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Manual de Tronco Comum

Introdução à Filosofia
Código A0010

Universidade Católica de Moçambique (UCM)


Centro de Ensino à Distância (CED)
Direitos de autor (copyright)
Este manual é propriedade da Universidade Católica de Moçambique (UCM), Centro de
Ensino à Distância (CED) e contém reservados todos os direitos. É proibida a duplicação e/ou
reprodução deste manual, no seu todo ou em partes, sob quaisquer formas ou por quaisquer
meios (electrónicos, mecânico, gravação, fotocópia ou outros), sem permissão expressa de
entidade editora (Universidade Católica de Moçambique – Centro de Ensino à Distância). O
não cumprimento desta advertência é passível a processos judiciais.

Elaborado Por: António Luís Rosa – Licenciado em Ensio de Filosofia pela Universidade
Pedagógica – Moçambique, Delegação da Beira.

Universidade Católica de Moçambique (UCM)


Centro de Ensino à Distância (CED)
Rua Correia de Brito No 613 – Ponta-Gêa
Beira – Sofala

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Agradecimentos

A Universidade Católica de Moçambique (UCM) – Centro de Ensino à Distância (CED) e o autor


do presente manual, António Luís Rosa, agradecem a colaboração de todos que directa ou
indirectamente participaram na elaboração deste manual. À todos sinceros agradecimentos.
Introdução à Filosofia i

Índice
Visão geral 7

Benvido à Introdução à Filosofia ...................................................................................... 7


Objectivos do curso .......................................................................................................... 7
Quem deveria estudar este módulo ................................................................................... 7
Como está estruturado este módulo .................................................................................. 8
Ícones de actividade .......................................................................................................... 8
Acerca dos ícones .......................................................................................... 9
Habilidades de estudo ....................................................................................................... 9
Precisa de apoio? ............................................................................................................ 10
Tarefas (avaliação e auto-avaliação)............................................................................... 10
Avaliação ........................................................................................................................ 11

Unidade N0 01-A0010 12

Tema: Introdução à Filosofia .......................................................................................... 12


Introdução .............................................................................................................. 12
Sumário ........................................................................................................................... 12
Exercícios........................................................................................................................ 17

Unidade N0 02-A0010 18

Tema: Atitude filosófica ................................................................................................. 18


Introdução .............................................................................................................. 18
Sumário ........................................................................................................................... 18
Exercícios........................................................................................................................ 31

Unidade N0 03-A0010 32

Tema: Breve contextualização histórica da Filosofia ..................................................... 32


Introdução .............................................................................................................. 32
ii Índice

Sumário ........................................................................................................................... 32
Exercícios......................................................................... Erro! Marcador não definido.

Unidade N0 04-A0010 36

Tema: A Pessoa Humana ................................................................................................ 36


Introdução .............................................................................................................. 36
Sumário ........................................................................................................................... 36
Exercícios........................................................................................................................ 39

Unidade N0 05-A0010 40

Tema: A Consciência Moral ........................................................................................... 40


Introdução .............................................................................................................. 40
Sumário ........................................................................................................................... 40
Exercícios........................................................................................................................ 43

Unidade N0 06-A0010 44

Tema: Aspectos da Ética Individual. .............................................................................. 44


Introdução .............................................................................................................. 44
Sumário ........................................................................................................................... 44
Exercícios........................................................................................................................ 48

Unidade N0 07-A0010 49

Tema: A acção humana................................................................................................... 49


Introdução .............................................................................................................. 49
Sumário ........................................................................................................................... 49
Exercícios........................................................................................................................ 51

Unidade N0 08-A0010 52

Tema: Introdução aos Valores ........................................................................................ 52


Introdução .............................................................................................................. 52
Introdução à Filosofia iii

Sumário ........................................................................................................................... 52
Exercícios........................................................................................................................ 57

Unidade N0 09-A0010 58

Tema: Aspectos da Bioética. .......................................................................................... 58


Introdução .............................................................................................................. 58
Sumário ........................................................................................................................... 58
Exercícios........................................................................................................................ 61

Unidade N0 10-A0010 62

Tema: Teoria do Conhecimento. .................................................................................... 62


Introdução .............................................................................................................. 62
Sumário ........................................................................................................................... 62
Exercícios........................................................................................................................ 71

Unidade N0 11-A0010 72

Tema: Possibilidades do Conhecimento. ........................................................................ 72


Introdução .............................................................................................................. 72
Sumário ........................................................................................................................... 72
Exercícios........................................................................................................................ 75

Unidade N0 12-A0010 76

Tema: Origem do Conhecimento. ................................................................................... 76


Introdução .............................................................................................................. 76
Sumário ........................................................................................................................... 76
Exercícios........................................................................................................................ 81

Unidade N0 13-A0010 82

Tema: Natureza do Conhecimento ................................................................................. 82


Introdução .............................................................................................................. 82
iv Índice

Sumário ........................................................................................................................... 82
Exercícios........................................................................................................................ 84

Unidade N0 14-A0010 85

Tema: Níveis de Conhecimento ...................................................................................... 85


Introdução .............................................................................................................. 85
Sumário ........................................................................................................................... 85
Exercícios........................................................................................................................ 95

Unidade N0 15-A0010 96

Tema: Introdução à Lógica. ............................................................................................ 96


Introdução .............................................................................................................. 96
Sumário ........................................................................................................................... 96
Exercícios........................................................................................................................ 99

Unidade N0 16-A0010 100

Tema: As dimensões do discurso humano. ................................................................... 100


Introdução ............................................................................................................ 100
Sumário ......................................................................................................................... 100
Exercícios...................................................................................................................... 104

Unidade N0 17-A0010 105

Tema: Os princípios da razão ....................................................................................... 105


Introdução ............................................................................................................ 105
Sumário ......................................................................................................................... 105
Exercícios...................................................................................................................... 111

Unidade N0 18-A0010 112

Tema: A convivência políticas entre os Homens.......................................................... 112


Introdução ............................................................................................................ 112
Introdução à Filosofia v

Sumário ......................................................................................................................... 112


Exercícios...................................................................................................................... 120

Unidade N0 19-A0010 121

Tema: Os Direitos Humanos......................................................................................... 121


Introdução ............................................................................................................ 121
Sumário ......................................................................................................................... 121
Exercícios...................................................................................................................... 125

Unidade N0 20-A0010 126

Tema: A Filosofia Política na História ......................................................................... 126


Introdução ............................................................................................................ 126
Sumário ......................................................................................................................... 126
Exercícios...................................................................................................................... 136

Unidade N0 21-A0010 139

Tema: Ciência ............................................................................................................... 139


Introdução ............................................................................................................ 139
Sumário ......................................................................................................................... 139
Exercícios...................................................................................................................... 141

Unidade N0 22-A0010 142

Tema: A Estética ........................................................................................................... 142


Introdução ............................................................................................................ 142
Sumário ......................................................................................................................... 142
Exercícios...................................................................................................................... 143

Unidade N0 23-A0010 144

Tema: A expressão artística .......................................................................................... 144


Introdução ............................................................................................................ 144
vi Índice

Sumário ......................................................................................................................... 144


Exercícios...................................................................................................................... 147

Unidade N0 24-A0010 148

Tema: A experiência Religiosa ..................................................................................... 148


Introdução ............................................................................................................ 148
Sumário ......................................................................................................................... 148
Exercícios...................................................................................................................... 150
Introdução à Filosofia 7

Visão geral

Benvindo à Introdução à Filosofia


O mundo que nos rodeia é caracterizado pela multiplicidade de
saberes, os quais fazem com que o Homem se questione sobre qual é
a verdadeira sabedoria. Nesse contexto, o que importa não são as
respostas, mas as perguntas levantadas pelo próprio Homem. Esta é
a principal característica do filósofo: levantar perguntas constantes,
profundas e radicais para buscar a verdade das coisas e do ser
humano. Com a filosofia se é capaz de buscar o sentido da vida,
segundo Sócrates “uma vida sem filosofia não vale a pena ser
vivida”.

Objectivos do curso
Quando terminar o estudo da Introdução à Filosofia, o estudante
deve ser capaz de:

 Identificar o sentido e o significado da Filosofia, através da reflexão


sobre a relação que ela tem para com outras ciências, com a existência
humana e toda a realidade, particularmente tudo o que se refere ao mundo
actual.

Quem deveria estudar este


módulo
Este módulo foi concebido para todos aqueles que frequentam os
cursos à distância, oferecidos pela Universidade Católica de
Moçambique (UCM), através do seu Centro de Ensino à
Distância (CED).
8 Unidade

Como está estruturado este


módulo
Todos os módulos dos cursos produzidos por UCM - CED
encontram-se estruturados da seguinte maneira:

Páginas introdutórias

 Um índice completo.

 Uma visão geral detalhada do curso / módulo, resumindo os


aspectos-chave que você precisa conhecer para completar o estudo.
Recomendamos vivamente que leia esta secção com atenção antes de
começar o seu estudo.

Conteúdo do curso / módulo

O curso está estruturado em unidades. Cada unidade incluirá uma


introdução, objectivos da unidade, conteúdo da unidade
incluindo actividades de aprendizagem, um resumo da unidade
e uma ou mais actividades para auto-avaliação.

Outros recursos

Para quem esteja interessado em aprender mais, apresentamos


uma lista de recursos adicionais para você explorar. Estes
recursos podem incluir livros, artigos ou sites na internet.

Tarefas de avaliação e/ou Auto-avaliação

Tarefas de avaliação para este módulo encontram-seno final de


cada unidade. Sempre que necessário, dão-se folhas individuais
para desenvolver as tarefas, assim como instruções para as
completar. Estes elementos encontram-se no final do módulo.

Comentários e sugestões

Esta é a sua oportunidade para nos dar sugestões e fazer


comentários sobre a estrutura e o conteúdo do curso / módulo. Os
seus comentários serão úteis para nos ajudar a avaliar e melhorar
este curso / módulo.

Ícones de actividade
Ao longo deste manual irá encontrar uma série de ícones nas
margens das folhas. Estes icones servem para identificar
diferentes partes do processo de aprendizagem. Podem indicar
Introdução à Filosofia 9

uma parcela específica de texto, uma nova actividade ou tarefa,


uma mudança de actividade, etc.

Acerca dos ícones


Os icones usados neste manual são símbolos africanos,
conhecidos por adrinka. Estes símbolos têm origem no povo
Ashante de África Ocidental, datam do século XVII e ainda se
usam hoje em dia.

Pode ver o conjunto completo de ícones deste manual já a seguir,


cada um com uma descrição do seu significado e da forma como
nós interpretámos esse significado para representar as várias
actividades ao longo deste módulo.

Habilidades de estudo
Caro estudante, procure olhar para você em três dimensões
nomeadamente: o lado social, profissional e estudante, daí ser
importante planificar muito bem o seu tempo.

Procure reservar no mínimo 2 (duas) horas de estudo por dia e


use ao máximo o tempo disponível nos finais de semana.
Lembre-se que é necessário elaborar um plano de estudo
individual, que inclui, a data, o dia, a hora, o que estudar, como
estudar e com quem estudar (sozinho, com colegas, outros).

Evite o estudo baseado em memorização, pois é cansativo e não


produz bons resultados, use métodos mais activos, procure
desenvolver suas competências mediante a resolução de
problemas específicos, estudos de caso, reflexão, etc.

O manual contém muita informação, algumas chaves, outras


complementares, daí ser importante saber filtrar e apresentar a
informação mais relevante. Use estas informações para a
resolução dos exercícios, problemas e desenvolvimento de
actividades. A tomada de notas desempenha um papel muito
importante.

Um aspecto importante a ter em conta é a elaboração de um


plano de desenvolvimento pessoal (PDP), onde você reflecte
sobre os seus pontos fracos e fortes e perspectivas o seu
desenvolvimento.

Lembre-se que o teu sucesso depende da sua entrega, você é o


responsável pela sua própria aprendizagem e cabe a ti planificar,
organizar, gerir, controlar e avaliar o seu próprio progresso.
10 Unidade

Precisa de apoio?
Caro estudante, temos a certeza de que por uma ou por outra
situação, o material impresso, lhe pode suscitar alguma dúvida
(falta de clareza, alguns erros de natureza frásica, prováveis erros
ortográficos, falta de clareza conteudística, etc). Nestes casos,
contacte o tutor, via telefone, escreva uma carta participando a
situação e se estiver próximo do tutor, contacte-o pessoalmente.

Os tutores têm por obrigação, monitorar a sua aprendizagem, dai


o estudante ter a oportunidade de interagir objectivamente com o
tutor, usando para o efeito os mecanismos apresentados acima.

Todos os tutores têm por obrigação facilitar a interação, em caso


de problemas específicos ele deve ser o primeiro a ser
contactado, numa fase posterior contacte o coordenador do curso
e se o problema for da natureza geral, contacte a direcção do
CED, pelo número 825018440.

Os contactos só se podem efectuar, nos dias úteis e nas horas


normais de expediente.

As sessões presenciais são um momento em que você caro


estudante, tem a oportunidade de interagir com todo o staff do
CED, neste período pode apresentar dúvidas, tratar questões
administrativas, entre outras.

O estudo em grupo, com os colegas é uma forma a ter em conta,


busque apoio com os colegas, discutam juntos, apoiem-me
mutuamnte, reflictam sobre estratégias de superação, mas
produza de forma independente o seu próprio saber e desenvolva
suas competências.

Juntos na Educação à Distância, vencendo a distância.

Tarefas (avaliação e auto-


avaliação)
O estudante deve realizar todas as tarefas (exercícios, actividades
e auto-avaliação), contudo nem todas deverão ser entregues, mas
é importante que sejam realizadas.As tarefas devem ser entregues
antes do período presencial.

Para cada tarefa serão estabelecidos prazos de entrega, e o não


cumprimento dos prazos de entrega , implica a não classificação
do estudante.
Introdução à Filosofia 11

As trabalhos devem ser entregues ao CED e os mesmos devem


ser dirigidos ao tutor/docentes.

Podem ser utilizadas diferentes fontes e materiais de pesquisa,


contudo os mesmos devem ser devidamente referenciados,
respeitando os direitos do autor.

O plagiarismo deve ser evitado, a transcrição fiel de mais de 8


(oito) palavras de um autor, sem o citar é considerado plágio. A
honestidade, humildade cintífica e o respeito pelos direitos
autorais devem marcar a realização dos trabalhos.

Avaliação
Vocé será avaliado durante o estudo independente (80% do
curso) e o período presencial (20%). A avaliação do estudante é
regulamentada com base no chamado regulamento de avaliação.

Os trabalhos de campo por si desenvolvidos , durante o estudo


individual, concorrem para os 25% do cálculo da média de
frequência da cadeira.

Os testes são realizados durante as sessões presenciais e


concorrem para os 75% do cálculo da média de frequência da
cadeira.

Os exames são realizados no final da cadeira e durante as sessões


presenciais, eles representam 60% , o que adicionado aos 40% da
média de frequência, determinam a nota final com a qual o
estudante conclui a cadeira.

A nota de 10 (dez) valores é a nota mínima de: (a) admissão ao


exame, (b) nota de exame e, (c) conclusão do módulo.

Nesta cadeira o estudante deverá realizar: 3 (três) trabalhos; 2


(dois) testes escritos e 1 (um) exame escrito.

Não estão previstas quaisquer avaliação oral.

Algumas actividades práticas, relatórios e reflexões serão


utilizadas como ferramentas de avaliação formativa.

Durante a realização das avaliações, os estudantes devem ter em


consideração: a apresentação; a coerência textual; o grau de
cientificidade; a forma de conclusão dos assuntos, as
recomendações, a indicação das referências utilizadas, o respeito
pelos direitos do autor, entre outros.

Os objectivos e critérios de avaliação estão indicados no manual.


Consulte-os.

Alguns feedbacks imediatos estão apresentados no manual.


12 Unidade

Unidade N0 01-A0010

Tema: Introdução à Filosofia

Introdução
A Filosofia é uma disciplina que está presente em todos os
tempos e lugares. Desde a antiguidade foi considerada a mãe de
todas as ciências, pois ela busca a verdade na sua totalidade.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer o conceito, método e objecto da Filosofia.

 Descrever as Funções da Filosofia.


Objectivos  Caracterizar atitudes e disciplinas auxiliares da Filosofia.

 Diferenciar a Filosofia de outras ciências.

Sumário
O termo “filosofia” é composto de dois termos gregos: phílos,
que significa amigo de, amante de, afeiçoado a, que gosta de, que
tem gosto em, que se compraz em, que busca com afã, que
anseia, etc., e sophía, que significa sabedoria, saber, ciência,
conhecimento, etc. Assim pois, etimologicamente, o termo
filosofia significa: amor à sabedoria, gosto pelo saber.

Filósofo é aquele que ama o saber, tem gosto pela sabedoria,


conhecimento e busca incansavelmente os conhecimentos de
forma radical, profunda e total.

Origem do termo “filosofia”

O termo filosofia nasceu no “círculo socrático”, quer dizer, no


círculo de Sócrates e dos discípulos dele, ou talvez antes ainda
Introdução à Filosofia 13

no “círculo pitagórico”, quer dizer, no círculo de Pitágoras e dos


seus discípulos.

Eram chamados de “filósofos” os homens que buscavam a


“sabedoria suprema”, quer dizer, “a sabedoria última e radical
da vida e das coisas”, ou seja, o saber que busca a dimensão
última e radical da vida e das coisas.

O que é filosofia?

Segundo a tradição, o criador do termo filosofia foi Pitágoras, o


que, embora não sendo historicamente seguro, no entanto é
verossimível. O termo certamente foi cunhado por um espírito
religioso, que pressupunha só ser possível aos deuses uma sofia
(sabedoria), ou seja, uma posse certa e total do verdadeiro, uma
contínua aproximação ao verdadeiro, um amor ao saber nunca
saciado totalmente, de onde, justamente, o nome, filosofia, ou
seja, “amor pela sabedoria”.

O Homem é naturalmente filósofo, isto é, “amigo da sabedoria”.


Ávido de saber, não se contenta em viver o momento presente e
aceitar passivamente as informações fornecidas pela experiência
imediata, como acontece com os animais. Em seu olhar
interrogativo quer conhecer o porquê das coisas, sobretudo o
porquê da própria vida.

Mas enquanto o Homem comum, o Homem da rua, formula essas


interrogações e enfrenta estes problemas de maneira descontínua,
sem método e sem ordem, há pessoas que dedicam a essa
pesquisa todo o seu tempo e todas as suas energias, e propõem-se
a obter uma solução concludente para todos os ingentes
problemas que espicaçam a mente humana, através de uma
análise aprofundada e sistemática. Estas pessoas recebem a
designação de “filósofos”.

Mas, então o que é a filosofia? A filosofia é um conhecimento,


um saber e, como tal, em sua esfera de particular competência na
qual, busca adquirir informações válidas, precisas e ordenadas.

No decorrer da história da filosofia, foi assumindo várias


definições, de acordo com o filósofo e o tempo em que se
encontrasse. Assim, Aristóteles (384-322 a.C) define filosofia
como sendo a disciplina que estuda “as causas últimas de todas
as coisas”; Cícero (106-46 a.C) define a filosofia como sendo “o
estudo das causas humanas e divinas das coisas”; Descartes
(1596-1650) afirma que filosofia “ensina a bem raciocinar”;
Hegel (1770-1831) concebe a filosofia como “saber absoluto”.
Whitehead (1861-1947) julga que a tarefa da filosofia é “fornecer
uma explicação orgânica do universo”.

Poderíamos citar muitos outros filósofos que definem a filosofia,


quer como estudo do valor do conhecimento, quer como pesquisa
sobre o fim último do Homem, quer como estudo da linguagem,
do ser, da história, da arte, da cultura, da política, etc.
14 Unidade

Dentre as várias definições acima apresentadas, podemos


concluir que a filosofia não estuda uma única realidade, mas
várias. Assim, podemos levantar a seguinte pergunta: qual é o
objecto de estudo da filosofia? No entender dos filósofos, a
filosofia estuda tudo, ou seja, a filosofia pretende explicar a
totalidade das coisas, toda a realidade, sem exclusão de partes
ou momentos delas. Assim, a filosofia distingue-se das ciências
particulares, que assim se chamam exactamente porque se
limitam a explicar partes ou sectores da realidade, grupos de
coisas ou de fenômenos. E a pergunta levantada pelos primeiros
filósofos foi: “Qual é o príncípio de todas as coisas?” Esta
pergunta já mostra a perfeita consciência desse ponto.

No que se refere ao método, a filosofia recorre ao método


puramente racional daquela totalidade, embora não exclua algum
momento intuitivo. Mas os métodos racionais são múltiplos, e os
mais importantes são indução e a dedução. A filosofia utiliza
ambos: a indução para ascender dos factos aos princípios
primeiros e a dedução para descer de novo dos primeiros
princípios e iluminar posteriormente os factos, para compreendê-
los melhor. O que vale em filosofia é a razão, a motivação
lógica, o logos.

Por último, o objectivo ou fim da filosofia está no puro desejo de


conhecer e contemplar a verdade. Ela tem como objectivo único
o conhecimento; tem em vista simplesmente pesquisar a verdade
em si mesma, prescindindo de eventuais utilizações práticas. A
filosofia tem um objectivo puramente teórico, ou seja,
contemplativo; não pesquisa por nenhuma vantagem que lhe seja
estranha, mas por ela mesma; por isso Aristóteles afirma que a
filosofia é “livre” enquanto não está sujeita a nenhuma utilização
de ordem prática, e portanto se realiza e se resume na pura
contemplação do verdadeiro.

Universalidade e particularidade da Filosofia

A filosofia é ainda um saber universal, pois exprime


preocupações e problemas que preocuparam a Humanidade
durante todos os tempos. Se o objecto de nossa preocupação é
uma paixão, um amigo, o juízo acerca de um quadro de
Malangatana ou a reflexão sobre uma injustiça de que fomos
vítimas, não estaremos propriamente a filosofar. Mas essa
reflexão tornar-se-á filosófica se formos mais longe e nos
questionarmos acerca do amor, da amizade, da beleza ou da
justiça. Nesta medida, a nossa reflexão não estará a ser particular,
mas universal, pois estes são problemas sempre presentes em
qualquer tempo de qualquer cultura ou civilização.

O Homem, ser frágil, marcado ao longo de sua existência por


situações – limites como a morte, o acaso, a culpa, a insegurança,
o desamparo, é, então, fortemente controlado com questões sobre
si próprio, sobre o mundo e o sentido da vida. E é na obscuridade
em que tantas vezes se encontra que nasce a ânsia de uma
orientação filosófica.
Introdução à Filosofia 15

A universalidade da filosofia pode ser entendida em diferentes


sentidos:

No primeiro sentido, universalidade da filosofia quer dizer, que


todos os homens são filósofos; este sentido radica no facto de
todo o homem ter razão. Tal universalidade conduziu à distinção
entre um filosofar espontâneo, presente, em todo o homem, e um
filosofar sistemático, específico dos filósofos.

Em segundo sentido, mais clássico, a universalidade da filosofia


significa: a ciência do universal e do ser. Como afirma Santo
Tomás de Aquino: “a filosofia é sabedoria no sentido em que,
conhecendo o universal, ela conhece, através dele, todos os
singulares que revelam desse universal”.

Em terceiro sentido, a universalidade da filosofia pode ser


entendida como a construção de um sistema de verdades
universais. Foi este o projecto de Descartes que procurou
encontrar um fundamento, evidente e indubitável, a partir do qual
dedutivamente construiu um sistema filosófico.

Em quarto sentido, pode-se falar da universalidade da filosofia


porque alguns de seus problemas são universais, isto é, referem-
se à existência do homem. Tais problemas, apesar de serem
formulados por um filósofo exprimem inquietações e esperanças
que são próprias da humanidade. O filósofo, ao transmutar o
vivido para o plano do pensado, universaliza uma dada situação e
enuncia-a como problema. Como diz Paul Ricoeur: A obra
filosófica dá forma à questão de onde ela procede; ora, a forma
universal da questão é o problema. O filósofo ao pôr
universalmente em forma de problema, exprime dificuldade que
lhe é própria.

Funções da Filosofia

Assim como se questiona sobre a utilidade de qualquer disciplina


como a Geografia, História, Matemática, Física, Biologia, etc., é
comum ouvir a pergunta: “Qual a função da filosofia?” Em geral
esta pergunta costuma receber uma resposta irônica, conhecida
dos estudantes de filosofia: “a Filosofia é uma ciência com a qual
e sem a qual o mundo permanece tal e qual”. Ou seja, a filosofia
não serve para nada. Por isso se costuma chamar de “filósofo”
alguém sempre distraído, com a cabeça no mundo da lua,
pensando e dizendo coisas que ninguém entende e, que são
perfeitamente inúteis. Mas esta pergunta continua sendo feita
porque em nossa cultura e sociedade habituamos considerar que
alguma coisa só tem o direito de existir se tiver alguma finalidade
prática, muito visível e de utilidade imediata.

Para dar alguma utilidade à Filosofia, muitos consideram, que de


facto, a filosofia não serviria para nada, se “servir”, fosse
entendido como a possibilidade de fazer usos técnicos dos
produtos filosóficos ou dar-lhes utilidade econômica, obtendo
16 Unidade

lucros com eles; consideram também que a filosofia nada teria a


ver com a ciência e a técnica.

Para quem pensa dessa forma, o principal para a Filosofia não


seriam os conhecimentos (que ficam por conta da ciência), nem
as aplicações de teorias (que ficam por conta da tecnologia), mas
o ensinamento moral e ético. A Filosofia seria a arte de bem-
viver. Estudando as paixões e os vícios humanos, a liberdade e a
vontade, analisando a capacidade de nossa razão para impor
limites aos nossos desejos e paixões, ensinando-nos a viver de
modo honesto e justo na companhia dos outros seres humanos e
na virtude, que é o princípio de bem-viver.

A necessidade da filosofia está no facto de que, por meio da


reflexão, a Filosofia permite ao Homem ter mais de uma
dimensão, além da que é dada pelo agir imediato, no qual o
Homem “prático” se encontra mergulhado. É a Filosofia que dá o
distanciamento para avaliação dos fundamentos dos actos
humanos e dos fins a que eles se destinam; reúne o pensamento
fragmentado da ciência e a reconstrói na sua unidade; retoma a
acção pulverizada no tempo e procura compreendê-la.

Portanto, a filosofia é a possibilidade da transcendência humana,


ou seja, a capacidade que só o Homem tem de superar a situação
dada e não escolhida. Pela transcendência o ser humano surge
como ser de projecto, capaz de liberdade e de construir o seu
destino.

O distanciamento é justamente o que provoca a aproximação


maior do Homem com a vida. A filosofia recupera o processo
perdido no imobilismo das coisas feitas e impede a estagnação.
Por isso, o filosofar sempre se confronta com o poder, e sua
investigação não fica alheia à ética e à política. A filosofia é
crítica da ideologia, enquanto forma ilusória de conhecimento
que visa a manutenção de privilégios.

Karl Jaspers diz-nos que a Filosofia ensina, pelo menos, a não


nos deixarmos iludir. Não permite que se descarte facto algum e
nenhuma possibilidade. Ensina a enfrentar de frente a catástrofe
possível. Em meio à serenidade do mundo, ela faz surgir a
inquietude, mas proíbe a atitude tola de considerar inevitável a
catástrofe. Com efeito, só ela tem o poder de alterar nossa forma
de pensamento.

Finalmente, a filosofia exige coragem. Filosofar não é um


exercício puramente intelectual. Descobrir a verdade é ter a
coragem de enfrentar as formas estagnadas de poder que tentam
manter o status quo, é aceitar o desafio da mudança. Lembremo-
nos que Sócrates foi aquele que enfrentou o dasafio máximo da
morte.
Introdução à Filosofia 17

Exercícios

1 – Que é Filosofia?

Resposta: A filosofia é um conhecimento, um saber e, como tal, em


sua esfera de particular competência na qual, busca adquirir
Auto-avaliação informações válidas, precisas e ordenadas.
18 Unidade

Unidade N0 02-A0010

Tema: Atitude filosófica

Introdução
Umas das atitudes do ser humano diante da realidade que o
rodeia consiste na admiração. Pela admiração, o homem formula
perguntas para encontrar a solução de suas inquietações.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer as atitudes filosóficas.

Objectivos  Reflectir sobre as disciplinas auxiliares da Filosofia

 Caracterizar a natureza das questões filosóficas

 Diferenciar a Filosofia e outras ciências.

Sumário
Entre os antigos gregos predominava inicialmente a consciência
mítica, cuja maior expressão se encontra nos poemas de Homero
e Hesíodo. Quando se dá a passagem da consciência mítica para a
racional, aparecem os primeiros sábios, um deles chamado
Pitágoras (séc. VI a.C.), que também era matemático e usou pela
primeira vez a palavra filosofia.

O trabalho filosófico é essencialmente teórico. Mas isso não


significa que a filosofia esteja à margem do mundo, nem que ela
constitua um corpo de doutrina ou um saber acabado, com
determinado conteúdo, ou seja, um conjunto de conhecimentos
estabelecidos de uma vez por todas.

Para Platão (427-347 a.C), a primeira atitude do filósofo é


admirar-se. A admiração é a condição de onde deriva a
capacidade de problematizar, o que marca a Filosofia não como
posse da verdade, mas como sua busca.
Introdução à Filosofia 19

Para Kant, filósofo alemão do século XVIII, “não há filosofia


que se possa aprender; só se pode aprender a filosofar”. Isto
significa que a filosofia é, sobretudo, uma atitude, um pensar
permanente. É um conhecimento instituinte, no sentido de que
questiona o saber instituído.

A atitude filosófica possui algumas características que são as


mesmas, independentemente do conteúdo investigado, que são:

- Perguntar o que a coisa, ou o valor, a idéia, é. A Filosofia


pergunta qual é a realidade ou a natureza e qual é o significado de
alguma coisa, não importa qual;

- Perguntar como a coisa, a idéia ou o valor, é. A filosofia


pergunta qual é a estrutura e quais são as relações que constituem
uma coisa, uma idéia ou um valor;

- Perguntar por que a coisa, a idéia ou o valor, existe e é como é.


A filosofia pergunta pela origem ou pela causa de uma coisa, de
uma idéia, de um valor.

A atitude filosófica inicia-se dirigindo essas perguntas ao mundo


que nos rodeia e as relações que mantemos com ele. Aos poucos,
porém, descobre que essas questões se referem, afinal, a nossa
capacidade de conhecer e de pensar.

Por isso as perguntas de Filosofia se dirigem ao próprio


pensamento: o que é pensar, como é pensar, por que há o pensar?
A Filosofia torna-se então, o pensamento interrogando-se a si
mesmo. Por ser uma volta que o pensamento realiza sobre si
mesmo, a Filosofia se realiza como reflexão.

Disciplinas da Filosofia

Psicologia experimental

O objecto da psicologia experimental é o comportamento


observável, a fim de testar modelos e teorias matemáticas sobre
diversos aspectos do mesmo: prestar atenção, perceber, recordar,
aprender, decidir, reagir emocionalmente e interagir. Os testes às
teorias e modelos são experimentais, isto é, implicam a
manipulação de variáveis ditas independentes e o registo rigoroso
e a medição precisa do que acontece às variáveis dependentes.
Por exemplo, manipular a intensidade da luz e registar e medir a
velocidade de reacção de pressionar uma determinada tecla face a
um estímulo sonoro. As observações que ocorrem nesses estudos
experimentais permitem a formulação de leis, tal como em física
ou química. Porém, o rigor do conhecimento científico em
psicologia experimental implica um rigoroso controlo das
potenciais variáveis parasitas ou confundentes. Por exemplo, se
se quiser saber em que medida manipular a intensidade da luz
influencia a velocidade de reacção de pressionar uma
determinada tecla face a um estímulo sonoro, terá de se controlar
20 Unidade

rigorosamente qualquer variação sonora no ambiente em que


ocorre a experiência. Caso contrário não saberemos se as
variações na velocidade de reacção são devidas às mudanças
produzidas na intensidade luminosa ou às mudanças aleatórias da
intensidade sonora.

Na psicologia experimental os conceitos são rigorosamente


definidos, sendo as definições do tipo operacional. Do mesmo
modo, os termos (ou nomes) usados para designar os conceitos
são universais. Não é admitida a ambiguidade que ocorre com
muita frequência em outras áreas da psicologia. A maioria dos
estudos experimentais em psicologia ocorre em ambiente
laboratorial, apesar de também poderem ser feitas experiências
em ambiente natural, como pretexto para testar modelos
desenvolvidos e testados em laboratório ou para gerar ideias que
serão testadas nas condições de rigor draconiano dos laboratórios.
Em psicologia social é frequente efectuarem-se testes
"experimentais" em ambiente natural (tido "apanhados"
realizados pelas cadeias de televisão) que geram hipóteses a
testar posteriormente em laboratório.

A psicologia experimental pode recorrer tanto a sujeitos humanos


como a outros animais, admitindo como paradigma de referência
a teoria evolucionista das espécies.

Lógica
A lógica (do grego clássico logos, que significa palavra,
pensamento, idéia, argumento, relato, razão lógica ou princípio
lógico), é uma ciência de índole matemática e fortemente ligada à
Filosofia. Já que o pensamento é a manifestação do
conhecimento, e que o conhecimento busca a verdade, é preciso
estabelecer algumas regras para que essa meta possa ser atingida.
Assim, a lógica é o ramo da filosofia que cuida das regras do bem
pensar, ou do pensar correcto, sendo, portanto, um instrumento
do pensar.

A aprendizagem da lógica não constitui um fim em si. Ela só tem


sentido enquanto meio de garantir que nosso pensamento proceda
correctamente a fim de chegar a conhecimentos verdadeiros.
Podemos, então, dizer que a lógica trata dos argumentos, isto é,
das conclusões a que chegamos através da apresentação de
evidências que a sustentam. O principal organizador da lógica
clássica foi Aristóteles, com sua obra chamada Organon. Ele
divide a lógica em formal e material.

Um sistema lógico é um conjunto de axiomas e regras de


inferência que visam representar formalmente o raciocínio
válido. Diferentes sistemas de lógica formal foram construídos ao
longo do tempo quer no âmbito escrito da Lógica Teórica, quer
em aplicações práticas na computação e em Inteligência artificial.

Tradicionalmente, lógica é também a designação para o estudo de


sistemas prescritivos de raciocínio, ou seja, sistemas que definem
como se "deveria" realmente pensar para não errar, usando a
razão, dedutivamente e indutivamente. A forma como as pessoas
realmente raciocinam é estudado nas outras áreas, como na
psicologia cognitiva.
Introdução à Filosofia 21

Como ciência, a lógica define a estrutura de declaração e


argumento para elaborar fórmulas através das quais estes podem
ser codificados. Implícita no estudo da lógica está a compreensão
do que gera um bom argumento e de quais argumentos são
falaciosos.

A lógica filosófica lida com descrições formais da linguagem


natural. A maior parte dos filósofos assumem que a maior parte
do raciocínio "normal" pode ser capturada pela lógica, desde que
se seja capaz de encontrar o método certo para traduzir a
linguagem corrente para essa lógica.

Ética

A palavra Ética é originada do grego ethos, (modo de ser,


carácter) através do latim mos (ou no plural mores,costumes, de
onde se derivou a palavra moral). Em Filosofia, Ética significa o
que é bom para o indivíduo e para a sociedade, e seu estudo
contribui para estabelecer a natureza de deveres no
relacionamento indivíduo - sociedade.

Ética, pode ser definida como a disciplina filosófica que busca


reflectir sobre os sistemas morais elaborados pelos homens,
buscando compreender a fundamentação das normas e
interdições próprias e cada sistema moral.

Define-se Moral como um conjunto de normas, princípios,


preceitos, costumes, valores que norteiam o comportamento do
indivíduo no seu grupo social. Moral e ética não devem ser
confundidos: enquanto a moral é normativa, a ética é teórica, e
buscando explicar e justificar os costumes de uma determinada
sociedade, bem como fornecer subsídios para a solução de seus
dilemas mais comuns. Porém, deve-se deixar claro que
etimologicamente "ética" e "moral" são expressões sinónimas,
sendo a primeira de origem grega, enquanto a segunda é sua
tradução para o latim; a moral é o conjunto que orientam o
comportamento humano tendo como base os valores próprios a
uma dada comunidade.

Como as comunidades humanas são distintas entre si, tanto no


espaço quanto no tempo, os valores podem ser distintos de uma
comunidade para outra, o que origina códigos morais diferentes.

A ética também não deve ser confundida com a lei, embora com
certa frequência a lei tenha como base princípios éticos. Ao
contrário do que ocorre com a lei, nenhum indivíduo pode ser
compelido, pelo Estado ou por outros indivíduos, a cumprir as
normas éticas, nem sofrer qualquer sanção pela desobediência a
estas; por outro lado, a lei pode ser omissa quanto a questões
abrangidas no escopo da ética.

Modernamente, a maioria das profissões têm o seu próprio


código de ética profissional, que é um conjunto de normas de
cumprimento obrigatório, derivadas da ética, frequentemente
incorporados à lei pública. Nesses casos, os princípios éticos
passam a ter força de lei; note-se que, mesmo nos casos em que
esses códigos não estão incorporados à lei, seu estudo tem alta
22 Unidade

probabilidade de exercer influência, por exemplo, em


julgamentos nos quais se discutam fatos relativos à conduta
profissional. Ademais, o seu não cumprimento pode resultar em
sanções executadas pela sociedade profissional, como censura
pública e suspensão temporária ou definitiva do direito de exercer
a profissão.

Tanto “ethos” (carácter) como “mos” (costume) indicam um tipo


de comportamento propriamente humano que não é natural, o
Homem não nasce com ele como se fosse um instinto, mas que é
“adquirido ou conquistado por hábito”. Portanto, ética e moral,
pela própria etimologia, diz respeito a uma realidade humana que
é construída histórica e socialmente a partir das relações
colectivas dos seres humanos nas sociedades onde nascem e
vivem.

Como doutrina Filosófica, a Ética é essencialmente especulativa


e, a não ser quanto ao seu método analítico, jamais será
normativa, característica esta, exclusiva do seu objecto de estudo,
a Moral. Portanto, a Ética mostra o que era moralmente aceito na
Grécia Antiga possibilitando uma comparação com o que é
moralmente aceito hoje na Europa, por exemplo, indicando
através da comparação, mudanças no comportamento humano e
nas regras sociais e suas consequências, podendo daí, detectar
problemas e/ou indicar caminhos. Além de tudo, ser Ético é fazer
algo que te beneficie e, no mínimo, não prejudique o outro.

