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Cadernos PDE
VOLUME I I
O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS
DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
Produção Didático-Pedagógica
2009
AIDÊ SONIA BOTTI DE SOUZA
UNIDADE DIDÁTICA
TAREFAS DE CASA
SIM OU NÃO?
LONDRINA
2010
AIDÊ SONIA BOTTI DE SOUZA
TAREFAS DE CASA
SIM OU NÃO?
LONDRINA
2010
SUMÁRIO
IDENTIFICAÇÃO..........................................................................................................4
1 INTRODUÇÃO..........................................................................................................5
CONCLUINDO.......................................................................................................... 18
REFERÊNCIAS ..…........................................................................…........................19
4
IDENTIFICAÇÃO
1 INTRODUÇÃO
Analise a figura: parece uma cena comum nas nossas casas. Uma família
ajudando seu filho na tarefa de casa. Uma coisa tão corriqueira, lógica e
considerada até necessária. Nesta imagem os pais parecem tranquilos e o filho feliz.
Mas muitas vezes, na realidade familiar a tarefa de casa é motivo de conflito entre
pais e filhos, entre família e escola.
Este texto apresenta reflexões teóricas e ao mesmo tempo busca discutir a
prática pedagógica da escola no uso da tarefa de casa. Será que é mesmo válido
seu uso, se muitos alunos, justamente aqueles que mais necessitam aprender, não
as fazem? Os professores geralmente desanimam ao solicitar tarefas de casa, pois
nem todos os alunos as realizam. Aí culpam a família, porque consideram que ela
deveria apoiar a escola nessa exigência. Essa e outras questões fazem parte da
reflexão sobre as perspectivas e os limites das tarefas de casa e se essas levam o
aluno a aprender melhor.
1
Professora Pedagoga da Rede Estadual de Ensino do Paraná. Graduada em
Pedagogia(UEL);especialista em Administração, Supervisão e Orientação Educacional (UNOPAR).
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Para iniciar nossa conversa, vamos ver o que se entende por tarefa de casa.
Apesar de seu uso corriqueiro, a tarefa de casa, praticada em todas as escolas,
como uma das formas de promoção do sucesso escolar, é um assunto pouco
debatido no meio escolar. A “tarefa de casa”, “dever de casa” ou “lição de casa” são
expressões usadas na escola e na família e indicam um dever que o aluno leva para
resolver em casa, fora do seu horário regular de aula. Vamos nos ater ao termo
tarefa de casa, por ser o mais usual nas nossas escolas.
Segundo o Dicionário Aurélio (1986), tarefa é o “trabalho que se deve concluir
em determinado prazo e, algumas vezes, por castigo”. Para Libâneo, apud Nogueira,
(2002, p. 23), “a tarefa de casa consiste nas tarefas de aprendizagem realizadas fora
do período escolar”. Portanto, é uma obrigação, um compromisso do aluno para com
a escola, com os professores, e deve ser feita em casa.
Algumas justificativas são apresentadas para o seu uso:
resolvê-las. Isso gera um descrédito para com as tarefas de casa. Essa incoerência,
desanima o aluno e/ou desperta sua criatividade nas formas de burlar o controle do
professor.
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Segundo Carvalho (2004), a tarefa de casa é uma prática cultural que faz
parte das relações família-escola e a divisão do trabalho entre estas duas
instituições. Confirma a autora que o seu uso está justificado como forma de
construir a independência, autonomia, hábitos de estudo e pontualidade do aluno. A
tarefa de casa é o trabalho escolar que foi transferido para a família e pode se tornar
uma estratégia da escola em sua própria defesa contra a cobrança da sua
responsabilidade e do Estado de oferecer a educação de qualidade.
Apropriando-se do conceito da violência simbólica2 de Bourdieu e Passeron,
Carvalho (2004) considera a tarefa de casa uma extensão da autoridade pedagógica
da escola às famílias, como forma de regulação da vida privada pela política pública,
através da instrução da família pela escola.
