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“A Evolução da Questão do Nexo de

Causalidade Entre Doença e Trabalho no


Entendimento Técnico-Científico,
Legal e Normativo Brasileiro”
Curso de Formação Continuada: “Estabelecimento do Nexo de Causalidade
entre Doença e Trabalho”
CSJT/TST/ENAMAT – Comitê Gestor do Programa Trabalho Seguro
Brasília, 17-19 de agosto de 2015
Prof. René Mendes
Plano de Aula
1. Evolução do Entendimento Técnico-Científico
2. Evolução do Entendimento Legal e Normativo
Brasileiro
3. Introdução do “Nexo Epidemiológico” no
Pensamento de “Causalidade” no Brasil
4. Considerações Finais e Discussão Geral
1. Evolução do Entendimento
Técnico-Científico
“Nexo Causal”: uma “causa” ->
um “efeito”

“CAUSA” “EFEITO”
“CAUSAS” = “Processos de trabalho”
nocivos ou perigosos

• “Objetos de trabalho” – Exemplos


• “Meios de trabalho” – Exemplos
• “Ambientes de trabalho” – Exemplos
• “Condições de trabalho” - Exemplos
“Objetos de trabalho” nocivos – Exemplo:
amianto (asbesto) crisotila

Mesotelioma maligno de pleura


MORRONE L. C; Andrade, M. Anemia aplástica pelo benzeno em uma indústria de
plásticos - ocorrência de quatro casos fatais. In: Congresso Nacional de
Prevenção de Acidentes do Trabalho, 1974, São Paulo. Anais... São Paulo, Fundacentro,
1974. p.741
“Métodos de trabalho”
segmentados e alienantes
“Condições de trabalho” perigosas...
Carga de Trabalho
(física e
mental/psíquica)
“Nexo Causal”: uma “causa” ->
múltiplos “efeitos”
“EFEITO” 1

“EFEITO” 2
“CAUSA”
“EFEITO” 3

“EFEITO” 4
“Nexo Causal”: múltiplas “causas” ->
um efeito
“CAUSA” 1

“CAUSA” 2 “EFEITO”

“CAUSA” 3

“CAUSA” 4
Morte por excesso de trabalho
Suicídio desencadeado pelo trabalho
“Trabalho” ou “Ocupação” como um
“Fator de Risco”
“Fator de Risco”: “Um aspecto do comportamento
pessoal ou do estilo de vida, da exposição ao meio
ambiente, ou uma característica própria ou herdada
do indivíduo que se sabe, tendo como base a
evidência epidemiológica, estarem associados com
condições importantes de se prevenir para proteger
a saúde. O fator de risco representa uma
probabilidade maior de ser atingido por
determinada afecção ou dano.”
(Fonte: Luís Rey, Dicionário de Termos Técnicos de Medicina e Saúde, 1999)
“Trabalho” ou “Ocupação” como uma
“Concausa”

“... o acidente ligado ao trabalho que, embora


não tenha sido a causa única, haja contribuído
diretamente para a morte do segurado, para
redução ou perda da sua capacidade para o
trabalho, ou produzido lesão que exija atenção
médica para a sua recuperação”
(Inciso I do Artigo 21, Lei no. 8.213/91).
“Nexo Causal”: múltiplas “causas” ->
múltiplos “efeitos”
“CAUSA” 1 “EFEITO” 1

“CAUSA” 2 “EFEITO” 2

“CAUSA” 3 “EFEITO” 3

“CAUSA” 4 “EFEITO” 4
Classificação proposta por Richard Schilling (1911–1997)
(Schilling, R.S.F. More effective prevention in occupational health practice?
Journal of the Society of Occupational Medicine, 39:71-9, 1984.)

CATEGORIA EXEMPLOS
I-Trabalho como causa · Intoxicação por chumbo
· Silicose
necessária · “Doenças profissionais”
legalmente prescritas
· Outras
II-Trabalho como fator · Doença coronariana
· Doenças do aparelho locomotor
contributivo, mas não · Câncer
necessário · Varizes dos membros inferiores
· Outras
III-Trabalho como provocador · Bronquite crônica
· Dermatite de contato alérgica
de um distúrbio latente, ou · Asma
agravador de doença já · Doenças mentais
estabelecida · Outras
Classificação proposta por Richard Schilling (1911–1997)
(Schilling, R.S.F. More effective prevention in occupational health practice?
Journal of the Society of Occupational Medicine, 39:71-9, 1984.)

