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SUPREMO CONSELHO DO RITO MODERNO


Vi Encontro nacional do rito moderno
Rio de janeiro - 2011

ÉTICA

Walter Celso de Lima, 8o


Florianópolis, SC

Ética é o estudo da conduta humana. Conduta é a maneira de se comportar, ou


seja, um conjunto de atitudes e reações do indivíduo, em face ao meio social. Uma
definição mais precisa, clássica e formal: ética é a parte da filosofia que estuda os
juízos de apreciação, referentes a conduta humana, susceptível de qualificação do
ponto de vista do bem e do mal, seja relativa à determinada sociedade, seja de modo
absoluto. Analisando tal definição: ética é o ramo do conhecimento que estuda a
conduta humana, parte da filosofia chamada deontologia, (δέονλογία; δέον = deon
= dever, obrigação) em que se estudam os princípios, os fundamentos e os sistemas
de moral (SEP, 2007). Em filosofia, ética pode significar o que é bom para o
indivíduo e para a sociedade, e seu estudo contribui para estabelecer a natureza de
deveres no relacionamento indivíduo - sociedade. O comportamento ético é aquele
que é considerado bom, e, sobre a bondade, os antigos diziam que: “o que é bom para
a leoa, não pode ser bom à gazela. E, o que é bom à gazela, fatalmente, não será bom
à leoa”. Este é um dilema ético típico.
O termo ética origina-se do grego ethos (ἤθος) que significa hábito, modo de
ser, caráter. Em latim, traduz-se por mos, moris (ou no plural mores) que significa
costumes, de onde se derivou a palavra moral. Moral, portanto, significa relativo aos
costumes e provém do latim moralis, -e.
Ética e moral não são a mesma coisa. Ética e moral estão relacionadas à
valorização do comportamento humano, mas têm significados diferentes. Moral é um
conjunto de regras de conduta humana, consideradas, convencionadas como válidas,
quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar (moral absoluta), quer para
uma sociedade, um grupo ou uma determinada pessoa (moral relativa). Moral ---
como um conjunto de normas, princípios, preceitos, costumes, valores --- norteia,
portanto, o comportamento do indivíduo no seu grupo social. A moral implica em
conformidade com padrões do comportamento humano, aceitos por uma sociedade,
numa determinada época. Ética implica em julgamento pessoal e está relacionada à
avaliação do comportamento humano. Enquanto a moral é normativa, a ética é
teórica, buscando explicar e justificar os costumes de uma determinada sociedade,
bem como, fornecer subsídios para a solução de seus dilemas mais comuns. Moral é
para um grupo, uma sociedade, é, portanto, coletivo; ética é o julgamento de um
comportamento individual, portanto, pessoal (Comparato, 2006).
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A ética também não deve ser confundida com a lei, embora, com certa
frequência, a lei tenha (ou deveria ter), como base, princípios éticos. Ao contrário do
que ocorre com a lei, nenhum indivíduo pode ser compelido, pelo Estado ou por
outros indivíduos, a cumprir as normas éticas, nem sofrer qualquer sanção, do Estado,
pela desobediência a estas normas éticas. Nem tudo que é legal é ético, e nem tudo
que é ético é legal.
Voltando à definição de ética: ética envolve juízos de apreciação, i.e., envolve
julgamento, envolve uma decisão. Logo, envolve consciência. Consciência é o
atributo pelo qual o homem toma em relação ao mundo e ao seu estado interior.
Conclusão primeira: juízos de apreciação (portanto ética) envolvem um julgamento
que pressupõe consciência.
A ética estuda os juízos de apreciação referentes à conduta humana, i.e.,
procedimentos morais, comportamentais. Um julgamento ético pode, portanto, basear-
se num código de moral. Ética é susceptível de qualificação do ponto de vista do bem
e do mal; é, portanto, subjetivo, porque depende do julgamento consciencioso de cada
um.
A ética se refere à determinada sociedade ou, de modo absoluto, à sociedade
em geral. Como as sociedades são dinâmicas, os julgamentos de valor do
comportamento também são dinâmicos, i.e., são mutáveis. Ética, portanto, é variante
no tempo (dinâmica) e no espaço (determinada sociedade).
Ética é, pois, viver bem. Viver bem numa determinada sociedade depende dos
outros cidadãos viverem bem. Aqui, está o primeiro problema filosófico estudado
por Sócrates1, Platão2 e Aristóteles3: ética é intrínseco ao homem ou adquirido,
ensinado? Viver bem, sozinho, é fácil e intrínseco ao homem, desde que,
mentalmente são. Viver em sociedade é adquirido do meio, é ensinado. É
conhecimento (Chaui, 2006).
Abordando algo mais pragmático, é importante levar em conta que a ética se
refere à determinada sociedade. Assim, existem éticas de diversos grupos religiosos
(cristãos, islâmicos, etc.), de sub-grupos religiosos (católicos, calvinistas; sunitas,
xiitas, etc.) e a ética profissional de grupos de profissões. O médico grego
Hipócrates4 foi pioneiro em definir um código de moral médica (o juramento de
Hipócrates), cujo texto original apresenta-se, hoje, bastante modificado e com
significativas diferenças em diversos países. É a constatação de que um código de
moral é variante no tempo (c. 400 a.E.V. e hoje) e no espaço (diferença, hoje, entre os
diversos países). Cada profissão reconhecida tem seu código próprio de ética (na
verdade preceitos profissionais morais).

