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Margarida Gonçalves

ECONOMIA I
Regente: Fernando Araújo
CAPÍTULO I – CONCEITOS INTRODUTÓRIOS

O Direito é um conjunto de normas que rege o nosso dia a dia. Disciplina um conjunto de
relações económicas (impostas, por exemplo) e regula a atividade económica – parte substancial
da nossa vivência.
A economia enquanto ciência social, nasceu no século XVIII, com Adam Smith. Esta
pretende estudar a conduta humana nas suas interações coletivas, fazendo-o com distanciamento
analítico, de um modo sistemático, recorrendo a uma metodologia explícita – para evitar o
entorpecimento das categorias fáceis do “senso comum” e o envolvimento na estridência
turbulenta e apaixonada dos debates ideológicos. Estuda, portanto, as opções e decisões humanas
perante os meios para satisfazer as necessidades.

1. A afetação de recursos escassos


A expressão “Economia”, indica que estamos em presença de situações a reclamarem
escolhas, seja no estabelecimento de prioridades quanto às necessidades a satisfazer, seja na
distribuição de tarefas, seja na redistribuição das mesmas, seja na ponderação dos meios mais
eficientes de execução e de coordenação dos esforços para satisfazer as necessidades ou para
consumir os bens e serviços gerados pelos esforços de produção.
As escolhas devem-se à escassez de bens e de recursos disponíveis para satisfazer as
necessidades dos indivíduos.
As escolhas são ditadas pela escassez de tempo – a informação tem custos. P.E: ao ler um livro,
é possível escolher-se um grau ótimo de informação em vez de um grau completo de informação,
uma vez que, em termos de tempo perdido, a informação completa poderá ter um custo
desproporcionado às vantagens relativas que dela se derivam.
A Economia trata das escolhas que a escassez de bens e recursos disponíveis impõe para que
se satisfaçam as necessidades ilimitadas. Porém, a escassez não é postulado da economia, aliás,
esta muitas vezes conduz ao ponto de saciedade. Assim, o problema económico fundamental é o
da escassez e o objetivo da Economia é o de encontrar soluções para a sua minimização e
equilíbrio.

1.1. Corolários de escassez

• Se não fosse a escassez as opções seriam irrelevantes, pois os bens e recursos seriam
ilimitados.
• É impossível atingir a saciedade de todas as necessidades experienciadas, pois na sociedade o
total dos bens disponíveis é inferior às necessidades experienciadas.
• As necessidades básicas de sobrevivência são recorrentes, sendo que a sua plena satisfação
num dado momento não impede o seu ressurgimento posterior, de forma periódica e cíclica,
pelo que as necessidades se afiguram como inesgotáveis. P.E: alimentação.
• A escassez é gradual e relativa pois depende da intensidade com que a necessidade é sentida;

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• O facto dos recursos serem superabundantes para a satisfação de uma necessidade, não
significa que o seu excedente possa ser reorientado, com um mínimo de eficiência, para as
restantes necessidades que o reclamam.

• Mesmo com recursos abundantes, o tempo continuaria a ser escasso, impedindo a satisfação
de todas as necessidades simultaneamente, já que o tempo empregue na satisfação de cada
uma não pode ser recobrado e reutilizado nas demais.

Necessidades satisfeitas através de Bens/recursos


(ilimitadas) (escassos/raros)

• Económicos (raros/escassos);
Opções/escolhas • Livres (podem ser obtidos sem
esforços). P.E: ar

• Priorizar as necessidades;
• Procurar obter o máximo de vantagens
com o menor esforço possível.

Relação entre as necessidades e a escassez dos recursos:

• Limitações orçamentais;
• Limitações temporais – gestão de um recurso escasso, o tempo.

1.2. Objeto da Economia


O tema central da Economia é o estudo das decisões individuais e coletivas em ambiente de
escassez, enfatizando o grau de liberdade do agente (pois só em liberdade se produzem escolhas
genuínas) e a interdependência que se gera entre essas decisões. A Economia procura determinar
as razões pelas quais da interdependência de decisões livres emerge uma ordem espontânea que
dispensa supra-ordenação política, fazendo com que as pessoas colaborem independentemente do
valor que atribuem à solidariedade, entrem em relações de interdependência por mais
individualistas que sejam, etc.
“A Economia é a ciência que estuda o comportamento humano como uma relação entre fins e
meios escassos suscetíveis de aplicações alternativas” – Lionel Robbins.

Esta procura indagar as razões pelas quais essa ordem espontânea não evita alguns resultados
patológicos e socialmente nocivos, traduzidos em desperdício de recursos e oportunidades. A
Economia é uma forma de análise que procura acrescentar dimensões à compreensão da conduta
social humana e, para isso, a sua ênfase inicial é na racionalidade abstrata das escolhas ou nos
constrangimentos contratuais e institucionais que ditam os caminhos legitimadores das soluções
que decorrem das escolhas (opção ou organização).
FALAR DA TEORIA DA CIÊNCIA DO CONTRATO E COMO ESTÁ ULTRAPASSADA.

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1.3. A análise económica da racionalidade


A análise económica pode assumir uma de duas vias:

• Otimização de meios – olhar para os objetivos e determinar a racionalidade, a adequação dos


meios;
• Maximização de fins – olhar para os meios disponíveis e tentar justificá-los, encontrar-lhes
objetivos para que se afigurem racionalmente adequados.

A racionalidade de que trata a ciência económica é procedimental e raramente avança pelo plano
dos fins. A razão cinge-se ao plano das inferências válidas, não podendo haver racionalidade que
não seja capacidade de representação adequada dos fins no seu próprio plano. Esta racionalidade
não é a ponderação dos custos e benefícios associados à totalidade de opções do horizonte
cognitivo mas uma resposta a estímulos variáveis. P.E: decisões que envolvam comparações de
vantagens, prioridades e disponibilidades de tempo, genericamente em todas as interações
políticas e sociais que não tenham como objetivo explícito a criação e a repartição de riqueza.
A Economia relaciona-se com a modelação jurídica na medida em que esta é objeto de
escolhas sociais e trata de prever os efeitos das regras jurídicas alternativas aplicadas às decisões
individuais. P.E: é notório que o ingresso maciço das mulheres no mercado de trabalho implicou
quebras de natalidade, justificadas pelo facto do tempo mínimo necessário para o parto e o
acompanhamento dos recém-nascidos ter um custo de oportunidade tanto maior, quanto maior for
o rendimento que a mulher aufere.
É de referir que a racionalidade não é a ponderação minuciosa, escrupulosa, articulada, de
todos os custos e benefícios associados à totalidade de opções que o horizonte abarca – mas apenas
uma resposta diferenciada, e explicável, a estímulos variáveis: aquele que sabe que o chocolate
engorda e escolha não o ter à mão enquanto estuda não calcula minuciosamente a distância à qual
o chocolate tem de se encontrar para que a tentação se dissipe; aquele que pede a outrem para não
fumar em espaço fechado não tem de explicitar todos os argumentos científicos ao pormenor de
o porquê de o fumo passivo ser prejudicial; o tribunal decide pela dúvida razoável e não pela
certeza absoluta.
Pode dizer-se que coexistem dois modelos de racionalidade:
• Modelo “construtivista” – todas as regras de conduta e decisões válidas foram criadas por
uma deliberação consciente e racional. Porém, muito do nosso conhecimento prático, da
nossa capacidade de agir e resolver problemas, é não deliberativa e não estruturada;
• Modelo “ecológico” – a racionalidade emerge de processos evolutivos culturais e
biológicos que ditam experiências “locais” de validação. Muita da nossa racionalidade tem
base instintiva.

Para a Economia, a moeda é um simples meio de acesso a recursos e não é, em si mesma,


um recurso daqueles cuja escassez obriga à realização de escolhas e à tomada de decisões
optimizadoras e maximizadoras da satisfação de necessidades.

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1.3. a) A otimização
Princípio da otimização – George Stigler: escolha da conduta que apresenta máxima
diferença entre benefícios e custos. São custos de oportunidade todos os benefícios que deixamos
de obter por sacrificarmos as opções que tinham que ser preteridas em favor da conduta escolhida.

A otimização não pode evoluir da análise generalizada e meticulosa de custos e benefícios porque
estes nem sempre são explicitáveis e ponderáveis e porque seria irracional despender esse tempo.
Assim, surge o raciocínio marginal que se concentra microscopicamente nos custos e vantagens
de mais uma opção, de mais um bem, de mais um fator produtivo.

A escola neoclássica é essencialmente racionalista, afirmando que as decisões básicas derivam de


ponderações racionais, sendo a racionalidade facilitadora de resultados maximizadores do bem-
estar social.

1.3. b) Racionalidade limitada


Racionalidade limitada – Herbert Simon: conduta que pretende ser racional mas não transcende
a ponderação dos custos implícitos na racionalidade, tem como objetivo não a maximização mas
a satisfação do meramente suficiente.

Como o tempo é limitado, é um bem escasso e custoso de aquisição e análise de informação


completa e no desenvolvimento de um plano de otimização, então escolhemos viver um nível de
“ignorância racional” (optando pela solução marginalista em função do baixo nível de informação
que ela tende a exigir) e agregar-nos em grupos que permitam dividir trabalho e partilhar
informação por forma a poupar tempo. FALAR DA IMPORTÂNCIA DA PSICOLOGIA PARA
A ECONOMIA.

2. As opções ditadas pela escassez


Todas as nossas escolhas têm um custo que consiste essencialmente no valor daquilo a que
se renuncia para se obter aquilo por que se optou. P.E: um estudante que deixa acumular as
cadeiras “atrasadas”, aumenta o custo na sua aplicação a cada uma, porque é cada vez maior o
número das disciplinas pelas quais tem de distribuir o seu tempo, cada vez maior o número de
disciplinas que deixa de estudar enquanto se dedica àquela que momentaneamente considere
prioritária.

2.1. Eficiência e prioridades

A escassez condiciona igualmente conflitos de fundo, como entre eficiência e justiça.


A prioridade dada à eficiência (afetação de recursos aos seus empregos com o máximo valor
relativo) implica emprego de meios com finalidade à maximização (maior rendimento possível
partindo de um determinado conjunto de meios).
A prioridade dada à justiça dá importância à forma de repartição do rendimento, à igualdade nas
comparações intersubjetivas de resultados distribuídos.

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A incompatibilidade da prossecução simultânea destes, deriva da escassez de recursos


passíveis de serem afetados a cada um. Um uso eficiente de recursos resulta em produção dos
bens e serviços mais apreciados pelo maior nº de pessoas, levando a que o aumento quantitativo
dos meios seja decisivo para a otimização das finalidades. Até uma distribuição justa de um
resultado ineficiente pode ser injusta, porque não satisfaz ninguém. A eficiência é a consumação
de regras aceites por todos na integração social e cujo respetivo desenvolvimento livre é também
uma forma de justiça capaz de limitar como justos os resultados que dela dimanam. Otimizar
recursos é retirar deles o máximo de satisfação, ou seja, levar a exploração ao limite imposto pela
escassez.

3. Custo de oportunidade e preço relativo


Uma escolha é racional porque se centra numa comparação subjetiva de custos e benefícios
das várias alternativas abertas à opção. A utilidade ponderada é o resultado dessa ponderação
(ponderação de ganhos e perdas).

Racionalidade económica – não envolve qualquer ponderação valorativa sobre os objetos de


uma conduta, reportando-se ao custo de oportunidade.
Custos emergentes – resulta daquilo que ocorreria se tivéssemos tomado cada uma das opções
alternativas daquela que tomámos.
Lucros cessantes – vantagens a que renunciámos e que estariam ao nosso alcance nas opções que
preterimos.
Custo de oportunidade – valor do benefício que deixou de ser obtido associado à segunda melhor
alternativa (alternativa preterida). Aquilo que se deixou de ganhar, o lucro que deixou de ser
obtido associado à alternativa escolhida. Para uma escolha devem ser contabilizados não só os
custos dela mas também o custo de oportunidade que se perde ao não realizar uma outra.

A escassez e a irreversibilidade do tempo tornam crucial a ponderação de benefícios e custos


de oportunidade, para que qualquer decisão económica, que quando tomada é condicionante e
irreversível, se paute de alguma medida de racionalidade.

A dimensão temporal é decisiva para a maior parte das valorações económicas e a maior parte
dos custos resulta da perda de tempo, uma vez que este não é nem reversível nem infinito e a sua
perda resulta num intervalo de não-oportunidade. Quem perde tempo perde uma fação
irrecuperável da sua vida, não poderá jamais alcançar os benefícios que lhe teriam advindo do uso
produtivo do tempo que perdeu no determinado período de não-oportunidade.
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EXEMPLO
Alguém é ótima advogada e ótima secretária. A atividade racional para se dedicar seria advocacia,
pois, possivelmente, teria mais lucro, tendo mais custo de oportunidade se decidisse ser secretária.
Ganharia uma hora de salário de secretariado, mas estaria a perder uma hora de salário de
advocacia. A alternativa deve poder cobrir o custo de oportunidade. É racional não optar por
ganhar 10€ se se puder ganhar 100€, embora o custo de oportunidade de 10€ exista, compensa
prescindir dele.
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O custo de oportunidade é espelhado no Preço relativo – o preço relativo de um bem A em


𝑃𝑟𝑒ç𝑜 𝐴
relação a um bem B é o quociente entre o preço de A e o preço de B. PRA = . Este é a medida
𝑃𝑟𝑒ç𝑜 𝐵
exata do quanto deixamos de pagar por um bem quando compramos o outro.

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EXEMPLO
Preço A: 4€, Preço B: 2€
4
2
= 2. Para obter uma unidade de A tenho de prescindir de duas unidades de B

4. Raciocínio marginalista
Na maior parte dos casos nunca atingimos o ponto de saciedade, porque os recursos são
escassos e as necessidades ilimitadas. A análise da racionalidade económica centra-se, não nas
grandes decisões que transportam o indivíduo automaticamente para um ponto de saciedade desde
um ponto de insatisfação total, mas nas pequenas decisões que provocam pequenos incrementos
de satisfação dentro de um plano decisório que as transcende nos seus valores totais.
A maior parte das decisões de que se ocupa a ciência económica não são em rigor as de fazer ou
deixar de fazer algo, ou seja, o tudo ou nada, mas antes as de fazer mais ou menos de algo, de
intensificar ou reduzir o número de unidades empregues em apoio de uma determinada decisão
ou atividade.

Utilidade – quando os benefícios dizem respeito ao consumidor. Conceito desenvolvido a partir


das leis de Gossen (séc. XVIII) (3 leis) por três autores: Jevons, Menger e Walras (anos 70 do
séc. XIX) = pensamento marginalista.

PRIMEIRA LEI DE GOSSEN – a intensidade das necessidades decresce à medida que vão
sendo aplicadas doses sucessivas do mesmo bem até se alcançar o ponto de saciedade.
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EXEMPLO
Uma pessoa tem sede e tem à disposição vários copos de água, iguais uns aos outros.
Quando consome a primeira dose de água tem um nível de satisfação muito elevado
porque a necessidade é sentida de forma muito intensa. Continua com sede e vai bebendo
mais água e vai decrescendo a sua necessidade, atribuindo nível de satisfação inferior a
cada copo de água, até atingir o ponto de saciedade.
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Assim, temos de distribuir os recursos às necessidades que sentimos e a última dose (que não
satisfaz), tem utilidade denominada marginal. A utilidade é decrescente proporcionalmente ao
número da dose, ou seja, é maior se for a segunda dose do que se for a terceira.

Após a saciedade o ponto de utilidade é 0, sendo que se continuar a satisfazer uma saciedade
inexistente a utilidade passa a ser negativa.
Deve consumir-se até ao ponto que a utilidade marginal seja igual ao custo (preço que tem de
pagar para obter o bem) [Um=P]

Utilidade marginal – utilidade obtida de uma dose


Se utilidade for 60 e preço também então atingiu-se um ponto de equilíbrio entre a Utilidade
marginal e o Preço e não compensa continuar a consumir pois o custo supera o benefício. Não
compensaria pagar 60 por uma utilidade de 40.

Custo marginal – valor da mais valiosa alternativa preterida para se produzir mais uma unidade
de um bem ou serviço.

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Beneficio marginal – valor dessa unidade suplementar do bem ou serviço por que se optou.

Assim, é marginalmente racional optar por produzir/adquirir mais de um bem/serviço


enquanto o benefício de mais essa unidade exceder o correspondente custo de oportunidade,
produzir/adquirir menos quando esse custo exceder o benefício adicional, e não produzir/adquirir
nem mais nem menos quando os valores coincidem.

5. O impacto dos incentivos na conduta


O ser livre recorrerá sempre a uma comparação racional custos/benefícios. Ora, se se
interferir com a dimensão absoluta ou relativa destes, alterando-a, o agente irá responder a essa
alteração, adaptando a sua conduta. É, assim, possível condicionar a conduta de um agente sem
lhe retirar a liberdade de escolha e decisão, interferindo nos incentivos, que são para ele o valor
absoluto ou relativo dos ganhos e perdas esperados da próxima decisão; que são os pontos de
referência das suas escolhas e a sua motivação para agir.

Embora simples no efeito que provoca numa conduta individual (ex. aumento de custos
geralmente provoca restrição do consumo), os incentivos são complexos quanto às facetas de
modelação da política económica porque supõem que se conheça minimamente a reação dos
indivíduos à alteração dos incentivos e porque um mesmo incentivo implica diferentes reações
em agentes económicos com caraterísticas diferentes.

A ênfase nos incentivos é, também, a ênfase na liberdade, na convicção de que as pessoas são
capazes de alcançar sem constrangimentos certas finalidades, desde que sejam criadas motivações
adequadas.

A ênfase nos incentivos, embora permita compreender a viabilidade das soluções económicas em
contextos de liberdade social e política, sacrifica os valores igualitários ao apelar àquilo que
diferencia as pessoas. Uma economia que assente na livre mecânica dos incentivos, apela à
desigualdade de talentos, de sorte, de oportunidades e de formação, que levam cada um a acalentar
a esperança de alcançar uma remuneração correspondente com justiça ao esforço, empenho,
talento e boa sorte, com que individualmente participou no processo produtivo.

