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APRENDENDO

ACT
Jason B. LUOMA
Steven C. HAYES
Robyn D. WALSER

2 ª E D I Ç Â O

APRENDENDO

ACT
MANUAL DE HABILIDADES
DA TERAPIA DE
ACEITAÇÃO E COMPROMISSO
PARA TERAPEUTAS

Tradução
Antônio Bonfada Collares Machado, Mariana Sanseverino Dillenburg e Natália Boff

Revisão técnica
Renata Klein Zancan
Doutora em Psicologia Clínica pela Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Margareth da Silva Oliveira
Doutora em Psiquiatria e Psicologia Médica pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Professora titular de Psicologia da PUCRS.

2022
Copyright © 2017 by Jason B. Luoma, Steven C. Hayes, and Robyn D. Walser
Context Press
And imprint of New Harbinger Publications, Inc.
5674 Shattuck Avenue
Oakland, CA 94609
www.newharbinger.com

Supervisão editorial: Ricardo Gusmão


Editora: Paola Araújo de Oliveira
Assistente editorial: Vitória Duarte Martinez
Capa: Márcio Monticelli
Preparação de originais: Danielle Zuma
Editoração: Maurício Luís Coelho

Todos os direitos reservados à


Sinopsys Editora
(51) 3066-3690
atendimento@sinopsyseditora.com.br
www.sinopsyseditora.com.br
Autores

Jason B. Luoma, PhD, é diretor da Portland Psychotherapy, uma clínica de pesquisa


e treinamento baseada em um modelo de empresa social que usa a receita de negócios para
financiar a pesquisa científica.
Steven C. Hayes, PhD, é professor da Nevada Foundation, no departamento de psico-
logia da University of Nevada. É ex-presidente da Association for Behavioral and Cognitive
Therapies e da Association for Contextual Behavioral Science.
Robyn D. Walser, PhD, é codiretora do Bay Area Trauma Recovery Center e funcioná-
ria do National Center of Post-traumatic Stress Disorder. É ex-presidente da Association for
Contextual Behavioral Science e professora clínica assistente no departamento de psicologia da
University of California, Berkeley.
À minha parceira, Jenna LeJeune, por seu apoio, seu sacrifício e sua fé em mim.
Jason B. Luoma

Dedico este livro a David H. Barlow e aos meus colegas internos (Peter M. Monti, Kelly D.
Brownell, A. Toy Caldwell-Colbert e Carol Heckerman Landau) que trabalharam com ele
na primeira classe de psicologia clínica na Brown University, Departamento de Psiquiatria e
Comportamento Humano (1975-1976) e quem mostrou paciência e gentileza em moldar um
homem selvagem (isso seria eu) para trabalhar com as pessoas.
Steven C. Hayes

Dedico este livro a Susan L. Pickett. Obrigada pelo encorajamento ao longo dos anos e por
sempre ter acreditado em mim.
Robyn D. Walser

Agradecimentos

Este livro foi um esforço de equipe. A todos aqueles que leram e deram seu feedback sobre
os originais, obrigado. Os exercícios foram especialmente aprimorados por aqueles que pi-
lotaram os capítulos deste livro, incluindo Mary Englert, Anne Shankar, Lianna Evans, Ross
Leonard, Brendan Sillifant, Kevin Handley, Laura Meyers, Joanne Hersh, Jennifer Boulanger
e Jennifer Plumb. Agradecemos ao grupo de consulta ACT entre pares do Portland Psycho-
therapy, por suas ideias sobre como organizar o livro, os exercícios e os vídeos. Agradecemos
a Joe Parsons, pelas discussões sobre como moldar o comportamento do terapeuta que in-
fluenciaram os exercícios apresentados aqui. Agradecemos àqueles que forneceram feedback
sobre a primeira edição, incluindo Donna Read, Ana Gallego, Miguel Lewis, Hiba Giacoletto,
Brady Henderson, Petra Berg, Andrea Sieg, Kathleen Thorndike, Fred Kane, Magda Permut,
Kaylin Jones, Sonia Combs e os terapeutas do Lutheran Community Services de Spokane.
As opiniões dadas por todos resultaram em grandes melhorias nesta edição, e seus esforços
afetarão a vida de milhares de futuros leitores e suas centenas de milhares de clientes. Todas
essas pessoas nunca saberão que deveriam agradecê-los pelo tempo que vocês dedicaram à
melhora do livro.
A todos os nossos clientes, que nos honraram com sua presença, confiança e coragem.
Sem vocês, este livro não teria sido possível. Agradecemos aos alunos e aos profissionais que
se deixaram ser supervisionados por nós e que ensinaram muito aos seus supervisores. Agra-
decemos aos nossos editores, Jude Berman e Jasmine Star, por suavizar nossa linguagem e
tornar nossa mensagem mais compreensível.
10 Agradecimentos

Agradecimentos individuais dos autores:


Obrigado a todos aqueles que me ajudaram (Jason) a aprender ACT. Quando comecei
a estudá-la, fiquei impressionado com o rigor e o escopo da teoria e completamente confuso
com a linguagem técnica. Eu rapidamente consegui utilizar muitas das metáforas e exercícios,
mas realmente não entendi como tudo estava ligado. Eu precisava de um livro sobre os mo-
mentos intermediários. Esta é a minha tentativa de escrevê-lo.
Eu (Steven) agradeço a minha esposa, Jacqueline Pistorello, por seu apoio, conselho e
paciência, e ao meu laboratório por sua contribuição e incentivo.
Eu (Robyn) agradeço a minha mãe por fornecer algumas das ilustrações deste livro. Elas
estão ótimas, mãe! Agradecemos sua disposição e ação em tão pouco tempo. Eu te amo e sinto
sua falta. E obrigada aos meus irmãos por estarem lá em momentos de necessidade e também
de alegria. Muito amor a vocês e suas famílias.
Sumário

Introdução........................................................................................................................................... 13

1 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos...................................... 27

2 Desenvolvendo disposição e aceitação.................................................................................... 51

3 Diminuindo a fusão cognitiva................................................................................................... 103

4 Entrando em contato com o momento presente.............................................................. 147

5 Construindo tomada de perspectiva flexível por meio do eu-como-contexto........... 179

6 Definindo direções baseadas em valores............................................................................. 213

7 Criando padrões de ações comprometidas......................................................................... 255

8 Conceitualizando casos usando ACT..................................................................................... 289

9 A postura terapêutica da ACT.................................................................................................. 335

10 Adaptando a ACT a contextos culturais.............................................................................. 369

11 Juntando tudo............................................................................................................................ 393

Apêndice A: Formulário de Avaliação das Competências Centrais da ACT .................... 435

Apêndice B: Recursos para maior aprofundamento ............................................................ 441

Apêndice C: Usando a ACT em diferentes contextos............................................................ 443

Glossário........................................................................................................................................... 447

Referências....................................................................................................................................... 451

Índice................................................................................................................................................. 463
Introdução

Sempre que Richard Cory ia às partes menos favorecidas da cidade,


Nós, o povo na calçada, olhávamos para ele:
Ele era um cavalheiro da cabeça aos pés,
Privilegiadamente limpo, e imperialmente esbelto.

E ele estava sempre em silêncio,


E ele era sempre humano quando falava;
Mas ele fazia as pessoas derreterem quando dizia:
“Bom dia”, e ele brilhava quando andava.

E ele era rico – sim, mais rico que um rei –


E admiravelmente educado em toda graça:
Em suma, pensávamos que ele era tudo
E desejávamos estar no lugar dele.

Então, trabalhávamos e esperávamos pela luz,


E não comíamos mais carne e amaldiçoávamos o pão;
E Richard Cory, em uma noite calma de verão,
Foi para casa e colocou uma bala em sua cabeça.
Edwin Arlington Robinson

É impossível construir uma vida humana intocada pelo sofrimento. O conhecido poema de
Edwin Arlington Robinson nos lembra que, todos os dias, pessoas que aparentemente têm
todas as coisas que uma pessoa poderia querer, pelo menos visto de fora, dão fim a sua exis-
tência em vez de resistir por mais um momento. Nós, da espécie humana, encontramos muitos
dos mesmos eventos dolorosos, assim como outras espécies; seres humanos e animais não
humanos enfrentam perdas, perturbações inesperadas e experiências fisicamente dolorosas.
No entanto, fazemos algo com esses encontros que outras espécies não fazem: refletimos,
analisamos, prevemos e ruminamos sobre eles e, por meio desse processo, amplificamos nosso
sofrimento e o trazemos conosco.
A capacidade humana de pensar e raciocinar é realmente incrível. Nosso sistema de lin-
guagem é diferente de qualquer outro. Como um processo contínuo, enche nossa consciência
com um fluxo interminável de conexões verbais. Essa habilidade é uma coisa maravilhosa e
terrível. Ela sustenta a capacidade de realização humana: a de comunicação, construção, pla-
14 Introdução

nejamento e participação na solução de problemas. Faz parte da nossa capacidade de amar


profundamente e nos comprometer com os outros, sonhar com o futuro que desejamos e
trabalhar em direção a sua realização. No entanto, os mesmos elementos cognitivos e verbais
que permitem essas possibilidades também nos permitem lutar no meio da abundância. Eles
nos permitem ser Richard Cory.
Os seres humanos lutam de várias maneiras, que podem ser dolorosas e mudar a vida.
Quando ocorrem eventos que nos colocam em contato com emoções e pensamentos difíceis,
geralmente trabalhamos duro para nos livrar dessas experiências, tentando evitar o evento que
as desencadeou e buscando remover as emoções e os pensamentos avaliados negativamente
que as acompanham. Por exemplo, não queremos sentir ansiedade por medo de falhar ou
tristeza por perda, portanto, quando ocorre um evento que possa ocasionar essas emoções,
trabalhamos para evitar o evento e as reações emocionais resultantes.
Não é de surpreender que tomemos essas medidas. Se algo é desagradável, faz sentido des-
cobrir como removê-lo. O problema com essa estratégia está nos efeitos paradoxais da linguagem
– aquelas habilidades simbólicas que compõem o que chamamos, no senso comum, de mente – à
medida que tentamos usar essas habilidades para evitar ou subtrair o que não pode ser evitado ou
subtraído. Quando se torna importante que não pensemos ou nos sintamos de certa maneira e, no
entanto, nos encontramos pensando ou nos sentindo assim, nossa mente pode ser consumida por
esforços para diminuir ou eliminar essas experiências. Muitas vezes, contudo, no próprio esforço
de eliminar essas experiências, as propagamos e aumentamos os demônios que desejamos destruir.
A terapia de aceitação e compromisso (ACT, que é dita como uma palavra, não como
A.C.T. [conforme Hayes, Strosahl, & Wilson, 1999) oferece um possível antídoto para as fun-
ções prejudiciais dessa capacidade verbal e seu papel no sofrimento humano. A ACT é uma
intervenção cognitivo-comportamental contextual baseada em evidências, projetada para criar
maior flexibilidade psicológica e, como resultado, libertação humana. Ela aborda os paradoxos
inerentes aos processos cognitivos humanos e trabalha para ajudar as pessoas a viverem vidas
significativas e valorizadas.
A ACT emprega várias estratégias para aliviar os problemas das pessoas e promover o
seu crescimento, incluindo disposição ou aceitação da experiência, desfusão cognitiva, atenção
flexível ao momento presente, contato com um senso de eu transcendente ou de tomada de
perspectiva (eu-como-contexto), clareza e domínio de valores, bem como para fomentar o
compromisso com padrões mais amplos de vida baseada em valores. Cada um desses proces-
sos é aplicado com gentileza e compaixão pela luta do cliente e pelas dificuldades que a expe-
riência indesejada pode trazer. A ACT é uma abordagem construtiva da psicoterapia que ajuda
as pessoas a aprender a abraçar com compaixão sua experiência interna por tudo o que ela
representa, enquanto também se concentra na construção de repertórios de comportamentos
construtivos orientados por valores.
A ACT é informada por todos os elementos do que agora é conhecido como ciência
comportamental contextual (em inglês, Contextual Behavioral Science [CBS]; Zettle, Hayes, Bar-
nes-Holmes, & Biglan, 2016). A CBS visa reformular a própria ciência comportamental e adota
uma abordagem funcional aos principais elementos necessários para o desenvolvimento do
conhecimento nesse domínio. Ela inclui o contextualismo funcional como uma filosofia da
ciência (Biglan & Hayes, 2016), os fundamentos da ciência da evolução (Hayes, Monestès, &
Wilson, no prelo) e princípios comportamentais ampliados pela teoria das molduras relacionais
(em inglês, Relational Frame Theory [RFT]; Hayes, Barnes-Holmes, & Roche, 2001). Todos esses
elementos se reúnem para definir a ACT como um método comportamental contextual.
Aprendendo ACT 15

A relação da ACT com esse conjunto maior de premissas, princípios e estratégias foi
amplamente descrita em livros anteriores, e resumimos alguns desses tópicos de maneira mais
clínica nesta obra. Em particular, descrevemos o modo como a ACT aborda a contribuição
da linguagem e da cognição humanas para manter os seres humanos presos. Nesta 2ª edição,
também vinculamos mais claramente os processos de flexibilidade psicológica aos princípios
evolutivos. Mas, na maioria das vezes, este livro se concentra em adquirir familiaridade e prática
com os processos de flexibilidade direcionados pela ACT de uma maneira que seja acessível.
Esperamos que a leitura deste livro permita que os clínicos comecem a aplicar o modelo
e os métodos de flexibilidade psicológica da ACT em suas práticas. Isso é o que há de mais
exclusivo neste volume. Ele foi projetado para ir além de filosofia, teoria, conceitos e conheci-
mento verbal de técnicas, abordando a produção real de habilidades e competências que visam
a processos de flexibilidade. Portanto, nós o escrevemos deliberadamente em um estilo acessí-
vel, porque o foco está na prática.
Este livro:
• Trata de aumentar a capacidade dos clínicos para que sejam capazes de ajudar seus
clientes a viver vidas mais gratificantes, completas e vitais.
• Trata de ajudar os clínicos a obter conhecimento e habilidade suficientes nos seis pro-
cessos de flexibilidade para que possam começar a implementá-los na terapia.
• Destina-se a ser um companheiro de desenvolvimento de habilidades para outros tex-
tos da ACT que fornecem muito mais detalhes sobre a teoria, filosofia, dados, metá-
foras, exercícios e aplicação da ACT, e sobre sua relevância para vários problemas do
cliente, como ansiedade, depressão, dor crônica e psicose.
• Foi desenvolvido para ajudar a construir as habilidades dos clínicos nas competências
essenciais associadas aos processos terapêuticos da ACT, para que possam ser mais
eficazes, independentemente da apresentação do cliente.
A ACT não é uma abordagem de livro de receitas. É um modelo bastante flexível, cons-
truído desde o início com foco em processos de mudança que capacitam as pessoas, em vez
de oferecer protocolos rígidos para síndromes. Não queremos apenas proporcionar aos profis-
sionais uma noção clara de como a ACT é conduzida, mas também transmitir a vitalidade que
essa terapia pode trazer à experiência humana.
Nós encorajamos fortemente o envolvimento pessoal com o livro, incluindo o engajamento
nas práticas que oferecemos. Pedimos isso por várias razões, e a mais importante é que você, como
terapeuta, possa experimentar o que significa envolver-se pessoalmente com a ACT, exatamente
como você estará pedindo aos seus clientes. As pessoas que desempenham o papel de terapeuta não
são fundamentalmente diferentes das pessoas que desempenham o papel de cliente. Como descre-
veremos neste livro, todos os seres humanos tendem a ficar presos nas mesmas armadilhas.
É essencial aprender sobre essas armadilhas de dentro para fora, por meio da prática. Por esse moti-
vo, pode ser difícil fazer essa terapia se você não aplicar as mesmas abordagens em sua própria vida.
Tomemos, por exemplo, sua própria experiência pessoal com as emoções: o que você faz quando se
confronta com o que é mais doloroso para você? Se sua resposta incluir esforços para eliminar ou
controlar sua experiência, perguntaremos: “Para que fim?”. Talvez, para você, como para a maioria
das pessoas, esse fim seja se sentir “melhor”. No entanto, se sua resposta for experimentar a dor
pelo que ela é, aprender com ela e viver melhor fazendo isso, então você estará à frente do jogo de
aprender a abordagem da ACT e terá maior probabilidade de ser eficaz nela.
16 Introdução

Muitas terapias concentram-se principalmente em ajudar as pessoas a se sentirem melhor.