1 Sócrates (Σωκράτης), filósofo ateniense, 470 a.E.V. – 399 a.E.V..


2 Platão (Πλάτων), filósofo ateniense, c. 423 a.E.V. – c. 347 a.E.V..
3 Aristóteles (Ἀριστοτέλης), filósofo grego-macedônio, 384 a.E.V. – 322 a.E.V..
4 Hipócrates (Ἱπποκράτης), médico, filósofo e teurgo grego, 460 a.E.V. - 377 a.E.V..
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Ressalta-se a importância da tolerância. Todos os seres humanos são diferentes,


pensam diferentemente. Mesmo que todos os seres humanos fossem clonados,
pensariam diferentemente. Cada um tem seu próprio código moral: alguns são
cristãos, outros judeus, outros islâmicos outros, ainda, agnósticos. Alguns têm muita
cultura, outros não. Têm-se, também, educação e formação diferentes. As profissões,
também, são diferentes. Por exemplo, há os advogados e os engenheiros: cada um tem
seu próprio código de ética profissional, sua própria moral profissional e,
especialmente, sua própria formação (deformação profissional ?). Pode-se conviver, e
bem, somente com tolerância e respeito em relação a pensamentos e comportamentos
diferentes. O julgamento ético deve ter, como base, estes princípios de moral, mas,
com tolerância, sempre respeitando ideias diferentes.
O homem vive em sociedade, convive com outros homens. Portanto, cabe
refletir e responder à seguinte pergunta: “Como se deve agir perante os outros?”.
Trata-se de uma pergunta fácil de ser formulada, mas difícil de ser respondida. Ora,
esta é a questão central da moral e da ética. A ética é julgamento do caráter moral de
uma determinada pessoa.
Há outros problemas pertinentes. Ética é um julgamento com a finalidade de
qualificar um comportamento como bom ou mal. O questionamento que se coloca:
qual é o significado de bom? O que é bom? Ao se tentar definir a palavra “bom”,
confunde-se as coisas que são boas com a bondade propriamente dita. Bom é aquele
que tem todas as qualidades adequadas a sua natureza ou função. E quais são estas
qualidades? A questão continua sem resposta. Bondade é a qualidade ou caráter de
ser bom. Definição cíclica: retorna-se à pergunta: o que é bom? Na verdade, o
significado de bom é uma questão aberta. Não existe um uso ético único para “bom”.
O antônimo de bom é mal. O vocábulo “mal” parece dotado de um caráter mais
atributivo do que “bom”. Algumas análises sugeridas para definir a palavra “bom”:
bom é aquilo que produz prazer. Mas, tudo o que produz prazer é bom? Certamente,
não. Outra análise: bom é aquilo que é mais evoluído. Ou, bom é aquilo que é
aprovado socialmente; ou moralmente. Bom é aquilo que está em harmonia com o
universo. Os crentes religiosos dirão: bom é aquilo que se ajusta à vontade de Deus.
Todas estas afirmações, entretanto, são subjetivas. O que é mais evoluído? Depende
de como se conceitua evolução e depende, também, das condições iniciais do sistema
que evolui. O que é aprovado socialmente? Depende da sociedade em que se vive. O
que é aprovado moralmente? Depende dos preceitos morais. A moral é, como a ética,
relativa no tempo e no espaço. O que está em harmonia com o universo? Depende
dos conceitos do que seja “em harmonia” e, também, do que é o universo. E a vontade
de Deus, para os religiosos? Depende do tipo de crença, das particularidades dos
princípios religiosos, dos dogmas, aceitos por um determinado crente. Averiguar o
que é descrito, por quaisquer destas formas, continua sendo uma questão aberta. Uma
ação pode ser boa porque é generosa, mas sua bondade não é idêntica à generosidade.
Por exemplo: uma pessoa pode ser, ao mesmo tempo, um professor e um tradutor.
Nota-se que “bom” continua sendo atributivo, ainda que se tenha um significado
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central, comum a todos os idiomas mencionados: esta pessoa pode ser, ao mesmo
tempo, um bom professor e um mal tradutor. Isto leva a pensar que “bom” possa ser
“eficaz”. Esta pessoa ensina de maneira eficiente e traduz de maneira ineficiente.
“Bom” e “eficaz” têm, ambos, sentidos atributivos. O “bom” é um atributo subjetivo
que depende, basicamente, da consciência de cada um. Isto é, depende da cultura e da
educação de cada um. Não é possível determinar um sentido único e estático, do
ponto de vista ético, do que seja bom.
E o que se pode dizer sobre ética e moral na Maçonaria? E no Rito Moderno?
A Maçonaria não tem um código de ética ou de moral explícito, simplesmente, por ser
Universal. Mas tem uma série de preceitos, práticas e normas, consubstanciados nos
Landmarks, nas Constituições, nos Regulamentos e, especialmente, nos rituais. E
mantendo uma tradição centenária, algo moral perdura e permanece nas Constituições
de Anderson (1723) e nas Antigas Obrigações (“Old Charges”) da Idade Média, na
Constituição de York (926 E.V.), bem como, em outros documentos medievais
conhecidos como Constituições Góticas (Poema Regius, Manuscritos de Cook,
Manuscrito de Watson, etc). Estes têm caráter disciplinar e moral para a época e local
em que foram escritos. Implicitamente, hoje, há um código moral, especialmente nos
rituais, embora, não seja expresso formalmente, nem mesmo manifestamente e
tacitamente declarado. Por ser adogmático, o Rito Moderno motiva seus membros a
procurar uma ética de forma racional e consciente; um constante julgamento pessoal e
consciencioso do que é bom e do que é mal.
Como considerações finais: abaixo, o pensamento de Morin5 : “La morale non
complexe obéit à un code binaire bien/mal, juste/injuste. L'éthique complexe conçoit
que le bien puisse contenir un mal, le mal un bien, le juste de l'injuste, l'injuste du
juste ” (Morin, 2004). Em português : a moral não complexa obedece a um código
binário bem/mal, justo/injusto. A ética complexa concebe que o bem pode conter um
mal, o mal um bem; a justiça, uma injustiça; a injustiça, uma justiça.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

