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PODER JUDICIÁRIO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUÍZO DE DIREITO DA 5ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE NATAL

PROCEDIMENTO ORDINÁRIO Nº: 0000353-59.2010.8.20.0001


PARTE AUTORA: ASSOCIAÇÃO DOS DELEGADOS DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DO
RIO GRANDE DO NORTE - ADEPOL/RN
PARTE RÉ: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

SENTENÇA

Verificando a ocorrência de erro de digitação na parte dispositiva da sentença


de fls. 158-166, chamo o feito a ordem para, com observância ao art. 494, inciso I, do Código
de Processo Civil - “Art. 494. Publicada a sentença, o juiz só poderá alterá-la: I - para
corrigir-lhe, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais ou erros de cálculo” -
retificar de ofício a parte dispositiva do decisório mencionado, passando a mesma a constar
com o inteiro teor a seguir transcrito:

“ Relatório.

Associação dos Delegados de Polícia Civil do Rio Grande do Norte, neste ato
representada por seu então Presidente, Sr. Gustavo André Leite Santana, já devidamente
qualificados, assistida por advogado, ajuizou a presente ação ordinária contra o Estado do
Rio Grande do Norte, objetivando, já em sede de tutela antecipada, a determinação para que
o demandado pague o acréscimo de 1/3 do valor da parcela única da remuneração básica
atual de Delegado Substituto aos Delegados de Polícia Civil Estaduais que, convocados ou
designados, desempenhem o exercício de suas funções das quais são titulares de forma
cumulativa com a substituição, nos termos do art. 97 da LCE nº 270/2004, e, de igual modo,
promova o retorno dos Delegados às suas funções originais, de modo a não cumularem
atividades além do permitido por lei. No mérito, pugnou pela procedência dos pedidos iniciais
para manter as medidas liminares, caso concedidas, conforme se depreende da petição
inicial e dos documentos anexados.

Antes de examinar o pedido liminar o Estado foi notificado para se manifestar,


o que fez às fls. 59-62.

Em despacho de fl. 74 o Estado foi citado e apresentou sua contestação (fls.


77-92), arguindo preliminar de inépcia da inicial, e, no mérito, requereu a improcedência dos
pedidos iniciais.

O Representante do Ministério Público emitiu parecer (fls. 129-140) opinando


pelo não acolhimento da preliminar arguida pelo demandado e, no mérito, pela procedência
parcial dos pedidos da inicial.

Aplico a regra do artigo 355, I, do Código de Processo Civil, do julgamento


antecipado da lide.

Das questões prévias.


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Antes de adentrar no mérito próprio, convém apontar que não merece


prosperar a preliminar de inépcia da inicial sob o argumento de ausência da ata da
assembleia que autorizou a interposição da presente ação e da relação nominal dos
associados, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento no sentido
de que as associações de classe e os sindicatos possuem legitimidade ativa ad causam para
atuar como substitutos processuais em ações coletivas, independentemente de autorização
expressa dos substituídos e de juntada da relação nominal dos filiados, conforme se observa
nos arestos a seguir:

“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO


ESPECIAL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. REPERCUSSÃO GERAL. ARTIGO
543-B, § 3º, CPC. RE 573.232/SC. AÇÕES COLETIVAS. EXECUÇÃO.
ASSOCIAÇÕES DE CLASSE. REPRESENTAÇÃO. AUTORIZAÇÃO
EXPRESSA DOS ASSOCIADOS. NECESSIDADE. BALIZAS SUBJETIVAS
DO TÍTULO EXECUTIVO. LEGITIMIDADE DOS REPRESENTADOS.
ANÁLISE DE ELEMENTOS FÁTICOS. SÚMULA 7/STJ. SUPRESSÃO DE
INSTÂNCIA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. 1. Com o julgamento do RE
573.232/SC pelo Supremo Tribunal Federal, os autos foram devolvidos pela
Vice-Presidência do STJ, em atenção ao disposto no § 3º do art. 543-B do
Código de Processo Civil, diante da necessidade de adequação do julgamento
ao entendimento firmado pelo STF. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça orientava-se no sentido de que as associações de classe e os
sindicatos possuem legitimidade ativa ad causam para atuar como substitutos
processuais em Ações Coletivas, nas fases de conhecimento, na liquidação e
na execução, independentemente de autorização expressa dos substituídos e
de juntada da relação nominal dos filiados. 3. O STF, reconhecendo a
repercussão geral da matéria, apreciou e julgou o RE 573.232/SC, de rel. do
Min. Ricardo Lewandowski, relator para Acórdão Min. Marco Aurélio, tendo
assentado que "O disposto no artigo 5º, inciso XXI, da Carta da República
encerra representação específica, não alcançando previsão genérica do
estatuto da associação a revelar a defesa dos interesses dos associados" e
que "As balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta
por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento,
presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à
inicial". 4. Em que pese o esforço da Associação, o STF, no RE 573.232/SC,
não se limitou a averiguar se a previsão genérica contida no estatuto social
da entidade de classe, por si só, legitima a representação processual dos
associados, independentemente de autorização assemblear ou individual.
Naquele precedente, assim como no presente caso, o processo também
estava em fase de Execução, como se pode verificar no trecho da ementa
transcrita no item 3 acima, e o debate envolveu os limites subjetivos do título
executivo judicial. Nas palavras do Ministro Marco Aurélio, Relator para o
acórdão, "não vejo como se possa, na fase que é de realização do título
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executivo judicial, alterar esse título, para incluir pessoas que não foram
inicialmente apontadas como beneficiárias na inicial da ação de
conhecimento e que não autorizaram a Associação a atuar como exigido no
artigo 5º, inciso XXI, da Constituição Federal". 5. No presente caso, em
Agravo de Instrumento, o Tribunal a quo decidiu a controvérsia com base na
premissa de que se está a tratar de substituição processual, o que tornaria
prescindível o exame acerca da autorização dos associados. 6. Por outro lado,
é possível constatar que a agravada, desde a contraminuta ao Agravo de
Instrumento originário, vem sustentando que, "conforme Certidão em anexo,
as autorizações foram juntadas na ação e posteriormente restituídas ao
advogado da autora, em decorrência do entendimento do ilustre Magistrado
no sentido de que tratava-se de ação coletiva, cujo tramite seguiu o rito do
CDC" (fl. 178). 7. A Associação apresentou, juntamente com memoriais, cópia
de termo de entrega contido nos autos originários, dando conta de que, por
decisão judicial, foram devolvidos ao advogado da parte autora 28 volumes
avulsos contendo autorizações dos representados, o que leva a crer que, no
caso concreto, houve o preenchimento desse requisito. Contudo, tal fato deve
ser apurado definitivamente nas instâncias ordinárias, sob pena de supressão
de instância e em razão do óbice da Súmula 7/STJ. 8. Dessa forma, muito
embora mereça parcial reforma o acórdão de fls. 340-347, a retratação
realizada não pode conduzir de plano ao reconhecimento da ilegitimidade ativa
dos representados, pois remanesce controvérsia de natureza fática a ser
dirimida pelas instâncias ordinárias, a saber: a existência de expressa
autorização dos associados e a lista de seus nomes juntada à inicial, nos
moldes definidos no RE 573.232/SC, elementos que irão definir as balizas
subjetivas do título judicial. 9. Advirta-se que tal determinação não implica
retroceder ao início da Ação de Conhecimento, pois a discussão travada
envolve preliminar atinente à Execução promovida pelos réus dos Embargos à
Execução que deram origem ao presente Recurso Especial. 10. Agravo
Regimental parcialmente provido, nos termos do art. 543-B, § 3º, do CPC, para
determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que se verifique a
regularidade da representação na Execução.” (STJ - AgRg no AREsp
385.226/DF - Relator MINISTRO HERMAN BENJAMIN – Segunda Turma –
Publicação: DJe 29/11/2016).

“EMENTA: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR


PÚBLICO. DESVIO DE FUNÇÃO. DIFERENÇAS VENCIMENTAIS.
AJUIZAMENTO DE ANTERIOR AÇÃO COLETIVA. SINDICATO.
SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DOS
FILIADOS. DESNECESSIDADE. CITAÇÃO VÁLIDA. INTERRUPÇÃO DO
PRAZO PRESCRICIONAL PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO INDIVIDUAL. 1.
Este Superior Tribunal assentou entendimento no sentido de que a citação
válida no processo coletivo, ainda que este venha ser julgado extinto sem
resolução do mérito em face da ilegitimidade do Substituto Processual,
configura causa interruptiva do prazo prescricional para propositura da ação
individual (REsp 1055419/AP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJe
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21/9/2011). 2. Os sindicatos possuem ampla legitimidade para defenderem em


juízo os direitos da categoria, quer nas ações ordinárias, quer nas seguranças
coletivas, ocorrendo a chamada substituição processual, sendo dispensável a
autorização expressa dos substituídos e a juntada da relação nominal dos
filiados (AgRg no AgRg no Ag 1.157.523/GO, Rel. Min. Arnaldo Esteves
Lima, DJe 02/08/2010). 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ -
AgInt no REsp 1325649/AP - Relator MINISTRO SÉRGIO KUKINA – Primeira
Turma – Publicação: DJe 30/06/2016).

Do mérito.