Eugênio Bucci, em seu livro Sobre Ética e Imprensa, descreve a


ética como um saber escolher entre "o bem" e "o bem" (ou entre
"o mal" e o mal"), levando em conta o interesse da maioria da
sociedade. Ao contrário da moral, que delimita o que é bom e o
que é ruim no comportamento dos indivíduos para uma
convivência civilizada, a ética é o indicativo do que é mais justo
ou menos injusto diante de possíveis escolhas que afectam
terceiros.

A ética pode ser interpretada como um termo genérico que


designa aquilo que é frequentemente descrito como a "ciência da
moralidade", seu significado derivado do grego, quer dizer 'Casa
da Alma', isto é, susceptível de qualificação do ponto de vista do
bem e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja
de modo absoluto.

Em Filosofia, o comportamento ético é aquele que é considerado


bom, e, sobre a bondade, os antigos diziam que: o que é bom
para a leoa, não pode ser bom à gazela. E, o que é bom à gazela,
fatalmente não será bom à leoa. Este é um dilema ético típico.

Portanto, de investigação filosófica, e devidas subjectividades


típicas em si, ao lado da metafísica e da lógica, não pode ser
descrita de forma simplista. Desta forma, o objectivo de uma
teoria da ética é determinar o que é bom, tanto para o indivíduo
como para a sociedade como um todo. Os filósofos antigos
adoptaram diversas posições na definição do que é bom, sobre
como lidar com as prioridades em conflito dos indivíduos versus
o todo, sobre a universalidade dos princípios éticos versus a
"ética de situação". Nesta, o que está certo depende das
circunstâncias e não de uma qualquer lei geral. E sobre se a
Introdução à Filosofia 23

bondade é determinada pelos resultados da acção ou pelos meios


pelos quais os resultados são alcançados.

O Homem vive em sociedade, convive com outros Homens e,


portanto, cabe-lhe pensar e responder à seguinte pergunta:
“Como devo agir perante os outros?”. Trata-se de uma pergunta
fácil de ser formulada, mas difícil de ser respondida. Ora, esta é a
questão central da Moral e da Ética. Enfim, a ética é julgamento
do carácter moral de uma determinada pessoa. Como Doutrina
Filosófica, a Ética é essencialmente especulativa e, a não ser
quanto ao seu método analítico, jamais será normativa,
característica esta, exclusiva do seu objecto de estudo, a Moral.

Portanto, a Ética mostra o que era moralmente aceito na Grécia


Antiga possibilitando uma comparação com o que é moralmente
aceito hoje na Europa, por exemplo, indicando através da
comparação, mudanças no comportamento humano e nas regras
sociais e suas consequências, podendo daí, detectar problemas
e/ou indicar caminhos.

A ética tem sido aplicada na economia, política e ciência política,


conduzindo a muitos distintos e não-relacionados campos de
ética aplicada, incluindo: ética nos negócios e Marxismo.

Também tem sido aplicada à estrutura da família, à sexualidade,


e como a sociedade vê o papel dos indivíduos, conduzindo a
campos da ética muito distintos e não-relacionados, como o
feminismo e a guerra, por exemplo.

A visão descritiva da ética é moderna e, de muitas maneiras, mais


empírica sob a filosofia Grega clássica, especialmente
Aristóteles.

Inicialmente, é necessário definir uma sentença ética, também


conhecido como uma afirmativa normativa. Trata-se de um juízo
positivo ou negativo (em termos morais) de alguma coisa.

Estética

Estética (do grego aisthésis: percepção, sensação) é um ramo da


filosofia que tem por objecto o estudo da natureza do belo e dos
fundamentos da arte. Ela estuda o julgamento e a percepção do
que é considerado belo, a produção das emoções pelos
fenómenos estéticos, bem como as diferentes formas de arte e do
trabalho artístico; a ideia de obra de arte e de criação; a relação
entre matérias e formas nas artes. Por outro lado, a estética
também pode ocupar-se da privação da beleza, ou seja, o que
pode ser considerado feio, ou até mesmo ridículo.

A estética adquiriu autonomia como ciência, destacando-se da


metafísica, lógica e da ética, com a publicação da obra Aesthetica
do educador e filósofo alemão Alexander Gottlieb Baumgarten,
em dois volumes (1750-1758). Baumgarten traz uma nova
abordagem ao estudo da obra de arte, considerando que os
artistas deliberadamente alteram a Natureza, adicionando
elementos de sentimento a realidade percebida. Assim, o
24 Unidade

processo criativo está espelhado na própria actividade artística.


Compreendendo então, de outra forma, o prévio entendimento
grego clássico que entendia a arte principalmente como mimesis
da realidade.

Na antiguidade - especialmente com Platão, Aristóteles e Plotino


- a estética era estudada fundida com a lógica e a ética. O belo, o
bom e o verdadeiro formavam uma unidade com a obra. A
essência do belo seria alcançado identificando-o com o bom,
tendo em conta os valores morais. Na Idade Média surgiu a
intenção de estudar a estética independente de outros ramos
filosóficos.

No âmbito do Belo, dois aspectos fundamentais podem ser


particularmente destacados:

 a estética iniciou-se como teoria que se tornava ciência normativa


às custas da lógica e da moral - os valores humanos fundamentais: o
verdadeiro, o bom, o belo. Centrava em certo tipo de julgamento de valor
que enunciaria as normas gerais do belo;

 a estética assumiu características também de uma metafísica do


belo, que se esforçava para desvendar a fonte original de todas as belezas
sensíveis: reflexo do inteligível na matéria (Platão), manifestação sensível
da ideia (Hegel), o belo natural e o belo arbitrário (humano), etc.

Mas este carácter metafísico e consequentemente dogmático da


estética transformou-se posteriormente em uma filosofia da arte,
onde se procura descobrir as regras da arte na própria acção
criadora (Poética) e em sua recepção, sob o risco de impor
construções a priori sobre o que é o belo. Neste caso, a filosofia
da arte se tornou uma reflexão sobre os procedimentos técnicos
elaborados pelo homem, e sobre as condições sociais que fazem
um certo tipo de acção ser considerada artística.

Para além da obra já referida de Baumgarten - infelizmente não


editada em português - são importantes as obras Hípias Maior, O
Banquete e Fedro, de Platão, a Poética, de Aristóteles, a Crítica
da Faculdade do Juízo, de Kant e Cursos de Estética de Hegel.

Embora os pensadores tenham ponderado a beleza e a arte por


milhares de anos, o assunto da estética não foi totalmente
separado da disciplina filosófica até o século XVIII.

Os filósofos gregos começaram a pensar sobre a estética através


de objetos bonitos e decorativos produzidos em sua cultura.
Platão entendeu que estes objetos incorporavam uma proporção,
harmonia, e união, tentando entender estes critérios.
Semelhantemente, na "metafísica", Aristóteles achou que os
elementos universais de beleza eram a ordem, a simetria, e a
definição. A denominação central para estética é:

Ciência do belo nas produções naturais e artísticas e filosofia do


belo na arte, designação aplicada a partir do século XVIII, por
Baumgarten, à ciência filosófica que compreendeu o estudo das
obras de arte e o conhecimento dos aspectos da realidade
sensorial classificáveis em termos de belo ou feio.
Introdução à Filosofia 25

Teoria do Conhecimento
A teoria do conhecimento interessa-se pela investigação da
natureza, fontes e validade do conhecimento. Entre as questões
principais que ela tenta responder estão as seguintes: O que é o
conhecimento? Como nós o alcançamos? Podemos conseguir
meios para defendê-lo contra o desafio cético? Essas questões
são, implicitamente, tão velhas quanto à filosofia.

Mas, primordialmente na era moderna, a partir do século XVII


em diante - como resultado do trabalho de Descartes (1596-1650)
e Locke (1632-1704) em associação com a emergência da ciência
moderna – é que ela tem ocupado um plano central na filosofia.
Basicamente é conceituada como o estudo de assuntos que outras
ciências não conseguem responder e se divide em quatro partes,
sendo que três delas possuem correntes que tentam explicá-las: O
conhecimento como problema, Origem do Conhecimento e
Essência do Conhecimento Possibilidade do Conhecimento.

Metafísica

Aristóteles é considerado o "pai" da metafísica. Metafísica (do


grego met = depois de, além de; physis = natureza ou físico) é
um ramo da filosofia que estuda a essência do mundo. A saber, é
o estudo do ser ou da realidade. Se ocupa em procurar responder
perguntas tais como:O que é real? O que é natural? O que é
sobrenatural?

O ramo central da metafísica é a ontologia, que investiga em


quais categorias as coisas estão no mundo e quais as relações
dessas coisas entre si. A metafísica tenta, também esclarecer as
noções de como as pessoas entendem o mundo, incluindo a
existência e a natureza do relacionamento entre objectos e suas
propriedades, espaço, tempo, causalidade, e possibilidade.

O sentido da palavra metafísica deve-se a Aristóteles e a


Andrônico de Rodes.

Aristóteles nunca utilizou esta palavra, mas escreveu sobre temas


relacionados à physis e sobre temas relacionados à ética e à
política, entre outros semelhantes. Andrônico, ao organizar os
escritos de Aristóteles, o fez de forma que, espacialmente,
aqueles que tratavam de temas relacionados à physis viessem
antes dos outros. Assim, eles vinham além da física (Meta =
depois, além; Physis = física). Neste sentido, a metafísica é algo
intocável, que só existe no mundo das ideias.

Assim, conscientemente ou não, Andrônico organizou os escritos


de forma análoga à classificação dos dois temas. Ética, política,
etc., são assuntos que não tratam de seres físicos, mas de seres
não físicos existentes apesar da sua imaterialidade.

Em resumo, a Metafísica trata de problemas sobre o propósito e a


origem da existência e dos seres. Especulação em torno dos
primeiros princípios e das causas primeiras do ser. Muitas vezes
ela é vista como parte da Filosofia, outras, se confunde com ela.
26 Unidade

Antropologia filosófica
Antropologia filosófica é a antropologia encarada
metafisicamente; é antes aquela parte da filosofia que investiga a
estrutura essencial do homem; contudo, este ocupa o centro da
especulação filosófica, na medida em que tudo se deduz a partir
dele, na medida em que ele torna acessíveis as realidades, que o
transcendem, nos modos de seu existir relacionados com essas
realidades. Ou seja, a antropologia filosófica é uma antropologia
da essência e não das características humanas. Ela se distingue da
antropologia mítica, poética, teológica, e científico natural ou
evolucionista por dar uma interpretação basicamente ontológica
do homem. É também uma disciplina filosófica ou movimento
filosófico que tem relações com as intenções e os trabalhos de
Scheler, mas não está unido ao conteúdo específico desse autor.

Concentra-se no estudo das estruturas fundamentais do Homem.


Converte-se numa ontologia, na medida em que nos conduz à
questão do significado do “Ser”. O Homem torna-se para si
mesmo o tema de toda a especulação filosófica: interessa estudar
o Homem e estudar tudo o mais apenas em relação a ele. O que é
mais significativo é o conhecimento do Homem, e não o de nós
próprios enquanto individualidade. Estuda, também, o carácter
biopsicológico do Homem, verifica o que o Homem faz com suas
disposições bioquímicas dentro de seu ambiente biológico que
possa diferenciá-lo de outros animais.

Reflexão sobre a vida, a religião e a reflexão filosófica que parte


do principio do cogito. A introspecção se revela como
absolutamente necessária como fundamento e ponto de partida de
qualquer outro recurso de natureza metodológica.

Segundo Groethuysen, ela, de fato, constitui a base da


antropologia filosófica. De acordo com Landsberg, a
antropologia filosófica faz uso dos dados proporcionados pelas
outras formas de antropologia, por exemplo, os fornecidos pela
“antropologia das características humanas”, ou seja, dados
proporcionados pela biologia, pela sociologia, pela psicologia,
pela etnografia, pela arqueologia e pela história, mas interpreta
esses dados à sua maneira, e procura unificá-los numa teoria
abrangente.

O pensamento antropológico filosófico teve início quando o


Homem se sentiu jogado sobre si mesmo e (em oposição ao
idealismo), precisamente sobre a concreticidade pessoal e
histórica de sua vida que antecede e ultrapassa todo e qualquer
conceito. O nome “Antropologia filosófica” é relativamente
recente. Difundiu-se sobretudo a partir dos trabalhos de Scheler,
que considera a antropologia filosófica a ponte estendida entre as
ciências positivas e a metafísica.

Mostrar exactamente como a estrutura fundamental do ser


humano, estendida na forma pela qual a descrevemos brevemente
(espírito; Homem), “explica todos os monopólios, todas as
funções e obras específicas do homem: linguagem, consciência
moral, as ferramentas, as armas, as ideias de justiça e de injustiça,
o Estado, a administração, as funções representativas das artes, o
Introdução à Filosofia 27

mito, a religião e a ciência, a historicidade e a sociabilidade, a


fim de ver se há algo nessas actividades, bem como em seus
resultados, que seja especificamente humano. Seu objectivo é
colocar no centro de sua reflexão a questão: que é o ser humano?
Como problema, ela tem seus primórdios mais fecundos nos
debates de Sócrates e dos Sofistas.

Immanuel Kant definiu a antropologia como a “questão filosófica


por excelência”, uma vez que a filosofia enquanto tal tomaria ao
seu encargo quatro grandes problemáticas: a metafísica, a ética, a
religião e a antropologia, considerando que todas a três primeiras
não seriam senão partes da última, pois todas elas remetem, em
última análise, ao problema do humano.

Reconhecimento de uma grande continuidade entre o reino


animal – em particular dos vertebrados superiores – e o reino
humano, por um lado, e a afirmação de que as instituições
humanas e a fabricação e uso de instrumentos são em princípios
independentes de – no sentido de não ser exigidos por –
necessidades biológicas (com opiniões intermediárias entre esses
extremos, como a de que a institucionalização e a
“instrumentalização” são propriedades ou caracteres emergentes,
que têm uma base biológica, mas não são redutíveis a ela).

Problemas de carácter metafísico e moral: coloca o problema do


Homem no próprio Homem, questiona o lugar ocupado pela
função racional do Homem em comparação com outras funções.
Kant propôs quatro problemas filosóficos: “O que posso
conhecer?” “O que devo fazer?” “A que posso aspirar?” “O que é
o homem?”

Max Scheler (pioneiro): As questões relativas à natureza da


história e a seu sentido emergem da reflexão referente à conduta
humana e ao seu valor moral, à essência espiritual do homem, à
experiência humana da realidade e à evolução do espírito nesta
relação, ao conhecimento e às formas de saber, assim como às
relações do homem com Deus. Seu pensamento está vinculado à
sua concepção da essência espiritual do homem e à sua teoria da
religião.

A produção filosófica de Scheler é dividida em três períodos:

1º Período: pré-fenomenológico: escritos produzidos a partir de


1899 e vai até o ano de 1905.

2º Período: fenomenológico: Obras produzidas de 1906 até 1920,


sendo considerado como primeira fase de maturidade do filósofo.

3º Período: período que vai de 1921 até 1928, ano em que


Scheler faleceu, interrompendo-se, bruscamente, a fase de
maturidade do pensador. Este período inclui uma etapa de
transição, centrada na temática da antropologia e metafísica que,
marca predominantemente o período. A fundamentação da ética,
a conduta moral e a espiritualidade humana constituem o âmbito
em que se move, primordialmente, a reflexão scheleriana dos
dois primeiros períodos.
28 Unidade

No terceiro período, a posição que, nos primeiros períodos do


pensamento do autor, ocupava a religião, passa a ser ocupada
pela metafísica. A "esfera" do ser Absoluto, enquanto integrante
da própria essência do homem, permanece intocada, ainda que
haja mudado sua concepção sobre os actos e sobre os conteúdos
materiais que a compõem, a esfera do ser Absoluto permanece
como constitutiva da própria essência do homem. O
conhecimento metafísico do absoluto deve passar, segundo
Scheler, pela antropologia filosófica, ou seja, pelo conhecimento
essencial do homem, já que não se pode esperar que, partindo do
mundo objectivo, se consiga obter qualquer determinação do
absoluto. A metafísica, enquanto conhecimento da natureza do
ser absoluto a partir da essência do homem, não é cosmologia,
nem metafísica do objecto, é uma metafísica do ato e meta-
antropologia. Somente a partir do homem, enquanto sujeito de
actos, que se torna acessível a verdadeira natureza do princípio de
todas as coisas. O engajamento activo do homem na divindade
possibilita o conhecimento dos dois atributos do fundamento de
todas as coisas: o espírito infinito (de que procede a estrutura
essencial do mundo e do homem) e o impulso irracional (origem
da existência e do ser contingente).

Filosofia e outras Ciências


No seu começo a ciência estava ligada à Filosofia, sendo o
filósofo, o sábio que reflectia sobre todos os sectores da
indagação humana. Nesse sentido os filósofos como Tales,
Pitágoras, eram também geómetras, e Aristóteles escreveu sobre
física e astronomia.

Na ordem do saber estipulada por Platão, o homem começa a


saber pela forma imperfeita da opinião (doxa), depois passa ao
grau mais avançado da ciência (episteme), para só então ser capaz
de atingir o nível mais alto do saber filosófico.

A partir do século XVII, a revolução metodológica iniciada por


Galileu promove a autonomia da ciência e o seu desligamento da
filosofia. Pouco a pouco, desse período até o século XX,
aparecem as chamadas ciências particulares: física, astronomia,
biologia, psicologia, química, psicologia, etc., delimitando um
campo específico de pesquisa.

Na verdade, o que estava a ocorrer era o nascimento da ciência.


Com a fragmentação do saber, cada ciência se ocupa de um
objecto específico: à física cabe investigar os movimentos dos
corpos; à biologia, a natureza dos seres vivos; à química, as
transformações substânciais, e assim por diante. Além da
delimitação do objecto da ciência, se acrescenta o
aperfeiçoamento do método científico, fundado sobretudo na
experimentação e matematização.

Ora, apesar da separação entre a Filosofia e a ciência, aquela não


deixou de ser uma ciência, porque se preocupa a investigar as
causas primeiras e finais de toda a realidade. A filosofia
distingue-se de outras ciências pelas seguintes razões:
Introdução à Filosofia 29

Pela profundidade da investigação: enquanto a ciência procura


as causas próximas imediatas da s coisas, a Filosofia procura as
causas últimas e finais das coisas;

Pela reflexão crítica: enquanto a ciência pressupõe reflexão e


crítica, a Filosofia põe em questão tudo o que se apresenta ao
espírito para examinar, discutir, avaliar e descobrir o seu
significado, inclusive o da própria ciência;

Pelo grau de generalidade e síntese: a ciência limita-se à


realidade dos factos e ocupa-se dos fenómenos, enquanto que a
Filosofia procura dar unidade total ao saber e pretende penetrar
na realidade global;

Pela humanidade e valorização: a ciência ocupa-se em geral, da


realidade estranha ao homem, enquanto que a Filosofia é
essencialmente humana e axiológica, ou seja, ela dá valor à acção
e a existência humana.

Se a ciência tende cada vez mais a especialização, a Filosofia, no


sentido inverso, quer superar a fragmentação do real, para que o
homem seja resgatado na sua integridade e não sucumba à
alienacão do poder parcelado. Por isso a filosofia tem uma função
de interdisciplinaridade, estabelecendo o elo entre as diversas
formas do saber e do agir.

A filosofia ainda se distingue da ciência pelo modo como aborda


seu objecto: em todos os sectores de conhecimento e da acção, a
filosofia está presente como reflexão crítica a respeito dos
fundamentos desse conhecimento e desse agir.

Portanto, a Filosofia não faz juízos da realidade, como a ciência,


mas juízos de valor. O filósofo parte da experiência vivida do
homem trabalhando na linha de montagem, repetindo sempre o
mesmo gesto, e vai além dessa constatação. Não vê apenas como
é, mas como deveria ser. Julga o valor da acção, sai em busca do
significado dela. Filosofar é dar sentido à experiência.

Natureza das questões filosóficas

O homem primitivo limitava-se a aceitar o mundo e a vida tais


como eles eram. Emprestava-lhes uma origem, um processo, uma
finalidade e um significado. Por isso inventa histórias
explicativas, descrições cheias de beleza e fantasia, em que
intervém, quase sempre, forças sobrenaturais.

Estas histórias chamadas mitos, representam o primeiro esforço


para uma leitura sistemática e organizada do universo.
Consistiam sobretudo, em encontrar as origens e evocar o acto
primordial da criação, fundamentalmente de todo o real.

A palavra mito vem do grego, mythos, e deriva de dois verbos: do


verbo mytheyo (contar, narrar, falar alguma coisa para outros), e
do verbo mytheo (conversar, contar, anunciar, nomear, designar).
Para os gregos, mito é um discurso pronunciado ou proferido
para os ouvintes que recebem como verdadeira a narrativa,
porque confiam naquele que narra; é uma narrativa feita em
30 Unidade

público, baseada na autoridade e confiabilidade da pessoa do


narrador. E essa autoridade vem do facto de que ele ou
testemunhou directamente o que está a narrar ou recebeu a
narrativa de quem testemunhou os acontecimentos narrados.

No estudo das origens do conhecimento filosófico não se pode


pensar em se encontrar logo as ideias claras, precisas, distintas e
bem definidas. Todas imagens primitivas do mundo nos
aparecem envolvidas numa atmosfera mística e mágica; o
pensamento em que se esboça a explicação do universo parece
mais próxima do plano dos nossos sonhos do que do plano da
realidade.

Esta atitude, que atribui a ordem do universo a entidades


sobrenaturais, funda-se em práticas mágicas em ritos de cultos
ancestrais. Liga-se com a religião. Mergulha no espanto perante o
mistério, no terror do desconhecido, na incerteza do destino e na
procura do inteligível.

Partindo do comportamento religioso, o mito apresenta-se como


apresentação anónima e colectiva, forjada pela imaginação, mas
contendo já, germes de racionalidade. Não se preocupa com a
totalidade do real; repara nas forças naturais mais perigosas, na
sucessão cíclica dos fenómenos e nas relações mais vulgares e
constantes.

Os mitos revelam tudo o que se passou, desde a cosmografia até a


fundação das instituições sócio-culturais. Estas revelações não
constituem um conhecimento no sentido restrito do termo; não
esgotam o mistério das realidades cósmicas e humanas.

Todas as imagens primitivas do mundo nos aprecem envolvidas


numa atmosfera mística e mágica; o pensamento em que se
esboça a explicação do universo parece mais próxima do plano
dos nossos sonhos do que do plano da realidade.

Este carácter que nos parece irreal, esconde, todavia, uma


profunda e enérgica actividade da imaginação humana, dá-nos a
impressão de que ao longo desses séculos de sonho procurou-se
laboriosamente uma passagem do confuso para o definido, quer
dizer, isola-se certos elementos da original confusão, volta-se a
associá-los novamente, para obter assim uma imagem
ligeiramente mais perfeita, mais consciente e mais voluntária.

Assim nasceram durante milénios, e até o século VI a. C., os


mitos que traduzem por imagens fabulosas todos os
acontecimentos e experiências que impressionaram a alma dos
homens primitivos. A criação do Homem, por exemplo, servia
para descrever a sucessão dos deuses ou dos mundos em
conformidade com as tradições religiosas. Foram essas as
primeiras tentativas de formulação da Ciência e da Filosofia.
Introdução à Filosofia 31

Exercícios

1 – Qual deve ser a atitude de um filosofo segundo Platão?

Resposta: A atitude de um filosofo para Platão e a admiração,


pois ela e a condição de onde deriva a condição a capacidade de
Auto-avaliação problematizar tudo o que marca a filosofia como a busca da
verdade.
32 Unidade

Unidade N0 03-A0010

Tema: Breve contextualização


histórica da Filosofia

Introdução
Os primeiros filósofos da humanidade foram os gregos. Isso
significa que, embora tenhamos referências de grandes homens
na China (Confúcio, Lao Tsé), na Índia (Buda), na Pérsia
(Zaratustra), suas teorias ainda estão por demais vinculadas à
religião para que se possa falar propriamente em reflexão
filosófica.

Neste tema veremos o processo pelo qual se tornou possível a


passagem da consciência mítica para a consciência filosófica na
civilização grega, constituída por diversas regiões politicamente
autónomas.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Compreender a passagem da Filosofia da fase mítica para a fase


racional.

 As condições que levaram o surgimento da Filosofia.


Objectivos
 As fases ou etapas da Filosofia Clássica.

Sumário
No período arcaíco surgiram os primeiros filósofos gregos, por
volta de fins do século VII a. C e durante o século VI a.C. alguns
autores costumam chamar de “milagre grego” a passagem do
pensamento mítico para o pensamento crítico racional e
filosófico.

O surgimento da racionalidade crítica foi o resultado de um


processo lento, preparado pelo passado mítico, cuja
características não desapareceram na nova abordagem filosófica
do mundo, ou seja, o surgimento da filosofia na Grécia não é o
resultado de um salto, um “milagre”, realizado por um povo
privilegiado, mas a culminação de um processo que se fez através
dos tempos e tem sua dívida com o passado mítico.
Introdução à Filosofia 33

Algumas novidades surgidas no período arcaíco ajudaram a


transformar a visão que o homem mítico tinha do mundo e de si
mesmo. São elas: a invenção da escrita, o surgimento da moeda,
a lei escrita, o nascimento da polis (cidade-estado), todas elas
contribuiram para o surgimento da filosofia.

As Epopeias

Os mitos gregos eram recolhidos pela tradição e transmitidos


oralmente pelos aedos e rapsodos. Era dificil conhecer os autores
de tais trabalhos de formalização, porque num mundo em que
predomina a consciencia mítica não existe a preocupação com a
autoria da obra, já que o anonimato é a consequência do
colectivismo, fase em que ainda não se destaca a individualidade.
Além disso, não havia escrita para fixar o autor e a obra.

Por esse motivo há controvérsia à respeito da época em que teria


vivido Homero, um desses poetas, e até se ele realmente teria
existido. É costume atribuir-lhe a autoria de dois poemas: Ilíada,
que trata da guerra de Tróia, e Odisséia, que relata o retorno de
Ulisses a Ítaca, após a guerra de Tróia.

As epopéias tiveram uma função didáctica muito importante na


vida dos gregos porque descrevem o periodo da civilização
micênica e transmitem os valores da cultura por meio das
histórias dos deuses e antepassados, expressando uma
determinada concepção de vida. Por isso desde cedo as crianças
decoravam passagens dos poemas de Homero.

As acções heróicas relatadas nas epopéias mostram a constante


intervenção dos deuses, ora para auxiliar um protegido seu, ora
para perseguir um inimigo. O homem homérico é presa do
Destino (Moira), que é fixo, imutável e não pode ser alterado. O
herói vive na dependência dos deuses e do destino, faltando a ele
a nossa noção de vontade pessoal, de livre-arbítrio. Mas isso não
o diminui diante dos homens comuns. Ao contrário, ter sido
escolhido pelos deuses é sinal de valor e em nada tal ajuda
desmerece a sua virtude.

A virtude do herói se manifesta pela coragem e pela força,


sobretudo no campo de batalha, na assembléia, no discurso e no
poder de persuassão. Assim, a noção de virtude não deve ser
confundida com o conceito moral de virtude, mas como
excelência, superioridade, alvo supremo do herói. Trata-se de
virtude do guerreiro belo e bom.

A Teogonia

Hesíodo, outro poeta que teria vivido no final do século VIII e


príncipio do século VII a. C., produz uma obra com
características que apontam para a época que se vai iniciar a
34 Unidade

seguir, com particularidades que tendem a superar a poesia


impessoal e colectiva das epopéias.

A palavra Teogonia vem do grego: teo, que significa Deus;


gonia, que significa: origem; a teogonia reflecte sobre a
preocupação com a crença dos mitos. Nela Hesíodo relata as
origens do mundo e dos deuses, e as forças que surgem não são a
pura natureza, mas sim as próprias divindades: Gaia é a Terra,
Urano é o Céu, Cronos é o Tempo, surgindo ora por segregação,
ora pela intervenção de Eros, princípio que aproxima os opostos.

Etapas da Filosofia Grega Clássica

No decorrer dos séculos, a Filosofia teve um conjunto de


preocupações, perguntas e interesses que lhe vieram de
nascimento na Grécia. Para isso, devemos primeiro conhecer os
principais períodos da Filosofia grega que definiram os campos
de investigação filosófica na Antiguidade. A história da Grécia
costuma ser dividida pelos historiadores em quatro fases ou
épocas:
a) a da Grécia Homérica, correspondente aos 400 anos narrados pelo
poeta Homero, em seus dois grandes poemas, Ilíada e Odisséia;

b) a da Grécia arcaica ou dos sete sábios, do século VII ao século V a.


C, quando os gregos criam cidades como Atenas, Esparta, Tebas, Mégara,
Samos, etc., e predomina a economia urbana, baseada no artesanato e no
comércio;

c) a da Grécia clássica, nos séculos V e IV a. C, quando a democracia


se desenvolve, a vida intelectual e artística no apogeu e Atenas domina a
Grécia com seu império comercial e militar;

d) a helenística, a partir do final do século IV a. C., quando a Grécia


passa para o poderio do império de Alexandre da Macedônia e, depois,
para as mãos do Império Romano, terminando a história de existência
independente.
Os períodos da filosofia não correspondem exactamente a essas
épocas, já que ela não existe na Grécia Homérica, e só aparece
nos meados da Grécia arcaíca. O apogeu da Filosofia acontece
durante o apogeu da cultura e da sociedade gregas; portanto,
durante a Grécia clássica. Os quatro grandes perodos da Filosofia
grega, nos quais seu conteúdo muda e se enriquece são:

Período pré-socrático ou cosmológico, do final do século VII


ao final do século V a. C., quando a Filosofia se ocupa
fundamentalmente com a origem do mundo e as causas das
transformações na Natureza.

Período socrático ou antropológico, do final do século V e todo


o século IV a. C., quando a Filosofia investiga as questões
humanas, isto é, a ética, a política e as técnicas ( em grego,
antropos quer dizer homem; por isso o período recebeu o nome
de antropológico).
Introdução à Filosofia 35

Período sistemático, do final do século IV ao final do século III .


C., quando a Filosofia busca reunir e sistematizar tudo quanto foi
pensado sobre a cosmologia e a antropologia, interessando-se
sobretudo em mostrar que tudo pode ser objecto de conhecimento
filosófico, desde que as leis do pensamento e de suas
demonstrações estejam firmemente estabelecidas para oferecer os
critérios da verdade e da Ciência.

Período helenístico ou greco-romano, do final do século III a.


C. até o século VI depois de Cristo. Nesse longo período, que já
alcança Roma e o pensamento dos Padres da Igreja, a Filosofia se
ocupa sobretudo com as questões da ética, do conhecimento
humano e das relações entre o homem e a Natureza e de ambos
com Deus.

Exercícios
1 – Como foi feita a passagem da concepção mítica para a
racionalidade?

Resposta: Foi o resultado de um processo lento, cuja


características não desapareceram na nova abordagem filosófica
do mundo, ou seja, a passagem da concepção mítica para a
Auto-avaliação racionalidade não é o resultado de um salto, um “milagre”,
realizado por um povo privilegiado, mas a culminação de um
processo que se fez através dos tempos e tem sua dívida com o
passado mítico.
36 Unidade

Unidade N0 04-A0010

Tema: A Pessoa Humana

Introdução
Costuma-se dar um nome compreensível à singularidade do ser
humano: diz-se que o Homem, ao contrário das outras coisas que
o circundam, é uma pessoa. Muitos filósofos fizeram da pessoa o
epicentro de suas reflexões, dando origem à uma visão filosófica
que recebeu o nome de personalismo. O problema da pessoa é
estudado pelos psicólogos, psicanalistas, educadores políticos e
jurístas.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Explicar o conceito de Pessoas de acordo com vários filósofos.

 Compreender a relação da pessoa com Deus, consigo mesmo, com o


mundo e com o trabalho.
Objectivos

Sumário
Os estudiosos estão de acordo em reconhecer que o conceito de
pessoa é estranho à Filosofia grega. Com efeito, o conceito de
pessoa, acentua a singularidade, a individualidade, o concreto,
enquanto que a filosofia grega dá importância só ao universal, ao
ideal e ao abstracto. O singular, o individuo, o concreto, para o
pensamento grego tem valor provisório, como momentânea
fenomenização da espécie universal, ou então como instante
transitório do grande ciclo, que tudo compreende da história.

Uma memorável de definição da pessoa, a mais célebre de todas,


muito completa e precisa do ponto de vista ontológico deixou-nos
Severino Boécio e diz o seguinte: “Pessoa é uma substância
individual de natureza racional”.

Para S. Tomás de Aquino: “Pessoa significa o que de mais


nobre há no universo, isto é, o subsistente de uma natureza
racional”.
Introdução à Filosofia 37

Para Kant, “os seres humanos são chamados pessoas porque a


sua natureza os distingue já como fins em si…o homem e em
geral cada ser racional, existe como fim em si e não como um
meio de que esta ou aquela vontade pode servir-se ao seu bel-
prazer”.

Paul Ricoeur concebe a pessoa como um projecto da


humanidade, a qual por sua vez é assim definida: “a humanidade
é o modo de ser sobre a qual deve regular-se cada aparição
empírica do que nós chamamos de ser humano”.

Para Scheler, “a pessoa é antes a unidade, imediatamente vivida


pelo vivente espiritual e não uma coisa pensada atrás e fora do
imediatamente vivido”. A pessoa é a unidade essencial concreta
do ser de actos de essências diferentes, que em si mesma precede
todas as diferenças de actos.

Romano Guardini elaborou um conceito de pessoa em que são


fundidos habilmente os elementos mais característicos da
concepção clássica e da moderna: a substancialidade,
individualidade, a incomunicabilidade e a autoconsciência. A sua
definição diz: “A pessoa é a forma da individualidade enquanto
é determinada pelo espírito”.

Assim, a pessoa significa que eu, no meu ser, em definitivo não


posso ser possuido por nenhuma outra instância, mas que me
pertenço; pessoa significa, que eu não posso ser habitado por
nenhum outro, mas que, em relação à mim, estou só comigo
mesmo; não posso ser representado por nenhum outro, mas eu
respondo por mim mesmo; não posso ser substituído por nenhum
outro, mas sou único.

A interioridade da vida, o saber, o querer, o agir, o criar do


espírito, etc., tudo isso não é ainda pessoa; pessoa significa que
tudo isso, o Homem está em si mesmo.

O fundamento último da personalidade é dado à seu juízo, pela


autonomia no ser por parte de uma realidade racional, ou seja,
pela posse de um próprio acto de ser: graças à tal posse, a
realidade humana torna-se completa em si mesma, e não pode
mais ser comunicada e associada a outros. Quando um acto de
ser, próprio e proporcionado a uma certa essência particular ou
substância individual intelectiva, a faz existir por si e em si, por
isso mesmo é incomunicada e incomunicável, é pessoa.

A pessoa quer dizer antes de tudo, autonomia de ser, domínio de


si mesmo, inviolabilidade, individualidade, incomunicabilidade,
unidade. O homem é pessoa porque é dotado de um modo de ser
que supera nitidamente o modo de ser das plantas e dos animais.

A Pessoa em suas relações


38 Unidade

Soren Kierkegaard (1813 – 1855), é um dos filósofos que


procurou analisar os problemas da relação existencial do homem
com o mundo, consigo mesmo e com Deus.

A relação do homem com o mundo - outros seres humanos e na


natureza - são dominadas pela angústia. A angústia é entendida
como o sentimento profundo que temos ao perceber a
instabilidade de viver num mundo de acontecimentos possíveis,
sem garantia de que nossas expectativas sejam realizadas. “No
possível, tudo é, possível”, escreve Kierkegaard. Assim, vivemos
num mundo onde tanto é possível a dor como o prazer, o bem
como o mal, o amor como o ódio, o favorável como o
desfavorável.

A relação do homem consigo mesmo é marcada pela inquietação


e pelo desespero. Isso acontece por duas razões: ou porque o
homem nunca está plenamente satisfeito com as possibilidades
que realizou, ou porque não conseguiu realizar o que pretendia,
esgotando os limites do possível e fracassando diante de suas
expectativas.

A relação do homem com Deus seria talvez a única via para a


superação da angústia e do desespero. Contudo, é marcado pelo
paradoxo de ter de compreender pela fé o que é incompreensível
pela razão.

O trabalho

O termo trabalho vem do latim tripalium, que significa um


instrumento de tortura feito de três paus.

O trabalho é toda actividade no qual o ser humano utiliza sua


energia física e psíquica para satisfazer suas necessidades ou para
atingir um determinado fim.

Por intermédio do trabalho, o homem acrescenta um “mundo


novo” ( a cultura) ao mundo natural já existente.

O trabalho é, portanto, elemento essencial da relação dialéctica


entre o homem e a natureza, entre o saber e o fazer, entre a teoria
e a prática.

Nesse sentido, o trabalho é uma actividade tipicamente humana,


porque implica a existência de um projecto mental que determina
a conduta a ser desenvolvida para se alcançar um objectivo
almejado. Pelo trabalho, o homem é capaz de expandir suas
energias, desenvolver sua criatividade e realizar suas
potencialidades; pelo trabalho o ser humano é capaz de moldar a
natureza e, ao mesmo tempo, transformar a si próprio. Ou seja,
trabalhando podemos transformar o mundo e a nós mesmos.

Em seu aspecto social, isto é, como esforço conjunto dos


membros de uma comunidade, o trabalho teria como objectivos
últimos a manutenção da vida e o desenvolvimento da sociedade.
Introdução à Filosofia 39

Assim dentro da visão positiva, o trabalho poderia promover a


realização do indivíduo, a edificação da cultura e a solidariedade
entre os homens.

Exercícios
1 – Qual a relação da pessoa com o mundo na perspectiva de Soren
Kierkegaard?

Resposta: Para Kiergaard, a relação do homem com o mundo -


outros seres humanos e na natureza - são dominadas pela angústia.
A angústia é entendida como o sentimento profundo que temos ao
Auto-avaliação perceber a instabilidade de viver num mundo de acontecimentos
possíveis, sem garantia de que nossas expectativas sejam realizadas.
40 Unidade

Unidade N0 05-A0010

Tema: A consciência moral

Introdução
O homem é o único animal consciente de suas acções. A
consciência é o conhecimento que acompanha as nossas
vivências; é um conhecimento (das coisas e de si) e um
conhecimento desse conhecimento (reflexão).

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Explicar o conceito de consciência moral em diferentes perspectivas.


Objectivos  Interpretar as etapas do desenvolvimento da consciência moral.

 Identificar os graus da consciência moral.

 Diferenciar a ética da moral.