Uma economia que insista num nivelamento igualitário em nome da justiça social conta com
a perda de incentivos e respetivas consequências (queda do nível de atividade económica e da
capacidade de gerar riqueza). Nenhuma medida se pode alhear do dilema justiça social/ eficiência
ou privar-se ao preço imposto pela escolha deste dilema.

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5.1. O postulado da racionalidade


A ciência económica parte do pressuposto de que a ação humana é dominada por princípios
racionais, podendo o agente escolher livre e conscientemente uma de entre várias opções, optando
por aquela que, ao mesmo custo que as demais, apresenta maior probabilidade de resultados
ótimos ou aquela que com probabilidade de resultados igual às demais apresenta um custo mais
baixo.

Procura-se minimizar os custos e maximizar os ganhos, o maior benefício líquido, minimizando


desperdícios. Esta liga-se com o princípio hedonístico, com a “lei do menor esforço”. Aquele que
alcance mais satisfação com esforço igual aos restantes maximizará o sucesso da sua atividade e
o que com menos esforço alcance os mesmos resultados poupará recursos para prolongar ou
repetir a satisfação.

Característico da eficiência é a minimização dos custos de produção de riqueza, salientando-se a


relevância da eficiência tecnológica, sem a qual não se pode ter eficiência económica.
A racionalidade foca-se mais no plano dos meios que na adoção de fins, sendo normalmente
enganador considerar-se racional ou irracional um objetivo da ação, se ele é efetivo a determinar
condutas. A apreciação que incide sobre a racionalidade é praticamente valorativamente nula.
O postulado da racionalidade é decisivo para a esperança da edificação de uma ciência económica
capaz de formular leis empíricas gerais e rigorosas: se a racionalidade predominar no plano de
resposta aos incentivos, então a conduta torna-se mais previsível.

5.2. Limitações temporais e orçamentais


Dada a escassez, a otimização da satisfação de uma necessidade conflitua inevitavelmente com a
atuação que é requerida para se alcançar a satisfação das necessidades:

• ou se consegue estabelecer a prioridade da necessidade e ela beneficia, temporariamente, do


emprego de recursos, até à sua satisfação progressiva lhe faça perder a prioridade.
UM = B > C
• ou os recursos têm de ser selecionados e combinados de forma a que se consiga satisfazer de
forma simultânea e proporcional as várias necessidades concorrentes – tudo se centra na
exploração das possibilidades máximas de satisfação simultânea do máximo de
necessidades.
Se se intensificar a afetação de recursos à satisfação de necessidades, há um aumento do CDO
(menor número de recursos dedicados à satisfação de necessidades) – menor incentivo à
prossecução de uma atividade que visa satisfazer as necessidades.
Quando mais tempo e recursos se pode reservar à busca e à edificação de uma solução, maiores
probabilidades haverão de que ela seja optimizadora.
As limitações temporal e orçamental são as manifestações mais restritivas e sensíveis no plano
individual da escassez. Antes de se deparar com estas limitações, as opções são condicionadas e
desincentivadas por CDO crescentes no esforço produtivo.

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6. A vantagem das trocas


A relação que se estabelece entre os agentes económicos pressupõe uma complementaridade de
necessidades e uma contraposição objetiva de interesses – a nossa interdependência social
depende do facto de precisarmos uns dos outros.
Trocas – são “jogos de soma positiva” porque o benefício de uma parte não implica o prejuízo
da outra, contribuindo para o aumento da utilidade total. Os interesses que se contrapõem são
complementares, tendo, por isso, valores desiguais para as partes envolvidas.
É um compromisso que implica que cada parte transija relativamente à sua posição inicial de
ganho máximo – o facto de ambas as partes ganharem com as trocas, não significa que qualquer
uma delas realize o ganho máximo que idealizou antes da troca.
O facto de ambas as partes ganharem, não significa que elas ganhem o mesmo, sendo natural que
ocorra variações de preços que ora beneficiem mais de uma parte, ora beneficiem mais de outra
parte.
As trocas efetuam-se dentro de um quadro de justiça. Assim, cada família produz um valor
equivalente àquilo que consome. Contudo, produzir mais implica libertar-se das atividades em
que se é menos produtivo, para se concentrar naquelas em que é maior a sua vantagem
comparativa.
Os ganhos das trocas decorrem da diferença entre preço e valor. Definimos o preço de acordo
com a expressão monetária do valor que lhe damos. O preço é objetivo e o valor é subjetivo. Um
fumador pode dar valor a um cigarro, mas um não fumador não lhe dá qualquer valor, porém, o
preço é o mesmo para ambos. O preço é algo que se forma no mercado e o valor depende de uma
valoração por parte dos agentes económicos.
Para o consumidor o valor tem como referencial a utilidade e para o produtor tem como
referencial o custo de produção. O consumidor consome até a utilidade ser igual ao preço e o
produtor produz até que o custo marginal seja igual ao preço. A vantagem da troca para o
consumidor é a diferença entre a utilidade total e o preço total.
O produtor está disposto a vender porque dá mais valor, de forma racional, ao dinheiro que
vai receber do que à posse de uma coisa. Está disposto a vender porque o preço cobre o custo de
produção, é superior. Está disposto a vender até ao ponto em que o custo marginal iguala o preço.

Cada família consumirá tanto mais quanto mais produzir. Esta produção implica libertar-se
das atividades nas quais não apresenta boas prestações e forcar-se nas que apresenta bons
resultados, através de uma especialização. Assim, interessa intensificar as trocas, prejudicando o
isolamento e a autarcia, porque estes fazem perder oportunidades de ganhos recíprocos (sendo
que ninguém ganha e todos perdem), cada um produzindo aquilo em que se especializa, obtendo
melhores resultados globais. Ao especializar-se numa determinada área, a família terá de comprar
bens de outras áreas, bens esses em que outras famílias se especializaram.

Esta necessidade salienta a necessidade do mercado e das trocas, para a satisfação geral das
necessidades. Assim, e como reitera Adam Smith, se todos ganham com as trocas e se as trocas
são veículos de enriquecimento, então as oportunidades de riqueza são tanto maiores quanto maior
for a dimensão dos mercados e a sua subsistência e preservação é fulcral para o enriquecimento
global.

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Perante esta situação, deveria apontar-se na formação de um mercado internacional sem


fronteiras, permitindo todas as trocas necessárias e desenvolver as suas virtualidades
optimizadoras. Porém, em favor de interesses de ordem interna, os Estados procuram colocar
fronteiras a um mercado internacional aberto, ao sentirem ameaças de concorrência estrangeira
aos seus produtos nacionais. Se não fosse o poder de que dispõem, os Estados jamais cairiam nas
soluções de agressividade e isolamento autárcico a que os privados são poupados.

7. Afetação social de recursos através do mecanismo dos preços


O poder de planificar e dirigir a economia ou se entrega a uma racionalidade central (poder
político) ou se abandona às forças de mercado e ao poder de maximização de ganhos recíprocos
pelas trocas.

Numa economia de mercado, a atividade económica é condicionada pelas forças que animam
as trocas, sendo o mercado o seu principal ocasionador. Predomina a liberdade de conformação
de direitos e deveres conexos com os interesses em jogo, por recurso às formas contratuais
comuns. As grandes decisões de que dependem a eficiência e justiça e o funcionamento geral do
mercado não são entregues a ninguém, assumindo-se que elas resultarão de uma ordem
espontânea, centrada no mecanismo dos preços.

Este mecanismo é um processo de sinalização através do qual as partes comunicam a


disponibilidade para trocar; a adesão a valores geralmente aceites como base de negociação; o
respeito do comprador pelo custo imposto e a sensibilidade do vendedor pelas necessidades do
consumidor e; a confiança de ambas as partes no meio de pagamento comum.

Qualquer interferência do poder político pode destabilizar toda a atividade económica ao turvar
ou distorcer a sinalização pela qual se coordenam os interesses particulares e com base na qual as
decisões particulares são tomadas de forma mais racional possível.

Acredita-se que as decisões da economia de mercado resultam de uma organização espontânea


(mão invisível), que se centra no mecanismo dos preços um processo de sinalização através do
qual as partes comunicam:

• A sua disponibilidade para trocar;


• A sua adesão a valores geralmente aceites como base de negociação;
• O respeito que os compradores têm pelo custo expresso na avaliação do vendedor;
• A sensibilidade que os vendedores têm pelo custo expresso na avaliação do consumidor;
• A confiança que as partes depositam no meio de pagamento comum.

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8. Mercado de produtos e mercado de fatores

PROCURA Empresas OFERTA

Mercado de Mercado de
fatores produtos

OFERTA PROCURA
Famílias

• Mercado de fatores – bens e serviços que são produzidos para satisfazer as necessidades
(outputs).
• Mercado de produtos – bens e serviços apreciados e empregues no ponto inicial do inicio do
ciclo da atividade económica (inputs). Os fatores de produção são a terra (renda), os bens de
capital (instalações) e o trabalho (salário).
Estes dois tipos de mercado podem ser configurados como:

• Um fluxo circular de produtos e de fatores – no mercado dos produtos, as empresas são os


produtores e as famílias são os consumidores.
• Um contra fluxo de pagamentos – no mercado de fatores, as famílias são os produtores (mão
de obra, recebem uma remuneração) e as empresas são os consumidores (pagam as
remunerações).

9. A intervenção do Estado nos mercados


Muitas vezes, o funcionamento do mercado vem acompanhado de ineficiências e injustiças que
justificam a intervenção do Estado para emendar as falhas do mercado. Existem três razões que
justificam a intervenção do Estado:

• Justiça social
A principal razão que justifica a intervenção estatal nos mercados é a justiça social, de
solicitude pelos mais desfavorecidos e explorados e pelos excluídos do mecanismo das trocas. O
rendimento atribuído a quem participa nas trocas deveria ser proporcional ao esforço e habilidade
respetivos aplicados na produção de bens e serviços que tenham procura nos mercados.

O Estado deve balizar o resultado da livre manifestação de incentivos à atividade económica,


evitando que a regra de coexistência e complementaridade destrua os próprios alicerces do
mercado.
Se por um lado, fornecer uma base aos que estão em queda para situações de carência e exclusão
absolutas parece um fator estruturante da humanidade, sem o qual o jogo de trocas não faria
sentido; por outro lado, tal salvaguarda exige financiamento público, que exige retirar
financiamento aos privados, diminuindo os incentivos de produção, o que leva a que aquele para
quem o trabalho ou a poupança passam a trazer menos rendimentos líquidos trabalhará e poupará
menos, aumentando a possibilidade de queda na pobreza para todos.

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A liberdade económica existe dentro de um determinado quadro normativo e organizativo, que


assegura justiça e segurança nas trocas, promovendo a eficiência do circuito económico quando
o mercado falha. Ainda assim, convém ser crítico quanto à intervenção estatal porque, em norma,
tem-se provado que os mercados têm uma capacidade autorreguladora para dar resposta às suas
próprias falhas.

• Eficiência – falhas de mercado que têm duas causas:

➢ Externalidades – quando uma atuação económica projete efeitos, benéficos ou maléficos,


sobre alguém que não o agente, interferindo no nível de bem-estar dessa pessoa sem que
lhe seja paga qualquer indemnização ou exigida uma compensação. Aqui, a intervenção do
Estado justifica-se para colmatar a brecha entre a eficiência económica e o bem-estar
coletivo (refreando o nível de atividade; incentivando quem não dispõe de meios para
reclamar dos terceiros os benefícios que lhes causa). É a presença de externalidades que
perturba a coincidência entre eficiência de mercado e bem-estar social, é ela que impede
que todos os resultados socialmente relevantes sejam alcançados através do mercado.
Pressupõem-se, então, que sem as externalidades o mercado funcionaria eficientemente na
afetação de recursos.

➢ Poder de mercado – permite a alguém a exploração do mecanismo dos preços em proveito


próprio, para além do limite que fira um sentido mínimo de justiça. A atuação do Estado
justifica-se para esvaziar esse poder, evitando situações abusivas, explorações de vantagens
ou desequilíbrios extremos que comprometam a capacidade do funcionamento normal do
mercado assegurar a justiça e a eficiência da atividade total que nele decorrem.

Como é que o Estado intervém?


Em ambos os casos, o Estado pode: produzir diretamente bens, serviços e informação que
estejam subproduzidos no mercado ou adquirir esses mesmos a produtores privados quando
sobreproduzidos; criar incentivos e desincentivos a produtores privados e; impor determinados
padrões e condutas ao setor privado. Para combater as falhas de mercado o Estado pode utilizar
determinados mecanismos:
• Aumentar a informação disponível;
• “Criação de mercado”, com definição de direitos de apropriação, quotas negociáveis,
sistemas de compensação de benefícios e sacrifícios particulares.
Estes mecanismos traduzem-se em medidas concretas:
• Eliminação de “subsídios perversos” que fomentam atividades causadores de externalidades
negativas;
• Adoção de medidas “internalizadoras”;
• Ponderação custo-benefício de efeitos a longo prazo;
• Formação de coligações internacionais para a coordenação de esforços para a melhoria do
acesso a fontes de financiamento.

• Falhas de intervenção
As “falhas de intervenção” ou “falhas de Governo” dão-se, maioritariamente, porque o
Estado é administrado por pessoas falíveis e injustas, suscetíveis de pressões e aliciamentos. Toda
a intervenção é inevitavelmente contaminada por informação imperfeita, por unilateralidade e
confinamento de avaliações, por deficiências de planeamento e execução, por quebras de
comunicação, por falta de vigilância ou responsabilidade, por corrupção, compadrio, nepotismo
e caciquismo.

12
Margarida Gonçalves

A atividade económica coletiva é dos fenómenos sociais mais complexos e sempre se colocará a
dúvida se é possível pôr-se em prática uma planificação tão sofisticada que abarque e interaja
eficientemente com essa complexidade, ou se há um sucedâneo razoável para os incentivos que o
mercado transmite a todos os participantes.

Mais ainda, existem critérios de legalidade, imparcialidade e transparência na atuação dos entes
públicos que prejudica a sua agilidade de tomada de decisões e torna muito dispendiosa a sua
atividade. Para completar, existe um grave problema de incentivos no setor público, visto que as
decisões são tomadas por funcionários que, não tendo a sua remuneração ou ascensão na carreira
diretamente relacionadas com a eficiência das soluções adotadas, não são incentivados a adotar
as diligencias que tomariam no caso de tal suceder.

Não é muito evidente que a intervenção do Estado na economia seja globalmente eficiente, muitas
vezes sucedendo que as “falhas de mercado” não cobrem as “falhas de intervenção”, o que se
pode dever à incapacidade do Estado de interagir com o dinamismo do mercado, pelos atrasos
burocráticos, à falta de “pressão competitiva”, à falta de informação detalhada sobre uma situação
concreta, etc.

Parte das “falhas de intervenção” pode ser minimizada pelo recurso a instrumentos muito
sofisticados na recolha e processamento da informação, na sua aferição empírica e reformulação
permanente, na sua sujeição explícita a procedimentos iterativos de otimização que se apresentam
como alternativa ao funcionamento do mercado.

A simples admissão da possibilidade de “falhas de intervenção” já é uma evolução paradigmática


a análise da atuação do Estado na economia que contraria a perspetiva vigente no século XX, que
alicerçava a expansão do Estado na eficiência, alegando detetar “falhas de mercado” que só
podiam ser resolvidas pela intervenção estatal nos mercados.

10. Produtividade
A produtividade é a quantidade de bens e serviços que cada trabalhador é capaz de produzir,
em média, numa unidade de tempo (“output” por hora). Essa quantidade poderá ser aumentada
em função do grau de aptidão do trabalhador, do progresso tecnológico e da estabilidade jurídica
e política.

Numa comparação instantânea, serão mais prósperos os países onde é mais elevada a
produtividade do trabalho. Numa comparação diacrónica, os aumentos de prosperidade, para não
serem somente aparentes ou especulativos, resultarão essencialmente da intensificação da
produtividade, através do progresso tecnológico.

É hoje comummente aceite que a forma ideal de gerar riqueza, de assegurar o crescimento da
prosperidade de modo favorável, deve pôr ênfase na garantia de condições estruturais de
produtividade, na afetação de recursos ao investimento em capital humano e físico que assegurem
tanto o crescimento como a reserva de potencial para o crescimento futuro, ou seja, assegurar
prosperidade a esta geração sem esgotar os recursos para a prosperidade das gerações seguintes.

A atuação estadual, absorvendo muitos recursos, desvia para si meios de financiamento que
de outro modo estariam disponíveis para o investimento direto em capital humano e físico, o que
pode determinar quebras de produtividade e, desse modo, um abrandamento ou até um retrocesso
da prosperidade.
A opção pelo investimento em tecnologia revela o quanto incremento da produtividade reclama
um esforço de luta contra o bem mais escasso de todos: o tempo.

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Margarida Gonçalves

“Path dependence” – irreversibilidade que acompanha os triunfos tecnológicos, que faz com que
a tecnologia triunfante tenda a arrebatar a totalidade do mercado, tornando-se “standard” e
expulsando as tecnologias rivais. O progresso tecnológico traz consigo um risco estrutural.

11. Fronteira de possibilidades de produção


A FPP é a expressão do contínuo de combinações de vários bens/serviços que estão ao alcance
do produtor através de simples reafectação de recursos disponíveis. Isto significa que a eficiência
produtiva é maximizada em toda a opção produtiva por ela representada, verificando-se a
impossibilidade de produzir mais de um bem sem produzir menos de outros bens para os quais
seja possível reafectar em alternativa os recursos disponíveis.
A perceção das vantagens é imediatamente acompanhada da medida total dos correspondentes
CDO.