Em nossa sociedade, marcada pelas diferenças das classes sociais,
geralmente os professores, oriundos das classes médias, mais favorecidas,
possuem um determinado patrimônio cultural que é expresso em linguagem,
condutas e valores diferentes daquele patrimônio cultural dos alunos provenientes
das classes trabalhadoras. O que a escola faz é uma desvalorização desse
patrimônio trazido pelos alunos, fazendo-os aprender novos padrões e modelos de
cultura, novo jeito de pensar e agir, desconstruindo a sua identidade. Assim, de
acordo com Bourdieu e Passeron apud Carvalho 2004, a escola se torna um
instrumento de dominação que, em vez de ajudar a transformar a sociedade e
permitir a ascensão social do aluno, levando em consideração seus valores e
saberes, serve para manter e reproduzir as desigualdades da sociedade de classes.
A escola domina, não necessariamente pela força física, mas pela doutrinação, pois
força os alunos a pensarem que foram feitos para obedecerem e continuarem a
pertencer à classe operária, sujeitando-os mais facilmente às relações de poder e à
2
A teoria que se encontra no Livro A Reprodução - de P. Bourdieu e J.C; Passeron (1975) se refere
ao sistema educacional como instituição que permite a reprodução da cultura dominante. Este
sociólogo francês (1930-2002) acentua em seus estudos que nas sociedades de classes existem
diferenças culturais entre as classes burguesas e as trabalhadoras e que a escola despreza a
cultura popular fazendo prevalecer a cultura de um grupo superior economicamente ou
politicamente Isto é, segundo o autor uma “violência simbólica”, pois assim a escola serve para a
reprodução da cultura e a reprodução das classes sociais, pela doutrinação, fazendo as pessoas
pensarem e agirem conforme um código de condutas que as caracteriza como pertencentes às
classes inferiores.
9
Questionamento:
Como poderiam ser usadas as tarefas de casa no reforço da aprendizagem do
aluno, respeitando seu tempo e ritmo?
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lado, pais que se interessam “pelas explicações no campo pedagógico” que emitem
opiniões ou questionam são considerados “intrusos”. Assim a relação
pais/professores deixa de ser democrática: “O direito educativo de ingerência é,
portanto, dissimétrico: os pais se veem sendo aconselhados sobre a maneira de agir
com seus filhos, mas os professores não gostam que lhes digam o que devem fazer”
(LAHIRE, 1997, p. 338). Afirma ainda Lahire (1997) que mesmo as famílias
semianalfabetas, ou com “fraco” capital escolar, podem acompanhar a vida escolar
de seus filhos, escutando-os ou questionando-os, valorizando a sua experiência
escolar. Pais menos escolarizados que solicitam a ajuda dos filhos, por exemplo,
para ler a correspondência, preencher documentos, escrever bilhetes, procurar
telefones, acompanhar a escolaridade dos irmãos, valorizam a criança e dão
reconhecimento a ela na família.
Aprofundando a discussão, Carvalho (2006) ressalta que o apelo moral do
discurso do sucesso versus fracasso escolar, relacionado ao apoio ou negligência
dos pais ou mesmo de outro membro da família, não é razoável, pois coloca aos
pais exigências escolares e impõe-lhes um empenho, um trabalho. A política do
dever de casa causa efeitos perversos, pois pretende ensinar às famílias suas
obrigações básicas de organizarem o ambiente doméstico para dar continuidade à
aprendizagem e cria, ao mesmo tempo, oportunidade de culpar as famílias por suas
inadequações e de responsabilizá-las pelo fracasso escolar.
Sobrecarregar os pais com mais esta exigência de acompanhar seus filhos
nas tarefas diárias pode gerar um conflito entre pais e filhos, o que resulta em
péssimo resultado pedagógico: o aluno fica irritado e não aprende, pois essa hora se
torna um tormento e não uma oportunidade de aprendizagem a mais. O aluno cai no
desânimo. Nogueira (2002) ressalta ainda que não se pode descarregar os conflitos
de aprendizagem da sala de aula, para que a família os resolva.
Nesse sentido questionamos: Tarefas de casa são necessárias? Quais as
condições a escola oferece para que as famílias acompanhe a aprendizagem dos
filhos , par além das simples tarefa de casa? Que atitudes dos professores podem
favorecer a participação da família no acompanhamento da aprendizagem dos
filhos?