A esperança é que, ao final da terapia, o cliente tenha menos sintomas e se sinta melhor emocio-
nalmente. O foco da ACT é explicitamente viver melhor. Embora isso possa envolver a sensação
de se sentir melhor, também pode não ser o caso, principalmente em curto prazo. Às vezes, viver
melhor, na verdade, exige sentir a dor. Se isso promove a conexão, a escolha e a convivência com
vitalidade, a ACT tenta fornecer aos clientes as habilidades necessárias para sentir dor sem defesa
desnecessária. O objetivo final da ACT é ajudar os clientes a sentirem e pensarem o que já sentem
e pensam diretamente, além de ajudá-los a se mover em uma direção escolhida e com valor pessoal.

Como usar este livro


Aprendendo ACT foi projetado para ser usado com outros livros e recursos sobre conceitos e
métodos da ACT. Recomendamos especialmente os seguintes:

• Hayes, S. C., Strosahl, K., & Wilson, K. G. (2021). Terapia de aceitação e compromisso: o pro-
cesso e a prática da mudança consciente. Esta é a 2ª edição do livro original da ACT. Nenhum
clínico da ACT deve deixar de lê-lo e mantê-lo ao alcance.
• Eifert, G., & Forsyth, J. (2005). Acceptance and Commitment Therapy for Anxiety Disorders.
Embora esse livro seja nominalmente orientado para uma população específica, tam-
bém é um protocolo ACT forte e geralmente útil que demonstra como mesclar pro-
cessos de flexibilidade em uma terapia breve. Ele fornece excelentes conselhos sobre
como usar a ACT para orientar a exposição.
• Hayes, S. C., Smith, S. (2021). Saia da sua mente e entre na sua vida: a nova terapia de aceitação
e compromisso. Este é o primeiro livro de trabalho de uso geral da ACT. Pode ser útil
para terapeutas iniciantes da ACT, ajudando-os a entrar em contato com o trabalho
experiencialmente. Também pode ser facilmente usado como tarefa de casa para os
clientes.
• Harris, R. (2011). Liberte-se: evitando as armadilhas da procura da felicidade. Este é um livro
ACT de uso geral e altamente acessível, que também pode ser usado como tarefa de
casa para os clientes.
• Stoddard, J. A., & Afari, N. (2014). The Big Book of ACT Metaphors: A Practitioner’s Guide
to Experimental Exercises and Metaphors in Acceptance and Commitment Therapy. Este livro
fornece acesso fácil a centenas de metáforas e exercícios da ACT, organizados pelo
processo de flexibilidade para facilitar a referência.
• Wilson, K. G. (with DuFrene, T.). (2008). Mindfulness for Two: An Acceptance and Commit-
ment Therapy Approach to Mindfulness in Psychotherapy. Este livro concentra-se em levar a
atenção plena, um aspecto fundamental da flexibilidade psicológica, para as interações
terapêuticas, desafiar os terapeutas a renunciarem abordagens padronizadas e, em vez
disso, sintonizarem de maneira flexível o cliente e as oportunidades terapêuticas ofe-
recidas pelo momento presente na sessão.
• Hayes, S. C. (2007). ACT in Action. Uma série de seis DVDs com alguns dos melhores
terapeutas da ACT mostrando como encaixa-se bem nos vídeos desta edição do livro
(o último DVD está disponível, em inglês, para visualização em http://www.newhar-
binger.com/39492).
Aprendendo ACT 17

Se você precisar de uma introdução inicial à ACT, recomendamos especialmente esses


dois livros:

• Harris, R. (2009). ACT Made Simple: An Easy-to-Read Primer on Acceptance and Commit-
ment Therapy.
• Hayes, S. C., & Lillis, J. (2012). Acceptance and Commitment Therapy.
Além disso, existem dezenas de livros da ACT para populações especializadas, tanto para
terapeutas quanto para pacientes. Um dos autores deste livro (Jason) mantém uma lista atua-
lizada de livros da ACT e outros recursos no e-book Learning ACT Resource Guide (disponível
para download em http://www.learningact.com [conteúdo em inglês]). A Association for Con-
textual Behavioral Science (ACBS) é a principal porta de entrada para pesquisas, publicações
clínicas e teóricas da ACT, discussões on-line, treinamentos, instituições, conferências, manuais,
protocolos, metáforas e networking. A ACBS também mantém uma lista de títulos relevantes da
ACT e da RFT em seu site, mas a maioria dos materiais é disponibilizada apenas para membros
inscritos na plataforma (em inglês). Mais informações sobre a ACBS e outros recursos estão
disponíveis no Apêndice B.

Organização deste livro


A ACT é uma intervenção baseada em evidências, mas queremos esclarecer o que isso significa
em uma abordagem contextual da ciência comportamental, para que você possa entender a
organização do livro. A ACT não é um protocolo ou um conjunto de técnicas. Pelo contrário,
é uma abordagem que visa um pequeno conjunto de processos-chave de flexibilidade. Essa
abordagem baseada em processos é um recurso que distingue a ACT das muitas formas de
terapia que enfatizam protocolos sobre processos.
A Introdução e o primeiro capítulo deste livro de exercícios fornecem uma visão geral
da teoria por trás da ACT e algumas ferramentas para ajudá-lo a pensar em casos a partir dessa
perspectiva. Especificamente, o Capítulo 1 descreve as maneiras como os processos básicos de
aprendizagem e ciência da evolução, combinados com os efeitos problemáticos da linguagem,
levam ao aumento do sofrimento para os seres humanos. A teoria da mudança da ACT tam-
bém é descrita no Capítulo 1.
Os Capítulos 2 ao 7 e o 9 cobrem o conhecimento e as práticas necessárias para os clí-
nicos da ACT, com os Capítulos 2 ao 7 enfocando os seis processos de flexibilidade. Cada um
desses capítulos inclui uma descrição das metáforas básicas, histórias e técnicas usadas junto
a algum processo, além de vinhetas que demonstram esses métodos e terminam com uma
tarefa prática de escrita na qual é solicitado que você aplique os princípios que aprendeu a vá-
rios cenários possíveis de clientes. Cada um desses capítulos também aborda quando usar os
métodos discutidos, indicadores que funcionam com esse processo específico e como abordar
problemas que geralmente surgem ao direcionar determinados processos. Além disso, inclui
pelo menos um exercício experiencial. O objetivo desses capítulos é ajudá-lo a entender o que
é cada processo. Nenhuma técnica específica da ACT é fundamental, portanto o propósito
é ajudá-lo a entender como manipular os processos de flexibilidade subjacentes por meio da
leitura e da prática.
Nos Capítulos 2 ao 7, cada um dos processos de flexibilidade psicológica direcionados
pela ACT são apresentados, em grande parte, como se fossem separados. No entanto, em
sessões reais com os clientes, raramente o foco é um processo exclusivo. Em vez disso, vários
18 Introdução

processos são explorados e trabalhados em cada sessão. O Capítulo 8 concentra-se em como a


conceitualização de caso e o planejamento do tratamento podem ajudá-lo a iniciar a tarefa de
integrar os seis processos em um tratamento coerente e oferece a oportunidade de aplicar o
modelo ACT em casos práticos. O Capítulo 9 mostra como utilizar os processos de flexibilida-
de no contexto da relação terapêutica, e o Capítulo 10 oferece orientação sobre como trabalhar
de maneira flexível com fatores culturais durante intervenções e conceitualizações de caso. Por
fim, o Capítulo 11 foi projetado para ajudá-lo a integrar o uso dos vários processos de flexibili-
dade nas sessões e ser flexível ao fazê-lo. E, assim como a ACT tenta desenvolver flexibilidade
psicológica nos clientes, esperamos que este livro de exercícios aumente sua flexibilidade como
clínico na aplicação da ACT. Para esse fim, o Capítulo 11 também fornece vários exercícios
para ajudá-lo a desenvolver essa flexibilidade.
Também incluímos três apêndices. O Apêndice A apresenta o Formulário de Avaliação das
Competências Centrais da ACT, que pode ser usado para avaliar suas habilidades na aplicação
destas. Nas principais práticas de competência dos Capítulos 2 ao 7 e o 9, solicitamos que você
demonstre essas competências. É apenas no Apêndice A que você pode ver todas as competên-
cias em um só lugar. Por isso, revise esse apêndice antes de mergulhar nos capítulos. O Apêndice
B oferece informações sobre recursos adicionais para aprofundar seu conhecimento sobre a
ACT, e o Apêndice C aborda a adaptação da ACT a diferentes configurações de intervenção.

Recursos on-line
Vários recursos relacionados a este livro estão disponíveis para download em http://www.
newharbinger.com/39492. Lá, você encontrará o Formulário de Avaliação das Competências
Centrais da ACT (Apêndice A), um documento de perguntas frequentes respondendo a alguns
dos questionamentos mais comuns dos terapeutas novos na ACT, e gravações em áudio de vários
exercícios de clientes descritos no livro (forneceremos um lembrete sobre as gravações para
download nos exercícios em que estão disponíveis). Outro recurso para download é o documento
Aprendendo ACT em sala de aula, em grupos e por meio de supervisão em pares.* Quanto a este último, a
experiência nos mostrou que é importante que os terapeutas da ACT tenham uma comunidade que
os apoie em seu trabalho com a ACT. Seja um grupo de amigos ou colegas, seja uma comunidade
virtual acessada pela internet, um curso temporário ou um relacionamento com um supervisor
ou mentor, essa comunidade social/verbal é essencial para mantê-lo no caminho como clínico,
particularmente como um clínico ACT. Felizmente ou infelizmente, muitas das formas de falar
ou pensar que fazem parte do repertório de um clínico eficaz da ACT não são comuns fora desse
contexto. Muitas das mensagens da cultura ocidental dominante são tão dominantes e automáticas,
particularmente aquelas que promovem o bem-estar (controle experiencial) e maneiras literais de
interagir com os pensamentos, que, sem o apoio de uma comunidade social/verbal versada em
ACT, repertórios mais novos e menos praticados de comportamento e pensamento baseados na
ACT têm menos probabilidade de serem mantidos ao longo do tempo.
Além disso, é altamente recomendável que você visite http://www.newharbinger.com/39492
para encontrar vídeos que complementem o livro, com clínicos experientes da ACT e exemplos de
dramatização das principais competências, utilizando atores treinados para interpretar os clientes
(conteúdo em inglês). Criamos esses exemplos para mostrar aplicações relativamente qualificadas

* O Formulário de Avaliação das Competências Centrais da ACT (Apêndice A), o documento de Perguntas
Frequentes e o Aprendendo ACT em sala de aula, em grupos e por meio de supervisão em pares estão dis-
poníveis, em português, no site da Sinopsys
Aprendendo ACT 19

e não qualificadas dos métodos e princípios da ACT. Nem todas as competências são abordadas
nos vídeos, mas, com exceção do Capítulo 8 (conceitualização de caso), são fornecidos exemplos
de abordagens apresentadas nos Capítulos 2 ao 10. Recomendamos a leitura do capítulo correspon-
dente antes de assistir aos vídeos.
Os vídeos oferecem modelos de exercícios e técnicas que vão além do que podemos de-
monstrar adequadamente por escrito. Uma boa maneira de usá-los é reproduzir cada vídeo e
pausar a reprodução antes que o narrador descreva o que estava sendo feito. Tente determinar
qual foi o ajuste ou não do modelo ACT no vídeo e só depois retome para ouvir o narrador
relatar a interação. Esse método de iniciar e parar é especialmente recomendado para oficinas
ou utilização deste livro em sala de aula.

Usando os exercícios práticos deste livro


Embora seja importante ler sobre técnicas e habilidades da ACT para se tornar um clínico
eficaz da ACT, é ainda mais importante praticar essas habilidades. Ter amplo conhecimento
mental sobre uma terapia pode definir claramente o cenário para a implementação. No entanto,
não é apenas o conhecimento verbal que o guiará ao longo da terapia; o conhecimento expe-
riencial também é essencial para entender a abordagem da ACT e implementar com qualidade
o repertório. Este livro está estruturado para fornecer a você esse conhecimento experiencial
por meio do engajamento com exercícios. O conhecimento experiencial também é essencial
para entender a ACT.
Aprender a usar a ACT é como aprender a tocar violino. Você pode ler um livro sobre
como segurar o instrumento ou como as escalas musicais são estruturadas. No entanto, ler so-
bre como tocar não faz de você um violinista. A prática é essencial. Embora a leitura (conheci-
mento verbal) possa ensiná-lo a segurar o instrumento, os exercícios deste livro foram projeta-
dos para ajudá-lo a começar a tocar violino (conhecimento experiencial). Na ACT, solicitamos
aos clientes que se envolvam no processo de aprendizado experiencial e que estejam dispostos
a experienciar tudo o que acompanha esse aprendizado, incluindo falhas e erros dolorosos.
Pedimos que façam isso com o objetivo de aprender com sua própria experiência a serviço de
viver uma vida rica e valorizada. Gostaríamos de pedir que você faça o mesmo, envolvendo-se
totalmente com os exercícios apresentados neste livro. Muitos deles requerem uma resposta
por escrito. Se você estiver lendo uma versão eletrônica deste livro ou simplesmente preferir
não escrever no livro, ou se precisar de mais espaço para suas respostas em qualquer um dos
exercícios, fique à vontade para usar um notebook, um caderno ou outro dispositivo eletrônico
para registrar suas respostas.
No final dos Capítulos 2 ao 7 e o 9, incluímos uma seção intitulada Prática de compe-
tências centrais, na qual fornecemos exercícios práticos baseados em diálogos com os clientes.
(Muitos dos casos apresentados neste livro são dificuldades de clientes reais, mas foram alte-
rados e combinados para que ninguém, nem mesmo os próprios clientes, possam reconhecer
o material.) Esses exercícios oferecem a oportunidade de formular e praticar respostas a situa-
ções hipotéticas antes de iniciar a atuação com clientes reais. Você deve formular suas próprias
respostas antes de compará-las com as respostas consistentes com a ACT sugeridas, fornecidas
no final do capítulo.
Os comentários dos leitores da primeira edição deste livro indicam que eles frequente-
mente eram tentados a ir diretamente para as respostas dos exemplos, pulando o processo de
formular suas próprias respostas. Esse é definitivamente o caminho mais fácil e uma maneira
20 Introdução

de se envolver com este livro de exercícios. No entanto, essa estratégia tem uma grande desvan-
tagem: ela nega o que há de mais exclusivo neste livro – a oportunidade de realmente praticar a
ACT e obter feedback sobre suas respostas. Aqui está o que alguns de nossos leitores anteriores
disseram sobre a importância de realmente fazer os exercícios em vez de apenas lê-los:
“Realmente, fazer os exercícios faz toda a diferença. Realizá-los me permitiu testar o que aprendi no
capítulo. Foi muito útil conclui-los e depois comparar minhas formulações com as respostas.”

