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Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul


Gabinete do Des. Luiz Gonzaga Mendes Marques

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjms.jus.br/pastadigital/sgcr/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 1402735-45.2022.8.12.0000 e código 47ABA8F.
HC 1402735-45.2022.8.12.0000 – Aparecida do Taboado
Impetrante: Lucas Júnior Silva dos Santos
Impetrado: Juiz de Direito da 1ª Vara da Comarca de Aparecida do Taboado
Paciente: Valtercides Fernando da Silva

Vistos.

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por LUIZ GONZAGA MENDES MARQUES, liberado nos autos em 04/03/2022 às 16:13 .
Lucas Júnior Silva dos Santos, advogado identificado nos autos, impetra
habeas corpus, com pedido de liminar, em favor de Valtercides Fernando da Silva,
devidamente qualificado, apontando como autoridade coatora o Juiz de Direito da 1ª Vara
da Comarca de Aparecida do Taboado.
Alega o impetrante que o paciente foi preso em flagrante, em 28/10/2021,
pela suposta prática do delito de tráfico de drogas, art. 33 da Lei n.º 11.343/2006, convertida a
prisão em preventiva posteriormente; sustenta a ilegalidade da prisão em flagrante em razão
da violação do domicílio do paciente pelos policiais que atuaram na abordagem, os quais
ingressaram no local sem ordem judicial ou consentimento do morador, apontando
precedentes do Superior Tribunal de Justiça na defesa de sua tese; pede o reconhecimento da
nulidade do flagrante e, como consequência, o relaxamento da prisão, com o
desentranhamento das provas que indica serem ilegais, nos termos do art. 157 do Código de
Processo Penal; argumenta o não cabimento da prisão preventiva, por ausência dos requisitos
legais, apontando condições pessoais favoráveis do paciente, que poderia responder ao
processo em liberdade; que é possível a substituição da medida extrema por outras menos
restritivas, nos termos do art. 319 do Código de Processo Penal; que diante da disseminação
da pandemia de Covid-19 no território brasileiro, é necessária a revogação da prisão
preventiva do paciente, não sendo recomendada sua manutenção no sistema prisional
superlotado, como forma de impedir o contágio e disseminação do vírus.
Requer a concessão da liberdade provisória, inclusive em sede liminar, com
ou sem medidas cautelares diversas da prisão e, no mérito, a concessão definitiva da ordem.

É o breve relatório. Passo a decidir.


Inicialmente, devo consignar que a impetração será conhecida apenas em
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parte, pois o pedido de substituição da prisão preventiva por medidas cautelares não prisionais
por ausência dos requisitos legais ou em razão da pandemia de Covid-19 já foi apreciado nesta
Corte, no HC 1419611-12.2021.8.12.0000, julgado recentemente por este Colegiado.
Segue-se, então, na análise da apontada ilegalidade da prisão em flagrante
pela suposta invasão de domicílio pelos policiais.
A concessão de liminar em habeas corpus é medida excepcional, somente

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por LUIZ GONZAGA MENDES MARQUES, liberado nos autos em 04/03/2022 às 16:13 .
cabível quando, em juízo perfunctório, observa-se, de plano, evidente constrangimento ilegal,
o que não é a situação presente, melhor cabendo o exame da pretensão no julgamento de
mérito pelo Colegiado, juiz natural da causa.
No caso em apreço, o paciente foi preso em flagrante acusado da prática do
delito de tráfico de drogas, pelo armazenamento, em tese, de pouco mais de 18 kg (dezoito
quilos) de maconha no interior de um imóvel desabitado nas proximidades de sua residência.
A despeito dos precedentes da Corte Superior indicados na inicial do
mandamus ressalvando que o consentimento do morador para entrada dos policiais no imóvel
só é válido se documentado por escrito e registrado em gravação audiovisual, recentemente o
Supremo Tribunal Federal anulou decisão do Superior Tribunal de Justiça nesse sentido.
O Ministro Alexandre de Moraes, no RE 1.342.077/SP, em decisão
proferida em 02/12/2021, consignou que:

“Diante de todo o exposto, em face do decidido no Tema 280 de Repercussão Geral,


CONHEÇO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARA CONCEDER PARCIAL PROVIMENTO E
ANULAR O ACÓRDÃO RECORRIDO tão somente na parte em que entendeu pela necessidade de
documentação e registro audiovisual das diligências policiais, determinando a implementação de
medidas aos órgãos de segurança pública de todas as unidades da federação (itens 7.1, 7.2, 8, 12, e 13
da Ementa); MANTENDO, entretanto, a CONCESSÃO DA ORDEM para absolver o paciente, em virtude
da anulação das provas decorrentes do ingresso desautorizado em seu domicílio”.

Nesse contexto, verifica-se que o Min. Alexandre, ao tempo em que


reafirmou a jurisprudência da Suprema Corte consolidada em sede de repercussão geral no
Tema 280, afastou a inovação promovida pelo STJ ao determinar a documentação por escrito
e gravação audiovisual da diligência policial em que há consentimento do morador para
ingresso na residência.
Além disso, no caso concreto, existem indicativos de que o entorpecente foi
localizado não na residência de morada do paciente, mas em um imóvel desabitado próximo
de sua casa, portanto, em situação não agasalhada pela norma do art. 5º, XI, da Constituição
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Federal.
Não fosse isso o suficiente, a ação policial foi justificada, em tese, diante da
fundada suspeita da prática do delito de tráfico de drogas, tendo em vista que a residência era
um local utilizado como depósito de entorpecentes, sendo desnecessário, por expressa exceção
constitucional, prévio mandado judicial ou autorização do morador, não ocorrendo, assim,
qualquer ilicitude que possa ter maculado a instauração da persecução criminal.

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por LUIZ GONZAGA MENDES MARQUES, liberado nos autos em 04/03/2022 às 16:13 .
Aparentemente, restou demonstrado que os policiais adentraram no imóvel
diante da fundada suspeita da traficância, logo na sequência, confirmada, ocasião em que
apreenderam razoável quantidade de maconha e prenderam em flagrante o paciente.
Foge por completo da razoabilidade a alegação de que agentes estatais não
possam ingressar em um local utilizado como depósito de entorpecentes, por suposta violação
do direito constitucional à inviolabilidade de domicílio.
É preciso ficar claro que a norma constitucional buscou tutelar o direito à
tranquilidade, paz, segurança, privacidade, do cidadão não praticante de atividades ilícitas
recolhido em sua morada e não para que pessoas possam agir à margem da Lei, cometendo
crimes para depois alegar violação de domicílio.
Aproxima-se do absurdo exigir-se que o Estado, através do Poder Judiciário,
tivesse que pedir licença ou solicitar autorização para ingressar em locais onde pessoas estão
praticando crimes! Ilógico, inaceitável e fora do razoável tal conclusão, especialmente quando
a diligência resulta na confirmação do delito suspeito, como parece ser o caso, em que dezoito
quilos de droga foram apreendidos.
Neste cenário, não vislumbro, em princípio, ilegalidade na prisão em
flagrante do paciente por suposta invasão domiciliar dos policiais, pelo que não comporta
acolhimento o pleito liminar.
Diante do exposto, sem prejuízo do pronunciamento de mérito a ser
proferido em ocasião oportuna, indefiro o pedido de liminar.
Solicitem-se informações à autoridade coatora e, após, vista à PGJ, inclusive
para que manifeste eventual oposição ao julgamento virtual.
Intimem-se. Cumpra-se.

Campo Grande, 4 de março de 2022.


Des. Luiz Gonzaga Mendes Marques
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2ª Câmara Criminal

Habeas Corpus Criminal - Nº 1402735-45.2022.8.12.0000 - Aparecida do Taboado


Relator(a) – Exmo(a). Sr(a). Des. Luiz Gonzaga Mendes Marques
Impetrante : Lucas Júnior Silva dos Santos.
Impetrado : Juizo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Aparecida do Taboado.
Paciente : Valtercides Fernando da Silva.