- Chaui, M. “Convite à Filosofia” 13ª ed., S.Paulo: Ática, 2006. “A existência ética”,
Unid. 8, Cap. 5, pp: 305-309.
- Comparato, F. K. “Ética”. S.Paulo: Cia. das Letras, 2006.
- ERC - Ethics Resource Center. “Advancing High Ethical Standards and
Praxtices”, 2010. http://www.ethics.org/ Acessado em 28.mai.2011.

- Fieser, J. (University of Tennessee at Martin) “Ethics”. IEP –


Internet Encyclopedia of Philosophy, 2009.

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Morin (Edgar Morin, nome verdadeiro Edgar Nahoum, ‫)נחום‬, filósofo judeu-francês nascido em
1921.
5

http://www.iep.utm.edu/ethics/ Acessado em 28.mai.2011.


- Hinman, L.M. “E t h i c s M a t t e r s ”. University of San Diego, 2009.
http://ethics.sandiego,edu/ Acessado em 28.mai.2011.
- Hursthouse, R. (Auckland, New Zeland). “Virtue Ethics”. Stanford
Encyclopaedia of Phylosophy, 2007.
http://plato.stanford.edu/entries/ethics-virtue/ Acessado em
28.mai.2011.
- Mackie, J.L. “Ética” Barcelona: Ed. Gedisa, 2000.
- Morin, E. “Ética”. “O Método”, vol. 6. 2ª ed.. Porto Alegre: Sulina, 2011.
- Novaes, A. (org.) “Ética”. S.Paulo: Cia. das Letras, 2002.
- Pena-Vega, A . & Almeida, C.R. & Petraglia, I.C. “Edgard Morin – Ética, Cultura
e Educação”. S.Paulo: ed. Cortez, 2001.
- SEP. Stanford Encyclopedia of Phylosophy. “Deontological Ethics”. SEP, 2007.
http://plato.stanford.edu/entries/ethics-deontological/ Acessado em
28.mai.2011.
- Spinoza, B. “Ética”. S.Paulo: Martin Claret, 2002.

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