“Gostei dos exercícios das competências centrais, pois eles realmente me fizeram pensar nas minhas res-
postas. Eles me ajudaram a integrar o material que eu tinha acabado de ler no capítulo.”

“Apreciei os exercícios das competências centrais. Eles me incentivaram a pensar realmente em como
responderia a situações muito realistas.”

Somente você pode decidir se a aprendizagem da ACT vale o tempo e o esforço. Se você
estabelecer que a resposta é sim, sugerimos que dê espaço a si mesmo para formular respostas
aos exercícios, mesmo que sua mente pense que elas estarão erradas ou serão de baixa qualida-
de. Uma coisa que pode ajudar a manter a motivação para fazer essas práticas é refletir sobre
a qual objetivo maior isso pode servir. Sugerimos que você dedique um minuto para refletir
sobre isso agora. De fato, usaremos esse convite para oferecer a você um exercício inicial.

EXERCÍCIO

Identificando seus valores ao trabalhar com este livro


Honestamente, sinceramente e de coração, com qual propósito você gostaria de se envolver
com este livro? Que padrões maiores você espera implementar ao concluir este livro de exer-
cícios?
Para mim, o objetivo de concluir este livro de exercícios é:
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________

TRAZENDO AUTOCOMPAIXÃO AO PROCESSO


DE APRENDIZAGEM
Há um ditado relacionado a gostarmos de aprender algo novo: “Se tem algo que vale a pena
ser feito, vale a pena fazer mal feito no início”. Aprender algo novo geralmente significa
que nosso desempenho será ruim; caso contrário, não é realmente novo. Fazer os exercícios
neste livro, em vez de simplesmente lê-los, não é o caminho mais fácil. Você cometerá erros
Aprendendo ACT 21

– talvez muitos deles. No entanto, os erros são nossos professores. E mesmo que eles sejam
uma parte inevitável do aprendizado, geralmente a mente nos pune por cometê-los ou pela
nossa percepção de falta de conhecimento, embora isso dificulte o aprendizado. Como isso
é algo muito comum para as mentes fazerem, é importante ser capaz de encontrar maneiras
de responder a nós mesmos de uma maneira gentil e solidária quando estamos aprendendo.
De acordo com esse objetivo, solicitamos que você reflita um pouco sobre o tipo de relacio-
namento que gostaria de ter consigo mesmo ao concluir os exercícios deste livro. Portanto,
mais uma vez, usaremos esse convite como contexto para você começar a se envolver com
os exercícios deste livro.

EXERCÍCIO

Visualizando a autocompaixão
Se você fosse um amigo atencioso consigo mesmo enquanto pratica, que qualidades você es-
peraria ter em seu relacionamento consigo mesmo? Não se trata de como você geralmente é
consigo mesmo em relação a erros. É sobre suas intenções. Como você quer se tratar enquanto
aprende? No espaço a seguir, liste as qualidades que você deseja trazer para si mesmo ao tra-
balhar com este livro.
Enquanto eu cometo erros e luto com o aprendizado, gostaria de ter um relacionamento
comigo mesmo caracterizado por estas qualidades:
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________

Aqui está uma forma de como posso agir quando percebo que minha mente se apoderou
de mim durante estes exercícios:
__________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________

FICANDO EXPERIENTE

Além dos exercícios de competência centrais, cada capítulo inclui exercícios experienciais.
Por “experiencial”, queremos dizer que o objetivo deles é ajudá-lo a encontrar o espaço,
a postura ou o posicionamento psicológica da ACT a partir da qual você, como clínico da
ACT, provavelmente será mais eficaz. A natureza desses exercícios é pessoal e profunda-
mente conectada à natureza da terapia.
22 Introdução

Embora não recomendamos que você pule esses exercícios, tudo bem se você o fizer.
Você é o especialista em sua própria experiência e sabe o que o ajudará a alcançar seus objetivos
valiosos. No entanto, se você optar por não fazê-los durante a leitura inicial do livro, sugerimos
que você volte e conclua-os mais tarde para poder extrair o valor total deste volume.

Começando a usar a ACT


Temos várias sugestões sobre como começar a usar a abordagem ACT na terapia, estabelecidas
a seguir.

Consultando outros textos para complementar sua compreensão da ACT


Antes de começar a usar a ACT com os clientes, recomendamos que você tenha uma boa
noção de todo o modelo da ACT. Isso inclui conhecer uma variedade de metáforas e exercí-
cios essenciais disponíveis e ter uma compreensão prática da teoria básica. Embora este livro
forneça uma boa visão geral da teoria, ele não fornece muitas das principais metáforas neces-
sárias ou exercícios disponíveis. Assim, você precisará de pelo menos mais um livro de ACT
para complementar este volume e fornecer instruções mais específicas sobre como sequenciar
intervenções e introduzir os diferentes processos, além de fornecer acesso a uma variedade de
metáforas e exercícios. Em resumo, este livro não pretende oferecer uma introdução abrangen-
te da ACT. É um guia prático que permitirá que você aplique as ferramentas obtidas durante o
processo de aprendizagem a todos os momentos intermediários que não são específicos para
exercícios ou metáforas.
Bons livros a serem considerados como um texto introdutório que fornecerá mais instru-
ções passo a passo para o uso da ACT com seus clientes incluem a 2ª edição do livro original
da ACT, Terapia de aceitação e compromisso: o processo e a prática da mudança consciente (Hayes, Strosahl,
& Wilson, 2021), ou o ACT Made Simple (Harris, 2009). Geralmente, recomendamos o livro
original da ACT, pois é o mais abrangente. No entanto, se você preferir uma introdução mais
simples ou um guia passo a passo que se concentre em ferramentas, truques e técnicas e seja
mais leve em teoria, o ACT Made Simple é uma excelente alternativa. Se você tem uma sólida
formação em métodos mais tradicionais de terapia cognitivo-comportamental (TCC) e está se
ramificando para a ACT, o livro A CBT Practitioner’s Guide to ACT (Ciarrochi & Bailey, 2008) é
outro bom ponto de partida.
Para deixar claro, não recomendamos este livro como a primeira obra a ser lida sobre
ACT. Em vez disso, é um excelente segundo livro que permitirá aplicar o conhecimento ad-
quirido em livros mais abrangentes, como os sugeridos acima. Então, você pode começar a se
ramificar, aprofundando-se na literatura da ACT. Atualmente, existem livros da ACT para a
maioria das principais categorias de problemas (p. ex., transtornos alimentares, ansiedade, dor
crônica, uso de substâncias, depressão), bem como aplicações para profissões específicas (p.
ex., serviço social ou aconselhamento pastoral), ambientes (p. ex., cuidado primário) ou tipos
de prática (p. ex., grupos ou casais).

Trazendo flexibilidade para o processo e conectando-se com a comunidade ACT


Em segundo lugar, nós recomendamos reservar um período para o crescimento com a teoria e
a terapia. Embora, como mencionado, os processos de flexibilidade sejam apresentados inicial-
mente neste livro como independentes, eles são, na verdade, interdependentes. A falta de um
Aprendendo ACT 23

entendimento básico de um processo pode levar a dificuldades na implementação dos outros


processos, além de confusão e “becos sem saída” na terapia. Além disso, sem uma compreen-
são geral da abordagem, os terapeutas podem facilmente introduzir inconsistências capazes de
enfraquecer a crença geral na intervenção. Leva tempo para aprender esse modelo complexo e
abrangente. Incentivamos você a ter compaixão por si mesmo enquanto pratica e a ter tempo
para reler seções sobre conceitos e abordagens relevantes ao tentar aplicá-las. Adicionalmente,
esteja avisado que você poderá sofrer algumas interrupções em sua prática quando começar a
usar essas abordagens, principalmente se estiver operando com teorias de intervenção baseadas
em controle. Não é incomum que os profissionais que se sentem atraídos pela ACT se sintam
inicialmente estranhos, confusos e ansiosos quando começam a aplicá-la.
Uma dissertação de Douglas Long (2015) examinou o uso dos vídeos na primeira edição
deste livro e constatou que os clínicos competentes, capazes de detectar ACT, foram previstos
pelo treinamento em oficinas, conhecimento sobre ACT, leitura de livros sobre ACT, supervisão
em ACT e participação no grupo mais responsável pelo desenvolvimento contínuo da ACT, a
Association for Contextual Behavioral Science. A melhoria da competência após o treinamento
também foi prevista pela flexibilidade psicológica dos terapeutas. Essas descobertas fazem todo
sentido. Para ser bom em ACT, você precisa se esforçar, dedicar tempo, trabalhar em seus pró-
prios processos de flexibilidade e entrar em comunidades de outras pessoas na mesma jornada.
Felizmente, também sabemos que se sentir confiante não é necessário para a competên-
cia na ACT. Um estudo de eficácia, feito há alguns anos com terapeutas iniciantes, mostrou
que comparado à terapia cognitivo-comportamental tradicional, a ACT tendia a produzir mais
ansiedade nos terapeutas que eram novos nessa abordagem – e também levava a resultados
clínicos significativamente melhores em pacientes (Lappalainen et al., 2007). Com base nesses
tipos de descobertas, recomendamos que você tente abrir espaço para qualquer desconforto
que possa sentir ao aprender a implementar a ACT. Para esse fim, você pode achar úteis os
livros de autoajuda da ACT, permitindo-se aplicá-la ao seu desconforto enquanto aprende.
Agora sabemos que aplicar a ACT em si mesmo como terapeuta tem amplos benefícios. Di-
minui o estresse e o desgaste que podem advir de um terapeuta ou clínico em treinamento (p.
ex., Brinkborg, Michanek, Hesser, & Berglund, 2011; Frögéli, Djordjevic, Rudman, Livheim, &
Gustavsson, 2016) e ajuda os terapeutas a aplicar métodos de terapia baseada em evidências,
mesmo quando isso é psicologicamente difícil (Varra, Hayes, Roget, & Fisher, 2008; Scherr,
Herbert, & Forman, 2015).
Tempo e esforço, combinados com disposição, produzirão uma maior sensação de to-
talidade e empoderamento. No entanto, esteja ciente de que existe uma sensação de vulnera-
bilidade ao executar a ACT que nunca desaparece completamente. A ACT pede que o clínico
fique com o cliente como outro ser humano em um relacionamento horizontal, sem defesas
desnecessárias. Isso traz grande riqueza ao processo, além de uma naturalidade que, se evitada,
irá desfazer o trabalho.

Incorporando a ACT à sua prática


Recomendamos duas maneiras básicas de começar a incorporar a ACT em sua prática. Uma
é começar implementando a ACT com base em um dos manuais padronizados disponíveis.
Muitos estão listados em “Guias para o terapeuta” no e-book Learning ACT Resource Guide
(disponível para download em http://www.learningact.com [conteúdo em inglês]); você tam-
bém encontrará uma lista de muitos manuais de terapeutas para demandas específicas de
24 Introdução

clientes no site da ACBS: https://contextualscience.org/treatment_protocols. Idealmente,


você seguiria o manual do começo ao fim com um cliente que apresenta problemas corres-
pondentes ao tratamento específico discutido no manual utilizado. Isso tem a vantagem de
empurrá-lo para os cantos da atuação onde você ainda pode se sentir desconfortável.
Nós também recomendamos a abordagem relativamente comum de usar a ACT primeiro
com um cliente com o qual você esteja enfrentando dificuldades. Se esse cliente é difícil, o que
geralmente é o caso, isso pode parecer um lugar contraintuitivo para começar. No entanto,
como seu repertório antigo já falhou de maneira importante, se você continuar com as mesmas
abordagens que usa, provavelmente continuará se deparando no mesmo lugar que o cliente:
preso. Experimentar a ACT pode permitir que você veja se algo novo pode acontecer e liberar
o processo de terapia.
Depois de seguir um protocolo detalhado da ACT com alguns clientes, sugerimos que
você deixe o protocolo de lado e parta para rastrear e direcionar processos de flexibilidade com
base nas necessidades dos clientes e nas conceitualizações de caso. Este livro será especialmen-
te útil para você continuar a desenvolver suas habilidades durante essa etapa.
Por fim, recomendamos que você participe de uma oficina experiencial de ACT. Essa é
realmente uma das melhores maneiras de aprender a abordagem. Ela está centrada em viver
plenamente com todas as experiências – negativas e positivas – e na liberdade e riqueza que
uma vida com propósito pode trazer. Participar de uma oficina pode ajudar a criar essas dinâ-
micas em sua vida, tanto na sua maneira pessoal de estar no mundo quanto no seu trabalho
com clientes. Também pode fornecer orientação intuitiva sobre a função dos processos de fle-
xibilidade, não apenas sobre forma desses processos. Os treinamentos e oficinas da ACT estão
listados em http://www.contextualscience.org (conteúdo em inglês).

