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LUZ.

FERNANDO
CHALANA
Aventuras
de um português
em França

20 AGOSTO 2022  REVISTA DO NASCER DO SOL

DIANA
A princesa do povo:
Uma vida,
muitos filmes
8 12

SUMÁRIO
20
AGOSTO
2022

6. Pessoas Shakira e Piqué disputam avião privado de 20 milhões de


euros 8. Férias Ibiza voltou a ser o destino de eleição das celebridades
neste verão 12. Perfil A despedida de Serena Williams dos courts
16. Realeza 25 anos da morte da Princesa Diana: as teorias da conspiração
multiplica-se 28. Obituário Fernando Chalana 40. Receitas Verão pede
sangria de frutos vermelhos 42. Agenda Mariza leva fado à Praia dos
Pescadores, em Albufeira
2 LUZ 20 AGOSTO 2022
28 40

EDITORIAL

A gosto no desporto

C
om nova onda de calor esperada para principal objetivo da época para os encarna-
os próximos dias, o mês de agosto tem dos, continuando a mostrar apenas a sua fa-
sido também um mês quente no fu- ceta vitoriosa. Mas não é só no futebol que
tebol: os termómetros disparam no- agosto tem sido agitado. Campeão mundial de
vamente este sábado com o primeiro clássi- Fórmula E em 2020, António Félix da Costa
co da época, entre FC Porto e Sporting, no foi durante a última semana oficializado como
Dragão. Apesar da saída recente de Matheus o novo piloto da Porsche, uma das marcas
Nunes ter levado algumas nuvens até Alvala- com mais história no desporto automóvel. De-
Laura de, os leões de Rúben Amorim tentam voltar pois de três anos a representar a DS Techee-
Ramires a trazer céu limpo ao balneário depois do iní- tah, o piloto de 30 anos concretiza um ‘sonho
cio de época mais desafiante, com empate a de criança’ e faz esperar novos feitos para a
três bolas na abertura da Liga, frente ao Spor- temporada 2023, com partida no México em
ting de Braga. Já o dragão procura reacender a janeiro do próximo ano. Dos carros para o atle-
chama inicial, mostrada na entrada triunfal tismo, Pedro Pichardo continua a ser o nome
na Supertaça e na goleada aplicada no pri- em destaque: conquistou na quarta-feira o
meiro compromisso na defesa do título na- ouro no triplo salto nos campeonatos euro-
cional, frente ao Marítimo, isto uma semana peus que acontecem em Munique, na Alema-
antes de ter precisado do tempo total de jogo nha, e juntou-o aos títulos olímpico e mun-
para garantir os três pontos em Vizela. Por sua dial. Também o ciclista Iúri Leitão assegurou
vez, o Benfica deu mais um passo largo rumo o ouro, no scratch, no ciclismo de pista, en-
à fase de grupos da Liga dos Campeões, com quanto Auriol Dongmo foi prata, no lança-
vitória frente ao Dínamo de Kiev no primei- mento do peso. Mais uma vez, e como já vem
ro jogo do play-off. Roger Schmidt está cada sendo hábito, Portugal e os seus resultados de
vez mais perto de conquistar o primeiro e excelência a nível desportivo.

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VIVER PARA
CONTAR

JOSÉ ANTÓNIO
SARAIVA

Uma tragédia legal


A clínica Tavistock foi acusada de «prescrever bloqueadores hormonais a muitas
crianças sem analisar os efeitos a longo prazo deste tratamento».

E A
m 2020, a opinião pública ingle- queixa de Keira Bell poderia não passar mesmo assim, o grau de subjetividade das
sa foi agitada pelo ‘caso Keira de um expediente oportunista para sacar análises permitiria muitos erros.
Bell’. Uma mulher acusava a clí- uns milhões de dólares de indemnização à Mas não é isso que se passa. No caso de Kei-
nica Tavistock & Portman, do ser- clínica Tavistock, por comportamento ne- ra, tudo foi decidido após três consultas de
viço público de saúde do Reino Unido gligente. Só que, agora, o Governo britâni- uma hora cada, quando ela tinha apenas 15
(NHS), especializada em tratamentos de co decidiu mesmo encerrar a clínica. anos! Decidiram mudar o sexo a um jovem
‘transição sexual’, de ter iniciado o seu Esta decisão segue-se a um relatório ar- ser humano após três horas de consulta!
processo de mudança de mulher para rasador da pediatra Hilary Cass, publica- E uma ex-enfermeira da clínica Tavis-
homem sem exames aprofundados. do em março, segundo o qual a clínica tock afirmou à Justiça britânica que blo-
«Quanto mais a transição avançava, «prescreveu bloqueadores a muitas queadores de puberdade teriam sido re-
mais eu percebia que não era homem, crianças sem analisar os efeitos a longo ceitados a crianças muito novas, de 12 anos,
e que jamais o seria», afirmou Keira prazo deste tratamento». E a revista The sem avaliações psicológicas «adequadas».
Bell, oito anos após o início do tratamen- Week, de 6 de agosto, adianta que a insti-
to, conforme publicou a National Review.
«À medida que amadurecia, fui perce-
bendo que a disforia de género era um
tuição terá sido ‘tomada de assalto’ por ati-
vistas ‘trans’, que aceitam sem questio-
nar declarações de crianças dizendo que
O u seja, em idade infantil ou no início da
adolescência, numa altura em que os
jovens começam a ter dúvidas de toda a
sintoma da minha tristeza em geral, e «nasceram no género errado, ignorando ordem – em relação ao que são, ao que
não a causa», explicou. outras possíveis explicações». querem ser, à relação com os outros, aos
E os advogados de Bell defenderam Perante tudo isto, o jornal The Times con- seus afetos, aos seus medos… –, os médi-
que jovens menores de idade não estão clui: «Os estragos feitos são aterradores». cos aceitam como definitivos os seus tes-
aptos a decidir sobre a ‘transição de gé- temunhos e, com base neles, iniciam pro-
nero’ e a consentir um tratamento que
inclui bloqueadores hormonais – que Jábremeestes
pronunciei em textos anteriores so-
processos de mudança de sexo,
cessos brutalmente invasivos, que vão pro-
vocar mudanças radicais no seu corpo.
restringem as hormonas ligadas a mu- que me parecem aberrantes. De qualquer Parece ficção científica, mas é a reali-
danças no corpo durante a puberdade, forma, era suposto que essas decisões fos- dade em que já vivemos.
como a menstruação ou o surgimento sem tomadas pelos médicos após longos E de ano para ano a questão agrava-se.
de pelos faciais – ou alterações físicas, processos de observação dos pacientes, A clínica Tavistock começou com umas
como as mastectomias (a que Keira tam- com estudos psicológicos aprofundados e centenas de casos e já vai em milhares por
bém foi sujeita). cuidadosas análises de comportamento. E ano. Como se mudar de sexo se tivesse tor-

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JEFFREY BLACKLER/AFP
nado uma ‘moda’ – que as redes sociais
irresponsavelmente propagandeiam. Massãoneste assunto quem impõe a sua lei
os ativistas ‘trans’. Estamos num
tempo em que a ideologia dominante é es-

E ntretanto, apesar do seu óbvio interes-


se público, a discussão deste tema é
tabelecida pelas minorias.
As minorias começaram por ser repri-
tabu. Tudo se discute hoje, da política à re- midas, depois foram toleradas, a seguir
ligião. Tudo se pode pôr em causa, a co- protegidas, e hoje são dominantes – ten-
meçar pelo Presidente da República. Mas do-se tornado agressivas e repressoras.
nestes assuntos o debate é interdito; só são A imensa maioria acanha-se, com medo
permitidas as campanhas a favor. de ser insultada, amesquinhada, ridicu-
Há uns anos fui processado por um organis- larizada, apelidada de ignorante, negacio-
mo do Governo – num processo que um juiz
mais lúcido acabou por arquivar – por publi-
Uma mudança nista, reacionária – ou mesmo processa-
da. Mas os ativistas não se acanham: avan-
car um artigo em que fazia a seguinte pergun- de sexo de uma çam sempre, são voluntaristas, combativos
ta: se um indivíduo que nasce num corpo de
homem quer ser mulher, ou vice-versa, o que menina de 15 anos e acabam por impor a sua vontade.
Conseguem levar o serviço público de um
fará mais sentido: dar-lhe apoio psicológico
no sentido de tentar adequar a mente ao cor-
foi decidida após país a iniciar processos de mudança de sexo
em meninos de 12 anos, como se fosse pos-
po que tem, ou procurar transformar o corpo três consultas sível estes terem opiniões definitivas sobre
para ficar de acordo com a mente?
Com uma certeza: a ideia que cada um médicas de se querem ser rapazes ou raparigas.
Mais: como se fosse possível criar cor-
tem acerca da sua identidade pode mudar
com o tempo, mas o corpo mantém-se
uma hora cada; pos de rapazes a partir de meninas ou o
contrário.
inalterado: um homem não se transforma os médicos Tudo isto é uma burla, um faz de con-
‘naturalmente’ em mulher e vice-versa.
E isto ainda é mais verdade em crianças e aceitaram como ta, porque destas operações sairão sempre
seres híbridos, que não serão nem ho-
adolescentes, que não têm a personalidade for-
mada, e em que as certezas de hoje poderão
definitivas as mens nem mulheres, muitas vezes car-
regados de problemas superiores àqueles
ser renegadas com o mesmo vigor amanhã. suas declarações que tinham antes.

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PESSOAS

Mariah Carey
Mansão assaltada
enquanto estava
de férias
A mansão de Mariah Carey,
em Atlanta (EUA), foi assal-
tada, enquanto a cantora es-
tava de férias com o namo-
rado, Bryan Tanaka, e os fi-
lhos gémeos Monroe e
Adele
Marroquino, em Itália, em Filho de 9 anos
julho. A informação foi con- é ‘obcecado’
firmada pela polícia à Page por Billie Eilish
Six. Segundo as autoridades, Adele revelou que Angelo, o
o caso «está ainda a ser in- seu filho de 9 anos, é «obce-
vestigado» e, por esse moti- cado» por Billie Eilish. «Ele
vo, «as informações são li- enfia-se no quarto, depois da
mitadas». Esta mansão, escola, e sai de lá a querer dis-
avaliada em 20 milhões de cutir as letras todas», disse a
dólares, tem 9 quartos e 13 cantora em entrevista à revista
casa de banhos, uma pisci- ELLE. Adele e o filho marcaram
na, um campo de ténis e um presença no concerto de Billie
parque infantil. Eilish na O2 Arena, em Lon-
dres, no último mês de junho.

Shakira
e Gerard Piqué
Disputam guarda
dos filhos e... avião privado
de 20 milhões de euros
O processo de separação de Shakira e Gerard
Piqué levou o ex-casal a tribunal para dispu-
tar a custódia dos dois filhos, Milan, de 9
anos, e Sasha, de 7, mas também para decidir
quem fica com o avião privado que compra-
ram para as viagens em família. Segundo o
jornal Prensa Libre, a cantora colombiana e o
futebolista espanhol não se entendem quanto
ao jato, avaliado em 20 milhões de euros.
Com capacidade para 10 passageiros, o avião,
um Learjet 60XR, terá sido alterado a pedido
do ex-casal, que pretendia ter um quarto com
duas camas, uma sala de jantar e um espaço
com uma televisão de grandes dimensões a
bordo. O ex-casal esteve junto durante 12
anos, com a cantora a confirmar a separação
no passado mês de junho. Shakira enfrenta
também a justiça devido a acusações de frau-
de fiscal, com o Ministério Público espanhol a
pedir 8 anos e dois meses de prisão e o paga-
mento de uma multa de 23 milhões de euros

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Gina Lollobrigida Tom Holland e a saúde mental
Concorre às eleições em Itália aos 95 anos Ator diz ‘até já’ às redes sociais
Gina Lollobrigida, ícone do cinema italiano com 95 anos, vai O ator, de 26 anos, conhecido pelo seu papel em Homem-
concorrer ao senado nas eleições gerais de Itália, a 25 de setem- -Aranha, decidiu abandonar as suas contas no Twitter e
bro, pelo partido Itália Soberana e Popular (ISP), uma aliança Instagram para cuidar da sua saúde mental. «Não consigo
política anti-Draghi, baseada no euroceticismo e que se opõe dizer o que preciso sem gaguejar. Acho que o Twitter e o
ao envio de armas para a Ucrânia e ao «atlanticismo belicista». Instagram nos estimulam excessivamente e vejo-me pre-
«Lutarei para que o povo decida, da saúde à justiça. A Itália so numa espiral quando leio coisas sobre mim online e,
está em má forma, quero fazer algo diferente, algo positivo», ultimamente, tem me feito muito mal», explicou num ví-
disse a famosa atriz ao jornal italiano Corriere Della Sera. «Estou deo que partilhou com os mais de 67 milhões de seguido-
cansada de ouvir os políticos a discutirem entre si sem nunca res que reúne só no Instagram.
chegarem a um consenso», acrescentou na mesma entrevista.