CAPÍTULO III – INTERDEPENDÊNCIA E TROCAS

1. Divisão do trabalho
As relações económicas e a interdependência dependem de uma confiança institucional (de que a
complementaridade objetiva de interesses e aptidões tornará inevitável uma conduta
generalizadora de cooperação).
“Egoísmo económico” – satisfazemos interesses alheios para satisfazermos os nossos, ficando
todos a ganhar com as trocas.
Para proceder a trocas vantajosas, pressupõe-se que as pessoas que têm necessidades
complementares, disponham de bens diversos (em que são mais especializados e aptos) para
prestarem serviços e assim obterem, sem demasiado custo, informações sobre as potencialidades
dos parceiros nas trocas.
As trocas ocorrem motivadas pela representação do ganho, dentro da probabilidade de ocorrência
de “soma positiva” (diferença ente custos e benefícios).

2. Vantagens absolutas
A vantagem absoluta consiste na produção de um bem no qual o produtor tem uma maior
especialização e que vai produzir de forma excedentária para a realização de trocas. O produtor
tem uma maior eficiência na produção dos bens em que é mais especializado.
Para se especializar, o produtor necessita de fazer escolhas (qual bem irá produzir) racionais,
optando por isso por produzir o bem no qual tem uma maior especialização.

3. A confiança e o equilíbrio nas trocas


Muitas vezes sentimo-nos insatisfeitos com as transações que realizamos, o que não significa que
tenhamos sido prejudicados por ela.
Troca – é um compromisso que implica que cada parte transija relativamente à sua posição inicial
de ganho máximo – o benefício objetivo tem de existir para que ocorra troca voluntária.

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Margarida Gonçalves

Transação – unidade básica da atividade económica, que inclui o conflito, a mutualidade e a


ordem.
Os economistas, conservando um prudente ceticismo perante as preferências declaradas, tendem
a fazer recair o peso da sua análise sobre as preferências reveladas dos agentes económicos.
A racionalidade nas trocas implica que todos os indivíduos beneficiem, mas não que todos
beneficiem no mesmo montante/proporção. Se num caso, o lucro foi superior ao excedente do
consumidor, noutro caso verifica-se o contrário, mas em nenhum dos casos a presença de um dos
valores implica o desaparecimento do outro, porque se tal acontecesse, a transação não teria
ocorrido.

4. Vantagens comparativas
A vantagem comparativa exige a divisão de trabalho entre produtores, libertando tarefas em que
estes sejam comparativamente menos aptos, e dedicando-se à produção do bem em que são mais
especializados, tendo por isso um menor CDO.
A própria escassez determina que mesmo aquele que dispõe de várias vantagens absolutas em
ambas as atividades, acaba por não poder dedicar a qualquer uma dessas atividades mais do que
tempo parcial, se optar pela autossuficiência.
Na orientação da opção racional encontra-se uma ponderação de CDO – o tempo gasto na
atividade menos produtiva é tempo roubado à atividade mais produtiva e vice-versa, pelo que a
opção pela atividade menos produtiva é a que tem mais elevados CDO, e a opção pela atividade
mais produtiva é a que tem custos mais baixos.

5. Os custos da independência
As trocas beneficiam todos os membros de uma sociedade pois permitem que as pessoas se
especializem, se libertem de tarefas em que são relativamente menos eficientes e se concentrem
naquelas em que o são mais e, com isso, alcancem maior prosperidade e produtividade a menor
custo. O comércio designa, na sua vertente de interdependência, cooperação e coordenação, toda
a atividade produtiva, aquela mesma que se representa em mini-modelos de circulação
económica. Assim, os ganhos das trocas implicam agravamento da interdependência.

O “capital social” é o adquirido civilizacional que corresponde à sedimentação dos nexos de


interdependência que várias razões colocam nos alicerces da sociedade; visto de um prisma
individualista, é o conjunto de vantagens que qualquer pessoa pode retirar da sua pertença a uma
sociedade, ainda que essas vantagens dependam genericamente de uma contrapartida de
obrigações e limitações, ou reclamem níveis mínimos de participação nas atividades coletivas, até
como forma de travar ou evitar a degradação da experiência comunitária ou da formação e
legitimação da vontade política; há quem evite completamente esta expressão.

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Margarida Gonçalves

CAPÍTULO IV – AS FORÇAS DE MERCADO

1. Oferta e procura
Oferta – atitude típica daquele que se dirige ao mercado para vender um bem/serviço que avalia
em função do custo.
Procura – atitude típica de quem se dirige ao mercado para satisfazer as suas necessidades através
da aquisição de um bem, ou da utilização de um serviço, sendo que o valor atribuído a esse
bem/serviço é determinado pela sua utilidade.

2. Noção de mercado concorrencial


Mercado – interação do conjunto de vendedores e compradores, atuais ou potenciais, que se
interessam pela transação de determinado produto. Pode ser um ponto físico ou não – há tantos
mercados quantos os tipos de bens, serviços e fatores que são oferecidos e procurados.

• Bens de produção conjunta – a produção de um reclama a presença do outro. P.E: a gasolina


e os derivados do petróleo.
• Bens complementares – a sua utilização/consumo fazem-se combinadamente. P.E: os pneus e
o automóvel.
• Bens sucedâneos ou substituíveis – concorrem para a satisfação da mesma necessidade,
podendo uma descida consumo de um produto ser compensada por um aumento do consumo
do outro. P.E: coca-cola e pepsi.
Um mercado pode formar-se espontaneamente e ser efémero, ou pode ser muito organizado e
regulamentado.

3. Nível concorrencial
Mercado de concorrência perfeita – modelo ideal e abstrato, que defende que ninguém dispõe
do poder de mercado. Num mercado de concorrência perfeita, todo o comportamento gravita em
torno da relação quantidade-preço, sendo que, o vendedor que vence na competição não é aquele
que apresenta o melhor produto, mas sim aquele que faz o melhor preço.

• Atomicidade – há uma multiplicidade de agentes, tanto do lado da oferta, como do lado da


procura, pelo que é impossível que alguém consiga impor a um tal mercado as suas
preferências, não existindo, portanto, poder de mercado.
Os agentes da oferta e da procura contribuem coletivamente para a formação dos preços, mas
não dispõem individualmente do poder de alterar os preços que se vão formando no mercado
(ausência de poder de mercado).

• Liberdade – o agente tem plena liberdade de entrada e saída do mercado, as vezes que quiser,
sem quaisquer custos.
Por vezes, os custos de entrada = custos de saída (sunk cost, custos irrecuperáveis). P.E: a
introdução de um produto desconhecido na sociedade exige campanhas publicitárias.

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Margarida Gonçalves

• Fluidez – conjunto de características e de circunstâncias que permitem ao consumidor não se


deixar enganar pelos vendedores quanto à possibilidade de se proceder a uma simples
comparação de preços, permitindo-lhes calcular as vantagens da concorrência perfeita e da
guerra de preços entre vendedores, adquirindo o mesmo produto a um preço mínimo, ou a
máxima quantidade do mesmo produto a um dado preço.
Trata-se de assegurar a transparência das motivações dos agentes, através da maximização da
informação/eficiência do conhecimento disponível ao agente.

Mercado de concorrência imperfeita – o poder de mercado manifesta-se através da formação


dos preços, não pela ação combinada das forças em concorrência, mas pela vontade de um único
agente ou de um grupo restrito de agentes, para os quais os preços concorrentes passam a
constituir uma variável, que eles conseguem manipular dentro de certos limites (Price makers).

• Monopólio (um vendedor) – falta-lhe a atomicidade.


• Oligopólio (um número restrito de vendedores) – falta-lhe a atomicidade.
• Concorrência monopolística (todos vendem produtos similares, procurando conquistar
clientela através da diferenciação ostensiva desses produtos) – falta-lhe a fluidez.

4. Fatores da oferta num mercado concorrencial


A oferta é a posição dos vendedores no mercado. A quantidade oferecida é o conjunto de produtos
de que os vendedores dispõem e são capazes de vender, dado um nível de preços.
A atitude da oferta ou a curva da oferta depende:

• Preço
Lei da oferta – correlação direta entre os preços e a quantidade oferecida.
P+ Q+ / P- Q-
Produzir um bem para o oferecer num mercado envolve custos, por isso, quanto mais elevados
são os preços, maior é a possibilidade desses custos serem cobertos pelo total da receita obtida
com as vendas, e de se obter um excedente do produtor/lucro.
Lei dos rendimentos marginais decrescentes – a cada acréscimo de produtividade, há um
aumento do rendimento. Contudo, a partir de um certo ponto, o rendimento será fixo.

• Alteração dos custos de produção – correlação inversa. –CUSTOS +OFERTA

• Rendibilidade de produções alternativas


➢ Bens sucedâneos – quanto maior for a oferta de um bem (A), menor a oferta dos seus bens
sucedâneos (B).
➢ Bens complementares – quando maior for a oferta de um bem (A), maior o preço desse
mesmo bem, pelo que há um aumento da oferta do seu bem complementar.

• Alterações tecnológicas – permitem a expansão da curva da oferta.

• Dimensão do produtor – “economias de escala”: quando duas empresas se juntam, a sua


produção é mais do que o dobro.

17
Margarida Gonçalves

• Objetivos do produtor – estão relacionados com as considerações estratégicas do produtor.


Muitas vezes, os produtores têm a possibilidade de produzir mais, mas não o fazem por uma
questão estratégica, porque permite que eles tenham uma reserva de produção, para conseguir
eliminar os mercados concorrentes.

Assim, eles não aumentam a oferta para não revelar a total amplitude da sua capacidade de
resposta; esperam que os concorrentes acompanhem a subida de preços para alargar a clientela;
não arriscam um aumento de produção que se traduza, em situações futuras, num agravamento
progressivo dos custos.

• Expetativas – Efeito de Édipo


A expetativa de uma futura baixa de preços traduz-se na tentativa de venda imediata do stock de
produtos. Já perante uma expetativa da futura subida de preços, o produtor procura armazenar
esses produtos para os venderem mais tarde a um preço mais alto.

5. Fatores da procura num mercado concorrencial

• Preços
Lei da procura – correlação inversa entre o preço e a quantidade.
P+ Q- / P- Q+
Bens de Vebler – bens de consumo ostentatório (bens de luxo/superiores), que são bens que são
comprados porque são caros (contrariam a lei da procura).
Bens de Giffen – bens de baixo preço e de quantidade diminuída.

• Rendimento disponível – a procura individual dependerá do nível de rendimento de que cada


um disponha.
Bens normais – quanto maior o rendimento dos consumidores, maior a procura/o consumo.
Bens inferiores – quanto maior o rendimento, menos tendência há para o consumo destes bens.

• Existência de bens sucedâneos e complementares


Bens sucedâneos – a baixa de preço do bem A, resulta na diminuição da procura do bem B e vice-
versa.
Bens complementares – o aumento da procura de um bem A, provoca o aumento da procura do
bem B.

• Alteração dos gostos


• Publicidade
• Expetativas dos consumidores
➢ Variações do rendimento – uma expetativa do aumento do rendimento provoca uma
antecipação do consumo (crédito)
➢ Variações do preço dos bens – se achar que o preço de um bem vai aumentar, haverá uma
maior procura.
➢ Crise – antecipação do pior momento, havendo por isso uma retração do consumo.

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Margarida Gonçalves

6. Totais de oferta e procura

• Curva da procura
Há uma correlação inversa entre a variação dos preços e a variação da procura. As quantidades
procuradas serão tanto maiores quanto menores forem os preços, pelo que uma subida dos preços
será acompanhada de uma retração da procura.
O nível da procura depende do número de consumidores, alterando-se a escala da procura,
deslocando-se a própria curva da procura com a entrada de mais um consumidor no mercado e
aumento da quantidade procurada para qualquer nível de preços.

• Curva da oferta
A quantidade oferecida é função do número de vendedores que se encontram presentes no
mercado. A oferta total é o somatório daquilo que os vendedores estão dispostos a transacionar e
a produzir ou adquirir para vender no mercado.

7. O preço e a quantidade de equilíbrio


Preço – avaliação que ambas as partes fazem nas trocas.
Quando um preço estabiliza, significa que atingiu o limite máximo do incentivo para produzir e
consumir, e que uma das partes não consegue prosseguir para lá daquele ponto sem detrimento
da posição da outra.

Alfred Marshall – os preços formam-se no mercado. Só podemos compreender o funcionamento


do mercado se observarmos a interação entre a quantidade e o preço.
Isto originou a cruz marshalliana, que corresponde ao ponto de coincidência entre um preço de
equilíbrio e uma quantidade de equilíbrio.

8. Deslocações das curvas da procura e da oferta


Quando os consumidores estão dispostos a alterar a relação “quantidade-preço” a qualquer nível
de preços e de quantidades, há uma expansão ou uma contração da curva, neste caso da procura.
O mesmo acontece com a curva da oferta, quando a disposição parte dos vendedores.
O ponto de equilíbrio está formado num binómio “preço de equilíbrio-quantidade de equilíbrio”,
o que significa que:

• A um preço superior ao PE, os vendedores estariam dispostos a produzir mais bens a um


preço mais elevado do que os consumidores estariam dispostos a pagar. Ou seja, haveria uma
maior oferta de bens por estes estarem a um preço elevado, mas haveria uma menor procura.
• A um preço inferior ao PE, os consumidores estariam dispostos a consumir mais um bem por
ele ter um preço mais baixo, o que iria desincentivar a produção desse bem por parte dos
vendedores. Ou seja, haveria uma maior procura porque o preço seria mais baixo, mas a oferta
diminuiria.
Ponto de equilíbrio – é um ponto de estabilidade porque é nele que se atinge o máximo de
satisfação combinada dos interesses de vendedores e compradores que, naquele momento do
mercado, era alcançável.

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Margarida Gonçalves

Situação de equilíbrio – o cruzamento da oferta e da procura comporta uma estabilidade


dinâmica.
Lei da Oferta e da Procura – no simples pressuposto da liberdade nas trocas, os preços
efetivamente praticados no mercado tendem a convergir para um PE, ou porque coincidem com
esse ponto, ou porque o desequilíbrio impele para ele.
A deslocação do PE pode ser feita de duas formas:

• Deslocação simultânea e em sentidos opostos das curvas da procura e da oferta em resultado


de uma mera expetativa de subida de preços;
• Deslocação simultânea no mesmo sentido, em que as certezas incidem sobre as quantidades
transacionadas – aumentam se houver a expansão das curvas da oferta e da procura e diminuem
se houver uma contração das curvas da oferta e da procura.

9. A afetação de recursos através dos preços


Ao longo do tempo, procurou-se afirmar a capacidade de organização espontânea e livre do todo
da sociedade em torno das funções económicas básicas.
No mecanismo dos preços, o mercado estipula o preço de acordo com a interação entre a oferta e
a procura, ou seja, consoante a utilidade total. Contudo, o valor dos bens deixou de ser intrínseco
ao próprio bem, passando a depender da utilidade que cada consumidor retira do consumo desse
bem, ou seja, da utilidade marginal.

“Paradoxo do valor” – Adam Smith


Distingue o valor da troca de um bem, um valor objetivo determinado pelo mercado (preço) – a
utilidade total –, do valor do uso de um bem, um valor subjetivo determinado pelos consumidores
– utilidade marginal.
Um exemplo paradigmático é o da água e do diamante. Apesar do valor das trocas, ou seja, a
utilidade total do diamante ser superior ao valor da água, a verdade é que o valor de uso da água,
ou seja, a sua utilidade marginal é superior à do diamante.

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PROCURA OFERTA

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Margarida Gonçalves

“Efeito de King” – Gregory King


É uma constatação na qual se defende que se houver uma menor quantidade oferecida de um certo
bem e a sua procura for inelástica, o preço é elevado. Contudo, se num determinado ano houver
um aumento da produção desse mesmo bem, haverá uma maior quantidade oferecida, o que se
reflete na diminuição do preço.
A produção agrícola espelha este efeito. Se num bom ano agrícola existir um aumento da
quantidade oferecida de determinado produto agrícola, isso resulta numa quebra acentuada do PE,
prejudicando a receita dos agricultores. Assim, de acordo com o efeito de King, um bom ano
agrícola pode traduzir-se na ruína dos agricultores, e um mau ano agrícola pode resultar na fortuna
dos mesmos, desde que eles se consigam manter no mercado.

10. Elasticidades
A elasticidade é a amplitude da reação dos agentes económicos à alteração de condições
fundamentais da sua atividade.
I. Elasticidade procura

• Elasticidade preço procura – amplitude das variações de quantidades procuradas que


acompanham as variações de preços.

variação % da QP
EPP=
variação % do P

Fatores que determinam uma maior ou menor elasticidade dos bens


➢ Efeito de rendimento – aumento do nível médio dos preços com um rendimento constante
leva à diminuição da procura.
➢ Efeito de substituição – o consumo de bens sucedâneos provoca um aumento da elasticidade
da procura.
➢ Grau de necessidade dos bens – os bens essenciais são por norma inelásticos/rígidos; já os
bens de carácter supérfluo são mais elásticos.
➢ Perspetiva temporal – permite um ajustamento de preferências, aumentando a elasticidade
da procura.

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Margarida Gonçalves

Não há qualquer reacção da Curva da procura:


Inelasticidade procura perante a variação dos
absoluta preços.
Valor da EPP: 0
Curva da procura:

Verifica-se quando uma


determinada % de alteração do
P. determina uma % de Exemplos:
Procura
alteração da QP
Pouco Elástica
proporcionalmente inferior. Aumento do P. em 15% faz diminuir a QP em 5%
EPP = 5 / 15 <=> EPP = 0,33
Valor da EPP: entre 0 e 1
Diminuição do P. em 40 % faz aumentar a QP em
10%
EPP = 10 / 40 <=> EPP = 0,25_____
Curva da procura:

Todas as variações de P. são


proporcionalmente Exemplos:
Elasticidade compensadas pela variação na
Unitária QP. Aumento do P. em 10% faz diminuir a QP em 10 %
EPP = 1/1 <=> EPP = 1
Valor da EPP: 1
Diminuição do P. em 7,5% faz aumentar a QP
em 7,5%
EPP = 7,5 /7,5 <=> EPP = 1____
Curva da procura:

Verifica-se quando uma


determinada % de alteração do
P. determina uma % de Exemplos:
Procura
alteração da QP
Muito Elástica Aumento do P. em 10% faz diminuir a QP em 20 %
proporcionalmente superior.
EPP = 20/10 <=> EPP = 2
Valor da EPP: entre 1 e ∞
Diminuição do P. em 10% faz aumentar a QP em
50%
EPP = 50 / 10 <=> EPP = 5
Qualquer aumento dos preços
faz com que a procura
desapareça e qualquer Curva da procura:
Elasticidade diminuição dos preços faz
perfeita surgir mercado ou com que a
procura cresça infinitamente.