Sumário
A consciência pode ser definida na perspectiva psicológica, ético
e moral, política e na da teoria de conhecimento.

Na perspectiva psicológica, a consciência é um sentimento de


nossa própria identidade: é o eu, um fluxo temporal de estados
corporais e mentais, que retém o passado na memória, percebe o
presente pela atenção e espera o futuro pela imaginação e pelo
pensamento. O eu é o centro ou a unidade de todos esses estados
psíquicos. A consciência psicológica é formada por nossas
vivências.

Na perspectiva ético e moral, a consciência é a espontaneidade


livre e racional, para escolher, deliberar, e agir conforme à
liberdade aos direitos alheios e deveres. É a pessoa dotada de
vontade livre e de responsabilidade. É a capacidade para
compreender e interpretar sua situação e condição (física, mental,
social, cultural, histórica), viver na companhia dos outros
segundo as normas e os valores morais definidos por sua
sociedade, agir tendo em vista fins escolhidos por deliberação e
decisão, realizar as virtudes e, quando necessário, contrapôr-se e
Introdução à Filosofia 41

opôr-se aos valores estabelecidos em nome de outros,


considerados mais adequados à liberdade e à responsabilidade.

Do perspectiva política, a consciência é o cidadão, isto é, tanto o


indivíduo situado no tecido das relações sociais, como portador
de direitos e deveres, relacionando-se com a esfera pública de
poder e das leis, quando o membro de uma classe social, definido
por sua situação e posição nessa classe, portador e defensor de
interesses específicos de seu grupo ou de sua classe,
relacionando-se com a esfera pública do poder e das leis.

Na perspectiva da teoria de conhecimento, a consciência é uma


actividade sensível e intelectual dotada de poder de análise,
síntese e representação. É o sujeito, que se reconhece como
diferente dos objectos, cria e descobre significações, institui
sentidos, elabora conceitos, idéias, juízos e teorias. É dotado de
capacidade de conhecer à si mesmo no acto de conhecimento, ou
seja, é capaz de reflexão. É saber de si e saber sobre o mundo,
manifestando-se como sujeito percebedor, imaginante,
memorioso, falante e pensante.

A consciência moral (pessoa) e a consciência política (o cidadão)


formam-se pelas relações entre as vivências do eu e os valores e
as instituições de sua sociedade ou de sociedade ou de sua
cultura. São as maneiras pelas quais nos relacionamos com os
outros por meio de comportamentos e práticas determinadas
pelos códigos morais (que definem deveres, obrigações,
virtudes), e políticos (que definem direitos, deveres e instituições
colectivas públicas), a partir de modo como uma cultura e uma
sociedade determinadas definem o bem e o mal, o justo e o
injusto, o legítimo e o ilegítimo, o legal e o ilegal, o privado e o
público. O eu é uma vivência e uma experiência que se realiza
por comportamentos; a pessoa e o cidadão são consciência como
agente (moral e político), como práxis.

Em sua essência, a consciência é um vazio, um nada, um silêncio


que nos possibilita sentir e escutar, reflectir e querer. Nela
ouvimos a voz do nosso ser. Na vida familiar, a consciência é
considerada apenas uma vivência.

Platão definiu a consciência como o “diálogo da alma consigo


mesma”. A alma interroga a si mesma sobre que relação e
compromisso tem ela com essa outra realidade, que se dá a
conhecer no íntimo diálogo consigo mesma.

Graus da consciência
Distinguem-se três graus da consciência:
1. Consciência passiva: aquela na qual temos uma vaga e uma confusa
percepção de nós mesmos e do que se passa à nossa volta, como no
devaneio, no momento que precede o sono ou o despertar, na anestesia, e
sobretudo, quando somos muito criança ou muito idosos.

2. Consciência vivida, mas não reflexiva: é nossa consciência afectiva,


que tem a peculiaridade de ser egocêntrica, isto é, de perceber os outros e
42 Unidade

as coisas apenas a partir de nossos sentimentos com relação à elas, como


por exemplo, a criança que bate numa mesa ao tropeçar nela, julgando
que a “mesa faz de propósito para machucá-lo”. Nesse grau de
consciência não conseguimos superar o eu e o outro, o eu e as coisas. É
típico por exemplo, das pessoas apaixonadas, para as quais o mundo
existe a partir de seus sentimentos de amor, ódio, cólera, alegria, tristeza,
etc.

3. Consciência activa e reflexiva: aquela que reconhece a diferença


entre interior e o exterior, entre si e os outros, entre si e as coisas. Esse
grau de consciência é o que permite a existência da consciência em suas
quatro modalidades, que são: o eu, a pessoa, o cidadão e o sujeito.

Ética e moral
A palavra ética vem do grego, ethos, que significa costume. É a
ciência que tem por objecto o fim da vida humana e os meios
para alcançá-los. Historicamente, a palavra ética foi aplicada à
moral sob todas as suas formas, quer como ciência do
comportamento efectivo dos homens, quer como arte de guiar o
comportamento. Propriamente a ética deveria ocupar-se do bem
como valor primário e ser assumido pela liberdade como guia das
próprias escolhas.

A palavra moral vem do latim, mores, que significa hábitos.


Ética e moral, possuem com efeito, acepções muito próximas
uma da outra; se o termo ética é de origem grega, e a moral, de
origem latina, ambos remetem a conteúdos vizinhos, à ideia de
costumes, de hábitos, de modos de agir determinados pelo uso.

Portanto, a grande distinção entre ética e moral está no facto de


que a primeira é mais teórica, pretende-se mais voltada à uma
reflexão sobre os fundamentos que esta última. A ética se esforça
por desconstruir as regras de conduta que forma a moral, os
juízos do bem e do mal que se reúnem no seio desta última.

A ética desígna uma “metamoral”, uma doutrina que se situa


além da moral, uma teoria raciocinada sobre o bem e o mal, os
valores e os juízos morais.

Em suma, a ética desconstrói as regras de conduta, desfaz suas


estruturas e desmonta sua edificação, para se esforçar em descer
até os fundamentos ocultos da obrigação. Diversamente da moral,
ela se pretende pois desconstrutora e fundadora, enunciadora dos
prícipios ou de fundamentos últimos.
Introdução à Filosofia 43

Exercícios

1 – O que é a consciência na perspectiva Platónica?

Resposta: Para Platão, a consciência é o diálogo da alma consigo


mesma. A alma interroga a si mesma sobre que relação e
compromisso ela tem com a outra realidade, que se dá a
conhecer no íntimo diálogo consigo mesma.
Auto-avaliação
44 Unidade

Unidade N0 06-A0010

Tema: Aspectos da ética


individual

Introdução
A pessoa humana em sua acção exige-se que seja responsável e
livre de todas as suas escolhas e opções. Ao ser acusado e julgado
pelo que assume de forma livre e responsável, exige-se que seja
feita a justiça e sejam tomadas as sansões.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer os elementos da ética individual para uma boa convivência


na sociedade.

 Diferenciar cada um desses elementos da ética individual.


Objectivos

Sumário
A palavra liberdade, etimologicamente significa: isenção de
qualquer coação ou negação de determinação para uma coisa.
Pode-se entender como a faculdade de fazer ou deixar de fazer
alguma coisa. Ela tem sido entendida como a possibilidade de
autodeterminação e de escolha, acto voluntário, espontaneidade,
indeterminação, ausência de interferências, libertação de
impedimentos, realização de necessidades, direcção prática para
uma meta , ideal de maturidade, autonomia sapiencial ética, razão
de ser da própria moralidade.

A liberdade pode ser definida em dois sentidos imediatos: no


nosso cotidiano e na linguagem filosófica.

No nosso cotidiano, invocamos constantemente a palavra


liberdade para reivindicar liberdade de opinião, de reunião, de
livre circulação, considerando-se nesse sentido comum, a
liberdade como ausência de constrangimentos externos;
Introdução à Filosofia 45

Na linguagem filosófica, referimo-nos à liberdade em termos


absolutos e, neste sentido, à um poder de agir independentemente
de quaisquer obstâculos ou determinismos. Ora, as escolhas do
ser humano exercem-se num campo onde há tendências e
limitações de vária ordem (biológica, psicológica e sociológica),
e apesar disso são livres porque conseguem superar
racionalmente esses obstâculos que acabam por se transformar
em força impulsionadora.

No âmbito da acção humana, podemos distinguir a liberdade em:


liberdade jurídico-política e liberdade moral.

A liberdade jurídico-política é a possibilidade de agir no quadro


das leis estabelecidas pela sociedade que definem o conjunto dos
direitos de deveres e a responsabilidade civil. Esta forma de
liberdade, pressupõe logicamente a existência de certas condições
e relaciona-se directamente com a existência das leis que, por um
lado, limitam a acção do individuo, mas por outro, garantem.
Este sentido de liberdade realiza-se no interior de uma
comunidade ou Estado no qual os individuos, embora se
submetam às leis estabelecidas mediante convenção ou acordo
social, vêm asseguradas as chamadas liberdades concretas ou
liberdades reais.

A liberdade moral: manifesta-se na adesão a valores e implica a


orientação da conduta pela razão, estabelecendo a consciente,
intencional e voluntariamente metas para a própria existência. É
esta liberdade de escolha que faz do Homem, um ser autônomo,
possuidor de uma dignidade e originalidade ontológica, isto é, um
ser que se auto-constrói, uma invensão de si por si. É por causa
desta autodeterminação que o ser humano é o único responsável
pelos seus actos. Somente um ser livre, consequentemente,
dotado de possibilidade de optar e de decidir acerca dos valores a
que quer aderir e das acções que quer concretizar, pode assumir
compromissos de responder ou prestar contas pelos próprios
actos e pelos seus efeitos, aceitando as suas consequências, isto é,
a sua responsabilidade.

Responsabilidade
A palavra responsabilidade, deriva etimologicamente do latim
respondere, que significa responder pelos próprios actos e ter a
obrigação de prestar contas pelos actos praticados perante a nossa
consciência e perante outras pessoas e a sociedade.

A pessoa é moralmente responsável quando age livremente, isto


é, na ausência de qualquer forma de constrangimento; quando se
está plenamente consciente das intenções e das consequências de
nossa acção, e quando, estando consciente da intenção, da acção
e do seu efeito, se quer a sua realização.

A responsabilidade pode assumir diferentes formas, que são:

Responsabilidade civil: refere-se ao compromisso de ter de


responder perante a autoridade social e a lei jurídica pelas
46 Unidade

consequências e implicações de nossos actos em relação à


terceiros;

Responsabilidade moral: refere-se à obrigação de responder


perante nós mesmos, perante a nossa consciência, pela intenção
dos nossos actos.

Mérito
O mérito é definido como sendo a aquisição de valores, em
consequência do bem que se pratica. O seu oposto é o demérito,
que é a perda de valor, em virtude dos factos cometidos. O mérito
depende (em absoluto) do valor do próprio acto, e também (em
relactivo) das condições em que o acto foi realizado,
especialmente de dificuldade e de intenção. Por exemplo: um rico
que, ao encontrar um mendigo, lhe dá a quantia duzentos mil
meticais para ganhar a simpatia das pessoas em redor é menos
meritório que um pobre que despende o valor de cinco mil
meticais, mas que o faz por verdadeira solidariedade.

A sanção
A sanção é o prêmio ou o castigo inflingido pelo cumprimento
ou violação da lei. Sancionar um acto é sublinhar o seu valor,
quer reconhecendo-o como bom, por meio de elogios e
recompensas, quer tomando-o como mau, através de sensuras e
castigos. A sanção não é somente castigo como muitos entendem,
mas também um prémio. As sanções dividem-se em terrenas e
sobrenaturais.

As sanções sobrenaturais compreendem à:

Sanções de consciências: são assim considerados certos


sentimentos, com os quais nos sentimos elevados (satisfação, paz
interior) ou deprimidos (inquietação, remorso), consoante os
nossos actos são bons ou maus.

Sanções de opinião pública: sanciona as acções humana quer


quando louva os bons, ou quando reprova os maus.

Sanções naturais: são as consequências que resultam para nós da


vida que levamos. Os actos morais traduzem-se, geralmente, em
decadência pessoal (intelectual e física) ao passo que a saúde
pode ser o fruto de uma vida moral pura.

Sanções civis: são as que a sociedade aplica, por órgão


apropriados, aos que transgridem leis e regulamentos.

Sanções sobrenaturais: estão relacionadas com as religiões, e em


todos os tempos, e incluem a crença (explícita ou implícita) num
juízo final como recompensa última dos bons e castigo dos maus.

Esta noção de sanções sobrenaturais corresponde a um objectivo


moral positivo: evitar que, perante as insuficiências inevitáveis
(em erros e omissões) das crenças terrenas, o homem possa
Introdução à Filosofia 47

cultivar a ideia moralmente corrupta, de que pode haver crime


sem castigo ou pode haver virtude sem esperança de recompensa.

O dever
O dever pode ser entendido como um imperativo, isto é, como
uma ordem a que o indivíduo se terá de submeter e que assume
duas dimensões, que são as seguintes:

Dimensão subjectiva: que traduz o sentimento de respeito devido


à lei imposta pela consciência moral;

Dimensão objectiva: que traduz uma obrigação de submissão e


acatamento dessa lei.

Assim, podemos concluir que a consciência moral é uma


instância dinâmica na qual se interrelacionam factores de diversa
ordem, como:

Individuais: na qual o indivduo interioriza e assimila regras


sociais, mas selecciona e escolhe, isto é, apenas assume como
suas aquelas que ele próprio valorizou;

Sociais: em que a vivência em sociedade impõe um conjunto de


deveres necessários para o funcionamento harmonioso da
comunidade. É por isso que as acções morais implicando as
relações interindividuais tem repercussão ao nível colectivo;

Racionais: em que a função judicativa da consciência traduz-se


em juízos de valor e raciocínios acerca das razões a favor ou
contra a tomada de determinadas decisões;

Afectivos: em que na apreciação dos actos intervêm sentimentos


de simpatia ou indiferença em relação ao objecto da acção; a
realização dos actos é seguida de sentimentos de satisfação ou de
remorso, conforme praticamos acções consideradas boas ou más.

A Justiça
As palavras hebraicas bíblicas que significam justiça (tzedek,
tzedaká, mishpat) possuem muitas tonalidades de sentido (justiça,
rectidão, bom comportamento, lealdade, integridade, etc). A
palavra tzedaká veio a significar também bondade e, daí,
caridade, sendo não raro discutível, por isso, a acepção em que os
vários contextos bíblicos aplicam tais termos.

Por justiça tem-se geralmente entendido a vontade firme e


constante de reconhecer e atribuir o que é devido aos outros.
Trata-se de uma virtude cardeal, a par da prudência, da fortaleza
e da temperança. E trata-se também de um ideal, situado no plano
axiológico dos padrões que iluminam o espírito dos homens e
dão sentido à vida na tradição clássica, a justiça acaba por
confundir-se com o direito. Assim, a palavra grega “dikaion”
tanto exprime a idéia de direito como a de justo, ou a de justiça.
48 Unidade

A justiça é comumente dividida em retributiva e distributiva.

Justiça distributiva: aquela parte da justiça que se preocupa com


a justa distribuição de benefícios e sofrimentos dentro de uma
sociedade. Na medicina (“quem recebe o que por quê”) que
afectam toda a sociedade, bem como as questões de
racionamento, que afectam paciêntes em particular ou grupos de
pacientes em particular.

Justiça retributiva: parte da teoria da justiça que considera a


punição sob as bases do mero merecimento em vez de sob as
bases de detenção ou reabilitação, baseada na ideia da
compensação por um dano; baseada na ideia de “olho por olho,
dente por dente”.

John Rawls em sua obra Teoria da Justiça (1971), apresenta dois


princípios de justiça:

O primeiro princípio exige a igualdade das distribuições dos


direitos e dos deveres básicos. Cada pessoa, diz-nos Rawls, tem
um direito igual ao conjunto mais extenso de liberdades
fundamentais, iguais para todos.

O segundo princípio põe que as desigualdades sócio-econômicas


são justas se produzem, em compensação, vantagens para cada
um, se beneficiam os indivíduos menos favorecidos. Não há
nenhuma injustiça em um pequeno número obter vantagens
superiores à média, sob a condição de que seja melhorada a
situação dos desfavorecidos.

Uma sociedade justa, de acordo com a nossa concepção, seria


aquela onde as pessoas pudessem melhorar suas posições por
meio de trabalho ( com oportunidades de trabalho disponíveis
para todos), mas elas não aproveitariam posições superiores
simplesmente porque nasceram com sorte.

Exercícios

1 – Destaque os elementos da ética social.

Resposta: Liberdade, responsabilidade, mérito, sansão, dever,


justiça.
Auto-avaliação
Introdução à Filosofia 49

Unidade N0 07-A0010

Tema: Acção Humana

Introdução
No contexto de uma Filosofia da Acção, o que se pretende é
analisar a praxis humana, isto é, o modo como o ser humano
actua enquanto tal, o que faz a diferença e a especificidade do seu
comportamento.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Diferenciar as palavras fazer e agir.

 Explicar os condicionantes da acção humana.


Objectivos

Sumário
Aristóteles, na ética e na Política, distinguia entre o fazer ou
produzir (poiein) e o agir (praxein). Segundo ele:

No fazer, a acção tem como finalidade dominar e organizar uma


matéria exterior – produção técnica ou actividade centrada no
objecto;

No agir, a acção não tem como principal finalidade transformar


uma matéria exterior, mas transformar o próprio agente, pois agir
remete uma actividade centrada no sujeito ou no agente da acção.

Apesar da diferença, o termo fazer continua ainda hoje a ser


usado no domínio da actividade moral como sinónimo de agir,
sendo por isso, que na linguagem cotidiana, se diz
indiferentemente “fez bem” ou “agiu bem”.

Contudo, para designar a actividade técnica, usamos o termo


fazer e não dizemos que alguém “agiu uma casa ou um quadro
ou um objecto de barro”. Nesse âmbito mantemo-nos à tradição
aristotélica.
50 Unidade

Agir é, pois, o termo usado para traduzir um determinado tipo de


comportamento (intencional, consciente) e remete para uma rede
de conceitos que aparecem interligados: agente, intenção e
motivo.

A acção reflecte um projecto, isto é, uma intenção do agente;


supõe uma vontade, um querer e uma possibilidade de optar, isto
é, de poder fazer ou poder não fazer algo; implica uma
explicação ou justificação – um motivo ou razão de …

Condicionantes da acção humana

Contrariamente aos animais, sujeitos a um determinismo que os


faz comportar-se de acordo com uma pré-programação biológica,
o Homem é um ser com possibilidades de escolher e de decidir o
que fazer de si mesmo e aberto em relação ao futuro.

Na verdade, as suas características biológicas, as condições


físicas de seu ambiente, as representações sociais, influênciam e
condicionam a sua acção. O Homem toma-as como um conjunto
de possibilidades e de alternativas que lhe são dadas para que, a
partir delas, construa o seu ser e dê um sentido à própria vida. O
ser humano possui um corpo, uma natureza biológica, que lhe dá
um certo número de capacidades.

As nossas características biológicas condicionam, naturalmente, a


nossa acção, e é óbvio que os nossos hábitos e modos de agir
dependem de aptidões que possuimos e que procuramos
desenvolver e rentabilizar.

As necessidades básicas ou primárias, tais como a necessidade


de alimento, de água, de oxigênio e de repouso, determinam o
próprio ritmo de nossas acções.

Por outro lado, habitamos um determinado ambiente, um mundo


de coisas e objectos materiais, recursos indispensáveis à nossa
sobrevivência e a uma existência com qualidade. Os recursos e as
matérias primas existentes numa determinada região, o clima e
as outras condições ambientais, condicionam até hoje, o tipo de
actividade produtiva, os costumes, as crença, os valores sociais,
religiosos, estéticos, etc.

O Homem, porém, vive inserido num meio sócio-cultural, que


também condiciona o seu modo de agir e diversifica as formas de
satisfação das suas necessidades básicas. Logo no acto de nascer,
na maneira como se faz o parto, nos rituais que acompanham o
nascimento, nas roupas com que se veste o bebé, começa a
modelação sócio – cultural do ser humano.

A cultura, que aprendemos a respeitar, permitindo-nos moldar a


nossa natureza biológica e tornarmo-nos verdadeiramente
homens é, pois, um factor indispensável à nossa construção como
seres humanos – um factor de humanização.
Introdução à Filosofia 51

Assim, o Homem é capaz de crescer de forma humana, isto é,


aprender a viver como vive o nosso grupo social; aprender a sua
linguagem e adoptar os seus costumes e formas padronizadas de
comportamento social.

O agente criador

O ser humano, é o ser activo e criador, nasce inacabado e produz-


se a si próprio mercê da sua própria acção, a partir das
características biológicas que recebe dos seus progenitores e da
influência da cultura.

O ser humano é, portanto, um agente criador: ao nível do fazer e


através do trabalho, fabrica e produz artefactos e transforma a
natureza.

Ao nível do agir, nas suas acções intencionais: apropria-se e


assume valores e normas socialmente estabelecidas; recria
valores, através dos quais dá sentido à sua existência; constrói a
sua própria natureza a partir de um conjunto de factores
(biológicos e sócio-culturais), constituíndo-se como um ser que
se inventa a si mesmo num processo criador sempre inacabado.

Exercícios
1 – Quem é o agente criador da cultura?

Resposta: o agente criador da cultura é o ser humano em seus


níveis de agir e fazer.

Auto-avaliação
52 Unidade

Unidade N0 08-A0010

Tema: Valores.

Introdução
Na Sociedade em que nos encontramos somos impelidos a buscar
o que é bom e o que não é bom. Diante disso, mesmo no nosso
contexto cultural, buscamos o que é aceite e o que não é aceite
pela colectividade humana. Aquilo que é aceite é chamado de
valor e, o que não é aceite é um anti-valor.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Explicar os valores e suas características.

 Identificar a hierarquia dos valores.

Objectivos

Sumário
A nossa relação connosco, com a realidade e com os outros é
mediada pela linguagem (no caso, conceptual), e a linguagem se
serve de instrumentos lógicos para comunicar a nossa apreensão
da realidade (ao formular juízos de facto); além de juízos de
facto também fazemos juízos de preferência em que não nos
limitamos a descrever a realidade, mas utilizamos valores com
que predicamos essa mesma realidade (ao formular juízos de
valor).

Os juízos de facto se referem à ordem de ser e do real indicando


os seus atributos, pois se referem a acontecimentos;

Juízos de valor são apreciações subjectivas, implicam uma


avaliação ou uma escolha, expressam a relação da consciência
individual ou social com o que a realidade deve ser, e apontam
para um horizonte de ordem ideal.

A preocupação com os valores é tão antiga como a humanidade,


mas só no século XIX, surge uma disciplina específica, a teoria
dos valores ou axiologia (do grego axios, “valor”). A axiologia
Introdução à Filosofia 53

não se preocupa com os seres, mas das relações que se


estabelecem entre os seres e o sujeito que os aprecia.

O conceito valor pode ter várias acepções. Com efeito:

Um significado afectivo: ao significar o carácter das coisas que


nos merecem estima; pode ter um significado moral ao ser
atribuido por alguém a uma atitude: é o caso da coragem em
frente ao perigo, da solidariedade ( o valor das acções da
solidariedade social), da beleza de um gesto, do altruísmo e do
egoísmo; e um significado técnico: por exemplo o valor de uma
mercadoria ou o valor de uma incógnita.

Os valores podem ter uma vertente subjectiva ou objectiva:

Subjectiva: quando designam um padrão de comportamento a


que alguém dá importância ou relevo (por exemplo, a
honestidade, a parcimónia no uso dos prazeres, a preocupação
com questões espirituais);

Objectiva: quando designam padrões de comportamentos


reconhecidos e adoptados por um grupo ou comunidade mais ou
menos vasta (a moda de um abraço, uma determinada estação, a
indumentária tradicional de uma região ou os valores de uma
mercadoria).

Em suma, podemos dizer que o conceito geral dos valores se


deixa resumir assim:
 O mundo dos valores é o mundo de entes ideais (só existe para
quem os vive);
 Os valores são orientações gerais para a acção (pois dão-lhe
sentido);
 Introduzem apreciação no mundo dos objectos ( condicionam as
nossas opções);
 São qualidades incorporadas em objectos (só existem num
contexto cultural).
O valor deve distinguir-se de regra, norma ou lei, pois estas são
prescrições de conduta definidas por consenso que pretendem
fixar e institucionalizar os valores. Assim, por exemplo, deve-se
ser corajoso, é claramente uma regra, cujo valor é a coragem.

Características dos valores


 A polaridade: visão positiva e negativa, ou seja, ausência de
neutralidade perante os acontecimentos;
 A hierarquização: organização dos valores em termos de mais
importantes e menos importantes, o que permite depois, na acção, o
estabelecimento de prioridades sem o que nenhum projecto é realizável;
 A historicidade;
 A relactividade;
 A objectividade subjectividade.

Classificação e hierarquia dos valores


54 Unidade

Johannes Hessen, indica que podemos classificar os valores de


um duplo ponto de vista: formal e material. Do ponto de vista
formal, os valores subdividem-se como segue:

1. Positivo e negativo. Valor positivo é aquele que mais


geralmente costumamos designar pela expressão pura e simples
de “valor”. O conceito de “valor” é geralmente usado numa dupla
acepção: algumas vezes, entende-se por esta palavra o valor em
geral, independentemente da polaridade valor-desvalor, como
conceito neutro, outras vezes entende-se só o seu aspecto positivo
contraposto ao negativo. O valor positivo contrapõe-se ao
negativo, chamando-se então a este mais propriamente
“desvalor”. Esta polaridade pertence à própria estrutura essencial
da ordem axiológica que assim se distingue fundamentalmente da
ordem do ser a que é estranha uma tal estrutura.

2. Valores das pessoas e valores das coisas, ou valores pessoais


e reais. Valores das pessoas, ou pessoais, são aqueles que só
podem pertencer a pessoas, como os valores éticos. Reais, os que
aderem a objectos ou coisas impessoais, como o das coisas ditas
valiosas, designadas mais geralmente pela expressão “bens”.

3. Valores em si mesmo, ou autónomos e valores derivados de


outros ou dependentes. O valor em si reside na sua mesma
essência; possui esse carácter com independência de todos os
outros valores; não depende deles; não é meio para eles.
Contrapõe-se-lhe o valor derivado.

Como todos valores se acham referidos ao homem, e este é, antes


de mais nada, um ser constituido de sensibilidade e espírito, daí o
poderem classificar-se imediatamente todos os valores nas duas
classes fundamentais de : valores sensíveis e valores espirituais.
Os primeiros referem-se ao homem enquanto simples ser da
natureza, os segundos ao homem como ser espiritual.

A – Valores sensíveis. A esta categoria pertencem:

1. Os valores do agradável e do prazer, também chamados


“hedónicos”. Ela abrange não só todas as sensações do prazer e
satisfação, como tudo aquilo que é apto a provocá-las ( vestuário,
comida, bebidas, etc.). À ética que apenas conhece esses valores,
chama-se geralmente Hedonismo.

2. Valores vitais ou da vida: são aqueles valores de que é


portadora a vida, no sentido naturalista desta palavra, isto é, Bios.
Cabem aqui o vigor vital, a força, a saúde, etc. foram estes os
valores que Nietzsche reputou os mais elevados de todos na sua
escala axiológica, como os únicos mesmos. E ao que se chama
também Biologismo ético ou Naturalismo.

3. Valores de utilidade: coincidem com os chamados valores


económicos. Referem-se a tudo aquilo que serve para a satisfação
das nossas necessidades da vida (comida, vestuário, habitação,
etc.) e aos instrumentos que servem para a criação destes bens.
Distinguem-se dos restantes valores desta classe, nomeadamente
Introdução à Filosofia 55

dos sensíveis para os quais aliás concorrem, por não serem, do


ponto de vista formal, autónomos, mas derivados.

B – Valores espirituais. A estes, pertencem os seguintes:

1. Valores lógicos: quando se fala em valores lógicos, é preciso


ter presente que se podem entender por esta expressão duas
coisas distintas: a função do conhecimento – o saber, a posse da
verdade e o esforço para alcançar – e o conteúdo do
conhecimento.

No primeiro sentido, é óbvio que podemos falar, com todo o


direito, os valores lógicos ou no valor do conhecimento.
Contrapor-se-ao, como desvalor lógico, a ignorância, o erro, a
falta de interesse pela verdade, a ausência de esforço para a
alcançar, etc. mas a expressão “valor lógico”, pode significar
também o próprio conteúdo do conhecimento. E, neste segundo
caso, é “valor lógico” tudo aquilo que cai dentro do par de
conceitos: vardadeiro-falso.

2. Valores éticos: ou do bem moral. Destes podem dar-se as


seguintes características: a) só podem ser seus portadores as
pessoas, e não as coisas. Só seres espirituais podem realizar
valores morais. Por isso, o âmbito destes valores é relativamente
restrito; por exemplo: que o dos estéticos; b) os valores éticos
aderem sempre a suportes reais. Também por este lado, se
distinguem os valores estéticos, cujo suporte é constituido por
algo de irreal, de mera aparência; c) os valores éticos têm o
carácter de exigências e imperativos absolutos; d) os valores
éticos dirigem-se ao homem em geral; são universais; e) além
disso, é, pode dizer-se, ilimitada também a exigência que os
valores éticos nos fazem: constituem uma norma ou critério de
conduta que afecta todas as esferas da nossa actividade e de nossa
conduta da vida. Esta caracteristica de valores éticos poderia se
definir de totalitários.

3. Valores estéticos, ou do Belo: incluímos aqui o conceito de


belo, no mais amplo sentido desta palavra, o sublime, o trágico, o
amorável, etc. estes valores têm as seguintes características: a) o
belo não adere apenas a pessoas, mas também as coisas.
Qualquer objecto, vivo ou morto, de natureza material ou
espiritual, real ou ideal, pode tornar-se suporte de um valor
estético; b) o valor estético reside essencialmente na aparência.
A realidade estética é sempre uma realidade aparente. Isto
encontra sua explicação no facto de o valor estético ser um valor
de expressão, em oposição ao valor ético que é sempre um valor
de acção. “Belo é”, como disse Hegel, “a manifestação sensível
da idéia”.

4. Valores religiosos ou do “sagrado” : cuja referência foi


demonstrada acima. São valores de um “ser”. Nisto não se
afastam de valores éticos para se aproximarem dos estéticos com
os quais estão numa relação mútua íntima. Todavia, existe
também entre eles e estes últimos uma diferença que cumpre
salientar: a realidade do “sagrado”, não é, como a do “Belo”,
apenas uma realidade aparente, mas uma realidade no mais
eminente sentido desta palavra: um ens realismum.
56 Unidade

A hierarquia dos valores foi proposta pela primeira vez por


Max Scheler, que forneceu cinco critérios para determinar a
altura dos valores. A hierarquia dos valores proposta por Scheler
é, no seu entender, objectiva, universal e eterna porque é
constituida a priori pela sensibilidade. É constituida por quatro
grupos fundamentas de valores:
 Valores do agradável e do desagradável, correspondentes à
função do gozo e do sofrimento;
 Valores vitais (como saúde, a doença, etc.);
 Valores espirituais, isto é, estéticos e cognitivos;
 Valores religiosos.
São critérios os cinco seguintes:

1º Os valores são tanto mais altos quanto maior for a duração,


qualquer que seja aliás a duração do seu suporte real. Max
Scheler, por exemplo, na peugada de Santo Agostinho, distingue
entre tempo e duração. O amor, por exemplo, é sempre sentido
como eterno. Amar por uma noite não é amar, mas fazer amor. E
dizer: “amar-te-ei eternamente” seria um pleonasmo.

2º Os valores são tanto mais altos quanto menos divisíveis forem.


Diz-se bens materiais exactamente porque são divisíveis. E se no
fundo da escala dos bens materiais colocarmos os bens
económicos este serão os mais divisíveis que todos. Os bens
espirituais são indivisíveis. Conclusão, os valores espirituais são
mais altos, são superiores aos valores materiais.

3º O valor que serve de fundamento a outros é mais alto que os


valores que se fundam nele. Segundo Max Scheler, o valor do
“útil” funda-se na valor do “agradável”. O agradável, por seu
turno, funda-se sobre um valor vital, como a saúde, etc.

Nas suas grandes linhas, os valores religiosos servem de


fundamento aos valores espirituais, estes aos valores vitais e estes
aos valores do agradável e do desagradável.

4º Os valores são tanto mais altos quanto maior é a satisfação


que a sua realização produz em nós. Max Scheler quando fala
em “satisfação” está a pensar em satisfação duradoira. Um prazer
duradoiro (os do espirito) é sempre um valor mais alto que um
prazer transitório (porque sensível, ligado ao corpo).

5º Um valor é tanto mais alto quanto menos relativo for. Por


exemplo, os valores morais são mais altos que os valores vitais e
estes mais altos que o simples agradável ou desagradável.

Para Johannes Hessen, na sua obra Filosofia dos valores, nos


seria de guia até aqui, qualquer escala de valores a construir
deverá obedecer a três princípios gerais:

1º Os valores espirituais prevalecem sobre os sensíveis;

2º Na classe dos valores espirituais é fora de dúvida que o


primado pertence aos valores éticos;
Introdução à Filosofia 57

3º Os mais altos de todos os valores são os valores do “sagrado”


ou os valores religiosos porquanto todos os outros se fundam
neles.

O acto voluntário
Se o que caracteriza fundamente o agir humano é a capacidade de
antecipação ideal do resultado a ser alcançado, concluímos que é
isso que torna o acto moral propriamente voluntário, ou seja, um
acto de vontade que decide pela busca do fim proposto.

Nesse sentido, é importante não confundir desejo e vontade. O


desejo surge em nós com a sua força e exige a realização; é algo
que se impõe e, portanto, não resulta da escolha. Já a vontade
consiste no poder de parada que exercemos diante do desejo.

Seguir o impulso do desejo sempre que ele se manifesta é a


negação da moral e da possibilidade de qualquer vida em
sociedade.

Exercícios

1 – Explique qual o significado afectivo e moral do termo valor.


Resposta: significado afectivo é o carácter das coisas que nos
Auto-avaliação
merecem estima; e o significado moral trata-se de uma atitude
diante de uma situação: é o caso da coragem em frente ao perigo,
da solidariedade ( o valor das acções da solidariedade social), da
beleza de um gesto, do altruísmo e do egoísmo; e um significado
técnico: por exemplo o valor de uma mercadoria ou o valor de
uma incógnita.
58 Unidade

Unidade N0 09-A0010

Tema: Aspectos da Bioética

Introdução
A palavra “bioética” nasceu na América e se transformou
profundamente, passando para o vocabulário corrente. Inventada
nos Estados Unidos por R. Potter, a bioética designa, neste
último, um projecto de utilização das ciências biológicas
destinadas a melhorar a qualidade de vida. Na nossa linguagem, a
palavra “bioética” se inscreve desde o início dos anos oitenta, em
virtude dos progressos da biologia. Originalmente, a bioética se
insere num plano com perspectiva pragmática e técnica, bem
mais que um sistema reflectido de valores: ela se liga, primeiro, a
um optimismo científico.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Explicar o conceito de Bioética.

 Identificar os problemas tratados pela bioética.

Objectivos  Descrever a Filosofia Analítica da Educação.

Sumário
Bioética, vem da palavra ética e de bios (vida, em grego). Pode
designar, então, ou uma reflexão sobre os valores subordinada a
bios, a vida, ou então uma metamoral que se interessa pelos
desafios e as repercussões da Biologia e Medicina. Eis pois
algumas definições:

A bioética é a ciência normativa do comportamento humano


aceitável no campo da vida e da morte (Pierre Deschamps –
jurísta);

A bioética é o estudo interdisciplinar do conjunto das condições


que uma gestão responsável da vida humana (ou da pessoa
humana) exige, no quadro dos progressos rápidos e complexos
do saber e das tecnologias bio-médicas (David Roy);
Introdução à Filosofia 59

A bioética designa a investigação do conjunto das exigências do


respeito e da promoção da vida humana e da pessoa, no sector
bio-médico (Guy Durand).

Essas diferentes definições, revelam que há uma dúpla óptica da


bioética: de um lado, científica e preocupada com a eficácia; de
outro, centrada no debate ético, a responsabilidade e os valores.

A bioética é, pois a expressão da responsabilidade em face da


humanidade futura e distante que está confiada à nossa guarda, e
a busca das formas de respeito devidas à pessoas , busca que se
efectua particularmente considerando o sector biológico e suas
aplicações.

Eutanásia

Eutanásia (do grego- eu "bom", tanasia "morte") é a prática pela


qual se abrevia a vida de um enfermo incurável de maneira
controlada e assistida por um especialista.

A eutanásia representa actualmente uma complicada questão de


bioética e biodireito, pois enquanto o Estado tem como princípio
a protecção da vida dos seus cidadãos, existem aqueles que,
devido ao seu estado precário de saúde, desejam dar um fim ao
seu sofrimento antecipando a morte.

Independentemente da forma de Eutanásia praticada, seja ela


legalizada ou não (tanto em Portugal como no Brasil esta prática
é considerada como ilegal), é considerada como um assunto
controverso, existindo sempre prós e contras – teorias
eventualmente mutáveis com o tempo e a evolução da sociedade,
tendo sempre em conta o valor de uma vida humana. Sendo
eutanásia um conceito muito vasto, distinguem-se aqui os vários
tipos e valores intrinsecamente associados: eutanásia, distanásia,
ortotanásia, a própria morte e a dignidade humana.

Em primeiro lugar, é importante ressaltar que a eutanásia pode


ser dividida em dois grupos: a "eutanásia activa" e a "eutanásia
passiva". Embora existam duas “classificações” possíveis, a
eutanásia em si consiste no acto de facultar a morte sem
sofrimento a um indivíduo cujo estado de doença é crónico e,
portanto, incurável, normalmente associado a um imenso
sofrimento físico e psíquico. A eutanásia activa conta com o
traçado de acções que têm por objectivo pôr término à vida, na
medida em que é planeada e negociada entre o doente e o
profissional que vai levar e a termo o acto.

A eutanásia passiva por sua vez, não provoca deliberadamente a


morte, no entanto, com o passar do tempo, conjuntamente com a
interrupção de todos e quaisquer cuidados médicos,
farmacológicos ou outros, o doente acaba por falecer. São
cessadas todas e quaisquer acções que tenham por fim prolongar
a vida. Não há por isso um acto que provoque a morte (tal como
na eutanásia activa), mas também não há nenhum que a impeça
(como na distanásia).
60 Unidade

É relevante distinguir eutanásia de "suicídio assistido", na medida


em que na primeira é uma terceira pessoa que executa, e no
segundo é o próprio doente que provoca a sua morte, ainda que
para isso disponha da ajuda de terceiros.