Ezra Miller
Inicia tratamento
para ‘problemas de
saúde mental graves’
Ezra Miller anunciou na última
semana ter iniciado tratamento
para «problemas de saúde men-
tal graves». A estrela de The
Flash admitiu em comunicado
que tem passado «por um perío-
do de crise intenso». «Peço des-
culpa a todos os que preocupei e
Madonna e os anos 80 magoei devido ao meu compor-
tamento. Comprometo-me a
‘Não devias mostrar o rabo se quisesses realizar o trabalho necessário
uma carreira, agora é o contrário’ para poder voltar a uma fase
No programa de Jimmy Fallon, Madonna recordou o momento saudável e produtiva na minha
em que, em 1984, ouviu do seu manager que a sua carreira vida», disse. As autoridades nor-
musical tinha chegado ao fim depois de uma atuação polémica te-americanas detiveram Miller
nos prémios da MTV em que mostrou parte do rabo enquanto por três vezes, só desde março
cantava o êxito ‘Like a Virgin’. «Naquele tempo, não devias deste ano – uma por conduta im-
mostrar o rabo se quisesses uma carreira, agora é o contrá- própria e assédio, outra por
rio», disse Madonna no programa The Tonight Show. «Acon- agressão e uma por roubo. Miller
teceu por acidente e eu nem sequer me apercebi. Nem mos- vê-se ainda a braços com a justi-
trei o rabo todo, foi só parte de uma nádega. Quando cheguei ça uma vez que pendem também
aos bastidores, o meu manager disse-me que aquilo era o fim sobre si acusações de assédio a
da minha carreira», recordou a artista de 64 anos. menores e de liderar um culto.

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FÉRIAS

Todos
os caminhos
vão dar a Ibiza
Ibiza voltou a ser o destino de eleição da maioria
das celebridades nacionais e internacionais neste
verão. As modelos Sara Sampaio e Alessandra
Ambrósio, a apresentadora de televisão Cristina
Ferreira, o músico David Guetta ou o futebolista
Rúben Dias são apenas alguns exemplos.

David Guetta
e McGregor
O dj francês e o lutador irlandês têm em
comum a escolha do destino de férias. Mas
se seria de esperar uma vida mais festiva
por parte do músico francês, num destino
como Ibiza, David Guetta aproveitou a es-
tadia para praticar vários desportos aquáti-
cos. Já o desportista Conor McGregor feste-
jou o seu 34.º aniversário – no passado mês
de julho – em Ibiza e deu que falar num
vídeo partilhado nas redes sociais, onde é
possível ver o irlandês com um ‘cigarro’
numa mão e uma bebida na outra...

De Rúben Dias a Messi e Suárez


Na companhia do irmão e de vários amigos, aniversário na ilha espanhola, no passado
Rúben Dias mostrou alguns momentos de mês de junho, na companhia de família e
descanso passados em Ibiza e Formentera, a amigos, entre os quais o antigo companheiro
mais pequena das ilhas Baleares de Espa- de equipa do Barcelona, Luís Suárez. Tam-
nha. Mas o jogador do Manchester City não bém Luís Figo aproveitou uns dias de des-
foi o único a escolher aquele que se tem tor- canso em Ibiza, tendo sido fotografado na
nado nos últimos anos um dos destinos de companhia da sua filha mais nova, Stella,
eleição das figuras públicas. Este verão, Ibiza durante o passado mês de julho. Já Ronaldo
contou com a passagem de vários craques Nazário, antigo internacional brasileiro, vol-
além do internacional português. Messi, jo- tou a rumar à ilha, onde tem uma proprie-
gador do PSG, celebrou mesmo o seu 35.º dade localizada perto da praia Cala Jondal.

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Sara Sampaio e
Zac Frognowski
Depois de ter oficializado o namoro com
o produtor Zac Frognowski, em abril
deste ano, Sara Sampaio, de 31 anos,
mostrou-se ao lado do namorado du-
rante as férias em Ibiza. O casal aprovei-
tou ainda para fazer uma paragem por
Barcelona e visitar alguns dos pontos tu-
rísticos da cidade. Mas a modelo por-
tuense não foi a única a ‘desfilar’ pela
ilha espanhola. Também Alessandra
Ambrosio, antigo anjo da Victoria’s Se-
cret, provou que continua em excelente
forma física aos 41 anos. A modelo bra-
sileira seguiu depois viagem até Amalfi
(Itália), sempre na companhia do namo-
rado, o modelo norte-americano Ri-
chard Lee: o casal está junto desde 2021.

Cristina Ferreira:
de Itália a Ibiza
Depois de ter passado por Itália e pelo
Alentejo, em Portugal, Cristina Ferreira
rumou a Ibiza. A Diretora de Entreteni-
mento e Ficção da TVI tem estado a bordo
do luxuoso iate Leopard 27 Open. Na
companhia de amigos, a apresentadora
da TVI tem partilhado com os seus segui-
dores várias imagens das férias na rede
social Instagram, desde os restaurantes
que visita aos momentos mais radicais,
em que surge a andar de mota de água.
«Um azul inacreditável», escreveu.

Lando Norris e Luísa Oliveira


A modelo portuguesa Luísa Barosa Oli- assinalou a data especial nas redes so-
veira e o namorado, Lando Norris, piloto ciais, em que tem feito outras partilhas
da Fórmula 1 (McLaren), são um dos ca- com os seguidores. Instalados num iate
sais que tem estado a aproveitar o bom de luxo, a modelo e o piloto, ambos de
tempo e as praias do ‘refúgio de Ibiza’. 22 anos, foram ‘apanhados’ em clima de
Numa altura em que celebraram tam- romance pelo jornal inglês The Sun e não
bém o primeiro ano de namoro, o casal faltaram elogios à bela portuguesa...

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FÉRIAS

Demi Moore de
férias na Grécia
Este ano, Demi Moore optou por umas férias
na Grécia, a bordo de um iate. A atriz fará 60
anos em novembro deste ano e, numa en-
trevista recente, disse que é «muito liberta-
dor» chegar a essa idade. Na sua página de
Instagram, a atriz publicou algumas fotogra-
fias das férias e recebeu vários elogios. «Es-
tás maravilhosa», «pareces radiante e mui-
to contente» e «deslumbrante como sem-
pre», são apenas alguns da longa lista de
comentários. A estrela de Hollywood, co-
nhecida pelos seus papéis em projetos como
Ghost e Striptease, apostou num biquíni
num tom rosa vibrante, uma das tendências
deste verão, que conjugou ainda com uma
camisa em amarelo torrado. Moore está
numa relação com o chef suíço Daniel

Família Patrocínio
Humm desde março de 2022.

De Ibiza para o Algarve: Carolina Pa- Ibiza e Formentera, já durante este


trocínio rumou no mês de junho às mês de agosto a apresentadora da
ilhas Baleares espanholas para umas SIC gozou uns dias de descanso com
miniférias, na companhia do mari- os filhos e restante família na Praia
do, Gonçalo Uva, da irmã Rita Patro- dos Salgados, no Algarve, onde já é
cínio e do cunhado, o ator Tiago Teo- tradição aproveitarem parte das fé-
tónio Pereira. Depois de uns dias em rias de verão.

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Família real
espanhola
em Maiorca
Felipe VI, a rainha Letizia e as duas fi-
lhas, a infanta Sofia e a princesa Leonor,
rumaram a Maiorca no início de agosto e
contaram com a companhia da rainha
Sofia. A ilha balear mantém-se como o
destino da realeza espanhola por tradi-
ção e, ao contrário do que acontecia,
deixa-se agora fotografar em passeios
pelas ruas – durante muitos anos a fa-
mília real espanhola fazia a sessão de fo-
tografias para a imprensa apenas no Pa-
lácio de Marivent. No dia 1 de agosto, a
família fez uma visita guiada pela Cartu-
ja de Valldemossa. Letizia prestou ho-
menagem à ilha ao usar uma saia no es-
tampado típico maiorquino, o ikat, com

‘Rei’ Ronaldo: à moda da realeza


assinatura do criador local Pablo Erroz.

Já de regresso aos relvados em Inglater- nacional o avançado do Man. United terá


ra, mas com o futuro desportivo ainda desembolsado cerca de 10 mil euros por
em aberto, também Cristiano Ronaldo dia. De acordo com o The Sun, a escolha
gozou uns dias de descanso em família do local foi recomendado pelo ex-com-
em Palma de Maiorca. Durante a estadia panheiro de equipa de CR7, Sergio Ra-
de dez dias, o craque português alugou mos. A família levou ainda o seu iate
uma luxuosa mansão em plena serra particular – que estava atracado em Port
Tramuntana. Segundo a imprensa inter- Adriano – nas águas de Cala Egos.

Do Douro à «paz» do Alentejo


A atriz e apresentadora da SIC Cláudia

Algarve é sempre
Vieira, de 44 anos, esteve de férias na re-
gião do Douro e, no último fim de semana,

boa ideia
rumou ao Alentejo, para mais uma sema-
na de descanso. Cláudia Vieira está com o
companheiro João Alves e a filha de am-
Catarina Furtado partilhou com os segui- bos, Caetana, de 3 anos. O casal está insta-
dores várias fotografias das suas férias lado no Hotel São Lourenço do Barrocal,
com a família em Cabanas de Tavira. A nas imediações da aldeia histórica alente-
apresentadora do The Voice esteve alojada jana de Monsaraz e do lago do Alqueva.
no Hotel Cabanas Beach & Nature, no Al- Cláudia Vieira tem partilhado vários regis-
garve, com o ator e marido João Reis e tos com os seus seguidores – na sua página
com os respetivos filhos: Beatriz, João e oficial de Instagram é seguida por um mi-
Maria. «O melhor das férias é ter a capa- lhão e meio de pessoas – e mostrado al-
cidade (e a sorte) de poder parar mesmo guns dos programas que tem feito, como
que seja a pensar muito e a sentir tanto. passeios de bicicleta. «Que paz», pode
Leitura em dia, mergulhos tatuado, afec- ler-se na legenda que acompanhou uma
tos exercitados e projectos desenhados. série de fotografias da apresentadora na
Regressar a Lisboa», escreveu na legenda. tranquilidade do Alentejo.

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MODALIDADES
PERFIL

Serena Williams faz 41 anos de idade no próximo mês e


é um dos nomes mais icónicos do ténis feminino mundial.
Conta, na sua carreira, 23 títulos de Grand Slam e, em 2017,
segundo a Forbes, era a atleta feminina mais bem paga do
mundo. Mas os anos pesam, e as polémicas acumularam-se,
agora que se aproxima o fim de uma carreira que já vai longa.

Serena
Williams
Uma vida de altos e baixos
TEXTO José Miguel Pires

N
o WTA 1000 de Cincinnati, que deixar de jogar ténis. É como um as- ternacional, tendo ambas sido treinadas
as expectativas para o con- sunto tabu. Ele chega e eu começo a cho- pelos pais, Oracene Price e Richard
fronto entre a jovem Emma rar. Acho que a única pessoa com quem Williams.
Raducanu e a veterana Sere- realmente falei disto foi o meu terapeu- Com apenas quatro anos de idade, na
na Williams estavam em al- ta», disse a própria, num artigo de opinião cidade de Compton, na Califórnia, Sere-
tas, pois seria um verdadei- publicado na revista Vogue. na Williams – também conhecida como
ro duelo de gerações do ténis Preferindo usar o termo «evolução» em Meka, forma diminutiva do seu nome do
feminino. No fim, a britânica de 19 anos ba- vez de «reforma», Serena Williams diz que meio (Jameka) – começou a jogar ténis,
teu – com facilidade – a norte-americana está «a evoluir do ténis para outras coisas tornando-se profissional em 1995.
de 40 anos, com os parciais 6-4 e 6-0. que são importantes». «Há alguns anos, co- O talento esteve sempre lá: apenas qua-
Para muitos, o desastroso resultado para mecei discretamente a Serena Ventures, tro anos depois de se profissionalizar, no
Williams foi o espelho de uma tenista que uma empresa de capital de risco. Logo de- Open dos Estados Unidos de 1999,
já não é o que era, e a quem os 40 anos de pois disso, comecei uma família. Eu quero Williams vencia o seu primeiro título de
idade começam a pesar. Afinal de contas, que essa família cresça», continuou a tenis- Grand Slam, com apenas 17 anos.
Serena ocupa o lugar 612 do ranking mun- ta, atirando: «Uma coisa que eu não vou fa- Seguiu-se então uma carreira rechea-
dial da WTA, onde já ocupou o primeiro zer é embelezar isso. Eu sei que muitas pes- da de títulos e vitórias, bem como uma
lugar durante 319 semanas, 186 das quais soas estão animadas e ansiosas por se reti- série de contratos chorudos e ações im-
consecutivamente. rarem, e eu gostaria de me sentir assim». portantes no mundo dos negócios, que
Não é por acaso, aliás, que a norte-ame- fizeram da tenista a atleta mais bem paga
ricana anunciou, no início do mês, que vai A vida de Serena em 2017. Aliás, segundo a Forbes, e mes-
abandonar a sua carreira profissional. «Te- Serena e a sua irmã mais velha, Venus, mo com o ‘declínio’ de Williams nos úl-
nho sido relutante em admitir que tenho são dois dos grandes nomes do ténis in- timos anos, a tenista vale ainda 260 mi-

12 LUZ 20 AGOSTO 2022


SERENA OCUPOU
O PRIMEIRO LUGAR
DO RANKING
MUNDIAL WTA
DURANTE
319 SEMANAS,
186 DAS QUAIS
CONSECUTIVAMENTE

lhões de dólares (cerca de 255 milhões


de euros).
Mas nem toda a vida foi feita de rosas
para esta tenista de Saginaw, pequena ci-
dade do estado norte-americano do Mi-
chigan, conhecida pelo seu temperamen-
to difícil. Já em 2009, nas meias-finais
do Open dos Estados Unidos contra Kim
Clijsters, Williams bateu com a raquete
no court depois de perder o primeiro set,
valendo-lhe uma advertência, com uma
potencial segunda violação com uma pe-
nalidade de um ponto. Mais tarde, En-
quanto perdia por 4–6, 5–6, o segundo
serviço de Williams foi considerado fal-
ta no pé, resultando em dois match points
para Clijsters. A norte-americana não
gostou, virando-se para a juíza de linha
e gritando com ela, com palavrões e uma
ameaça de enfiar uma bola de ténis pela
goela abaixo da mesma.
A polémica repetiu-se anos depois, em
2018, quando Williams caiu frente a Nao-
mi Osaka no Open dos Estados Unidos,
onde, durante o segundo set, sofreu uma
violação de código porque o seu treina-
dor, Patrick Mouratoglou, foi apanhado a
fazer-lhe sinais. Williams ficou chateada
com a violação, alegando que o treinador
estava simplesmente a dar-lhe um sinal
de positivo, e exigiu um pedido de des-
culpas do árbitro Carlos Ramos. Acabou
por receber uma segunda violação por es-
magar a raquete no court. Depois de sua
terceira violação de código por abuso ver-
bal contra o árbitro, a tenista recebeu uma
penalidade de jogo, tendo-se mais tarde
queixado de ter sido tratada injustamen-
te pelo árbitro por ser mulher. 