Valor da EPP: ∞

22
Margarida Gonçalves

• Elasticidade rendimento – sensibilidade dos padrões de consumo às variações do rendimento


disponível do consumidor.
variação % da QP
ERP =
variação % do P

Lei de Engel – as despesas alimentares são uma função decrescente do rendimento.

Bens superiores Valor ERP: A quebra da procura é mais que proporcional à


superior a 1 diminuição do rendimento e vice-versa
Valor ERP: 0, 1 A quebra na procura é proporcional, menos que
Bens normais ou entre 0 e 1 proporcional ou indiferente à diminuição do
rendimento
Bens inferiores Valor ERP: A quebra da procura decorre de um aumento no
inferior a 0 rendimento

• Elasticidade cruzada
Descobre-se se um bem é sucedâneo ou complementar de outros, e em que medida, através do
exame da elasticidade cruzada (elasticidade-preço cruzada da procura), a medida da variação
percentual das quantidades procurada de um bem em função da variação percentual dos preços
de outro bem.
variação %QP (bem A)
ECP = .
variação % do P (bem B)

Esta elasticidade é positiva no cado dos bens sucedâneos, negativa no caso dos bens
complementares, e nula no caso dos bens não relacionados no consumo.
✓ A descida de preço de um bem faz diminuir a procura dos bens sucedâneos e aumentar a dos
complementares;
✓ A subida de preço de um bem faz aumentar a procura dos bens sucedâneos e diminuir a dos
complementares;
✓ A procura de um bem aumenta se o preço dos seus sucedâneos subir ou dos seus
complementares descer;
✓ A procura de um bem diminui se o preço dos seus sucedâneos descer ou dos seus
complementares subir.

Bens complementares Valor ECP: A quantidade procurada de um bem diminui


abaixo de 0 se o preço de outro aumenta e vice-versa
Bens independentes Valor ECP: 0 A quantidade procurada de um bem diminui
não varia em função das variações de preços
de outro
Sucedâneos Valor ECP: entre A quantidade procurada de um bem aumenta
imperfeitos 0e∞ se o preço de outro aumenta e vice-versa
Sucedâneos perfeitos Valor ECP: ∞ A diminuição do preço de um bem leva ao
desaparecimento da procura de outro

Este conceito é de elevada importância para a definição daquilo que constitui um mercado, para
demarcar os seus limites, pois, em rigor, só existirá mercado autónomo para cada produto se
pudermos determinar a inexistência de elasticidades cruzadas de valor diferente de 0.

23
Margarida Gonçalves

II. Elasticidade da oferta


variação % da QP
EOP =
variação % do P

Há uma correlação direita entre os movimentos dos preços e os movimentos da oferta – a subida
de preços induz um aumento da oferta e vice-versa. Há situações em que a oferta não pode deixar
de ser pouco elástica, como por exemplo:
• Se a raridade do bem é inultrapassável;
• Se há recursos fixos ou não-renováveis.

Inelasticidade A quantidade oferecida não varia com os


absoluta Valor EOP: 0 preços
O aumento do preço leva a um aumento
Inelasticidade Valor EOP: entre menos que proporcional das quantidades
0e1 oferecidas, vice-versa
O aumento do preço leva a um aumento
Elasticidade unitária Valor EOP: 1 proporcional das quantidades oferecidas, vice-
versa
O aumento do preço leva a um aumento mais
Elasticidade Valor EOP: entre que proporcional das quantidades oferecidas,
1e∞ vice-versa
A diminuição do preço leva ao
Elasticidade perfeita Valor EOP: ∞ desaparecimento da oferta, o aumento do
preço leva ao surgimento ou expansão infinita
da oferta

Fatores que influenciam a elasticidade da oferta

• Efeito de substituição – aumenta a EO. Há uma maior rigidez da oferta relativamente a bens
perecíveis.
• Tempo – aumenta a EO.
• Efeito rendimento – é a necessidade do produtor obter um certo nível de rendimento. Diminui
a EO.

11. Elasticidade e poder de mercado


A intensidade com que a oferta e a procura reagem às variações de preços determina por sua vez
o peso que cada uma tem na conformação, em seu próprio benefício, da deslocação do preço de
equilíbrio.

12. Inelasticidade e dependência

Comparação económica das políticas proibicionistas ou repressivas face às políticas ou educativas


e formativas:

• As políticas repressivas, se levam à restrição direta da oferta de bens/serviços para os quais a


procura é inelástica, significam que uma pequena quebra de quantidade implica subidas mais
do que proporcionais do preço de equilíbrio, o que beneficiará os vendedores, para os quais a
quebra de vendas é compensada pela subida de preços.

24
Margarida Gonçalves

• Substituindo a inelasticidade, a repressão constitui a favor da oferta um incentivo económico


à subsistência da atividade proibida ou reprimida.

• As políticas educativas ou formativas procuram aumentar a elasticidade da procura,


aumentando o grau de informação quanto aos riscos do excesso de consumo ou de práticas
viciantes ou fornecendo as vias sucedâneas que despertem o efeito de substituição no consumo.

• Se a elasticidade da procura aumentar, gera-se a possibilidade de uma contração da escala da


procura determinar um novo equilíbrio que reflita uma redução simultânea de quantidades e
de preços, ou que ao menos se dirija para a linha divisória para lá da qual as restrições da oferta
deixam de significar aumentos mais do que proporcionais dos preços.

CAPÍTULO V – A INTERVENÇÃO DO ESTADO NO MERCADO

O impulso interventor do Estado no funcionamento do mercado deve começar por se defrontar


com o mecanismo da oferta e da procura. O propósito interventor é o de retificação dos resultados
desse mecanismo, quando eles sejam tidos por injustos ou ineficientes. Essa retificação e os meios
são frequentemente iníquos e ineficientes.

1. Interferências na lei da oferta e da procura


A geração espontânea de um equilíbrio no mercado é aquilo que Adam Smith designou por “mão
invisível”. A regulação de preços tem levado à ocorrência de alguns dos seguintes fenómenos:
• Carência dos bens com preços tabelados acima do PE;
• Surgimento do “mercado negro” no qual se forma um PE mais elevado do que aquele que se
formaria sem o tabelamento de preços;
• Formação de um “intervalo especulativo” de disparidade entre o PE sem regulação e o PE
com regulação;
• Disparidade entre PE no mercado negro e remuneração de quem efetivamente produz o bem
ou serviço, o que pode afetar os níveis de produção;
• Florescimento da economia do crime, em simbiose com a economia da regulação, de que
aquela retira a estabilização das suas expetativas de ganhos e perdas, a suscetibilidade de
exploração das disfunções induzidas no livre funcionamento do mercado e das próprias
falhas de intervenção, quando elas geram áreas de corrupção e impunidade;
• Abandono do mercado pelos compradores;
• Expansão autossustentada da burocracia supervisora da regulação dos preços;
• Aumento dos custos para os próprios agentes tutelados, seja os custos de acatamento seja os
de evasão aos regulamentos;
• Redução do nível concorrencial, pela imposição de uma disciplina uniforme ou de
segmentação do mercado;
• Com preços mínimos, uma degeneração em formas concorrenciais que não incidem em
preços, e que podem sobrecarregar o consumidor com vantagens indesejadas para ele e a
sobrevivência de produtores ineficientes.

A advertência para a não intervenção estatal na economia não é uma despreocupação fria e cruel
para os desfavorecidos pelo jogo livre do mercado, é uma constatação de facto: sendo inevitáveis
carências ou desperdícios por efeito da “imobilização” dos preços, os que tentarem promover esta
violação da dinâmica gravitacional e reequilibradora do mercado deverão ter em mente o preço
das consequências, de forma a adotarem, ao menos, soluções minimizadoras das patologias que
inevitavelmente ocorrerão.

25
Margarida Gonçalves

2. Controlo dos preços


O Estado pode fixar preços máximos abaixo do nível de equilíbrio, se ceder aos consumidores,
ou preços mínimos acima do preço de equilíbrio, se ceder aos vendedores.

2.1. A via dos preços máximos


Esta é a mais tentadora, porque transporta a ilusão de aumento das possibilidades de todos de
acederem a determinado produto.

O preço máximo eficaz é uma barreira a que o preço suba té ao equilíbrio ajustador da oferta e da
procura. O mercado irá esbarrar com esse limite e o preço será inevitavelmente esse. Dado o
excesso de procura face à oferta, será necessário racionar com vários critérios: os vendedores
podem atender sequencialmente aos pedidos, formando filas de espera e rateio entre consumidores
em função do custo de oportunidade do tempo de espera. Outra possibilidade é atribuir a alguém
critérios distributivos inapeláveis, ou seja, a aceitação prévia do acatamento definitivo de qualquer
decisão tomada por um ditador, que permite “custos de transação” aceitáveis e imuniza a
distribuição contra a estratégia de dissimulação de preferências, mas sacrifica a liberdade de
trocas e não assegura nem a justiça nem a eficiência.

Os excluídos do consumo pelo racionamento ficam não em escassez, mas em carência absoluta.
A solução de racionamento é sempre ineficiente e a solução para este problema é desintervir,
desregular e não estabelecer preços máximos.

2.2. A via dos preços mínimos


O preço mínimo eficiente é aquele que impede as forças da oferta e procura de empurrar o
preço para baixo, até ao nível de equilíbrio, o que vai provocar um excedente, um excesso de
oferta para a procura. Os vendedores vão ter dificuldade em escoar stocks e acaba por haver alguns
que não conseguem vender nada e são excluídos do mercado.

Os preços mínimos prejudicam todos os consumidores, privando-os de excedente do consumidor,


e prejudica alguns produtores em função de outros.

Os preços só se reequilibram através de uma descida, à qual os vendedores nem se opõem, porque
têm uma disposição para vender a nível inferior ao preço fixado, porque não conseguem escoar
os produtos àquele nível de preços.

3. A reação do mercado negro


Se um produtor vender um bem voluntariamente abaixo do ponto de equilíbrio, está a
prescindir de parte do seu lucro, mas expande a procura a mais classes de consumidores. Passa a
haver uma escassez do produto, que se resolve pela recompra, pela classe mais rica, do que a mais
pobre comprou. Assim, há uma “transferência do bem-estar” do produtor para os consumidores
mais pobres.
Se for o Estado a impor este abaixamento de preços, o produtor é desincentivado a produzir,
levando a uma carência mais aguda: há menos produto, mais consumidores e surge uma terceira
classe, os especuladores, que estão dispostos a assumir o risco de promover o reequilíbrio do
mercado através do mecanismo dos preços, contra a proibição legal do recurso a tais mecanismos.
Os especuladores disputam o produto escasso a todos os consumidores, jogando nos ganhos
especulativos da compra ao preço oficial e na revenda a um preço clandestino. O risco da
clandestinidade tem por efeito uma nova retração da oferta.

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No fim:
• O estado promove uma expansão da oferta que consiga ao preço mais baixo satisfazer todos
os consumidores e evitar o surgimento de especuladores, subsidiando os produtores;
• Ou se forma um mercado negro no qual os preços são superiores ao nível de equilíbrio, devido
ao prémio de risco dos vendedores-especuladores, e por isso os mais ricos consomem menos
do que aconteceria àquele nível e os mais pobres não consomem, e o excedente do produtor
perde-se numa involuntária transferência de bem-estar em benefício dos especuladores.

4. O caso do congelamento das rendas


O maior exemplo dos preços máximos é os limites às rendas no arrendamento de habitação. No
curto prazo, tanto a oferta e a procura são muito rígidas. A “travagem” do preço abaixo do seu
nível de equilíbrio não provocará uma disparidade muito pronunciada entre oferta e procura.

A elasticidade aumenta com o tempo, levando a um progressivo desfasamento da oferta e da


procura àquele nível de preços. No longo prazo, os senhorios têm tempo para reagir a um preço
que os desincentiva e entrarão no mercado cada vez mais pessoas atraídas pelo nível baixo das
“rendas militadas” → carência pronunciada no longo prazo.

5. O caso dos salários mínimos


O maior exemplo dos preços mínimos é o estabelecimento de salários mínimos. O
estabelecimento deste preço mínimo, se ocorrer a um nível que ultrapassa o de equilíbrio, provoca
um excesso de oferta sobre a procura → desemprego.
O custo social do desemprego é menor que a subsistência de setores com salários de equilíbrio
muito baixos, e por isso a generalização de salários mínimos é desaconselhada.

O recurso ao salário mínimo há de situar-se num ponto intermédio, evitando extremos de


desemprego e de pobreza associada ao desemprego, e extremos de degradação das condições
económicas da remuneração dos já empregados.

O estabelecimento de salários mínimos tende a diminuir a pobreza das famílias, mas a existência
de salários mínimos provoca desfasamentos quantitativos no trabalho:
• No mercado de operário não-qualificados ou ocorre desemprego ou surgem problemas de
mercado negro, de trabalho clandestino, no qual as remunerações se reaproximam do nível
de equilíbrio, podendo estabilizar abaixo dele;
• Na busca de primeiro emprego, a impreparação e não-integração no mercado, a
insusceptibilidade de comportamento coligado da oferta no mercado de fatores, a falta de
“capital humano”, tendem a colocar os salários de equilíbrio mais baixos.

O desemprego é normal, porque os trabalhadores são pagos em função da sua produtividade


marginal e o salário mínimo situa-se acima do nível de equilíbrio. O salário mínimo superior ao
preço de equilíbrio de um setor produtivo tende a gerar uma ineficiência adicional nesse setor,
que é o agravamento dos “custos de busca”, de desperdício de tempo e outros recursos na
adequação da oferta à procura, mormente o tempo gasto pelo trabalhador à procura de vagas, o
prolongamento do desemprego daquele que não encontra facilmente, e poderá nunca, algum
empregador disposto a pagar-lhe acima do salário de equilíbrio.

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6. O fenómeno da repercussão dos impostos


O Estado também intervém na economia, lançando impostos sobre as transações, sendo um
acréscimo de custos para algumas das partes envolvidas nas trocas.
O seu objetivo é proporcionar uma receita para as entidades públicas e manipular comportamento
económicos. Os impostos indiretos tornam o nexo causal entre lançamento de tributo e sua
receção pelos tributários mais nítido.

A carga tributária será suportada pelos vendedores ou compradores ou será partilhada em função
de condições geradas pelo próprio mercado, determinadas pelo mecanismo livre da interação da
oferta e da procura. Consequências previsíveis da incidência do imposto:
• Se for suportado pelos compradores, toda a escala da procura se contrai, sendo procurada
menos quantidade de bem a cada nível de preços;
• Se for suportado pelos vendedores, toda a escala da oferta se contrai, sendo oferecida menor
quantidade a cada nível de preços;

O imposto não recai em exclusivo sobre os compradores/vendedores, dada a presença de


elasticidade da parte de cada um. Só no caso da rigidez total da elasticidade de um dos lados é
que o imposto seria suportado inteiramente por ele. De resto, a contração da procura intercetará a
escala da oferta num novo ponto de equilíbrio em que há quebra de quantidades mas também de
preços em relação ao anterior ponto de equilíbrio (contração do mercado).

É este o fenómeno da repercussão: dada a elasticidade da procura, os compradores conseguiram


repercutir sobre os vendedores parte da carga tributária que formalmente seria da sua
responsabilidade exclusiva.
• Se a oferta for mais elástica que a procura, a retração do mercado tem mais impacto na
procura;
• Se a oferta for mais rígida que a procura, a retração do mercado tem mais impacto na oferta;
• Se a elasticidade dos dois lados for igual, a repartição da carga tributária será rigorosamente
igualitária quando alcançado o novo equilíbrio.

No caso dos impostos diretos (incidem sobre o rendimento pessoal), aquilo que o trabalhador
deverá suportar de imposto será mais ou menos repercutido para o seu empregador, em função da
maior ou menor elasticidade de cada um; os impostos geram uma clivagem entre aquilo que é
pago ao trabalhador (salário bruto) e o que ele verdadeiramente recebe (salário líquido).

CAPÍTULO VI – A PROCURA EM MERCADOS CONCORRENCIAIS

1. Utilidade, revelação de preferências e análise do bem-estar

O conceito de utilidade peca por ser insuscetível de mediação em termos objetivos e unívocos.
Em nome da objetividade, a ciência económica passou a concentrar-se em dados objetivos que
permitissem aferir a posição de um agente económico perante as vantagens que resultassem das
suas opções, a concentrar-se nas “preferências relevadas” e no conceito de “disposição de pagar”
(montante que se possa determinar que seria o limite do sacrifício monetário de que uma pessoa
seria capaz para obter um produto e não outro).

Deve-se a Paul Samuelson a teoria das preferências relevadas, considerando possível analisar-se
a racionalidade económica em termos de puros dados empíricos, sem ser necessário recorrer-se a
atribuições mais recônditas e psicologicamente “carregadas” como a de utilidade. Esta teoria
pressupõe um agente racional e maximizador, e por isso não tem a preocupação de inserir no seu
modelo a margem de imprecisão que os modelos estatísticos e econométricos reclamam em nome
do realismo.