Etimologicamente, distanásia é o oposto de eutanásia. A


distanásia defende que devem ser utilizadas todas as
possibilidades para prolongar a vida de um ser humano, ainda
que a cura não seja uma possibilidade e o sofrimento se torne
demasiadamente penoso.

Aborto

O aborto consiste na expulsão ou extracção de um feto pesando


menos de mil gramas, ou com uma idade gestacional inferior a
vinte e oito semanas completas.

Esta definição é geralmente utilizada nos países menos


desenvolvidos, nos quais é rara a sobrevivência de fetos pesando
menos.

Nos países mais desenvolvidos, em que os fetos pesando


quinhentos a mil gramas muitas vezes sobrevivem, utiliza-se a
definição recomendada pela Organização Mundial da Saúde: “a
extracção ou expulsão de um feto pesando menos de quinhentas
gramas ( o que equivale aproximadamente a 22 semanas
completas de gestação. Os tipos e graus de aborto forma já
classificados de muitas maneiras.

Classificação em função da causa:


Aborto espontâneo e induzido;

Induzido profisssionalmente;

Induzido não profissionalmente.

Classificação em função do estádio:


Ameaça de abordo;
Aborto inevitável;

Aborto incompleto;

Aborto completo.

Classificação em função das complicações:


Aborto séptico e retido.

Aborto espontâneo é aquele que ocorre sem intervenção humana


deliberada. As causas são: mal nutrição, infecções, anomalias de
desenvolvimento do embrião, perturbações metabólicas (por
exemplo: diabetes, hipertiroidismo), alterações da parede uterinas
(por exemplo: malformações, miomas).

Aborto induzido é aquele que resulta de intervenção humana


deliberada.
Introdução à Filosofia 61

Aborto profissional é induzido por trabalhadores de saúde


qualificados, utilizando métodos modernos, legal ou ilegalmente.

Aborto não profissional é induzido por meios alheios aos


métodos médicos modernos. Os métodos e os seus efeitos são
vários: substâncias de medicina tradicional, medicamentos
modernos, instrumentação uterina, cáustigos intravaginais e
massagem uterina.

A partir das definições e os tipos de aborto acima apresentados,


podemos concluír que há varias formas de fazer o aborto, seja de
forma legal ou de forma ilegal. Porém, não deixa de ser aborto.
Especialistas da bioética e diferentes camadas da sociedade
questionam se é lícito fazer ou não o aborto, já que se trata de
matar uma vida em formação, particularmente o aborto
provocado. É correcto fazer o aborto? Existe países como a
Holanda, que a lei aprovou a permissão do aborto. Mas o Brasil e
outros países consideram o aborto como um crime. Qual desses
países está agindo moralmente em relação ao aborto? É ou não é
permitido fazer o aborto? São questões a ser reflectidas,
debatidas sobre o certo e o errado, tendo em conta que a expulsão
do fecto corresponde a morte de uma vida do ser humano em
formação. A prática do aborto é é eutanásia e proibida em
qualquer sociedade.

Exercícios
1 – Quais são os problemas abordados pela bioética?

Resposta: São problemas referentes a vida tais como: eutanásia,


aborto, meio ambiente, entre outros.

Auto-avaliação
62 Unidade

Unidade N0 10-A0010

Tema: Teoria de Conhecimento

Introdução
Conhecimento é o pensamento que resulta da relação que se
estabelece entre o sujeito que conhece e o objecto a ser
conhecido. A apropriação intelectual do objecto supõe que haja
regularidade nos acontecimentos do mundo; caso contrário, a
consciência cognoscente nunca poderia superar o caos.

O conhecimento pode designar o acto de conhecer, enquanto


relação que se estabelece entre a consciência que conhece e o
mundo conhecido. Mas o conhecimento se refere também ao
produto, ao resultado do conteúdo desse acto, ou seja, o saber
adquirido e acumulado pelo homem.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Definir os conceitos de Teoria do Conhecimento.

Objectivos  Destacar os representantes da Teoria do conhecimento e seus


princípios.

Sumário
A teoria do conhecimento é uma disciplina filosófica que
investiga quais são os problemas decorrentes da relação entre
sujeito e objecto do conhecimento, bem como as condições do
conhecimento verdadeiro.

Teoria do conhecimento na Antiguidade


A passagem do mundo tribal à polis na Grécia, determina a
maneira de pensar, que antes era predominantemente mítica e
depois, com o aparecimento das cidades, faz surgir a
racionalidade crítica típica do pensar filosófico.

O advento da polis grega é concomitante a outras transformações


também marcantes, como o aparecimento da escrita, da moeda e
dos legisladores. Essas transformações culminam com a figura do
Introdução à Filosofia 63

cidadão e do filósofo, em um mundo marcado pelo desígnio


divino.

Começa então a grande aventura filosófica dos gregos, cuja


influência se faz sentir até nossos dias.

Filosofia pré-socrática

A Filosofia pré-socrática se caracteriza pela preocupação com a


natureza do mundo exterior. O nascimento da filosofia na Grécia
é marcado pela passagem da cosmogonia para a cosmologia. A
cosmogonia, típica do pensamento mítico, é descritiva e explica
como do caos surge o cosmos, a partir da geração dos deuses,
identificados às forças da natureza. Na cosmogonia, as
explicações rompem com a religiosidade: a arché (princípio) não
se encontra mais na ordem do tempo mítico, mas significa
princípio teórico, enquanto fundamento de todas as coisas. Daí a
diversidade das escolas filosóficas, dando origem a
fundamentações conceituais (e portanto abstractas) muito
diferentes entre si.

Dentre os pré-socráticos que nos interessam na teoria do


conhecimento, destacamos os seguintes: Heráclito de Éfeso e
Parmênides de Éleia. Porém, não deixamos de mencionar os
demais filósofos pré-socráticos e seus pensamentos.

Tales de Mileto (Séc. VI-V a.C.) é um dos sete sábios da Grécia.


Conhecedor da cultura oriental por cantactos directos efectuados
em numerosas viagens, interessa-se por vários campos de
actividade, desde a engenharia e a matemática até à política e
finanças. Foi astrónomo e, como tal, previu a ocorrência de um
eclipse total do sol, que veio a acontecer em 585 a.C.

Tales diz que o princípio de tudo é a água, pelo que sustentava


ainda que a terra está sobre a água; considerava talvez como
prova, o facto de verificar que o alimento de todas as coisas é
húmido e de que, mesmo o que é quente, se gera e vive no
húmido; ora, aquilo de que tudo provém é o princípio de tudo.

Como vemos, não se trata de encontrar uma explicação mítica


para o origem do universo; mas antes se nota a preocupação de
descobrir a substância primordial subjacente à natureza na sua
totalidade.

Anaximandro de Mileto (611-546 a.C): vê no infinito ou


indeterminado a arché, isto é, o princípio de tudo. O infinito,
susceptível de produzir constantemente seres novos, é anterior à
própria água. É dele que tudo vem e para onde tudo regressa.

Arché para ele é o apeiron, que podemos traduzir como sendo o


indeterminadamente infinito ou infinitamente indeterminado,
pois com isso quer-se significar tanto a indeterminação lógica
como infinito espacial e temporal, eterno e omnipresente.
64 Unidade

Anaxímenes de Mileto: considera o ar como elemento


primordial. Para ele, o ar é tão necessário como a água, sendo,
contudo, de natureza mais subtil.

O ar origina todas as coisas mediante processos de condensação,


dilatação e outros. Assim, por exemplo, da rarefação crescente do
ar resultariam as estrelas; da solidificação do ar nasceriam os
corpos de natureza cristalina.

É com Anaxímenes que se encerra a Escola Jônica, o que não


impede o pensamento grego de continuar a sua marcha.

Heráclito de Éfeso: Tudo muda

Heráclito (544-484 a.C.), nasceu em Éfeso, na Jônia, actualmente


Turquia. Tal como os seus contemporâneos pré-socráticos, busca
compreender a multiplicidade do real. Mas, ao contrário deles,
não rejeita as contradições e quer apreender a realidade na sua
mudança, no seu devir. Todas as coisas mudam sem cessar, e o
que temos diante de nós em dado momento é diferente do que foi
a pouco e do que será depois: “Nunca nos banhamos duas vezes
no mesmo rio”, pois na segunda vez não somos os mesmos, e
também o rio mudou.

Portanto, não há ser estático, e o dinamismo pode bem ser


representado pela metáfora do fogo, forma visível da
instabilidade, símbolo de eterna agitação do devir, “o fogo eterno
e vivo, que ora se acende e ora se apaga”.

Para Heráclito o ser é o múltiplo. Não no sentido apenas de que


existe a multiplicidade das coisas, mas de que o ser é múltiplo
por estar constituído de oposições internas. O que mantém o
fluxo do movimento não é o simples aparecer de novos seres,
mas a luta dos contrários, pois, “a guerra é pai de todos, rei de
todos”. E é da luta que nasce a harmonia , como sínteses dos
contrários.

O que faz de Heráclito um pensador original é o facto de não ter


uma visão estática do mundo. Considera, portanto, que há um
dinamismo inerente às coisas, o que explica que tudo esteja em
constante mudança. É, por isso, considerado o pai da filosofia do
devir.

Parmênides de Eléia: o ser é imutável

Parmênides (540-470 a.C), viveu em Eléia, cidade do sul da


Magna Grécia (actual Itália) e é o principal expoente da escola
eleática. Elaborou uma importante teoria filosófica na medida em
que influenciou de forma decisiva o pensamento ocidental.
Ocupou-se longamente a criticar a filosofia heraclitana: ao “tudo
muda”de Heráclito, contrapôs a imobilidade do ser.

Para Parmênides é absurdo e impensável considerar que uma


coisa pode ser e não ser ao mesmo tempo. À contradição opõe o
princípio segundo o qual “o ser é” e o “não-ser não é”. Mais tarde
os lógicos chamarão a isto princípio de identidade, base de toda
construção metafísica posterior.
Introdução à Filosofia 65

Parmênides conclui que, o ser é único, imutável, infinito e


imóvel. Não há, entretanto, como negar a existência do
movimento no mundo que percebemos, onde as coisas nascem e
morrem, mudam de lugar e se expõem em infinita multiplicidade.
Para Parmênides, o movimento existe apenas no mundo sensível,
e a percepção levada a efeito pelos sentidos é ilusória. Só o
mundo inteligível é verdadeiro, pois está submetido ao princípio
que hoje chamamos de identidade e de não-contradição.

Uma das consequências dessa teoria é a identidade entre o ser e o


pensar. Ou seja, as coisas que existem fora de mim são idênticas
ao meu pensamento, e o que eu não conseguir pensar não pode
ser na realidade.

Os sofistas
O século de Péricles (V a. C.) constitui o período áureo da cultura
grega, quando a vida democrática de Atenas convida a
participação dos cidadãos na vida política e se desenvolve uma
intensa vida cultural e artistica. Os pensadores do período
clássico, embora ainda discutam questões refrentes à natureza,
desenvolvem o enfoque antropológico, abrangendo a moral e
apolítica.

Os sofistas vivem nessa época e alguns deles são interlocutores


de Sócrates. Os mais famosos sofistas foram: Protágoras de
Abdera (485-411 a.C); Górgias de Leontinos (485-380 a.C);
Hípias de Élis, e ainda, Trasímaco, Pródico, Hipódamos, entre
outros. Tal como ocorreu com os pré-socráticos, dos sofistas só
nos restam fragmentos de suas obras, alem das referências feitas
pelos filósofos anteriores.

A palavra sofista, etimologicamente, vem de sophos, que


significa sábios, ou melhor “professor da sabedoria”.
Posteriormente adquiriu um sentido pejorativo de “homem que
emprega sofismas”, ou seja, alguém que usa de raciocínio
capcioso, de má-fé, com intenção de enganar. Sóphisma significa
“sutileza de sofisma”.

Os sofistas sempre foram mal interpretados devido às críticas que


sobre eles fizeram Sócrates e Platão. A imagem de certa forma
caricatural da sofística tem sido reelaborada no sentido de
procurar recuperar a verdadeira importância do seu pensamento.

São muitos os motivos que levaram à visão deturpada dos


sofistas que a tradição nos oferece. Em primeiro lugar, há enorme
diversidade teórica entre os pensadores reunidos sob a
designação de sofistas. Talvez, o que passa a identificá-los é o
facto de serem considerados sábios e pedagogos. Vindos de todas
as partes do mundo grego, desenvolvem um ensino itinerante
pelos locais em que passam, mas não se fixam em lugar algum.
Deve-se a isso o gosto pela crítica, o exercício do pensar
resultante da circulação de ideias diferentes.

Para o escândalo de seus contemporâneos, costumavam cobrar


pelas aulas e por esse motivo Sócrates os acusava de prostituição.
66 Unidade

Os sofistas, faziam das aulas seu ofício, já que não eram


suficientemente ricos para filosofarem sem compromissos.

Os sofistas exerceram influência muito forte, vinculando-se à


tradição educativa dos poetas Homero e Hesíodo. Deram
importante contribuição para a sistematização do ensino.
Formaram um currículo de estudos: gramática (da qual foram os
iniciadores), retórica e dialéctica; por influência dos pitagóricos,
desenvolveram a aritmética, a geometria, a astronomia e a
música.

Se foram acusados pelos seus detractores de pronunciarem


discursos vazios, essa fama se deve à excessiva atenção dada por
alguns deles ao aspecto formal da exposição e da defesa das
ideias, pois se achavam preocupados com a persuação,
instrumento por excelência do cidadão na cidade democrática. Os
melhores deles, buscam aperfeiçoar os instrumentos da razão, ou
seja, a coerência e o rigor da argumentação, porque não basta
dizer o que se considera verdadeiro, é preciso demostrá-lo pelo
raciocínio. Pode-se dizer que aí se encontra o embrião da lógica,
mais tarde desenvolvida por Aristóteles.

Quando Protágoras, um dos mais importantes sofistas, diz que “o


homem é a medida de todas coisas coisas”, esse fragmento deve
ser entendido não como expressão do relativismo do
conhecimento, mas enquanto exaltação da capacidade de
construir a verdade: o logos não mais é divino, mas decorre do
exercício técnico da razão humana.

Sócrates
Sócrates (470-399 a. C) nada deixou escrito, e teve suas idéias
divulgadas por dois de seus principais discípulos, Xonofonte e
Platão. Evidentemente, devido ao brilho deles, é de se supor que
nem sempre fossem realmente fiéis ao pensamento do mestre.
Nos diálogos que Platão escreveu, Sócrates figura sempre como o
principal interlocutor.

Mesmo tendo sido concluído muitas vezes entre os sofistas,


Sócrates recusava tal classificação, e opunha-se a eles de forma
crítica. Sócrates se indispôs com os poderosos de seu tempo,
sendo acusado de não crer nos deuses da cidade e corromper a
mocidade. Por isso foi condenado e morto.

Costumava conversar com todos, fossem velhos ou jovens,


nobres e escravos, preocupado com o método do conhecimento.
Sócrates parte do pressuposto “só sei que nada sei”, que consiste
justamente na sabedoria de reconhecer a própria ignorância,
ponto de partida para a procura do saber.

Por isso seu método começa pela parte considerada “destrutiva”,


chamada ironia (em grego, “perguntar”). Nas discussões afirma
inicialmente nada saber, diante do oponente que se diz
conhecedor de determinado assunto. Com hábeis perguntas,
desmonta as certezas até o outro reconhecer a ignorância. Parte
então para a segunda etapa do método, a maiêutica (em grego,
“parto”). Dá esse nome em homenagem a sua mãe, que era
Introdução à Filosofia 67

parteira, acrescentando que, se ela fazia parto de corpos, ele


“dava a luz” ideias novas.

Sócrates, por meio de perguntas, destrói o saber constituido para


reconstruí-lo na procura da definição do conceito. Esse processo
aparece bem ilustrado nos diálogos relatados por Platão, e é bom
lembrar que nem sempre Sócrates tem resposta: ele também se
põe em busca do conceito e às vezes as discussões não chegam a
conclusões definitivas.

As questões que Sócrates privilegia são as referentes à moral, daí


perguntar em que consiste a coragem, a covardia, a piedade, a
justiça e assim por diante. Diante de diversas manifestações de
coragem, quer saber o que é a “coragem em si”, o universo que a
representa. Ora, enquanto a filosofia ainda é nascente, precisa
inventar palavras novas, ou usar as antigas dando-lhes sentido
diferente. Por isso Sócrates utiliza o termo logos, que na
linguagem comum, significava “palavra”, “conversa”, e que no
sentido filosófico passa a significar “a razão que se dá de algo”,
ou mais propriamente, conceito.

Quando Sócrates pede o logos, quando pede que indiquem qual é


logos da justiça, que é a justiça, o que pede é o conceito da
justiça, a definição de justiça.

Platão
Platão (428-347 a. C), viveu em Atenas, onde fundou uma escola
denominada Academia.

Para sintetizar as suas ideias, recorremos ao livro VII de A


República, onde seu pensamento é ilustrado pelo famoso “mito
de caverna”. Platão imagina uma caverna onde estão
acorrentados os homens desde a infância, de tal forma que, não
podendo se voltar para a entrada, apenas enxergam o fundo da
caverna. Aí são projectadas as sombras das coisas que passam às
suas costas, onde há uma fogueira. Se um desses homens se soltar
das correntes para contemplar a luz do dia os verdadeiros
objectos, quando regressasse, relatando o que viu aos seus
antigos companheiros, esses o tomariam por louco, não
acreditando em suas palavras.

A análise do mito pode ser feita pelo menos sob dois pontos de
vista: o epistemológico (relativo ao conhecimento) e o político
(relativo ao poder).

Segundo a dimensão epistemológica, o mito de caverna é uma


alegoria a respeito das duas principais formas de conhecimento:
na teoria das ideias, Platão distingue o mundo sensível, dos
fenômenos, e o mundo inteligível, das idéias.

O mundo sensível, acessível aos sentidos, é o mundo da


multiplicidade, do movimento, e é ilusório, pura sombra do
verdadeiro mundo. Assim, mesmo se percebemos inúmeras
abelhas dos mais variados tipos, a ideia de abelha deve ser una,
imutável, a verdadeira realidade. Com isto, Platão se aproxima do
instrumento teórico de Parmênides e, aliando-os aos
ensinamentos de Sócrates, elabora uma teoria original.
68 Unidade

Do seu mestre aproveita a noção nova de logos, e continuando o


processo de compreensão do real, cria a palavra ideia (eidos),
para referir-se a intuição intelectual, distinta da intuição sensível.

Acima do ilusório mundo sensível, há o mundo das ideias gerais,


das essências imutáveis que o homem atinge pela contemplação e
pela depuração dos enganos dos sentidos.

Sendo as ideias a única verdade, o mundo dos fenômenos só


existe na medida em que participa do mundo das ideias, do qual é
apenas sombra ou cópia. Por exemplo, um cavalo só é cavalo,
enquanto participa da ideia de “cavalo em si”. Trata-se da teoria
de participação, mais tarde duramente criticada por Aristóteles.

Para Platão há uma dialéctica que fará a alma elevar-se das coisas
múltiplas e mutáveis às ideias unas e imutáveis. As ideias gerais
são hierarquizadas, e no topo delas está a ideia do Bem, a mais
alta em perfeição e a mais geral de todas: os seres e as coisas não
existem se não enquanto participam do Bem. E o Bem supremo é
também a Suprema Beleza. É o Deus de Platão.

Se lembrarmos o que foi dito a respeito dos pré-socráticos,


podemos verificar que Platão tenta superar a oposição instalada
pelo pensamento de Heráclito, que afirmava a mutabilidade
essencial do ser, e a posição de Parmênides, para o qual o ser é
imóvel. Platão resolve o problema: o mundo das ideias se refere
ao ser permanente, e o mundo dos fenômenos ao devir
heraclitano.

Platão supõe que os homens já teriam vivido como puro espírito


quando contemplaram o mundo das ideias. Mas tudo esquecem
quando se degradam ao se tornarem prisioneiros do corpo, que é
considerado o “túmulo da alma”. Pela teoria da reminiscência,
Platão explica como os sentidos se constituem apenas na ocasião
para despertar nas almas as lembranças adormecidas. Em outras
palavra, conhecer é lembrar. No diálogo Menon, Platão descreve
como um escravo, ao examinar figuras sensíveis que lhe são
oferecidas, é induzido a “lembrar-se”das ideias e descobre uma
verdade geomêtrica.

Voltando ao mito de caverna: o filósofo (aquele que se libertou


das correntes), ao contemplar a verdadeira realidade e ter
passado da opinião (doxa) à ciência (epísteme), deve retornar ao
meio dos homens para orientá-los.

Eis assim a segunda dimensão do mito, a política, surgida da


pergunta: como influenciar os homens que não vêem? Cabe ao
sábio ensinar a governar. Trata-se da necessidade da acção
política, da transformação dos homens e da sociedade, desde que
essa acção seja dirigida pelo modelo ideal contemplado.

Aristóteles

Aristóteles (384-322 a.C) nasceu em Estagira, na Calcídica


(região dependente da Macedônia). Seu pa era médico de Filipe,
rei da Macedônia. Mais tarde, Alexandre, filho de Filipe, foi
discípulo de Aristóteles, até o momento em que precisou assumir
precocentemente o poder e continuar a expansão do império.
Introdução à Filosofia 69

Frequentou a Academia de Platão e a fidelidade ao mestre foi


entremeada por críticas que mais tarde justificaria dizendo: “Sou
amigo de Platão, mas mais amigo da verdade”. Em 340 a.C.
fundou em Atenas o Liceu, assim chamado por ser vizinho do
templo de Apolo Lício.

Aristóteles retoma a problemática do conhecimento e se preocupa


em definir a ciência como conhecimento verdadeiro,
conhecimento pelas causas, capaz de superar os enganos da
opinião e de compreender a natureza do devir. Mas ao analisar a
oposição entre o mundo sensível e o mundo inteligível segundo a
tradição de Heráclito, Parmênides e Platão, Aristóteles recusa as
soluções apresentadas e critica o “mundo” separado das ideias
platônicas.

A teoria de Aristóteles se baseia em três distinções fundamentais:


substância-essencia-acidente: acto-potência; forma-matéria, por
sua vez desembocam na teoria das quatro causas.

Aristóteles “traz as ideias do céu à terra”: rejeita o mundo das


ideias de Platão, fundindo o mundo sensível e o inteligível no
conceito da substância, enquanto “aquilo em si mesmo”, ou
enquanto suporte dos atributos.

Ora, quando dizemos algo de uma substância, podemos nos


referir a atributos de essência propriamente dita, e chamamos de
acidente o atributo que a substância pode ter ou não, sem deixar
de ser o que é. Então, a substância individual “este homem” tem
como características essenciais os atributos pelos quais este
homem é homem (Aristóteles diria que a essência do homem e a
racionalidade) e outros, acidentais (como ser gordo, velho ou
belo), atributos esses que não mudam o ser do homem em si.

O problema da transformação dos seres ainda não se resolve com


os conceitos de essência e acidente, e por isso Aristóteles recorre
às noções de forma e matéria. Matéria é o princípio
indeterminado de que o mundo físico é composto, é “aquilo de
que é feito algo”, o que não coincide exactamente com o que nós
entendemos por matéria, na física, por se caracterizar pela
indeterminação. Forma é “aquilo que faz com que uma coisa seja
o que é”.

Todo o ser é constituido de matéria e forma, princípios


indissociáveis. Enquanto a forma é o princípio inteligível, a
essência comum aos indivíduos da mesma espécie, pela qual
todos são o que são, a matéria é pura passividade, contendo a
forma em potência. Numa estátua, por exemplo, a matéria é o
mármore; a forma é a ideia que o escultor realiza na estátua.

É através da noção de matéria e forma se explica só devir. Todo o


ser tende a tornar actual a forma que tem em si como potência.
Assim, a semente, quando enterrada, tende a se desenvolver e se
transformar no carvalho que era em potência.

O conceito de potência não pode ser confundido com força, mas


sim com ausência da perfeição em um ser capaz de vir a possuí-
la. Pois uma potência é a capacidade de tornar-se alguma coisa, e
70 Unidade

para tal, é preciso que sofra a acção de outro ser já em acto. A


semente que contém o carvalho em potência foi gerada por um
carvalho em acto.

O movimento é pois, a passagem da potência para o acto. O


movimento é “o acto de um ser em potência enquanto tal”, é a
potência se actualizando. Tais considerações levam à distinção
dos diversos tipos de movimentos ou teoria das quatro causas: as
mudanças derivam da causa material, da causa formal, da causa
eficiênte e da causa final.

Mesmo ainda considerando o postulado parmenídeo de que o ser


é idêntico ao pensar, Aristóteles pode superar Parmênides e
Platão ao usar os conceitos acima expostos, pelos quais se
compreende a imutabilidade e a mutabilidade, o acidental e o
essencial, o individual e o universo. Se conhecer é lidar com os
conceitos universais, é também aplicar esses conceitos a cada
coisa individual. Com isso, nem é preciso justificar a imobilidade
do ser, nem criar o mundo das essencias imutáveis.

Deus, Acto Puro


Toda a estrutura teórica da filosofia de Aristóteles desemboca na
teologia. A descrição das relações entre as coisas leva ao
reconhecimento da existência de um ser superior e necessário, ou
seja, Deus. Isso porque, se as coisas são contingentes, já que tem
em si mesmas a razão de sua existência, é preciso concluir que
são produzidas por causas a elas exteriores. Assim, todo o ser
contingente foi produzido por outro ser, que também é
contingente e assim por diante. Para não ir ao infinito na
sequência de causas, é preciso admitir uma primeira causa, por
sua vez incausada, um ser necessário (e não contingente). Esse
primeiro motor (imóvel, por não ser movido por nenhum outro) é
também um puro acto (sem nenhuma potência). Chamamos Deus
ao Primeiro Motor Imóvel, Acto Puro, Ser Necessário, Causa
Primeira de todo existente.

Metafísica

A filosofia grega, desde o momento em que se destaca do


pensamento mítico, elabora conceitos para instrumentalizar a
razão no esforço de compreensão do real. Entre as diversas e
diferentes contribuições do pensamento grego, destaca-se o
caminho percorrido por Parmênides, Platão e Aristóteles na busca
dos conceitos que explicassem o ser em geral e que hoje
reconhecemos como sendo o assunto tratado pela parte da
filosofia denominada metafísica.

O termo metafísica surgiu no século I a.C., quando Andrônico de


Rodes, ao classificar as obras de Aristóteles, colocou a Filosofia
Primeira depois das obras de física: Meta Física, ou seja, “depois
da física”.

De qualquer forma, nada impediu que esse “depois”, puramente


espacial, fosse considerado “além”, no sentido de tratar de
assuntos que transcendem a física, que estão além dela porque
ultrapassam as questões postas a partir do conhecimento do
mundo sensível. Portanto, no sentido pelo qual o conhecemos
Introdução à Filosofia 71

hoje, o termo só começou a ser aplicado a partir do século V da


nossa era.

A filosofia primeira não é primeira na ordem do conhecer, já que


partimos do conhecimento sensível, mas a que busca as causas
mais universais (e portanto as mais distantes dos sentidos) e que
são as mais fundamentais na ordem real. Trata-se da parte nuclear
da filosofia, onde se estuda “o ser enquanto ser”, isto é, o ser
independentemente de suas determinações particulares.

É a metafísica que fornece a todas as outras ciências o


fundamento comum, o objecto ao qual todas se referem e os
princípios dos quais dependem. Ou seja, todas as ciências se
referem continuamente ao ser e a diversos conceitos ligados
directamente a ele, tais como identidade, oposição, diferença,
género, espécie, parte, perfeição, necessidade, possibilidade,
realidade, etc. Mas nenhuma ciência examina tais conceitos. É
nesse sentido que consideramos que o objecto da metafísica
consiste em examinar o ser e suas propriedades.

Exercícios

1 – O que é Teoria do Conhecimento?

Resposta: Teoria do conhecimento é uma disciplina filosófica que


investiga quais são os problemas decorrentes da relação entre
Auto-avaliação sujeito e objecto do conhecimento, bem como as condições do
conhecimento verdadeiro.
72 Unidade

Unidade N0 11-A0010

Tema: Possibilidade de
Conhecimento

Introdução
Uma das discussões em torno do problema do conhecimento diz
respeito à possibilidade ou não de o espírito humano atingir a
certeza. Distinguiremos inicialmente duas tendências principais:
o cepticismo e o dogmatismo.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer a origem, natureza e possibilidades do conhecimento.

 Analisar as formas e as críticas do cepticismo.


Objectivos  Conhecer e descrever as características do dogmatismo.

Sumário
Cepticismo

A palavra cepticismo vem do grego, sképtikós, que significa:


olhar à distância, examinar, observar, que considera O céptico
tanto observa e tanto considera que conclui, nos casos mais
radicais, pela impossibilidade do conhecimento, e nas tendências
moderadas, pela suspensão provisória de qualquer juízo.

Cepticismo é a doutrina que afirma que não se pode obter


nenhuma certeza a respeito da verdade, o que implica numa
condição intelectual de dúvida permanente e na admissão da
incapacidade de compreensão de fenômenos metafísicos,
religiosos ou mesmo da realidade. O termo originou-se a partir do
nome comumente dado a uma corrente filosofia originada na
Grécia Antiga.
Introdução à Filosofia 73

O Cepticismo filosófico originou-se a partir da filosofia grega e o


seu fundador é Pirro de Élis (360-275 a.C.), que viajou até a Índia
e lá estudou, e propôs a adopção do cepticismo "prático" .

Subsequentemente, na "Nova Academia", Arcesilau (315-241


a.C.) e Carnéades (213-129 a.C.) desenvolveram mais
perspectivas teóricas, que refutavam concepções absolutas de
verdade e mentira. Carnêades criticou as visões dos dogmatistas,
especialmente os defensores do estoicismo, alegando que a
certeza absoluta do conhecimento é impossível. Sexto Empírico
(200 d.C.), a maior autoridade do cepticismo grego, desenvolveu
ainda mais a corrente, incorporando aspectos do empirismo em
sua base para afirmar o conhecimento.

Ou seja, o cepticismo filosófico é procurar saber, não se


contentando com a ignorância fornecida actualmente pelos meios
públicos, por meio da dúvida. Opõem-se ao dogmatismo, em que
é possível conhecer a verdade.

Portanto, há gradações no cepticismo. Os cépticos moderados


admitem uma forma relativa do conhecimento (relactivismo),
reconhecendo os limites para a apreensão da verdade. Para outros
moderados, mesmo que seja impossível encontrar a certeza, não
se deve abandonar a busca. Mas para o cepticismo radical, como
o pirronismo, se a certeza é impossível, é melhor renunciar ao
conhecimento, o que traz, como consequência prática, a
indiferença absoluta em relação a tudo.

O cepticismo radical se contradiz ao se afirmar, pois concluir que


“toda a certeza é impossível e a verdade é inacessível” não deixa
de ser uma certeza, e tem valor de verdade.
O cepticismo costuma ser dividido em duas correntes:

 Cepticismo filosófico - uma postura filosófica em que pessoas


escolhem examinar de forma crítica se o conhecimento e percepção que
possuem são realmente verdadeiros, e se alguém pode ou não dizer se
possui o conhecimento absolutamente verdadeiro;

 Cepticismo científico - uma postura científica e prática, em que


alguém questiona a veracidade de uma alegação, e procura prová-la ou
desaprová-la usando o método científico.

As formas do cepticismo

Cepticismo absoluto, também conhecido de radical ou


sistemático: é aquele que afirma que é impossível todo e qualquer
tipo de conhecimento. Rigorosamente, é a única espécie de
cepticismo possível, porque perante o problema da possibilidade
da relação sujeito-objecto, ou se afirma ou se nega esta
possibilidade. O cepticismo absoluto ou pirrónico nega-a. Foi
defendido na antiguidade, por Pirron de Elis, que para evitar cair
em contradição, recomenda que nada se afirme nem negue, isto é,
recomenda a suspensão do juízo.

Cepticismo moderado, entende que o sujeito atinge o objecto,


porém, de modo não total, mas limitado. Rigorosamente, não é
cepticismo, porque afirma a possibilidade da relação, mas uma
74 Unidade

forma mitigada do cepticismo. Apresenta duas modalidades: o


probabilismo e o relativismo.

O probabilismo entende que é possível um conhecimento


provável, mas não um conhecimento certo; que podemos
formular uma opinião, mas não garantir uma certeza. Os seus
principais defensores foram na antiguidade: Arcesilau e
Carneades.

O relativismo sustenta que as nossas verdades são relativas que e


não absolutas. Esta posição pode resultar do sujeito ou do
objecto.

Crítica do cepticismo

O cepticismo conclui, pela impossibilidade de qualquer


conhecimento (cepticismo absoluto) ou dum conhecimento de
validade universal (cepticismo moderado).

Mas, o cepticismo não tem justificação: porque, os sentidos não


erram: os sentidos são simples instrumentos de captação de
estímulos, instrumentos limitados, que a técnica humana vai
ampliando, e nunca capacidade interpretáveis. Porque, se a razão
erra, e na verdade, erra, porque só ela interpreta, é susceptível de
corrigir o erro.

Por conseguinte, não há motivo para uma descrença total no valor


dos sentidos e da razão. Por outro lado, é evidente que, quer o
cepticismo absoluto quer o cepticismo moderado, se contradizem,
porque ambos têm a certeza da verdade absoluta das suas
posições.

Dogmatismo
A palavra dogmatismo vem do grego dogmatikós, significa, “que
se funda em princípios”, ou “relativo a uma doutrina”.
Dogmatismo é doutrina segundo a qual o homem pode atingir a
certeza.

Filosoficamente é uma atitude que consiste em admitir que a


razão humana tem a possibilidade de conhecer a realidade.

Do ponto de vista religioso, chamamos dogma a uma verdade


fundamental e indiscutível da doutrina. Na religião cristã, por
exemplo, há o dogma da Santissima Trindade, segundo a qual as
três pessoas (Pai, Filho e Espirito Santo) não são três deuses, mas
apenas um. Deus é uno e trino. Não importa se a razão consegue
entender, já que é um principio aceito pela fé e o seu fundamento
é a revelação divina.

Quando transpomos a ideia de dogma para o campo não-


religioso, ela passa a designar as verdades inquestionáveis. Só
que, nesse caso, não se estando no domínio da fé religiosa, o
dogmatismo torna-se prejudicial, já que o homem, de posse de
uma verdade, fixa-se nela e abdica de continuar a busca.

O mundo muda, os acontecimentos se sucedem e o homem


dogmático permanece petrificado nos conhecimentos dados de
uma vez por todas. Nietzsche dizia que “as convicções são
Introdução à Filosofia 75

prisões”. Refractário ao diálogo, o homem dogmático teme o


novo e não raro se torna intransigente e prepotente. Quando
resolve agir, o fanatismo é inevitável, e com ele, a justificação da
violência.

Também chamamos dogmáticos, os seguidores de “escolas” e


tendências quando se recusam a discutir suas verdades,
permanecendo refractários às mudanças.

Quando o dogmatismo atinge a politica, assume um caracter


ideológico que nega o pluralismo e abre caminho para a
imposição da doutrina oficial do Estado e do partido único, com
todas as infelizes decorrências, como sensura e repressão. Em
nome do dogma da raça ariana, Hítler cometeu genocídios dos
judeus e ciganos nos campos concentração.

Exercícios

1 – Quais são as correntes que falam da possibilidade do espírito


humano alcançar ou não o conhecimento?

Resposta: são o cepticismo e o dogmatismo.


Auto-avaliação
76 Unidade

Unidade N0 12-A0010

Tema: Origem do conhecimento

Introdução
Desde a antiguidade a Filosofia buscou perceber sobre qual era a
origem do conhecimento. Alguns defenderam que o homem
nasce com os conhecimentos, e outros ainda afirmaram que o
conhecimento adquir-se pela experiência.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer a origem do conhecimento.

 Identificar as Correntes e os representantes da origem do


conhecimento.
Objectivos

Sumário
Empirismo

A palavra empirismo vem do grego empeiria, que significa


“experiência”. O empirismo, sustenta que todo o conhecimento
é, de raiz; particular e contingente, a posteriori, visto que procede
inteiramente da experiência, isto é, o fundamento e a fonte de
todo e qualquer conhecimento é experiência sensível, responsável
pela existência das ideias na razão e controlando o trabalho da
própria razão, pois o valor e o sentido da actividade racional
dependem do que é determinado pela experiência sensível.

Para os empiristas, o modelo do conhecimento verdadeiro é dado


pelas ciências naturais ou ciências experimentais, como a física e
a química. Os principais representantes do empirismo são:
Francis Bacon, John Locke e David Hume.

Francis Bacon

Francis Bacon (1561-1626), seguindo a tradição empirista inglesa


que remonta a Roger Bacon (séc. XIII), realça o significado
histórico da ciência e do papel que ela poderia desempenhar na
vida da humanidade. Seu lema “saber é poder” mostra como ele
Introdução à Filosofia 77

procura, bem no espírito da nova ciência, um saber instrumental,


que possibilita a dominação da natureza.

Na sua obra Novum Organon (Novo órgão, no sentido de


instrumento de pensamento), Bacon faz uma crítica da lógica
aristotélica, opondo ao ideal dedutivista a eficácia da indução
como método da descoberta.

Inicia pela denúncia dos preconceitos e noções falsas que


dificultam a apreensão da realidade, aos quais chama de ídolos.

Os ídolos da tribo: estão fundados na própria natureza humana,


na própria tribo ou espécie humana. Todas as percepções, tanto
dos sentidos como da mente, guardam analogia com a natureza
humana e não com o universo. Isso significa que muitos dos
nossos enganos derivam da tendência ao antropomorfismo.

Os ídolos da caverna: são os dos homens enquanto indivíduos.


Pois cada um, além das aberrações próprias da natureza em geral,
tem uma caverna ou uma cova que intercepta e corrompe a luz da
natureza; seja devido à natureza própria singular de cada um; seja
devido à educação ou conversação com os outros.

Os ídolos do foro: são os provenientes, de certa forma, das


relações estabelecidas entre os homens devido ao comércio.
“Com efeito, os homens se associam graças ao discurso, e as
palavras são cunhadas pelo vulgo. E as palavras, impostas de
maneira imprópria e inepta, bloqueiam espontaneamente o
intelecto. E os homens são assim arrastados a inúmeras e inúteis
controvérsias e fantasias”.