20 AGOSTO 2022 LUZ 13


MODALIDADES
PERFIL

Momentos
memoráveis
Serena Williams conta mais de 20 anos de carreira
profissional, com momentos inesquecíveis a
preencher o seu portfólio. Desde a primeira vitória
em Grand Slams, em 1999, até ao polémico Open
dos Estados Unidos de 2018, a carreira da Williams
mais nova, durante a qual conquistou 23 majors,
está repleta de memórias e momentos inseparáveis
da história mundial do ténis profissional.
TEXTO José Miguel Pires
1999 Primeira conquista
num Grand Slam, no Open
dos Estados Unidos
Com 17 anos de idade, Serena Williams
venceu o seu primeiro torneio Grand
Slam. No Open dos Estados Unidos de
1999, a tenista venceu a suíça Martina
Hingis na final, por 6-3 e 7-6.

1995 Estreia no Bell Challenge, no Quebec


O primeiro jogo profissional de Serena Williams aconteceu em outubro de 1995, na Ci-
dade do Quebec, no Canadá. Aos 14 anos, Williams perdeu numa ronda de qualificação
do torneio Bell Challenge, frente à norte-americana Annie Miller, por 6-1, 6-1.

14 LUZ 20 AGOSTO 2022


2001 O alegado racismo
em Indian Wells
Serena Williams boicotou durante 14 anos
o torneio de Indian Wells depois de, em
2001, o seu pai e a sua irmã Venus, tam-
bém ela tenista profissional, terem sido
alegadamente vítimas de insultos racistas
durante o torneio.

2003 Serena Slam


Em 2004, Serena Williams tornou-se
numa das poucas tenistas que, ao longo
da história do ténis profissional, conquis-
taram o feito de deter simultaneamente
os quatro títulos de Grand Slam, depois
de bater a irmã Venus na final do Open
da Austrália de 2003.

2002 No topo
do ranking pela
primeira vez 2012 Golden
Em 2002, e depois de Slam
uma série de importan- Depois de conquistar o
tes vitórias – algumas ouro nos Jogos Olímpi-
delas contra a sua irmã, cos de Londres’2012, Se-
Venus Williams – Serena rena Williams tornou-se
subiu pela primeira vez na única tenista a com-
ao primeiro lugar do pletar um Golden Slam
ranking da WTA. em singulares e duplas.

20 AGOSTO 2022 LUZ 15


PRINCESA DIANA

25 anos da morte
A vida da ‘princesa do povo’
em 25 imagens

Diana Spencer nasceu a 1 de julho de 1961

TEXTO Joana Mourão Carvalho

M
uito se escreveu e conti- o casal não chegaria ao destino. Já passava da de Pitié-Salpêtrière, não tendo resistido
nua a escrever sobre as meia-noite em Paris, quando o carro guia- aos ferimentos.
circunstâncias que leva- do pelo motorista Henri Paul e onde ainda Quase 25 anos depois, são múltiplas as
ram à tragédia na madru- seguia o guarda-costas Trevor Rees-Jones teorias que se formularam em torno do
gada de 31 de agosto de se despistou no túnel que passa por baixo trágico acidente, mas todas se sustentam
1997. Era sábado à noite da Ponte da Alma, numa fuga aos paparazzi. na mesma crença: que alguém queria ma-
quando Diana e o egípcio Apenas o guarda-costas sobreviveu ao tar Diana e que a família real britânica aju-
Dodi al-Fayed, herdeiro dos armazéns de violento acidente. Tanto Dodi, namorado dou a orquestrar o acidente fatal daquela
luxo Harrods, saíram do hotel Ritz, na Pra- de Diana, como o motorista foram decla- noite. Essas teorias foram tão difundidas
ça Vendôme, onde tinham jantado, e entra- rados mortos no local. Já a princesa de Ga- que as autoridades britânicas foram for-
ram num Mercedes com destino a um apar- les acabaria por morrer, aos 36 anos, nas çadas a lançar a conhecida Operação Pa-
tamento na rua Arsène Houssaye. Contudo, primeiras horas de domingo, no hospital get, um inquérito para estabelecer se ha- >>

16 LUZ 20 AGOSTO 2022


de Diana
A morte de Diana Spencer, a princesa de Gales, em 31 de agosto
de 1997 marcou toda uma nação que ao longo dos anos especulou
sobre as circunstâncias do fatal acidente em Paris. A poucos dias
de se assinalarem os 25 anos da data, passamos em revista
as várias teorias da conspiração em torno do trágico desfecho
de uma das figuras mais adoradas do século XX.

Foi professora primária, em Pimlico Diana ficou noiva de Charles em 24 de fevereiro de 1981

via algum fundamento de verdade nestas mente ser o padrasto do futuro rei da In- rias fundamentava-se na crença de que a
teorias. Durou anos, custou milhões de li- glaterra». E, assim, planeara matá-la. própria Diana pensava que ia ser morta.
bras e pôs um ponto final a todas as sus- O burburinho sobre uma possível gravi- E, ao que tudo indica, isso seria verdade,
peitas conspiratórias, concluindo que tudo dez surgiu antes mesmo de Diana morrer uma vez que veio a público uma carta di-
se tratou de um acidente infeliz. e a especulação foi impulsionada pelos jor- vulgada por Paul Burrell, antigo mordo-
Uma das teses que chegou a ser alimen- nais franceses. Contudo, nada indicava mo de Diana, onde a princesa de Gales
tada por Mohamed al-Fayed, o pai de Do- uma gravidez no exame post-mortem. E confidenciava essa suspeita.
di, baseava-se na suposição de que Diana outros testes ao sangue de Diana também «O meu marido está a planear ‘um aci-
estaria grávida, o que motivaria o descon- apontavam no mesmo sentido. Além dis- dente’ no meu carro, uma falha nos freios
tentamento do Palácio de Buckingham e so, não há evidências sequer de que a pró- e ferimentos graves na cabeça para dei-
da rainha Isabel II. Em declarações à im- pria suspeitasse de uma gravidez, não ten- xar o caminho livre para se casar de
prensa, Fayed chegou a alegar que a famí- do mencionado qualquer possibilidade de novo», lia-se na carta.
lia real «nunca poderia aceitar que um estar grávida aos seus confidentes. De facto, Diana receava pela sua segu-
muçulmano egípcio pudesse eventual- O principal fator por trás de todas as teo- rança. Mas parece não haver nenhuma >>

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PRINCESA DIANA 25 ANOS DA MORTE

O casamento teve lugar na catedral de St. Paul O namorado Dodi al-Fayed

evidência de que realmente seria morta,


mesmo que a sua relação com alguns DIANA E O confiasse de que esta versão oficial era fal-
sa, partindo de uma intenção para enco-
membros da família real fosse conturbada. NAMORADO DODI brir um suposto assassinato. Um dos ar-
Logo após o acidente, o público em ge-
ral também depositou as culpas nos pa- AL-FAYED SAÍRAM gumentos desta teoria era que o corpo de
Henri Paul teria sido trocado, para que os
parazzis que seguiam atrás do Mercedes DO HOTEL RITZ resultados toxicológicos batessem certo
pelas ruas de Paris. Em parte isto refletia
uma preocupação que perseguira Diana EM PARIS NUM com a versão das autoridades.
Há uma série de razões pelas quais mui-
ao longo de sua vida: o interesse da im- MERCEDES COM tos acreditaram nesta tese. Nas imagens
prensa pela sua vida de forma abusiva e
intrusiva. DESTINO A UM de vigilância do Ritz, o motorista não apa-
rentava estar bêbado no início da noite,
Outro alvo das teorias de conspiração
era Henri Paul. Suspeitava-se que o che-
APARTAMENTO aparecendo por exemplo a atar os ataca-
dores dos sapatos sem qualquer dificul-
fe de segurança do Ritz, em Paris, que con- dade. Contudo, numerosos testes mostra-
duzia o Mercedes naquela noite, teria sido ram que Henri Paul continha álcool no
pago para pôr fim à vida de Diana. De sangue e de que este teria conduzido em-
acordo com os relatórios do acidente, o briagado naquela noite de agosto.
motorista estaria bêbado naquela noite, Outro dos elementos centrais das teo-
acabando por se despistar ao tentar fugir rias da conspiração é talvez o carro que
dos fotógrafos. Contudo, havia quem des- transportava Diana. Há quem afirme que

William nasceu a 21 de junho de 1982

18 LUZ 20 AGOSTO 2022


O motorista Henri Paul O acidente ocorreu a 31 de agosto de 1997

o carro tinha sido mexido e que circulava corro concentram-se em dar tratamento
a uma velocidade excessiva para o trajeto. no local antes de transferir uma pessoa
Porém, as investigações levadas a cabo para o hospital. Já no Reino Unido, opta-
pelas autoridades francesas e britânicas -se por chegar ao hospital o mais rápido
concluíram que tudo parecia estar em con- possível.
formidade com o carro, apesar de o Mer- Tal como é descrito no relatório da Ope-
cedes ter entrado no túnel a uma veloci- ração Paget, para que esta teoria tivesse
dade muito acima do limite legal. algum fundamento um número substan- INVESTIGAÇÕES
O simples facto de Diana ter chegado ao
hospital ainda com vida também foi mo-
cial de médicos e de outros profissionais
teriam de quebrar com o código de ética e
CONCLUÍRAM QUE
tivo para alimentar a especulação sobre a depois mentir em conjunto às autorida- O MOTORISTA
conduta dos profissionais de saúde que a
socorreram tanto no local do acidente
des. Algo que é pouco plausível.
Além disso, é impossível aferir se Dia-
ESTARIA EMBRIA-
como no hospital, com o povo britânico a na teria mais hipóteses de sobreviver caso GADO NA NOITE
especular que os médicos permitiram que
Diana morresse ao não oferecerem o tra-
tivesse sido levada de imediato para o
hospital. De qualquer forma, na altura,
DO ACIDENTE E
tamento mais adequado. os médicos alegaram que os ferimentos SEGUIA EM
Na verdade, a abordagem francesa em
casos de emergência é diferente da do Rei-
eram fatais.
Curiosamente, as teorias da conspira-
EXCESSO DE
no Unido. Em França, as equipas de so- ção em torno de Diana circulavam mes- >> VELOCIDADE
Harry nasceu a 15 de setembro de 1984 A princesa Diana e a rainha Isabel II

20 AGOSTO 2022 LUZ 19


PRINCESA DIANA 25 ANOS DA MORTE

Diana com a Madre Teresa de Calcutá

mo quando ainda estava viva – e, de fac-


to, era a própria que as alentava. Em 2004, VÁRIAS TEORIAS nesse projeto tem uma equipa de investi-
gadores que terão já contactado as auto-
o canal norte-americano NBC exibiu um DA CONSPIRAÇÃO ridades francesas para apurar os porme-
vídeo no qual Diana falava sobre Barry
Mannakee, um ex-guarda-costas com APONTAVAM PARA nores do trágico acidente. O objetivo, se-
gundo a imprensa internacional, é tentar
quem viveu o seu «maior amor». QUE A FAMÍLIA esclarecer o mistério que ainda persiste
«Foi tudo descoberto e ele foi expulso
[da segurança real]. Depois foi morto. REAL TIVESSE em torno do caso.
Certo é que um quarto de século depois,
Acho que foi eliminado», afirmava Dia- ORQUESTRADO a população britânica ainda guarda na me-
na nas imagens, dando a entender que a
família real teria orquestrado o acidente A MORTE DA mória a imagem de Diana como uma das
figuras mais marcantes do século XX. Des-
de carro em que Mannakee morreu.
A poucos dias de se assinalarem os 25
PRINCESA DIANA de que anunciou o seu noivado com o
príncipe de Gales, em 1981, até à sua trá-
anos sobre a data, persistem as descon- gica morte, a popularidade da educadora
fianças em torno da morte de Diana e o de infância que se tornou na ‘princesa do
próprio príncipe Harry anda a investigar povo’ nunca parou de crescer.
a morte da mãe. A viver nos EUA e re- E foi com grande tristeza que os ingle-
centemente afastado das funções reais, ses receberam a notícia da sua morte, en-
Harry anda a reunir material para escre- quanto William e Harry passavam férias
ver um livro de memórias. A trabalhar com o pai, o príncipe Charles, e os avós -