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por LUIZ GONZAGA MENDES MARQUES, liberado nos autos em 15/03/2022 às 19:42 .
Advogado : Lucas Júnior Silva dos Santos (OAB: 453747/SP).

EMENTA - HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS –


RELAXAMENTO DA PRISÃO – ILEGALIDADE DO FLAGRANTE – SUPOSTA
VIOLAÇÃO DOMICILIAR PELOS POLICIAIS – IMPOSSIBILIDADE – CRIME
PERMANENTE – JUSTA CAUSA PARA O INGRESSO DOS AGENTES NO
LOCAL – EXPRESSA EXCEÇÃO CONSTITUCIONAL – DILIGÊNCIA LEGÍTIMA
– LICITUDE DAS PROVAS – PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO
PREVENTIVA OU SUBSTITUIÇÃO POR MEDIDAS CAUTELARES NÃO
PRISIONAIS – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS – PANDEMIA DE COVID-19 –
NÃO CONHECIMENTO DESTA PARTE DA IMPETRAÇÃO – REITERAÇÃO DE
PEDIDO ANTERIOR – PARCIAL CONHECIMENTO E ORDEM DENEGADA.
O habeas corpus deve ser conhecido apenas em parte, pois quanto
aos requisitos da prisão preventiva por ausência doS requisitos ou em razão do cenário
de pandemia, bem como a substituição por medidas cautelares não prisionais, trata-se
de reiteração de pedido anterior.
O tráfico de drogas é crime permanente, ensejando situação de
flagrância enquanto perdurar a permanência do delito. Nesse contexto, permite-se o
ingresso domiciliar para prisão em flagrante do agente delitivo, mesmo sem prévio
mandado judicial, inexistindo nulidade nessas circunstâncias fáticas.
Nesse sentido, decidiu a Suprema Corte no RE 603.616/RO – Tema
280, fixando a seguinte tese de julgamento: “A entrada forçada em domicílio sem
mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em
fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da
casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar,
civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados”.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM, em sessão permanente e


virtual, os(as) magistrados(as) do(a) 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de
Mato Grosso do Sul, na conformidade da ata de julgamentos, a seguinte decisão: Por
unanimidade e com o parecer, conheceram parcialmente do habeas corpus e, nesta
extensão, denegaram a ordem.

Campo Grande, 15 de março de 2022.

Des. Luiz Gonzaga Mendes Marques


Relator do processo
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R E L A T Ó R I O
O(A) Sr(a). Des. Luiz Gonzaga Mendes Marques.(Relator)

Lucas Júnior Silva dos Santos, advogado identificado nos autos,


impetra habeas corpus, com pedido de liminar, em favor de Valtercides Fernando da

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por LUIZ GONZAGA MENDES MARQUES, liberado nos autos em 15/03/2022 às 19:42 .
Silva, devidamente qualificado, apontando como autoridade coatora o Juiz de Direito
da 1ª Vara da Comarca de Aparecida do Taboado.
Alega o impetrante que o paciente foi preso em flagrante, em
28/10/2021, pela suposta prática do delito de tráfico de drogas, art. 33 da Lei n.º
11.343/2006, convertida a prisão em preventiva posteriormente; sustenta a ilegalidade
da prisão em flagrante em razão da violação do domicílio do paciente pelos policiais
que atuaram na abordagem, os quais ingressaram no local sem ordem judicial ou
consentimento do morador, apontando precedentes do Superior Tribunal de Justiça na
defesa de sua tese; pede o reconhecimento da nulidade do flagrante e, como
consequência, o relaxamento da prisão, com o desentranhamento das provas que indica
serem ilegais, nos termos do art. 157 do Código de Processo Penal; argumenta o não
cabimento da prisão preventiva, por ausência dos requisitos legais, apontando
condições pessoais favoráveis do paciente, que poderia responder ao processo em
liberdade; que é possível a substituição da medida extrema por outras menos restritivas,
nos termos do art. 319 do Código de Processo Penal; que diante da disseminação da
pandemia de Covid-19 no território brasileiro, é necessária a revogação da prisão
preventiva do paciente, não sendo recomendada sua manutenção no sistema prisional
superlotado, como forma de impedir o contágio e disseminação do vírus.
Requer a concessão da liberdade provisória, inclusive em sede
liminar, com ou sem medidas cautelares diversas da prisão e, no mérito, a concessão
definitiva da ordem.
Liminar indeferida pela decisão de fls. 153-156 e informações
prestadas às fls. 159-162.
Parecer pelo parcial conhecimento e não concessão da ordem, fls.
167-183.