O objetivo principal e efetivo da presente lide é condenar o demandado ao


pagamento do valor correspondente a 1/3 do valor da parcela única da remuneração
percebida por Delegado de Polícia Civil Estadual em casos de convocação ou designação
destes para substituição cumulativa com o exercício do cargo que desempenha em
titularidade, bem como para que o Estado se abstenha de designar os Delegados de Polícia
Civil para mais de uma substituição, tudo nos termos da Lei Complementar Estadual nº 270,
de 13 de fevereiro de 2004.

Sobre o assunto, a Constituição da República determina em seu artigo 144 que


a segurança pública é dever do Estado, devendo ser efetivada através, dentre outros órgãos,
das polícias civis, bem como que lei disciplinará a organização e o funcionamento destes
órgãos. Vejamos:

“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de


todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
(...)
IV - polícias civis;
(...)
§ 7º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos
responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de
suas atividades.”

Nesse sentido, no âmbito desse Estado do RN, foi publicada a Lei


Complementar Estadual nº 270, de 13 de fevereiro de 2004, dispondo sobre a Lei Orgânica e
o Estatuto da Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Norte, prevendo, em seu artigo 97,
que “o policial civil convocado ou designado para substituição cumulativa com o exercício do
cargo na Polícia Civil de que é Titular, terá direito à percepção de 1/3 (um terço) do valor da
parcela única da remuneração do substituído”, como se vê adiante:
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“(...)
Art. 97. O policial civil convocado ou designado para substituição cumulativa
com o exercício do cargo na Polícia Civil de que é Titular, terá direito à
percepção de 1/3 (um terço) do valor da parcela única da remuneração do
substituído.”

Ainda, a LCE nº 270/2004, em seu § 1º do artigo 97, limita a acumulação de


que trata o caput acima transcrito:

“Art. 97. (...)


§ 1º Na hipótese prevista no caput deste artigo, o substituto não poderá
acumular mais de uma substituição.
(...)”

Como se percebe, não há dúvida quanto ao direito dos delegados de Polícia


Civil Estaduais de, quando em convocação ou designação para substituição cumulativa com
o exercício do cargo na Polícia Civil de que é Titular, perceba o valor correspondente a 1/3
(um terço) do valor da parcela única da remuneração do substituído.

De outro modo, no tocante a limitação prevista no § 1º do artigo 97, da LCE nº


270/2004, que respalda o pedido para que o Estado se abstenha de designar os Delegados
de Polícia Civil para mais de uma substituição, entendo que o mesmo não merece prosperar.

Ora, o limite previsto na LCE nº 270/2004 de apenas uma acumulação se


explica porque a lei estadual, ao pretender que o policial civil não acumule mais de uma
função, entende que isso compromete a eficiência das atividades dos órgãos de segurança
pública.

De igual modo, dentro da atual conjuntura em que se encontra a segurança


pública estadual, sendo público e notório que há mais delegacias em todo Estado do que
Delegados de Polícia Civil para provê-las, aceitar a limitação requerida é concordar com o
fato de que melhor é deixar inúmeras Delegacias sem Delegados que por elas responda ou
que dê os encaminhamentos necessários às demandas nelas apresentas. Ou seja, deixar
grande parcela da população sem acesso a órgão da segurança pública, em detrimento da
disposição da Carta Magna que prevê ser direito de todos o acesso à segurança pública.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a pretensão formulada na


inicial pela Associação dos Delegados de Polícia Civil do Rio Grande do Norte para
determinar ao Estado do Rio Grande do Norte que, em caso de convocação ou
designação de Delegado de Polícia Civil para atuação cumulativa, seja em cargo vago
ou já provido, com o exercício do cargo de que é Titular, proceda, em acréscimo a
remuneração do respectivo Delegado, ao pagamento da quantia referente a 1/3 (um
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terço) do valor da parcela única da remuneração básica atual correspondente ao cargo


de Delegado de Polícia Civil Substituto, independentemente da quantidade de
substituições cumulativas. Defiro o pedido de tutela antecipada para que esta decisão
surta seus efeitos de forma imediata.

Notificar o Governador do Estado, os Secretários de Estado da Segurança


Pública e da Defesa Social e da Administração e dos Recursos Humanos e o Estado do RN,
por sua Procuradoria Geral, para conhecimento e cumprimento imediato da presente
decisão, devendo comunicar a este Juízo no prazo de 5 (cinco) dias a adoção de todas as
providências adotadas.

Custas ex lege. Aplico ao réu o ônus pelos honorários advocatícios


sucumbenciais, que arbitro em R$ 500,00 (quinhentos reais) – CPC, art. 85, § 2º.

Sentença sujeita ao reexame necessário, nos termos do art. 496, inciso I, do


Código de Processo Civil.

Publicar, registrar e intimar.”

Publicar e intimar.

Natal/RN, 22 de março de 2017.

Bruno Lacerda Bezerra Fernandes


Juiz de Direito

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