A princesa de Gales com o Papa João Paulo II Diana com o amigo Elton John

20 LUZ 20 AGOSTO 2022


Diana numa entrevista concedida à BBC, em 1995 Diana com Nelson Mandela, em 1997

a rainha Isabel II e o duque de Edimburgo nação desolada, a monarca transmitiu


- no castelo escocês de Balmoral. ao vivo uma mensagem para manifes-
Assim que a informação foi tornada ofi- tar, «como rainha e como avó», o seu
cial, um mar de gente munido de ramos profundo pesar pela morte de Diana de
de flores começou uma peregrinação de Gales.
seis dias até aos Palácios de Kensington e Assim como no seu casamento, o seu fu-
Buckingham para prestar homenagem à neral foi tratado como um espetáculo –
admirada Lady Di. 750 milhões de pessoas assistiram ao ca- A RAINHA ISABEL
Até ao dia do funeral, a 6 de setembro
de 1997, na Abadia de Westminster, o Rei-
samento de Diana e de Charles e 2,5 mil
milhões assistiram ao cortejo fúnebre.
II E A RESTANTE
no Unido viveu seis dias com o silêncio da Centenas de milhares de pessoas enche- FAMÍLIA REAL
monarquia, que já na altura era vista como
distante e fria.
ram as ruas de Londres para ver o caixão
da a ser transportado para a Abadia de
MANTEVE-SE
A tristeza coletiva provocada pela mor- Westminster, onde políticos, celebrida- EM SILÊNCIO
te de Diana forçou Isabel II a romper o si-
lêncio para viajar da Escócia ao Palácio de
des e realeza se reuniram para o funeral.
Elton John interpretou uma versão da sua
NA ESCÓCIA
Buckingham,e caminhar pela multidão música Candle in the Wind, e o irmão de DURANTE
para ver o mar de flores, um ato sem pre-
cedentes e que surpreendeu o país.
Diana, Lord Spencer, aproveitou o mo-
mento para culpar os media pela morte da
SEIS DIAS
Forçada a responder diante de uma sua irmã. Diana foi enterrada em Althorp, >> ATÉ AO FUNERAL
Diana com o tenor Luciano Pavarotti Lady Di no iate de Dodi al Fayed

20 AGOSTO 2022 LUZ 21


PRINCESA DIANA 25 ANOS DA MORTE

Diana era constantemente perseguida pelos paparazii

na propriedade da sua família em


Northamptonshire, Inglaterra. ENQUANTO problemas de saúde mental – relacionados
com a perda da mãe enquanto eram muito
Grande parte da admiração pela prince- MONARCA DIANA novos – tal como, no seu tempo, Diana que-
sa resultou do empenho que dedicou à ca-
ridade e às causas humanitárias, em es- PROCUROU brou tabus ao abraçar doentes com SIDA
para acabar com os receios sobre a doença.
pecial pelo grande envolvimento que de- ABRAÇAR CAUSAS A grande marca de Diana, contudo, é a
monstrou no combate ao HIV/SIDA e na
Campanha Internacional pela Proibição COMO A SIDA ideia de que as celebridades e as figuras
públicas podem usar essa ‘ligação’ com as
de Minas Terrestres. Mas sobretudo pela E A PROIBIÇÃO massas como agentes de mudança. Engo-
forma como se relacionava com o povo.
Esta ligação de Diana foi um legado que DE MINAS lida pela máquina real quanto tinha ape-
nas 20 anos, Diana encontrou o seu pro-
ainda hoje é seguido pelos seus dois filhos. TERRESTRES pósito ao perceber que o público ficava
Ambos adotaram a abordagem mais pró-
xima como a mãe, por oposição à figura EM ANGOLA fascinado com tudo o que fazia ou dizia.
Depois era ágil em manipular esse inte-
distante que a rainha sempre demonstrou, resse público e usá-lo a seu favor, promo-
prosseguindo a tarefa de humanizar a ins- vendo causas beneméritas, mas também
tituição real britânica. puxando o povo para o seu lado, como
À sua maneira, William e Harry têm usa- quando o casamento com Charles colap-
do a sua posição e experiência para quebrar sou, devido ao relacionamento do prínci-
tabus, falando abertamente sobre os seus pe com Camilla Parker Bowles.

Diana cumprimenta doente com SIDA Diana no funeral de Gianni Versace

22 LUZ 20 AGOSTO 2022


Diana e Dodi no Ritz em Paris Diana em Angola Elton John no funeral de Diana

Durante o seu casamento de 15 anos com ainda se encontrava no processo de defi-


o príncipe Charles, herdeiro do trono bri- nir a sua vivência pós-monarquia. Agora,
tânico, Diana transformou-se numa das Harry atravessa um processo semelhante
pessoas mais famosas e fotografadas do após se ter afastado de seus deveres como
mundo. A sua história de vida serviu de membro da realeza em 2020. Aos 37 anos
inspiração para inúmeros livros, progra- – um ano mais velho que Diana quando
mas de televisão e filmes e a sua imagem ela morreu – Harry disse que queria con-
apareceu em inúmeras capas de revistas, tinuar o legado da mãe. DIANA ENQUANTO
ao longo dos anos.
O fascínio com a sua vida pessoal e a
«Não tenho dúvidas de que a minha
mãe ficaria incrivelmente orgulhosa de
AGENTE
perseguição pelos paparazzi foi ainda mais mim. Estou a viver a vida que ela queria DE MUDANÇA
exacerbada após a sua separação de Char-
les em 1992. Com o surgimento das acusa-
viver para si mesma, a viver a vida que
ela desejava que pudéssemos viver. Então,
ERA ÁGIL EM
ções de infidelidade de ambos os lados, o não só sei que ela está incrivelmente or- MANIPULAR
casal acabou por se divorciar oficialmen-
te a 28 de agosto de 1996. Mesmo depois
gulhosa de mim, mas que ela me ajudou
a chegar aqui – e eu nunca senti sua pre-
O INTERESSE DO
do divórcio, Diana continuou o trabalho sença mais do que senti no último ano», PÚBLICO A FAVOR
humanitário que havia iniciado ainda
como membro da família real.
declarou após a mudança para os Estados
Unidos, onde agora reside com a mulher
DAS CAUSAS
Antes do acidente que lhe roubou a vida, Meghan Markle e o filho Archie. QUE DEFENDIA
O funeral de Diana na abadia de Westminster Harry, Meghan e Archie

20 AGOSTO 2022 LUZ 23


CONTO
I PARTE

AS SIAMESAS
Duas irmãs siamesas são vendidas a um circo
e tornam-se a atracção principal.Entretanto,
aparece um médico que se propõe separá-las.

TEXTO João Cerqueira

E
u e a Mara somos inseparáveis, da de um relógio. Olhava-nos espantado, ar-
não por vontade própria, mas por regalando os seus olhos cinzentos.
estarmos unidas pelas ancas. Te- - Estão mesmo presas uma à outra? Não há
mos catorze anos, um metro e nenhum truque?
cinquenta de altura, cabelos ne- - Apalpe, apalpe – disse o nosso pai, orgu-
gros, olhos esverdeados, narizes lhoso, apontando para as nossas ancas.
pequenos e bocas com lábios fi- O senhor Knut meteu a sua mão peluda no
nos. Geralmente, estamos de acordo com o nosso corpo, puxou cada uma por um braço
que fazer e para onde ir, mas, quando isso não e abanou-nos até ficar convencido.
acontece, eu imponho a minha vontade. - Diabos me levem. Estas criaturas são como
Como a nossa mãe não nos deixou ir à esco- se fossem uma só. Quanto quer por estes
la, mal sabemos ler e escrever. Ela dizia que monstrinhos? rasgado e enxotou-nos para um canto da ca-
éramos um castigo de Deus e só falava con- - Por cem dólares pode ficar com elas – dis- ravana onde dormimos alguns meses.
nosco para nos dar ordens ou insultar. Um dia, se o nosso pai. A Sheila era uma mulher alta com olhos
durante a Exposição Pan-americana[1], fugiu O senhor Knut riu-se. azuis e cabelos pretos; a sua barba não pas-
de casa e nunca mais soubemos dela. - Por esse preço posso comprar três maca- sava de uns tufos de pêlo espalhados pelo ros-
Uma semana depois, o nosso pai levou-nos cos. E, como aberração, já tenho a mulher com to. Deveria ter cerca de quarenta anos – nin-
ao circo. Havia uma grande tenda com riscas barbas. Dou-lhe metade. guém sabia a sua idade e nunca tivemos co-
brancas e vermelhas, seis caravanas onde vi- - Combinado – disse o meu pai. Assine es- ragem de lhe perguntar – e já tinha estado
viam os artistas e duas jaulas onde estavam tes papéis e trate-as bem. noutros circos antes de trabalhar para o se-
os leões. Cheirava a algo podre. No entanto, nhor Knut. Ao contrário da nossa mãe, só nos
nós não fomos lá para ver o espectáculo, mas * batia quando não lhe obedecíamos. Foi ela
sim para nele participar. O nosso pai levou- Desde esse dia tornamo-nos pertença do se- quem nos ensinou a estar diante do público
-nos ao circo para nos vender. nhor Knut e começamos a aprender a ser es- pois o nosso número consistia, tão-só, em nos
- Chamam-se Lili e Mara. São espertas, fa- trelas de circo. Fomos instaladas na tenda da mostrarmos às pessoas.
zem tudo o que lhes mandar e comem pouco. mulher barbuda, a Sheila, e a primeira coisa No dia seguinte acordamos com pontapés
– disse para o senhor Knut, o dono do circo. que ela fez foi ameaçar-nos. dados pela Sheila e o senhor Knut apresen-
O senhor Knut era um homem atarracado - Eu sou a atracção principal do circo e isto tou-nos ao resto da companhia. Conhecemos
com o rosto vermelho e o cabelo e as suíças vai continuar assim. Se fizeram alguma coisa Sílvio e Zita, o casal de trapezistas que voa-
cor de ferrugem. Vestia um fato preto com um para me prejudicar, racho-vos ao meio. vam sem rede; Hector, o domador de feras;
colete lilás onde se via uma corrente pratea- De seguida atirou-nos com um cobertor Peng, o faquir; Nina, a contorcionista; Tico, o

24 LUZ 20 AGOSTO 2022


relados; fez-nos festas na cabeça como se fos-
semos animais.
Na sessão dessa noite fizemos a nossa pri-
meira apresentação, tendo o senhor Knut de-
cidido que apareceríamos no final do espec-
táculo. Ele queria expor-nos seminuas, para
que toda a gente visse a carne que nos une,
mas, como havia o risco de o circo ser fecha-
do por ultraje à moralidade, usamos os nos-
sos vestidos mais curtos.
«Não me desiludam meninas, investi mui-
to dinheiro em vós». – disse.
O circo estava cheio e o público fazia um
barulho medonho. Havia um cheiro a suor
horrível. Dois focos amarelados iluminavam
o centro do recinto e o resto era escuridão.
Depois do senhor Knut saudar a assistência
e anunciar que iriam ver o maior espectácu-
lo do mundo, entrou em cena Tico. Mal ele
apareceu, ao som de uma corneta tocada por
Peng, o circo quase vinha abaixo, tamanhas
eram as gargalhadas das pessoas. Tico vestia
um fato amarelo com bolas azuis, tinha a face
pintada de branco, os lábios de vermelho e
as pálpebras de preto. Começou por dar cam-
balhotas para a frente e para trás como fazem
as crianças. De seguida imitou animais an-
dando de gatas, batendo no peito com os pu-
nhos e emitindo os rugidos – se eu e a minha
irmã fizéssemos estas palhaçadas em casa, a
nossa mãe dava-nos uma coça. Por fim Tico
tirou um balão do bolso e começou a enchê-
-lo simulando um esforço tremendo para o
conseguir. Esteve nisto alguns minutos - com
Peng a soprar mais forte a corneta sempre
palhaço anão; e Madame Rita, a vidente. Síl- que ele deixava esvaziar o balão – até que,
vio e Zita eram emigrantes italianos, ele tinha por fim, disse palavras sem nexo, encheu o
o cabelo negro encaracolado, olhos cor de peito de ar e fez rebentar o balão. O público
amêndoa e era forte, ela tinha cabelos loiros, riu ainda mais e algumas pessoas atiraram-
olhos verdes e era magra; foram os únicos que -lhe moedas. Tico apanhou-as, fez uma vé-

‘CHEGOU POR FIM nos sorriram e deram um beijo. Hector era ca-
reca, tinha metade da cara desfeita pela pata
nia e saiu de cena em dando saltos ridículos.
Toda a gente estava feliz, excepto o próprio
A NOSSA VEZ, UMA de um leão, um único olho azul e tresandava
a álcool; cuspiu para o chão como forma de
Tico que nunca se ria.
De seguida entraram Sílvio e Zita, vestidos
VEZ QUE O SENHOR nos cumprimentar. Peng era descendente de com fatos brancos cheios de brilhantes cola-

KNUT DECIDIRA chineses, tinha olhos e cabelos negros e a pele


cor de cobre; fez uma vénia para nos saudar.
dos ao corpo – e foi então que percebi que Síl-
vio era o homem mais bonito do mundo. Os
QUE NA NOSSA Nina era negra, tinha olhos castanhos, era
quase da nossa altura e pouco mais velha do
trapezistas saudaram o público e depois come-
çaram a trepar por uma escada de corda que
ESTREIA APARECE- que nós; apertou-nos a mão sem dizer uma os levava até uma plataforma onde estavam