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Porém, a própria disposição (revelada) de pagar é um conceito com limitações:


• Primeiro surge a dúvida se essa disposição de pagar verdadeiramente representa o
encadeamento psicológico que domina o processo de escolha do consumidor;
• São legítimas as reservas quanto ao pressuposto de que o consumidor tem preferências bem
definidas, que é capaz de optar instantaneamente entre produtos;
• Os consumidores não dispõem de informação perfeita acerca dos preços, porque a aquisição
de informação não é gratuita, racionalmente colocando-se os consumidores num nível de
informação incompleta no qual as perdas de informação são compensadas pela poupança na
respetiva aquisição. Nem sempre a disposição de pagar nos dá objetivamente a verdadeira
dimensão dos sacrifícios que um consumidor se proporá fazer entre os bens que se lhe
apresentem à opção, porque há custos de busca e obtenção de informação, custos friccionais
de ajustamento entre compradores e vendedores;
• A disposição de pagar varia ao longo do tempo. Não haverá, na consciência do consumidor
real, uma disposição de pagar estável e permanente;
• Eliminadas as fricções de busca e processamento da informação, perdia-se a fluidez do
mercado;
• A disposição de pagar pouco nos indica, naqueles casos especiais em que o preço é a única
caraterística do produto em relação à qual o consumidor dispõe de informação, casos em que
poderá surgir um padrão de procura que excecionalmente acompanha, em correlação direta,
as variações dos preços.

2. A curva da procura e a disposição de pagar

Um comprador só consumará a compra se essa valer a pena, ou seja, se o sacrifício dos bens que
troca por aquele que adquire é mais que compensado pelo beneficio que advém da aquisição deste
e se o sacrifício fica aquém do sacrifico que admitiria fazer para ter acesso àquele bem, mesmo
que em menores quantidades. P.E: licitação através dos preços → num leilão, antes de começar a
licitação, cada pessoa já delineou o máximo que é capaz de dar por aquele bem, o preço máximo
até ao qual os custos de oportunidade ficam aquém dos benefícios que advirão da sua aquisição.

Excedente do consumidor – diferença entre a disposição de pagar e aquilo que é efetivamente


pago. Existem excedente do consumidor sempre que há um único preço a pagar pelas várias
unidades do bem/serviço consumidos: a curva descendente da procura significa que o consumidor
retirou uma satisfação superior das doses anteriores do que aquela que retira da dose marginal,
pelo que estaria disposto a pagar mais por aquelas doses do que por esta.

A curva da procura é a expressão da tendência evolutiva do benefício marginal, ou da disposição


de pagar, visto que nos indica, para cada quantidade de um produto, a quantidade de outros
produtos que cada consumidor prescinde, o custo de oportunidade.

2.1. A teoria económica dos leilões

William Vickrey – “leilão pelo segundo preço” → forma de facilitar a revelação das preferências
por partes dos intervenientes num leilão, uma forma de evitar a cautelosa sub-licitação com a qual
se tenta afastar a “maldição do vencedor” (tendência para que o vencedor típico de um leilão
venha a descobrir que pagou mais pelo objeto leiloado do que aquilo que os demais participantes
julgam ser o preço justo).

Se se estabelecer que o vencedor de um leilão por licitações ascendentes terá que pagar apenas o
preço oferecido por aquele que ficou em segundo lugar, as verdadeiras disposições de pagar serão
reveladas.

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O “leilão de Vickrey” referia-se a licitações por carta fechada, pelo que perduraria o risco de
alteração dos valores pelo leiloeiro. O “leilão de segundo preço” é uma solução eficiente em
contextos de neutralidade ao risco e de “valor provado”, incitando os participantes a uma
revelação autêntica e integral das suas “disposições de pagar”; o alienante do bem recebe apenas
o “segundo preço”, o preço sub-ótimo para ele.
Como alternativa a este e ao leilão “de primeiro preço” “à holandesa” (licitações
descendentes e ganha o primeiro a interromper), pode apostar-se num leilão hibrido “anglo-dutsch
auction”, em que numa primeira parte há licitação aberta e ascendente, até só haverem dois,
passando a uma licitação por carta fechada com o preço mínimo correspondente à licitação
máxima na fase anterior.

2.2. Maximização e Leis de Gossen

A escala da procura é o espetro total da quantidade que cada um está disposto a adquirir a cada
nível de preços. Representa, para cada quantidade dada, o preço máximo que o comprador
marginal (aquele que se retira do mercado mal o preço suba) está disposto a pagar, ou seja, a
disposição marginal de pagar evidenciada pela procura.

Existe diferente disposição de pagar por parte dos consumidores e, consequentemente, cada um
vai ter um excedente do consumidor diferente.
A procura aumentará quando os preços descem, o que leva a um aumento do bem-estar: amplia-
se o excedente do consumidor e os consumidores marginais regressam ao mercado.

Benefício marginal – máximo montante de produtos de que um consumidor está disposto a


prescindir para obter mais essa unidade de um qualquer produto: quanto mais o consumidor
dispõe de unidades de um produto, menos disposto está a prescindir dos demais, se todos são
necessários ao seu bem estar; quando o benefício marginal deixa de ser superior ao custo
marginal, deixa racionalmente de haver disposição de pagar por mais uma unidade desse produto;
quando o benefício e o custo marginais coincidem, verifica-se um uso eficiente dos recursos.

Presume-se que o consumidor há de escolher a combinação de produtos eu maximize a sua


utilidade total, que estará maximizada quando todo o seu rendimento estiver gasto e quando a
utilidade marginal de cada unidade de rendimento gasto for igual para todos os produtos.

Leis de Gossen – Hermann Gossen


• 1ª lei de Gossen – a intensidade das necessidades decresce à medida que vão sendo aplicadas
doses sucessivas do mesmo bem até se alcançar o ponto de saciedade.
• 2ª lei de Gossen – a maximização da satisfação individual requer que a utilidade marginal de
todos os bens empregues na satisfação de necessidades esteja perfeitamente nivelada, que
não haja nenhuma necessidade a manifestar desequilibradamente a sua presença e a reclamar
a prioridade da sua satisfação no plano das opções racionais.

Princípio da dotação - Daniel Bernoulli: os jogadores dão mais valor às perdas potenciais que
aos ganhos potenciais, ou seja, dão mais valor àquilo que já têm do que àquilo que podem ganhar
por troca com o que já têm.

Eficiência do consumidor – quando se encontrar no limite da sua fronteira de possibilidade


orçamentais, o benefício marginal que retirar das suas opções há de ser o preço máximo que ele
está disposto a pagar pelos produtos por que opta, e a sua curva da procura há de ser a
representação exata da quantidade procurada a cada preço quando a utilidade está maximizada,
quando a utilidade marginal por cada € gasto é igual para todos aqueles produtos.

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3. A curva da oferta e a disposição de vender

Disposição de vender – preço mínimo que o produtor está disposto a aceitar para produzir mais
uma unidade de um bem/serviço. Qualquer preço acima do custo irá garantir um excedente do
produtor que motiva a venda.

O mercado seleciona, através dos preços, o produtor mais eficiente. O excedente do produtor
tende a coincidir com a diferença entre a disposição de vender do concorrente mais eficiente e a
do que vem em segundo lugar.

Quanto mais elevado o preço, maior será a oferta: a escala da oferta está correlacionada com a
escala dos custos, na medida em que uma subida de preços vai sucessivamente ultrapassando
níveis de custos de produção. Para cada quantidade oferecida, o preço há de corresponder aos
custos do “vendedor marginal” (o que sai do mercado mal o preço desça).

4. A noção de excedente do produtor

Excedente do produtor – diferença entre o preço mínimo a partir do qual o vendedor está
disposto a vender e o preço a que acaba por vender.

5. Eficiência e bem-estar total

Bem-estar geral – é o excedente total, ou seja, a soma do excedente do consumidor com o do


produtor. O mercado é eficiente se promover uma afetação de recursos que maximize esse
“excedente total”, e: se permitir que a venda se concentre nos produtores com mais disposição de
vender e que a compra se leve a cabo pelos consumidores com mais disposição de pagar.

O preço de equilíbrio denota uma seleção entre todos os compradores e vendedores potenciais no
mercado. O mercado opera uma triagem a favor dos compradores com mais disposição de pagar
e os vendedores com mentos custos.

Só existem trocas voluntárias quando as partes têm esperança de ganhos. A eficiência é alcançada
quando não é possível produzir mais de um bem/serviço sem ter de sacrificar a produção de outros
bens/serviços que passam a ser mais valiosos do que aquele pelo qual se optaria; ou quando não
se pode produzir menos de um bem/serviço sem que os recursos sejam desviados para a produção
de outros bens/serviços que seriam marginalmente menos valiosos que aquele que se produziria
em menor quantidade.

O bem-estar social não depende apenas da maximização do excedente total de compradores e


vendedores, porque os efeitos desse total podem ser perturbados por externalidades.
Se se puder provar que o mercado encaminha os bens dos produtores mais eficientes para os
compradores mais ávidos, de uma forma que maximiza o bem-estar total e não admite retificações
optimizadoras, é legítimo sustentar que o mercado em equilíbrio é o meio mais eficiente de
afetação de recursos e de conciliação de interesse do maior número.

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6. Eficiência de Pareto

Uma das formas mais simples de aferir a eficiência total da economia é a de relacioná-la com
os seus resultados em termos de maximização do bem-estar.

Eficiência de Pareto – é um estado de eficiência máxima da economia, em que não seria possível
aumentar o bem-estar de alguém sem diminuir o de outrem.
Esta eficiência implica três requisitos:
✓ Eficiência ao nível das trocas – as trocas são mais eficientes quando o excedente total é o maior
possível.
✓ Eficiência ao nível da produção – não há desperdícios, todos os recursos estão a ser utilizados.
✓ Eficiência ao nível das preferências dos consumidores – produzem-se os bens aos quais os
consumidores dão mais importância.

Esta eficiência nada nos diz quanto à justiça do resultado, mas apenas se a eficiência foi atingida.
As “melhorias paretianas” (incrementos que conduzem à eficiência), promovem a eficiência e
colocam a economia num ponto da FPP no qual se consuma o potencial de realização da
economia, mas que suscita problemas. Tudo o que pode ser empregue numa produção está a ser
efetivamente empregue com a minimização dos custos. Por isso, se porventura mudam as
solicitações que mobilizam essa afetação máxima, pode cair-se num impasse, numa armadilha de
eficiência.

7. Perdas do bem-estar resultantes dos impostos

Um dos melhores exemplos para o impacto negativo no bem-estar por interferências do mercado
é a existência de impostos. A incidência de impostos consiste numa diminuição de rendimento do
sujeito de imposto, em favor do credor desse imposto, com a perda de bem-estar que aquele
rendimento assegurava.
• Preços – o imposto é a clivagem entre o custo para os compradores e o rendimento para os
vendedores, sendo que o imposto limita os planos maximizadores dos dois;
• Quantidades – porque provoca deslocações no sentido da contração, o imposto é o
correspondente à diferença entre o volume de transações de equilíbrio e aquele que acaba por
se verificar, espelhando uma retração absoluta do mercado.

No caso do imposto indireto, o rendimento obtido pelo Estado será o produto do imposto pelo
volume das transações, sobre a incidência do imposto (produto de uma taxa de imposto pela
quantidade de unidades tributadas).
O imposto por unidade transacionada é correspondente à perda de “excedente” que se verifica
em cada transação tributada, e nesse aspeto não existe uma perda absoluta de eficiência, mas
apenas uma “transferência de bem-estar” (a perda de bem-estar para as partes corresponde ao
ganho de bem-estar para o credor do imposto).

Porém, o imposto provoca uma retração do mercado e o número de unidades transacionas e


tributadas é menor do que o número de transações que ocorreria sem imposto. Porque só pode
incidir sobre transações efetivamente ocorridas e porque o número de transações diminui por sua
causa, o imposto não pode gerar uma receita correspondente à perda de excedente total que ele
provoca → “perda absoluta de bem-estar”.

O efeito desincentivador do imposto faz com que seja impossível ao Estado recolocar
eficientemente a economia ao nível de bem-estar que existia antes do imposto. A pura perda de
bem-estar, resultando de um efeito de retração do mercado, será tanto maior quanto maior for a
elasticidade-preço de qualquer das partes, ou de ambas, e será tanto menor quanto mais se verifica
inelasticidade-preço do lado da oferta e da procura.

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Um Estado que queira minimizar o impacto dos impostos no bem-estar total deverá procurar
concentrar a carga tributária naqueles mercados em que a procura e a oferta sejam menos
suscetíveis de se retrair e onde é menos possível a ocorrência de uma quebra das transações.
Ainda assim, a justiça impõe limites a esta tributação, porque a tributação dos consumos
inelásticos pode tender a coincidir com a tributação dos consumos básicos, das transações de bens
de primeira necessidade.

Deadweight loss – pode haver um ponto de equilíbrio na modulação de um imposto, um ponto


aquém do qual a “pura perda” é diminuta e a receita ainda pode crescer, um ponto além do qual a
retração do mercado é tão pronunciada que passa a acarretar a perda da receita – a curva de
“Laffer” (a taxa do imposto pode condicionar negativamente a receita tributária).

8. A teoria do consumidor
A escala da procura reflete a disposição de pagar que cada consumidor tem perante um
determinado bem/serviço.

8.1. As restrições orçamentais

O “horizonte de oportunidade” é definido pelas possibilidades de aquisição de bens/serviços que


lhes são facultadas pelo seu rendimento disponível, a determinado nível de preços. É possível
aumentar o rendimento disponível pela poupança, pelo investimento, através do crédito, ou
intensificando a participação no mercado de fatores.

Um determinado rendimento disponível permitirá um contínuo de opções traduzidas em


combinações de bens suportáveis dentro de um limite orçamental. Essa restrição máxima pode
ser representada numa reta, a unir todos os pontos daquele contínuo de combinações máximas de
bens – a FPC (Fronteira de Possibilidades de Consumo).

A e B – Pontos eficientes
C – Ponto impossível
D – Ponto ineficiente

A restrição orçamental indica a combinação total daquilo que pode comprar-se com um
determinado rendimento disponível, dado um conjunto de preços relativos que indicam quanto
deve sacrificar-se do consumo de um bem/serviço para que os outros possam ser consumidos; é
o limite absoluto da sua disposição de pagar.

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8.2. Preferências e curvas da indiferença

As curvas da indiferença representam aquilo que o consumidor deseja fazer, os modos com as
suas preferências efetivamente se distribuem pelos produtos. A linha ideal que une todos os pontos
representativos das combinações de produtos que se equivalem designar-se-á por curva de
indiferença, e ela representa o conjunto de situações em que o consumidor estará igualmente
satisfeito.
A maior ou menor escassez relativa de um ou de outro bem determina uma sensível variação
da “taxa marginal de substituição”, ou seja, da disposição do consumidor para ir trocando uma
unidade de um dos bens por uma ou mais unidade do outro sem sair da mesma curva da
indiferença.

Taxa marginal de substituição – quociente entre o nº de unidades trocadas de um bem e o nº de


unidade do outro bem obtido por troca com aquele.

Não há limite para o estabelecimento de múltiplas curvas de indiferença ou até de “mapas de


indiferença”, isto é, contínuos de curvas da indiferença. Caraterísticas das curvas de indiferença:
• O consumidor prefere as mais elevadas, que unem combinações mais volumosas e lhe
proporcionam mais utilidade;
• Tem uma inclinação negativa, com correlação inversa entre bens, o que reflete a taxa
marginal de substituição;
• As curvas não se cruzam;
• É sempre uma curva e não uma reta, porque a taxa marginal de substituição pode variar
amplamente ao longo das diversas combinações possíveis de bens (bens sucedâneos, curva
menos acentuada, bens complementares, curva muito acentuada).

A combinação das retas do rendimento e das curvas da indiferença permite decidir qual a escolha
ótima para o consumidor (ponto ótimo). A curva da indiferença mais elevada que é alcançável
será aquela que é tangente à reta do rendimento, ou seja, aquela que num determinado ponto
coincide com o valor mais elevado que é consentido pela limitação orçamental, não ficando
aquém nem além dele.

8.3. Efeitos de rendimento e de substituição

Se com a alteração da fronteira orçamental a taxa marginal de substituição se mantiver, uma


expansão orçamental levará a que a procura dos dois bens se expanda e na mesma proporção; mas
se a divergência ocorrer, pode a expansão não ser proporcional, ou até a expansão do consumo de
um dos bens ser acompanhada por restrições ao consumo do outro.

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Margarida Gonçalves

Na hipótese de se alterar o preço de um dos bens, tem de se traçar nova reta do rendimento, visto
que ela espelha o preço relativo dos bens e esse preço relativo alterou-se. Esta quebra tem efeito
duplo: permitir um aumento do consumo de ambos os bens (explicável pelo efeito de rendimento:
a diminuição do preço de um bem aumenta o poder de compra do consumidor relativamente a
todos os bens, e pode levá-lo a comprar mais desses bens) e o de permitir um aumento mais do
que proporcional do consumo do bem em causa face ao aumento do consumo do outro bem
(explicável pelo efeito de substituição: a preferência do consumidor por um bem foi parcialmente
substituída por uma preferência por outro, devido à nova relação de preço).

“Bens de Giffen” – bens cujas curvas da procura seriam alegadamente ascendentes, respondendo
com aumentos da procura a aumentos de preço; o aumento de preço de um bem inferior provoca,
na respetiva procura, um efeito de rendimento superior ao efeito de substituição.

9. A escolha do nível de trabalho

“Lazer” – tempo disponível a trabalho remunerado, mas não aproveitado para esse efeito.

Aquilo que de cada um dispõe para consumir depende de outras duas decisões pessoais – uma
refere-se ao nível de esforço laboral e de remuneração (mercado de fatores – mercado de
trabalho); a outra é refere-se ao nível de poupança ou de gastos de poupanças (mercado de fatores
– mercado de capitais).

Reta do rendimento – é o conjunto das combinações possíveis de consumo e de lazer que são
permitidas pelas horas de trabalho e pela remuneração à hora.