Ciência comportamental contextual e o contexto de pesquisa


em torno da ACT
A ACT baseia-se em um corpo, agora enorme, de trabalhos acadêmicos e pesquisa nos cam-
pos da filosofia da ciência, psicologia básica, psicopatologia, ciência da evolução e intervenção
clínica. Enquanto esta 2ª edição foi escrita, havia quase 200 ensaios clínicos randomizados de
ACT (em uma lista parcial, desconsiderando alguns disponíveis apenas em idiomas que não em
inglês, consulte http://contextualscience.org/ACT_Randomized_Controlled_Trials). Esses
estudos analisaram quase todas as áreas concebíveis de saúde mental, saúde comportamental e
funcionamento social. Cerca de 80% dessas literaturas têm menos de cinco anos e, nos últimos
anos, um novo estudo randomizado foi publicado a cada 10 a 11 dias, em média. Em todas as
áreas da CBS relevantes para a ACT e suas bases, existem quase dois mil artigos atualmente
disponíveis. Neste livro, deliberadamente usamos linguagem relativamente informal porque
nosso objetivo é intensamente prático e focado em habilidades. À medida que suas habilidades
em ACT aumentam, você pode descobrir que explorar um campo mais amplo de pesquisas
pode aprofundar sua compreensão.
Os profissionais que participam de sua primeira conferência da ACBS costumam se sur-
preender ao encontrar oficinas e sessões sobre RFT, princípios comportamentais, extensões
evolutivas e uma filosofia contextualista da ciência. Talvez ainda mais surpreendente, depois
de ganhar alguma experiência, os próprios clínicos começam a exigir tais sessões e geralmente
ficam entusiasmados com sua utilidade prática. Neste livro, usamos termos clínicos e de senso
comum, geralmente sem parar para vinculá-los a princípios básicos. Por exemplo, falamos fa-
Aprendendo ACT 25

cilmente de “mente” sem nos aprofundarmos no trabalho realizado nos laboratórios da RFT
para identificar as habilidades comportamentais componentes envolvidas nesse domínio do
senso comum. Se você estiver interessado em aprender mais sobre esses aspectos da ACT,
pode começar lendo mais da literatura da CBS.
Se você se conectar profundamente ao trabalho, acabará aprendendo que a ACT faz parte
de uma tentativa de reestruturar a psicologia e, de fato, a própria ciência do comportamento.
Embora neste momento você esteja provavelmente preocupado com propósitos práticos ime-
diatos, este livro o ajudará a aprender o suficiente sobre a ACT em vez de se importar com esse
contexto maior. Mais importante, esperamos que ler – ou talvez a melhor palavra seja “fazer” –
este livro o ajude a aprender o suficiente sobre a ACT para começar a usar esses métodos com
clientes que possam se beneficiar deles.
1

Os seis processos centrais da ACT e


seus respectivos aspectos
“Se você sempre faz o que sempre fez, sempre fará o que sempre fez.”
Moms Mabley

De um ponto de vista da ACT, a principal fonte de psicopatologia e infelicidade humana é a


inflexibilidade. Declarado dessa maneira, pode não parecer muito um insight. Setenta anos atrás,
o conceito de paradoxo neurótico se referia aos problemas de saúde mental como uma forma
de inflexibilidade: a estranha incapacidade das pessoas que lutam com a psicopatologia para
fazer algo diferente, acabava levando a resultados ruins (Mowrer, 1947). A teoria da evolução
nos diz a mesma coisa: os sistemas evoluem apenas quando há variação funcional suficiente
para que ajustes bem-sucedidos sejam selecionados e retidos. Moms Mabley estava certa: a in-
flexibilidade é inimiga da melhoria.
O que é único na ACT é o conteúdo, precisão e escopo de sua análise do porquê a infle-
xibilidade ocorre e o que fazer a respeito. Do ponto de vista da ACT, a linguagem é a bênção e
a maldição da existência humana. Os processos normais da linguagem humana tendem a atrair
as pessoas para a psicopatologia, e somente aprendendo novas maneiras de se relacionar com
eventos verbais elas conseguem encontrar um equilíbrio mais saudável.
Neste capítulo, apresentamos uma visão geral do modelo no qual a ACT se baseia, em
que a linguagem desempenha um papel central na forma como os seres humanos ficam presos.
Tentamos encontrar um equilíbrio entre ser abrangente e acessível. No entanto, alguns leitores
da primeira edição nos disseram que partes deste capítulo inicialmente pareciam muito técni-
cas. Se esse for o seu caso, tenha certeza de que o material deste capítulo será descompactado
no restante do livro, geralmente de maneira mais completa e acessível. Portanto, se você não
conseguir entender certas passagens nessa primeira etapa, tudo bem. Apenas siga em frente e
28 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

considere retornar a essas seções novamente depois de ler o restante do livro, quando é pro-
vável que você as entenda melhor. Em particular, esta primeira seção é provavelmente a mais
técnica de todo o livro. Portanto, fique à vontade para pular para o próximo capítulo se o pri-
meiro estiver confuso.
Não há dúvida de que a linguagem é uma bênção. Imagine que você foi dormir e acordou
em uma sala totalmente desconhecida, com todas as saídas trancadas. O que você faria?
Você quase certamente se perguntaria como chegou lá e logo se voltaria para a tarefa de
sair. Quando sua mente passou por várias soluções possíveis, você pesaria os prós e os contras.
Você pode considerar usar seu celular para pedir ajuda, mas também pode se preocupar que
quem o colocou naquela sala o ouça. Você pode arrombar uma porta, quebrar ou abrir uma
janela e pular para fora, mas talvez você se preocupe com o fato de seu sequestrador o punir
se você fizer isso. Usando apenas o pensamento, você pode considerar os riscos associados a
cada um desses planos. Por exemplo, e se a porta for muito resistente para ser arrombada?, ou se eles me
ouvirem sair, o que vai acontecer comigo?. Usando apenas suas habilidades verbais e simbólicas, você
seria capaz de formular um plano que possa ter sucesso.
Esse exemplo contém todos os elementos de que os humanos precisam para responder
ao mundo externo usando suas habilidades verbais e cognitivas: uma situação complexa é divi-
dida em seus componentes e recursos. O passado e o futuro são considerados e relacionados
ao presente. Esses componentes e recursos definem a ocasião para ações, previsões e avalia-
ções imaginadas, e um plano é escolhido com base nos resultados prováveis.
Esse processo de solução de problemas verbais oferece uma enorme vantagem evolutiva
e permitiu que os seres humanos dominassem o planeta, apesar de sermos fracos, lentos e com
pouca defesa. Nossas poderosas habilidades verbais, no entanto, podem facilmente proporcio-
nar uma enorme desvantagem
Suponha que, em vez de ficar preso em uma sala, você estivesse preso em um sentimento
de intensa ansiedade ou destruição iminente. Novamente, sua tarefa seria encontrar uma saída.
As mesmas habilidades de resolução de problemas, trazidas para o ambiente físico no primeiro
exemplo, seriam aplicadas ao ambiente psicológico para gerar soluções (p. ex., tomar um tran-
quilizante, suprimir a ansiedade ou automutilar-se) e forneceriam resultados possíveis, como
escapar dos sentimentos.
Tudo isso é extremamente lógico, mas não significa que seja extremamente útil. As mes-
mas coisas que funcionam bem no mundo externo podem facilmente criar danos quando vol-
tadas para o mundo interno. Se não gostamos da tinta descascando, podemos raspar a parede
e colocar uma tinta nova. Por outro lado, se não gostamos de pensar em um trauma passado e
tentamos “raspar”, podemos torná-lo mais central, saliente e influente. Se temermos uma seca
futura, poderemos economizar água para saciar nossa sede futuramente. Mas, se tememos a re-
jeição futura e tentamos garantir que ninguém jamais nos machuque dessa maneira novamente,
podemos limitar nossas conexões com os outros ou evitar compromissos, ampliando, assim, o
papel da rejeição em nossas vidas.
É bem possível sair de uma sala trancada e deixá-la para trás. Por outro lado, a própria
tentativa de escapar de uma emoção difícil pode exacerbá-la (Chawla & Ostafin, 2007; Hayes,
Luoma, Bond, Masuda, & Lillis, 2006). E, é claro, nunca podemos deixar nossa história para trás.
A solução verbal de problemas não é boa para tudo. No entanto, é bom para tantas coisas
que é difícil saber quando – e como – usá-lo somente quando for útil. A linguagem humana é
uma faca de dois gumes. Todos os principais processos que a ACT tem como alvo decorrem
desse insight e da pesquisa básica que o levou a ocorrer.
Aprendendo ACT 29

A ACT é baseada em princípios comportamentais e evolutivos básicos e sua expansão na


linguagem e cognição humanas, conforme explicado pela RFT. A RFT é uma abordagem com-
portamental contextual da linguagem e cognição humanas com amplo suporte empírico (para
uma revisão, ver Dymond & Roche, 2013). Segue um pequeno resumo que sintetiza a RFT em
quatro linhas breves (Hayes, 2016):

Aprenda em um,
derive em dois,
coloque-o em redes
que mudam o que você faz.

Por exemplo, uma criança humana normal, depois de aprender que uma maçã é chamada
“maçã”, saberá procurar maçãs ao ouvir a palavra “maçã”. Nesse caso, a relação treinada de ver
uma maçã e ouvir “maçã” levou a uma relação que não foi treinada diretamente (pelo menos
não com esse conjunto de objetos e nomes): ouvir “maçã” e procurar uma maçã. A relação
agora é mútua: a criança aprendeu em uma direção e a derivou em outra direção. Dito de uma
maneira mais normal, a criança tem um nome para um objeto.
Esse simples ato de criar nomes é onde a linguagem humana provavelmente começou,
e muito provável que tenha começado em tribos, não no indivíduo (Hayes & Sanford, 2014).
Os seres humanos são de longe os primatas mais cooperativos. A razão mais plausível para
nossa cooperação parece ser a seleção multinível (Nowak, Tarnita, & Wilson, 2010; DS Wilson,
2015), na qual a cooperação é selecionada porque dá uma vantagem aos grupos ou tribos con-
correntes, desde que o egoísmo individual seja amortecido. Qualquer que seja o motivo, nosso
nível de cooperação comparado ao de outros primatas é extraordinário e antigo. Além disso,
nossa capacidade de solicitar recursos usando nomes verbais (como pedir maçãs a um membro
da tribo por meio de um barranco) rapidamente estendeu a cooperação humana e deu origem
a uma comunidade verbal receptiva preparada para o próximo passo: colocar relações verbais
em redes.
Mesmo as crianças pequenas sabem colocar relações verbais mútuas em redes. Depois de
aprender que uma “maçã” também é um “jabuka” (como na Croácia), um ouvinte normal sabe-
rá que um “jabuka” é uma maçã e será capaz de imaginar como é beber suco de jabuka. Essa é a
essência do significado de “colocá-lo em redes que mudam o que você faz”. Como esse tipo de
comportamento verbal passou do nível tribal para a internalização pelos indivíduos, a estrutura
do pensamento simbólico humano foi estabelecida.
As propriedades das relações derivadas entre eventos são arbitrariamente aplicáveis
no sentido de que podem ocorrer com qualquer conjunto de eventos relacionados, inde-
pendentemente de sua forma, desde que as “pistas” corretas estejam presentes. Aqui está
um exemplo para ilustrar esse conceito: antes que as habilidades linguísticas sejam fortes, as
crianças pequenas tendem a preferir uma moeda de cinco a uma de dez centavos porque a
de cinco é maior e podem chorar quando recebem uma de dez centavos em vez disso. No
entanto, uma criança mais madura verbalmente prefere uma moeda de dez centavos a uma
de cinco, porque a moeda de dez centavos é supostamente “maior” e pode chorar quando
recebe uma de cinco, em vez de uma moeda de dez centavos, mesmo que a criança nunca
tenha realmente usado uma moeda de dez centavos para adquirir bens. Assim, as funções
30 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

das moedas (os eventos relacionados neste exemplo) são baseadas apenas em caprichos ou
convenções sociais, que arbitrariamente declaram que uma moeda de cinco é menor que uma
de dez centavos.
A flexibilidade das habilidades relacionais nos seres humanos nos permite ir além das
relações não arbitrárias que existem no mundo físico, mas fazemos isso tão perfeitamente que
o próprio mundo se torna completamente enredado em nossas ações verbais simbólicas. Se
nós dissermos que “ser seco é melhor que ser gordo”, a relação “melhor que” nesta declaração
é muito semelhante à frase “maior que” na declaração “o elefante é maior que o rato”. No
entanto, na verdade, é bem diferente porque a relação de tamanho na segunda frase é baseada
nas propriedades formais de elefantes e ratos, enquanto a relação de “melhor que” é baseada
apenas na história de quem fala, não em ser gordo ou seco. A relação parece estar nos próprios
eventos relacionados, e não na história arbitrária do treinamento social, e essa ilusão pode
ocultar possíveis opções de resposta. À medida que essas habilidades se fortalecem, criamos
vastas redes relacionais e vivemos cada vez mais em um mundo no qual as funções são
adquiridas verbalmente, não baseadas na experiência direta. Isso pode nos prender a modos de
vida e relacionamentos culturais e socialmente derivados que não são escolhidos e nem sempre
são viáveis. Dessa maneira, a linguagem trabalha nos bastidores para estruturar nosso mundo
e faz isso de maneira tão transparente que a fonte dessa estruturação geralmente é invisível.
A ACT trabalha para revelar a ilusão da linguagem produzida pela mente, como Totó,
em O Mágico de Oz, afastando a cortina e fazendo Oz trovejar: “Não preste atenção naquele
homem atrás da cortina!”. Na perspectiva da RFT, a mente não uma coisa. É apenas uma co-
leção de habilidades relacionais. E, embora a capacidade de relacionar eventos – por exemplo,
pensando, planejando, julgando, avaliando ou lembrando – tenha um lado claro e um escuro,
o processo é notavelmente semelhante nos dois lados. As diferenças estão no contexto e no
domínio de destino. Linguagem literal e cognição são ferramentas, mas não são ferramentas
adequadas para todos os fins.
A RFT levou ao desenvolvimento de métodos que melhoraram as habilidades de lingua-
gem e o desempenho intelectual (Dymond & Roche, 2013), mas é de igual importância para
aprender a controlar os excessos de linguagem. A RFT sugere não apenas como a linguagem
e a cognição se desenvolvem e por que elas são uma ajuda e um obstáculo, mas também como
controlar essas habilidades para que possamos usá-las e não ser usados por elas. A resposta está
na última linha do poema da RFT: precisamos mudar o que elas fazem.
A teoria da evolução nos dá uma orientação clara sobre quando precisamos mudar
o que fazemos. Precisamos acompanhar apenas seis coisas para desvendar o desafio da
mudança intencional: variação, contexto, seleção, retenção, nível de organização e dimen-
são. (Para uma discussão mais extensa, ver D. S. Wilson, Hayes, Biglan e Embry, 2015.)
Mudança intencional requer variação de ações e exige que variações bem-sucedidas em
um determinado contexto sejam selecionadas e mantidas. A seleção deve ser considerada
em termos de seu nível de organização. (P. ex., o crescimento de uma célula cancerígena
pode ser bem-sucedido para a célula, mas não para o organismo, e o sucesso de uma ação
pode ser bom para um indivíduo, mas prejudicial para outros.) A seleção também deve
ser considerada em termos de dimensão selecionada, seja uma emoção, pensamento, ação,
estado fisiológico, gene, epígene ou assim por diante. Uma visão multidimensional exige
que consideremos uma ampla gama de tópicos para determinar se estamos progredindo.
Por exemplo, obter sucesso no desempenho de um trabalho pode custar a necessidade de
sono de uma pessoa.
Aprendendo ACT 31

Essas seis características da evolução sugerem que as relações simbólicas (e, de fato, to-
dos os eventos psicológicos) devem ser pensadas como interferindo na mudança deliberada
quando restringem desnecessariamente a variação saudável, comprometem o contato com o
contexto atual, interferem na seleção de ações positivas na dimensão adequada dimensão ade-
quada ou no nível correto da organização ou quando elas interferem na capacidade de reter
ganhos. No final deste capítulo, após apresentar o modelo da ACT, retornaremos a essas seis
características da mudança da teoria evolucionista e examinaremos como o modelo da ACT se
expande, na medida em que os desafios se apresentam.
 