RÍAMOS AO palavra. Tico media noventa centímetros e ti-


nha uma cabeça enorme com cabelos loiros
dois trapézios. Quando chegaram lá cima, ilu-
minados pelos focos amarelos, pareciam dois
LADO DE SHEILA, A e olhos azuis; aproximou-se de nós, cheirou-
-nos e fez uma careta. Madame Rita era ciga-
bonecos – o público fez silêncio e eu rezei para
que nada acontecesse a Sílvio. Entretanto, cá
MULHER BARBUDA’ na, tinha os cabelos cinzentos e os olhos ama- em baixo, o senhor Knut anunciava que eles >>

20 AGOSTO 2022 LUZ 25


CONTO I PARTE

eram os únicos no mundo que se atreviam a


actuar sem rede, desafiando a morte. Zita foi
a primeira a lançar-se no vazio. Primeiro sen-
tou-se na barra como se estivesse num ba-
loiço, depois agarrou-se ao trapézio com as
mãos e por fim pendurou-se de cabeça para
baixo dobrando as pernas e voou duas vezes
para cada lado – o público soltava um ‘’ooh’’
de espanto. Depois foi a vez de Sílvio se lan-
çar no outro trapézio. Músculos impressio-
nantes apareceram nos seus braços e o seu
corpo balançou-se a grande velocidade so-
bre as nossas cabeças. Cada vez que se cru-
zava com Zita parecia que ia chocar contra ela,
mas os dois passavam rente um ao outro sem
nada acontecer. Com os seus fatos brancos e
movimentos graciosos, voando nas alturas,
já não pareciam bonecos, mas dois anjos so-
prados por Deus. E, por momentos, vi mes-
mo Sílvio com um par de asas nas costas,
como um querubim bondoso que brinca no
céu acima deste inferno onde nós vivemos.
Então, num dos momentos em que se cruza-
vam, Zita soltou-se do seu trapézio, pairou al-
guns segundos no ar e, quando começou a
cair, foi agarrada pelas mãos fortes de Sílvio
que a segurava de cabeça para baixo – e o pú- ção final, lhe dar pontapés nas costas. Mas es- Nina nem um minuto ficou presa pois pouco
blico soltou o maior ‘’oooh’’ da noite. Tal como tas feras eram mais doceis do que a minha depois apareceu Peng, anunciado como um
eu e a Mara, os dois formavam agora um só mãe pois Hector não tinha necessidade de as faquir que em tempos havia servido um im-
corpo com duas cabeças, unidos, não pelas fazer sangrar para que elas se sentassem numa perador chinês. Peng, usando apenas umas
ancas, mas pelos braços. Porém, ao contrário espécie de bancos e ficassem quietas. E pou- calças pretas atadas com uma corda, tinha
de nós, a morte podia separá-los. Tive então co mais acontecia do que isto, não se atreven- uma tocha numa mão e uma garrafa na ou-
um pensamento mau: Sílvio podia largá-la, do Hector a meter a cabeça dentro das suas tra e ia soprando chamas pela boca como um
vir buscar-nos e, ainda que por alguns ins- bocas ou sequer a tocar-lhes – o meu pai era dragão. O público voltou a aplaudir e Peng li-
tantes, seriamos os três felizes. Mas logo me muito mais corajoso do que ele e o circo da bertou Nina da sua prisão. Então ela foi-se en-
arrependi, e eles venceram a morte uma vez nossa casa muito mais perigoso. costar a uma placa de madeira, juntou os bra-
mais e desceram do céu à terra. De seguida veio Nina, apresentada pelo se- ços às coxas e ficou imóvel. Peng abriu um
Depois houve uma pausa para se coloca- nhor Knut como a mulher de borracha, com saco que Tico trouxera e tirou a primeira faca.
rem as grades que protegiam o público dos um vestido que parecia o mesmo que Zita Mostrou-a ao público para que todos vissem
leões. Então, o senhor Knut anunciou a vin- usou. Nina dobrou e esticou o corpo de uma o perigo daquela arma, depois voltou-se para
da de temíveis feras africanas que já tinham forma que não julgava que fosse possível, che- Nina, puxou o braço atrás e, descontraído
comido homens. Hector entrou para a jaula gando a levar um pé à boca e a tocar com os como quem atira uma pedra para um lago,
em tronco nu com um chicote e uma cadei- calcanhares na cabeça. O público, porém, não lançou a faca. A lâmina cravou-se a dois de-
ra e abriu uma portinha por onde saíram dois se mostrou impressionado pois ninguém lhe dos do pescoço dela e o público soltou um
leões e uma leoa. E as temíveis feras eram ani- bateu palmas. Então, no momento alto da sua novo ‘’oooh’’. De seguida, Peng lançou mais
mais velhos e magros com o pelo estragado actuação, ela abriu uma caixa de vidro que cinco facas que se espetaram também muito
que, mesmo assim, intimidaram o público. não teria mais de meio metro de altura e com- próximas da carne de Nina, fazendo percutir
Os animais rugiam mostrando dentes amare- primento, entrou lá para dentro, sentou-se e a madeira e desenhando o contorno do seu
lados e garras afiadas, mas Hector estalava o depois torceu o pescoço até enfiar a cabeça corpo. Aquilo lembrou-me de novo a nossa
chicote e eles recuavam. De repente, esta cena entre as pernas – nessa altura Tico entrou ra- mãe quando uma vez pegou na faca de esca-
fez-me lembrar a minha mãe e o meu pai pidamente em cena e fechou a caixa. Ao ver mar o peixe e atirou-a contra o nosso pai, com
quando discutiam. Ele rugia como uma leoa isto recordei-me de quando a nossa mãe nos a diferença de que ela tinha mais pontaria do
e ele dava-lhe chicotadas com o cinto até a castigava fechando-nos dentro de um baú du- que Peng e acertou-lhe no peito quase o ma-
domar completamente fazendo-a cair ao rante algumas horas, o que nos obrigava a fa- tando. Então, para terminar o show, Peng pe-
chão, cheia de sangue, para depois, como li- zermos as nossas necessidades lá dentro. Mas gou num machado e desta vez concentrou-

26 LUZ 20 AGOSTO 2022


dilha de ferros, deu a mão a Peng e juntos, Segundos depois, de novo com uma voz es-
como um casal feliz, fizeram uma vénia. Terá tranha, Madame Rita falou pelo morto.
havido um tempo que o nosso pai e a nossa - O dinheiro foi entregue à caridade e o fi-
mãe, depois de atirarem facas e copos um ao lho da criada é do padeiro.
outro, faziam as pazes e davam as mãos? A mulher benzeu-se.
Foi então a vez de Madame Rita, apresen- - Perdoa-me Gabriel, nunca deveria ter
tada como vidente que comunicava com os desconfiado de ti – e começa a chorar.
mortos, entrar em cena. Apareceu com um Madame Rita levanta-se, abraça-a e, deli-
lenço preto na cabeça, uma blusa vermelha cadamente, leva de volta para o seu lugar.
e uma saia verde que lhe escondia os pés. Fez- A maioria do público continuou em silên-
-se silêncio. A sua figura assustou mais o pú- cio, mas algumas pessoas assobiaram.
blico do que os leões. As luzes foram desliga- Ocorreu-me então que também pode-
das e ela sentou-se diante de uma mesa com ria fazer algumas perguntas a Madame Ri-
duas velas – nos bastidores, Peng tocava um ta sobre a nossa mãe: onde é que ela esta-
violino. Aquela luz ténue fazia desaparecer- va? Por que se foi embora? Será que algu-
-lhe o corpo e dava ao seu rosto um ar fan- ma vez gostou de nós?
tasmagórico. Talvez por ela parecer uma cria- Chegou por fim a nossa vez, uma vez que
tura do outro mundo, ninguém estranhou que o senhor Knut decidira que na nossa estreia
pudesse falar com os defuntos. O senhor Knut apareceríamos ao lado de Sheila, a mulher
convidou então o público a avançar. Um mur- barbuda. Fomos apresentadas como as maio-
múrio percorreu a assistência, mas ninguém res aberrações do mundo, erros medonhos
se mexeu. O senhor Knut insistiu, dizendo da natureza, umas criaturas algures entre o
para não terem medo. Pouco depois, um pou- humano e animal. Então, ao som da corneta
co embaraçada, uma senhora de meia-ida- de Peng, entramos as três na arena do circo.
de toda vestida de preto, levantou-se e foi ter Sheila vestia uma tanga a imitar pele de tigre
com Madame Rita. para mostrar que tinha corpo de mulher e nós
-se antes de o lançar. Nina continuava im- - Queria falar com o meu marido, ele mor- os referidos vestidos curtos para que o públi-
passível, como se aquelas lâminas que a po- reu há um ano - disse a senhora. co visse o máximo do nosso corpo. E o públi-
diam matar não passassem de mosquitos que - Como é que ele se chamava? co desatou a rir como se fossemos palhaços,
zumbiam por perto sem a picarem. Peng ati- - Gabriel Watson. muito mais cómicos do que Tico, embora não
rou o machado, a arma voou rodando sobre Madame Rita colocou as mãos nas fontes e fizéssemos nada de engraçado. De mão dada
si própria, ouviu-se um silvo e, subitamente, começou a chamar pelo defunto com uma com Sheila demos uma volta à arena – e as
o estrondo da lâmina contra a madeira. O ma- voz lenta e arrastada. pessoas iam-nos chamando anormais, bes-
chado cravara-se rente à sua orelha, não a de- - Gabrieeeel, vem Gabrieeeel, a tua mulher tas e outros insultos. Então o senhor Knut con-
cepando por milímetros. O público aplaudiu está aqui. vidou uma pessoa para vir comprovar que
entusiasticamente, Nina saiu daquela arma- A mulher juntou as mãos e começou a rezar. éramos autênticas aberrações e vários ho-
Madame Rita continuou a chamar pelo mor- mens engalfinharam-se para terem esse pri-
to durante algum tempo até que, de repente, vilégio. Por fim, entrou na arena um homem
começou a falar com uma voz estranha. gordo com rosto de bebé que tinha conquis-
- Quem és tu e o que queres de mim? tado o direito de nos tocar à custa de socos e

MADAME RITA O público soltou um novo ‘’ooh’’ e a mu-


lher caiu de joelhos. Madame Rita explicou
empurrões, mas que, quando ficou diante de
nós, pareceu ter perdido a coragem. E foi Shei-
APARECEU COM que já tinha conseguido entrar em contacto
com o morto e prosseguiu a conversa, recu-
la quem lhe pegou numa mão e o fez puxar a
sua barba. O homem começou então rir-se,
UM LENÇO PRETO perando o seu tom de voz normal. um riso estúpido como já tinha visto nos de-

NA CABEÇA, UMA - Sou Madame Rita e a tua mulher está aqui


para te fazer perguntas.
ficientes mentais, avançou para nós e apal-
pou os nossos corpos de cima a baixo, explo-
BLUSA VERMELHA - Estou à vossa disposição – disse com a voz
estranha de novo.
rando os seios e as nádegas com a língua de
fora, babando-se, já pouco importado em
E UMA SAIA VERDE - O que quer saber? – perguntou Madame comprovar se estávamos presas. Uma vez, um

QUE LHE ESCONDIA Rita à mulher.


- Pergunte-lhe onde escondeu o dinheiro
homem que a nossa mãe levou a casa fez-nos
o mesmo, meteu a mão dentro das calças e
OS PÉS. FEZ-SE e se o filho da criada é dele – sussurrou.
- Ele ouviu, aguardemos a resposta – disse
sacudiu-a até mandar um berro. Depois, deu-
-lhe uma nota e foi-se embora.
SILÊNCIO... Madame Rita com a sua voz normal. [1]
1901

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CHALANA

Chalana
A volta à Gália
«Quand il est mort, le poéte...»
Aventuras de um Português em França
ou a Outra Vida de Fernando Chalana,
ao qual chamavam Chalaná. Alegrias e tormentos
contados por quem os viveu de perto essa fase
que deveria ter sido maravilhosa e se tornou
num pesadelo. Ironicamente, até o seu nome
vem do francês – Chaland.