CATEGORIA EXEMPLOS
I-Trabalho como causa · Intoxicação por chumbo
· Silicose
necessária Nexo · “Doenças profissionais”
Epidemiológico! legalmente prescritas
· Outras
II-Trabalho como fator · Doença coronariana
· Doenças do aparelho locomotor
contributivo, mas não · Câncer
necessário · Varizes dos membros inferiores
· Outras
III-Trabalho como provocador · Bronquite crônica
· Dermatite de contato alérgica
de um distúrbio latente, ou · Asma
agravador de doença já · Doenças mentais
estabelecida · Outras
2. Evolução do Entendimento
Legal e Normativo Brasileiro
Legislação Previdenciária
(Art. 20 da Lei 8.213/91)

• Grupo 1: Doença Profissional, “assim


entendida a produzida ou desencadeada pelo
exercício do trabalho peculiar a determinada
atividade e constante da respectiva relação
elaborada pelo Ministério do Trabalho e da
Previdência Social;”
Legislação Previdenciária
(Art. 20 da Lei 8.213/91)

• Grupo 2: Doença do Trabalho, “assim


entendida a adquirida ou desencadeada em
função de condições especiais em que o
trabalho é realizado e com ele se relacione
diretamente, constante da relação
mencionada no inciso I.”
Legislação Previdenciária
(Redação atual do Artigo 21-A da Lei 8.213/91)
“Art. 21-A. A perícia médica do Instituto Nacional
do Seguro Social (INSS) considerará caracterizada a
natureza acidentária da incapacidade quando
constatar ocorrência de nexo técnico
epidemiológico entre o trabalho e o agravo,
decorrente da relação entre a atividade da empresa
ou do empregado doméstico e a entidade mórbida
motivadora da incapacidade elencada na
Classificação Internacional de Doenças (CID), em
conformidade com o que dispuser o regulamento.”
Lei Orgânica da Saúde
(Parágrafo 3º do Art. 6º da Lei 8.080/90)
“Entende-se por saúde do trabalhador, para fins desta lei,
um conjunto de atividades que se destina, através das
ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, à
promoção e proteção da saúde dos trabalhadores, assim
como visa à recuperação e reabilitação da saúde dos
trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos
das condições de trabalho, abrangendo:
(...)
Inciso VII - revisão periódica da listagem oficial de
doenças originadas no processo de trabalho, tendo na
sua elaboração a colaboração das entidades sindicais;”
Eventos mais importantes, no final da
década de 1990, relacionados com o tema
 Criação, pelo Ministério da Saúde, de Comissão
para elaborar lista de “doença relacionadas ao
Trabalho” (1998/1999);
 Disponibilização da Lista do MS ao Ministério da
Previdência Social, e sua introdução no Anexo II
do Decreto no. 3.048/99 (maio de 1999);
 Publicação oficial da Lista pelo Ministério da
Saúde, através da Portaria MS/GM 1.339/99
(setembro de 1999).
 Elaboração e publicação, pelo Ministério da
Saúde/OPAS, do livro “Doenças relacionadas ao
trabalho: Manual de procedimentos para os
serviços de saúde” (2000).
Acesso à “Lista” da Portaria
MS/GM 1.339/99
“referência dos agravos originados no processo
de trabalho no Sistema Único de Saúde, para
uso clínico e epidemiológico”

http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/doe
ncas_relacionadas_trabalho_2ed_p1.pdf
Acesso livre ao “Manual” em PDF:
“Doenças Relacionadas ao Trabalho: Manual
de Procedimentos para os Serviços de Saúde”
(OPAS/Ministério da Saúde, 2001)

Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/doe
ncas_relacionadas_trabalho1.pdf
LISTA A do Decreto 3.048/99 e da
Portaria MS/GM 1.339/99
“Agentes ou Fatores de Risco de Natureza
Ocupacional Relacionados com a Etiologia de
Doenças Profissionais e de Outras Doenças
Relacionadas com o Trabalho”

PARA CADA “AGENTE” AS DOENÇAS


CORRESPONDENTES...
Exemplo da Lista A: Asbesto (Amianto)
• Neoplasia Maligna do Estômago (C16.-)
• Neoplasia Maligna da Laringe (C32.-)
• Neoplasia Maligna dos Brônquios e do Pulmão (C34.-)
• Mesotelioma da Pleura (C45.0), do Peritônio (C45.1),
do Pericárdio (C45.2)
• Placas Epicárdicas ou Pericárdicas (I34.8)
• Asbestose (J60.-)
• Derrame Pleural (J90.-)
• Placas Pleurais (J92.-)
“Lista A” e o “Nexo Causal” (Schilling I)

“CAUSA”
(“agente” ou
“EFEITO”
“fator de risco”) (CID)
“Lista A” e o “Nexo Causal” (Schilling I e III)

“Efeito” 1 (CID)

“CAUSA” “Efeito” 2 (CID)


(“agente” ou
“fator de risco”)
“Efeito” 3 (CID)