O modelo de psicopatologia da ACT: os seis processos da inflexibilidade
Do ponto de vista da ACT, os conceitos de RFT fornecem uma base para os processos
principais que, acredita-se, levam ao sofrimento humano. Em essência, o problema é que a
linguagem literal leva a aumentos na disseminação da dor, o que é ainda mais exacerbado
pela tendência de exagerar um modo de pensar na solução de problemas como uma manei-
ra de se livrar dessa dor. Os processos de linguagem literal nos incentivam a tentar escapar
ou evitar nossos sentimentos, nos levam a enredar-nos em nosso pensamento, nos fazem
perder contato flexível com o momento presente e nos tentam a acreditar e defender nossas
próprias histórias sobre nós mesmos e os outros. Dito em termos evolutivos, a super exten-
são da linguagem reduz a variação funcional saudável e também reduz nossa capacidade de
responder de forma adaptável aos nossos ambientes internos e externos. Enquanto isso, o
que realmente queremos é colocar em espera ou mudar para segundo plano, enquanto a cria-
ção de padrões de ação vinculados aos valores escolhidos se torna mais difícil. Em resumo,
uma super extensão da linguagem humana leva a modos de vida rígidos e psicologicamente
inflexíveis.
Do ponto de vista da ACT e da RFT, todas essas dinâmicas compõem a inflexibilidade
psicológica: uma coleção de processos que produzem ou exacerbam o sofrimento humano.
A inflexibilidade psicológica é o alvo da ACT e estabelecer uma maior flexibilidade psicoló-
gica é o objetivo imediato da ACT.
Nas seções a seguir, passamos a um exame mais detalhado desses processos. Eles são
destilados em seis aspectos de um único foco e podem ser combinados em três pilares ver-
ticais que refletem de perto a base evolutiva do modelo ACT. O modelo geral de psicopa-
tologia da ACT pode ser ilustrado na forma de um hexágono (Figura 1.1), com cada ponto
no hexágono correspondendo a um dos seis processos que presumidamente contribuem ou
causam grande parte do sofrimento humano e da psicopatologia. No centro deste diagra-
ma está a inflexibilidade psicológica, que é simplesmente um termo usado para se referir à
interação de todos esses processos. Embora a ACT reconheça que processos patológicos
específicos estejam associados a certos distúrbios, também sustenta que esses processos
gerais ultrapassam os limites tradicionais do que chamamos de psicopatologia (e, portanto,
podem frequentemente influenciar a comorbidade. Além disso, também se aplicam à saúde
comportamental e ao funcionamento social.
32 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

FIGURA 1.1 O modelo do hexágono da inflexibilidade psicológica.

Evitação experiencial
A evitação experiencial se refere à tentativa de controlar ou alterar a forma, a frequência ou a
sensibilidade em relação às experiências internas situacionais das experiências internas (isto
é, pensamentos, sentimentos, sensações ou memórias) em uma determinada situação, mesmo
quando esse comportamento pode causar danos (Hayes, Wilson Gifford, Follette, & Strosahl,
1996). Do ponto de vista da ACT/RFT, a evitação experiencial surge naturalmente de nossas
habilidades para avaliar, prever e evitar situações. Em outras palavras, é alimentado por um
emaranhado de “resolução de problemas” por meio do uso da linguagem e cognição.
Como mencionado anteriormente, a linguagem é útil no mundo externo e social, em parte
porque os eventos externos podem ser previstos, avaliados e evitados. Nada impede que essas
habilidades linguísticas se expandam do mundo externo para o interno. Essencialmente, não há
diferença entre os processos cognitivos envolvidos para escapar de uma sala trancada e os usados
para escapar dos sentimentos de ansiedade, ou entre os processos cognitivos usados para prever
que vai passar fome e os utilizados para prever um ataque de pânico. No entanto, tentativas dire-
tas de evitar ou alterar experiências podem ter efeitos infelizes e paradoxais em certos contextos.
Vamos começar com o processo de evitar um pensamento negativo. Suponha que seja
extremamente importante não pensar em algo. Tentativas deliberadas de controlar o surgi-
mento desse pensamento envolve uma regra verbal: não pense em “X”. No entanto, seja qual
for o X, especificar qual X tenderá a evocar o X; por exemplo, não pensar em um lago evoca
pensamentos de um lago, ou; não pensar em um bebê evoca pensamentos de um bebê. Isso
acontece porque esses eventos verbais estão relacionados aos eventos reais e porque algumas
das propriedades dos eventos reais são transferidas para o evento verbal (p. ex., quando você
Aprendendo ACT 33

ouvir a palavra “bebê”, poderá ver uma imagem de um bebê em sua mente). A mesma coisa
tende a ocorrer com as emoções. Parte disso se deve à regra verbal que acabamos de discutir:
não sinta Y. Assim, tentar controlar a ansiedade envolve pensar em ansiedade, que tende a
evocar a ansiedade.
As razões verbais que motivam esses esforços de controle também têm impacto. Geral-
mente, diz-se que a ansiedade é algo a ser evitado devido a uma longa lista de consequências
indesejáveis; você pode pensar: “Eu vou fazer papel de bobo”, “Eu vou enlouquecer”, “Vou
ter um ataque cardíaco”, ou “Não vou conseguir”. Mas a resposta emocional natural a essas
consequências inclui – você adivinhou – ansiedade.
Por esses motivos e vários outros, a evitação experiencial tende a ser inútil e autoamplifica-
dora em longo prazo, embora não seja, é triste dizer, em curto prazo. Uma pessoa que lida com
a ansiedade bebendo pode “não ter consequências” por anos; uma pessoa que evita situações
de medo recusando convites sociais pode sentir-se aliviada no momento e apenas perceber gra-
dualmente que sua vida se tornou restrita. Além disso, algumas evitações experienciais parecem
se alimentar e ser alimentadas por processos culturais. Uma pessoa que evita o medo de rejeição
comprando roupas da moda, aparentemente apoia a cultura e seu funcionamento de economia.
Talvez por razões semelhantes, a evitação experiencial seja frequentemente ampliada pela comu-
nidade social/cultural, para vender produtos ou controlar o comportamento das pessoas. A ideia
de que humanos saudáveis não têm dor psicológica (p. ex., estresse, depressão, memórias trau-
máticas) pode ser usada por interesses econômicos para especificar ações que devem ser tomadas
para evitar eventos privados negativos – ações que produzem ganhos para aqueles que propagam
a regra. Soluções evitativas, como consumismo irracional ou uso de álcool, são frequentemente
modeladas em programas de televisão e comerciais. A generalização do “sentir-se bem”, na cul-
tura ocidental, vende. Não apenas devemos nos sentir bem; temos o direito de nos sentir bem!
Infelizmente, parece que o objetivo de se livrar de sentimentos difíceis costuma estar
no cerne do modelo de saúde mental. Os próprios nomes de nossos distúrbios e tratamentos
revelam essa conexão (p. ex., transtornos de humor, transtornos de ansiedade). Diagnostica-
mos distúrbios com base na presença de configurações particulares de eventos e experiências
particulares. Por exemplo, pensamentos autocríticos, pensamentos suicidas e sentimentos de
fadiga fazem parte da depressão. Em seguida, construímos tratamentos projetados para elimi-
nar esses sintomas, ostensivamente com o objetivo de devolver uma boa saúde para a pessoa.
Infelizmente, tudo isso tem o risco de alimentar a mensagem do “estar sempre bem”. Talvez
como reflexo dessa convenção cultural, uma em cada quatro mulheres com mais de quarenta
anos nos Estados Unidos toma antidepressivos, um número impressionante, dado o estado
da ciência para esses medicamentos, o que sugere que seus benefícios geralmente superam os
riscos de depressão grave (Pratt, Brody, & Gu, 2011). 
 
Fusão cognitiva
Em termos gerais, a fusão cognitiva refere-se à tendência dos seres humanos de serem fisgados
pelo conteúdo que estão pensando, de modo que elas prevaleçam sobre outras fontes úteis de
regulação comportamental. Por “pensamento” entendemos qualquer coisa que seja simbólica
ou relacional no sentido arbitrariamente aplicável (ver sobre RFT); isso inclui, por exemplo,
palavras, gestos, pensamentos, sinais, imagens e algumas propriedades das emoções.
A palavra fuse, de origem latina, significa “derramar”. Metaforicamente, é como se o con-
teúdo da cognição e o mundo sobre o qual estamos pensando sejam derramados juntos até que
34 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

sejam um, da mesma maneira que água, suco de limão e açúcar podem ser despejados juntos
em um copo, formando, assim, uma limonada. Mas quando o pensamento e o mundo sobre o
qual estamos pensando são tratados como uma coisa, os hábitos de pensamento podem ditar
como reagimos ao mundo. Dessa forma podemos não perceber, mas os pensamentos criam
estruturas que são impostas ao mundo por um processo ativo – é algo que fazemos.
Há muito se sabe que o comportamento controlado por algumas regras verbais tende
a ser rígido e inflexível (Hayes, 1989). A maioria das formas de intervenção psicológica
percebe isso e, seguindo um caminho lógico, tenta resolver o problema alterando as regras
verbais (isto é, alterando os pensamentos). Infelizmente, isto pode falhar em abordar o
cerne do problema. Não é que uma regra incorreta esteja sendo usada, mas sim um evento
sendo interpretado verbalmente. São duas coisas que parecem ser uma: o evento e a inter-
pretação do evento. Confundimos o significado dos pensamentos com os eventos literais
pensados, perdendo o processo contínuo de pensar em si. Do ponto de vista da ACT/
RFT, não é o que achamos que é o mais problemático; é como nos relacionamos com o que
pensamos.
Imagine que os pensamentos são como um par de óculos escuros que você esqueceu que
estava usando. Eles colorem sua visão do mundo, e você não percebe isso. O problema é que
os pensamentos ficam livres para apresentar a você um mundo estruturado através do pensa-
mento – um mundo visto através da cor dessas lentes. Você não está lidando com o mundo
como ele é diretamente experenciado, e não percebe que o está modificando “verbalmente”.
Por exemplo, quando as pessoas com transtorno obsessivo-compulsivo pensam: “Se eu não
lavar as mãos, minha família ficará contaminada”, elas podem ficar tão focadas no mundo co-
lorido por esse pensamento que nem parece que estão lidando com um pensamento. Eles estão
lidando com a contaminação e suas consequências (p. ex., que sua família vai morrer), não com
um pensamento.
Toda a linguagem ocorre em um contexto e a linguagem e cognição têm apenas funções
particulares em contextos particulares. O pensamento simbólico é tão amplamente útil para a
solução de problemas e para o nosso sucesso na adaptação ao meio, no entanto, a evolução cul-
tural ampliou demais os contextos que atribuem à linguagem automaticamente suas funções.
É claro que, para fins mais práticos, é útil tratar as palavras como se elas fossem exatamente o
que elas dizem que são. Quando você pensa em caminhar na praia, geralmente não faz mal ex-
perimentar reações semelhantes às de uma caminhada real na praia, mas de uma forma menos
vívida. Você pode “ver” a água na sua mente e “sentir” o vento na pele. Portanto, em parte de-
vido ao treinamento social, normalmente vemos o mundo do ponto de vista dos pensamentos,
em vez de observá-los diretamente. Isso é bom para atividades como pagar impostos, consertar
um carro ou plantar. No entanto, muitas vezes não é tão útil para coisas como apreciar um pôr
do sol ou descobrir como obter paz de espírito.
Pense no exemplo anterior de se perguntar como escapar de uma sala trancada. Se você
realmente se envolveu na tarefa, provavelmente não estava ciente do que estava fazendo fisica-
mente no momento. Você provavelmente não notou o pé ou a cadeira em que estava sentado,
nem a textura e a cor do papel em que essas palavras estão escritas. Seu foco atencional se
estreitou: você estava focado em planejar sua fuga.
É o que acontece com a fusão cognitiva. Construções verbais/cognitivas substituem o
contato direto com eventos. Esquecemos que estamos interagindo com os pensamentos, e
não com a coisa real. O passado pode parecer como se estivesse ocorrendo agora, embora já
tenha passado há anos. O futuro pode se tornar presente aqui e agora, mesmo que esteja lá
Aprendendo ACT 35

adiante. O momento presente é perdido para o foco da mente no passado e no futuro. Estamos
constantemente interagindo com o mundo como organizando cognitivamente – sem perceber
que o estamos constantemente organizando.
Quando um cliente deprimido imagina como ele ou ela pode desmoronar por causa do
estresse do trabalho, essa pessoa aparentemente está lidando com o problema de literalmente
desmoronar, assim como, anteriormente, você aparentemente estava lidando com o problema
de uma sala trancada. Se as funções literais desse pensamento dominam todas as outras funções
possíveis, a questão pode se tornar como evitar desmoronar, e não milhares de outras respostas
possíveis ou problemas situacionais. Assim, a flexibilidade psicológica e comportamental se
perde. Isso pode resultar no cliente não trabalhar, dormir demais ou se afastar dos desafios ou
colegas de trabalho, ou simplesmente não ir trabalhar – todos os comportamentos típicos que
fazem parte do que chamamos de “depressão”. O perigo é que, quando uma pessoa se fusiona
com o conteúdo verbal, esse conteúdo pode ter domínio quase total sobre o comportamento
da pessoa, limitando outras fontes possíveis de influência, como o terapeuta, repertórios ver-
bais novos, mas ainda fracos ou contingências diretas no ambiente.
A super extensão da linguagem possui várias fontes contextuais importantes. Inicialmen-
te, a linguagem começa dentro de um contexto de literalidade, que é o contexto social/verbal
que estabelece certos sons que ouvimos (a palavra falada “limão”) e certas imagens que vemos
(uma imagem de limão) como palavras ou pensamentos com significado. A comunidade so-
cial expande esse repertório de outras maneiras também. Por exemplo, a maioria das crianças
é exposta a demandas precoces para justificar e explicar suas ações. Isso ajuda a comunidade
social/verbal a ter acesso às habilidades de raciocínio das crianças e ajuda a manter as ações
das crianças dentro dos limites do que pode ser justificado verbalmente em uma comunidade
cultural. Espera-se que crianças e adultos tenham motivos para justificar e explicar suas ações.
Elas geralmente assumem a forma de declarações verbais de causa e efeito, como dizer: “Fiquei
na cama porque estava deprimido”.
Infelizmente, esse contexto de literalidade também tende a apoiar a ideia de que razões
são causas literais; por exemplo, pensamos que a depressão gerou a ação de ficar na cama. Afinal,
essa noção de causa literal é o que responde aos “porquês?”. De fato, os porquês verbalmente
construídos são considerados “reais” simplesmente porque a comunidade verbal os trata dessa
maneira. Razões que começam como explicações para o comportamento mais tarde passam a
exercer controle sobre o nosso comportamento por causa desse contexto social de dar explica-
ções. Nossas vidas se enredam com uma rede cada vez maior de formulações verbais, à medida
que todos os aspectos de nossas vidas são analisados e categorizados.
Além disso, muitas respostas para o porquê das perguntas apontam para experiências
particulares, que as pessoas não conseguem controlar. Por exemplo, pessoas podem perder reu-
niões “porque eu esqueci”, ou evitar tarefas “porque tenho medo”. Essa formulação raramente
é contestada. É quase rude perguntar: “Por que você esqueceu?” ou “Por que você sentiu
medo e ainda assim fez?” Assim, o contexto de dar explicações rapidamente se expande para
um contexto de controle experiencial. O próximo passo lógico é tentar remover experiências
privadas problemáticas para obter mais controle comportamental como, por exemplo, livran-
do-se do esquecimento e do medo. A cultura ocidental dominante nos ensina que experiências
privadas podem ser perigosas e, portanto, precisam ser controladas. Por exemplo, pense no pai
que diz ao filho: “Não tenha medo. Somente os bebês têm medo”.
Dessa forma, a fusão cognitiva é combinada com mensagens culturalmente aceitas sobre
o efeito causal de eventos privados, sua natureza perigosa e a necessidade e suposta capacida-
36 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

de de controlá-los. Por exemplo, uma pessoa que pensa “Eu vou desabar” acreditará que esse
pensamento faz parte do processo de literalmente desabar – pensamentos são causas. Ensi-
nam-nos coisas como “Ansiedade é ruim”, como se os sentimentos fossem perigosos. Quando
jovens, nos dizem: “Pare de chorar ou eu lhe darei um motivo para chorar”, como se o controle
emocional fosse razoável e óbvio. Seria interessante se, quando crianças, pudéssemos respon-
der ao adulto e mostrar a impossibilidade do comando dizendo: “Pare de ser incomodado pelo
meu choro ou darei a você motivo para se incomodar”.
Todos esses aspectos culturais discutidos servem apenas para dar aos pensamentos um
efeito ainda mais dominante em relação às nossas ações.