V O T O
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O(A) Sr(a). Des. Luiz Gonzaga Mendes Marques. (Relator(a))

Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Valtercides


Fernando da Silva, qualificado nos autos, apontando como autoridade coatora o Juiz de
Direito da 1ª Vara da Comarca de Aparecida do Taboado.

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por LUIZ GONZAGA MENDES MARQUES, liberado nos autos em 15/03/2022 às 19:42 .
Colhe-se dos autos que o paciente foi preso em flagrante, em
28/10/2021, acusado da prática do crime de tráfico de drogas, art. 33 da Lei n.º
11.343/2006, sendo a prisão convertida em preventiva, posteriormente.
Sustenta o impetrante a ilegalidade da prisão em flagrante em razão
da violação do domicílio do paciente pelos policiais que atuaram na abordagem, os
quais ingressaram no local sem ordem judicial ou consentimento do morador,
apontando precedentes do Superior Tribunal de Justiça na defesa de sua tese; pede o
reconhecimento da nulidade do flagrante e, como consequência, o relaxamento da
prisão, com o desentranhamento das provas que indica serem ilegais, nos termos do art.
157 do Código de Processo Penal; argumenta o não cabimento da prisão preventiva,
por ausência dos requisitos legais, apontando condições pessoais favoráveis do
paciente, que poderia responder ao processo em liberdade; que é possível a substituição
da medida extrema por outras menos restritivas, nos termos do art. 319 do Código de
Processo Penal; que diante da disseminação da pandemia de Covid-19 no território
brasileiro, é necessária a revogação da prisão preventiva do paciente, não sendo
recomendada sua manutenção no sistema prisional superlotado, como forma de impedir
o contágio e disseminação do vírus.
Requer o relaxamento da prisão, sob alegação de ilegalidade do
flagrante, ou a revogação da prisão preventiva, por ausência dos requisitos, ainda que
substituída por medidas cautelares não prisionais, nos termos do art. 319 do Código de
Processo Penal.
Pois bem. O habeas corpus é ação constitucional de natureza penal
destinada à proteção da liberdade de locomoção, ameaçada ou violada por ilegalidade
ou abuso de poder, nos termos da norma estampada no art. 5º, LXVIII, da Constituição
Federal, e art. 647 do Código de Processo Penal.
Conforme consignado na decisão que indeferiu o pleito liminar, a
ação constitucional será conhecida apenas em parte, pois o pedido de substituição da
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prisão preventiva por medidas cautelares não prisionais por ausência dos requisitos
legais ou em razão da pandemia de Covid-19 já foi apreciado nesta Corte, no HC
1419611-12.2021.8.12.0000, julgado e denegado por este Colegiado em dezembro de
2021, tratando-se, portanto, neste ponto, de mera reiteração.
A ementa do referido julgado restou assentada nos seguintes termos:

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HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS – REQUISITOS DA PRISÃO
PREVENTIVA PRESENTES – ORDEM PRISIONAL SUFICIENTEMENTE
FUNDAMENTADA – GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA –
CONSIDERÁVEL QUANTIDADE DE ENTORPECENTES ARMAZENADOS PELO
PACIENTE EM UMA RESIDÊNCIA DESABITADA – PEDIDO DE
AFASTAMENTO DA PRISÃO EM RAZÃO DA PANDEMIA DE COVID-19 –
INVIABILIDADE – INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO COLETIVA PARA
COLOCAÇÃO DE TODOS OS PRESOS BRASILEIROS EM LIBERDADE –
AUTORIDADE PENITENCIÁRIA QUE ESTÁ SEGUINDO TODAS AS
NORMATIVAS DOS ÓRGÃOS DE SAÚDE DO BRASIL E DA OMS – PACIENTE
QUE NÃO FAZ PARTE DO GRUPO DE RISCO – NÃO CONCESSÃO, COM O
PARECER. Na hipótese, o decreto prisional encontra-se devidamente
fundamentado em dados concretos extraídos dos autos, que evidenciam que a
liberdade do paciente acarretaria risco à ordem pública, notadamente se
considerada a elevada quantidade de entorpecentes apreendida, presentes prova
da materialidade delitiva e fortes indícios de autoria, nos termos dos arts. 312 e
313, I, do CPP. Não obstante a gravidade do problema sanitário e de saúde
pública pela propagação do novo coronavírus no território nacional, inexiste a
autorização coletiva para a colocação de todos os presos brasileiros em liberdade,
sob pena de, a pretexto de se buscar medidas de controle do avanço da doença,
ocasionar um caos na segurança pública do país.
Deste modo, considerando a reiteração de pedidos relativamente à
alegação de constrangimento ilegal por ausência dos requisitos autorizadores da prisão
preventiva, ou em razão da pandemia do novo coronavírus, bem como do cabimento de
medidas cautelares diversas da prisão, a impetração não merece ser conhecida, neste
ponto.
Na parte conhecida, segue-se no exame da apontada ilegalidade da
prisão em flagrante pela suposta invasão de domicílio pelos policiais.
Na hipótese, em que pesem os argumentos deduzidos pelo impetrante,
não vislumbro ilegalidade ou abuso de poder na prisão em flagrante do paciente, não
havendo que se falar em nulidade das provas obtidas em razão do ingresso domiciliar
pelos policiais.
Compulsando o auto de prisão em flagrante e a ação penal na origem,
verifica-se que o paciente foi preso em flagrante acusado da prática do delito de tráfico
de drogas, pelo armazenamento, em tese, de pouco mais de 18 kg (dezoito quilos) de
maconha, no interior de um imóvel desabitado nas proximidades de sua residência.
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De fato, o ingresso domiciliar pressupõe autorização judicial, nos
termos do art. 5º, XI, da Constituição Federal e art. 241 do Código de Processo Penal,
podendo configurar crime o cumprimento da diligência sem prévio mandado judicial
(art. 150 do Código Penal).
Todavia, é sabido que o delito de tráfico de drogas, nas modalidades