TEXTO Afonso de Melo

O
eco da morte de Fernando lugares e das suas pombas. E que gostava de agudo, oxítono, dava a sensação que algo
Chalana continua a perdu- os ter perto. A antítese do emigrante. E, no estava aí para acontecer, algo que ninguém
rar na batida do coração de entanto, depois do Campeonato da Euro- estava preparado para adivinhar. Repare-
cada um que foi, verdadei- pa de 1984, foi para Bordéus, envolto no pó -se noutro pormenor, insuspeito, mas pra-
ramente, seu amigo. O fei- de ouro das estrelas e havia um altar à sua ticamente premonitório. O seu nome vem
ticeiro do drible, o poeta do espera, logo para ele, imagine-se, para o do francês: Chalana – fomos buscá-la ao
futebol fantasmagórico – nosso Fernando que era um rapazinho que castelhano, tal como está mas, por sua vez,
porque ele, como um espírito, incorpóreo, não queria crescer, como Peter Pan, obri- tem a sua raiz em França, Chaland, onde
parecia atravessar adversários como fan- gado a ser homem muito cedo, ainda im- surgiu vinda da Grécia, Khelándion, um
tasmas no seu caminho aos ziguezagues, berbe não fora aquela sua barba farta de barco de pesca de fundo chato, uma fraga-
em frente, sempre em frente –, teve uma sabedor dos Evangelhos. ta, se quiserem, sempre tem mais a ver
vida para lá da vida que lhe conhecemos, Chalana foi, em França, outro Chalana. com o Tejo e com o Barreiro, onde o Fer-
no Barreiro, na Luz, ultimamente no Sei- Chalaná, como lhe chamavam, repare-se nando surgiu na face da Terra a 10 de Fe-
xal. Era um homem que gostava dos seus a forma como o seu nome passou a ser vereiro de 1959, já pronto para brincar com >>

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Chalana em Bordéus –
os franceses nunca
conseguiram
compreendê-lo

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CHALANA

«O PÚBLICO
FRANCÊS NUNCA
PERCEBEU
CHALANA. MAS
a mágica senhora das paixões (a bola) e SEMPRE GOSTOU nha. Praticamente invencíveis dentro do
correr como um menino pela eternidade,
para usar as palavras do Torga. «Chalana MUITO DELE» - Hexágono. Bela carreira na Taça dos Cam-
peões Europeus: Athletic Bilbao (3-2 e 0-
n’a jamais été compris par le public français
mais a toujours été aimé», diz-me Eric Biel-
ERIC BIELDERMAN -0); Dínamo Bucareste (1-0 e 1-1); Dnipro
Dnipropetrovsk (1-1 e 1-1, com desempate
derman, mon pote, camarada de tantas jor- por grandes penalidade e Fernando Chala-
nadas no futebol e sem ele, o grande jor- na a marcar o decisivo, com o pé direito,
nalista da sua (nossa) geração no L’Équipe pois claro. «Eles não percebiam», contou-
e no France Football, que era editor da sec- -me o próprio Chalana, certa vez, em ca-
ção internacional ao mesmo tempo que vaqueira. «Perguntavam-me - “mas então
eu ocupava idêntico lugar em A Bola. Gil- tu és gaucher (canhoto) e marcas o penal-
bert Bécaud, Monsieur 100.000 Volts, poderia ti com o pé direito?” E eu ria-me: “quem
cantar em memória do Fernando: «Quand mulher, Cristina, provavelmente o ampa- vos disse que sou canhoto? Nunca fui. Só
il est mort, le poète/Tous ses amis/Tous ro que nunca teve. treinei tanto o pé esquerdo que para mim já
ses amis/Tous ses amis pleuraient/Quand A Volta à Gália. Tudo parecia estar no não havia diferença entre um e o outro”».
il est mort le poète/Le monde entier/Le seu lugar. Baixinho (1m65), bigode farto, O Eric recorda-se bem desse momento:
monde entier pleurait/On enterra son cabelo longo, geralmente arrumado em «Chalana deixou uma marca na alma de
étoile/Dans un grand champ/Dans un cachos atrás das orelhas. Pois... pois... fal- todos os girondinos quando marcou aque-
grand champ de blé». Não, Chalana não tava-lhe apenas o capacete com asas. A le penalti contra Dniepr na Taça dos Cam-
foi enterrado num grande campo de trigo poção mágica? Caiu nela ao nascer. A po- peões, no desempate. Entrou na lenda do
onde a brisa despenteia as pétalas da amo- ção mágica que lhe permitia, simples mor- Bordéus porque toda a gente achava que
reira. Continua a correr e a fintar defesas tal (é estranho, só agora, ao escrever, per- ele era esquerdino e, de repente, decide a
confusos para sempre dependurado na pa- cebo que o Fernando era, de facto mortal, eliminatória com um pontapé rasteiro e
rede branca da nossa memória. tão mortal que morreu mesmo, à revelia tranquilo feito com o pé direito. Foi no dia
Que falhou a Chalana em França? A per- de todas as nossas vontades) fazer coisas 20 de Março de 1985. Aí sim, de repente
gunta infiltra-se por entre o nevoeiro de que só as personagens de todas as mito- Chalana voltou a ser o mágico que levara
um certo esquecimento. Porque, entre nós, logias são capazes de fazer. o Bordéus a pagar por ele uma soma re-
Fernando em França foi como Che Gueva- Eric Bielderman: «Chalana manteve- corde do futebol francês, qualquer coisa
ra no ano em que esteve em parte nenhu- -se sempre um mistério. Muitas vezes como 18 milhões de Francos. De tal modo
ma. Com a diferença que não foram um, brilhava intensamente mas, noutras, tor- festejado por todos os seus companhei-
foram dois, até ser positivamente resgata- nava-se transparente. Toda a gente es- ros, que saltaram em bloco sobre ele, que
do de volta ao Benfica, o clube da sua vida. perava pela sua súbita explosão. Havia esteve à beira de perder os sentidos. Em
«Nunca ninguém conseguiu perceber a aquela expectativa. Tínhamo-lo visto a seguida foi como se desaparecesse».
presença muito forte da sua mulher, Ana- ser fantástico no Campeonato da Euro- A final, ainda assim, foi sonhada. Seria
bela, e não foi fácil descobrir o seu carácter pa, fazia parte da fortíssima equipa do a segunda final europeia de Chalana de-
discreto, sempre humilde. Mas, atenção!, Bordéus de 1984 a 1987. Foi campeão de pois da que jogou contra o Anderlecht pelo
todos adoravam a sua gentileza e a suavi- França. E, no entanto, era como se con- Benfica para a Taça UEFA. Apesar de uma
dade do seu sorriso. Foi sempre como uma tinuássemos à espera». garra que vinha lá do fundo da sua alma
criança para nós, franceses», continua Eric. «Tranquillité, sérénité, plénitude», dizia girondina, a Juventus foi demasiado forte
a imprensa da Gália sobre o Bordéus cam- na meia-final: 0-3 e 2-0. «Não jogou mais
O mistério de Chalana peão em 1985. «Le Récital Girondin!». Cha- do que 18 jogos em três anos de Bordéus
Criança, menino, são expressões que se lana estava lá. O treinador era Aimé Jacquet, para todas as competições. Ganhou a al-
repetem, em português ou em francês, en- futuro campeão do mundo em 1998. E ha- cunha de O Jogador de Um Milhão. Um
tretanto traduzido. Deus, um deus qual- via Giresse, o senhor do meio-campo, por cada partida. Mas ninguém, aqui em
quer, criou-o para ser criança, para ficar Dropsy, guarda-redes, Battiston, o homem França, esquecerá o menino do bigode!»
sempre criança, mas abandonou-o a meio que quase foi assassinado por Schumacher Torga outra vez quando termino dizendo
do caminho e mandou-o seguir, sozinho no Mundial de Espanha, Jean Tigana, o ma- que desejava deitar-se no banco mais
ou mal acompanhado, o resto da sua vida, ratonista, Bernard Lacombe, o elegante, Die- comprido que vagasse e pudesse dormir.
apesar de, no fim dela, ter encontrado na ter Müller, o avançado gigante da Alema- Em paz… >>

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1.
1. O gesto simples, o fio de ouro que costumava morder enquanto partia à desfilada, a camisola de um clube completamente novo 2. Segundo a con-
tar da esquerda da linha de baixo de uma equipa campeã de França com categoria e brilho 3. Queria ter ficado com o número dez mas este já tinha
um dono, e um dono de importância: Alain Giresse

2. 3.

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CHALANA

1.

1. Com a mulher da altura, Anabela, bem mais velha do que ele – algo que para a direcção do clube não fazia sentido na hora de falarem os dois com
a mesma voz 2. Tempos felizes de um homem apaixonado 3. Até treinavam juntos, se preciso fosse: eram um casal inseparável até ao momento em
que tudo se desmoronou

2. 3.

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Primeiro treino em Bordéus
Tenso e ansioso, com as pernas a tremer
TEXTO Joaquim Rita

Desafiado pelo meu velho camarada Afon- entusiasmo. Battiston era, porventura, o cuidar do seu material, inclusive das bo-
so de Melo, “regresso” agora a Bordéus, 38 mais surpreendido, quando me pergun- tas. Reagiu assim: «Agora terei de ser eu
anos depois. tou se «ele joga sempre assim?».  a comprar pomada e uma escova para en-
15 de Julho de 1984. graxar as botas… Meu querido José Luís
Depois de ter viajado de carro (!…) des- Roupeiro… só nos jogos (referia-se ao roupeiro do Benfica). Aqui
de Abrantes, de onde saíra mais de vinte e , o roupeiro só nos dias de jogos…».
quatro horas antes, Chalana chegou final- COMPRAR POMADA
mente a Bordéus. E ENGRAXAR AS BOTAS A 10 era do Giresse
Estava à sua espera. Fernando Chalana encontrou em Bor-
Visível e compreensivelmente cansado, déus hábitos (e costumes!…) muito dife- CHALANA NÃO QUIS
Aquele que, semanas antes, fizera esbu- rentes daqueles a que estava habituado A CAMISOLA 11…
galhar de espanto os olhos da Europa do no Benfica. No Benfica, Chalana já tinha estatuto para
futebol, preparava a sua aventura num Antes do primeiro treino foi-lhe entre- usar a camisola 10 (como Pelé, Eusébio,
«mundo novo». gue um saco, contendo todo o equipamen- Maradona ou Platini). Todavia, ao chegar
A noite terá sido «percorrida» apressa- to de treino, botas e toalha para o banho. a Bordéus, o número dos «seus amores»
damente. Oito horas depois Chalana apre- Chalana não contava com a «oferta». já tinha dono – e que dono!
sentava-se para o primeiro treino sob o Mais: foi informado que teria de ser ele a «Tenho predilecção pela camisola 10,
comando de Aimé Jacquet. mas já sei que não a poderei usar, é do
Tenso, ansioso, fechado, nem o bigode Giresse. Aqui é como no Benfica, os mais
farto lhe servia de disfarce. Mais tarde con- antigos tem direitos neste aspecto».
fessou-me que as pernas lhe tremiam… Sugeri-lhe a camisola 11. Voltou a não
… Como, visivelmente, lhe tremiam as me «ouvir»… – «Não, não gosto desse
mãos, quando das muitas solicitações para número, como não gosto de números ím-
dar autógrafos. pares. Nunca gostei. Vou ver se consigo
Entrou no balneário, do qual foi o últi- a 8. Desde que seja um número par, não
mo a sair antes de chegar ao relvado, onde haverá problema. No Europeu joguei com
os novos companheiros, em pequenos a 4 e as coisas saíram-me bem».
grupos, iam trocando a bola entre si.
Acompanhamo-lo da cabina ao relvado TREINO a 10 FRANCOS
e ouvi-lhe a primeira queixa: «As botas PARA VER CHALANA…
são pesadas, tem muitos pítons, embora
de borracha». O ingresso de Chalana no Bordéus impli-
Animei-o: «Quem sabe como tu, até cou números gigantescos.
joga descalço». Não terei sido convin- Tratou-se da transferência mais cara do
cente… futebol francês: 18 milhões de francos para
Entrou, finalmente, no relvado, sem sa- o Benfica (mais de 300 mil contos…). Para
ber para onde se dirigir, que grupo esco- Chalana ficou destinado um «bolo» de 7
lher para se integrar na troca de bola. Foi milhões de francos, a receber nos três
o defesa Rorh quem o «ajudou» passan- anos de contrato, incluindo ordenados e
do-lhe a bola pela primeira vez. prémios.
Terá sido um alívio… O bulício da transferência ficou subli-
Poucos minutos volvidos, o técnico Ai- nhado com algo de inédito no clube: 10
mé Jacquet distribui-lhe um colete… en- francos para ver o primeiro treino de
carnado. Chalana.
Depois, sim, tudo se lhe tornou mais fá- O Bordéus tentava tudo para amenizar
cil, quando utilizou a sua «linguagem». o estremeção financeiro resultante da
No final do treino, Chalana já parecia aquisição do «mais espectacular jogador
«outro». E os colegas não escondiam o do Euro-84».

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BIBLIOTECA
PESSOAL

JOSÉ CABRITA
SARAIVA

Bendito Benedikt
A Taschen orgulha-se de ser uma editora democrática.
Mas não o é apenas pelos preços acessíveis que pratica.

U
ma vez por ano, a meio do verão, ne, pintor nascido numa aldeia da atual Li- pecializada, se não aborrecida, os autores
a editora Taschen promove no seu tuânia (então império russo) que nas suas da Taschen preferem em geral uma escrita
site alguns dias de saldos, com telas deformava os objetos e as pessoas só viva, sem grandes divagações ou floreados,
descontos a que os amantes de li- para os tornar mais reais. Ou o suptuoso ál- por vezes empolgante. Ora aí está mais uma
vros têm dificuldade em resistir. Há dois bum, forrado a tecido, dedicado à vida e obra manifestação do seu caráter ‘democrático’.
anos encomendei aí um belíssimo catálo- de Peter Beard, um fotógrafo americano que
go (formato XXL, 492 págs., 6 kg) com a
obra completa de Pieter Bruegel, o velho,
privou com Salvador Dalí, Andy Warhol,
Jacqueline Onassis e Mick Jagger, embora a Ccado
uriosamente, o primeiro livro publi-
por esta editora, em 1980, foi uma
mestre quinhentista autor de pinturas cé- sua grande paixão, onde se sentia verdadei- banda desenhada, Sally Fort – que, a ava-
lebres como Os Caçadores na Neve, O ramente feliz, fosse a África selvagem. liar pela capa, devia ser vagamente eróti-
Triunfo da Morte e a A Torre de Babel. No ca ou até um pouco mais do que isso. Be-
ano passado, foi a vez de mandar vir um
álbum com os desenhos de papagaios fei-
tos por Edward Lear (1812-1888), poeta
D evido aos preços baixos que pratica, a
Taschen orgulha-se de ser uma editora
democrática. Creio que esse traço também
nedikt Taschen, o fundador, ainda não ti-
nha sequer 20 anos. Não foi propriamente
um sucesso. Em 1982 publicou uma se-
genial e artista não menos dotado. Este ano se manifesta nos textos que publica. En- gunda BD, Ray Banana, que só agravou a
– sempre com generosos descontos – con- quanto muitos livros de história da arte se sua situação.
segui finalmente deitar a mão a The Char- caracterizam por uma prosa altamente es- O fim da curta vida da casa editorial de
lie Chaplin Archives, que reúne um ma- Colónia parecia cada vez mais próximo.
nancial quase inesgotável de fotografias e Em 1984 Benedikt lançou a última carta-
documentos sobre o grande cineasta e ator. da. Com dinheiro emprestado, comprou
por atacado 40 mil exemplares de um li-

É preciso que se diga: os descontos são


apenas um bónus. Regra geral, os livros
da Taschen são tão em conta e bem produ- Depois de publicar
vro sobre o surrealista belga René Magrit-
te que aparecera no mercado não se sabe
por que artes mágicas (mas provavelmen-
zidos que valem cada cêntimo. E sei bem
do que falo. Ao longo dos anos já acumulei
dois álbuns de BD, te de alguma editora entretanto falida). À
venda por 9,95 marcos, os 40 mil exem-
uma boa meia centena ou mais deles – des- o fim da casa plares voaram em poucos dias. Justifica-
de os exemplares da série básica (formato
a4, menos de cem páginas) que comprei editorial de Colónia -se plenamente o slogan ‘Books for optimists’.
‘Livros para optimistas’: com esse golpe
com as primeiras mesadas, a outros mais
caros e mais raros. Nesta categoria inclui-
parecia cada vez de sorte e o sucesso que conheceu de en-
tão em diante, o seu fundador tem bons
ria o Catalogue Raisonné de Chaïm Souti- mais próximo motivos para ser um deles.