Atenção inflexível
Vivemos nossas vidas dentro do momento presente por uma razão simples: não há outro lu-
gar para a vida acontecer. Apesar disso, fusão e evitação tendem a aumentar a atenção para o
passado e o futuro, conceitualizados na forma de ruminação e preocupação, respectivamente.
Isso é problemático, reduzindo nossa capacidade de consciência contínua e flexível sobre o
que o ambiente externo proporciona e, dessa forma, diminuindo nosso conhecimento sobre o
que estamos sentindo, pensando, percebendo e lembrando no momento. Isso nos torna menos
sensíveis às possibilidades inerentes ao nosso ambiente e pode se manifestar em problemas
como a alexitimia – uma incapacidade de identificar ou perceber o que estamos sentindo.
Quando o passado ou o futuro conceitualizados dominam a consciência do momento
presente, o comportamento tende a ser controlado por pensamentos e reações condicionados,
resultando em mais do mesmo comportamento que ocorreu no passado. Novas possibilidades
são encerradas. Sonhar acordado substitui a ação efetiva. Dissecar cada pequeno dano atra-
palha a intimidade e conexão com o momento. A atenção se torna mais rígida e programada,
reduzindo ainda mais a variação saudável de comportamento.
 
Apego à conceitualização referente ao eu e aos outros
Provavelmente, nada é tão grande como um foco de processos verbais de um indivíduo. Desde
muito cedo, se fazem muitas perguntas para as crianças sobre elas mesmas, como quantos anos
elas têm, do que gostam, o que querem ser quando crescerem e do que gostam na escola. As
crianças são atormentadas a responder “Por que?”, como se as respostas já estivessem disponí-
veis e apenas a timidez ou a relutância as impedissem de dar respostas completas e reveladoras.
De fato, as crianças têm pouco a dizer a princípio, sobre tais coisas. As perguntas “Por que” são
frequentemente respondidas com honestidade com a resposta “porque sim” e outras perguntas
complicadas sobre autoconhecimento podem provocar um “Eu não sei” igualmente honesto.
Eventualmente, no entanto, as crianças aprendem a contar histórias mais coerentes e envolven-
tes para explicar seu comportamento de uma forma mais aceitável para os outros. O passado é
formulado e descrito. O futuro é previsto e avaliado. Dentro desse processo de narrativa, existe
um eu conceitualizado ou eu-como-conteúdo: o indivíduo e seus atributos são descritos e analisados.
Como as crianças aprendem rapidamente que mudar de história sem um bom motivo é causa
de desaprovação, as histórias se tornam mais estáveis ao longo do tempo. O eu conceitualizado
cria estabilidade no comportamento, para o bem e para o mal. Quando um cliente entra em
terapia, esse processo cria uma teia de aranha de categorias, interpretações, avaliações e expec-
tativas em relação a si mesmo. Frequentemente, essas histórias sobre si mesmo, “baseadas no
ego”, tornam-se eventos a serem defendidos, tornando a mudança ainda mais difícil.
Aprendendo ACT 37

Temos histórias para contar sobre o que fizemos e do que gostamos, sobre por que temos
problemas e o que funcionaria como soluções e sobre como somos e como diferimos dos ou-
tros. Normalmente, em todas essas histórias tem alguma verdade. O problema é que a verdade
sobre a qual estamos falando não é necessariamente útil; ao contrário, é uma verdade que pode
ser justificada porque reflete a relação entre as formulações verbais e os fatos supostamente
objetivos do assunto. Em outras palavras, essas histórias são consideradas verdadeiras porque
estão “certas”, não necessariamente porque são úteis na vida.
Considere uma cliente típica que vem dizendo: “Eu sou agorafóbica. Eu sou assim há
doze anos, desde que meu marido me bateu e depois me abandonou com meu filho de dois
anos. Meus pais tentaram ajudar, mas eles eram tão críticos que só pioraram a situação. Desde
então, tenho tido uma ansiedade terrível. Como resultado, não consigo funcionar e estou com
muito medo de lidar com isso. Estou pensando na minha ansiedade o tempo todo”. Todos
esses eventos podem ser 100% verdadeiros, mas o mais importante é que a pessoa se fusionou
com uma história focada em si mesma e está tentando resolver problemas nessa história. Em
vez de um ser humano flexível e complexo, estamos lidando com uma caricatura criada por
ela mesma: “Eu sou agorafóbica”. Em vez de dizer algo como “Eu sinto medo”, é como se ela
estivesse dizendo “Eu sou uma categoria de diagnóstico”. Na declaração “Eu sou tão medroso”,
a palavra “tão” implica que “quem eu sou” é de alguma forma ilegítimo.
O problema é que soluções reais podem não existir nessa história e, ainda assim, a histó-
ria é tão bem elaborada que todas as formas possíveis de sair dela seriam consideradas nulas.
O eu conceitualizado tornou-se estreito e aprisionado e padrões inflexíveis de comportamento
são o resultado inevitável disso.
Construímos histórias não apenas sobre nós mesmos, mas também sobre os outros. As-
sim como podemos nos envolver com um eu conceitualizado, também podemos nos envolver
com conceitualizações dos outros. Podemos ficar tão envolvidos em nossas histórias, avalia-
ções e julgamentos sobre outras pessoas que somos incapazes de responder de maneira flexível
a eles ou de ter uma empatia precisa com a experiência deles. Esse processo está no centro da
objetificação, desumanização e preconceito; de fato, a fusão com histórias imprecisas sobre as
intenções, sentimentos e pensamentos de outras pessoas geralmente contribui muito para as
dificuldades interpessoais. Em um nível básico, essas histórias sobre si e sobre os outros inter-
ferem em nossa capacidade de formar relacionamentos cooperativos e solidários. 

Falta de contato ou falta de clareza em relação aos valores


Valores são qualidades escolhidas do ser e do fazer que são representadas por padrões contí-
nuos de comportamento. Em última análise, os valores são sobre viver de uma maneira esco-
lhida e significativa; eles são como uma bússola que podemos usar para guiar nossas vidas. Os
valores escolhidos livremente não devem ser avaliados, ao contrário, servem como o padrão
por meio do qual outras coisas podem ser avaliadas.
Valorizar é um processo parcialmente verbal, mas não totalmente lógico ou racional, por-
que envolve escolher, assumir, criar e postular, não apenas pesar ou decidir. Não é assim que
geralmente estabelecemos objetivos de vida. Frequentemente, os objetivos são estabelecidos
sem pensar ou são criados com base na avaliação de “razões” (p. ex., listas de prós e contras
e, em seguida, selecionando que são “melhores”). Embora isso possa ser útil em muitos casos,
muitas dessas “razões” estão ligadas a processos psicológicos não importantes (p. ex., estar
certo, evitar dor ou agradar outros), em vez de estarem ligados a caminhos de vida escolhidos.
38 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

À medida em que o comportamento está atrelado à evitação experiencial, a pessoa terá


dificuldade em entrar em contato com o que realmente importa em sua vida. É doloroso cuidar
e, se alguém tem uma história de vida cheia de perdas, arrependimentos ou falhas, pode ser
mais fácil evitar o cuidado. Em particular, pessoas que foram criadas em famílias caóticas, nas
quais a vida era imprevisível e muitas vezes decepcionante, podem evitar a construção de fu-
turos valiosos para evitar mais perdas e dores. Eles podem nunca ter solidamente estabelecido
um repertório comportamental de construção de qualidades valorizadas verbalmente ou esses
valores podem ter sido suprimidos pela dor. De qualquer maneira, a avaliação está ausente ou
fraca.

Inatividade, impulsividade e evitação persistente


Associada à fusão, evitação, apego a um eu conceitualizado e perda de atenção flexível ao
momento presente, há uma incapacidade de desenvolver hábitos maiores de ação baseada em
valores. A impulsividade ou persistência rígida se manifesta em vez de um compromisso com
a construção contínua de padrões cada vez maiores de ação pessoalmente significativa. Objeti-
vos de curto prazo, como se sentir bem, estar certo e defender um eu conceitualizado, podem
se tornar tão dominantes que as qualidades desejadas da vida a longo prazo (isto é, valores)
ficam em segundo plano. As pessoas perdem o contato com o que desejam na vida, além do
alívio da dor psicológica.
A vida das pessoas pode ser consumida, defendendo-se da ansiedade, lidando com a
depressão ou defendendo sua autoestima, em vez de focar em metas e valores que possam
ter maior significado, profundidade e vitalidade. Em tais situações, as pessoas são metafori-
camente consumidas ao afiar o machado e nunca têm a chance de usá-lo para derrubar árvo-
res e construir a casa em que desejam viver. Isso geralmente leva ao surgimento de padrões
de ação que são desapegados das qualidades desejadas de ser e agir das pessoas – desconec-
tados de seus valores. Às vezes, isso aparece na forma de uma direção geral fraca da vida ou
na incapacidade de assumir e manter compromissos. Por exemplo, as pessoas podem não se
envolver efetivamente com o trabalho, relacionamentos íntimos, hábitos de vida saudáveis,
atividades de recreação e lazer ou práticas espirituais significativas. Frequentemente, esse
tipo de padrão se apresenta como uma falta de vitalidade e uma sensação de que as pessoas
abandonaram sua vida.

Usando os processos de inflexibilidade na avaliação


Na ACT, esses seis processos de inflexibilidade informam a avaliação em alto grau. Atualmen-
te, existe um grande número de dispositivos de avaliação que permitem que a inflexibilidade
específica em áreas de conteúdo específicas seja mensurada sistematicamente, mas ao longo
deste livro também mencionaremos características do comportamento dos clientes em sessão
que refletem esses processos específicos de inflexibilidade sem o uso de dispositivos de avalia-
ção formal. Como as síndromes e os protocolos direcionados a elas estão se tornando menos
importantes na terapia baseada em evidências, um novo modelo de avaliação e conceitualização
de casos baseado em processos está surgindo e se encaixa muito bem com uma abordagem
ACT. Na terapia baseada em processos (Hayes et al., no prelo), os processos baseados em
evidências estão ligados a procedimentos baseados em evidências para aliviar de maneira mais
eficaz os problemas das pessoas e promover o bem-estar. A avaliação dos processos de inflexi-
bilidade pode contribuir significativamente para essa abordagem.
Aprendendo ACT 39

Seis processos terapêuticos centrais da ACT


A ACT tem como alvo cada um dos principais processos de inflexibilidade descritos, com o
objetivo geral de aumentar a flexibilidade psicológica – a capacidade de entrar em contato com
o momento presente mais plenamente, como um ser humano consciente e, com base no que a
situação oferece, mudar ou persistir no comportamento para servir a fins valorizados (Hayes &
Strosahl, 2004). A flexibilidade psicológica é estabelecida por meio dos seis processos positivos
mostrados na Figura 1.2. Cada uma dessas áreas é conceitualizada como uma habilidade psico-
lógica positiva que é instigada, modelada e apoiada na terapia. Todas as competências da ACT
são projetadas para promover esses recursos de flexibilidade e, portanto, esse modelo pode ser
pensado como um modelo da própria terapia. Como você pode ver, ele se aproxima muito do
modelo de psicopatologia e sofrimento descrito na Figura 1.1.
Vale a pena notar esses processos não apenas porque são paralelos positivos aos pro-
cessos de psicopatologia, mas também porque podem ser escalados para o nível da díade ou
grupo. Esse é um dos motivos pelos quais os processos de flexibilidade estão tão intimamente
ligados às competências terapêuticas na ACT: o modelo sugere que, no nível da intervenção,
esses processos precisam se manifestar nas interações entre o terapeuta e o cliente. Dito de
outra maneira, os processos de flexibilidade na ACT compreendem um modelo para um rela-
cionamento terapêutico eficaz e intervenções efetivas.

FIGURA 1.2. O modelo do hexágono da flexibilidade psicológica.


© Steven C. Hayes. Usada com permissão.
40 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

Aceitação
A aceitação de eventos privados é ensinada como uma alternativa à evitação experiencial. Abran-
ge o envolvimento ativo e consciente de eventos privados que são ocasionados por nossa his-
tória, sem tentativas desnecessárias de mudar sua frequência ou forma, especialmente quando
isso causaria danos psicológicos. Por exemplo, os clientes que experimentam ansiedade são
ensinados a sentir ansiedade como um sentimento, total e sem defesa e a deixar de lado sua
luta contra a dor psicológica.
A aceitação, na ACT, não é um fim em si. Pelo contrário, a aceitação é promovida como
um método para aumentar a ação baseada em valores. Os métodos de aceitação na ACT en-
volvem exercícios que incentivam uma interação rica e flexível com experiências anteriormente
evitadas. Por exemplo, as emoções são transformadas em objetos descritos, as reações comple-
xas são divididas em elementos experienciais e é dada atenção a aspectos relativamente sutis
de um evento evitado. Até certo ponto, parecem exercícios de exposição, mas com o objetivo
adicional de aumentar a disposição e a flexibilidade de resposta, em vez de necessariamente,
diminuir a resposta emocional.
Quando a aceitação é dimensionada para o nível do relacionamento terapêutico, é im-
portante que os terapeutas aceitem e modelem a aceitação quando seus próprios momentos
difíceis entram em terapia. A aceitação também pode ser escalada para casais, famílias ou ou-
tros grupos, incentivando a compaixão pelos outros, e é por isso que existe uma aliança natural
entre a ACT e as terapias voltadas para a compaixão. 

