o Estado. O §3º cria uma ideia de que todos que
participam do processo devem estimular a solução consensual. O que efetivamente muda no
CPC/15? É criada uma sessão inteira, do art. 165 ao 175, para disciplinar os conciliadores e
mediadores judiciais.

O código sempre trata a conciliação e mediação juntas. O próprio mediador já reconhece que a
conciliação é diferente da mediação no art. 165. Assim, apesar de tratar sempre juntas, quando
sente necessidade de expressar diferença procedimental, o faz.

Na sessão no art. 165/175 há a diferença na atuação do conciliador e do mediador. Na


conciliação, o conciliador faz propostas para solução do conflito. A tarefa do mediador, por outro
lado, não é essa; ele vai buscar esclarecer as questões envolvidas no conflito, para que as próprias
partes resolvam esse conflito.

Quem será mediador e conciliador judicial?


Precisamos saber quem pode se tornar mediador e conciliador judicial. Isso significa ser um
intermediário entre as partes na audiência do art. 334 do NCPC. Essa audiência de mediação e
conciliação será feita pelo mediador judicial, e não pelo juiz. A ideia do legislador é os Tribunais
criarem centros de solução consensual do conflito.

Entram para atuar nesses centros sujeitos aprovados em cursos de capacitação (com pelo
menos o parâmetro curricular do CNJ) ou aprovado em concurso público. Também é possível que
o Tribunal faça convênio com empresa privada de conciliação e mediação.

O art. 168, §1º, diz que as partes podem escolher o mediador e o conciliador, não precisando
ele qualquer vínculo com entidade privada. É a vontade soberana das partes.

A OAB queria que só advogados pudessem ser conciliadores ou mediadores; mas não
conseguiu. Não precisa ser advogado, mas pode ser. E se o advogado resolver se tornar mediador
e conciliador judicial, surgem dois impedimentos de atuação da advocacia. O primeiro é o do art.
167, §5º - o advogado fica impedido de atuar como advogado no juízo em que ele exerce as funções
consensuais. Isso é para evitar que o advogado tire vantagem da sua posição. O segundo é o art.
172 – o advogado fica 1 ano impedido de advogar para aquelas partes em qualquer outro conflito.
Isso evita a captação de clientela ilegítima do advogado.

Princípios da Mediação e Conciliação (Art. 166 do CPC/15).

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O primeiro é o princípio da independência. Se pretende uma atuação de todos os envolvidos sem
pressões internas ou externas – seja uma pressão para o mediador tentar fazer um acordo de
qualquer jeito, e ele não pode se portar como um juiz perante as partes.

O segundo é o princípio da imparcialidade. Imparcialidade não significa inércia. Não se pode aceitar
um conciliador ou mediador inerte. Ele tem que aplicar as técnicas de conciliação e mediação no
caso concreto. Para ele não há nenhum benefício de qualquer natureza derivado da solução
daquele conflito. A imparcialidade é não ter interesse na solução – quer resolver, mas a solução
não gera qualquer vantagem ou desvantagem para ele.

O terceiro é o princípio da autonomia das vontades. Apenas terá a solução se ocorrer acordo de
vontades.

O quarto é o princípio da confidencialidade. Quando se faz uma mediação e conciliação, só consta


do termo o resultado favorável ou desfavorável. A ideia clássica é de que todo o debate, todas as
discussões, não fiquem registradas. Isso dá uma maior liberdade de exposição às partes, sem risco
de contaminar o julgador do processo. A exceção é: se tiver um acordo de vontade entre as partes,
pode ampliar o objeto do tema (ex.: faço questão de deixar consignado a oferta). Além disso, a lei
cria um impedimento do conciliador e mediador para testemunhar no processo.

O quinto é o princípio da oralidade. Não se documentam os passos da conciliação e mediação,


apenas o resultado.

O sexto é o princípio da informalidade. Não faz sentido criarem regras muito rígidas. O mediador e
conciliador que escolhe o procedimento no calor do momento.

O sétimo é o princípio da decisão informada. O mediador e o conciliador devem manter as partes


informadas quanto aos seus direitos e ao contexto fático ao que estão envolvidas. Devem alimentar
as partes de informações, para que elas tomem decisão com a compreensão plena do que está em
conflito.

O oitavo é o princípio da normalização do conflito. É a solução da lide sociológica, ou seja, o


apaziguamento dos ânimos.

ARBITRAGEM
A arbitragem é uma forma de solução de conflitos que decorre de uma decisão impositiva de
terceiros. Esse é o primeiro elemento. Ou seja, a força das partes é irrelevante (o que a distingue
da autotutela), a vontade das partes na solução do conflito é irrelevante (o que a distingue da
mediação e conciliação); e quando diz que tem uma decisão impositiva de terceiro, significa que as
partes estarão vinculadas a essa decisão, gostando ou não. Nesse primeiro elemento a arbitragem
é parecida com a jurisdição.

Ela se distingue da jurisdição no segundo elemento: esse terceiro, árbitro, é escolhido pelas partes.
A influência das partes é na escolha de quem vai julgar, e não no julgamento.

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E aí percebemos o elemento fundamental da arbitragem: ela é essencialmente uma forma de
solução de conflitos fundada na confiança. Ou seja, as partes escolhem aquele terceiro para
solucionar o conflito porque confiam nele.

A arbitragem surge na história antes mesmo da jurisdição. Porque poder jurisdicional é o poder do
Estado interver na vida das pessoas para solucionar conflitos. Para isso precisava de um Estado
forte. E por isso muitas sociedades usava a arbitragem.

A Arbitragem e o Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição.


Houve algumas críticas, dizendo que a arbitragem feria o princípio da inafastabilidade da jurisdição.
Porém, isso não ocorrer, pois o direito de ação é disponível. Ninguém pode obrigar a alguém que
entre com a ação. E se é possível dispor do direito de ação, a ponto de não resolver conflito, é
evidente que posso dispor do direito de ação para resolver pela arbitragem – quem pode o mais,
pode o menos.

E o art. 3º, caput, do CPC/15 repete o art. 5º, XXXV, da CF – que é o dispositivo constitucional da
inafastabilidade da jurisdição. Porém, no art. 3º, §1º, há a permissão da arbitragem nos termos da
lei. Ou seja, o próprio legislador entendeu que a arbitragem não fere tal princípio.

Arbitragem como Espécie de Jurisdição Privada.


Há doutrina, como Dinamarco, Carmona, Joel Dias Figueira, que entendem a arbitragem como
espécie de jurisdição privada. Porém, Marinone e Daniel Assumpção defendem que a arbitragem é
um equivalente jurisdicional, ou seja, não é jurisdição.

Para chegar a ideia de que estaríamos diante de jurisdição privada, essa doutrina se utiliza de dois
fundamentos na realidade da arbitragem que são premissas irrefutáveis.

Matéria: Teoria Geral do Processo – Prof: Daniel Assumpção

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