Se a remuneração à hora aumentar, os agentes podem ter duas reações: ou trabalhar mais horas,
porque o custo de oportunidade de cada hora de lazer aumenta, ou trabalhará menos horas, porque
pode receber o mesmo trabalhando menos. Esta reação bicéfala torna impossível formular
previsões sobre os rumos que a oferta de trabalho tomará.

10. A escolha do nível de poupança

A teoria da escolha do consumidor pode aplicar-se também nas decisões de poupança e de


consumo. O que poupa voluntariamente com vista a reforma, tem uma escolha entre dois valores:
o do consumo presente e o do consumo futuro. O preço relativo do consumo presente face ao
consumo futuro é fruto do entrechoque de dois valores: a taxa de desconto, que leva a desvalorizar
o consumo futuro face ao presente, e a taxa de juro, que remunera a poupança e motiva o consumo
futuro face ao presente.

Se admitirmos que a taxa de desconto não varia significativamente e que as variações das taxas
de juro são acompanhadas por efeitos de substituição e de rendimento, um aumento da taxa de
juro causará um aumento do valor relativo ao consumo futuro, motivando a poupança.

Contudo, nem sempre assim sucede, especialmente quando o efeito de rendimento prevalece – a
mais elevada remuneração das suas poupanças torna mais próspero o aforrador, levando-o a
reconsiderar as vantagens do consumo presente.

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10.1. A taxa de desconto


É cada vez mais aceite a existência de uma “taxa social de desconto”, uma taxa que sirva de
medida ao custo de oportunidade da utilização, imediata ou diferida, dos recursos socialmente
disponíveis.

Deve-se a Paul Samuelson o conceito de “utilidade descontada” – damos menos peso


(descontamos) as consequências futuras das nossas decisões, vistas do presente, e consideramos
essas consequências tanto menos quanto mais distantes as colocamos no tempo; procurava
permitir a consideração simultânea de valores que ocorrem em momentos distintos, dando uma
dimensão relevante à análise “custo-benefício” que se reportasse a situações mais ou menos
distantes.

Ultrapassando determinado limite, a ideia de desconto torna-se problemática e tem de conviver


com uma margem de incerteza e imponderabilidade, suscetível de aumentar a taxa de desconto e
reforçar a preferência pelo presente.

A convergência entre as taxas individual e social de desconto não está assegurada, e as


divergências abundam; a própria noção de taxa social de desconto pode ser suspeita de
favorecimento da perspetiva tutelar e intervencionista do Estado.

Se existir uma remuneração para a poupança que ultrapasse a taxa de desconto, aquele que
sacrifica o consumo presente consumirá mais no futuro e aquele que opta por consumir
imediatamente incorre no custo de oportunidade equivalente àquela remuneração.

Uma simples subida de taxas de juro não garante que aumente a poupança: tudo depende se o
aforrador tem as suas preferências dominadas pelo efeito de rendimento ou de substituição.

10.2. A hipótese do rendimento permanente


A decisão de poupar ou consumir é presidida por critérios que abarcam a ponderação da
totalidade da perspetiva da vida do agente económico, que visam normalizar os padrões de
consumo em toda a totalidade, aforrando mais quando o rendimento é maior para que, quando o
rendimento desça, possa levantar poupanças e manter o mesmo nível de consumo.

Segundo a “hipótese do rendimento permanente” (Milton Friedman), o consumo seria


determinado não tanto pelo rendimento disponível corrente, mas antes pela riqueza individual
registada em cada momento (sendo que nessa riqueza se encontra o aforro acumulado com vista
à normalização do consumo em diferentes momentos e a diferentes níveis de rendimento).
O comportamento ótimo de consumidores moderadamente impacientes é o de nivelarem o seu
nível de despesa de acordo com a projeção válida para o total do ciclo de vida.

Franco Modigliani explorará, com o “efeito de riqueza”, que o nível de consumo e poupança, e
as respetivas oscilações cíclicas dependem não tanto do rendimento disponível atual como da
relação entre rendimento presente e as expetativas de rendimento ao longo do ciclo de vida do
titular do rendimento. Este reduziria o impacto do rendimento atual nos níveis de poupança e
consumo e tenderia a gerar contrabalanços na conduta dos consumidores aos efeitos inflacionistas
ou recessivos.

Em suma, o grau de aforro há-de depender da existência, e da dimensão, de uma remuneração


atribuída aos reformados; o motivo-precaução levará a aumento de aforro diretamente
proporcional ao aumento da insegurança, e vice-versa.

36
Margarida Gonçalves

A hipótese do rendimento permanente permite acalentar a esperança de que as pessoas promovam


espontaneamente o seu próprio “seguro de velhice”, ficando só por cobrir as grandes despesas e
catástrofes. É preocupante que o envelhecimento populacional seja acompanhado por um declínio
da poupança, porque isso equivale a remeter a solução do problema da sustentabilidade do sistema
para uma mera eventualidade de promoção do “altruísmo” junto das gerações vindouras.

O grau de aforro há de depender ainda da incidência dos impostos sobre o fenómeno sucessório,
tal como dependerá da maior ou menor generalização do crédito ao consumo.

CAPÍTULO VII – O INVESTIMENTO E A OFERTA EM MERCADOS


CONCORRENCIAIS

1. Os custos do produtor sem poder de mercado

As motivações do produtor são as de vender tanto mais, quanto maior o preço e tanto menos
quanto menor o preço. A disposição de vender existe em função dos custos que a produção
acarreta. O objetivo normal de um produtor será o de obter uma receita, um rendimento total que
supere o custo total, para obter lucro.
✓ Rendimento/Receita total – somatório do produto de todas as vendas alcançadas pelo
vendedor;
✓ Custo total – somatório de todas as despesas em que o vendedor incorreu para que os bens
vendidos fossem produzidos e chegassem ao mercado.

2. Custos implícitos, lucro económico e lucro contabilístico

Custo total – inclui os custos explícitos (o conjunto de valores que constituíram a base da
disposição de pagar do próprio vendedor em relação aos fatores com que foram produzidos os
bens e serviços que vende e que foram efetivamente alienados em pagamento, na troca por esses
bens/serviços).

Custo económico – é um custo de oportunidade, que inclui tanto os custos explícitos como os
implícitos. É então a perda de benefícios que para ele adviriam da segunda melhor opção.

Custo implícito – diferença líquida entre o melhor saldo e o segundo melhor saldo.

Em suma, a diferença entre ganhos contabilísticos e ganhos económicos reside no facto dos
primeiros serem calculados por referência ao conjunto total de custos de oportunidade que possam
ser contextualmente considerados, ao passo que os ganhos económicos são computados por
referência somente aos custos explícitos.

3. Função de produção e produto marginal

Função de produção – relação puramente quantitativa entre aquilo que é empregue na produção
e aquilo que dela resulta.

Produto marginal – variação de quantidade produzida que resulta da variação, em uma unidade,
da quantidade de algum dos fatores produtivos.

Há uma tendência para o decréscimo do produto marginal que resulta de efeitos de saturação
decorrentes da utilização em quantidades crescentes de alguns fatores em combinações
progressivamente desiguais com fatores fixos, ou fatores cujas quantidades não podem variar tao
rapidamente.

37
Margarida Gonçalves

4. Custos fixos, variáveis, totais, marginais e médios

Custo fixo – associado aos fatores cuja quantidade não se altera com o nível de produção.
Custos variáveis – cada incremento de produção pode implicar um custo não só crescente, mas
marginalmente crescente.

Custos

Volume de produção

Custos totais – custos fixos + custos variáveis.

Custos médios – custo de quanto custa produzir cada unidade.


Custos fixos médios = custos fixos/nº unidades produzidas.

Custos variáveis médios = custos variáveis/nº unidades produzidas.

Custos totais médios (custo da unidade típica) = custos totais (c.f+c.v)/nº unidades produzidas.

Ponto de inflexão – escala mínima


de eficiência

Custo marginal – quanto custa produzir cada unidade adicional.

A escala de eficiência é o ponto ótimo em que são mínimos os custos médios e o nível de produção
que minimiza os custos médios totais.
Um produtor preocupado em controlar custos deve atender a este ponto crítico a partir do qual a
produção se faz a custos médios crescentes.

38
Margarida Gonçalves

Os custos marginais têm tendência a crescer, e a incrementar progressivamente essa propensão


para o crescimento:
✓ Enquanto o valor marginal for inferior a um valor médio, este descerá;
✓ Sempre que o valor marginal for superior ao valor médio, este subirá;
✓ As variações dos valores marginais arrastam variações dos valores médios.

5. Os custos no curto e no longo prazo


5.1. Rendimento marginal decrescrente e efeitos de escala

Curto prazo – período de tempo em que pelo menos um dos fatores e os seus custos são fixos.
Longo prazo – período de tempo em que todos os fatores são variáveis.
Lei do rendimento marginal decrescente – à medida que se combinam fatores variáveis com
uma dada quantidade de fatores fixos, o rendimento marginal dos fatores variáveis tende a
decrescer.
Só com a expansão dos fatores de produção é que o produtor pode encarar a possibilidade de
expansão da escala de produção, ou seja, um aumento proporcional de todos os fatores de
produção. À medida que o produtor se vai expandindo e ajustando a produção às solicitações do
mercado, é como se fosse descartando a sua perspetiva de curto prazo de pequeno produtor e fosse
assumindo a perspetiva do curto prazo do grande produtor.
Existe, no curto prazo, um limite ao rendimento marginal que se obtém da intensificação do
uso dos fatores de produção.

5.2. Rendimentos de escala


Uma variação de escala de produção pode ter três resultados:
✓ Resultados crescentes à escala – a produção aumenta mais que proporcionalmente ao
aumento da escala (quando duplico os fatores, aumento mais do que proporcionalmente a
produção). P.E: de 1000 para 2500 (economia de escala).
✓ Resultados constantes à escala – a produção aumenta proporcionalmente ao aumento de
escala. P.E: dispomos de 100 unidades de fatores de produção e produzo 1000. No segundo
momento duplico os fatores de produção (200) e duplico também a produção (2000).
✓ Resultados decrescentes à escala – a produção aumenta menos do que proporcionalmente
ao aumento de escala. P.E: quando ao duplicar os fatores de produção, o aumento da
produção é menos do que proporcional, por exemplo de 1000 para 1300.

Economias de escala – caraterísticas tecnológicas de um produtor, que lhe permitem realizar


quebras dos custos médios de longo prazo quando a produção aumenta, traduzindo-se numa
“curva de custos médios de longo prazo” decrescente. Estas surgem em unidades de produção
com elevados custos fixos e baixos custos marginais, que mantêm o seu valor reduzido até se
alcançar elevados volumes de produção.

“Economias de produção conjunta” /“Economias de gama” – registam-se na produção


combinada de dois ou mais bens cuja produção separada implica duplicação dos custos. Ainda se
destacam as “economias de produção em grupo” que resultam da especialização em tarefas de
complementaridade e de apoio reciproco entre produtores.

A existência de economias de escala é um dos atrativos para o aumento das dimensões de


produção no longo prazo, até porque a sua ocorrência consegue fazer com que a escala eficiente
acabe por ocorrer a níveis muito superiores de produção. Nestas situações verificam-se
rendimentos crescentes à escala ou pelo menos rendimentos constantes à escala.

39
Margarida Gonçalves

Fronteira de possibilidades de eficiência – é a curva de custos médios a longo prazo, que indica
ao produtor o plano em que se situa a sua escala de eficiência quando lhe é possível contar com a
variabilidade de todos os fatores, e serve-lhe como um ponto de referência à planificação da sua
atividade e das suas decisões a curto prazo, que deverão tender para o abaixamento de custos
médios até esse limite ideal. O ponto mais baixo dos custos médios designar-se-á por escala
mínima de eficiência.

Entre as economias internas contam-se:


✓ Eficiência técnica;
✓ Eficiência empresarial;
✓ Vantagens financeiras;
✓ Possibilidade de “descontos de quantidade” na compra de publicidade ou de recursos e
matérias-primas;
✓ Sinergias de dimensão nos esforços de investigação e desenvolvimento.

Entre as economias externas temos:


✓ Presença local de uma vasta mão-de-obra especializada;
✓ Existência de uma rede instalada de assistência ou de distribuição;
✓ Eficiência e dimensão das infraestruturas disponíveis.

A formação de “clusters” de empresas (aglomerações geográficas de produtores) justifica-


se pela possibilidade de formação de externalidades positivas, potencializadas pela proximidade,
que são partilhadas por todos aqueles que se encontram na aglomeração.
As economias de escala externas são um “ambiente empresarial fértil” – estas explicam, em parte,
o sucesso económico do fenómeno da urbanização.
Contudo, é inevitável que a expansão comece a ser travada por perdas de escala, por
rendimentos decrescentes à escala ou por uma subida dos custos médios para níveis superiores ao
custo mínimo registado na escala de eficiência. Aqui, a melhor decisão a longo prazo é a redução
da escala (“downsizing”).

As perdas de escala podem ter também uma vertente interna ou externa.


Quanto à vertente interna, temos entre outros os seguintes fatores:
✓ Crescente manifestação dos fatores de ineficiência na divisão de trabalho;
✓ Saturação dos locais ou instrumentos de trabalho;
✓ Crescente dificuldade de supervisão e coordenação;
✓ Perda de comunicação interna e aumento da complexidade das cadeias de decisão;
✓ Perda da coesão e da solidariedade, do espirito de grupo entre os trabalhadores.

Quanto às fontes externas das perdas de escala:


✓ Crescente escassez de mão-de-obra especializada próxima do local de produção;
✓ Crescente raridade de instalações disponíveis;
✓ Crescente saturação das infraestruturas e agravamento dos tempos de acesso e de transportes.

Entre as fontes internas de perdas de escala, a teoria destaca a “ineficiência-X” – a flacidez da


empresa, a sua falta de agilidade, em geral, provocada pela falta de concorrência.

6. Opções de investimento
Investimento – é a aquisição de um bem (de um ativo) na perspetiva da obtenção de rendimentos
na exploração desse bem, ou de mais-valias na sua alienação.
Investimento real – direta aquisição de bens de capital que sejam empregues seguidamente num
processo produtivo.

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Margarida Gonçalves

Investimento financeiro – mútuo/depósito de fundos junto de mercados ou de instituições


especializadas, os quais, por sua vez, encaminham esses fundos em direção àqueles que deles
necessitam para realizar os seus investimentos reais.

Sistema financeiro – mecanismo através do qual os excedentes de pessoas que têm rendimentos
superiores aos seus níveis de despesão são encaminhados para pessoas e empresas que estejam
dispostos a gastar mais do que aquilo que lhes é permitido pelo seu rendimento corrente.

Nível individual de investimento – resulta da combinação de fatores, que vão desde o


rendimento disponível e a aversão ao risco até aos montantes em causa, ao horizonte temporal do
investimento e de expetativa devida, à taxa individual de desconto, aos motivos da poupança. O
investimento justifica-se enquanto for positivo o valor presente líquido dos bens de capital, ou
seja, pela diferença entre o valor presente do rendimento gerado pelo capital e o custo presente
desse capital.

6.1. Depósitos e investimento direito em bens


Depósitos bancários – a ordem e a prazo.
Aqueles que revelam maior aversão ao risco podem minimizá-lo através do depósito bancário, no
qual o levantamento do capital e o pagamento de juros parecem maximamente assegurados e no
qual parece sempre assegurado um razoável nível de liquidez.
Entre os bancos e os clientes há normalmente um fosso de assimetria informativa, onde se pode
instalar o risco moral.
Alguns investimentos em compra de bens podem parecer tão seguros como um depósito
bancário e parecer que vão assegurar uma valorização periódica superior, mas ninguém garante a
recuperação do capital investido; tais investimentos podem ser praticamente desprovidos de
liquidez, criando o risco para o investidor de ficar preso no momento em que tenta vender o bem
para realizar a liquidez pretendida e não encontra comprador.
Esses obstáculos podem ser removidos pela constituição de um fundo comum de investidores,
que em conjunto adquirem bens, os gerem e transacionam, amortecendo pela dimensão e
diversificação o impacto pela falta de liquidez de cada bem investido.

6.2. Obrigações
Outra alternativa de investimento é a subscrição de títulos obrigacionistas (empréstimo de capital
financeiro a uma empresa, por um prazo determinado). A segurança do investimento é alta, porque
o investidor fica na posição de credor, mas podem suscitar-se problemas de liquidez
(característica de um determinado bem poder funcionar como bem de pagamento. Só os
pagamentos em moeda é que a contraparte está obrigada a aceitar.) e o risco (existem sempre de
que a remuneração convencionada seja destruída por efeito da inflação). As subidas de taxas de
juro no mercado são más para os subscritores de obrigações, sendo que as suas descidas
“desbloqueiam” a liquidez dos bens.

6.3. Ações
Outra forma de investimento é a compra de ações, partes do capital de uma empresa, que conferem
ao seu titular algumas especiais prerrogativas quanto à empresa eminente, porque o colocam na
posição de sócio, de contitular da propriedade da empresa. A segurança é baixa e nada garante a
recuperação do capital, porque a empresa pode falir.
Em contrapartida, a remuneração deste investimento é sempre superior ao das obrigações.
Podemos encarar ações e obrigações como títulos que, entre eles, distribuem pelos investidores o
rendimento e o risco de acordo com as suas preferências por um retorno mais seguro ou
potencialmente menos elevados.

41
Margarida Gonçalves

Ações – são uma parcela de capital de uma empresa. Quando alguém compra uma ação, torna-se
proprietário daquela empresa de acordo com a proporção da ação comprada. Os dividendos são
os lucros divididos pelos acionistas.
Através dos fundos de investimento é possível minimizar os riscos e aumentar a liquidez das
ações e obrigações, onde os investidores participam pondo em comum os seus recursos, o que
permite:
✓ Uma diversificação na compra de títulos;
✓ A gestão profissional dos títulos;
✓ Um número de participantes tão grande que a entrada ou saída de um não afeta o total do
montante investido, confere a todos uma quase perfeita liquidez.