Desfusão cognitiva
A ACT é uma das terapias cognitivas e comportamentais, mas como outras abordagens chama-
das de TCC de terceira geração (Hayes, 2004), não adota o princípio central da TCC tradicional,
ou seja, que modificar pensamentos distorcidos ou irreais é um precursor necessário para mu-
dança de comportamento. Essa afirmação central da TCC tradicional recebeu apoio empírico
muito limitado (Chawla & Ostafin, 2009). Do ponto de vista da RFT, isso não é surpreendente.
Do ponto de vista da RFT, o problema é o seguinte: os esforços para mudar as redes relacionais
(ou seja, padrões de pensamento) geralmente expandem essas redes e tornam o evento (p. ex.,
o pensamento ou a emoção) no qual a pessoa está focada ainda mais importante. Em termos
técnicos, um contexto relacional geralmente também é um contexto funcional.
Geralmente, os clientes são excessivamente focados em experiências privadas negativas.
Como efeito, eles estreitaram seu repertório comportamental. Focar ainda mais atenção nessa
área pode não ser o mais útil possível. O trabalho de alterar permanentemente e completa-
mente o conteúdo cognitivo é difícil porque os pensamentos são históricos, frequentemente
automáticos e, em áreas clínicas relevantes, geralmente bem estabelecidas. Alterá-los pode levar
muito tempo, mesmo quando bem-sucedido, e eles ainda não desapareceram – como mostra
a tendência das redes verbais/cognitivas mais antigas de ressurgirem sob estresse (Wilson &
Hayes, 1996).
Além disso, os clientes geralmente estão bastante dispostos a tentar suprimir ou eliminar
pensamentos e sentimentos negativos e podem muito bem já ter tentado fazê-lo; no entanto,
isso geralmente tem efeitos paradoxais, às vezes aumentando a frequência e a intensidade dessas
experiências, bem como seu poder de regular o comportamento (Wenzlaff & Wegner, 2000).
Embora as técnicas de mudança cognitiva normalmente não sejam supressivas, essa tendência
Aprendendo ACT 41

torna o uso destas estratégias mais arriscado. Pouquíssimos dados sugerem que disputas e mu-
danças cognitivas são úteis ou um caminho fundamental para a mudança de comportamento;
até o momento, estudos sugerem que esses métodos são relativamente inertes ou, em alguns
casos, até prejudiciais (Dimidjian et al., 2006).
A RFT sugere uma abordagem diferente: que não precisamos mudar o conteúdo dos
pensamentos para mudar as funções dos pensamentos em nossas vidas. Os contextos sociais
e culturais de literalidade, fundamentação e controle emocional normalmente determinam as
funções dos pensamentos sobre os comportamentos. Em contextos como esses, os efeitos do
pensamento sobre a ação são como máquinas. Isto é, pensamentos ou sentimentos parecem
causar ações, assim como uma bola de bilhar que bate em uma segunda fazendo com que ela
se mova. No cenário culturalmente normativo, para mudar a ação, devemos mudar o pensa-
mento. No entanto, com uma visão contextual, podemos ver que os efeitos do pensamento são
apenas mecânicos: eles parecem causar ações, mas na verdade não. Em vez disso, pensamentos
particulares estão vinculados a ações ou pensamentos específicos apenas dentro de um determinado
contexto. Assim, ao criar outros contextos (p. ex., por meio de desfusão ou aceitação), o impacto
dos pensamentos pode ser alterado sem primeiro ter que mudar sua forma. Não há necessida-
de de mudar certos pensamentos. De fato, estudos sugerem que estratégias contextuais podem
levar mais rapidamente a mudanças duradouras de comportamento do que estratégias direcio-
nadas diretamente ao conteúdo de pensamentos e sentimentos (para uma metanálise recente de
estudos de componentes desse tipo, ver Levin, Hildebrandt, Lillis, & Hayes, 2012).
Do ponto de vista da ACT, quando os clientes lutam com suas próprias experiências
particulares como se suas vidas dependessem disso (como parece ser o caso quando os pen-
samentos são tomados literalmente) e criam histórias para justificar e explicar suas ações, o re-
sultado pode ser uma amplificação do sofrimento e rigidez da resposta, que podem ser difíceis
de superar. Uma das principais razões para esse efeito é que esses esforços criam contextos
difusos e rígidos de literalidade, fundamentação e controle emocional. São esses contextos que
as técnicas da ACT visam.
Desfusão é uma palavra inventada que significa “desfazer a fusão”, refere-se ao processo
de criação de contextos não literais, nos quais a linguagem pode ser vista como um processo
relacional ativo, contínuo, processo relacional de natureza histórica e presente na atualidade.
Em termos menos técnicos, isso significa observar pensamentos com uma atitude de curio-
sidade e imparcial, desapegada. Linguagem e pensamento sempre podem ser observados no
momento como linguagem e pensamento: podemos observar o que a mente diz, em vez de
ser um escravo dela. Uma palavra é vista como uma palavra, não como o que parece significar.
Criar esse contexto não literal reduz a relação com o pensamento, criando maior flexibilidade.
Não precisamos ser guiados por nossas palavras ou deixá-las ditar nosso comportamento.
A desfusão é talvez um dos recursos mais exclusivos da ACT. Dezenas de técnicas de des-
fusão foram desenvolvidas para uma ampla variedade de apresentações clínicas. Por exemplo,
um pensamento negativo pode ser observado com imparcialidade, repetido em voz alta até que
se torne apenas um som, desprovido de significado. Também pode ser tratado como um evento
observado externamente, dando-lhe uma forma, tamanho, cor, velocidade ou outros atributos.
O resultado da desfusão é geralmente uma diminuição na credibilidade ou apego ao pensamento,
em vez de uma mudança imediata em sua frequência. Além disso, a desfusão não é um processo
de eliminação do pensamento ou do impacto dos pensamentos. O objetivo é ter uma perspectiva
mais consciente dos pensamentos, o que aumenta a flexibilidade comportamental vinculada aos
valores escolhidos. Não estamos falando de desatenção, intuição ou eliminação da racionalidade.
42 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

Todas as técnicas de desfusão têm o objetivo de capturar os processos da linguagem em


fuga e colocá-los sob controle contextual, para que, quando necessário, possam ser vistos em vez
de ver. Quando utilizada no relacionamento terapêutico, a desfusão promove um espaço aberto
e sem julgamento na terapia, no qual todos os pensamentos estão abertos para serem exami-
nados. Significa criar um relacionamento que não julgue e em que as avaliações não atraem o
terapeuta – ou, se o fazem, o terapeuta reconhece isso e segue em frente.

Estar presente
A ACT promove contato contínuo e sem julgamento com eventos psicológicos e ambientais à
medida que ocorrem. O objetivo é a consciência do momento presente, na qual a atenção é direcio-
nada ao aqui e agora de uma maneira flexível, fluida e intencional. Quando em contato com o
momento presente, os seres humanos são flexíveis, receptivos e conscientes das possibilidades
e oportunidades de aprendizado oferecidas pela situação atual. Comparada a viver presa no
passado ou em um futuro conceitualizado, a percepção do momento presente é mais direta e
responsiva e menos conceitual e fusionada. Sem contato adequado com o momento presente,
o comportamento tende a ser mais dominado pela fusão, evitação e racionalização (no sentido
de dar razões/explicações) e, portanto, normalmente resulta em mais do mesmo comporta-
mento que ocorreu no passado. Novas possibilidades são encerradas.
Na ACT, estar presente está ligado ao desenvolvimento de um senso de eu chamado de
eu-como-processo (Hayes et al., 2012) – um hábito de autoconsciência aberta que se caracteriza
pela descrição contínua e sem julgamento de pensamentos, sentimentos e outros eventos priva-
dos, de forma desfusionada e sem julgamentos. Um senso de atenção plena também é incenti-
vado, para que as pessoas possam perceber mais completamente o rico conjunto de interações
oferecidas em um determinado momento.
Quando dimensionada socialmente, a consciência do momento presente contribui para
uma atmosfera na qual o processo contínuo no relacionamento terapêutico é percebido e usa-
do como base para o trabalho de flexibilidade. O terapeuta e o cliente são chamados a estar
presentes e a prestar atenção ao que for importante.

Eu-como-contexto e tomada de perspectiva flexível


Do ponto de vista da RFT, argumenta-se que o treinamento de linguagem inclui quadros re-
lacionais que requerem uma tomada de perspectiva (tecnicamente chamada de molduras re-
lacionais, das relações dêiticas na RFT) e que essas habilidades, por sua vez, estabelecem um
senso de eu como um local sem fronteiras. Nessa perspectiva, o eu é mais como um contexto
ou arena para a experiência do que como uma experiência em si. Por exemplo, considere as se-
guintes perguntas: “O que você comeu?”, “O que você quer?”, “Com quem você conversou?”,
“Quando você fez isso?”, “Por que você fez isso?”. A única coisa que elas têm em comum é a
resposta: o “eu” responderá a todas as perguntas.
Por meio de exercícios experimentais e metáforas, a ACT nos ajuda a entrar em con-
tato com esse senso de eu-como-contexto – um “eu” contínuo e seguro a partir do qual os
eventos são vivenciados, um eu que contém esses eventos, mas que também é distinto deles.
Esse processo nos ajuda a desvencilhar da máquina de palavras em seus ouvidos. O obje-
tivo é ajudar-nos a desenvolver um senso mais sólido de nós mesmos, como observadores
ou experienciadores, independentemente da experiência particular que está sendo vivida no
momento.
Aprendendo ACT 43

Além disso, como os limites da consciência e da atenção não podem ser contatados den-
tro delas próprias, a linguagem humana leva a um senso de transcendência, um aspecto espi-
ritual da experiência humana normal. A linguagem é uma faca de dois gumes – e facilitar esse
senso de transcendência é uma de suas características mais positivas. Estabelecer esse senso
transcendente do eu também pode ser útil para diminuir o apego ao conteúdo. Estabelecer
esse senso transcendente de si também pode ser útil para diminuir o apego ao conteúdo. Essa
ideia foi uma das sementes das quais tanto a ACT quanto o RFT cresceram (Hayes, 1984) e há
evidências de sua importância para as funções da linguagem subjacentes a fenômenos como
empatia, compaixão e teoria da mente (para um livro de revisão, ver McHugh & Stewart,
2012). Na ACT, um senso transcendente do eu é importante, em parte porque desse ponto
de vista as pessoas podem estar cientes de seu fluxo contínuo de experiências sem se apegar
a elas. A desfusão e a aceitação são assim promovidas por esse lado naturalista e espiritual da
experiência humana.
A outra razão pela qual o eu-como-contexto e a tomada de perspectiva são críticos para
a ACT é que eles são uma fonte primária da extensão social do modelo. As três principais
molduras de tomada de perspectiva na RFT são: eu versus você, aqui versus lá e agora versus de-
pois. Essas molduras são fundamentais para o modo como as pessoas desenvolvem um senso
consistente de perspectiva e uma consciência de que sua perspectiva é diferente da dos outros.
Todos as molduras relacionais são bidirecionais, portanto aprender a olhar o mundo do pon-
to de vista de eu-aqui-agora necessariamente dá às pessoas a capacidade de ver o mundo do
ponto de vista de você-lá-depois. Metaforicamente, você consegue entrar atrás dos seus olhos
como um membro consciente do grupo, ao mesmo tempo que percebe que os outros também
estão conscientes por trás dos olhos deles. Um senso de tomada de perspectiva nos liga às
perspectivas dos outros e às perspectivas de outros tempos e outros lugares. Essa expansão da
consciência é o motivo pelo qual o eu contextual é fundamental para experiências de espiritua-
lidade e transcendência (Hayes, 1984), empatia, compaixão e autocompaixão. Essas capacida-
des humanas são parcialmente não verbais (o efeito dos neurônios-espelho, por exemplo), mas
são grandemente amplificadas por relações verbais agora conhecidas por apoiar a tomada de
perspectiva (McHugh & Stewart, 2012).
 
Definir direções baseadas em valores
Os processos de flexibilidade descritos anteriormente têm como objetivo principal en-
fraquecer a linguagem temporal e avaliativa em áreas da vida em que essas formas de lin-
guagem são relativamente ineficazes. Os processos de esclarecimento de valores e ações
de compromisso (discutidos a seguir) concentram-se no fortalecimento da linguagem nas
áreas em que é mais provável que a linguagem seja efetivamente aplicada. A ACT pede
que nos afastemos dos problemas cotidianos da vida e vejamos o que dá sentido a ela,
procurando as melhores possibilidades que dignificam nossas lutas e podem gerar ações
construtivas.
Valores são qualidades de ações escolhidas que nunca serão obtidas como um ob-
jeto, mas podem ser representadas momento a momento. São combinações de verbos e
adjetivos e não de substantivos (p. ex., relacionar-se amorosamente ou participar hones-
tamente). A ACT usa uma variedade de exercícios para ajudar os clientes a escolher as
direções de vida valorizadas em vários domínios (p. ex., família, carreira, espiritualidade),
ao mesmo tempo em que enfraquece os processos verbais que podem levar a escolhas
44 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

baseadas em evitação experiencial, conformidade social e fusão cognitiva. Por exemplo,


no sentido da ACT, nenhum desses é considerado como valores: “Eu me sentiria culpado
se não valorizasse Q”, “Eu valorizo Z porque minha mãe quer”, “Eu devo valorizar X” e
“Uma boa pessoa valorizaria Y”. O primeiro é evitação, o segundo é submisso e os dois
últimos são fusionados. Valores são escolhas e respondem a pergunta: “Em um mundo
onde você poderia escolher sobre o que seria sua vida, o que você escolheria?” (Wilson &
Murrell, 2004, p. 135).
Os valores são a base da ACT, porque a verdade e a utilidade da ACT dependem deles.
A aceitação, a desfusão, o estar presente e os outros processos centrais não são fins em si
mesmos. Em vez disso, eles abrem caminho para uma vida mais vital e consistente com os
valores.
A ACT adota uma postura em relação à verdade, baseada em uma forma particular de fi-
losofia pragmática chamada contextualismo funcional. A verdade é definida com base na no quanto
é funcional que, por sua vez, está vinculada aos valores escolhidos. Na visão de mundo meca-
nicista mais típica, verdade é um tipo de correspondência. Usando a metáfora do mapa, se as
marcas no mapa indicam com precisão onde as coisas estão no “mundo real” em relação umas
às outras, o mapa é verdadeiro. A verdade pragmática procura a verdade apenas dentro de um
determinado contexto, com base na funcionalidade de tudo o que está sendo avaliado nesse
contexto. Portanto, embora um mapa do mundo funcione (seja verdadeiro) para descobrir
como navegar pelo mundo, será inútil (não verdadeiro) para encontrar um caminho na Cidade
de Nova York, pois precisaria de um mapa regional para isso. Seria um mapa menos verdadeiro
que o outro baseado no quanto ele é correspondente com realidade? Não. Mas certamente um
mapa funciona melhor no contexto de tentar encontrar o caminho por Nova York. É nesse
sentido que a verdade é definida na ACT. Ela troca a verdade que emerge de um contexto de
literalidade (isto é, correspondência) pela verdade definida pelo que é útil para capacitar-nos a
viver vidas ricas e significativas, guiadas por nossos valores.
Essa postura radical em relação à verdade permite que os terapeutas da ACT contornem
armadilhas terapêuticas comuns com clientes que são pegos em discussões sobre se suas his-
tórias particulares estão certas ou erradas, ou se suas visões do mundo são precisas ou impre-
cisas. Quando se trata de clientes, a verdade é naquele ponto sendo definida em termos de se
uma maneira particular de pensar ou se comportar é útil ou não na busca de uma vida baseada
em valores. Por exemplo, suponha que um cliente pense que é inerentemente não amável; a
vida desmoronou; e nunca será possível ter uma vida com relacionamentos carinhosos e uma
família, mesmo que isso seja considerado profundamente importante para ele. Um terapeuta
da ACT não se concentrará na natureza racional ou irracional desses pensamentos ou nas
evidências a favor e contra eles. Em vez disso, o foco estará em: esses pensamentos estão a
serviço de quê? E se a experiência mostra que eles são úteis para levar a uma vida que reflete
os valores escolhidos. A questão provavelmente será sobre se o cliente está disposto a ter esses
pensamentos quando eles ocorrerem e se mover na direção de seus valores escolhidos, em vez
de, literalmente, seguir na direção em que os pensamentos pretendem indicar como estado do
mundo, do cliente e dos próprios pensamentos, o que os pensamentos indicam sobre o estado
do mundo eles mesmos.
O trabalho com valores geralmente é socialmente orientado, devido à interação e coope-
ração social integral de nossa espécie. Mesmo valores estéticos (p. ex., trazer beleza ao mundo)
geralmente envolvem atos de dar e compartilhar (p. ex., ajudar outras pessoas a apreciar a be-
leza).
Aprendendo ACT 45

Ação comprometida
Por fim, a ACT incentiva o desenvolvimento de padrões cada vez maiores de ações eficazes,
vinculados aos valores escolhidos. As raízes latinas da palavra “compromisso” envolvem um
sentimento de levar algo adiante “com” um “envio” ou uma “missão”. Desta forma, ação com-
prometida significa simplesmente adotar uma vida baseada em valores como uma missão na
qual o estabelecimento de padrões cada vez maiores de ação, vinculados aos valores escolhidos,
é valorizado.
Dentro dessa missão, o “como” da construção de hábitos pode, então, ser um foco que
tem significado. Quando ocorre um deslize, as pessoas têm a opção de fazer uma nova escolha:
construirão um padrão de valorizar, deslizar e depois abandonar a missão, ou construirão um
padrão de valorizar, deslizar e se comprometer com a missão mais uma vez? Planejar esses mo-
mentos e organizar o ambiente de alguém para promover escolhas baseadas em valores nesses
momentos é o que parece ser a ação comprometida.
Nesse trabalho, os terapeutas da ACT podem tirar proveito de qualquer processo
baseado em evidências conhecido por promover a mudança de comportamento: exposi-
ção, aquisição de habilidades, métodos de modelagem, estabelecimento de metas ou qual-
quer outra coisa. Além disso, foi demonstrado que os processos de flexibilidade podem
amplificar o impacto desses métodos de mudança de comportamento (p. ex., Arch et al.,
2012).
Diferentemente dos valores – que são constantemente instanciados, mas nunca alcança-
dos como um objeto – objetivos concretos, consistentes com valores podem ser alcançados.
Os protocolos da ACT quase sempre envolvem trabalhos de casa vinculados a mudanças de
comportamento de curto, médio e longo prazo. Os esforços de mudança de comportamento,
por sua vez, levam ao contato com barreiras psicológicas, que são abordadas por outros pro-
cessos de flexibilidade (p. ex., aceitação, desfusão).
Quando socialmente ampliada, a ação comprometida envolve apoiar os compromissos
dos outros. Como resultado, a pesquisa da ACT naturalmente atraiu o trabalho em áreas re-
lacionadas à justiça social, em parte porque ver o sofrimento nos outros exige uma resposta.