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Para responder a esta questão, Carvalho (2006) considera que faz parte da
política educacional o incentivo às famílias a uma maior participação na escola,
sobretudo no acompanhamento das tarefas de casa, como forma de melhorar o
sucesso escolar. Exemplos disso são reportagens como “Acompanhamento familiar
eleva nota dos alunos” (FOLHA ONLINE, 2004) e “O hábito de fazer a lição de casa
no rendimento do aluno” (BRASIL, 2003), uma análise dos resultados do SAEB
sobre o aproveitamento escolar.
Carvalho (2006) alega que, embora seja difícil se chegar à conclusão sobre o
resultado positivo de que a feitura da tarefa de casa possa ter sobre o desempenho
escolar dos alunos, é possível refletir sobre a qualidade do ensino, como são
trabalhados os conteúdos nas aulas e se são ou não articulados à tarefa de casa, e
faz algumas afirmações sobre as contradições em torno dessa problemática.
Professores apontam que a tarefa de casa é necessária para melhorar o
aproveitamento escolar, mas não existe um lugar para ela no planejamento
pedagógico. Usada rotineiramente como atividade de treino de habilidades e fixação,
envolve boa parte do tempo das aulas. Como recurso potencial poderia beneficiar
todos os alunos, mas não é enfocada na formação docente e não consta do
planejamento pedagógico, fazendo parte, assim, do currículo vivido e não do
currículo pensado e planejado. Além disso, a tarefa de casa tem impacto direto ou
indireto na avaliação do aluno, por isso ela pode se constituir num elemento que
favoreça os alunos provenientes de famílias com melhores condições econômicas,
culturais e sociais, contribuindo para a vantagem ou desvantagem no resultados do
aproveitamento. Assim se expressa Carvalho (2006) em relação à garantia da
eficácia do uso da tarefa de casa:
Comenta ainda Carvalho (2006) que a tarefa de casa contribui para integrar
um modelo curricular e pedagógico que pretende estender o tempo de
aprendizagem além da jornada escolar e ocupar o aluno em casa com tarefas de
aplicação e fixação, que são cobradas e avaliadas em aula de duas maneiras: ora
com a correção coletiva com fins pedagógicos (avaliação formativa); ora com a
correção individual, usando o visto no caderno com fins de controle (avaliação
somativa).
No atual contexto, pelas precárias condições de trabalho, com aumento do
número de horas aulas semanais e classes numerosas, o professor não tem tempo
para garantir a qualidade dessas tarefas, com o seu prévio planejamento e posterior
correção individual das mesmas, como se fazia tradicionalmente. Geralmente o
professor se limita a fazer o controle do retorno da tarefa, atribuindo para isso uma
nota ou conceito, e a correção é feita coletivamente na aula, oralmente ou no
quadro, enquanto o aluno acompanha como pode essa correção.
Se a tarefa de casa pode propiciar o enriquecimento curricular, existe uma
contradição a enfrentar, pois muitas vezes, a tarefa de casa não tem correlação com
o conteúdo trabalhado em sala, ou são atividades retiradas dos livros didáticos que
nada têm a ver com a realidade do aluno. Além disso, são uniformizadas, assim não
atendem aos diferentes níveis de aprendizagem dos alunos. Isto torna o ensino
compartimentado, um rito a ser cumprido, sem significado para a aprendizagem do
aluno, resultando em sua pouca eficácia.
Frente a todas essas contradições, por fazer parte de nossa cultura escolar,
perguntamo-nos: é possível ressaltar os aspectos positivos da tarefa de casa?
Segundo Rezende (2008), há quase unanimidade, na opinião de pais e
professores, de que a tarefa de casa é útil, havendo discordância apenas no que se
refere aos tipos de tarefa para casa mais utilizados. Defende ainda Rezende (2008)
que a questão maior a que esta discussão nos remete é como é desenvolvida a
tarefa de casa, enquanto currículo-ação nas escolas. Se são valorizadas pela
escola, enquanto situação de estudo, estimulantes e enriquecedoras, incluem a
orientação aos alunos e à família e devem constar em documentos da escola.