Na sua decisão de investir, o investidor deve:


✓ Comparar as taxas médias das aplicações disponíveis;
✓ Ponderar o rendimento periódico que geram a compra e revenda com a possibilidade de
obtenção de mais-valias através da renda especulativa;
✓ Apreciar a relação dos níveis remuneratórios do investimento com os riscos envolvidos;
✓ Oferecer um preço que varia em função do risco, da liquidez, da esperança de ganho, do
próprio regime fiscal que recai sobre os ganhos.

6.4. Mercado eficiente e passeio aleatório


Num mercado eficiente, o preço refletiria perfeitamente as caraterísticas dos bens de
investimento, não sendo possível a nenhum investidor alcançar ganhos extraordinários ou
beneficiar de preços extraordinariamente baixos. Não é possível adotar uma estratégia racional
para “vencer o mercado”, ou seja, para obter vantagens especulativas através de tipos de
informação que não estejam incorporados no preço. Porém, o mercado eficiente não passa de uma
hipótese.
Pela sua natureza, haveria uma única forma de “vencer” no mercado eficiente, e seria apostar
em variações inesperadas de preços. Só que o que é inesperado não é objeto de conhecimento, e
menos de uma ponderação racional ou estratégica. Apostar no inesperado nem sequer é jogar com
probabilidades.
No longo prazo, os ganhos médios de “vitórias no mercado” não dependeriam de uma
estratégia melhor que o passeio aleatório, ou seja, a não-estratégia de compras e vendas de bens
de investimento arbitrariamente decididas. Aleatória é a caraterística de toda a variável que não é
totalmente predeterminada pelas demais variáveis disponíveis nem pela sua própria tendência
evolutiva anterior que não é “determinística”.

7. Empresas
O investimento das famílias é a fonte da maior parte do financiamento de que elas podem
dispor, sendo o restante fornecido por subsídios estatais ou investimento estrangeiro. Para o
investimento das famílias, estas só têm de ser de responsabilidade limitada porque a aversão ao
risco é caraterística psicológica natural.
A responsabilidade limitada facilita a captação de investimentos individuais porque ela
garante aos investidores que nada lhes será exigido para lá do valor dos títulos que subscreveram,
e assim, as suas perdas serão limitadas.

Mercado de ações – é um jogo de fortuna e azar, que atrai investidores avessos ao risco através
do aliciamento com uma forma assaz desprendida de participação no mercado e respetivos fins.
Mais ainda, enquanto a responsabilidade é limitada, os ganhos são ilimitados.

42
Margarida Gonçalves

A razão para a existência da responsabilidade limitada é a necessidade social de solução do


problema de aversão ao risco.

Os requisitos económicos para a existência de uma “empresa” são:


✓ Existir uma estrutura de raiz contratual que promove a produção através de conjugação de
recursos;
✓ Verificar-se a diversa titularidade dos recursos que são cedidos para a produção;
✓ Só haver uma contraparte em todos os contratos de arregimentação de recursos;
✓ O empresário ter liberdade de negociar separadamente as condições e a remuneração de
diversos tipos de recursos;
✓ O empresário ter uma titularidade sobre a estrutura produtiva e direito aos resultados líquidos
da remuneração de todos os recursos.
Empresas – agentes produtivos dotados de acentuada neutralidade perante o risco que se
substituem a agentes avessos ao risco e por isso são capazes de prosseguir na senda da criação de
riqueza, quando a aversão ao risco teria já ditado, nas agentes individuais, o declínio da utilizada
marginal desse esforço de enriquecimento, o declínio das esperanças (subjetivas) de ganho.

8. As opções de financiamento das empresas


Vias através das quais uma empresa pode obter financiamento:
✓ Mercado de capitais, com obrigações e ações;
✓ Recurso ao crédito bancário;
✓ Autofinanciamento.

Quanto à escolha do financiamento: o recurso ao crédito e à emissão de obrigações parece ser


o mais aliciante para a empresa, porque é por essa via que ela ficará obrigada a pagar
remunerações que em média são inferiores às que correspondem aos dividendos; por outro lado,
o endividamento transfere o risco do investidor para a empresa, sendo, pois, que o endividamento
é a opção mais arriscada do ponto de vista da empresa. O recurso ao endividamento é ao mesmo
tempo aliciante e arriscado.
Os regimes tributários podem constituir condicionamentos decisivos, levando a uma maior
moderação no recurso ao endividamento e a que a empresa só lhe recorra quando as receitas
correntes não permitem assegurar o autofinanciamento, e antes de recorrer às ações ou os cistos
de transação, em que a empresa não terá limites ao endividamento enquanto as suas receitas
correntes excederem as oportunidades de investimento rentável.
O endividamento sinaliza ao mercado a confiança que a empresa tem no seu próprio futuro, a
margem de risco financeiro que está disposta a assumir na sua própria viabilidade.
Porém, a estratégia do excesso de endividamento traz consigo problemas adicionais, alguns de
perversão de incentivos até. Mais ainda, aquele que não tendo a maioria das ações, controla a
empresa, vai preferir o endividamento à entrada de novos acionistas, porque este tem em princípio
direitos de sócio, incluindo o de eleger quem lidera a empresa, enquanto os credores têm poderes
muito restritos.
Porém, o endividamento não está sempre disponível; os potenciais credores têm todo o
interesse em prever o risco dos seus créditos, e em segmentar os mercados em níveis diferenciados
de risco, para evitar o fenómeno da “seleção adversa”.
Se os potenciais credores pudessem conhecer perfeita e antecipadamente o risco de cada
potencial devedor, poderiam proceder a uma perfeita discriminação de juros, cobrando a cada
mutuário em função do nível de risco por ele apresentado. Mas como tal não é possível, os
credores prosseguem a imprecisas segmentações do mercado em “grupos de risco”
O racionamento do crédito é uma dificuldade superável, mas a um custo que poderá ser
elevadíssimo, refletindo a perceção do mercado acerca dos riscos inerente, agravando ou
aliviando o quadro jurídico que acompanha a relação creditícia, as garantias, a responsabilidade
obrigacional, e, portanto, condiciona as estratégias de cumprimento e incumprimento, fornecendo
dados sinalizadores sobre o risco moral e a fiabilidade do devedor mediano.

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Margarida Gonçalves

A emissão de novas ações tende a desvalorizar as ações já existentes porque:


✓ A perceção que o mercado tenha de que a nova emissão representa já um recurso de
emergência perante as dificuldades sentidas pela empresa no seu acesso ao crédito;
✓ A perceção que haja de que o risco de desvalorização assumido pelos controladores da empresa
corresponde à certeza que estes tenham quanto à sobrevalorização especulativa dos títulos;
✓ A perceção de que o recurso ao financiamento acionista é uma solução irresponsabilizante.

Também o recurso ao mercado acionista não está sempre disponível nem é ilimitadamente válida.
É natural que as empresas no seu momento de “arranque” tenham mais dificuldades de acesso ao
endividamento e ao mercado de capitais. É geralmente a sedimentação de uma reputação no
mercado que permite a uma empresa obter empréstimos às condições dominantes no mercado. A
idade e inércia da empresa tendem a estar correlacionadas, e não apenas por força da “ineficiência-
X”, mas também porque as empresas já instaladas no mercado tendem a assumir meras atitudes
defensivas, ficando mais vulneráveis à contestação de mercado por concorrentes mais jovens, e
mais expostos às aquisições de controlo societário.

CAPÍTULO VIII – OS FATORES TEMPO E RISCO

1. O fundamento do juro

Grande parte das nossas decisões económicas são orientadas para o futuro, e os meios futuros
cuja obtenção queremos assegurar têm um preço relativo em termos de bens presentes (valor dos
bens presentes de que temos de prescindir para obtermos os bens futuros, o sacrifício de consumo
imediato que está implicado no investimento em recursos de que emergirão os bens futuros).

O valor presente dos bens futuros é descontado, ou seja, é menor do que o valor dos mesmos
bens quando a sua disponibilidade seja imediata; e o valor descontado é tanto menor quanto mais
dilatado for o prazo que medeia entre o presente e o momento em que finalmente acedemos à
fruição desses bens futuros.

A racionalidade impõe-nos uma preferência pelo presente, que a nossa irracionalidade mitiga em
formas “hiperbólicas” ou exacerba em formas “exponenciais”, que tem por reverso a taxa de
desconto, que aplicamos à representação presente do efeito futuro das nossas ações. A preferência
pelo presente desaconselharia todos os sacrifícios da gratificação imediata das necessidades; o
sacrifício daquele que adia a gratificação das suas necessidades deve ser compensado com o
montante que ultrapasse a taxa de desconto, que faça superar a preferência pelo presente pela
preferência pelo futuro – o juro.

Juro – montante que faz vencer a preferência pelo futuro, pelo que a taxa de juro tem de ser
superior à taxa de desconto; é o preço de equilíbrio do mercado dos fundos monetários mutáveis.
Este existe porque na sua ausência, haveria carência de fundos mutuáveis, ou seja, excesso da
procura de fundos e falta da oferta.
Dois aspetos interferem na formação de uma taxa de juro – a presença de intermediários
financeiros e a presença de inflação.

Juro nominal – somatório do juro real (remuneração do empréstimo, compensação da taxa de


desconto) e do prémio de inflação (que coincide com a taxa de inflação).

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Margarida Gonçalves

2. O motivo-especulação
Há um setor da economia que se centra nas transações inter-temporais – aquele em que os bens
duradouros são adquiridos como valores especulativos (na esperança de que possam mais tarde
ser revendidos a preço superior).
Um aumento da taxa de desconto significa uma perda do valor presente dos bens futuros. As
expetativas da evolução futura dos preços condicionam estes mercados. O mercado especulativo
nem sempre espelha a conjuntura real sobre que assenta, mas apenas exprime a limitação e
racionalidade das expetativas sobre situações de mercado vindouras. Dessas expetativas são
racionais as que incorporam todo o conhecimento disponível e irracionais as que se limitam a
extrapolar o presente para o futuro.

3. As respostas ao risco e ao problema do seguro


George Shackle elaborou uma teoria da decisão em condições de incerteza, em que exprime a
existência de uma zona de dúvida irradicável, insuscetível de seguro, e também a sua convicção
relativa à legitimação do lucro como contrapartida da assunção dessa incerteza.

“Aversão ao risco” – indisponibilidade para assumir a margem de probabilidade de desfechos


negativos que se prende com todas as nossas decisões projetadas para o futuro.
As economias modernas tendem a multiplicar as formas de dissipação, distribuição e transferência
de riscos. Sem assunção de riscos e incertezas, não há atividade económica.
Há por isso, formas de mitigar o risco: diversificar, produzir ou investir em vários setores de
atividade e não num só; transferir os riscos para uma seguradora, embora haja limites para este
recurso.

3.1. Seguro e incerteza


Há incertezas não computáveis e que não podem ser cobertas por um seguro, porque seriam um
mau negócio para a empresa. Genericamente, as incertezas podem respeitar à tecnologia ou às
condições dos mercados: podem ser objeto de cálculos de probabilidade subjetiva quanto à sua
evolução em termos similares aos de eventos passados, e com base nesses cálculos é possível
determinar-se uma utilidade esperada.

3.2. Seguro e seleção adversa


Seleção adversa – é a relativa incapacidade que as seguradoras têm de estabelecer relações
contratuais discriminadas e ajustadas ao nível de risco que apresenta cada segurado, levando-os a
cobrar prémios de seguro uniformes para diversas categorias de risco, afastando os segurados de
baixo risco e atraindo os de alto risco.
Esta emerge da assimetria informativa, e neste caso resulta do facto de os segurados disporem
de informações mais concretas acerca das suas situações do que as seguradoras. O problema pode
ser resolvido por seguros obrigatórios, mas essa obrigatoriedade gera problemas, especialmente
a nível dos incentivos supervenientes.
Os problemas de risco e incerteza são especialmente sentidos no mercado da saúde. As pessoas
tendem a subestimar os seus riscos, e adquirir somente as coberturas de risco mais amplas aquelas
que saibam ter riscos superiores àquelas que tornariam rentáveis essas coberturas de risco, criando
por isso ineficiências a distribuição das pessoas pelas várias classes de risco e uma retração do
próprio lado da oferta, que deixará de incluir nas coberturas alguns tratamentos mais extremos,
onerosos ou sofisticados. George Akerlof concluiu que o mercado entraria em colapso por seleção
adversa se não fosse dado ao comprador vencer a sua assimetria afirmativa e perceber o que é
bom e mau no mercado.

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Margarida Gonçalves

São contextos em que a presença de informação privada gera incerteza nas trocas. Se as partes,
apesar da sua impaciência quanto à conclusão de um negócio equilibrado, não partilham essa
informação privada relativa ao objeto do negócio e subsistem na assimetria informativa, a
incerteza prevalecerá, para lá dos limites do que é computável, do que é suscetível de cálculo de
probabilidades, do que é segurável.
A incerteza pode perpetuar-se na medida em que constitua uma vantagem estratégica para a
parte privilegiada pela assimetria informativa.

3.3. Seguro e risco moral


As seguradoras defrontam-se com um outros problema, o do “risco moral”, que é o da perda
de incentivos para a diligência e para o cuidado na prevenção dos prejuízos cobertos pelo seguro,
porque o segurado passa a externalizar os custos das suas ações sobre a seguradora. Um seguro
que cobrisse todas as perdas ou garantisse um nível mínimo de ganhos na atividade produtiva
teria efeitos negativos nos incentivos dos produtores, reduzindo-lhes, por risco moral, o grau de
esforço e diligência.
A simples possibilidade de “duplo risco moral” (possibilidade de a seguradora se socorrer das
suas vantagens informativas para subverter os equilíbrios contratuais) fará com que seja benéfico
o empolamento dos danos comunicados pelo segurado à seguradora, em compensação antecipada
por essa margem de “duplo risco moral”.
Como o risco moral agrava o nível geral de risco para as seguradoras, pode causar a insolvência
destas, ressalvada a hipótese de se recorrer ao resseguro (seguro das seguradoras) e à
“securitização” à transferência parcial do risco das seguradoras para o próprio mercado de
capitais, associando a emissão de títulos aos elos contratuais de base. Outra forma de reação das
seguradoras é a de procederem a uma variante de “seleção adversa”, tentando restringir o nº dos
segurados àqueles que têm saúde acima da média, baixando os custos médios esperados no
tratamento desses.
A assunção de riscos e incertezas afigura-se indispensável para se assegurar uma atitude
diligente na obtenção de resultados positivos, pois só estes afastam a hipótese de prejuízos. A
empresarialidade é essencialmente uma atitude de gestão desses riscos e incertezas, e é só porque
o empresário assume riscos e incertezas extraordinários, que se justifica que lhe caibam ganhos
extraordinários. Os empresários são aqueles que, incentivados pela contrapartida do lucro,
assumem as incertezas da organização produtiva dos recursos.

CAPÍTULO XIX – O MERCADO CONCORRENCIAL

1. As condições da concorrência
1.1. Atomicidade

Se existirem suficientes vendedores e consumidores no mercado, as suas decisões serão diluídas


no todo das interações desse mercado, e tornar-se-á impossível a alguém impor nesse mercado as
suas preferências, ou as suas avaliações relativamente ao que lhe é proposto nas trocas – não
existe poder de mercado. Assim, todos poderão escolher racionalmente os padrões que tenham
por maximizadores dos seus projetos individuais de satisfação: será mais fácil a cada um
estabelecer a sua própria ponderação de vantagens e custos imediatos, pois poderá tomar o nível
de preços como um valor fixo.
Os agentes de ambos os lados contribuem coletivamente para formar preços, mas não têm
poder individualmente para os alterar, pois de outro modo o automatismo equilibrador ficaria
dependente da abstenção dos agentes com poder de mercado. A ausência desse poder é
caraterística de contextos de pulverização “atomística” dos centros de decisão do mercado. Sem
poder de mercado, o produtor tem mais incentivo a ser eficiente porque a única liberdade que tem
é reduzir os custos porque não pode aumentar os preços. A maior ou menos atomicidade verifica-
se pelo que sucede a um produtor que aumente preços.

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Margarida Gonçalves

1.2. Fluidez

Fluidez – conjunto de caraterísticas e circunstâncias que permitem ao consumidor não ser


enganado pelos vendedores quanto à possibilidade de se proceder a uma comparação de preços,
que lhe permitem aceder às vantagens da concorrência perfeita e da guerra de preços, adquirindo
o produto ao preço mínimo, ou a máxima quantidade do mesmo a um dado preço.

É a transparência das motivações dos agentes, de maximizar a eficiência do conhecimento


disponível ao agente, equilibrando o custo marginal da obtenção de informação perfeita com os
ganhos que daí poderão advir. Não podem haver erros na formação dos planos individuais de
realização económica ou na avaliação dos meios que são fornecidos pelo próprio mercado. Tem
de haver uma predominância de informação e racionalidade que permita discernir o que é igual e
diverso nos produtos, facultando uma base para a adoção de critérios racionais.

1.3. Liberdade de entrada e de saída


Liberdade significa liberdade de entrada e saída no mercado, ou seja, não podem existir barreiras
à entrada, sejam económicas (escala de produção), sejam jurídicas. Uma variante deste requisito
da inexistência de barreiras é a exigência de que os produtores estabelecidos não têm vantagens
competitivas face aos recém-chegados.

É da liberdade que depende o grau de disciplina do mercado quando surgem hipóteses de distorção
da concorrência do lado da oferta.

É difícil criar ou manter barreiras à concorrência sem o apoio do Estado, mas é fácil encontrar
motivos aparentemente justificativos desse apoio estadual.

2. Teoria do produtor – a maximização do lucro


O lucro para o produtor é a diferença entre o rendimento médio e o custo médio. Se este integrar
um ambiente atomístico, o seu rendimento total variará diretamente em função das quantidades
produzidas. Para o “price taker”, a procura é infinitamente elástica, porque os produtos dos
concorrentes são perfeitos substitutos do seu, e a concorrência de preços é uma corrida para o
fundo, precisamente porque todos os produtores atomísticos sabem que o consumidor tem a
máxima liberdade de escolha.