Os ídolos do teatro: são os “ídolos que imigraram para o espírito


dos homens por meio das diversas doutrinas filosóficas e também
pelas regras viciosas da demonstração. Ademais, não pensamos
apenas nos sistemas filosóficos, na sua universalidade, mas nos
numerosos princípios e axiomas das ciências que entraram em
vigor, mercê da tradição, da credulidade e da negligência”.

Francis Bacon desenvolve um estudo da indução a partir do


carácter estéril do silogismo e insiste na necessidade da
experiência e da investigação segundo métodos precisos.

John Locke
John Locke (1632 – 1704) tornou-se conhecido pela contribuição
como teórico do liberalismo. Sua reflexão a respeito da teoria do
conhecimento parte da leitura da obra de Descartes e consiste em
saber “qual é a essência , qual é a origem, qual é o alcance do
conhecimento humano”. Na sua obra Ensaio sobre o
entendimento humano, Locke deixa o caminho “lógico”
percorrido por Descartes e escolhe o “psicológico”.

Escolhendo o caminho psicológico, distingue duas ideias


possíveis para as nossas ideias: a sensação e a reflexão.

A sensação é o resultado da modificação feita na mente através


dos sentidos, e a reflexão é a percepção que a alma tem daquilo
que nela ocorre. Portanto, a reflexão se reduz apenas a
78 Unidade

experiência interna do resultado da experiência externa produzida


pela sensação.

David Hume

David Hume (1711-1776), filósofo escocês, leva mais adiante o


empirísmo de Francis Bacon e Locke. Partindo do princípio de
que só os fenômenos são observáveis e de que o mecanismo
íntimo do real não é passível da experiência, afirma que as
relações são exteriores aos seus termos, ou seja, se não são
observáveis, não podem pertencer aos objectos.

As relações são simples modo que o homem tem de passar de um


objecto a outro, de um termo a outro, de uma ideia particular a
outra. São apenas passagens externas que nos permitem associar
os termos a partir dos princípios de causalidade, semelhança e
contiguidade.

Assim, Hume nega a validade universal do princípio de


causalidade e da noção de necessidade a ele associada. Para
Hume, o que observamos é a sucessão dos factos ou a sequência
de eventos, e não o nexo causal entre esses mesmos factos ou
eventos. O que nos faz ultrapassar o dado e afirmar mais do que
pode ser alcançado pela experiência é o hábito criado através da
observação dos casos semelhantes. A partir deles, imaginamos
que o facto actual se comportará de forma análoga.

A única base para as ideias ditas gerais, é a crença, que, do ponto


de vista do entendimento, faz uma extensão ilegítima do
conceito.

O racionalismo

Doutrina que afirma que tudo que existe tem uma causa
inteligível, mesmo que não possa ser demonstrada de fato, como
a origem do Universo. Privilegia a razão em detrimento da
experiência do mundo sensível como via de acesso ao
conhecimento. Considera a dedução como o método superior de
investigação filosófica. René Descartes (1596-1650), Spinoza
(1632-1677) e Leibniz (1646-1716) introduzem o racionalismo
na filosofia moderna. Friedrich Hegel (1770-1831), por sua vez,
identifica o racional ao real, supondo a total inteligibilidade deste
último. O racionalismo é baseado nos princípios da busca da
certeza e da demonstração, sustentados por um conhecimento a
priori, ou seja, conhecimentos que não vêm da experiência e são
elaborados somente pela razão.

Na passagem do século XVIII para o XIX, Immanuel Kant


(1724-1804) revê essa tendência de associar o pensamento à
análise pura e simples e inaugura o neo-racionalismo. A nova
doutrina aceita as formas a priori da razão, afirmando, entretanto,
que elas necessariamente devem ser conjugadas aos dados da
experiência para que possa haver conhecimento. O racionalismo
dos séculos XVII e XVIII influencia a religião e a ética até hoje.

Está presente nas várias seitas do protestantismo, que dispensam


a autoridade e a revelação religiosa em favor dos postulados
lógicos e racionais sobre a existência de Deus. Influencia,
Introdução à Filosofia 79

também, a conduta moral que atribui à razão e aos princípios


inatos de bondade, entre outros, a capacidade humana de se bem
conduzir.

O racionalismo cartesiano
René Descartes (1596-1650), cujo nome latino era Cartesius (daí
seu pensamento ser conhecido como “cartesiano”), é considerado
o “pai da filosofia moderna”. Dentre suas obras, o Discurso do
método e Meditações metafísicas expressa a tendência de
preocupação com o problema do conhecimento. O ponto de
partida é a busca de uma verdade primeira que não possa ser
posta em dúvida. Por isso, converte a dúvida em método. Começa
duvidando de tudo, das afirmações do senso comum, dos
argumentos da autoridade, do testemunho dos sentidos, das
informações da consciência, das verdades deduzidas pelo
raciocínio, da realidade do mundo exterior e da realidade de seu
próprio corpo.

O cogito

Descartes só interrompe essa cadeia de dúvidas diante de seu


próprio ser que duvida. Se duvido, penso; se penso, existo:
“Cogito, ergo sum”, “Penso, logo existo”. Eis, aí o fundamento, o
ponto de partida para a construção de todo o seu pensamento.
Mas este “eu” cartesiano é puro pensamento, pois, no caminho da
dúvida, a realidade do corpo (res extensa, coisa externa,
material), foi colocada em questão.

A partir dessa intuição primeira (a existência do ser que pensa),


que é indubitável, Descartes distingue os diversos tipos de idéias,
percebendo que algumas são duvidosas e confusas e outras são
claras e distintas.

As idéias claras e distintas são idéias gerais que não derivam do


particular, mas já se encontram no espírito, como instrumentos de
fundamentação para a apreensão de outras verdades. São as
idéias inatas, que não estão sujeitas a erro pois vêm da razão,
independentemente das idéias que “vêm de fora”, formadas pela
acção dos sentidos, e das outras que nós formamos pela
imaginação. São inatas, não no sentido de o homem já nascer
com elas, mas como resultantes exclusivas da capacidade de
pensar. São idéias verdadeiras. Nessa classe estão a idéia de
substância infinita de Deus e a idéia de substância finita, com
seus dois grandes grupos: a res cogitans e a res extensa.

Embora o conceito de idéias claras e distintas resolva alguns


problemas com relação à verdade de parte do nosso
conhecimento, não dá nenhuma garantia de que o objecto
pensado corresponda a uma realidade fora do pensamento. Como
sair do próprio pensamento e recuperar o mundo.

Deus

Para isso, lança mão, entre outras provas, da famosa prova


ontológica da existência de Deus. O pensamento deste objecto –
Deus – é a idéia de um ser perfeito; se um ser é perfeito, deve ter
80 Unidade

a perfeição da existência, se não lhe faltaria algo para ser


perfeito.

O mundo

Se Deus existe e é infinitamente perfeito, não me engana. A


existência de Deus é garantia de que os objectos pensados por
idéias claras e distintas são reais. Portanto, o mundo tem
realidade. E dentre as coisas do mundo, o meu próprio corpo
existe. O que caracteriza a natureza do mundo é a matéria e o
movimento (res extensa), em oposição à natureza espiritual do
pensamento (res cogitans).

Podemos perceber, nesse relato, uma tendência forte e absoluta


de valorização da razão, do entendimento e do intelecto.

O intelectualismo
O intelectualismo, do latim intus legere = ler dentro, é uma
criação de Aristóteles (séc. IV a.C.), mais tarde desenvolvida por
Santo Tomás de Aquino. Aristóteles estava sob influência de
duas correntes opostas, a empirista dos pré-socráticos e a
racionalista de Platão, de que era discípulo. O intelectualismo é
superação destes contrários.

Aristóteles concorda com Platão, que só há ciência em geral, do


universal e do necessário, que o verdadeiro conhecimento é
constituído por idéias. Porém, porque é mais amigo da verdade
que do mestre, recusa a teoria da reminiscência. No seu entender,
as idéias não estão fora e por cima deste mundo. Estão nas coisas,
no fundo das coisas, encobertas pelo véu dos caracteres
existenciais, particulares e contingentes, de cada coisa concreta.

Constituem a síntese dos caracteres comuns, essenciais, das


coisas. Importa, pois, afastar o véu das aparências mutáveis para
se apreender, então, a verdadeira realidade, a idéia ou essência.
E, como?

Os sentidos põem-nos em contacto com as existências, as coisas


concretas, dão-nos delas imagens sensíveis, percepções.
Seguidamente, a razão debruça-se sobre essas percepções e extrai
delas as essências. Utiliza, para isso, duas faculdades: o intelecto
activo ou agente e o intelecto passivo ou possível.

O intelecto activo ou agente é uma luz potente que atravessa o


véu das características singulares e põe a descoberto, no fundo da
coisa, a essência mesma. Realiza assim a leitura do
conhecimento, que, imediatamente é recebido, tanto quanto
possível, pelo intelecto passivo ou possível.

Construtivismo
No construtivismo, Piaget afirma o seguinte: “só se conhece e
aprende aquilo que se faz”. Portanto, o conhecimento resulta não
da assimilação de percepções, mas da interiorização das acções
do sujeito sobre os objetos.

Esta teoria opõe-se ao empirismo e, em certo sentido aproxima-se


do apriorismo Kantiano, do qual dá versão psicológica e
Introdução à Filosofia 81

experimental, pondo em evidência o carácter evolutivo e


processual da estruturação dos conceitos com base nos quais
opera o nosso conhecimento.

O construtivismo defende a tese de que qualquer conhecimento, é


produto de uma construção progressiva a partir das formas
evolutivas da embriogénese biológica. Quanto mais avançamos
no conhecimento do desenvolvimento lingüístico da criança,
mais tomamos consciência da actividade intensa que ela
desenvolve na descoberta das regras e das funções da sua própria
capacidade lingüística.

Relativismo
O relativismo entende que não existem verdades absolutas, mas
apenas verdades relativas, que têm uma validade limitada a um
certo tempo, a uma situação determinada. É o oposto do
absolutismo, que defende a existência de verdades absolutas.

Exercícios

1 – Quais são as principais correntes da origem do


conhecimento?

Resposta: são o racionalismo e o empirismo.


Auto-avaliação
82 Unidade

Unidade N0 13-A0010

Tema: Natureza do conhecimento

Introdução
Assim como no capitulo anterior falamos da origem do
conhecimento, nesse capitulo abordaremos sobre a natureza do
conhecimento. Alguns pensadores indicam que o conhecimento e
real e outros ainda, que o conhecimento e ideal.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer a natureza do conhecimento.

 Identificar as Correntes e os representantes da natureza do


conhecimento.

 Mencionar as implicações educativas inerentes ao adulto.


Objectivos

Sumário
Realismo

Realismo é a posição filosófica que afirma a existência objectiva


ou em si da realidade externa como uma realidade racional em si
e por si mesma e, portanto, que afirma a existência da razão
objetiva.

O realismo se manifestou naturalmente e de modo sistemático na


filosofia antiga e medieval. A partir do século XII, com o advento
da filosofia moderna e do idealismo, o realismo não tem deixado
de se manifestar em escolas e pensadores dos mais diversos.
Assim destacam-se os seguintes representantes: Russel e Samuel
Alexander, que representam o neo-realismo inglês; Jasper e
Sartre, que são os filósofos existencialistas; Lukacs e Kosik são
pensadores marxistas, como, aliás, Sartre também.

Formas do realismo

Realismo ingênuo: espontaneamente convictos de que o sujeito


apreende, imediatamente, e na sua corporeidade, o objeto, os
primeiros pensadores não se dão conta de que o conhecimento de
Introdução à Filosofia 83

modo mediato, através duma percepção. E, porque não


distinguem o conteúdo da percepção do objecto percepcionado,
são, espontaneamente, levados a considerar objectivas, isto é,
como existindo nas coisas, todas as qualidades daquele conteúdo.
Quer dizer, o objecto é tal qual o sujeito o percepciona: é um
realismo ingênuo.

Realismo natural: o posterior aparecimento do espírito crítico


põe a descoberta isso mesmo que o realismo ingênuo ignora: que
o conhecimento não se faz por contacto direto, mas mediante
uma percepção. Distingue-se, pois, entre conteúdo da consciência
e objeta percebido. Porém, continua naturalmente a acreditar-se
que todas as propriedades desse conteúdo exprime as do objeto. É
um realismo natural: o vermelho existe na crista do galo, o
agradável na aroma da flor, a doçura no açúcar, etc. Esta
concepção foi defendida por Aristóteles e vigorou até a idade
moderna. É característica da física medieval, uma física
qualitativa.

Realismo crítico: a partir do século XVI, com a conversão da


física a ciência quantitativa, o realismo natural cede ao realismo
crítico, para quem só são objetivas, só existem realmente nas
coisas, as propriedades atingidas por mais do que um sentido, a
saber, a extensão e o movimento. Todas as outras – cores, sons,
sabores, odores – experimentados por um só sentido, não existem
nos objetos, são meras reações subjetivas da nossa sensibilidade.
Pois que nas coisas só existem a extensão e o movimento, então,
a matéria ou o mundo reduz-se a figuras e a números, isto é, a
matemática. A física moderna é uma físico-matemática. As
propriedades objetivas, percebidas por mais do que um sentido,
chamará, mais tarde Locke, qualidades primárias, e as restantes,
de natureza subjetiva, as qualidades secundárias..

Em conclusão e fundamentalmente, o realismo reduz-se em duas


formas: natural e crítico.

Idealismo

Tendência filosófica que reduz toda a existência ao pensamento.


Opõe-se ao realismo, que afirma a existência dos objetos
independentemente do pensamento. No idealismo absoluto, o ser
é reduzido à consciência. Ao longo da história da filosofia, ele
aparece sob formas menos radicais não nega categoricamente a
existência dos objetos no mundo, mas reduz o problema à
questão do conhecimento. O idealismo toma como ponto de
partida para a reflexão o sujeito, não o mundo exterior.

O idealismo metódico de Descartes é uma doutrina racionalista


que, colocando em dúvida todo o conhecimento estabelecido,
parte da certeza do pensar para deduzir, por meio da idéia da
existência de Deus, a existência do mundo material. O idealismo
dogmático surge com George Berkeley (1685-1753), que
considera a realidade do mundo exterior justificada somente pela
sua existência anterior na mente divina ou na mente humana.
Para ele, "ser é ser percebido".

Immanuel Kant formula o idealismo transcendental, no qual o


objeto é algo que só existe em uma relação de conhecimento. Ele
84 Unidade

distingue, portanto, o conhecimento que temos dos objetos,


sempre submetidos a modos especificamente humanos de
conhecer, como as idéias de espaço e tempo, dos objetos em si,
que jamais serão conhecidos. Na literatura, o romantismo adota
boa parte dessas idéias.

Johann Gottlieb Fichte (1762-1814) e Friedrich Von Schelling


(1775-1854) desenvolvem esse conceito e se tornam expoentes
do idealismo alemão pós-kantiano. Eles conferem às idéias de
Kant um sentido mais subjetivo e menos crítico: desconsideram a
noção da coisa-em-si e toma o real como produto da consciência
humana. Friedrich Hegel (1770-1831) emprega o termo
idealismo absoluto para caracterizar sua metafísica. Ao
considerar a realidade como um processo, ele discute o
desenvolvimento da idéia pura (tese), que cria um objeto oposto a
si - a natureza (antítese) -, e a superação dessa contradição no
espírito (síntese). Esse movimento se dá na história até que o
espírito se torne espírito absoluto, ou seja, supere todas as
contradições, por meio da dialética, e veja o mundo como uma
criação sua.

Exercícios

1 – Quais são as principais correntes da natureza do


conhecimento?

Resposta: são o realismo e o idealismo.


Auto-avaliação
Introdução à Filosofia 85

Unidade N0 14-A0010

Tema: Níveis de conhecimento

Introdução
Como acabamos de nos referir acima que, conhecimento é uma
relação que se estabelece entre o sujeito que conhece e o objeto
conhecido. O sujeito que conhece se apropria, de certo modo, do
objeto conhecido.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer os níveis do conhecimento.

 Analisar a importância, limites e perigos do conhecimento cientifico.


Objectivos  Descrever as perspectivas da anàlise do conhecimento.

Sumário
Como acabamos de nos referir acima, conhecimento é uma
relação que se estabelece entre o sujeito que conhece e o objeto
conhecido. O sujeito que conhece se apropria, de certo modo, do
objeto conhecido.

Através do conhecimento, reconstruímos, em nós, a realidade (o


Ser), através de imagens (conhecimento sensível) e de idéias
(conhecimento intelectual).
a) Senso comum ou popular: é o conhecimento do povo, que nasce da
experiência do dia-a-dia: por isso, é chamado também de “empírico”, ou
“vulgar”, quer dizer, do povo (criança, lavrador iletrado, dados
encontrados na TV, nos jornais etc.). É ametódico e assistemático, mas é
a base do saber.

b) Científico: durante a Antigüidade e a Idade Média desenvolveu-se um


saber racional, distinto do mito e do saber comum: e era chamado de
filosofia.
Mas, a partir de Galileu (1564-1642), nasce a ciência moderna
pois é determinado o objeto e o método desta ciência. A ciência
86 Unidade

tem como objeto a descoberta das leis que presidem os


fenômenos sensíveis; e, como método, serve-se da observação
sistemática e, quando possível, da experimentação. Dessa
maneira, a ciência se separa da filosofia.

As ciências são particulares, pois privilegiam setores distintos da


realidade sensível (física, química, biologia...). Serve-se de
instrumentos (balança, termômetro, microscópio, computador...)
e utilizam a matemática (ex. na estatística). Mesmo aspirando à
objetividade, as ciências não são infalíveis: para o filósofo Karl
Popper (1902-1994), todo conhecimento científico é hipotético e
se desenvolve a partir de erros anteriores.

A ciência gerou a tecnologia que mudou o habitat humano,


particularmente no século XX. De fato, permite a previsibilidade
dos fenômenos: o que possibilita um maior poder para a
transformação da natureza.
c) Filosófico: Enquanto as ciências estudam uma parte da realidade
sensível, a filosofia questiona todas as coisas, procurando saber sua
essência (o que é?), sua origem (de onde vem?), seu destino (para onde
vai?), seu sentido (por quê?).
Do ponto de vista etimológico, “filosofia” significa “amor à
sabedoria”. Pode ser definida como “aquela disciplina que
procura descobrir o sentido último (origem, essência, destino) de
todas as coisas, servindo-se da razão (método racional)”. Por
isso, a filosofia tem como objeto analisar tudo.

A título de exemplo, enquanto o biólogo (cientista) questiona os


dados sensíveis do ser humano (como a célula, o tipo de
sangue...), o filósofo questiona o homem como um todo e se
pergunta: Quem é o homem? De onde ele vem? Para onde ele
vai? Quais são seus elementos constitutivos fundamentais?

Os principais problemas da filosofia são: cosmológico (do


mundo); gnosiológico (do conhecimento); epistemológico
(questiona a ciência); antropológico (do homem); metafísico ou
ontológico (do ser e de sua origem); ético (do bem e do mal);
político (da sociedade); estético (da arte); pedagógico (da
educação); lingüístico (filosofia da linguagem); jurídico (filosofia
do direito).

Na filosofia, além de estudar as reflexões dos pensadores do


passado, colocam-se as novas questões que surgem na atualidade,
por exemplo, o sentido da técnica, os aspectos éticos da
globalização ou da engenharia genética.

d) teológico: A verdade pode ser encontrada tanto pelo caminho da

investigação (nas ciências e na filosofia), como pelo caminho da

revelação e do encontro com o Transcendente (típico da experiência


Introdução à Filosofia 87

religiosa). O homem responde à “Revelação de Deus” através da

“Fé”.

A Teologia procura integrar os conhecimentos da Razão com os


dados da Fé. Seu método é, pois, caracterizado por esta
integração; enquanto que seu objeto de investigação é constituído
pelos dados da fé.

No exemplo específico do cristianismo, pertencem à razão os


seguintes dados: a existência histórica de Moisés, dos profetas, de
Jesus de Nazaré, dos apóstolos; a historicidade dos evangelhos; o
estudo dos gêneros literários ou das línguas da Bíblia, etc.

E pertencem à fé as afirmações do credo cristão: Jesus Filho de


Deus e Salvador, o perdão dos pecados, a ressurreição final, etc.

Fé e razão são as duas asas através das quais o espírito humano


“voa” rumo à verdade. Por isso, a fé e a razão podem se
enriquecer reciprocamente.

A ciência sem a religião é claudicante; e a religião sem a ciência


é cega, diz Albert Einstein. O filósofo francês Jacques Maritain
(1882-1973), na sua obra “Os graus do saber”, fala de cinco graus
de conhecimento: 1. O saber da ciência; 2. o saber da
matemática (a abstração do número); 3. o saber filosófico; 4. o
saber teológico (síntese entre fé e razão); 5. o saber místico (a
experiência direta de Deus em si mesmo e na sua relação com o
homem, típica da oração contemplativa).

Para ele, no que diz respeito à relação fé-razão, os princípios do


saber provêm da razão; e a fé oferece o sentido da verdade, a
necessidade de procurá-la. A fé confere à razão seja o sentido do
seu limite (pois a razão não explica tudo), seja um corpo de
verdades transcendentais, quer dizer, comuns a toda a
humanidade, que dão sentido ao saber: por exemplo, o
cristianismo ensinou a fé no progresso civil da humanidade; a
dignidade da pessoa humana; a dignidade do povo; a igualdade
entre os homens; o caráter relativo de toda autoridade; a
coincidência entre política e moral; a liberdade; a fraternidade.

Importância e perigos do conhecimento científico

O nascimento do “método científico” é, ao mesmo tempo, o


início de um processo que, juntamente com outros factores
(políticos, sociais, culturais), foi definido como “época
moderna”, ou “modernidade”.
88 Unidade

Nesse processo começa a emergir um novo tipo de humanidade,


consciente da própria autonomia e de sua própria força racional.
No momento em que Descates cunha o famoso axioma “Penso,
logo existo”, a razão começa a celebrar o seu triunfo.

Tal autonomia do ser humano recebe novo impulso a partir do


século XVIII, com a civilização industrial ou o desenvolvimento
técnico-científico. A civilização tecnológica trouxe consigo uma
crescente urbanização, com o conseqüente anonimato citadino,
uma mobilidade constante, a valorização da educação, das
mudanças e do progresso, e uma acentuada disparidade ente
países ricos e países pobres. Tanto os países capitalistas como os
socialistas tiveram o mesmo ideal: resolver os problemas da
humanidade pelo ter mais e pelo não ser mais.

A civilização tecnológica é essencialmente urbana: e no século


XX, esse fenômeno se generalizou no mundo inteiro. Então, viu-
se que o mundo está a se tornado “cidade”, mas as cidades de
hoje têm seus grandes contrastes de vida e de morte, de esperança
e de desespero.

A civilização tecnológica separa o homem da natureza e obriga a


viver em um ambiente totalmente artificial, e não inadequado,
tirânico e psicologicamente aterrador.

A educação hoje não é mais responsabilidade apenas da família,


pois se tornou condição essencial no processo de
desenvolvimento técnico-científico. Eis a razão pela qual as
sociedades tecnopolitanas investem uma grande percentagem do
seu orçamento na educação, o que consequentemente, estimula as
pesquisas científicas. A racionalidade, o espírito crítico e a
evolução do próprio pensamento filosófico requerem uma
margem muito grande de liberdade de pensamento e de
expressão.

O homem tecnopolitano se caracteriza por uma crença quase cega


com referência ao poder das ciências e da técnica. Como estas
são dinâmicas e não estáticas, o homem de hoje valoriza, e às
vezes de maneira ingênua e irracional, as mudanças e o
progresso. Para ele, as ciências e a técnica são as únicas vias de
acesso à solução de todo e qualquer problema. Essa crença na
ciência esta vinculada a “fé” num progresso sem limites.

Portanto, o que vale é o pregresso, não importante que ele seja


racional, trazendo assim benefícios a todos, ou se irracional,
destruído e ameaçador.

Quanto maior forem as descobertas científicas, maior é mudança


de ritmo na vida dos homens: mudanças de mentalidade e a
maneira de ser, do conceber a realidade e de se relacionar com a
mesma. Estes sucessos científicos levaram fizeram com que os
filósofos ganhassem maior confiança nas ciências físico-
matemáticas, deprecionando todo o tipo de saber que não é
empírico.
Introdução à Filosofia 89

August Comte (1798-1857), inspirado pela realidade do século


XVII, fez um estudo geral da evolução da história e formulou a
lei dos três estádios, segundo a qual a humanidade, assim como o
psiquismo humano, atravessa três estádios, a saber: teológico,
metafísico e positivo.

O estádio teológico, corresponde à infância, o metafísico à


juventude e o positivo à sua maturidade. No estádio positivo não
se admite a justificação nem teológica, nem filosófica da
realidade, mas apenas a científica. O científico está ligado ao
empírico, ao prático.

O critério científico deita por terra todo o discurso relativo à


religião e aos sentimentos que são constitutivos do homem. A
Ciência, mostra-se como aquela que vem emancipar o homem do
obscurantismo, da tradição, da cultura, etc., tornando-o mais
racional, procurando, cada vez mais o seu bem-estar. É, portanto,
progressista.

A ciência proporcionou um avanço tecnológico, que nem sempre


se mostrou favorável ao homem. A crença no progresso vacilou
com II Guerra Mundial. Os efeitos do industrialismo tornam-se
assustadoramente evidentes da degradação do meio ambiente, no
esgotamento dos recursos naturais não renováveis e na
desorientação da camada do ozono.

A tecno-ciência é ao mesmo tempo construtora e destruidora.


Enquanto se produz cimento para melhorar a habitação dos
homens, destrói-se consequentemente a camada do ozono,
através dos gazes que a indústria expele no acto de fabrico do
cimento, tão necessária para a sobrevivência humana. Como não
é difícil perceber, o homem auto-destrói-se-à medida que procura
emancipar-se. Este ponto fez com que Francis Fukuyama
negasse a própria idéia de progresso.

Outro ponto em que o avanço da ciência tecnológica mingua


refere-se à substituição de mão de obra humana pelas máquinas.
O trabalho realizado pelas máquinas tende a ser mais perfeito do
que o feito pelas mãos humanas. As conseqüências disto são
desastrosas. Por exemplo: um computador leva ao desemprego
milhares e milhares de homens, desgraçando assim muitas
famílias.

Limites do conhecimento científico

As limitações da ciência em responder aos problemas concretos


do homem fez com que a confiança autrora dada à ciência
passasse a ser questionada. A classificação tripartida da história
humana, proposta pelo positivismo errou por ter hipertrofiado o
método das ciências experimentais, desvalorizando todo o tipo
de saber diferente do proposto pelo seu método.

Dilthey, o maior representante da nova corrente filosófica oposto


ao positivismo, observa que o método positivo das ciências
90 Unidade

experimentais satisfaz apenas às exigências do estudo dos


fenômenos naturais, sendo absolutamente inadequado para o
estudo e a compreensão dos fenômenos culturais ou espirituais.

Existe, portanto, dois grupos de ciências: o das ciências da


natureza e o das ciências do espírito, cada um deles dotado de
método próprio e, por isso, também de objecto próprio.

Perspectivas de análise do conhecimento

Perspectiva fenomenológica – conhecimento como um


fenômeno

A fenomenologia é um método de análise ou uma atitude face ao


real, que consiste em descrever aquilo que se manifesta ou
aparece numa experiência. A palavra “fenômeno”, nesta
perspectiva, significa, “o que se manifesta ou revela, o que se
mostra”.

O fenômeno constituiu-se pois, como descrição dos elementos


presentes numa situação, numa vivência, procurando observar e
descrever aquilo que se passa, com o objectivo de captar a
estrutura geral do que acontece.

A fenomenologia procura centrar-se na captação directa daquilo


que nos é imediatamente dado no mundo da consciência. Propõe-
se orientar a investigação para a matéria concreta das nossas
vivências, para observação daquilo que nos é dado ou que se nos
revelam por si mesmo, na intuição dos dados presentes à
consciência. Antes de tentar qualquer tipo de interpretação,
pretende deixar falar os dados da nossa experiência imediata,
fazer a descrição do que é dado à consciência do sujeito.

A fenomenologia realça, pois, a intuição e a receptividade da


nossa apreensão directa dos fenômenos; analisa o modo como os
factos se apresentam à consciência.

Na descrição dos conteúdos da consciência, ou das coisas tal


como elas surgem perante a consciência, a fenomenologia
procura descobrir as estruturas e as características fundamentais
dos vários domínios da experiência.

Nicolai Hartmann (1882-1950), filósofo alemão mostrou a


análise fenomenológica segundo os seguintes passos:
 No conhecimento existe alguém que conhece, algo a conhecer e um
encontro entre estes dois elementos – uma interacção e uma correlação;

 No conhecimento, o sujeito como que sai de si, está fora de si e


regressa a si com as determinações do objecto;

 A função do objecto no conhecimento é deixar-se apreender, a função


do sujeito é apreender o objecto;
Introdução à Filosofia 91

 O conhecimento é uma apreensão que o sujeito faz das determinações


do objecto;

 O conhecimento é, portanto, uma relação de representação, isto é, o


sujeito é um ser capaz de ter “presente” o objecto, mesmo quando este
está ausente; na verdade, o sujeito é dotado de uma faculdade de
representar o objecto na sua essência, faculdade essa a que chamamos
“consciência”; na consciência, o sujeito representa, através de uma
imagem, ou, através de um conceito, um conjunto de objectos.

Perspectiva filogética – história evolucionista

A perspectiva filogenética trata da evolução das espécies; os


estudos antropológicos e paleontológicos dão-nos conta de uma
progressiva transformação do sistema nervoso, desde os
primeiros animais invertebrados até ao homem. A natureza
selecciona e aprova a adaptação biogenética. Por exemplo: um
lago ou um mar que seca só deixa a possibilidade de
sobrevivência aos peixes que possam respirar o ar atmosférico.

Deste modo, a libertação das mãos e a posição erecta levou o


Homo sapiens ao desenvolvimento bio-psico-social, em que as
actividades sensório-motores passaram, através da experiência, às
actividades perceptivo motoras, tornando possível uma
interiorização das imagens que, por sua vez, constituíram o
suporte da linguagem e da reflexão.

Perspectiva ontogenética – formação das estruturas


cognitivas

No nascimento e no desenvolvimento cognitivo, há uma relação


entre o individuo e o meio, relação esta, que é determinada por
um processo de adaptação do indivíduo ao meio.

Para Jean Piaget, neste processo de adaptação identificam-se duas


actividades inter-relacionadas: assimilação e acomodação, que
por sua vez resulta no equilíbrio.

Deste modo, pela actividade, acção e movimento, a criança vai


assimilando ou incorporando o mundo exterior e, acomodando-se
ou integrando-se nesse mundo, estabelecendo os estádios de
equilíbrio cada vez mais estáveis.

Elementos do conhecimento: sujeito e objecto

“Conhecer é representar cuidadosamente o que é exterior à


mente” (Richard Rorty). A representação, por sua vez, é o
92 Unidade

processo pelo qual a mente torna presente diante de si a imagem,


a idéia ou o conceito de algum objecto.

Portanto, para haja o conhecimento, sempre será necessária a


relação entre dois elementos básicos: um sujeito conhecedor (
nossa consciência, nossa mente) e um objecto conhecido ( a
realidade, o mundo, os inúmeros fenômenos). Só haverá
conhecimento se o sujeito conseguir apreender o objecto, isto é,
consegui-lo representar mentalmente.

Dependendo da corrente filosófica, será dada, no processo de


conhecimento, maior ou menor importância ao sujeito (é o caso
do idealismo) ou ao objecto (é o caso do realismo ou
materialismo).

Para o realismo, as percepções que temos dos objectos


correspondem de facto às características presentes nesses
objectos, na realidade, e, para o idealismo, o sujeito é que
predomina em relação ao objecto, isto é, o objecto se mostra
como realmente é ao sujeito que o percebe, determinando o
conhecimento que se estabelece.

Classificação das ciências segundo Augusto Comte

Augusto Comte considera a existência de seis ciências


fundamentais: a matemática, a astronomia, a física, a química, a
biologia e a física social - a hierarquia que se estabelece
naturalmente entre elas, baseia-se em critérios históricos, lógicos
e pedagógicos.

A hierarquia das ciências fundamentais indica a ordem histórica


necessária pela qual foram nascendo, o espírito humano tendo
passado ao objecto mais complicado só depois de dominar os
mais simples e nessa perspectiva o recente intento de fundar a
física social como ciência positiva, supunha obviamente os
progressos alcançados nas demais ciências.

A filosofia não é equiparada às ciências fundamentais que são


objecto da referida classificação hierárquica. Cada uma destas
ciências é particularizada por uma classe própria de problemas e
por um método específico de abordagem dos mesmos, muito
embora respeitando os princípios gerais do método positivo,
condição necessária ao estatuto do saber científico.

A questão da Verdade

A palavra verdade vem do latim veritas, para significar validade


ou eficácia dos procedimentos cognoscitivos. Em geral, entende-
se por verdade, a qualidade em virtude da qual um procedimento
cognoscitivo qualquer se torna ou obtêm êxitos.
Introdução à Filosofia 93

Essa caracterização pode ser aplicada tanto às concepções


segundo as quais o conhecimento é um processo mental quanto
às que o considera um processo lingüístico ou semiótico.

O desejo de verdade aparece muito cedo nos seres humanos e se


manifesta como desejo de confiar nas coisas e nas pessoas, isto é,
de acreditas que as coisas são tais como as percebemos e o que
as pessoas nos dizem é digno de confiança e de crédito. Ao
mesmo tempo, nossa vida cotidiana é feita de pequenas e grandes
decepções e, por isso, desde cedo, vemos as crianças
perguntarem aos adultos se tal ou qual coisa “é de verdade ou de
mentira”.

Assim, seja, seja nos jovens ou adultos, a busca da verdade está


sempre ligada a uma decepção, a uma desilusão, a uma dúvida, a
uma perplexidade, a uma insegurança, ou então, a um espanto e
uma admiração diante de algo novo e insólito.

A busca da verdade distingue-se em dois tipos: o primeiro é a que


nasce da decepção, da incerteza e da insegurança é, por si
mesmo, exige que saiamos de tal situação readquirindo certezas;
o segundo é o que nasce da deliberação ou decisão de não aceitar
as certezas e crenças estabelecidas, de ir além delas e de
encontrar explicações, interpretações e significados para a
realidade que nos cerca. Esse segundo tipo é a busca da verdade
na atitude filosófica.

Epistemologia Contemporânea

A partir das transformações no campo científico ocorridas na


passagem do século XIX ao século XX, muitas certezas forma
abaladas, fazendo surgir novos questionamentos e reavaliações
dos critérios de verdade e da validade dos métodos e teorias
científicas.

A filosofia da ciência se debruçou sobre essas questões. Entre os


nomes mais significativos da filosofia da ciência, estão muitos
cientistas de vários ramos, que produziram reflexões sobre sua
própria prática (e nesse momento são filósofos).

Círculo de Viena

O círculo de Viena foi um grupo de cientistas que marcou a


filosofia da ciência. Foi formado na década de 1920 por cientistas
de diversas áreas, tais como, o físico alemão Moritz Schlick
(1882-1936), os matemáticos alemães Hans Hahn e Rudolf
Carnap (1891-1970), o sociólogo e economista austríaco Otto
Neurath (1882-1945).

O círculo de Viena desenvolveu o positivismo, também


denominado positivismo lógico ou ainda empirismo lógico, que
pretendeu formar uma concepção científica do mundo e se
94 Unidade

opunha às especulações. Em suas reflexões acerca do


procedimento científico, enfatizavam as exigências de clareza e
precisão e propuseram o critério da verificabilidade para validar
uma teoria científica. Em outras palavras, a teoria deveria, para
ser aceita como verdadeira, passar pelo crivo da verificação
empírica.

Karl Popper

Karl Popper (1902-1994), físico, matemático e filósofo da ciência


britânica, criticou o critério da verificabilidade e propôs como
única possibilidade para o saber científico o critério de não-
refutabilidade ou da falseabilidade. De acordo com esse critério,
uma teoria mantém-se como verdadeira até que seja refutada, isto
é, que seja mostrada sua falsidade, suas brechas, seus limites. No
seu entendimento, nenhuma teoria científica pode ser verificada
empiricamente. Isso porque, do ponto de vista lógico, não é
correcto que se justifique inferir assertivas universais a partir de
assertivas singulares, por mais numerosas que sejam estas
últimas. Com efeito, qualquer conclusão tirada desse modo
sempre se pode revelar falsa: por mais numerosas que sejam os
casos de cisnes brancos que possamos ter observado, isso não
justifica a conclusão de que todos os cisnes são brancos.

Com essa afirmação, Popper indicou a condição transitória da


validade de uma teoria. Uma teoria é válida até o momento em
que é refutada, mostrando-se a sua falsidade. Somente a falsidade
de uma teoria pode ser provada, mas nunca a sua veracidade.

Outro ponto destacado por Popper em suas reflexões sobre o


conhecimento científico foi que a mente não é uma “tábua
rasa”como pensam os empiristas. Para Popper, não existe
observação pura, pois todas as observações são sempre realizadas
à luz de pressupostos e de teorias prévias que o cientista traz
consigo. E elas se confirmam ou não a partir da sua observação.

Gaston Bachelard

Gaston Bachelard (1884-1962), destacou a importância do estudo


da história da ciência como instrumento de análise da própria
racionalidade. Nessa pesquisa, a actividade científica passa a
fazer parte de um processo histórico mais amplo e que possui um
carácter social.

De acordo com a análise de Bachelard, a ciência progride por


rupturas epistemológicas, causados por obstáculos
epistemológicos. Isso quer dizer que a ciência caminha por saltos,
que se caracterizam pela negação dos pressupostos e métodos que
orientavam a pesquisa anterior, porque esses pressupostos e
métodos actuam como obstáculos, ou seja, são entraves que
fazem com que ocorra a estagnação ou mesmo a regressão de um
dado patamar já alcançado.
Introdução à Filosofia 95

Esses obstáculos podem ser devidos a hábitos cristalizados, a


dogmatização de teorias que freiam o desenvolvimento da
ciência. Um exemplo de ruptura epistemológica seria o da física
quântica e da teoria de relatividade, que formularam uma nova
maneira de se conceber o espaço e o tempo, contra os obstáculos
representados pela física newtoniana, que não dava conta de
explicar certos fenômenos.

Bachelard destacou também o papel da imaginação e da


criatividade como elementos imprescindíveis da prática
científica.

Thomas Kuhn

Thomas Kuhn (1922-1996), físico, historiador e filósofo da


ciência norte-americano, desenvolveu sua teoria acerca da
história da ciência entendendo-a não como um processo linear e
evolutivo, mas como uma sucessão de paradigmas (modelos) que
se confrontam entre si.

