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Alfabetização

O sistema SESI-SP de ensino emprega o termo “alfabetização”


concebendo-o como processos de ensino e aprendizagem que associam a
compreensão do sistema de escrita às possibilidades de uso em práticas sociais
e não como mera decodificação de um sistema convencional de comunicação.
O processo de aprendizagem da língua escrita, ainda que não seja
exatamente semelhante ao da fala, também passa por um período de
construção. A aquisição da língua oral não é espontânea. Desde o nascimento,
proporcionamos às crianças o convívio com a comunicação, de forma que
construam, reconstruam e interpretem textos orais a partir de seus
conhecimentos sobre a língua, permitindo-lhes errar, acertar, reorganizar e
ressignificar. O mesmo ocorre com o processo de aquisição da língua escrita,
como afirma Ferreiro (2001, p. 32):

[…] não significa que o processo de aquisição da língua


escrita seja “natural e espontâneo”, que o professor se
limite a ser um espectador passivo, nem que seja suficiente
rodear a criança de livros para que aprenda sozinha. É um
processo difícil para a criança, mas não mais difícil que
outros processos de aquisição de conhecimento. É um
processo que exige acesso à informação socialmente
veiculada, já que muitas das propriedades da língua escrita
só se podem descobrir através de outros informantes e da
participação em atos sociais onde a escrita sirva para fins
específicos. Não é um processo linear, mas um processo
com períodos precisos de organização, para cada um dos
quais existem situações conflitivas que podem antecipar-
se. Esses conflitos têm um papel construtivo no processo
(não qualquer conflito, mas alguns muito específicos); o
trabalho da professora é crucial na identificação da
natureza das dificuldades que se apresentam, algumas das
quais representam problemas que devem ser enfrentados
pelas crianças. A escrita lhes apresenta desafios
intelectuais, problemas que terão que resolver,
precisamente para chegar a entender quais são as regras
de construção internas do sistema.

A partir dos estudos de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky sobre a aquisição


da língua escrita pelas crianças, muda-se o foco do ensino – do como se ensina
para o como se aprende –, pois entende-se que a criança, ao ingressar na
escola, já está em contato com a escrita e já elabora hipóteses sobre o seu
funcionamento, ainda que de forma não estruturada.
Durante a alfabetização, o estudante, sujeito ativo nesse processo, se
depara com dificuldades conceituais e, para resolvê-las, reinventa o sistema de
representação da linguagem. Assim, sua aprendizagem se transforma na
apropriação de um novo objeto de conhecimento, tornando-se uma
aprendizagem conceitual (FERREIRO e TEBEROSKY, 1985). Em relação à
aprendizagem conceitual, Weisz (1999, p. 8) afirma que

[…] a questão crucial da alfabetização inicial é de natureza


conceitual. Isto é, a mão que escreve e o olho que lê estão
sob o comando de um cérebro que pensa sobre a escrita
que existe em seu meio social e com a qual toma contato
através da sua própria participação em atos que envolvem
o ler ou o escrever, em práticas sociais mediadas pela
escrita.

Segundo Ferreiro (1993), a criança depara-se a todo momento com


sistemas simbólicos socialmente elaborados e constrói hipóteses sobre eles na
busca da compreensão da natureza dessas marcas sociais. Essa compreensão
é conquistada por meio de um processo construtivo, no qual as propriedades dos
sistemas simbólicos ganham significado. De acordo com esse processo, a escrita
infantil segue uma linha de evolução notavelmente regular.
É importante que o professor aprenda a ler e a interpretar essas escritas,
pois quando a criança escreve espontaneamente, segundo suas hipóteses, está
oferecendo a possibilidade de compreensão sobre o que ela pensa em relação à
natureza da escrita, direcionando a intervenção pedagógica, o que permite ao
professor elaborar novas situações didáticas, fazer boas perguntas e propor
agrupamentos produtivos para gerar avanços na aprendizagem.

O simples domínio do sistema e a aquisição de técnica não bastam para


compreender a complexidade da escrita como um sistema de representação.
Para desenvolver a competência leitora e escritora é preciso reconhecer a escrita
vinculada à oralidade, mas não dependente dela, compreender seus modos de
representação, que extrapolam a relação letra e som, e ampliar a experiência
sobre as práticas sociais de produção e interpretação, assumindo a concepção
de que o processo de alfabetização é uma atividade de produção e apropriação
de sentido. A aprendizagem da escrita não pode se dar em outro contexto que
não o de produção de textos em efetivas situações de uso da língua (COLELLO
e LUIZE, 2006).
Para uma prática condizente com essa concepção, é necessário que o
professor tenha como princípio que todos podem produzir e interpretar escritas,
respeitando o tempo e o ritmo de aprendizagem de cada um. É importante,
também, que se estimule a interação entre os estudantes e a língua escrita, nos
mais variados contextos, restituindo o seu caráter social; que se permita o
acesso, o quanto antes possível, à escrita do nome próprio; e que não se solicite
de imediato a correção gráfica nem a ortográfica das escritas( FERREIRO,
2001).
Ao propor situações de análise e reflexão – individuais e coletivas – a partir
das produções dos estudantes, considerando o texto como objeto de estudos, o
professor introduz aprendizagens fundamentais para o desenvolvimento da
competência escritora e leitora.
Assim, uma única palavra escrita em uma placa de trânsito é tomada,
nesse contexto, como um texto, uma vez que essa única palavra traz em si um
propósito em um contexto comunicativo específico. Desde o início do ensino
fundamental, tornam-se instrumentos significativos e prazerosos as práticas de
leitura e escrita quando os estudantes percebem a sua importância no dia a dia
(função social), ampliando os conhecimentos no que diz respeito às suas
próprias produções, em processos de interação com a língua escrita e por meio
dela, em variados contextos.
É importante que, tanto nos anos iniciais como nos finais, o trabalho com
as sequências didáticas seja adaptado ao nível de desenvolvimento dos
estudantes, assegurando uma construção contínua de conhecimentos. Os
gêneros podem ser abordados em vários níveis de complexidade e em diferentes
etapas do ensino fundamental, porém com objetivos graduados, tanto da
perspectiva da organização e da construção de personagens como das unidades
linguísticas que o caracterizam.
Outro aspecto a ser considerado nos anos iniciais é que, após apresentar
a situação aos estudantes, é importante, em vez de propor a produção inicial,
repertoriá-los para que ampliem seus conhecimentos sobre o gênero em questão
e, assim, possam dar continuidade aos módulos e à produção textual. Já nos
anos finais, deve-se garantir a produção inicial e o retorno a ela ao final da
sequência didática. Nesse processo, a mediação e o acompanhamento do
professor tornam-se essenciais, viabilizando recursos e meios para que o
estudante desenvolva suas capacidades linguísticas. Nesse sentido, torna-se
fundamental orientar o estudante para que ele possa mobilizar um conjunto de
saberes e aprender a selecionar os elementos e recursos linguísticos, a fim de
organizá-los adequadamente para a construção do sentido que deseja no texto
(KOCH e ELIAS, 2007).
SESI-SP. Referencial Curricular do Sistema SESI-SP de Ensino: Ensino
Fundamental. São Paulo: SESI-SP Editora, 2020.

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