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DESTINO IMPROVÁVEL
GOA, MOÇAMBIQUE

A ILHA DE GOA
QUE ILUMINA
A DE MOÇAMBIQUE
A pequena ilha de Goa sustenta um farol
já secularà entrada da Baía de Mossuril.
A sua torre listada sinaliza a primeira escala
de um périplo de dhow deslumbrante
em redor da velha Ilha de Moçambique.

TEXTO Marco C. Pereira FOTOGRAFIA M. C. Pereira e Sara Wong

A
pós uma aturada seleção e zar-nos com Omar, um jovem vendedor tripulantes. Instantes depois, zarpamos
negociação, por fim, chega- de chamuças que percorria a Ilha de Mo- para a baía de Mossuril, apontados ao ex-
mos a um acordo. Apesar da çambique com um grande frasco ao om- tremo norte da Ilha de Moçambique e à
atenção e do discernimento bro. Como era expectável, os lucros diários saída para o Canal de Moçambique. O
empregues, falha-nos um obtidos pelo rapaz provavam-se comedi- dhow rasa o forte de São Sebastião. Passa
pormenor. Irrisório, senão dos. De tal maneira assim era que, em vez por uma frota de pescadores artesanais a
cómico. Ainda assim, por via de se entregar ao seu ofício, Omar opta por bordo das suas pirogas movidas a pagaia
da história associada, uma mácula que nos acompanhar no passeio. Os donos do única. Ao contornarmos a península ocu-
preferíamos ter evitado. Dos vários dhows dhow conhecem-no. Admitem-no a bor- pada pela fortaleza, fletimos para sudes-
ancorados em frente ao pontão, sob a su- do e ao boião que o miúdo carregava como te. Entregamo-nos à imensidão do canal.
pervisão da estátua de bronze de Vasco da um apêndice de plástico gorduroso. Nesse tempo, refastelados entre o as-
Gama, acabamos por embarcar num bap- Instalamo-nos numa zona da embarca- sento e o fundo do casco, admiramos a pe-
tizado de “Titanic”. ção que o capitão nos indica e em que não rícia com que o capitão e os seus ajudan-
Nessa manhã, tínhamos voltado a cru- atrapalharíamos as manobras do trio de tes ajustam a vela ao vento, como a esti-

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O velho farol da Ilha de Goa,
acima de uma crista de vegetação

cam e fazem oscilar com uma fluidez que so. Navega paralelo, a determinada altura, trilho reto sulcado na vegetação, uma de
mal nos perturba no nosso trono panorâ- já ao longo do litoral sul e de seus sucessi- duas vias abertas e que, em forma de cruz,
mico. À medida que nos aproximamos da vos recortes. Um deles, revela-se mais pro- abrangiam a ilha de Goa de sul a norte e
ilha da Goa, o tráfico marítimo diminui a fundo que os anteriores. Acolhe uma pe- de leste a oeste.
olhos vistos. quena angra com leito de areia molhada. O Sempre em fila, ou quase fila, chegados
Aos poucos, de um mero vislumbre, de- capitão aponta o “Titanic” àquele portinho ao centro da ilha, cortamos para a sua per-
fine-se uma torre listada, branca e ver- natural e de águas cristalinas. Virada a sul e pendicular. No término dessa continua-
melha, acima de uma crista densa da ve- de mar tranquilo a condizer, a enseada con- ção, com a costa oriental de novo à vista,
getação que preenche o oriente da ilha, cede-nos um desembarque suave. esbarramos com a torre listada do farol.
para lá de uma costa feita de duas linhas. Num ápice, vemo-nos em terra firme. «Comi duas chamuças. Com este calor,
Uma primeira, de recife castanho e áspe- Subimos para uma laje intermédia forra- estou a morrer de sede», desabafa Omar,
ro. Outra, logo acima, de uma areal alvo da a pedra-coral. Dali, já com um duo de no português básico com que se desen-
que antecede o verde arbustivo. tripulantes do “Titanic” a fazer de guias e vencilhava com os visitantes lusos, à mar-
O “Titanic” aproxima-se do recife rocho- Omar a acompanhar-nos, seguimos um gem do dialecto macua em que os nativos >>

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DESTINO IMPROVÁVEL GOA, MOÇAMBIQUE

1.

daquelas paragens comunicam, aqui e ali, Retomamos a ascensão. Ao chegarmos fessa-nos que também achava estranho.
com recurso adicional a línguas vizinhas, ao cimo, já os guias por lá cirandavam, en- «Não sei… achou piada e pintou. Por cá,
casos do quimuane e do suaíli, úteis para tretidos a investigarem se as intempéries nem sempre quer dizer nada».
conversas com tanzanianos e até mesmo e os vendavais teriam causado estragos. Sem ter como se alongar no tema, o
com quenianos. Um deles, segura o invólucro de acrílico miúdo aproveita o inesperado protago-
Sem que o esperássemos, o rapaz ser- da lâmpada elétrica, como a testar a sua nismo. Pousa, mais uma vez, o frasco das
ve-se de um poço coberto. Lança para o estabilidade. Apercebemo-nos que tinha chamuças e enquadra-se na campânula
seu fundo um garrafão atado a uma corda. as unhas das mãos pintadas de vermelho enferrujada do farol, a apreciar as vistas
Recupera-o, cheio de água. Enche um bem vivo. Omar também repara. Confron- em redor. Voltamos a fotografá-lo, na-
copo de metal também ali ao dispor, pro- tamos olhares intrigados. Omar furta-se quela sua inadvertida fotogenia. Enquan-
videncial naquele reduto desprovido de a observar o que quer que fosse, com o to o fazemos, reparamos em vários res-
outras infraestruturas e castigado pelo sol conterrâneo por perto. Mais tarde, con- pingos, longínquos, ainda assim, bem
tropical. Omar bebe o copo de um trago destacados acima do azulão-profundo do
único. Restabelecido, insta-nos a subir- Canal de Moçambique. Trocamos de ob-
mos ao cimo do farol. «Vamos! É muito jectivas. Quando os enquadramos e mag-
bonito lá de cima». nificamos, percebemos que se tratavam
Ascendemos a escadaria, sem pressas. de baleias, entregues a repetidos saltos e
Mais que guias, os dois tripulantes pro-
vam-se escoltas. Por muito que a ilha ti-
NA ORIGEM, exibicionismos afins.
Há milénios que o Canal de Moçambi-
vesse por contar, pouco mais sabem que O FAROL DA ILHA que está na rota migratória de distintas
por ali se orientarem, o suficiente para nos
conduzirem aos seus pontos fulcrais. Dei- TINHA 12 METROS espécies de cetáceos, sobretudo de ba-
leias-jubarte, e de bossa. Nos meses mais
xamo-los ganharem avanço. A meio de
um dos lances da escadaria, Omar detém-
DE ALTURA. frios, estas espécies deixam as águas de-
masiado gélidas do Mar Antárctico rumo
-se a contemplar a vista por um janelo ar- EM 1923, a norte. De junho a setembro, sobem o
redondado, já sem vidros. Atentos aos seus
movimentos, apercebemo-nos como a sua A SUA TORRE sul da costa de África e circulam entre
Moçambique, Madagascar, com passa-
face gerava uma silhueta perfeita, contra os
azuis do Canal de Moçambique e do hori-
FOI AUMENTADA gens frequentes ao largo do arquipélago
das Comoros. A sua presença sazonal
zonte pouco nublado acima. PARA 31 METROS nestas paragens chegou a justificar que,

38 LUZ 20 AGOSTO 2022


2. 1. O “Titanic” prestes a ancorar na ilha de Goa 2. Pescadores em pirogas 3. O trilho pedregoso para
o farol

3.

em tempos em que a caça à baleia care- velmente antecessoras das que o mantêm Tiramos umas derradeiras fotos. Regres-
cia de regulamentação, duas empresas, em serviço. samos ao solo e ao colorido “Titanic”.
diz-se que norueguesas, instalassem es- Como o tínhamos acordado, a Ilha de Goa Dali, apontamos à ponta de Cabaceira,
tações baleeiras na província de Inham- e o seu emblemático farol eram apenas a ao largo de colónias de embondeiros des-
bane, em Linga-Linga. Mais tarde, aban- primeira paragem de um itinerário mais pidos de folhas que nos parecem saudar.
donaram-nas, ainda antes de o abate dos amplo em redor da Ilha de Moçambique, Esse percurso, cumprimo-lo já empur-
cetáceos ser inviabilizado pela sua prote- com desembarque previsto na não menos rados por um vento intenso que faz a vela
ção e pelo estabelecimento de distintas intrigante península da Cabaceira. Ciente do dhow empolar e o barco inclinar-se
eco-reservas terrestres e marinhas mo- do valor do seu tempo, o capitão vê-nos a até ao limite da sua veloz flutuação. O ca-
çambicanas. demorar no cimo da torre. Apesar da dis- pitão nota-nos apreensivos. Decide sos-
O farol de que continuávamos a apre- tância, consegue alertar os tripulantes- segar-nos: «Calma, amigos. Isto da par-
ciar o panorama Índico em redor, esse, foi -guias que está na hora de prosseguirmos. te da tarde é mesmo assim. Quando mais
erguido em 1876, com o fim de assinalar próximo do pôr-do-sol, mais intenso e
a entrada para a Baía de Mossuril. De rápido se torna».
orientar as embarcações ao largo, sobre- Decidimos abstrair-nos e aproveitar-
tudo as que tinham como destino a Ilha mos a inclinação. Tiramos fotos dos tri-
de Moçambique. É considerado o mais an- pulantes em luta com a vela e com a os-
tigo de Moçambique. A sua arquitetura
quadrangular, em vez de arredondada,
O CANAL DE cilação causada pelas vagas. Enquanto
isso, o casario longínquo da Ilha de Mo-
serviu de padrão para vários outros entre- MOÇAMBIQUE çambique desenrolava-se a ritmo con-
tanto edificados em Zanzibar e ao longo
da costa sul da África Oriental Alemã, ter- ESTÁ NA ROTA dizente. Por fim, o capitão faz o “Titanic”
entrar num braço de mar raso, protegido
ritório colonial desmembrado após a der-
rota germânica na 1ª Guerra Mundial e que
MIGRATÓRIA de manguezais. Regressamos à bonança.
Caminhamos com a água pelos joelhos,
deu origem à atual Tanzânia. DE DISTINTAS entre caranguejos alarmados, até retor-
Na origem, o farol da Ilha de Goa tinha
meros doze metros de altura. Em 1923, a ESPÉCIES DE namos a terra firme. Tal como nos lon-
gos tempos coloniais, a Cabaceira con-
sua torre foi aumentada para os trinta e
um metros a que nos encontrávamos, do-
CETÁCEOS, COMO firmou-se uma expedição à parte. A que,
em breve dedicaremos, o seu merecido
tada de uma nova luz e objectiva, prova- BALEIAS-JUBARTE capítulo. 

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RECEITAS
DO CHEF

Chef
José Lima OSSOBUCO COM ABÓBORA HOKKAIDO E PORTUBELO
RESTAURANTE
TÁBUA DA RIA INGREDIENTES: MODO DE PREPARAÇÃO
(GAFANHA DA NAZARÉ)
Ossobuco vitela 1- Colocar os ossobucos em um tabuleiro alto,
tabua_da_ria Cebola adicionar cenoura, cebola, alho francês, vi-
Alho francês nho branco, alecrim, tomilho, sal e paprika
Alho e levar o forno por 12h a 110º
Azeite 2- Cortar a abóbora em pedaços generosos e
Vinho branco temperar com azeite, sal, pimenta e oré-
Tomate gãos, levar o forno por 13m a 180º
Tomilho 3- Cortar os cogumelos e saltear com azeite,
Louro sal e alho
Alecrim 4- Preparar o puré de batata e colocar no cen-
Orégãos tro da travessa
Sal 5- Retirar o ossobuco, e coar o molho por um
Paprika passador
Puré de batata 6- Levar o ossobuco destapado no forno por
Abóbora hokkaido 10m a 200º, colocar por cima do puré
Cogumelos portubello 7- Empratar a abóbora e os cogumelos a gosto,
regar tudo com molho.