Na sua obra A estrutura das revoluções científicas (1962), ele


sustenta a tese de que a ciência se desenvolve durante certo
tempo a partir da aceitação , por parte da comunidade científica,
de um conjunto de teses, pressupostos e categorias que formam
um paradigma, ou seja, um conjunto de normas e tradições dentro
do qual a ciência se move e pelo qual pauta a sua actividade.

Em determinados momentos, porém, essa visão ou paradigma se


altera, provocando uma revolução, que abre caminho para um
novo tipo de desenvolvimento científico. Foi o que se deu por
exemplo, na passagem da física antiga clássica à física quântica.
De acordo com Kuhn, é como se ocorresse uma nova
reorientação da visão global, na qual os mesmos dados são
inseridos em novas relações.

Thomas Kuhn também distingue a ciência normal, que se


desenvolve dentro de um certo paradigma, acumulando dados e
instrumentos em seu interior, e a ciência extraordinária, que surge
nos momentos de crise do paradigma. Essa nova ciência
questiona os fundamentos e pressupostos da ciência anterior e
propõe um novo paradigma.

Exercícios
1 – Quais são os elementos do conhecimento?

Resposta: Os elementos do conhecimento são o sujeito que conhece


e o objecto que faz conhecer.
Auto-avaliação
96 Unidade

Unidade N0 15-A0010

Tema: Introdução à Lógica.

Introdução
A lógica é uma disciplina propedêutica, é o vestíbulo da filosofia,
ou seja, o instrumento que vai permitir o caminhar rigoroso do
filósofo ou do cientista. A lógica é o ramo da filosofia que se
preocupa com as regras de bem pensar, ou do pensar carreto,
sendo, portanto, um instrumento do pensar.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer a relação entre linguagem e comunicação.

 Conhecer os novos domínios da lógica.

Objectivos  Descrever os princípios da razão.

Sumário
Etimologicamente lógica vem do grego logos, que significa
“palavra”, “expressão”, “pensamento”, “conceito”, “discurso”,
“razão”.

A lógica trata dos argumentos, isto é, das conclusões a que


chegamos através da apresentação das evidências que a
sustentam. O seu fundador é Aristóteles, com a sua obra chamada
organon. Ele divide a lógica em formal e material.

Lógica formal (ou menor): que estabelece a forma correcta das


operações do pensamento. Se as regras forem aplicadas
adequadamente, o raciocínio é considerado válido ou correto.

Lógica material (ou maior): é parte da lógica que trata da


aplicação das operações do pensamento segundo a matéria ou
natureza dos objectos a conhecer. Enquanto a lógica formal se
preocupa com a estrutura do pensamento, a lógica material
investiga a adequação do raciocínio à realidade. É também
chamada metodologia, e como tal procura o método próprio de
cada ciência.
Introdução à Filosofia 97

A lógica estuda as condições do pensamento válido, isto é, do


pensamento que procura alcançar a verdade.

A linguagem como fundamento da condição humana

A linguagem é um sistema simbólico. O homem é o único animal


capaz de criar símbolos, isto é, signos arbitrários em relação ao
objecto que representam e, por isso mesmo, convencionais, ou
seja, dependentes de aceitação social.

No momento em que nascemos entramos imediatamente em


comunicação com os outros e com a realidade que nos circunda.
Uma das expressões primárias dessa necessidade comunicativa é
o primeiro choro à saída do ventre da mãe, traduzido na única
linguagem naquele momento.

A linguagem humana, na sua forma comum que é a palavra,


ocupa um lugar de relevo entre os instrumentos culturais
humanos. Pelas palavras, podemos transmitir o conhecimento
acumulado por uma pessoa ou sociedade. Podemos passar adiante
esta construção da razão que se chama cultura.

A linguagem, é assim, um dos principais instrumentos na


formação do mundo cultural, pois é ela que nos permite
transcender a nossa experiência. No momento em que damos
nome a qualquer objeto da natureza, nós o individuamos, o
diferenciamos do resto que o cerca; ele passa a existir para a
nossa consciência. Com esse simples acto de nomear,
distanciamo-nos da inteligência concreta animal, limitada ao aqui
e agora, e entramos no mundo do simbólico. O nome é símbolo
dos objectos que existem no mundo natural e das entidades
abstractas que só têm existência no nosso pensamento (por
exemplo: ações, estados ou qualidades como tristeza, beleza,
liberdade).

Pela linguagem, o homem deixa de reagir somente ao presente,


ao imediato; passa a poder pensar o passado e o futuro e, com
isso, a construir o seu projecto de vida. Certas necessidades do
âmbito biológico, como comer, dormir e respirar, se manifestam
naturalmente, pois como sabemos, a linguagem se insere no
âmbito cultural, tem de ser aprendida sob a forma da língua
própria da comunidade onde nascemos, crescemos,
manifestando-se nos actos de fala próprios dessa comunidade. A
linguagem é, portanto, o fundamento da nossa humanidade, ela
tem um estatuto antropológico, uma vez que é ela que assegura a
constituição do ser humano no seu processo antropológico e
cultural.

Linguagem e comunicação

A linguagem é um sistema de signos artificiais e convencionais


destinados à comunicação. Ela comporta uma estrutura
98 Unidade

essencialmente intencional. Com efeito a linguagem quer


significar intenções, idéias, sentimentos, coisas, etc. Pode-se
dizer com justa razão que a linguagem é o instrumento ideal da
intencionalidade essencial do homem. A linguagem usa-se
frequentemente em oposição a língua para distinguir a função de
se exprimir, em geral com a palavra, dos vários sistemas
lingüísticos fixos em uma sociedade (as línguas), e comunicação
é qualquer situação de interacção entre os seres humanos,
evocando imediatamente a simples conversação, o diálogo, a
discussão, o debate, os enunciados discursivos nas diversas
situações diárias.

A linguagem humana compreende tanto a linguagem verbal e não


verbal. A linguagem verbal se distingue em linguagem oral, ou
vocal, isto é, a fala, e linguagem escrita.

No nosso tempo, a comunicação aparece como fenômeno


complexo, uma vez que o termo designa objectos e situações
diversas. Quando falamos em comunicação pensamos nos meios
técnicos: rádio, televisão, telefone, fax, internet, etc.; falamos de
comunicação pensando nos dispositivos que a permitem
(informação, formação, publicidade, etc.).

Vários modelos explicativos da comunicação humana têm sido


propostos. Na sua forma mais simples podemos dizer que a
comunicação é o resultado de três elementos fundamentais: uma
fonte (o ser humano, um animal ou uma máquina) que emite uma
mensagem (uma frase, um gesto, um filme, etc.) em direcção a
um alvo (um interlocutor, um espectador, ou outro).

Alguns modelos de comunicação conhecem uma enorme


divulgação. É, por exemplo, o caso dos modelos de C. Shannon
(engenheiro de telecomunicação) e de W. Weaver (filósofo da
comunicação), datados de 1949, e o de H. Lasswell (especialista
em ciências políticas), datado de 1948.

Linguagem, pensamento e discurso


Pensamento é a consciência ou a inteligência saindo de si para ir
colhendo, reunindo, recolhendo os dados fornecidos pela
experiência, pela percepção, pela imaginação, pela memória, pela
linguagem, e voltando a si, para considerá-los atentamente,
colocá-los diante de si, observá-los intelectualmente, pesá-los,
avaliá-los, retirando deles conclusões, formulando idéias,
conceitos, juízos, raciocínios, valores.

O pensamento exprime nossa existência como seres racionais e


capazes de conhecimento abstracto e intelectual, e sobretudo
manifesta sua capacidade para dar a si mesmo leis, regras e
princípios para alcançar a verdade de alguma coisa.

O pensamento pode ser concreto e abstracto. É concreto, quando


se forma a partir da percepção, ou seja, da representação de
objectos reais, e é imediato, sensível e intuitivo; enquanto que o
pensamento abstracto é aquele que estabelece relações (não –
Introdução à Filosofia 99

perceptíveis), que cria os conceitos e as noções gerais e abstract


as, é mediato (precisa das mediações da linguagem) e racional.

O termo “discurso” é usado em filosofia para significar uma


operação intelectual que se processa por uma série de operações
elementares e sucessivas, encadeando-se numa seqüência
ordenada de enunciados em que cada um retira o seu valor dos
antecedentes, procurando chegar a determinadas conclusões.

Há uma estreita ligação com a lógica, considerada a ciência


reflexiva do discurso. Por isso, os gregos usam o termo logos
que foi traduzido por discurso, razão, e ainda linguagem.

A maioria dos lingüistas parece concordar que o discurso é em


primeiro lugar, um acontecimento de linguagem, uma atualizarão
da língua na palavra, materializada no acto de fala, e num acto de
comunicação lingüística. Pensadores como Dubois (1973)
defende que o termo “discurso” designa todo o enunciado
superior à frase, considerado do ponto de vista das regras de
encadeamento das seqüências de frases.

Na perspectiva filosófica, diz-se que há discurso quando há um


conjunto de enunciados articulados entre si de uma forma
coerente e lógica. Esta dimensão lógico-linguística do discurso é
por isso fundamental.

Exercícios

1 – Que é a lógica e quem é o seu fundador?

Resposta: Lógica é a ciência que ensina o homem a raciocinar


correctamente. O Seu fundador é Aristóteles.
Auto-avaliação
100 Unidade

Unidade N0 16-A0010

Tema: As dimensões do discurso


humano

Introdução
O discurso humano é pluridimensional, isto é, é constituída por
diversas dimensões. Dentre elas destacamos as seguintes:
dimensão sintáctica, semântica e pragmática.

Existem outras dimensões, cuja importância parece-nos


facilmente compreensível, assim como será fácil estabelecer
entre elas as respectivas relações e implicações. Dentre elas,
destacamos as seguintes: lingüística, textual, lógico-racional,
expressiva ou subjetiva, intersubjetiva ou comunicacional,
argumentativa, apofântica ou representativa, comunitária,
institucional e ética.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer as dimensões do discurso humano.

 Caracterizar cada uma das dimensões do discurso humano


Objectivos  Destacar os novos domínios da lógica e suas implicações sociais.

Sumário
Dimensão é todo plano, grau ou direcção no qual se possa
efectuar uma investigação ou realizar uma acção.

O discurso humano é pluridimensional, isto é, é constituída por


diversas dimensões. Dentre elas destacamos as seguintes:
dimensão sintáctica, semântica e pragmática.

Existem outras dimensões, cuja importância parece-nos


facilmente compreensível, assim como será fácil estabelecer
entre elas as respectivas relações e implicações. Dentre elas,
destacamos as seguintes: lingüística, textual, lógico-racional,
expressiva ou subjetiva, intersubjetiva ou comunicacional,
Introdução à Filosofia 101

argumentativa, apofântica ou representativa, comunitária,


institucional e ética.

Dimensão sintáctica

A palavra sintáctica vem do grego, syntaxis, que significa


coordenação. Tradicionalmente, define-se sintaxe, como a parte
da gramática que trata das regras combinatórias entre os diversos
elementos da frase, ou seja, trata da relação intralingüística dos
signos entre si (Apel, Karl-Otto; sprach-pragmatik und
Philosophie; Frankfurt; 1975) ou das relações internas que os
signos mantêm entre sí ( Meyer, Michel; Lógica, Linguagem e
Argumentação; Teorema; Lisboa; 1992).

Por outro lado, pode-se definir a sintaxe como o “conjunto dos


meios que nos permitem organizar os enunciados, afectar a cada
palavra uma função e marcar as relações que se estabelecem
entre as palavras. A ordem das palavras é um dos traços
característicos de qualquer sintaxe”. (Yagello, Marina; Alice no
País da Linguagem; Estampa; Lisboa; 1990).

Assim, por razões de carácter sintático: uma série de letras ao


acaso não é uma palavra; uma série de palavras postas ao acaso
não é uma frase; uma série de frases dispostas ao acaso não é um
texto nem um discurso.

Dimensão semântica

A palavra semântica, do grego, semantikê (tékhne), que significa


literalmente, “arte da significação”, ou arte (ciência) do
significado.

Semântica é a ciência que se dedica ao estudo das significações


(Michel Bréal).

Semântica trata da relação dos signos com o seu significado, e


logo com o mundo (Michel Meyer).

Portanto, a semântica trata das relações dos signos (as palavras


ou frases) com os seus significados (significações) e destes com
as realidades a que dizem respeito (referência).

No que diz respeito ao domínio da semântica lingüística podemos


considerar:

Semântica lexical: aquela que se dedica ao estudo da significação


das palavras entre si (as relações de sinonímia, de antinomia, os
campos lexicais, a evolução das palavras);

Semântica da frase: estuda o modo como as palavras se


combinam para que a frase tenha sentido (uma palavra pode ter
vários significados ou sentidos, que só descodificaremos se
considerarmos o contexto);

Semântica do discurso (frase ou enunciados): é que constitui e dá


coerência a um texto. ( Perante um texto que não tenha um
102 Unidade

sentido unitário, que não respeita as regras de articulação,


dificilmente alguém conseguirá captar o seu global.

Dimensão pragmática

A palavra pragmática, vem do grego pragmatiké (de pragma,


acção), a sua raiz.

Entre os percursores da pragmática, encontramos, o filósofo e


literário alemão Von Humboldt (1767 – 1835), que afirmou que a
essência da linguagem era a ação. Michel Meyer define-a como
disciplina que se prende com os signos na sua relação com os
utilizadores.

C. Morris, é considerado fundador da disciplina, pois exigiu a


pragmática como complemento da sintaxe e da semântica. Na
comunicação, segundo ele, há um signo, um significado e um
intérprete, desenrolando-se entre eles uma tríplice relação.

A pragmática é o estudo do uso das proposições, mas também,


pode definir-se como o estudo da linguagem, procurando ter em
conta a adaptação das expressões simbólicas aos contextos
referencial, situacional, de acção e interpessoal. A atitude
pragmática diz respeito à procura de sentido nos sistemas de
signos, tratando-os na sua relação com os utilizadores,
considerando sempre o contexto, os costumes e as regras sociais.

Uma análise pragmática de um texto, escrito ou falado, procura


ver de que modo o texto está estruturado e quais as suas funções
específicas.

Qualquer texto, oral ou escrito, representa fundamentalmente a


realização de um acto que não é apenas locutório, mas representa
igualmente um acto ilucotório e um acto per locutório. Se
considerarmos o que dissemos anteriormente, concluiremos que,
do ponto de vista pragmático, interessa sobretudo considerar os
aspectos ilocutórios e per locutórios.

Quando um sujeito falante diz algo, podemos distinguir


facilmente: o que diz (acto locutório); do que faz, dizendo (acto
ilocutório); e dos factos resultantes da acção de dizer (acto
perlocutório).

Estas três dimensões do discurso (sintática, semântica e


pragmática) não podem ser isoladas; são indissociáveis, pois a
sintaxe preocupa-se com a forma gramatical da linguagem; a
semântica coloca o problema do significado das palavras e frases
que constituem os nossos enunciados discursivos e, obviamente,
remete para a relação que a linguagem estabelece com o mundo,
com os objetos, colocando assim o problema de referência. A
pragmática preocupa-se com o uso que fazemos da linguagem
num dado contexto.

Os novos domínios da Lógica e suas implicações sobre o


homem e a sociedade

Informática
Introdução à Filosofia 103

A palavra informática foi criada por Philippe Dreyfus, em 1962.


Contudo, foi introduzido oficialmente na Academia Francesa de
Ciências em 1966.

Informática é a ciência do tratamento racional, nomeadamente


por máquinas automáticas, da informação considerada como
suporte dos conhecimentos e das comunicações nos domínios
técnico, econômico e social.

Apesar de o termo ter surgido nesta altura, os estudiosos da


informática, dizem que ela começou a ser um domínio autônomo
por volta dos anos 50. são entre outros, marcos importantes da
constituição dessa autonomia os seguintes: o congresso de Paris
de 1951; o primeiro computador baseado na tecnologia dos
transistores (Bell-1955) e a linguagem de alto nível ( Basic-1954;
Fortran-1957; Cobol-1960).

Entre 1945 e meados dos anos 60 surge a primeira informática.


Dá-se o aparecimento dos primeiros computadores propriamente
ditos. O ENIAC é o primeiro exemplar. É o período da definição
dos princípios básicos, da definição do corpo teórico e técnico.

Nos anos 60 até finais dos anos 70, surge à segunda informática,
desenvolvem-se os computadores baseados na técnica dos
transistores e os computadores pessoais. Nos anos 80, surge a
terceira informática, com o aperfeiçoamento dos computadores
pessoais das redes, da microinformática. É o que poderíamos
chamar banalização dos computadores pessoais e transformação
da sociedade da informática numa cultura de comunicação, frutos
que colhemos atualmente.

Cibernética
A palavra cibernética, vem do grego kibernétes. O termo foi
usado por Platão para designar a “arte de pitotar navios”. É nesta
raiz grega que se filia a palavra latina gubernare, que origina o
termo governo. Assim como o piloto dirige o navio, da mesma
forma o governo é o timoneiro que dirige o Estado.

A teoria da cibernética remonta a 1948 e o seu fundador é o


matemático norte-americano Norbert Wiener (1895-1964).

Cibernética é a ciência da comunicação e do controlo de homens


e máquinas. É no seio deste movimento de idéias que vimos
surgir o primeiro computador da nossa era e será igualmente
fruto do seu trabalho que se desenvolve a posterior robotização.

Inteligência artificial
A inteligência artificial é um domínio relativamente recente.
Encontramos as suas raízes no grande desenvolvimento dos
computadores dos anos 50. Porque estas máquinas ofereciam
enorme possibilidade de armazenamento e processamento de
informações a altas velocidades, os investigadores apostaram em
construir sistemas que em tudo se assemelhassem às
potencialidades da inteligência humana. Podemos dizer que a
inteligência artificial encontra sua fonte de inspiração na
inteligência natural própria dos seres humanos.
104 Unidade

Relação entre inteligência natural e inteligência artificial


Afirmar que os seres humanos são inteligentes, é pensar nas suas
habilidades para adquirirem, compreenderem e aplicarem certos
conhecimentos, bem como capacidades para exercitarem o seu
pensamento e raciocínio.

A inteligência engloba todo o conhecimento consciente e


inconsciente, que fomos adquirindo ao longo da nossa vida, fruto
do estudo, ou em resultado das multifacetadas experiências que
realizamos, das muitas situações mais ou menos problemáticas
que fomos ou vamos enfrentando.

Exercícios
1 – Quais são as dimensões do discurso humano?
Resposta: Sintáctica, semântica, pragmática, lingüística, textual, lógico-
racional, expressiva ou subjetiva, intersubjetiva ou comunicacional, argumentativa, apofântica
ouAuto-avaliação
representativa, comunitária, institucional e ética.
Introdução à Filosofia 105

Unidade N0 17-A0010

Tema: Os princípios da razão.

Introdução
A palavra princípio, do latim principium, significa ponto de
partida e fundamento de um processo qualquer. Os dois
significados, “ponto de partida” e “fundamento” ou “causa”,
estão estreitamente ligados na noção deste termo, que foi
introduzido em filosofia por Anaximandro.

Já a palavra razão, do latim ratio e do grego lógos, significam


pensar e falar ordenadamente, com medida e proporção, com
clareza e de modo compreensível para outros. Assim, na origem,
a razão é a capacidade intelectual para pensar e exprimir-se
correcta e claramente, para pensar e dizer as coisas tais como são.
A razão é uma maneira de organizar a realidade pela qual esta se
torna compreensível.

A razão obedece os seguintes princípios: Identidade, Não-


contradição, Terceiro Excluído e Razão Suficiente.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer os enunciados dos princípios da razão.

 Relacionar o conceito e compreensão do conceito.

Objectivos  Classificar os conceitos e os termos.

Sumário
Princípio de identidade:

Cujo enunciado pode aparecer: “A é A” ou “o que é, é”. Este


princípio afirma que uma coisa, seja ela qual, só pode ser
conhecida e pensada se for percebida e conservada com sua
identidade.

O princípio de identidade é a condição para que definamos as


coisas e possamos conhecê-las a partir de suas definições.
106 Unidade

Princípio de Não – Contradição:


Cujo enunciado é: “A é A e não é possível que, ao mesmo tempo e
na mesma relação seja não-A”.

Assim, é indispensável que a árvore que está diante de mim seja e


não seja, ao mesmo tempo, uma mangueira.

O princípio de não-contradição afirma que uma coisa ou uma


idéia da qual uma coisa é afirmada e negada ao mesmo tempo e
na mesma relação são coisas e idéias que se negam a si mesmas e
que por isso se autodestroem, desaparecem, deixam de existir.
Eis porque o princípio enuncia que isso é impossível, ou seja,
afirma que as coisas e as idéias contraditórias são impensáveis e
impossíveis.

Princípio do Terceiro excluído:


Cujo enunciado é: “A é ou X ou é Y e não há a terceira
possibilidade”. Por exemplo: “Ou este homem é Sócrates ou não
é Sócrates”; “Ou faremos a guerra ou faremos a paz”.

Este princípio define a decisão de um dilema – “ou isto ou


aquilo” – no qual as duas alternativas são possíveis e cuja solução
exige que apenas uma delas seja verdadeira.

Princípio de Razão Suficiente:


A firma que tudo o que existe e tudo o que acontece tem uma
razão (causa ou motivo) para existir ou para acontecer, e que tal
razão (causa ou motivo) pode ser conhecida pela nossa razão.

Pode ser enunciado da seguinte maneira: “Dado A,


necessariamente se dará B”. E também: “Dado B,
necessariamente houve A”.

Lógica do Conceito/Termo
Conceito ou idéia: é a representação intelectual da essência de
um objecto, representa o que de permanente, imutável e comum
em todos os objectos de uma espécie. É chamado de conceito
porque a sua formação realiza-se no espírito: uma espécie de
concepção, pela união da inteligência com o objeto, cujo fruto é o
conceito ou idéia. É fácil concluir que uma idéia não é falsa nem
verdadeira, porque nela nada se afirma e nada se nega.

Os conceitos podem ser possíveis (animal racional) e impossíveis


(círculo quadrado), conforme são formados de elementos
logicamente compatíveis ou incompatíveis entre si.

Enquanto o conceito é a representação intelectual de um objeto, o


termo é o que dá existência objectiva ao conceito; o termo é a
expressão externa (verbal) de um conceito ou nada. Não se deve
confundir termo e palavra, porque o termo pode ter várias
palavras e até proposições gramaticais ou ser constituído por
simples gestos.

Exemplo: Aristóteles é o filósofo da antiguidade que mais


contribuiu para o desenvolvimento da Filosofia.
Introdução à Filosofia 107

O termo é como que a idéia exteriorizada e concretizada, visto


que, concebido um conceito, só lhe damos existência depois de
encontrarmos o termo que a pode exprimir.

Relação entre a extensão e a compreensão do conceito

Chama-se compreensão (conotação ou intenção) de uma idéia: ao


conjunto de propriedades que lhe podem ser atribuídas.

Por exemplo: a idéia de “triângulo” contém uma extensão,


figura, três linhas, três ângulos, etc.

Chama-se extensão (denotação ou domínio da aplicação) de uma


idéia: ao conjunto de seres a que essa idéia é atribuível.

Por exemplo: o conceito de “Homem” convém a portugueses,


franceses, brancos, amarelos, negros, António, Rute, etc.

A extensão e a compreensão variam em sentido inverso: quanto


mais complexa é uma idéia tanto mais limitada será a sua esfera
de aplicação. É possível e necessário os conceitos e, portanto, os
seres que eles representam, numa hierarquia fundada na sua
extensão. O conceito de maior extensão chama-se gênero, em
relação à extensão menos, e esta denomina-se espécie em relação
àquela.

Diz-se gênero próximo ou supremo, consoante o grau de sua


generalidade. O gênero próximo é o conceito de generalidade
imediatamente superior ao conceito que é a espécie; o gênero
superior representa as grandes classes de seres ou grandes
divisões de ser. Aos conceitos que constituem os gêneros
supremos, os lógicos chamam categorias.

A diferença específica é a característica que se junta ao gênero


próximo para constituir a espécie, aumentado-lhe a compreensão
(racional que se junta ao gênero animal para constituir a espécie
homem). O gênero próximo e a diferença específica são os
carácteres essenciais de qualquer ser.

Classificação dos conceitos e dos termos

Quanto à compreensão podem ser:

Simples: aquelas que são divisíveis. Exemplo: homem, animal,


planta.

Concretas: que são aplicáveis a sujeitos ou objetos. Exemplo:


gato, cão, planta.

Abstractas: que são aplicáveis a qualidades, acções ou estados.


Exemplo: beleza, alegria, amizade.

Quanto à extensão podem ser:


Universais: os que são aplicáveis a todos os elementos de uma
classe. Exemplo: homem, círculo, mesa.

Particulares: os que são aplicáveis apenas a uma parte de classe.


Exemplo: aqueles homens, alguns livros, estes cadernos.
108 Unidade

Singulares: os que são aplicáveis apenas a um indivíduo.


Exemplo: Paulo, Almiro, este carro.

Quanto à relação mútua, são:


Contraditórios: quando há oposição e exclusão mútua. Exemplo:
ser/não ser, escuro/não escuro

Contrários: quando há oposição sem exclusão. Exemplo:


branco/preto, alto/baixo

Relativos: quando um não é sem o outro (implicação mútua).


Exemplo: pai/filho, direita/esquerda.

Os termos são expressões verbais dos conceitos e classificam-se


de acordo com os seguintes critérios:

Quanto ao modo de significação:

Unívocos: os que se atribuem de modo idêntico a objectos


diversos. Exemplo: homem (aplicado a brancos, negros, João,
americanos, etc.).

Equívocos: os que se aplicam a sujeitos diversos em sentido


totalmente distinto. Exemplo: manga (fruto), manga (de camisa).

Análogos: os que são aplicáveis a realidades diversas num


sentido que não é totalmente idêntico nem totalmente distinto.
Exemplo: saudável (aplicado ao corpo), saudável (dito dos
alimentos).

Quanto à perfeição com que representam o objeto:


Adequados: quando representam com perfeição o objeto.

Exemplo: ave (aplicado a um morcego)

Claros - quando são suficientes para fazer reconhecer o objeto.

Obscuros – quando insuficientes para fazer reconhecer o objeto.

Distintos – quando permitem distinguir bem um objeto de


outros.

Confusos – quando não permitem distinguir suficientemente um


objecto de outros.

Quanto à maneira como a exteriorização do conceito é feita:


- Oral;

- Escrita;

- Gesticular (mímica).

A definição essencial ou característica atinge os caráter essencial


da coisa; é aquela que se faz pelo gênero próximo, espécie e
diferença específica.
Introdução à Filosofia 109

Exemplo 1: O homem (espécie) é animal (gênero próximo)


racional (diferença específica).

A definição descritiva é aquela que enumera as características


exteriores mais salientes de uma coisa que a individualiza e
permitem distinguí-la de todas as outras.

Exemplo 2: O homem é um mamífero, bípede, de posição ereta,


etc.

A definição: tipos e regras

Definir quer dizer demarcar limites, isto é, indicar de entre as


propriedades de uma coisa, as que bastam para dizer o que à
coisa é, e a distingue do que não é; definir é dizer o que um
conceito é, e distinguí-la do que não é.

Espécies de definições:

- a definição nominal: é aquela que resulta da análise


etimológica da palavra, ou seja, que exprime o sentido de uma
palavra. Exemplo: filosofia é o amor da sabedoria.

- a definição real: é aquela que exprime a natureza do próprio


objeta que a palavra representa. Exemplo: paixões são tendências
exacerbadas.

A única definição verdadeira e usada por todas as ciências é a


definição essencial. Na impossibilidade de usar a definição
essencial, a ciência recorre à pura definição descritiva.
As definições reais podem subdividir-se em três:

Explicativas: se o objecto definido existe independentemente do


objeto. Exemplo: Os aracnídeos são antropóides octópodes.
As definições explicativas podem ser:

a) Essenciais: quando nos dão o conhecimento do objecto pela


indicação dos seus elementos intrínsecos ou estruturais.
Exemplo: O homem é um animal racional

b) Acidentais: quando permitem a indicação de caráteres


extrínsecos que, no conjunto, lhes são exclusivas. Exemplo:
emoção, “reação global, intensa e breve do organismo a uma
situação inesperada, acompanhada de estado afectivo de
tonalidade penosa ou agradável” (Larousse).

Construtivas: Se o objecto inseparável de conceito é criado pelo


próprio acto da definição. Estas definições são específicas de
matemática. Exemplo: quilógono é o polígono de mil lados.

As construtivas podem ser:

a) Essenciais: se dizem o que o objecto é. Exemplo: Losango é


um paralelogramo com os lados todos iguais.

b) Genéticas: se indicam o modo de produção do objeto.


Exemplo: O bronze é uma liga de diversos metais.
110 Unidade

Pragmáticas: Se a definição deriva do uso que do termo pode ser


feito em conformidade com determinada situação. Neste sentido,
ela supõe em cada caso um contexto – “sempre que as condições
são assim, o termo T será usado assim e assim”.

As regras que deve obedecer uma definição são:

1º A definição deve ser mais clara do que o termo a definir, isto


é, deve ser breve e feita em termos precisos e distintos e não pode
ser dada pela negativa.

2º A definição deve convir a todo o definido e só ao definido.


Quer dizer, não deve ser muito restrita ( o homem é um animal
racional de cor branca ou negra ou amarela), nem muito
extensiva ( o homem é um animal).

3º A definição deve ser recíproca. Isto é, sendo o definido o


primeiro membro de uma igualdade e a definição o segundo,
devem poder trocar de lugar. Exemplo: o homem é um animal
racional ou o animal racional é o homem.

Divisão e classificação

Divisão
Divisão é a análise das idéias sob o ponto de vista de sua
extensão; dividir um conceito significa indicar a quantos seres ou
objectos diferentes ele se aplica; divisão é a decomposição de um
todo nas suas partes.

A divisão pode ser dicotômica ou politómica. Mas a divisão


perfeita é a dicotômica, que consiste em passar de um gênero a
duas espécies, das quais uma tenha um atributo que não existe na
outra.

Classificação
Classificar é reunir ordenadamente em grupos vários seres ou
objectos que uma idéia abrange, de harmonia com as suas
semelhanças e diferenças, atendendo ao mesmo tempo, à
compreensão e à extensão do conceito.

Princípios da classificação:

1º Não deve deixar resíduos, isto é, deve ser exaustiva, não


ficando nada que não seja classificado;

2º Deve haver mais semelhanças entre dois seres reunidos numa


mesma classe do que entre dois seres colocados em classes
diferentes;

3º Deve ser irredutível, isto é, uma classe não deve incluir a


outra.

A classificação pode ser natural ou artificial.

- Classificação natural: baseia-se em características essenciais,


exigindo o estudo completo de todos os caracteres e propriedades
do objeto;
Introdução à Filosofia 111

- Classificação artificial: tem um carácter arbitrário ou


convencional e funda-se em algumas características ou
propriedades do objeto, que sejam mais fáceis de conhecer.

Exercícios
1 – Apresente os princípios da razão por ti estudados.

Resposta: Identidade, Não-contradição, Terceiro Excluído e


Razão Suficiente.

Auto-avaliação
112 Unidade

Unidade N0 18-A0010

Tema: A convivência política entre


os Homens.

Introdução
Desde antiguidade o homem foi caracterizado pela capacidade de
administrar o local em que se encontra: casa, aldeia, cidade,
instituições e a nação.

“O homem é por natureza um ser politico”. Aristóteles

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Explicar o conceito de Politica.

 A relação entre politica e filosofia.


Objectivos  Clarificar o conceito de Estado.

 Identificar os elementos do Estado.

 Identificar as diferentes teorias sobre a origem do Estado.

Sumário
A palavra política (do grego “politiké”, arte de governar a
“polis”, a cidade) tanto pode ser entendida como o modo de
partilha e organização do poder (regime político), como a arte de
governar, isto é, os princípios directivos da acção de um governo,
quer no que diz respeito à sua administração interna, quer no
tocante às relações com os outros Estados.

Na antiguidade grega, a “política” traduzia-se por República,


para significar organização, regime político, a constituição de
uma cidade soberana, de uma comunidade ou Estado com
individualidades e autonomia própria.

Pode-se definir a política como sendo o conjunto das acções


levadas a afeito por um grupo de indivíduos, grupos e
Introdução à Filosofia 113

governantes com vista a resolver os problemas com que se depara


uma colectividade humana. Estas são orientadas por imperativos
como: o bem comum, a ordem pública, a justiça, a harmonia e o
equilíbrio social.

A política oscila entre duas interpretações diametralmente


opostas, embora com um objecto comum: o poder.

Para os que querem conquistar o poder, a política é


essencialmente uma luta, um combate, o poder que permite aos
individuos e aos grupos que detêm assegurar o seu domínio sobre
a sociedade, e dele tirar proveito. Nesse caso, a política serve
para manter os privilégios de uma minoria sobre a maioria.

Para os outros, a política é o esforço para fazer reinar a ordem e a


justiça, assegurando o poder, o interesse geral e o bem comum
contra a pressão das reivindicações particulares. Aqui, a política é
concebida como meio de realizar a integração de todos os
individuos na comunidade e criar a Cidade justa de que falava
Aristóteles.

A luta política, quer consentida (nas chamadas “sociedades


abertas” ou democráticas), quer clandestinas (nas “sociedades
fechadas”ou totalitárias), é sempre expressão de interesses de
classes, de modos de produção, das relações de trabalho e, de um
modo mais geral, de uma tradição histórica.

O problema político é relativo à origem do estado e à sua função,


à sua organização, à sua melhor forma, à sua função e o seu fim
específico, à sua natureza da acção política e as suas relações
com a acção moral, à relação entre estado e individuos, entre
Estado e Igreja e Estado e partidos.

A filosofia política é ramo da filosofia que visa a fundamentação


de idéias de organização dos homens que vivem em sociedade.
Em suma, é a actividade racional e crítica, à razão política.

A Filosofia política é alento vivificador e a força de dinamismo


para a actividade política de uma sociedade. Ela não deve ser
usada como justificação posterior de elucubrações prévias e, nem
como depósito para aplicar na sociedade; ela é referência
primária em cujo contraste se ilumina de forma nova a realidade
social de uma nação.

A filosofia política não é uma solução cómoda e gratuita de


problemas da Humanidade; ela não invalida a autonomia da
actividade dos políticos e a sua capacidade de liderança; não
apresenta um sistema político de conteúdos concretos; a sua
mensagem pertence ao nível da intencionalidade; são orientações
globais, isto é, pertence ao universo da cosmovidência.

Relação entre Filosofia e Política

A relação que se encontra entre a Filosofia e a política está no


facto de que, a filosofia procura deter-se e abarcar nas condições
114 Unidade

de emergência da coisa pública no homem como animal político


e na tipologia dos regimes. A filosofia examina o nascimento das
instituições políticas e a sua maturidade; Ernesto Chambisse
acrescenta ainda que, a Filosofia vem iluminar os conceitos
inerentes à Política, tais como: justiça, bem comum, estado,
tolerância, bem como a própria definição de política; questiona o
grau de liberdade consentâneo com a coesão social e o equilíbrio
na divisão do poder. É a filosofia que deve denunciar a
absolutização da política e a redução à sua natureza precária;
deve criticar a política e todas as formas de dominação do
homem pelo homem.

Política, como dissemos acima, é actividade inerente à


organização das instituições, os factos que dizem respeito à
actividade política; tem a ver com os processos e estratégias
eleitorias, mecanismos para se alcançar o poder, composição de
partidos políticos, sindicatos, flutuação da opinião pública, as
acções dos governantes e a reação dos governados.

A atitude crítica da filosofia perturba em alguns casos a ordem


política, ou seja, os filósofos chama para si o patrono da
racionalidade. Por isso, Platão em sua obra A República, não é
alheio a idëia de que a racionalidade política consiste no rei
tornar-se filósofo ou vice-versa. E Lévy, acrescenta que o
“filósofo fala e por isso mesmo perturba a ordem do mundo,
incluindo o próprio mundo da política”. E ainda “quem quiser
saber para onde nos encaminhamos deverá prestar atenção, não
aos políticos, mas aos filósofos: aquilo que os filósofos anunciam
hoje será a crença do amanhã”.

A Ética Política

A política tem como finalidade a vida justa e feliz, ou seja, a vida


propriamente humana digna de seres livres, que portanto é
inseparável da ética.

Para os gregos, era inconcebível a ética fora da comunidade


política, a pólis como koinonia ou comunidade dos iguais, pois
nela a natureza ou essência humana encontrava sua realização
mais alta.

Quando se fala em ética, Aristóteles distingue entre teoria e


prática, e nesta, entre fabricação e acção, isto é, diferencia entre
poiesis de práxis. Ele reserva à práxis um lugar mais alto do que
a fabricação, definindo-a como a acção voluntária de um agente
racional em vista de um fim considerado bom. A práxis por
excelência é a política.

Platão identifica a justiça no indivíduo e a justiça na pólis. Já


Aristóteles, subordina o bem do indivíduo ao Bem Supremo da
pólis. Esse vínculo interno entre política e ética significava que as
qualidades das leis e do poder dependiam das qualidades morais
dos cidadão e vice-versa, isto é, das qualidades da cidade
dependiam as virtudes dos cidadãos. Somente na cidade boa e
Introdução à Filosofia 115

justa podem se encontrar bons e justos; e somente homens bons e


justos são capazes de instituir uma cidade boa e justa.

Estado

Estado é o modo como o poder está organizado num território e


entre uma população. Sahid Maluf, em sua obra Teoria Geral do
Estado, define o estado como sendo uma organização destinada a
manter, pela aplicação do Direito, as condições universais de
ordem social. E o Direito é o conjunto das condições existenciais
da sociedade, que ao estado cumpre assegurar. O direito pode ser
natural e positivo.

Direito natural é o que emana da própria natureza,


independentemente da vontade do homem (Cícero). É invariável
no espaço e no tempo, insusceptível de variação pelas opiniões
individuais ou pela vontade do Estado (Aristóteles). Ele reflecte a
natureza como foi criada. É anterior e superior ao estado,
portanto, conceituado como de origem divina.

Direito positivo é o conjunto orgânico das condições de vida e


desenvolvimento do individuo e da sociedade, dependente da
vontade humana e das garantias dadas pela força coerciva do
estado (Pedro Lessa). O direito positivo divide-se em público e
privado. O direito público é o que regula as coisas do Estado; o
direito privado é o que diz respeito aos interesses particulares.