A concorrência entre vendedores baixa custos e preços e beneficia os consumidores.


Rendimento médio – quociente do rendimento total pelo número de unidades vendidas. Para o
vendedor atomístico, o rendimento médio coincidirá com o preço unitário dos bens vendidos e
com o rendimento marginal (aquilo que o vendedor recebe por cada nova unidade vendida).

Como os preços não variam, o lucro será maximizado no ponto em que os custos médios são mais
baixos. Enquanto o custo marginal for inferior ao rendimento marginal, vale a pena incrementar
a produção porque irá aumentar o lucro.

3. A oferta no curto prazo

Para o vendedor atomístico, a curva da oferta é essencialmente a curva dos custos marginais.
Porém, nem toda a curva dos custos marginais se transforma em curva da oferta, porque há um
limiar mínimo abaixo do qual o produtor não oferece nada, não está disposto a vender.

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4. A suspensão de atividade no curto prazo


Num contexto concorrencial, ocorrerão muito frequentemente circunstancias em que um
produtor é induzido a retirar-se temporária ou definitivamente do mercado. A retirada de curto
prazo distingue-se da de longo prazo, porque no curto prazo existem certos custos fixos que são
irrecuperáveis, pois já estão pagos e não há alternativa para suportá-los.
Um custo irrecuperável deve ser racionalmente irrelevante para as decisões de um produtor,
porque só tem de se concentrar nas suas decisões de curto prazo de reafectação de recursos
variáveis e nas decisões de longo prazo relativas à escala de produção, já que esses custos
irrecuperáveis não se alteram.
Nem todos os custos fixos são irrecuperáveis, sendo recuperáveis todos os relativos à aquisição
de bens que sejam utilizáveis noutras linhas de produção. São também recuperáveis os custos
fixos de funcionamento, alguns tendendo a desaparecer mal seja tomada pelo produtor a decisão
de suspender a atividade.
No curto prazo, tudo se decide no plano dos custos variáveis. Será racional retirar-se
temporariamente se as perdas resultantes daí foram compensadas pela poupança obtida em sede
de custos variáveis, ou seja, se os custos variáveis forem superiores ao rendimento total.
O ponto de encerramento (temporário) ocorre quando o rendimento total não cobre o total dos
custos variáveis e as perdas totais são superiores aos custos fixos totais.

5. O encerramento no longo prazo


Trata-se de decidir pelo abandono ou não do setor produtivo, e se decidir não abandonar, de
decidir a escala de produção a adotar. O produtor-vendedor atomístico num ambiente
concorrencial deverá no longo prazo abandonar o mercado se o seu rendimento total não chega
para cobrir os seus custos totais. Aqui já são relevantes também os custos fixos.
No longo prazo, a curva da oferta também pode coincidir com a curva ascendente de custos
marginais, mas só há oferta a partir do ponto no qual é possível e sustentável uma situação em
que os custos médios sejam inferiores aos preços. O candidato à entrada no mercado deverá
considerar qual será a sua escala de eficiência, só entrando se esse mínimo de custos médios
estiver abaixo do preço de mercado.
A existência de preços elevados e de lucros extraordinários atrai novos concorrentes ao
mercado. Como cada novo produtor só entre se tiver calculado que é capaz de operar a custos
médios totais inferiores ao preço de mercado, e volta a sair se verificar o inverso, a expansão da
oferta através do aumento do número de produtores faz-se a custos marginais que praticamente
coincidem com os custos médios, pelo que a curva da oferta de longo prazo é quase horizontal.
O produtor deve encerrar a atividade sempre que o preço de venda dos seus produtos não for
suficiente para cobrir os custos médios.

6. A transição do curto para o longo prazo


No longo prazo, com a possibilidade de entrada e saída, não se pode presumir que o nº de
vendedores seja fixo, mas pode presumir-se que existam pontos de equilíbrios, nos quais
momentaneamente, ninguém entre nem sai.
Os produtores entram no mercado quando vêm que os outros, já instalados e com estruturas
de custos similares, recebem lucros. Mas a sua entrada aumenta a oferta e diminui os lucros, para
todos os produtores. Alguns dos produtores que foram atraídos ao mercado descobrem que aquilo
que os atraiu for destruído pela sua própria entrada.
Mas há um ponto de equilíbrio, em que ninguém tem incentivo para entrar, mas os instalados
também não estão pressionados para sair: o ponto em que o preço e o custo médio convergem –
ponto sem lucro nem prejuízo.
Um mercado concorrencial sem barreiras de entrada e de saída tende, no longo prazo, para um
equilíbrio que coloca os produtores na sua escala de eficiência.

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No longo prazo, os produtores estabilizarão um ponto em que coincidem preço, custo médio e
custo marginal (escala da eficiência). Isto significa que os produtores são selecionados na
concorrência pelo seu padrão de custos, e que ficam no mercado apenas os que têm custos médios
mais baixos, os que conseguem o não prejuízo a esses custos. Mas há momentos em que a oferta
de longo prazo deixa de ser estável quanto ao preço e evidencia crescimento: entrada de novos
concorrentes; cada concorrente que entra é menos eficiente que o anterior, agravando a média de
custos.
“Teoria da Renda” de David Ricardo → todo o rendimento que ultrapassa o custo de
oportunidade dos recursos empregues na atividade (renda económica), e por isso ultrapassa o
incentivo mínimo necessário para que a atividade tenha ligar, convertendo-se aparentemente
numa remuneração desnecessária e ineficiente.

7. O lucro normal
O facto de economicamente ter desaparecido o lucro não implica que não subsista um lucro
contabilístico, ou seja, a noção de custo total com que temos lidado abarca também os custos de
oportunidade.
Lucro normal – ponto mínimo aceitável de lucro sem o qual o setor é abandonado pelos
empresário, pois corresponde ao rendimento medio que a atividade empresarial é capaz de gerar
em qualquer setor.
O produtor que observa os seus lucros contabilísticos concluirá pela não-saída se tiver a
perceção de que em qualquer outro mercado ou setor de atividade os lucros contabilísticos seriam
menores.
A “linha de água” atingida quando o rendimento total é igual aos custos totais chama-se ponto
de break-even, no qual o produtor está já a atingir o rendimento que alcançaria na melhor das
produções alternativas.

8. A concentração do mercado
A intensidade da concorrência depende da estrutura de custos dominantes, e essa depende da
tecnologia disponível. O nível ótimo de concorrência dar-se-á quando a densidade de concorrentes
não impedir nenhum deles de chegar à sua escala de eficiência.

Monopólio natural – só há lugar para um produtor, que esgota o mercado a um nível de produção
em que os seus custos médios são ainda descendentes. Neste caso, a concorrência é impossível:
qualquer recém-chegado ao mercado que utilize a mesma tecnologia do produtor já instalado só
conseguirá produzir a custos médios superiores aos custos médios do monopolista, sendo, pois,
derrotado por este.
O que determina o grau de concorrência é os custos fixos, os custos irrecuperáveis e os custos
fixos de funcionamento, em que cada produtor tem que incorrer para se estabelecer num
determinado setor, são as “barreiras de entrada”.
Existem razões de eficiência que limitam a atomicidade e a concorrência. Quando é elevada a
escala mínima de eficiência, é de esperar que a concentração dos produtos seja igualmente
elevada.
Quanto maior for a concentração num mercado, mais provável se torna que o preço de afaste
do seu nível concorrencial e se aproxime dos máximos que poderão vigorar numa situação de
monopólio. A concentração é o caminho normal de evolução do mercado concorrencial para as
formas de concorrência imperfeita.

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9. A interdependência dos mercados competitivos


A análise das interdependências constitutivas de um mercado reclamaria um modelo de
relativa complexidade no qual pudessem ser simultaneamente ponderados os vários elementos da
teia de transações. Haveria que complementar a análise do equilíbrio parcial com a do equilíbrio
geral: a haver um equilíbrio geral da economia, todos os mercados parciais equilibrariam em
sintonia e a qualquer investimento em qualquer ponto da economia corresponderia um mesmo
rendimento, uma mesma escala e salários, os mesmos preços e taxas de juros.
A ideia do equilíbrio geral pode ser completada pela ideia de “fluxo circular”, enriquecida com
a inclusão de mais dois polos: as economias estrangeiras e o Estado.
No modelo básico do fluxo circular, as famílias encaminham para as empresas tanto os seus
pagamentos de bens e serviços como as suas poupanças; as empresas pagam salários, juros, rendas
e dividendos às famílias. As famílias nacionais podem encaminhar para as economias estrangeiras
tanto as suas poupanças como as suas despesas com importações, tal como as empresas nacionais
podem receber das economias estrangeiras tanto os pagamentos referentes às exportações como
empréstimos, podendo encaminhar juros e dividendos para aquelas economias. As famílias
encaminham para o Estado o pagamento de impostos e as quantias que emprestam àquele,
limitando-se os contributos das empresas, ao pagamento de impostos. O Estado paga salários e
juros, faz transferências de pagamento a favor dos particulares e às empresas atribui subsídios e
paga-lhes os produtos por elas fornecidos.

9.1. Externalidades de rede e formação de standards


Entre as economias externas contam-se as externalidades de rede (efeitos no uso de um bem
ou serviço decorrentes da circunstância de outros utilizares o mesmo bem ou serviço, ou bens e
serviços compatíveis). São os efeitos das externalidades positivas no consumo. Estas são
fenómenos característicos das tecnologias da informação. Fala-se a este propósito de uma “lei de
Metcalfe”, segundo a qual o valor de uma rede para os seus participantes é proporcional ao
quadrado do nº desses participantes, e que, portanto, a utilidade da rede para cada participante
corresponde linearmente à sua dimensão.
As externalidades de rede podem ser um veículo de penetração de uma inovação no mercado,
se ela “entrar na moda”; a rápida verificação de efeitos de escala permite à rede incentivar a
produção de bens complementares ao “standard” que fez arrancar os efeitos de rede. Podem
também ter efeitos anti competitivos se gerarem o path dependence: um determinado produto
torna-se “referência de mercado” e condiciona todos os produtores a gravitar em torno dele, o que
resulta numa barreira intransponível para aquelas inovações que queiram afirmar-se à margem da
norma, não querendo nenhum consumidor assumir os riscos e suportar os custos de dar o primeiro
passo no abandono do standard.
Isto prova uma aversão à incompatibilidade, expressa no medo dos “produtos-órfãos”. Isto não
sucede se a atitude normal for a indiferença e neutralidade perante a incompatibilidade, porque
há espaço para novos produtos comparando-os com o standard, gerando mais descentralização e
concorrência.
A compatibilidade nem sempre se traduz em beneficio para os consumidores: não só o
problema da “standardização” cria barreiras de entrada no mercado e pode propiciar rendas
monopolísticas, como ainda ele pode servir de base de conluio entre produtores (carteis) em
detrimento da adoção de produtos alternativos nos quais a heterogeneidade e a incompatibilidade
sejam mãos do que compensadas pelos preços baixos. Outra consequência pode ser a entrada
catastrófica, ou seja, uma simples sucessão de monopólios em vez de um equilíbrio concorrencial.
O mercado de “standards” assemelha-se ao mercado de “criação destrutiva” de Joseph
Schumpeter, o mercado no qual os monopólios seriam periodicamente varridos por assaltos de
inovadores que procuravam, não roubar-lhes os lucros mas destruir os próprios alicerces de que
dependia a sua permanência no mercado.

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9.2. Congestão de recursos


Um exemplo de “deseconomias externas” são os problemas de congestionamento de recursos
comuns. P.E: quanto mais popular um restaurante, mais difícil é arranjar mesa, quanto mais
companhias aéreas disputem o espaço aéreo mais elevados serão os custos e as ineficiências de
cada uma; quando mais assinantes tiver uma rede telefónica, maior será a dificuldade de a usar
em momentos de grande tráfego.

CAPÍTULO XX – MERCADOS DE CONCORRÊNCIA IMPERFEITA

1. Monopólio
1.1. Tipos de monopólios
Situação do monopólio – há no mercado um único vendedor, ou um vendedor com esmagadora
predominância sobre os demais.

Monopólio puro – situações em que existe um único vendedor.

Poder de monopólio – a preponderância de um vendedor sobre os demais é tal que ele pode agir
praticamente como se estivesse isolado do lado da oferta, embora na realidade não o esteja.

Os monopolistas têm a possibilidade de interferir decisivamente no nível de preços do mercado.


Têm poder de mercado, nem que seja nesse sentido restrito de poder condicionar os preços, e
serão, por isso, “price makers”. São mais frequentes as situações de poder de mercado do que de
monopólio puro.

Os dois objetivos dominantes daquele que se debate com esse contexto concorrencial serão:
✓ Coexistir com produtores de padrões de custos mais elevados, assegurando ganhos
extraordinários de longo prazo, “rendas monopolísticas”;
✓ Excluir todos os outros concorrentes para que a sua capacidade de maximização de lucro seja
aumentada através da manipulação dos preços, progredindo para um monopólio puro.

Aquele que alcança poder de mercado, vê os seus cálculos de custos complicarem-se – o “price
maker” vê o preço de mercado baixar à medida que aumenta o volume de produção, daí resultando
que a interseção da curva ascendente do custo marginal com a curva descendente do preço de
mercado determinará uma relação “preço-quantidade” mais baixa do que se esperaria
inicialmente.
O monopolista só pode incrementar as suas vendas, e esforçar-se por se aproximar do volume
de produção correspondente, se baixar os preços de mercado, pelo que para ele, o rendimento
marginal resultante do incremente da produção em uma unidade não é igual ao preço de mercado
corrente.
Em contrapartida, o poder de mercado há de manifestar-se precisamente na capacidade que o
vendedor tenha para travar essa queda do nível de preços de mercado, fixando preços acima do
custo marginal. Essa capacidade está naturalmente condicionada pela elasticidade-preço desses
consumidores: quanto menos estes tiverem reféns do consumo dos bens vendidos pelo
monopolista e puderem substituí-lo pelo consumo de outros bens, ou quanto mais esgotada estiver
a sua capacidade aquisitiva, a possibilidade de suportarem, com o seu rendimento finito, as
subidas de preços, menos o monopolista poderá explorar, através dos preços, as vantagens do seu
domínio no mercado. Contrariamente, a possibilidade de subida de preços é tanto mais ampla
quando maior a inelasticidade.

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a) A defesa do monopólio
O facto de haver um único vendedor no mercado, ou de existir um com preponderância
absoluta, derivará normalmente da existência de barreiras de entrada no mercado, as quais, por
sua vez, resultarão de:
✓ Detenção exclusiva de recursos produtivos (matérias primas);
✓ Detenção exclusiva de informação (relaciona-se com a inovação – informação sobre o
produto ou sobre a forma de produzir). Enquanto a informação for detida por um único
agente, ele detém a posição de monopólio.
✓ Os monopólios naturais (situação de maior eficiência produtiva. Por causa da estrutura de
custos, é o mais eficiente se existir apenas uma empresa no mercado). Justifica-se por
questões económicas. NOTA: os monopólios naturais também têm de ser regulados.
✓ Direitos exclusivos – uma tutela jurídica cria situações de monopólio – este protege o
indivíduo através da propriedade individual e das licenças e patentes.
✓ Condutas anti-concorrenciais – o agente que está instalado no mercado e tem o poder de
mercado, ou vai afastar os mercados mais pequenos através da descida dos preços, ou vai
impedir que outros agentes entrem no mercado, através da subida de preços.

O monopolista que afasta a concorrência através da prática de preços próximos do custo paga por
isso um custo elevadíssimo, até mais elevado do que aquele que suportaria se, mantendo o seu
preço que lhe garante uma “renda monopolística”, se dispusesse a dividir o mercado com os
concorrentes.

“Paradoxo da cadeia de distribuição”, Reinhard Selten – uma cadeia tem 100 lojas em 100
cidades e defronta-se com a possibilidade de concorrência por parte de comerciantes locais
sequencialmente nas cidades. Tem duas hipóteses: ou vive com a concorrência, ou baixa os preços
predatoriamente em todas as cidades, expulsando os rivais. A segunda opção é mais cara. Na
presença de contestação, o produtor dominante pode retirar-se de um segmento de mercado mais
ameaçado e concentrar-se num segmente que esteja menos. Aquele que se encontra em monopólio
natural está imune à concorrência, ao menos enquanto o mercado não se expandir.

1.2. O poder de mercado do monopolista


O poder de mercado do monopolista faz com que o preço pelo qual escoará num mercado a
sua produção não se mantenha fixo em todos os níveis de produção e tenda a evoluir no sentido
oposto ao da expansão da procura.
O “price maker” tem à sua frente uma curva da procura descendente e se ele for deveras o
único vendedor, tem à sua frente uma curva da procura do mercado. Um aumento de produção do
“price maker” levará a uma queda dos preços, e uma diminuição da produção induzirá num
aumento de preços.
Se o rendimento médio é descendente, isso significa que o rendimento marginal lhe é inferior
e está a “puxá-lo” para baixo. Dada a equivalência entre rendimento médio e preço, o monopolista
está condenado a ter um rendimento marginal que é sempre inferior ao preço.
O mercado concorrencial é mais eficiente do que um mercado monopolista: se, naquele
momento, o preço de equilíbrio tende a coincidir com o custo marginal, neste o preço está
necessariamente acima do custo marginal, do ponto em que esse custo marginal se cruza com o
rendimento marginal.
Os lucros que o monopolista obtém a mais do que o concorrente atomístico são fruto de um
excesso de preço em relação ao custo marginal, facilitado por o monopolista poder ajustar a sua
produção a uma escala inferior àquela a que os concorrentes atomísticos são forçados. O fim de
um monopólio levará normalmente à queda dos preços, sendo que a entrada dos novos
concorrentes conduzirá todos em direção a uma posição de equilíbrio na qual o preço coincidirá
com o custo marginal e todos estarão forçados a operar à escala de eficiência.

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