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OVOS ROTOS SANGRIA DE
DE CARAS DE BACALHAU FRUTOS VERMELHOS
INGREDIENTES: INGREDIENTES:

Batata agria Gim Bombay


Ovos Hortelã
Pimenta preta em grão Morango
Coentros Framboesa
Caras de bacalhau Mirtilo
Cebola Licor beirão
Alho 7up
Louro Açúcar amarelo
Gelo
MODO DE PREPARAÇÃO: Lambrusco

1- Demolhar as caras de bacalhau por 24h em várias águas MODO DE PREPARAÇÃO:


2- Colocar numa panela água, louro, pimenta preta em grão,
alho e cebola e deixar ferver, depois colocar as caras e dei- 1- Num jarro colocar os morangos, amoras, framboesa, mirtilo
xar cozer por 10m e 2 colheres de sopa de açúcar amarelo
3- Retirar e deixar arrefecer 2- Colocar 50ml de licor beirão, 50ml de gim Bombay, gelo a
4- Cortar as batatas em palitos com pele e fritar a 180º até esta- gosto e mexer tudo
rem bem douradinhas 3- Adicionar o Lambrusco e por fim a 7up e hortelã.
5- Preparar os 3 ovos
6- Numa frigideira com um pouco de azeite colocar cebola pi-
cada e alho, juntar as caras de bacalhau, depois a batata e
por fim os ovos
7- Mexer até ficar cremoso e retirar
8- Finalizar com coentros.

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AGENDA

SÁBADO, 20 DOMINGO, 21 SEGUNDA, 22


WET BED GANG - ROMARIA
DE SÃO BARTOLOMEU
Praça Terras da Nóbrega,
Ponte da Barca
22h00
€5

Considerada por muitos


como a mais genuína roma-
ria do Alto Minho, o São Bar-
tolomeu constitui um dos
maiores cartões de visita do
concelho barquense. Na noite
de 21 contará com o coletivo
de Vialonga Wet Ben Gang. A
primeira parte ficará a cargo
do artista local Madman.

JAZZ NO JARDIM - OPERADE MARIZA


Jardim Botânico Tropical, Lisboa Praia dos Pescadores, Albufeira ANA LAÍNS - CONCERTO
15h30 22h30 20 ANOS FATACIL
Preço de entrada no Jardim Entrada livre RTP 2 Até 28 de agosto
Botânico 23h30 Parque Municipal de Feiras
Concerto da fadista Mariza, e Exposições de Lagoa
O Jardim Botânico Tropical seguido de espetáculo piro- Ana Laíns celebrou 20 anos
recebe o Hot Club de Portu- musical a partir das 0h00, de carreira no Salão Preto e A 41ª edição da Feira de Arte-
gal, num concerto dos Ope- num programa inserido nas Prata do Casino Estoril, em sanato, Turismo, Agricultura,
rade. Depois de interpreta- comemorações do dia do janeiro de 2020. Com a can- Comércio e Indústria de La-
rem o repertório dos últimos Município de Albufeira. tora, estiveram em palco no- goa (FATACIL) promete con-
anos de vida de John Coltra- mes como Ivan Lins, Luís Re- certos de artistas como Ex-
ne, o trompetista Gonçalo presas, Mafalda Arnauth, pensive Soul, Gipsy Kings,
Marques volta a convocar os Fernando Pereira, Silvestre João Pedro Pais, Profjam,
guitarristas André Matos e Fonseca, Fernando A. Pereira Quim Barreiros, Plutónio,
João Carreiro e o baterista (o Trovador), Grupo de Can- Bárbara Bandeira, Resistên-
João Pereira para este seu tares de Évora e Adufadeiras cia, Fernando Daniel e Tony
novo grupo. de Idanha-a-Nova. Carreira.

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TERÇA, 23 QUARTA, 24 QUINTA, 25 SEXTA, 26
FESTIVAL DO CRATO ZIGURFEST EDP VILAR DE MOUROS FESTAS DO MAR
Até 27 de agosto Lamego Vilar de Mouros, Viana do Castelo Passeio D. Luís e Cidadela
€ 15 a € 20 (diário) Até 27 de agosto Até 27 de agosto de Cascais
€ 55 (passe 5 dias) Entrada livre 17h00 Até 4 de setembro
€ 40 A partir das 18h00
Evento emblemático da his- Durante quatro dias, Lamego
tórica vila alentejana volta a balança entre a música e a Do cartaz fazem parte Place- Um festival com dois palcos -
oferecer uma programação arte contemporânea, olhando bo, Suede, Gary Numan, o principal em plena Baía e o
musical eclética. Nomes para a cidade como um palco Battles, The Black Teddys (a “Cascais” nas imediações da
como Paula Fernandes, Nen- de grandes dimensões. 25 de agosto), Simple Minds, Cidadela - que continua a
ny e Maninho (a 23 de agos- Black Rebel Motorcycle Club, privilegiar a música em lín-
to), Gabriel o Pensador, Dino Clawfinger, Tara Perdida, gua portuguesa. No cartaz
d´Santiago e Dillaz (a 24), Non Talkers ( a 26 de agosto). destacam-se os nomes de
Miguel Araújo e The Happy No último dia, sobem ao pal- Diana Castro e Vítor Kley (a
Mess (a 25) fazem parte do co Iggy Pop, Bauhaus, The 25 de agosto), Tiago Nacarato
cartaz, que fecha com The Legendary Tigerman e The e Black Mamba (a 26 de agos-
Jesus and Mary Chain e Amor Mirandas. to), Beatriz Rosário e os Qua-
Electro a 27 de agosto. tro e Meia (a 27 de agosto),
Carolina de Deus e Resistên-
cia (a 28 de agosto). Já em se-
tembro, atuam Duque Pro-
víncia e D.A.M.A. (no dia 1),
Filipa Vieira e Cuca Roseta
(no dia 2), Luís Sequeira e
Agir & Friends (no dia 3). A
fechar, no dia 4, Luís Caracol
e a Sinfónica de Cascais (a to-
car o top 25 RFM).

JAMESON BOW STREET


ON TOUR
LX Factory
Até 29 de setembro

Pela primeira vez desde que


abriu portas, em 1780, a des-
tilaria da Jameson, em Bow NATIRUTS
Street, situada no coração de Casino Estoril - Salão Preto
Dublin, vai sair da Irlanda em e Prata
“viagem” e escolheu Lisboa 21h30 | A partir de € 35
para primeiro destino. Du-
rante um mês, a Jameson Fundada em 1996, a lendária
Bow Street on Tour vai estar banda brasileira de reggae
no Lx Factory com um espa- Natiruts regressa ao nosso
ço que permite aos visitantes país para apresentar o volu-
descobrir mais sobre a histó- me 2 de Good Vibration, de-
ria da marca, o método de pois de, em 2018, ter esgota-
produção e ainda fazer uma do os coliseus de Lisboa e do
prova de diferentes whiskeys. Porto.

20 AGOSTO 2022 LUZ 43


SHOPPING

ESCOLHAS 70€

DA SEMANA
35€

VESTIDO LION OF PORCHES


Vestido assimétrico tricolor.
SAPATOS H&M Valor em promoção, antes: 140€
Loafers com forro de cetim. Ref: LP000794_350
Ref: 1082477001

75€ 30€ 20€ 20€

CALÇAS ZARA SAIA CORTEFIEL


Calças culotte de cintura subida. Saia capa midi.
Cor: Menta-claro Valor em promoção, antes: 60€
Ref: 2731/259 Ref: 5803198

65€

VESTIDO MONARTE VESTIDO CORTEFIEL


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valor em promoção, antes: 95€ Chinelos em pele castanha Valor em promoção, antes: 80€
Disponível em: monarte.com com palmilha OrthoLite. Ref: 5143066

44 LUZ 20 AGOSTO 2022


48€ 99€ 10€ 12€

CONJUNTO BIMBA Y LOLA BLUSA WOMAN ECI


Conjunto de anéis em tom Top com manga curta.
dourado. Valor em promoção, antes: 30€

59€ 35€

BOLSA POLO RALPH LAUREN VESTIDO MONARTE CAMISA CORTEFIEL


Bolsa de cintura ‘Sunset Lover’, vestido midi. CASACO PIECES Camisa estampada.
100% algodão. Valor em promoção, antes: 130€ Cardigan de malha Valor em promoção, antes: 40€
Cor: Cinzento-claro Disponível em: monarte.com com manga comprida. Ref: 5703405

50€ 84€ 65€

BLAZER WOMAN ECI


Blazer cruzado azul-marinho.
Valor em promoção, antes: 100€

39€

CARTEIRA LION OF PORCHES


Carteira a tiracolo de pele e sarja.
Valor em promoção, antes: 120€
CAMISA HOSS INTROPIA Ref: LP001458_005 BLUSA MONARTE
‘Sauro’, camisa estampada. ‘Dance of Life’, valor
Valor em promoção, antes: 99€ em promoção, antes: 85€
Ref: 6283146 Disponível em: monarte.com

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RETRATOS CONTADOS

NÉLSON MATEUS ALICE VIEIRA

“Querido mês de agosto”


Q Q
uerida avó, uerido Neto,
Agosto, para muitos, é sinónimo de férias. Mas não para Nunca vivi muito tempo longe do mar – a não ser quan-
todos. do vivi no estrangeiro – e, mesmo assim, Dili era bem
Não me recordo se alguma vez estive de férias em agosto. junto do mar, e por isso eu estava sempre caída na praia
Em adulto, claro. Já nos tempos de estudante a conversa era outra. de Liquiçá (com as cabras a lamberem-me a cara…).
Sabes que há muitos que me encontram na rua e me dizem: «A De resto eu costumo dizer que vivi sempre junto ao mar.
sua avó lá está de férias, na Ericeira». Como se todos os que vi- Quando era muito criança, os meus tios adoravam a Praia do
vem perto do mar estivessem sempre de férias. Logo tu, que con- Guincho que, nesses anos 40 e 50, era um deserto, sem nin-
tinuas a trabalhar, mesmo que seja em frente ao mar. Muitos não guém, com um vento e um frio terríveis e sempre cheia de abe-
entendem o nosso trabalho. lhas. Antes de sairmos de casa, a minha tia ligava para o bar-
Devem imaginar-te de fato de banho, estiraçada na areia o dia racão onde havia o café do Sr. Muxaxo, a perguntar como es-
inteiro, «put the cream, you are very white», como diria o outro. tava o tempo. Nem sei porquê: fizesse o tempo que fizesse,
Por falar em fatos de banho, lembrei-me das idas à praia em íamos sempre.
tempos passados. Aliás, na Ericeira existem referências das idas Mas os loucos não éramos só nós: o barracão do Sr.Muxaxo
a banhos da D. Maria Pia em 1864. era também o poiso dos Condes de Barcelona e do Juanito, seu
Hoje, cada um veste o que quer (em muitos casos quase nada) filho.
mas nem sempre foi assim. Os fatos de banho já taparam, homens Às 11 da manhã, o Sr. António, que era pescador, banheiro e o
e mulheres, dos pés à cabeça. Durante muitos anos o tom bron- mais que fosse preciso, chegava à praia, vendia um robalo à mi-
zeado foi associado às classes trabalhadoras mais pobres, imagina. nha tia, esfregava as mãos e dizia: «embora, pessoal!».
O uso de biquíni só começou praticamente quando nasceste, Então eu, os meus dois irmão e uma prima fazíamos fila dian-
mas longe de ter as dimensões, reduzidas, que tem hoje. Julgo que te do mar e, à vez, o Sr. António pegava num de nós, com os de-
até os homens iam à praia com roupa de banho de duas peças. dos apertava-nos o nariz e zás!, atirava-nos para o meio do mar.
As minhas memórias de infância, na praia, já me remetem para Resultado: todos nós nadamos na perfeição.
indumentárias muito mais leves e da afirmação do “topless”. Depois passámos para a Ericeira, onde o frio e o vento também
Sabes que cada vez é mais frequente vermos mulheres islâmi- eram terríveis e o sol só nascia – quando nascia – depois das qua-
cas a banhos nas nossas praias. Mas, tal e qual como os nosso an- tro da tarde.
tepassados, vestidas dos pés à cabeça (literalmente). A desco- Depois casei e a praia, durante muitos anos, passou a ser a Cos-
berto só o rosto, pés e mãos. ta Nova (de seu nome completo Costa Nova do Prado), perto de
O que também não esqueço são as canções: “Bikini pequeni- Ílhavo. É uma praia extraordinária, com a possibilidade de po-
no às bolinhas amarelas”, do Nel Monteiro a cantar “Azar na dermos ir a uma praia com o mar bravo – Praia da Costa – e tam-
praia” e do Dino Meira a cantar “Meu querido mês de agosto”. bém a uma muito calma – a Praia da Ria.
Agora, vou preparar tudo para a Feira do Livro de Lisboa, que, Quando andava a escrever o meu livro Praias de Portugal (pu-
como sabes, começa na próxima semana. blicado na altura da EXPO-98) fui a todas. Mais de 300.
Sei que tens imensas recordações das idas à praia de outras Gosto de muitas, detesto outras – mas praias do meu coração
épocas. só tenho duas: a Ericeira e a Costa Nova.
Conta-me tudo. E não há nada a fazer…
Bjs Bjs

retratoscontados.pt info@retratoscontados.pt @retratoscontados RetratosContadosPortugal

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