O Estado tem uma constituição e uma divisão de poderes: poder


legislativo, poder executivo e poder judicial, conforme a norma
nas sociedades democráticas.

Há uma relação entre Estado e Direito, cuja opinião divide-se em


três grandes grupos doutrinários:

Teoria Monástica: também chamada de estatismo jurídico,


defende que o Estado e o Direito confundem-se em uma só
realidade. Para os monistas só existe o direito estatal, pois não
admitem eles a idéia de qualquer regra jurídica fora do Estado. O
Estado é a fonte única do Direito, porque quem dá vida ao Direito
é o Estado através da “força caótica” de que só ele dispõe. Regra
jurídica sem coação, é uma contradição em si, diz Ihering. Logo,
como só existe o Direito emanado do Estado, ambos se
confundem em uma só realidade.

Os seus defensores foram Hegel, Hobbes e Jean Bodin. Mas


tarde, Rudolf Von Ihering e John Austin desenvolveram esta
teoria, alcançado a sua máxima expressão na escola Técnico-
jurídica liderada por Jellinek e a Escola de Viena de Hans
Kelsen.

Teoria Dualística ou pluralista: sustenta que o Estado e o


Direito são duas realidades distintas, independentes e
inconfundíveis.
116 Unidade

Os dualistas dizem que o Estado não é a única fonte do Direito e


nem este se confunde. O que provém do Estado é apenas uma
categoria especial do direito: o direito positivo. Existem também
princípios do direito natural, as normas de direito costumeiro e as
regras que se afirmam na consciência colectiva, que adquirem
positivamente e que, nos casos omissos, o Estado deve acolher
para lhes dar jurisdicidade. Além do direito não escrito, existem o
direito canônico que independe da força coativa do poder civil, e
o direito das associações menores que o estado reconhece e
ampara.

Esta corrente defende que o Direito é criação social, não estatal.


O direito é um facto social, em contínua transformação. A função
do Estado é de positivar o Direito, isto é, traduzir as normas
escritas e os princípios que se afirmam na consciência social.

O direito traduz, no seu desenvolvimento, as mutações que se


operam na vida de cada povo, por influência das causas éticas,
pesquisas, biológicas, científicas e econômicas, etc. Os seus
defensores são Gierke e Gurvich, e mais tarde foi desenvolvida
por Léon Duguit.

Teoria do Paralelismo: o Estado e o Direito são realidades


distintas, porém necessariamente interdependentes. Esta teoria
procura solucionar a antítese monismo-pluralismo, adoptando
assim a concepção racional da graduação da positividade jurídica,
defendida por Gorgio Del Vecchio.

A teoria do paralelismo completa a teoria pluralista, e ambas se


contrapõem com vantagem à teoria monísitca. O estado e direito
são duas realidades distintas, que se completam na
interdependência.

Elementos do Estado

Alguns autores destacam que os elementos constituintes do


Estado são três: população, território e governo. Alguns autores
pretenderam a inclusão da soberania como o quarto elemento.
Passemos a apresentar alguns dos elementos:

Governo

É conjunto das funções pelas quais, no estado é assegurado a


ordem jurídica. Esse elemento apresenta-se de várias
modalidades, quanto à sua origem, natureza e composição, do
qual resultam as diversas formas de governo.

Pela sua origem, o governo pode ser de direito ou de facto; pela


sua natureza das suas relações com os governados, pode ser legal
ou despótico; quanto à extensão de poder, classifica-se como
constitucional ou absolutista.
Introdução à Filosofia 117

Governo de direito é aquele que foi constituído em conformidade


com a lei fundamental do Estado, senso, por isso, considerado
como legítimo perante a consciência jurídica da nação.

Governo de facto é aquele implantado ou mantido por via de


fraude ou violência.

Governo legal é aquele que, seja qual for sua origem, se


desenvolve em restrita conformidade com as normas vigentes de
direito positivo. Subordina-se aos preceitos jurídicos, como
condição de harmonia e equilíbrio sociais.

Governo despótico é aquele que se conduz pelo arbítrio dos


detentores eventuais do poder, oscilando ao sabor dos interesses e
caprichos pessoais.

Governo Constitucional é aquele que se forma e se desenvolve


sob a égide de uma constituição, instituindo a divisão do poder
em três órgãos distintos e assegurando, a todos os cidadãos a
garantia dos direitos fundamentais, expressamente declarados.

Governo absolutista é o que concentra todos os poderes num só


órgão. O regime absolutista tem suas raízes nas monarquias de
direito divino e se explicam pela máxima do cesarismo romano
que dava a vontade do príncipe como fonte da lei.

Constituição

O termo constituição deriva do prefixo cum e do verbo stituire,


stituto, compor, organizar, constituir. No seu sentido comum,
indica o conjunto dos caracteres morfológicos, físicos ou
psicológicos de cada individuo ou a formação material de cada
coisa. Na Ciência do Estado, essa palavra tem dupka acepção: no
sentido lato, é o conjunto dos elementos estruturais do estado, sua
composição geográfica, política, social, económica, jurídica e
administrativa; e no sentido restrito, constituição é a lei
fundamental do Estado, ou seja, o corpo de leis que rege o estado,
limitando o poder de governo e determinando a sua realização
(Sahid Maluf).

A palavra constituição implica um documento, sobre uma folha


de papel, estabelecendo todas as instituições e princípios de
governo de um país.

O sistema constitucional remonta desde os tempos mais antigos


da história da humanidade, destacando-se as leis de Creta,
elaboradas por Minos, e as leis de Licurgo e Sólon. O regime
jurídico de Atenas, repousava na existência de uma ordem
constitucional, criada pela vontade popular, mediante leis.

A constituição, lei fundamental do estado, provém de um poder


soberano (a nação ou povo, nas democracias) que não podendo
elaborá-la directamente, face à complexidade do estado moderno,
o faz através de representantes eleitos e reunidos em Assembléia
118 Unidade

Constituínte. A nação tem o direito de organizar-se


politicamente, como fonte de poder político. Esse poder que ela
exerce em determinados momentos chama-se poder constituinte.

Poder constituinte é uma função da soberania nacional. É o poder


de constituir e reconstituir ou reformular a ordem jurídica estatal.
É um poder ilimitado, em regra.

Soberania

Soberania é uma autoridade superior que não pode ser limitada


por nenhum poder. Etimologicamente o termo soberania provém
de soperanus, supremitas, ou super omnia, que significa “poder
absoluto e perpétuo de uma repúblia”.

Denominava-se poder de soberania, entre os romanos, suprema


potestas. Era o poder supremo do Estado na ordem política e
administrativa. Posteriormente passaram a denominar poder de
imperium, com amplitude internacional.

Historicamente, no Estado grego antigo, na obra de Aristóteles


falava-se em autarquia, significando um poder moral e
econômico, de auto-suficiência do Estado. Já entre os romanos, o
poder de imperium era um poder político transcendente que
reflectia na majestade imperial incontrastável. Nas monarquias
medievais era o poder de suserania de fundamento carismático e
intocável. No absolutismo monárquico, que teve o seu clímax em
Luíz XIV, a soberania passou a ser o poder pessoal exclusivo dos
monarcas, sob a crença generalizada da origem divina do poder
de Estado, e finalmente no Estado moderno, a partir das
Revolução Francesa, firmou-se o conceito de poder político e
jurídico, emanado da vontade geral da nação.

Há várias definições de soberania, segundo vários autores, como


por exemplo:

Soberania é uma espécie de fenômeno genérico do poder (Miguel


Reale). Pra Pinto Ferreira, soberania é a capacidade de impor a
vontade própria, em última instância, para a realização do direito
justo. E, para Clóvis Bevilácqua, soberania é autoridade superior,
que sintetiza, politicamente, e segundo os preceitos de direito, a
energia coativa do agregado nacional.

A soberania é limitada pelos princípios de direito natural, e pelo


direito grupal, isto é, pelos direitos dos grupos particulares que
compõem o Estado (grupos biológicos, pedagógicos,
econômicos, políticos, espirituais, etc..

O Estado existe para servir o povo e não o povo para servir o


Estado. O governo há-de ser um governo de leis, não a expressão
de soberania nacional, simplesmente.

A soberania é limitada pelos princípios de Direito Natural,


porque o Estado é apenas instrumento de coordenação de direito,
e porque o Direito Positivo de que o Estado emana só encontra
Introdução à Filosofia 119

legitimidade quando se conforma com as leis eternas e imutáveis


da natureza. Santo Tomás de Aquino, afirma que uma lei
humana não é verdadeiramente lei senão enquanto deriva da lei
natural; se em certo ponto se afasta da lei natural, não é mais lei e
sim uma violação da lei natural.

O Direito grupal limita a soberania, porque sendo o fim do estado


a segurança do bem comum, compete-lhe coordenar a actividade
e respeitar a natureza de cada um dos grupos menores que,
integram a sociedade civil. A família, escola, a corporação
econômica ou sindicato profissional, o município ou a comuna e
a igreja, são grupos intermediários entre o indivíduo e Estado,
alguns anteriores ao Estado, como é a família, todos eles com sua
finalidade própria e um direito natural à existência e aos meios
necessários para a realização dos seus fins.

No plano internacional, a soberania encontra limitações pelos


imperativos da coexistência de estados soberanos, não podendo
invadir a esfera de acção das outras soberanias.

Símbolos nacionais

a) O emblema da República de Moçambique foi estabelecido


após a independência do país de Portugal. Devido às ligações do
movimento de independência em 1970 com o comunismo
internacional do período da Guerra Fria, o brasão é baseado nos
elementos gráficos do antigo brasão de armas da União Soviética.

O brasão de armas de Moçambique tem como elementos


centrais um livro aberto sobre o qual se cruzam uma arma e uma
enxada, estando o conjunto disposto sobre o mapa de
Moçambique como se estivesse a ser olhado a partir do Oceano
Índico. Por baixo do mapa está representado o mar e por cima o
sol nascente, de cor avermelhada sobre um campo dourado
delimitado por uma roda dentada. À direita e à esquerda deste
conjunto encontram-se, respectivamente, uma planta de milho,
com uma maçaroca e uma planta de cana de açúcar e, entre elas,
no topo uma estrela vermelha fimbriada de ouro. Por baixo
encontra-se uma faixa vermelha com os dizeres “República de
Moçambique”.

O significado destes símbolos, segundo a constituição da


República de Moçambique, é o seguinte:

 O livro simboliza a educação;

 A arma simboliza a luta de resistência ao colonialismo, a Luta


Armada de Libertação Nacional e a defesa da soberania;

 A enxada simboliza o campesinato;

 O sol nascente simboliza a nova vida em construção;

 A roda dentada simboliza a indústria e o operariado;

 As plantas simbolizam a riqueza agrícola; e


120 Unidade

 A estrela representa a solidariedade entre os povos.

b) A Bandeira de Moçambique é composta por três faixas


horizontais com as cores verde, preta e amarela, de cima para
baixo, separadas por estreitas faixas brancas; sobreposto às
faixas, junto à tralha, encontra-se um triângulo isósceles de cor
vermelha, dentro do qual há uma estrela de cinco pontas dourada,
sobre a qual se cruzam uma arma e uma enxada.

O significado das cores, segundo a constituição da República de


Moçambique, é o seguinte:

 Vermelha: a luta de resistência ao colonialismo, a Luta Armada


de Libertação Nacional e a defesa da soberania;

 Preta: o continente africano;

 Verde: a riqueza do solo;

 Amarela-dourada: a riqueza do subsolo; e

 Branca: a paz.

A estrela representa a solidariedade entre os povos, a arma AK-


47 simboliza de novo a luta armada e a defesa do país, o livro faz
lembrar a educação por um país melhor e a enxada, a agricultura.
É a única bandeira no mundo a incluir a ilustração de um fusil
moderno.

c) Pátria Amada é o hino nacional de Moçambique.

Exercícios

1 – O que é politica?
Resposta: Politica e a arte de gerir o destino de uma cidade ou
polis.
Auto-avaliação
Introdução à Filosofia 121

Unidade N0 19-A0010

Tema: Os Direitos Humanos.

Introdução
A questão dos Direitos Humanos surgiu como resposta à
necessidade de protecção do indivíduo face à acção do Estado e
do seu poder discricionário, isto é, foi um meio de garantir a sua
segurança face aos frequentes abusos do poder por parte do
Estado.

A preocupação e o combate pelos Direitos Humanos reflectem


uma visão mais positiva das funções do Estado concebido, agora,
como uma instância de poder que deve assegurar as condições e
os recursos necessários para que cada um se realize,
simultaneamente como indivíduo e como membro de uma
comunidade. É nesse sentido que falamos, quando reivindicamos
do Estado o direito à educação ou à assistência médica.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer a história e o objectivo dos Direitos Humanos.

 Caracterizar os pensamentos políticos de diferentes filósofos e suas


respectivas épocas históricas.
Objectivos

Sumário
A Declaração Universal dos direitos do Homem data a 10 de
Dezembro de 1948. Só então, o ser humano viu reconhecidos os
seus direitos inalienáveis e seu reconhecimento universal pelas
nações unidas representadas na ONU.

Os Direitos do Homem representam a aspiração humana à liberdade


e o seu nascimento está associado à concepção individualista da
sociedade e à consequente necessidade de limitar o poder do estado,
fazendo-o servir os interesses do indivíduo, por isso, são de certo
modo identificados com a ideia de civilização e com os ideais
democráticos.
122 Unidade

A questão dos direitos Humanos começou a ganhar relevância na


reflexão dos filósofos iluministas do século XVIII, Montesquieu
(1689-1755), Voltaire (1691-1778) e Rousseau (1712-1778) e, a
partir de então, teve um desenvolvimento crescente e começou a ser
tida em consideração na elaboração dos programas dos governos e a
traduzir-se em declarações de direitos fundamentais comuns a todos
os homens.

Embora haja declarações célebre como a Magna Carta de 1215, a


petição dos Direitos de 1628 ou a Bill of Rights de 1689, em
Inglaterra, que tinham um conteúdo e objectivos políticos, pois eram
exigências dos cidadãos aos reis e ao estado no sentido de
respeitarem os direitoas de seus súbditos, a “Declaração dos Direitos
de Virgínia”, a “Declaração da Independência dos Estados Unidos
da América”, ambas de 1776, e a “Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão” de 18 de Agosto de 1789, (Revolução
Francesa), é que constituem as fontes de enunciação dos valores
individuais, naturais e inalienáveis, inerentes a qualquer cidadão
que, ainda hoje, estão longe de estar garantidos em todos os Estados
do mundo.

Foram, pois as revoluções americana e francesa que consagraram os


princípios de dignidade humana, de igualdade perante a lei, de
liberdade de pensamento e de governo democrático, que são hoje,
considerados os princípios básicos da ética política e social do nosso
tempo.

Após a II Guerra Mundial, em que a humanidade suportou


sofrimentos e crueldades gratuitas e constatou a violação sistemática
dos mais elementares direitos da pessoa humana, a Assembleia
Geral da Organização das Nações Unidas promulgou, em Dezembro
de 1948, a “Declaração Universal dos Direitos Do Homem”, que
constitui, ainda hoje, o conjunto dos princípios básicos que devem
ser respeitados nas relações internacionais; é por isso, o documento
fundamental de referência no estabelecimento da paz entre os povos
e do consenso generalizados das nações.

A consciência dos Direitos, conduziu a uma lista de documentos


emanados da ONU, que se ocupam e consagram internacionalmente
os direitos de minorias ou de grupos mais desfavorecidos. Assim,
foram sendo proclamadas, entre outras:

 A Convenção Européia dos Direitos do Homem: 1950;


 A Convenção sobre os Direitos Políticos da Mulher: 1952;
 Convenção para a Prevenção e Repressão do Genocídio: 1958;
 A Declaração dos direitos da Criança: 1959;
 Declaração sobre a concessão da Independência aos Países e Povos
Colonizados: 1960;
 Declaração sobre a Eliminação de todas as Formas de
Descriminação Racial: 1963.
Na generalidade de todos os países, os textos constitucionais
estabelecem de forma geral, as protecções mínimas que permitem ao
indivíduo viver uma vida digna. Assim, são estabelecidos:
 O direito à satisfação das necessidades vitais, tais como a
alimentação, habitação, assistência na doença e educação;
Introdução à Filosofia 123

 O direito de usufruir de liberdades políticas e civis, como a liberdade


de pensamento, religião e associação;
 O respeito pela integridade da pessoa individual;
 A igualdade de todos perante a lei; etc.
Classificação dos Direitos Humanos

As Declarações dos direitos Humanos estão divididos em duas


partes:

a. Direitos políticos ou direitos de cidadania: referem-se à definição da


qualidade de cidadão nacional e suas prerrogativas, aquisição e perda de
nacionalidade, formação do corpo eleitoral, capacidade eleitoral activa e
passiva, acesso aos cargos públicos, etc. Estes direitos, variam no espaço e
no tempo, segundo a ordem política e jurídica de cada Estado.

b. Direitos fundamentais propriamente ditos: referem-se aos atributos


naturais da pessoa humana, invariáveis no espaço e no tempo, segundo a
ordem natural estabelecida pelo Criador do mundo e, partindo-se do
princípio de que todos os homens nascem livres e iguais em direitos.
Entendem-se à todos os homens, sem distinção de nacionalidade, raça,
sexo, ideologia, crenças, condições econômicas ou quaisquer outras
discriminações. São os direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança
individual, à propriedade, etc.
Além dos direitos fundamentais definidos nas declarações clássicas,
novos direitos de personalidade vêm se configurando nos horizontes
sociais conturbados pela crescente hipertrofia do poder estatal,
assumindo configurações mais nítidas no mundo jurídico actual, os
seguintes: a) direito à própria imagem; b) direito à intimidade
pessoal; e c) direito à informação.

O primeiro tende a desvencilhar o homem de seu condicionamento


pelos estereótipos dos chamados mass-media. O direito à intimidade
pessoal dirige-se à preservação da vida íntima do indivíduo,
ameaçada pelo emprego de despositivos modernos de visão, audição
e outros meios de controle à distância. O direito à informação se
contrapõe, em nome da soberania nacional da sociedade de consumo
e aos exageros dos chamados “motivos de segurança nacional”.

Estado de Direito e suas funções

Estado de direito é uma situação jurídica, ou um sistema


institucional, no qual cada um é submetido ao respeito do
direito, do simples indivíduo até a potência pública. O Estado
de direito é assim ligado ao respeito da hierarquia das normas,
da separação dos poderes e dos direitos fundamentais.
Em outras palavras, o Estado de Direito é aquele no qual os
mandatários políticos (na democracia: os eleitos) são
submissos às leis promulgadas. A teoria da separação dos
poderes de Montesquieu, na qual se baseiam a maioria dos
Estados ocidentais modernos, afirma a distinção dos três
poderes (executivo, legislativo e judiciário) e suas limitações
124 Unidade

mútuas. Por exemplo, em uma democracia parlamentar, o


legislativo (Parlamento) limita o poder do executivo
(Governo): este não está livre para agir à vontade e deve
constantemente garantir o apoio do Parlamento, que é a
expressão da vontade do povo. Da mesma forma, o poder
judiciário permite fazer contrapeso à certas decisões
governamentais (especialmente, no Canadá, com o poder que a
Carta dos Direitos e Liberdades da pessoa confere aos
magistrados). O Estado de direito se opõe assim às monarquias
absolutas de direito divino (o rei no antigo regime pensava ter
recebido seu poder de Deus e, assim, não admitia qualquer
limitação à ele: "O Estado, sou eu", como afirmava Luís XIV)
e às ditaduras, na qual a autoridade age frequentemente em
violação aos direitos fundamentais. O Estado de direito não
exige que todo o direito seja escrito. A Constituição da Grã-
Bretanha, por exemplo, é fundada unicamente no costume: ele
não dispõem de disposições escritas. Num tal sistema de
direito, os mandatários políticos devem respeitar o direito
baseado no costume com a mesma consideração que num
sistema de direito escrito.
O Estado de direito é aquele em que vigora o chamado
"império da lei". Este termo engloba alguns significados:
Primeiro que, neste tipo de Estado, as leis são criadas pelo
próprio Estado, através de seus representantes politicamente
constituidos; o segundo aspecto é que, uma vez que o Estado
criou as leis e estas passam a ser eficazes (isto é, aplicáveis), o
próprio Estado fica adstrito ao cumprimento das regras e dos
limites por ele mesmo impostos; o terceiro aspecto, que se liga
directamente ao segundo, é a característica de que, no Estado
de direito, o poder estatal é limitado pela lei, não sendo
absoluto, e o controle desta limitação se dá através do acesso
de todos ao Poder Judiciário, que deve possuir autoridade e
autonomia para garantir que as leis existentes cumpram o seu
papel de impor regras e limites ao exercício do poder estatal.
Outro aspecto do termo "de direito" refere-se a que tipo de
direito exercerá o papel de limitar o exercício do poder estatal.
No Estado democrático de direito, apenas o direito positivo
(isto é, aquele que foi codificado e aprovado pelos órgãos
estatais competentes, como o Poder Legislativo) poderá limitar
a acção estatal, e somente ele poderá ser invocado nos
tribunais para garantir o chamado "império da lei". Todas as
outras fontes de direito, como o Direito Canônico ou o Direito
natural, ficam excluídas, a não ser que o direito positivo lhes
atribua esta eficácia, e apenas nos limites estabelecidos pelo
último.
Nesse contexto, destaca-se o papel exercido pela Constituição.
Nela delineiam-se os limites e as regras para o exercício do
poder estatal (onde se inscrevem as chamadas "garantias
fundamentais"), e, a partir dela, e sempre tendo-a como baliza,
redige-se o restante do chamado "ordenamento jurídico", isto
é, o conjunto de leis que regem uma sociedade. O Estado
Introdução à Filosofia 125

democrático de direito não pode prescindir da existência de


uma Constituição.
Conceito de Estado democrático
Estado democrático de direito é um conceito que designa
qualquer Estado que se aplica a garantir o respeito das
liberdades civis, ou seja, o respeito pelos direitos humanos e
pelas liberdades fundamentais, através do estabelecimento de
uma protecção jurídica. Em um Estado de Direito, as próprias
autoridades políticas estão sujeitas ao respeito da regra de
direito. Se trata de um termo complexo que define certos
aspectos do funcionamento de um ente político soberano, o
Estado.
O termo "Estado democrático de direito" conjuga dois
conceitos distintos que, juntos, definem a forma de
funcionamento tipicamente assumido pelo Estado de
inspiração ocidental. Cada um destes termos possui sua
própria definição técnica, mas, neste contexto, referem-se
especificamente a parâmetros de funcionamento do Estado
Ocidental moderno.

Exercícios

1 – O que são Direitos humanos?

Resposta: Direitos Humanos são o conjunto de prerrogativas que


devem ser reconhecidas ao indivíduo e tidas como essenciais para
Auto-avaliação lhe garantir uma vida digna; pode-se definir também como um
conjunto de regras que devem ser respeitadas pelos estados e por
todos os cidadãos para proteger os indivíduos das arbitrariedades
e dos abusos de poder.
126 Unidade

Unidade N0 20-A0010

Tema: A Filosofia Política na


História

Introdução
Na unidade anterior afirmamos que o homem é por natureza um
animal politico, segundo a concepção de Aristóteles. Desde a
antiguidade a politica se fez sentir entre os homens até na
actualidade. Durante esse tempo ela foi adquirindo diferentes
concepções no tempo e no espaço.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conhecer a história politica.

 Caracterizar os pensamentos de diferentes filósofos em suas


respectivas épocas históricas.
Objectivos
 Distinguir a Filosofia Politica na época antiga, medieval, moderna e
contemporânea.

Sumário
Filosofia Política na Antiguidade

Platão (428-347 a.C)

Platão sentia-se atraído pela actividade política e, por isso


desenvolveu uma filosofia política muito profunda e original que
chegou até aos nossos dias. Ele sustentava que a política deve-se
inspirar na filosofia, por ser ela a via segura de acesso aos valores
de justiça e de bem.

A origem do estado em Platão é convencional, ou seja, como o


homem não é capaz de satisfazer à todas as necessidades para a
sua sobrevivência, precisa do outro para se abster. Por isso,
ninguém pode ocupar ao mesmo tempo diferentes profissões. Daí
a necessidade de cada um associar-se aos outros, cada um com
tarefas sociais específicas.
Introdução à Filosofia 127

Platão distingue três classes sociais:

 A classe dos trabalhadores: predomina nesta classe a virtude da


temperança, o domínio e a disciplina dos prazeres e desejos, capacidade
de se submeter a classes imediatamente superiores.

 A Classe dos guardas: predomina nesta classe o domínio da força da


lama, composta por homens que à semelhança dos cães de raça, dotados
de mansidão e ferocidade, têm como virtude a força e a coragem. Deve
impedir que a classe baixa produza mais riquezas e garantir que esta
tenha uma vida mínima e decente.

 A classe dos Governantes: os integrantes desta classe devem ter amor


pela pátria em relação a todas as restantes classes; devem conhecer e
contemplar o bem. Predomina a alma racional e a sua virtude é a
sabedoria.

As ideias políticas de Platão encontram-se em sua famosa obra


intitulada A República. Segundo ele, o governante deve se tornar
filósofo ou vice-versa. O bom governo é aquele que tem como
finalidade o bem do homem na sua plenitude.

Aristóteles (384-322 a.C)


Aristóteles é mais “amigo da verdade que do mestre”. Foi
discípulo de Platão, mas em muitos pontos contesta as doutrinas
de seu mestre. Sobre a origem do Estado, é contrário a ideia de
Platão segundo a qual a origem do Estado é convencional.

Em Aristóteles, o Estado é natural e o homem é, por natureza um


animal político, pois é caracterizado pela sua integração numa
pólis (cidade), que resulta de uma civilização da espécie humana,
tais como: família, tribo, aldeia e cidade.

A cidade é a constituição e esta, cria o Estado, de maneiras que, a


mudança da constituição implica a mudança do tipo de Estado. A
constituição é a estruturas que dá ordem à cidade, estabelece o
funcionamento de todos os cargos, sobretudo os de soberania.

Há três espécies de constituição:

 Monarquia: governo de um só homem;

 Aristocracia: governo de uma classe restrita;

 Democracia: governo de muitos homens.

A democracia, para Aristóteles é uma demagogia, pois o


principal erro está no facto de considerar que, como todos são
iguais na liberdade, todos podem e devem ser iguais em tudo o
resto.

As melhores formas de governo são a monarquia e a aristocracia.


Mas como os homens são o que São, considera a democracia, a
melhor forma de governo pois é regida pelo segmento médio.

O estado tem como objectivo o bem da alma, por isso tem como
finalidade a moral. E o seu ideal supremo é a autodeterminação,
128 Unidade

ou seja, viver em paz e fazer coisas belas. Assim poderosos


concluir que a finalidade do Estado é produzir homens com
finalidade aristocrática e com amor aos estudos e às artes. De
qualquer modo, a sociedade e o estado existem para garantir a
felicidade e a virtude dos cidadãos.

Aristóteles defende que a felicidade da cidade é consequência de


boas acções – acções positivas e, nenhuma boa acção, pode
realizar-se sem virtude e bom senso: o valor, a justiça e o bom
senso de uma cidade têm a mesma potência e forma que sua
presença em cada cidadão privado. A forma suprema de estar na
cidade é a participação na gestão do bem comum e na gestão da
justiça.

Filosofia política na idade média

Santo Agostinho (354-430)


Nasceu em Tagaste, na Numídia. Converteu-se ao cristianismo
após uma juventude conturbada que culminou com a sua
conversão em Milão. Foi professor de retórica e nunca exerceu a
vida política. Foi bispo de Hipona e dedicou a sua vida em defesa
da religião, contra os hereges.

A sua doutrina política encontra-se em sua famosa obra intitulada


Cidade de Deus (413-427), que absorve o direito do Estado pelo
da Igreja.

Santo Agostinho fez uma apresentação do modelo em duas


cidades: a Cidade de Deus e a Cidade dos Homens. Para os
pensadores medievais, a esfera política se integrava num
horizonte muito vasto e profundo do que no pensamento grego.
Aqui transcende-se o hábito natural, isto é, a compreensão da
política como uma necessidade tendente aos bens materiais e aos
valores do homem para o bem do corpo e da alma.

A política edificada sobre os fundamentos da razão e a política


baseada no corpo místico de Cristo, fez com que todos os homens
se congregassem numa comunidade de comunhão, de intenções,
de amor total aplicado para fazer dos homens um só corpo e fazer
com os mesmos homens sejam uma só família criados à imagem
e semelhança de Deus.

A Cidade de Deus
É a cidade fundada no amor de Deus, prefigurando a Cidade
Celeste. Nesta cidade, apela-se à uma vocação sobrenatural e
traduz-se na introdução de valores cristãos na sociedade, que
implicam um bom uso da liberdade. Os cidadão vivem em
conformidade com os mandamentos da lei de Deus, e por essa via
se alcança o amor perfeito, a paz profunda, a justiça plena, a
liberdade e a realização pessoal.

O cidadão da cidade divina é um peregrino que marcha para a


salvação eterna; é um conhecedor da história, desde o seu
princípio, que é a criação, e o fim, que é a ressurreição.

A Cidade Terrena
Introdução à Filosofia 129

É uma cidade pagã que se fundamenta no amor à si próprio e no


desprezo de Deus. Não se propõe um ideal de civilização que tem
como fim assegurar a felicidade do homem; é o reino de satanás,
caracterizado por pessoas que vivem num estado de conflitos,
injustiças e guerras. Resume-se no amor à si mesmo, levado ao
desprezo de Deus; procura a glória dos Homens; o cidadão da
cidade terrena julga-se dominador e está condenado à eterna
danação.

Nesta cidade, o que importa é a realização dos valores terrenos,


tais como: a boa saúde, a força física, a liberdade, ter uma
família, ter vizinhos e amigos, pertencer à um Estado, buscar
honras, recompensas, os bens económicos e tem um discurso
filosófico racional. Estas duas cidades estão em constantes
conflitos com o objectivo de controlar o mundo.

Santo Agostinho defende a necessidade da existência da


autoridade política do Estado, de forma que se possa manter a
paz, a justiça e a segurança social.

Para Santo Agostinho, o poder vem de Deus e, portanto, o


homem não tem autoridade sobre o homem por direito de
natureza. A autoridade dos chefes funda-se na delegação do
poder divino. Assim, Deus não o delega nem ao regime, nem a
pessoa do chefe, mas confia nas pessoas secundárias quanto à
questão de pormenores. A história dos Impérios e dos regimes
particulares obedece a plano da providência divina.

Em Santo Agostinho não a coincidência entre o Império e a


Igreja. Ele retoma a diferença que existe entre a lei natural e a lei
positiva. A lei natural está no coração de cada homem, é a lei
divina; e a lei cristã é a promulgação exterior da lei interna da
alma. O direito positivo deveria ser o desenvolvimento da lei
natural.

A filosofia política tem a ver com a melhor forma de organização


social, ou seja, a análise das comunidades, das suas estruturas, do
Estado, do sistema do direito e das bases e princípios da sua
existência como comunidade. A Filosofia política analisa as
comunidades e as instituições, ocupa-se da fundamentação das
orientações do Estado e da Sociedade, buscando novos modelos
da ordem social.

Santo Tomás de Aquino


A filosofia de Santo Tomás de Aquino (1225-1274) tem como
fonte de inspiração o aristotelismo. Por isso, Tomas de Aquino
defende que o Homem é por natureza um ser social político e
pode viver e resolver todos os problemas em coordenação com os
outros membros da sociedade.

Ele deu um sentido pleno de justiça, ética política e económica,


tentado por Aristóteles, onde a temperança é recomendada aos
trabalhadores; a força compete aos defensores da cidade e a
prudência é apanágio dos chefes filósofos.

A origem do Estado está na própria natureza do Homem,


definindo o homem como animal político social porque está
130 Unidade

ordenado a viver em sociedade, e é através desta vivência social


que o homem necessita de um princípio de governo. A
necessidade do Estado não procede do pecado original que
existiria mesmo que o legado original não existisse. Os Homens
vivem mutuamente relacionados.

Uma sociedade de indivíduos com relações mútuas sem uma


autoridade que zele pelo bem comum, não pode subsistir por
muito tempo. Daí que, toda a direcção da natureza procede de
uma unidade e que a monarquia seria o regime ideal conforme o
estado de natureza.

Mas para evitar que a monarquia caía na tirania, Tomás de


Aquino aconselha para uma Constituição monárquico-moderado.

Para Tomás de Aquino, governar é o mesmo que conduzir uma


coisa ao fim devido, de maneira conveniênte; e o fim do Estado
consiste em conduzir os Cidadãos para uma vida feliz e virtuosa,
assegurando a paz, a justiça, a felicidade, que é a função de quem
governa e, os princípios são os primeiros a estar sujeitos à
prática e a salvaguardar os direitos da paz e segurança.

Filosofia Política na Idade Moderna


A Idade Moderna começa com o fim da Idade Média. Esta
mudança reflecte-se em todos os sectores dos saberes humanos,
como: a política, a religião, a filosofia, ciência, a arte, a moral e a
toda a cultura em geral. Na Idade Média a vida do espírito é
orientada para o mundo sobrenatural. A existência humana é a
preparação para outra vida, na qual se realiza o destino de cada
um, e ela se realiza pela virtude sobrenatural da graça de Deus. A
Igreja é a depositária da verdade revelada e a indispensável
intermediária entre a terra e o céu. Ela tem o poder de atar e
desatar; a ela compete formar as almas e ordenar toda a esfera da
actividade humana, individual e social.

O mundo moderno tem o seu início no século XV e não há um


facto histórico concreto que assinala a modernidade. Mas os
historiadores apresentam várias hipóteses, entre eles a queda do
Império Romano do Oriente em 1453; outros indicam a chegada
de Cristôvão Colombo às Américas em 1492; outros apontam
para o movimento da Reforma Protestante como acontecimento
que, pelo seu impacto e significado, marca a passagem da Idade
Média para a Idade Moderna, quando Martinho Lutero fixou as
95 teses na porta da paróquia de Wittenberg na Alemanha,
exigindo umas reforma na Igreja Católica, em 1517.

A modernidade caracteriza-se pelo oposto: não mais


teocentrismo, nem autoritarismo eclesiástico, mas autonomia do
mundo da cultura em relação a todo o fim transcendente; livre
explicação da actividade que a constitui; supremacia da razão na
procura da verdade; consciência do valor absoluto da pessoa
humana e afirmação do seu poder soberano no mundo. A vida e a
natureza são valorizadas por si mesmas. O homem sente que a
sua missão e o seu destino é a posse sempre mais plena deste
mundo.
Introdução à Filosofia 131

Nicolau Maquiavel (1469-1527)


“Os fins justificam os meios.” Maquiavel

Nasceu Florença (Itália) e pertencia à uma família da burguesia.


Desempenhou diversos cargos políticos e diplomáticos. Dentre as
suas obras, destacam-se: O Príncipe (1513) e Discursos sobre a
Primeira Década de Tito Lívio (1519).

Na sua primeira obra, apresenta as experiências das coisas


modernas e das lições aprendidas no passado. Ele parte duma
visão pessimista da natureza humana e propõe um Estado
fundado na força. Os governantes devem partir do pressuposto de
que todos os homens réus, e deste a empregarem todos os meios
para alcançar o fim de conservar a própria vida e do Estado. O
governante deve impor-se mais pela força do que pelo amor. Mas
o Principe, deve aparentar que está agir com a melhor das
intenções, o que significa que o principe deve ser “uma espécie
de lobo vestido de carneiro”.

Maquiavel é considerado o fundador da Ciência Política


moderna, na medida e que substitui a especulação, a observação
directa e indirecta feita através de leituras.

Fez uma classificação original e inovadora dos regimes políticos:


a República e a Monarquia.

A República: caracteriza-se por uma vontade colectiva que seria


uma república aristocrática ou uma república popular
democrática, consoante a vontade de todos ou muitos. A melhor
forma de governo depende das circunstâncias e, ele prefere uma
república porque ele defende a liberdade; há uma manutenção da
paz no território, expansão, descobertas e conquistas de novos
territórios em que um exército numeroso implica a existência de
base popular de apoio alargado.

A monarquia: seria governada pela vontade de um só indivíduo;


o monarca deve ter uma actuação apreciada em função do êxito
político alcançado e não de acordo com os critérios éticos.

É um defensor realista em que a razão do Estado deve obedecer


regras próprias de acções diferentes das que foram aplicada para
serem seguidas por vários indivíduos; sustenta que qualquer
actividade levada à cabo para manter o poder deve ser justificada
e, não obstante, neste caso, a apreciação que possa ser feita pela
moral: “os fins justificam os meios”. Em política, deve se fazer o
bem quando possível, mas também o mal, quando necessário.

Thomas Hobbes (1588-1679)


É um filósofo inglês, defensor do empirismo e da política. Ele se
diferencia de outros pensadores ingleses pela sua concepção
metafísica de cunho, claramente materialista e por sua visão ética
essencialmente hedonística. Dentre as suas obras, apresentamos
as seguintes: De corpore, que trata da física e da metafísica; De
homine, que trata sobre a gnosiologia e a psicologia; Leviathan,
que compreende a polítca e a ética. Essas obras, que forma um
132 Unidade

todo, são conhecidas também pelo título geral de Elementos de


filosofia.

O seu pensamento político teve forte influência do ambiente em


que ele viveu. Participou da vida polítca de seu país, e, mesmo
quando se encontrava no exílio, continuou a seguir os
acontecimentos que elevaram à queda da monarquia (decapitação
de Carlos I, em 1649) e a instauração de Cromwell. E foi
justamente no início desta ditadura que Hobbes escreveu a sua
obra Leviathan (1651), que é uma vigorosa apologia do
absolutismo do Estado.

Hobbes distingue dois estados da humanidade: estado natural e o


politico-social.

No estado natural: o homem goza de liberdade total, tendo todos


os direitos e nenhum dever. Mas, sendo a sua natureza egoísta,
cada um busca satisfazer os seus instintos, sem nenhuma
consideração pelos outros; segue-se daí uma luta de todos contra
todos, na qual cada homem se comporta em relação aos outros
como um lobo (o homem é o lobo do homem).

Nesta situação é impossivel a existência da felicidade, porque


todos vivem pelo temor de serem atacados uns pelos outros. Para
que se possa viver com tranquilidade é necessário transigir
quanto à liberdade e pôr-lhe limites ditados pela razão.
Obedientes a este conselho, os homens fazem um pacto, um
contracto social, com base no qual renunciam os seus direitos,
colocando-os nas mãos de um só homem, o soberano. Assim,
nasce o Estado.