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“ter em depósito” ou “guardar” drogas, é crime permanente, de modo que estará
configurada a situação de flagrância enquanto subsistir a permanência.
Nessas circunstâncias, havendo fundados indícios da ocorrência de
crime (justa causa), como no caso, é lícito o ingresso no domicílio para realização da
apreensão do entorpecente e prisão em flagrante, ainda que sem autorização judicial,
conforme prevê excepcionalmente o próprio art. 5º, XI, do Texto Constitucional e o art.
150, § 3º, II, do Código Penal, sendo esta a hipótese dos autos.
Nada obstante as alegações contidas na inicial do habeas corpus e os
precedentes da Corte Superior indicados, o Supremo Tribunal Federal, em sede de
repercussão geral, consolidou o entendimento de que a exceção à inviolabilidade
domiciliar, a qual também pode ocorrer no período noturno, deve ser amparada em
fundadas razões.
Nesse sentido, decidiu a Suprema Corte no RE 603.616/RO – Tema
280, julgado pelo Plenário em 05/11/2015:
1. Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Repercussão geral. 2.
Inviolabilidade de domicílio – art. 5º, XI, da CF. Busca e apreensão domiciliar sem
mandado judicial em caso de crime permanente. Possibilidade. A Constituição
dispensa o mandado judicial para ingresso forçado em residência em caso de
flagrante delito. No crime permanente, a situação de flagrância se protrai no
tempo. 3. Período noturno. A cláusula que limita o ingresso ao período do dia é
aplicável apenas aos casos em que a busca é determinada por ordem judicial. Nos
demais casos – flagrante delito, desastre ou para prestar socorro – a Constituição
não faz exigência quanto ao período do dia. 4. Controle judicial a posteriori.
Necessidade de preservação da inviolabilidade domiciliar. Interpretação da
Constituição. Proteção contra ingerências arbitrárias no domicílio. Muito embora
o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa sem determinação judicial, a
medida deve ser controlada judicialmente. A inexistência de controle judicial,
ainda que posterior à execução da medida, esvaziaria o núcleo fundamental da
garantia contra a inviolabilidade da casa (art. 5, XI, da CF) e deixaria de proteger
contra ingerências arbitrárias no domicílio (Pacto de São José da Costa Rica,
artigo 11, 2, e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, artigo 17, 1). O
controle judicial a posteriori decorre tanto da interpretação da Constituição,
quanto da aplicação da proteção consagrada em tratados internacionais sobre
direitos humanos incorporados ao ordenamento jurídico. Normas internacionais
de caráter judicial que se incorporam à cláusula do devido processo legal. 5. Justa
causa. A entrada forçada em domicílio, sem uma justificativa prévia conforme o
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direito, é arbitrária. Não será a constatação de situação de flagrância, posterior
ao ingresso, que justificará a medida. Os agentes estatais devem demonstrar que
havia elementos mínimos a caracterizar fundadas razões (justa causa) para a
medida. 6 . Fixada a interpretação de que a entrada forçada em domicílio sem
mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em
fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro
da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade
disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos
praticados. 7. Caso concreto. Existência de fundadas razões para suspeitar de

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flagrante de tráfico de drogas. Negativa de provimento ao recurso.”

Referido julgamento resultou na seguinte tese: “A entrada forçada em


domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em
fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa
ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do
agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados”.
É exatamente a situação sob análise, na medida em que o paciente, ao
ser flagrado transportando pequena quantidade de maconha, admitiu que mantinha mais
entorpecentes em uma residência desocupada, local onde a equipe policial encontrou
18,089 kg (dezoito quilogramas e oitenta e nove gramas) da mesma substância.
Em assim sendo, considerando que o paciente encontrava-se em
estado de flagrância por crime permanente, bem como informou a localização de mais
entorpecente em uma residência desocupada, não há que se falar em invasão de
domicílio, isso sem contar a justa causa para que os policiais ingressassem no local.
A despeito dos precedentes da Corte Superior indicados na inicial do
mandamus ressalvando que o consentimento do morador para entrada dos policiais no
imóvel só é válido se documentado por escrito e registrado em gravação audiovisual,
recentemente o Supremo Tribunal Federal anulou decisão do Superior Tribunal de
Justiça nesse sentido.
O Ministro Alexandre de Moraes, no RE 1.342.077/SP, em decisão
proferida em 02/12/2021, consignou que:
“Diante de todo o exposto, em face do decidido no Tema 280 de Repercussão
Geral, CONHEÇO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARA CONCEDER PARCIAL
PROVIMENTO E ANULAR O ACÓRDÃO RECORRIDO tão somente na parte em que entendeu
pela necessidade de documentação e registro audiovisual das diligências policiais, determinando
a implementação de medidas aos órgãos de segurança pública de todas as unidades da
federação (itens 7.1, 7.2, 8, 12, e 13 da Ementa); MANTENDO, entretanto, a CONCESSÃO DA
ORDEM para absolver o paciente, em virtude da anulação das provas decorrentes do ingresso
desautorizado em seu domicílio”.
Nesse contexto, verifica-se que o Ministro, ao tempo em que
fls. 191