“Efeito” 4 (CID)
LISTA B do Decreto 3.048/99 e da
Portaria MS/GM 1.339/99:
“DOENÇAS RELACIONADAS COM O
TRABALHO: lista elaborada pelo Ministério da
Saúde, a partir da relação de agentes
etiológicos ou fatores de risco de natureza
ocupacional, ampliada e atualizada, e disposta
segundo a taxonomia, nomeclatura e
codificação da CID-10”
PARA CADA DOENÇA OS “AGENTES”
CORRESPONDENTES...
Exemplo da Lista B: Neoplasia da
Cavidade Nasal e dos Seios da Paranasais
(CID C30-C31)

• Radiações ionizantes
• Níquel e seus compostos
• Poeiras de madeira e outras poeiras orgânicas
da indústria do mobiliário
• Poeiras da indústria do couro
• Poeiras orgânicas (na indústria têxtil e em
padarias)
• Trabalhadores da indústria do petróleo
A “Lista B” contém 232 categorias da CID-10,
distribuídas em 15 capítulos da mesma
Classificação; quando se juntam categorias
com subcategorias – segundo os conceitos
adotados pela CID-10 –, estima-se em
aproximadamente 400 o número de agravos
relacionados ao trabalho, listados a partir da
CID-10
“Lista B” e o “Nexo Causal” (Schilling I, II e III)

“Causa” 1

“EFEITO” “Causa” 2
(CID)
“Causa” 3

“Causa 4
3. Introdução do “Nexo
Epidemiológico” no Pensamento de
“Causalidade” no Brasil
Algumas Expressões do “Nexo Epidemiológico”
no Brasil, a partir de 1999
 Adoção deliberada do título da lista do Ministério da
Saúde (1999): “Doenças Relacionadas ao Trabalho”
 Adoção da mesma “Lista da Saúde” pela Previdência
Social (Anexo II do Decreto 3.048/1999 e Decreto
6.957/2009.)
 Adoção da categoria II da Classificação de Schilling,
como critério de inclusão de “doenças relacionadas
ao trabalho” nas Listas A e B
 Desenvolvimento do conceito de “nexo técnico
epidemiológico previdenciário” (NTEP), e sua
adoção na Previdência Social, a partir de 2009,
gerando a “Lista C”...
LISTA C do Decreto 3.048/99
(e suas atualizações):
A partir de 2006, com o “Nexo Técnico
Epidemiológico Previdenciário”
Resolução do Conselho Nacional de Previdência
Social (Res. 1269/2006)
Lei No. 11.430, 26/12/2006.
Decreto No. 6.042, 13/2/2007.
Instruções Normativas do INSS No. 16 (27/3/2007)
e no. 31 (10/8/2008)
Decreto Nº. 6957/2009
Lei Complementar No. 150 (1/6/2015)
Outros
Critérios de Inclusão e Nexo (Anexo II do
Decreto 3.048/99 e NTEP)

Lista A Fatores de
Doenças
(1999) Risco

Lista B Fatores de
Doenças
(1999) Risco

LISTA C - NTEP
CNAE Doenças
(2009)
Reflexões sobre Dificuldades e Limites
no uso do “Nexo Epidemiológico”
a) Como visto, o “nexo epidemiológico” foi inaugurado por
Ramazzini (1700), utilizado ao longo da história, utilizado pela
OMS (“doenças relacionadas ao trabalho”, a partir de 1984),
utilizado pela OIT (2010), utilizado por Schilling (grupo II),
utilizado na Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (“Lista
A” e “Lista B” do MS e MPS, 1999), e também pela Previdência
Social (“Lista C” ou NTEP).
b) O “nexo epidemiológico” é importante para orientar o
raciocínio clínico, mas ele é construído em bases populacionais,
obrigando levar o raciocínio para os enfoques e ideias de
“RISCO”, “PROBABILIDADE”, “RISCO RELATIVO” (e suas
variações), “RISCO ATRIBUÍVEL” e “FRAÇÃO DE RISCO
ATRIBUÍVEL”.
c) O “nexo epidemiológico” é fundamental para orientar
ações de saúde coletiva no trabalho (promoção da saúde,
prevenção de doença, “intervenções” etc) = “Medicina do
Trabalho Preventiva”, dentro da SST!
d) O “nexo epidemiológico”, baseado no raciocínio
epidemiológico aponta mais para perfis de saúde/doença de
pessoas (trabalhadores) e de populações, na perspectiva da
“integralidade” (“saúde integral do trabalhador”), do que
para firmar diagnóstico de doenças individuais...
e) O nexo epidemiológico não é uma boa ferramenta para a
lógica pericial, médico-legal, indenizatória, reparadora. Por
ser baseado em “probabilidade” ou “risco” populacional, não
pode dar respostas categóricas, do tipo “sim” ou “não”,
frente a situações individuais!
4. Considerações Finais e
Discussão Geral

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