Para Carvalho (2006), a tarefa de casa tem potencial de se tornar significativa
para os alunos e efetiva para a aprendizagem se for sistemática e tiver lugar
privilegiado na sala de aula, sendo articulada com planejamento pedagógico e à
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prática cotidiana. Nas escolas onde ela é pouco considerada e mal articulada, não
pode trazer significativos resultados na melhoria da aprendizagem.
Como estratégia pedagógica tem múltiplas finalidades: estender o tempo de
aprendizagem, completar a quantidade de matéria a ser dada numa jornada escolar
insuficiente, conectar o trabalho de classe precedente e subsequente, treinar e
reforçar habilidades, estimular hábitos de estudo independente, aplicar os
conhecimentos acadêmicos à vida cotidiana, enriquecer o currículo ampliando as
experiências de aprendizagem, informar os pais sobre as atividades da escola e
conectar escola e família (CARVALHO apud CARVALHO, 2006 p.342)
Carvalho (2006) defende ainda que, tanto na visão tradicional do uso da
tarefa de casa para intensificar a aprendizagem, com atividades de revisão e fixação
dos conteúdos trabalhados em sala, como em atividades mais abertas de
enriquecimento e aproximação do conhecimento acadêmico com a realidade
cotidiana, como o uso de pesquisas, visitas, entrevistas e uso de mídias, ela pode
contribuir para a formação da autonomia e da responsabilidade do aluno através do
desenvolvimento do hábito de estudo.
Sendo assim, os conflitos que perpassam a tarefa de casa devem ser
discutidos pela escola e na escola junto com a família, já que pode ser uma
estratégia educativa para trabalhar sistematicamente o conhecimento, desde que se
constitua, para o aluno, uma forma crítica, efetiva e prazerosa de aprendizagem.
Numa visão positiva a tarefa de casa, poderia ser um dos momentos de
síntese do conteúdo trabalhado em sala, ou de sua complementação através de
uma pesquisa bem orientada pelo professor, de modo a deixar claro para o aluno a
validade e a necessidade daquela atividade para a sua aprendizagem, bem como
dar uma motivação a mais para o aluno fazer com prazer a construção do
conhecimento, que está sempre inacabado.
Para que a tarefa de casa caia no “gosto” dos alunos e se constitua num
momento de aprendizagem, ela deve ser um desafio para o aluno. E para isso, são
necessárias algumas condições, esclarece Nogueira:
A fim de que tenha gosto pelo estudo, ele precisa dominar os pré-requisitos
necessários, quer sejam conteúdos, quer sejam habilidades, para o bom
desempenho na realização da TC [ Tarefa de casa ]. Vencidos os obstáculos,
atingida a meta TC realizada com correção, o aluno tenderá a aceitar os
novos desafios. A satisfação do “dever” cumprido a contento favorecerá o
gosto, o prazer pelo estudo, pela busca de desafios atingíveis e por novos
17
Questionamento
Que mudanças são necessárias na prática dos professores para que a tarefa de
casa se torne de fato um instrumento de aprendizagem?
18
CONCLUINDO
REFERÊNCIAS
CARVALHO, Maria Eulalina Pessoa de. O dever de casa como política educacional
e objeto de pesquisa. Revista Lusófona de educação, v. 8, p. 85-102, 2006.
Disponível em: <www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/rle/n8/n8a06.pdf>. Acesso em: 11
mar. 2010.
CARVALHO, Maria Eulalina Pessoa de. Escola como extensão da família ou família
como extensão da escola? Revista Brasileira de Educação, n. 25, jan./abr. 2004.
PARO, Vitor Henrique. Qualidade do ensino: a contribuição dos pais. São Paulo:
Xamã, 2000.
PAULA, Flávia Anastácio de. Lições, deveres, tarefas, para casa: velhas e novas
prescrições para professores. 2000. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de
Educação-Universidade Estadual de Campinas. Disponível em:
<http://www.libdigi.unicamp.br/document/?>. Acesso em: 12 dez. 2009.