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Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjms.jus.br/pastadigital/sgcr/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 1402735-45.2022.8.12.0000 e código 48442DA.
reafirmou a jurisprudência da Suprema Corte, consolidada em sede de repercussão
geral no Tema 280, afastou a inovação promovida pelo STJ ao determinar a
documentação por escrito e gravação audiovisual da diligência policial em que há
consentimento do morador para ingresso na residência.
Além disso, existem forte indicativos de que o entorpecente foi

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por LUIZ GONZAGA MENDES MARQUES, liberado nos autos em 15/03/2022 às 19:42 .
localizado não na residência de morada do paciente, mas em um imóvel desabitado
próximo de sua casa, portanto, em situação não agasalhada pela norma do art. 5º, XI, da
Constituição Federal.
Não fosse isso o suficiente, conforme colocado linhas atrás, a ação
policial foi justificada, em tese, diante da fundada suspeita da prática do delito de
tráfico de drogas, tendo em vista que a residência era um local utilizado como depósito
de entorpecentes, sendo desnecessário, por expressa exceção constitucional, prévio
mandado judicial ou autorização do morador, não ocorrendo, assim, qualquer ilicitude
que possa ter maculado a instauração da persecução criminal.
Aparentemente, restou demonstrado que os policiais adentraram no
imóvel diante da fundada suspeita da traficância, logo na sequência, confirmada,
ocasião em que apreenderem razoável quantidade de maconha e prenderam em
flagrante o paciente.
Foge por completo da razoabilidade a alegação de que agentes
estatais não possam ingressar em um local utilizado como depósito de entorpecentes,
por suposta violação do direito constitucional à inviolabilidade de domicílio.
É preciso ficar claro que a norma constitucional buscou tutelar o
direito à tranquilidade, paz, segurança, privacidade, do cidadão não praticante de
atividades ilícitas recolhido em sua morada e não para que pessoas possam agir à
margem da Lei, cometendo crimes para depois alegar violação de domicílio.
Aproxima-se do absurdo exigir-se que o Estado, através de suas
forças policiais, tivesse que pedir licença ou solicitar autorização para ingressar em
locais onde pessoas estão praticando crimes! Ilógico, inaceitável e fora do razoável tal
conclusão, especialmente quando a diligência resulta na confirmação do delito suspeito,
como é parece ser o caso, em que dezoito quilos de droga foram apreendidos.
Neste cenário, inexiste ilegalidade na prisão em flagrante do paciente
por suposta violação domiciliar pelos policiais, pelo que a pretensão formulada na
fls. 192

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjms.jus.br/pastadigital/sgcr/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 1402735-45.2022.8.12.0000 e código 48442DA.
presente ação constitucional, na parte conhecida, é improcedente.
Diante do exposto, com o parecer, conheço parcialmente do pedido de
habeas corpus e, nesta extensão, denego a ordem.
É como voto.

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por LUIZ GONZAGA MENDES MARQUES, liberado nos autos em 15/03/2022 às 19:42 .
D E C I S Ã O
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:

POR UNANIMIDADE E COM O PARECER, CONHECERAM


PARCIALMENTE DO HABEAS CORPUS E, NESTA EXTENSÃO, DENEGARAM
A ORDEM.

Presidência do(a) Exmo(a). Sr(a). Des. José Ale Ahmad Netto.

Relator(a), o(a) Exmo(a). Sr(a). Des. Luiz Gonzaga Mendes


Marques.
Tomaram parte no julgamento os(as) Exmos(as). Srs(as). Des. Luiz
Gonzaga Mendes Marques, Des. José Ale Ahmad Netto e Juiz Waldir Marques.

Campo Grande, 15 de março de 2022.

in

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