O soberano não tem nenhum dever para com os súbditos, uma


vez que estes renunciaram para sempre à sua liberdade de
homens isolados para usufruírem os benefícios da sociedade no
Estado. Por isso, o soberano não é obrigado a prestar contas de
seus actos a ninguém. E os súbditos não podem exigir de volta
seus direitos porque a renúncia, uma feita, vale para sempre.
Disso se segue que a revolução nunca é lícita.

Estado político – social: caracteriza-se pela existência de um


contrato social que está na origem de um poder político forte,
com objectivo de estabelecer um ambiente de paz. Este contrato
resulta da renúncia definitiva que cada homem faz a favor do
Estado, de parte de seus direitos. Dentro deste estado, é preciso
que os indivíduos sejam iguais no momento de contrato. Sem isso
haverá sempre imposição de forças.

A moral não é natural; o homem natural não tem dever, não tem
senso de justiça, como também não tem solicitude; a moral nasce
com a lei civil e, a lei civil deve se conformar com a lei da
natureza.

A monarquia é a melhor forma de governo, o governo de um só


homem dotado de plenos poderes e que não deriva da graça de
Deus, mas sim, de um contrato social feito pelo povo.
Introdução à Filosofia 133

Assim, Hobbes é um grande defensor do absolutismo, e que sem


dificuldade, entende o Estado, como o organismo que está acima
dos cidadãos.

John Locke (1632-1704)

É o segundo grande expoente da filosofia inglesa no século XVII.


À semelhança de Hobbes, Locke se interessa pelos problemas
gnoseológicos e políticos.

Locke nasceu em Wrington, na Inglaterra, aos 19 de Agosto de


1632 e faleceu aos 28 de outubro de 1704. Estudou na
Universidade de Oxford, tendo-se em ciências experimentais,
especialmente a medicina, na qual se destacou.

As suas obras são as seguintes: Dois tratados sobre o Governo,


Ensaio sobre o intelecto humano, Cartas sobre a tolerância
religiosa. Participou por algum tempo na vida política e, depois
se retirou para Oates, onde veio a falecer.

Em relação à politica, Locke expõe a sua doutrina nos Dois


tratados sobre o governo. Como Hobbes, ele distingue dois
estados: o estado de natureza e estado social.

O Estado de natureza não é um estado no qual cada um tenha


direitos ilimitados sobre tudo. O Estado de natureza, diz Locke,
tem uma lei da natureza que obriga a todos; e a razão, que é esta
lei, ensina a humanidade quando esta a consulta, que, sendo todos
iguais e independentes, ninguém deve causar danos a outrem em
sua vida, em sua saúde, liberdade e em sua propriedade.

O direito do homem é limitado à própria pessoa e, por isso, é


direito à vida, à liberdade e à propriedade, esta última enquanto
produto de seu trabalho. Este direito implica inegavelmenteo
direito de punir o ofensor; não implica o uso de uma força
absoluta e arbitrária, mas só aquela reacção que a razão e a
consci6encia indicam como proporcional à transgressão.

O primeiro impulso para a criação de uma sociedade civil é dado


pela incerteza e pela instabilidade das formas pelas quais o
direito punitivo é exercido no estado de natureza.

Uma sociedade civil e um Estado nascem quando os Homens


decidem de comum acordo confiar à sua comunidade o poder de
estabelecer leis que regulem a punição das ofensas e o uso da
força contra as transgressões destas leis.

O contrato social cria a autoridade, isto é, confia a alguns o


encargo de velar pelos direitos de todos. O contrato é uma
delegação de sua defesa à autoridade. O cidadão conserva sempre
os seus direitos naturais (à vida, à liberdade, à propriedade
privada, à família, etc.). O contrato social implica somente a
renúncia à defesa privada dos direitos e ao uso de alguns deles
quando o bem comum o exige ( a renúncia, por exemplo, ao
direito à vida quando a pátria está em perigo).

A autoridade é legítima quando usa os seus poderes para o bem


dos cidadãos; é tirânica quando os usa em benefício próprio,
134 Unidade

contra a autoridade dos cidadãos. No segundo caso, os cidadãos


têm o direito de se rebelarem contra o poder tirânico.

Jean-Jacques Rousseau (1712-1778)

Natural de Genebra, na Suíça, deixou sua terra natal aos 16 anos


de idade. Levou uma vida conturbada, andando por diversos
lugares, ora por espirito de aventura, ora devido a perseguições
religiosas. Dentre suas obras, destacam-se: Discurso sobre a
origem da desigualdade entre os homens, Do contrato Social,
ambos sobre política, e Emílio ou da Educação (1762).

Tal como Locke, Rousseau criticou o absolutismo e elaborou os


fundamentos da doutrina liberal. No entanto, o seu pensamento
pedagógico não se separa de sua concepção política, que é mais
democrática do que a teoria de Locke. Para Rousseau, o
indivíduo em estado de natureza é bom, mas se corrompe na
sociedade, que destrói sua liberdade. Ele defende que “o homem
nasce livre e por toda parte encontra-se a ferros”. Considera então
a possibilidade de um contrato social verdadeiro e legítimo, que
reúne o povo numa só vontade, resultante do consentimento de
todas as pessoas.

A concepção política de Rousseau foi menos elitista que a de


Locke, por conta da diferente noção de soberania.

Segundo Rousseau, o cidadão não escolhe representantes a quem


delegar o poder, como defendiam Locke e a tradição liberal,
porque para ele só o povo é soberania. Ou seja, o pacto que
institui o governo não submete o povo a ele, isto é, os
depositários de poder não são senhores do povo, mas seus
oficiais, e apenas executam as leis que emanam do povo. Nesse
sentido, Rousseau critica o regime representativo e defende a
democracia directa, pois toda a lei não ratificada pelo povo é
nula.

Portanto, o soberano é o povo incorporado, o corpo colectivo que


exprime, na lei, a vontade geral. Segundo a teoria de Rousseau, a
vontade geral não se confunde coma vontade da maioria, como o
senso comum deveria pensar, porque as decisões não resultam da
somatória das vontades individuais, mas expressam o interesse
comum, isto é, o interesse de todos, como participantes da
comunidade.

O cidadão, activo e soberano, capaz de autonomia e liberdade, é


ao mesmo tempo súbdito, porque se submete à lei que ele próprio
ajudou a erigir. Liberdade e obediência são pólos que devem se
completar na vida da pessoa em sociedade. Pólos que devem se
completar na vida da pessoa em sociedade.

Montesquieu (1689-1755)

Nasceu perto de Bordéus, na França. Era filho de família nobre, e


o seu nome era Charles – Louis de Secondant, barão da La Bréde
e posteriormente barão de Montesquieu. Teve formação
iluminista com os padres oratorianos, de modo que cedo se
mostrou um crítico severo e irónico da monarquia absolutista
Introdução à Filosofia 135

decadente, bem como do clero. Dentre as suas obras destacaram-


se: Cartas persas e o Espírito das leis.

Sua obra mais importante é o Espirito das Leis, onde discute a


respeito das instituições e das leis, e busca compreender a
diversidade das legislações existentes em diferentes épocas e
lugares.

ao procurar descobrir as relações que as leis têm com a natureza e


o princípio de cada governo, Montesquieu desenvolve uma teoria
do governo que alimenta as ideias fecundas do
constitucionalismo, pelo qual se busca se distribuir a autoridade
por meios legais, de modo a evitar o arbítrio e a violência.

Tais ideias se encaminham para a melhor definição da separação


dos poderes: legislativo, executivo e judiciário. Cada um desses
poderes deve-se manter autônomo e constituído por pessoas
diferentes. Reflectindo sobre o abuso do poder real, Montesquieu
conclui que “só o poder freia o poder”. Por isso propõe a
separação de poderes. Ele não defende uma separação tão rígida,
pois o que ele pretendia de facto era realçar a relação de forças e
a necessidade de equilíbrio e harmonia entre os três poderes.
Critica toda a forma de despotismo, mas prefere a monarquia
moderada e não aprecia a idéia de o povo assumir o poder.

Em ralação a liberdade, Montesquieu diz-nos que “é verdade que


nas democracias o povo parece fazer o que; mas a liberdade
política não consiste nisso. Num Estado em que a leis, a liberdade
não pode consistir senão em poder fazer o que se deve querer e
em não ser constrangido a fazer o que não se deve desejar”.

A Filosofia Política Contemporânea

John Rawls (1921-2002)

Nasceu em Baltimore a 21 de Fevereiro de 1921, e veio a falecer


em 24 de Novembro de 2002. Foi professor de Filosofia Política
na Universidade de Harvard, autor de Uma Teoria da Justiça
(1971), Liberalismo Político (1993), e O Direito dos Povos
(1999).

A Justiça para Rawls é eqüidade no momento inicial do pacto,


partindo-se da suposição que todos são iguais, e que por isso
podem determinar a forma de actuar a defesa dos seus direitos,
fixar os direitos, categorizar os bens que interessam ao grupo
social.

Num segundo momento a Justiça é vista como um bem, partindo


da idéia primária de que ninguém teria conceitos de bem,
conceito agora fixado contractualmente como também os seus
princípios aptos a produzir vantagens para todos – o que somente
seria justo, ou para alguns quando se destinar a melhorar os
menos privilegiados – como redistribuição. Justiça e igualdade, à
moda liberal, andam juntos no conceito proposto pela teoria de
Rawls, representando efetivamente, sem assumir, uma postura de
defesa do neoliberalismo.

John Rawls apresenta dois princípois da justiça:


136 Unidade

Primeiro princípio: exige a igualdade das atribuições dos direitos


e dos deveres básicos. Cada pessoa, tem o direito igual ao
cunjunto mais extenso de liberdades fundamentais, iguais para
todos.

O segundo princípio: põe que as desigualdades sócioeconômicas


são justas se produzem, em compensação, vantagens para cada
um, se beneficiam os indivíduos menos favorecidos. Não há
nenhuma injustiça em um pequeno número obter vantagens
superiores à média, sob a condição de que seja melhorada a
situação dos desfavorecidos.

Assim, o modelo de John Rawls da justiça se enraiza na ideia de


um procedimento de escolha equitativa, estranha à
predominância de tal ou tal interesse particular, procedimento
onde se enraiza a escolha de princípios justos.

Propriedade, considerada como um bem primário, é um direito de


liberdade e de igualdade. A liberdade é um princípio inegociável,
que identifica, no principio de diferença, um mecanismo para
concretizar e satisfazer Direito de propriedade. Neste contexto,
busca-se uma alternativa política para conflitos de direitos de
políticas, de valores e de deveres constitucionais, principalmente
decorrentes das demandas da liberdade e igualdades relacionadas
ao direito de propriedade.

Para uma justiça com equidade, é necessário que haja um pacto


com uso ao recurso do véu da ignorância, em que as partes
desconheçam habilidades, capacidades e benefícios. A ideia deste
pacto, é desvincular os cidadãos de interesses pessoais,
ideologias, habilidades, etc. É necessário um pacto que leve em
conta o recurso do véu da ignorância na posição original para
atingir o máximo a igualdade. O véu da ignorância se dá por um
critério de racionalidade. Com isso, escolhem-se os princípios da
justiça (o primeiro princípio da liberdade e o segundo da
diferença, sendo que o segundo subdivide-se em dois: igualdade
equitativa de oportunidades e os menos favorecidos sendo
beneficiados ao máximo na ocorrência de desigualdades
socioeconómicas).

A propriedade é analisada como direito de liberdade ou direito de


igualdade, sendo que, pelo direito de liberdade, é tida como
essncial à persoalidade, ao auto-respeito e à auto-estima do
cidadão.

No segundo princípio, objectiva-se a concretização de direitos


essenciais à promoção da cidadania. Demonstra-se que a
Constituição preceitua o direito de propriedade, a função social, a
liberdade e a igualdade, entre outros valores políticos e sociais.

Karl Popper (1902-1994)

Nasceu em Viena de Austria. Fez os seus estudos em


Matemáticas, Fïsica, Filosofia, Psicologia e História da música.
Foi professor do ensino secundário. Conviveu com o Círculo de
Viena, embora não tenha sido convidado para nela colaborar.
Introdução à Filosofia 137

Dentre as suas obras destacamos as seguintes: Lógica da


Descoberta Científica (1934); A Sociedade Aberta e os seus
inimigos (1943); Pobreza do Historicismo (1944); Conjenturas e
Refutações. O crescimento do conhecimento científico (1963);
Conhecimento Científico. Um enfoque Evolucionário (1973);
Sociedade Aberta. Universo Aberto (1982); Para um Mundo
Melhor (1989), etc.

Foi vítima do nazismo que se fez sentir sobre a Alemanha e a


Áustria. Popper, procurou reflectir sobre a génese e a
fundamentação ideológica dos regimes totalitários. Platão, Hegel
e Marx foram por ele apresentados como os principais teóricos
destes regimes, assim de uma visão da história que os justificava,
o Historicismo. As suas idéias podem ser resumidas nos
seguintes tópicos:

- A história da humanidade não tem um sentido concreto que


antecipadamente possa ser conhecido, o único sentido que possui
é aquele que os homens lhe dão; o progresso da humanidade é
possível, e não carece de um critério último de verdade; a razão
humana é essencialmente falível, o dogmatismo não tem pois
qualquer fundamento. A única atitude justificável para atingir a
verdade é através do diálogo, o confronto de idéias por meios não
violentos.

Na ciência significa aceitar o risco de formular hipóteses que


venham depois a ser refutadas pela experiência. Na política
significa que cada um deve aceitar o risco de ver as suas
propostas serem recusadas por outros no confronto de idéias ou
projectos.
Formas de Sistemas Políticos: Monocráticas e Pluricráticas
A monocracia opõe-se a divisão de poderes. São monócráticos os
governos que só têm poder em si próprios e tendem a confundir o
poder com a propriedade. Na monocracia haveria um centro
único de força política, independentemente do processo de
designação ou de recrutamento da autoridade governamental,
situação que formas pré-estaduais, onde existe confusão entre a
Propriedade e o exercício de Poder e que se distinguiria com a
autocracia, o regime em que os governos só têm o poder de si
próprios.

Já na divisão de poderes, eis que em lugar de confundir com uma


vontade única, o Poder do Estado só se imporá por efeito de um
acordo entre as vontades de vários órgãos, de tal maneira que a
eficácia de cada uma delas se sobordinará ao consentimento de
todas as outras. Este sistema político denomina-se pluricrático.
138 Unidade

Exercícios
1 – O que é democracia?
Resposta: Em sua origem grega, "democracia" quer dizer
"governo do povo". No sistema moderno, no entanto, não é
Auto-avaliação possível que o povo governe propriamente (o que representaria
uma democracia directa). Assim, os actos de governo são
exercidos por membros do povo ditos "politicamente
constituídos", que são aqueles nomeados para cargos públicos
através de eleição. No Estado democrático, as funções típicas e
indelegáveis do Estado são exercidas por indivíduos eleitos pelo
povo para tanto, de acordo com regras pré-estabelecidas que
regerão o pleito eleitoral.
Introdução à Filosofia 139

Unidade N0 21-A0010

Tema: Ciência.

Introdução
O homem é um ser condenado a viver a sua existência no mundo.
Pode ser existencial, tem que interpretar a si e ao mundo em que
vive, atribuindo-lhe significados. Cria intelectualmente
representações significativas da realidade. A essas representações
chamamos conhecimento.

O conhecimento, dependendo da forma pela qual se chega a essa


representação significativa, pode ser, em linhas gerais,
classificado em diversos tipos: mítico, ordinário, artístico,
filosófico, religioso e cientifico.

As duas formas que estão mais presentes e que mais interferem


nas decisões da vida diária do homem são o conhecimento do
senso comum e o cientifico.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Identificar as duas formas de conhecimentos

 Caracterizar os tipos de conhecimentos.


Objectivos

Sumário

 Identificar as duas formas de conhecimentos.

 Caracterizar os tipos de conhecimentos.


Obj
ecti
vos

Conhecimento do senso comum


140 Unidade

A forma mais usual que o homem utiliza para interpretar a si


mesmo, o seu mundo e o universo como um todo, produzindo
interpretações significativas, isto é, conhecimento, é a do senso
comum, também chamado de conhecimento ordinário, comum ou
empírico (KOCHE, 1997: 32)

Chamamos de conhecimento espontâneo ou senso comum o


saber resultante das experiências levadas a efeito pelo homem ao
enfrentar os problemas da existência. Nesse processo ele não se
encontra solitário, pois tem o concurso dos contemporâneos com
quem troca informações. Além disso, cada geração recebe das
anteriores a herança fecunda que não só é assimilada como
também transformada.

O conhecimento do senso comum é ametódico e assistemático, e


nasce diante da tentativa do homem de resolver os problemas da
vida diária. O homem do campo sabe plantar e colher segundo
normas que aprendeu com seus pais, usando técnicas herdadas de
seu grupo social e que se transformam lentamente em função dos
acontecimentos casuais com os quais se depara.

Ė um tipo de conhecimento empírico, porque se baseia na


experiência cotidiana e comum das pessoas, distinguindo-se por
isso da experiência cientifica, que exige um planeamento
rigoroso. É também um conhecimento ingénuo: ingenuidade aqui
deve-se entender como atitude não-critica, típica do saber que
não se coloca como problema e não se questiona enquanto saber.

Muitas vezes o conhecimento do senso comum é preso das


aparências em comparação com a ciência, o senso comum é
fragmentário, pois não estabelece conexões onde estas poderiam
ser verificadas.

É um conhecimento particular, restrito a pequena amostra da


realidade, a partir da qual são feitas generalizações muitas vezes
apressadas e imprecisas. O homem comum selecciona os dados
observados sem nenhum critério de rigor, de forma ametódica e
fortuita. Em outras palavras, conclui para todos os objectos o que
vale para um ou para um grupo de objectos.

É frequentemente um conhecimento subjectivo, o que ocorre, por


exemplo, quando avaliamos a temperatura do ambiente com a
nossa pele, já que só o termómetro dá objectividade a essa
avaliação. Ainda mais o senso comum depende de juízos pessoais
a respeito das coisas, com envolvimento das emoções e dos
valores de quem observa.

O conhecimento cientifico

O conhecimento cientifico é uma conquista recente da


humanidade: surgiu no século XVII com a revolução galileana.
Isso não significa que antes dessa data não houvesse o saber
rigoroso, pois desde o século VI a.C., na Grécia Antiga, os
homens aspiravam um conhecimento que se distinguisse do mito
e do saber comum. Tais sábios ocupavam-se com a filosofia e a
ciência.
Introdução à Filosofia 141

No século V a. C., Sócrates buscava a definição dos conceitos,


por meio da qual pretendia atingir a essência das coisas. Platão
mostrava o caminho que a educação do sábio devia percorrer
para ir da opinião a ciência.

No pensamento grego, a ciência e a filosofia encontravam-se


vinculadas e só vieram a se separar na Idade Moderna, buscando
cada uma delas seu próprio caminho, ou seja, seu método.

“A ciência moderna nasce ao determinar um objecto especifico


de investigação e ao criar um método pelo qual se fará o controle
desse conhecimento. A utilização dos métodos rigorosos permite
que a ciência atinja um tipo de conhecimento sistemático, preciso
e objectivo, segundo o qual são descobertas relações universais e
necessárias entre os fenómenos, o que permite prever
acontecimentos e também agir sobre a natureza de forma mais
segura” (ARANHA, 1993: 128-129).

Assim , cada ciência se torna então uma ciência particular, no


sentido de ter um campo delimitado de pesquisa e um método
próprio. As ciências são particulares na medida na medida em
que cada um privilegia sectores distintos da realidade: a física
trata do movimento dos corpos; a química, da sua transformação;
a biologia, do ser vivo, etc.

Por outro lado, as ciências são também gerais, no sentido de que


as conclusões não valem apenas para os casos observados, e sim
para todos os que a ele se assemelham.

O conhecimento cientifico é caracterizado pela objectividade: as


conclusões podem ser observadas por qualquer membro
competente da comunidade cientifica, pois a racionalidade desse
conhecimento procura despojar-se do emotivo, tornando-se
impessoal na medida do possível.

Para ser objectivo e preciso, o conhecimento cientifico dispõe de


uma linguagem rigorosa cujos conceitos são definidos de modo a
evitar a ambiguidade. A linguagem se torna cada vez mais
precisa, na medida em que utiliza a matemática para transformar
qualidades em quantidades.

Exercícios
1 – Quais são as formas de conhecimento mais usados pelo
homem?
Resposta: As duas formas de conhecimento mais usados pelo
homem são o conhecimento do senso comum e o conhecimento
científico.
Auto-avaliação
142 Unidade

Unidade N0 22-A0010

Tema: A Estética.

Introdução
“A estética designa simultaneamente: a capacidade humana de
captação do que nos rodeia através dos órgãos dos sentidos; o
sentimento de agrado ou de desagrado que acompanha as nossas
percepções” (ALVES, 1997: 131).

A atitude estética consiste em perceber o objecto como objecto


estético, ou seja, como objecto de que se gosta ou não se gosta.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Definir o conceito de Estética.

 Destacar as modalidades da experiência estética.

Objectivos

Sumário
A palavra estética vem do grego aisthesis, com o significado de
“faculdade de sentir”, “compreensão pelos sentidos”,
“percepção totalizante”.

A ligação da estética com a arte é ainda mais estreita se se


considera que o objecto artístico é aquele que se oferece ao
sentimento e a percepção. Por isso, enquanto disciplina filosófica,
a estética está voltada para as teorias da criação e percepção
artísticas.

Modalidades da experiência estética

Segundo J. Neves Vicente, a experiência estética pode desdobrar-


se em três dimensões distintas, que são:

Experiência estética da natureza: experiência estética do ser


humano quando, na admiração da natureza, e sujeito de
determinados sentimentos ou vivências, tais como o prazer, o
deleite, a maravilha, o espanto que o conduzem a contemplação.
Introdução à Filosofia 143

Experiência estética da criação artística: experiência do artista


da fase da criação; uma experiência tantas vezes marcada pela
reflexão, pelo silencio, pelo isolamento.

Experiência estética da obra da arte: experiência do espectador


na contemplação da obra da arte, também designada por
experiência estética da recepção.

Exercícios

1 – Quais são as modalidades da experiência estética?


Resposta: experiência estética de natureza; experiência estética da
criação artística e experiência estética da obra da arte.
Auto-avaliação
144 Unidade

Unidade N0 23-A0010

Tema: A expressão artística.

Introdução
“A arte ou técnica era uma actividade que obedecia regras para a
produção de uma obra. Em sentido amplo, arte significa
habilidade ou agilidade para inventar meios para vencer uma
dificuldade ou um obstáculo postos pela natureza. Em sentido
restrito, significa a aprendizagem e a prática de um oficio que
possui regras, procedimentos e instrumentos próprios. Ars ou
tekhne era um saber pratico”(CHAUI, 2003: 275).

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conceituar a arte.

 Conhecer as atitudes perante uma obra de arte.


Objectivos  Diferenciar o belo do feio.

Sumário
A palavra arte vem do latim ars e corresponde ao termo grego
tékhne, “técnica”, que significa “toda actividade humana
submetida a regras em vista da fabricação de alguma coisa”. No
latim, artesão, artífice ou artista se diz artifex, “o que faz com
arte”, e também opficis, “o que exerce um ofício”, e o resultado
de sua acção se diz opus (no singular) e opera (no plural), isto é,
obra.

Que representação social se tem dos artistas? Que se diz dos


artistas? Como se interpreta a sua actividade?

Segundo J. Neves Vicente, aos artistas atribui-se-lhes


originalidade, mas também fantasia. O mundo dos artistas e da
arte apresenta-se como um mundo fechado, uma torre de marfim
onde eles se refugiam.
Introdução à Filosofia 145

Atribui-se-lhes sensibilidade e imaginação, mas atribui-se-lhes


em particular a falsificação do mundo e da vida. A critica mais
comum que e feita aos artistas e precisamente a de oferecerem
um mundo irreal, um mundo de ficções. Como se arte e a vida se
encontrassem em oposição irredutível.

Mas não teria sentido opor a arte e a vida, a não ser que se
entenda, erradamente, que a arte e imitação, ainda por cima
imperfeita, se não mesmo enganadora.

O poder da criação artística e não só a posse e o domínio de um


outro olhar sobre os seres e as coisas, mas também sobretudo o
domínio de um poder de criação incomparável ao poder de
produção ou da fabricação de objectos úteis.

Atitude perante a obra de arte

Perante a obra de arte, o ser humano pode situar-se numa das


seguintes tres posições:

Como criador: o ser humano, por meio da realizaçao da obra,


opera, como se disse, a transfiguraçao do real; inventa um mundo
distinto do que é dado na percepção.

Como espectador: o ser humano colabora na recriação da obra e


também na transfiguração da realidade.

Como critico: o ser humano procura, entre outras coisas,


interpretar o significado antropológico da criação artistica e
determinar os critérios da beleza, etc. Esta e a atitude do esteta,
do historiador da arte, do sociólogo, do antropólogo, do
psicólogo e do filósofo.

O belo e o feio: a questão do gosto


Desde Platão ao classicismo, os filósofos tentaram fundamentar a
objectividade da arte e da beleza. Para Platão, a beleza é a única
ideia que resplandece no mundo. Se, por um lado ele reconhece o
carácter sensivel do belo, por outro, continua a afirmar a sua
essência ideal, objectiva. Somos assim obrigados a admitir a
existência do belo em si, independente das obras individuais que,
na medida do possivel, devem se aproximar desse ideal universal.

No classicismo, as artes seguem regras e procedimentos


específicos a partir desse belo ideal, fundando a estética
normativa. É o objecto que passa a ter qualidades que o tornam
mais ou menos agradável e independente do sujeito que as
percebe.

Os filósofos empiristas como David Hume, relativizam a beleza


ao gosto de cada um. Aquilo que depende do gosto e da opinião
pessoal não pode ser discutido racionalmente, donde o ditado:
“gosto não se discute”. O belo, portanto não está mais no
objecto, mas nas condições de percepção do sujeito.Para Kant, “o
belo é aquilo que agrada universalmente, ainda que não se possa
justifica-lo intelectualmente”(ARANHA, 1993:342). Para ele, o
146 Unidade

objecto de belo é uma ocasião de prazer, cuja causa reside no


sujeito. O principio do sujeito estético é o sentimento do sujeito e
não o conceito de sujeito. Belo, portanto, é umas qualidade que
atribuimos aos objectos para exprimir um certo estado da nossa
subjectividade. Sendo assim, não há uma ideia de belo nem pode
haver regras para produzi-lo.

Hegel, introduz o conceito de história. A beleza muda de face e


de aspecto através dos tempos. Essa mudança (devir), que se
reflecte na arte, depende mais da cultura e da visão do mundo
vigentes do que de uma exigência interna do belo.

Actualmente, considera-se o belo como uma qualidade de certos


objectos singulares que nos são dados a percepção. Beleza é uma
imanência total de um sentido ao sensivel. O objecto é belo
porque realiza o seu destino, é autêntico, e verdadeiramente
segundo o seu modo de ser, isto é, um objecto singular, sensivel,
que carrega um significado que só pode ser percebido na
experiência estética. Não existe mais a ideia de um único valor
estético a partir do qual julgamos todas as obras. Cada objecto
singular estabelece seu próprio tipo de beleza.

O problema do feio: “está implicito nas colocações que são feitas


sobre o belo. Por principio, o feio não pode ser objecto de arte.
Há dois modos de representar o feio: a representação do assunto
“feio” e a forma de representação feia.

No primeiro caso, embora o assunto “feio” tenha sido banido do


território artistico durante séculos, no século XIX ele vem a ser
reabilitado. No momento em que arte rompe com a ideia de ser
“cópia do real” para ser considerada criação autônoma que tem
por função revelar as possibilidades do real, ela passa a ser
avaliada de acordo com a autenticidade da sua proposta e com a
sua capacidade de falar ao sentimento”(ARANHA, 1993: 342).

O problema do belo e do feio é deslocado do assunto para o


modo de representação. E só haverá obras feias na medida em
que forem malfeitas, isto é, que não corresponderem plenamente
a sua proposta. Em outras palavras, sempre que houver uma obra
feia, não haverá uma obra de arte.

A questão do gosto tem a ver com a capacidade de julgamento


sem preconceitos. Gostar alguma coisa é, pois ter essa capacidade
de avaliar e julgar tal coisa ou objecto sem preconceitos. Gosto é,
finalmente, comunicação com a obra para além de todo o saber e
de toda a técnica.
Introdução à Filosofia 147

Exercícios
1 – O que se entende de Belo na actualidade?

Resposta: Na actualidade considera-se o belo como uma


qualidade de certos objectos singulares que nos são dados a
Auto-avaliação percepção. Beleza é uma imanência total de um sentido ao
sensivel. O objecto é belo porque realiza o seu destino, é
autêntico, e verdadeiramente segundo o seu modo de ser, isto é,
um objecto singular, sensivel, que carrega um significado que só
pode ser percebido na experiência estética. Não existe mais a
ideia de um único valor estético a partir do qual julgamos todas
as obras. Cada objecto singular estabelece seu próprio tipo de
beleza.
148 Unidade

Unidade N0 24-A0010

Tema: A experiência religiosa.

Introdução
O sentimento religioso corresponde a um sentir profundo da
natureza humana que pretende re-estabelecer os laços com um
plano de realidade que se designa por sagrado; o sentimento
religioso não passa de uma ilusao que se dissipara com a
emancipação da razão, possível atravês da ciência e da reflexão
filosófica.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Definir o conceito de religião.

 Destacar os modos de encarar a religião.

Objectivos  Diferenciar o sagrado do profano.

 Descrever as diferentes concepções sobre a experiência religiosa.

Sumário

A palavra religião deriva do latim: de relegere, significa


respeitar, prestar culto; de religare, que significa, voltar a
juntar, unir. Neste último sentido, significa pois, que a religião é
um laço de união entre os homens e o sagrado.

Religião, segundo Cicero (106-43 a.C), é o respeito que o


indivíduo sente, no mais profundo de si, perante qualquer ser que
disso seja digno, em particular o divino ou o sagrado. Este
respeito manifesta-se no cuidado que se coloca a quando da
participação nos ritos e outros gestos tradicionais da sociedade.

Para Lucrêcio, poeta romano, seguidor da filosofia materialista


de Epicuro (99-55 a. C.), a religião é um sistema de ameaças e
promessas que cultiva e desenvolve o medo instintivo do ser
humano, contra o qual o individuo, se for corajoso, se revoltara
Introdução à Filosofia 149

e sobre o qual triunfará graças ao conhecimento cientifico e a


sabedoria filosofica.

Modos de encarar a religião

Segundo Albert Einstein, citado por J. Neves Vicente, existem


três modos de encarar a religião:

 A religião – temor: aquela que surgiu para compensar a


fragilidade humana;
 A religião-moral: existe para compensar os mecanismos de
controle social;
 A religiosidade – côsmica: expressa o sentimento de maravilha
perante a natureza.

A experiência religiosa

Diante do sagrado, o homem religioso é possuído pelo


sentimento de pavor, de medo, porque apresenta-se como algo de
tremendo. Mas, ao mesmo tempo, o homem religioso é invadido
pelo sentimento de atracção porque o mesmo sagrado se lhe
apresenta também como fascinante e protector.

Se, para alguns, a experiência religiosa teve a sua origem nos


sentimentos de pavor e medo, para outros, ela teve a sua origem
na experiência da dependência, de estar nas mãos de, de estar
sujeita a forças indomáveis e em particular ante as forças da
natureza que o ser humano não controla e que não raras vezes
lhes são adversas.

Para outros, a experiência religiosa confunde-se com a


experiência da finitude, de limitação, de impotência, donde o
sentimento de submetimento da fragilidade humana a um poder
superior, presente ainda que oculto na própria natureza ou acima
dela.

Para outros, a experiência religiosa nasce sobretudo da


necessidade ou vontade de sentido: sentido para ordem côsmica,
para o mal, para a morte e sobretudo para a existência. O mundo
apresenta-se como irracional e inóspito, incompatível com o
Homem, se não tem em si ou por trâs de si uma realidade
absoluta que lhe de consistência e assegure a sua inteligibilidade.

Para outros ainda, a experiência religiosa nasce da experiência de


se estar ligado, de ser-com, da abertura aos outros, ao universo,
ao infinito, ao transcendente.

Para outros ainda, a experiência religiosa nasce da necessidade


que o Homem tem de viver num mundo onde lhe seja dado
discernir o bom do mau, o junto do injusto.
150 Unidade

O sagrado e o profano

O sagrado é a experiência da presença de uma potência ou de


uma força sobrenatural que habita algum ser: planta, animal,
humano, coisas, ventos, águas, fogo. Essa potência é tanto um
poder que pertence definitivamente a um determinado ser quanto
algo que ele pode possuir e perder, não ter e adquirir. O sagrado é
experiência simbólica da diferença entre os seres, da
superioridade de alguns sobre os outros, do poderio de alguns
sobre os outros: superioridade e poder sentidos como espantosos,
misteriosos, desejados e temidos (CHAUI, 2003: 252-253).

O sagrado pode definir-se pela negativa – opõe-se ao profano –


ou pela positiva – como uma força ( a que os antropólogos e
sociólogos chamam manã) que não dimana do mundo dito natural
ou biofísico, mas do que se considera, em sentido lato, o mundo
do sobrenatural.

A experiência do sagrado é uma experiência do tremendo, pois o


sagrado é sempre ambivalente, simultaneamente atrai e assusta,
uma vez que a sua natureza reveste quer o carácter de divino
(benéfico para o ser humano), quer de demoníaco (o maléfico
para o ser humano), sendo a esse tremendo, a esse poder que
aterroriza o mistério tremendo.

O sagrado é uma hierofania, uma manifestação do que não é


natural nem social, mas antes sobrenatural que transcende o
nosso plano de experiência comum, pois é o completamente
outro, que pode causar em quem a vive quer um sentimento de
quietude e paz propícia ao recolhimento, quer um sentimento de
profunda perturbação emocional, que se pode traduzir em actos
convulsivos e violentos.

Exercícios

1 – Quais os modos de encarar a religião?


Resposta: Os modos de encarar a religião são:
a) A religião – temor: aquela que surgiu para compensar a
fragilidade humana;
Auto-avaliação
b) A religião-moral: existe para compensar os mecanismos de
controle social;
c) A religiosidade – cósmica: expressa o sentimento de
maravilha perante à natureza.
Introdução à Filosofia 151

EXERCÍCIOS PARA RESOLVER

Em cinco (05) páginas no mínimo, faça uma redacção dos


seguintes sub-temas do tema – “Introdução à Filosofia”:

1. Trabalho1 para primeira sessão presencial – Código: T-F.E-01

 A Questão de método, objecto e objectivos da Filosofia.


a) Diferença entre Filosofia e outras ciências;
b) Funções e atitudes da Filosofia;
c) Etapas da História da Filosofia

2. Trabalho2 para segunda sessão presencial – Código: T-F.E-02

 A Questão da Pessoa Humana:

a) Destacar a relação da Pessoa Humana com:


b) O mundo, consigo mesmo, com Deus e o trabalho.
c) Falar da consciência moral em diferentes perspectivas.
d) Relação entre liberdade e responsabilidade;
e) Relação entre acção humana e os valores;
f) Teoria do Conhecimento: Origem, natureza e possibilidades do
Conhecimento.

3. Trabalho3 para terceira sessão presencial – Código: T-F.E-03

a) A Questão sobre a lógica:

b) Relação entre linguagem, comunicação, pensamento e discurso;


c) Comentar sobre as dimensões do discurso humano;
d) Fazer referência dos novos domínios da lógicas e desenvolver
apenas um.
e) Princípios da razão.
 Sobre a politica:
a) Relação entre Filosofia e Politica;
b) Destacar os pensamentos políticos nas suas diferentes épocas
históricas e seus principais representantes.
c) Os poderes e elementos do Estado;
d) Importância e história dos Direitos Humanos;
e) Formas de Sistemas políticos;
 Sobre a Estética:
a) Relacionar a estética da arte;
152 Unidade

b) Relação entre arte e religião;

c) Experiência religiosa e os modos de encarar a religião.


Introdução à Filosofia 153

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

1. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia,


Martins Fontes, S. Paulo, 2003

2. ALVES, Fátima, et al. A Chave do Saber –


Introdução à Filosofia 10º Ano, Porto editora, Porto,
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3. ALVES, Fátima et al. A Chave do Agir - Introdução


à Filosofia 10º Ano, Texto editora, Lisboa, 1997

4. ARANHA, Maria Lúcia de Arruda et al.


Filosofando. Introdução à Filosofia; 2ª edição, S.
Paulo, 1993

5. CHAMBISSE, Ernesto et al. A Emergência do


Filosofar. Filosofia 11ª/12ª Classe, 1ª edição; S.
Paulo, 2003

6. CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia, 13ª edição, S.


Paulo, 2003

7. COTRIM, Gilberto. Fundamentos de Filosofia; 15ª


edição, editora Saraiva, S. Paulo, 2002

8. JASPERS, Karl. Introdução ao Pensamento


Filosófico, editora Cultrix, S. Paulo, s/d

9. LOPES, João. Introdução à Filosofia 2, Didáctica


editora; Lisboa, 1977

10. MARTÏNEZ, Soares. Filosofia do Direito, 3ª edição,


Editora Almedina, Coimbra, 2003

11. MONDIN, B. O Homem, que é ele? Elementos da


Antropologia Filosófica; 7ª edição, edições Paulinas,
S.Paulo, 1980
154 Unidade

12. MONDIN, B. Introdução à Filosofia; Problemas,


Sistemas, Obras; 7ª edição, edições Paulinas, S.
Paulo, 1980

13. POVEY, George et al. Conduta Obstétrica; Imprensa


do Partido, Maputo, 1990

14. RAMPAZZO, Lino. Metodologia Científica; Para


alunos dos cursos de graduação e pós-graduação; 3ª
edição; Edições Loyola; S. Paulo, 2002

15. RACHELS, James. Os Elementos da Filosofia da


Moral; 4ª edição; Editora Monete; S. Paulo, 2006

16. REALLE, Giovanni; ANTISERI, Dário. História da


Filosofia, Vol I; editora Paulus, S.Paulo, 1990

17. RUSS, Jaqueline. Pensamento Ético


Contemporâneo, Editora Paulus; S. Paulo, 1999

18. SERRALHEIRO, Deolinda. O Acto Educativo


Religioso e Moral; Educar na fé hoje; Secretariado
Nacional de Educação Cristã; Lisboa, 1995

19. VICENTE, J. Neves. Razão e Diálogo, Introdução à


Filosofia 10º Ano, Porto editora, Porto, 1998.

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