Agrupamentos de processos dentro do modelo


Os seis processos principais da flexibilidade são sobrepostos e inter-relacionados. Toma-
dos como um todo, cada um apoia o outro e todos almejam a flexibilidade psicológica – o
processo de entrar em contato com o momento presente como um ser humano consciente
e persistir ou mudar o comportamento a serviço dos valores escolhidos. Os seis proces-
sos podem ser divididos em dois agrupamentos, como mostra a Figura 1.2. Os processos de
mindfulness e aceitação envolvem abertura, desfusão, contato com o momento presente e o
eu-como-contexto. Juntos, esses quatro processos fornecem uma definição comportamental
de atenção plena (Fletcher & Hayes, 2005). Os processos de comprometimento e mudança de com-
portamento envolvem contato com o momento presente, eu-como-contexto, valores e ação
comprometida. O contato com o momento presente e o eu-como-contexto ocorrem em
ambos os grupos, porque toda atividade psicológica de seres humanos conscientes envolve o
agora; é onde moramos e toda mudança deliberada envolve a conscientização da perspectiva
da pessoa.
46 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

Os pilares da inflexibilidade: fechado, desatento e descomprometido


Os seis processos principais também podem ser agrupados em três pilares ou estilos de res-
posta (Strosahl, Robinson, & Gustavsson, 2012; Hayes et al., 2012), cada um contendo dois
pontos de inflexibilidade (Figura 1.3). Os dois pontos de inflexibilidade no lado esquerdo do
hexágono, evitação e fusão podem ser combinados em um pilar de inflexibilidade – sendo
fechado – porque evitação e fusão são o estreitamento do repertório. Em qualquer contexto,
muitas opções comportamentais diferentes são geralmente possíveis tanto no sentido funcio-
nal (para que serve o comportamento) quanto no sentido topográfico (como é o comporta-
mento). Evolutivamente falando, precisamos de variação em nossas vidas, pois isto fornece as
sementes para melhoria e mudança comportamental. Além disso, a psicopatologia geralmente
envolve limites de variação, especialmente em termos de funcionalidade. Suponha que uma
pessoa use álcool para reduzir a ansiedade social. Quando o álcool não está disponível, a pessoa
pode encontrar alternativas topográficas, talvez fumando um baseado ou evitando conversas
significativas, com o objetivo funcional desses comportamentos permanecendo os mesmos.
No modelo da ACT, essa restrição na variabilidade é alimentada por evitação e fusão,
e o trabalho clínico direcionará esses processos para criar mais abertura e flexibilidade de
resposta. A teoria evolucionista pode ajudar a clarear essa dinâmica. Entre os seres huma-
nos, a cooperação foi selecionada porque o sucesso do grupo é promovido pela cooperação
e restrições aos interesses egoístas dos indivíduos. Da mesma forma, ambos os processos
deste pilar (evitação e fusão) podem ser pensados como instâncias de egoísmo no indivíduo,
nas quais as demandas de aspectos específicos do repertório da pessoa (p. ex., pensamentos
e sentimentos particulares) recebem mais tempo e atenção do que valem em relação ao bem
de toda a pessoa.
A remoção dessas restrições desnecessárias na variação e a criação de mais cooperação
entre os aspectos do repertório do indivíduo libertam o comportamento e permitem que ele
se modifique para se ajustar ao contexto. Fazer isso, no entanto, é difícil quando os próximos
dois pontos de inflexibilidade interferem no processo.
Os pontos de inflexibilidade na parte superior e inferior do hexágono, dominância do
passado e futuro conceitualizados e apego ao eu conceitualizado, combinam-se para formar
o segundo pilar ou estilo de resposta: desatento.* Esse pilar de inflexibilidade é extremamen-
te prejudicial à mudança de comportamento intencional. Quando as pessoas estão desen-
volvendo repertórios comportamentais intencionais, é importante que eles façam contato
consciente com o contexto para desenvolver comportamentos eficazes nesse contexto. As
pessoas que estão mudando precisam saber onde estão e em que se concentrar, a fim de ge-
rar variações com probabilidade de sucesso. Mudar intencionalmente é muito mais difícil e
também provavelmente não atingirá o objetivo, se as pessoas perderem detalhes importantes
de seu ambiente externo ou interno, se não conseguirem manter a atenção no que é impor-
tante ou não conseguirem desviá-lo do que não é importante, ou se eles não conseguirem se
desvencilhar de histórias rígidas sobre si e sobre os outros.

* N. de R. T.: No sentido de falta de atenção ou consciência do momento e do contexto.


Aprendendo ACT 47

FIGURA 1.3. Os pilares da inflexibilidade psicológica.


Finalmente, os dois pontos de inflexibilidade no lado direito do hexágono, falta de clareza
sobre os valores, inatividade, impulsividade ou evitação persistente, combinam-se para formar
o terceiro pilar da inflexibilidade: desconectado, que é a incapacidade de selecionar mudanças
positivas ou mantê-las por meio da prática. A variação não é um objetivo positivo em si: é uma
maneira de as pessoas encontrarem formas de se mover em direções valorizadas e se aproximar
dos fins desejados, selecionando e mantendo as variações que funcionam. Este é o núcleo de
uma abordagem evolucionista: mudança por retenção seletiva. Em uma abordagem da ACT, os
valores são os critérios de seleção para a ação, e a retenção é produzida pela criação e repetição
deliberada de padrões de ação efetiva, portanto esse pilar final de inflexibilidade inibe a mudan-
ça positiva de comportamento.

Os pilares da flexibilidade: aberto, consciente e engajado


Como os seis processos ou pontos de inflexibilidade, os três pilares da inflexibilidade são espe-
lhados por pilares da flexibilidade: processos que têm implicações positivas nos métodos clíni-
cos. Cada pilar de flexibilidade contém dois pontos de flexibilidade no hexágono (Figura 1.4).
48 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

FIGURA 1.4. Os pilares da flexibilidade psicológica.

Em relação ao primeiro pilar da flexibilidade, aberto, qualquer abordagem que promova a


aceitação e a desfusão pode ser considerada um método ACT, independentemente de sua escola
de origem. A abertura oferece maior acesso à história de uma pessoa sem permitir que ela a do-
mine excessivamente, além de uma oportunidade para que surja uma sensação de totalidade e paz
de espírito. Com esse pilar de flexibilidade, todas as reações são bem-vindas como são, não como
dizem que são e nenhuma reação recebe uma porção “egoísta” ou perturbadora do tempo ou
da atenção de uma pessoa. Este pilar diminui repertórios rígidos e aumenta a variação saudável.
Em relação ao segundo pilar, consciente, a ACT busca aumentar a atenção flexível, fluida
e intencional aos eventos internos e externos que estão presentes e são importantes, do ponto
de vista do aqui e agora da pura consciência ou tomada de perspectiva. Este não é apenas um
objetivo, mas um método fundamental que facilita os outros pilares e, portanto, é o pilar central
do método de intervenção da ACT. Na sessão, o terapeuta estimula, modela e apoia esse tipo
de consciência. O terapeuta está consciente da consciência do cliente e está presente com o
que estiver presente, de maneira flexível, fluida e intencionalmente direcionando a atenção para
o que for importante. Assim, a relação terapêutica na ACT é ela própria caracterizada por um
alto grau de conscientização, com o segundo pilar de flexibilidade garantindo que a variações
saudáveis sejam sensíveis ao contexto.
Finalmente, o terceiro pilar, engajado, consiste em valores e ações comprometidas. Na
sessão, os terapeutas da ACT modelam um compromisso baseado em valores para o bem do
cliente e o fazem de uma maneira que nunca viola seus próprios valores. A disposição de ser
ativo na terapia a serviço do cliente é comparada à disposição de também ficar calado, ouvir e
Aprendendo ACT 49

permitir. Em outras palavras, o compromisso – a missão – não é para uma forma específica de
ação; é para uma função ou qualidade de ação subjacente que fortalece a vida de outras pessoas.
Este pilar garante que passos saudáveis sejam selecionados e mantidos.

Promovendo a evolução psicológica saudável


Em resumo, os seis processos de evolução – variação e retenção seletiva no contexto, na di-
mensão e nível certos – são totalmente integrados aos seis processos de flexibilidade. Como já
observamos, os pilares e pontos de abertura promovem variações saudáveis. Os pilares e pontos
de engajamento promovem a retenção seletiva. E o pilar e os pontos de tomada de consciência
estimulam deliberadamente o desenvolvimento e a mudança de acordo com o contexto. A di-
mensionalidade e o nível são abordados pelo modelo de flexibilidade psicológica como um todo.
Considere a dimensionalidade primeiro. Dimensionalidade significa que as inter-relações entre
várias vertentes do desenvolvimento saudável são observadas e tratadas de maneira equilibrada, em
vez de enfatizar apenas uma dimensão ou domínio específico como sendo importante, ignorando
outras áreas-chave. A inflexibilidade psicológica promove uma abordagem subtrativa e julgado-
ra do próprio desenvolvimento, pois a evitação experiencial e a fusão cognitiva são controladas
de uma maneira que pode até violar os valores da pessoa. A flexibilidade psicológica, por outro
lado, promove uma mudança de viver a vida como um problema a ser resolvido para viver a vida
como um processo a ser experimentado, o que permite uma atenção mais equilibrada aos desafios
e oportunidades de desenvolvimento e mudança em todos os seus aspectos inter-relacionados. Não
seria muito bom desenvolver uma vida emocional saudável, por exemplo, sem também atender a
comportamentos de saúde (p. ex., dieta, exercício, sono) que facilitam uma vida vital. Esse mesmo
senso de equilíbrio e inter-relacionamento se aplica a todos os domínios, quer estejamos falando
do equilíbrio entre desenvolvimento intelectual e desenvolvimento social, ou do equilíbrio entre
trabalho e desenvolvimento espiritual. Isso explica por que a ACT é frequentemente incluída sob o
guarda-chuva da psicologia positiva (Kashdan & Ciarrochi, 2013) e por que a literatura sobre a ACT
é tão ampla: a flexibilidade psicológica capacita todas as áreas da vida e incentiva a preservação do
equilíbrio entre elas. A ACT não é apenas para aliviar a psicopatologia. É sobre viver bem.
Promover a evolução no nível certo de seleção significa reconhecer a natureza aninhada de
sistemas complexos e entender que a cooperação em qualquer nível da organização pode acarretar
egoísmo disruptivo como um nível superior da organização. A seleção multinível nos lembra que
“são grupos por todo o lado” e que esse equilíbrio de desenvolvimento em vários níveis está, por-
tanto, envolvido em qualquer ato de evolução intencional. Como a flexibilidade psicológica se aplica
ao indivíduo, o objetivo do crescimento psicológico envolve acomodar todo o repertório de toda
a pessoa sem alimentar perturbações egoístas por componentes do repertório do indivíduo e sem
ignorar as necessidades críticas de partes do indivíduo. Incentivar o desenvolvimento dessa maneira
holística pode ser pensado como fomentador do crescimento pessoal, com vistas à paz de espírito
e à integração da personalidade. Quando esse processo é socialmente escalado em relacionamentos
e grupos, ele se manifesta como capaz de se concentrar no sucesso em níveis mais altos da organi-
zação, além de promover o sucesso, mas não uma interrupção egoísta no nível do indivíduo. Isso
capacita os indivíduos a participar de pares e grupos de maneiras positivas, cooperativas, compas-
sivas e amorosas. Como exemplo, é natural que o senso de eu que leva a perspectiva, que promove
a tomada de consciência, também nos lembre das necessidades dos outros em outros momentos
e em outros lugares. O eu-aqui-agora da pura consciência é baseado em relações dêiticas (eu/você,
aqui/lá, agora/depois) que intrinsecamente expandem a consciência entre seres, lugares e tempos.
50 Os seis processos centrais da ACT e seus respectivos aspectos

Portanto, é natural vincular o modelo da ACT a questões como preconceito, necessidades das co-
munidades subdesenvolvidas em todo o mundo, preocupações ambientais e direitos dos animais.
Em resumo, a flexibilidade psicológica é um conceito expansivo, que agrupa conceitos pa-
ralelos na parentalidade, nos relacionamentos e nas organizações. E, de fato, medidas de flexibili-
dade estão surgindo em todas essas áreas. Além disso, essa qualidade expansiva agora está sendo
expressa em esforços organizados para desenvolver novas aplicações da ciência comportamental
contextual que combinam métodos da ACT com princípios de desenvolvimento de grupo, como
os princípios dos projetos ganhadores do Prêmio Nobel de Elinor Ostrom, no método PRO-
SOCIAL de promover a eficácia do grupo (http: //www.prosocial.world [conteúdo em inglês]).

Uma definição de ACT


Nós definimos os seis processos básicos de flexibilidade e examinamos seu agrupamento em três
pilares de flexibilidade ou nos dois grupos abrangentes de processos de mindfulness e aceitação e
processos de comprometimento e mudança de comportamento. Também examinamos como eles
estão ligados aos princípios evolutivos que governam o desenvolvimento em todas as áreas das ciên-
cias da vida. Tendo feito isso, agora podemos definir a ACT de maneira bastante simples: A ACT
é uma intervenção psicológica baseada em princípios comportamentais e evolutivos modernos,
incluindo RFT, que aplica processos de mindfulness e aceitação e processos de comprometimento
e mudança de comportamento, para a criação de flexibilidade psicológica. A ACT é, portanto, um
modelo, não uma tecnologia específica. Ela oferece um modelo de processos de psicopatologia
que abrange todas as categorias tradicionais de diagnóstico e, portanto, é profundamente transdiag-
nóstico. Também oferece um modelo de processos de saúde e intervenção que está naturalmente
ligado ao crescimento e fortalecimento positivos. É uma abordagem da intervenção psicológica e do
funcionamento humano de maneira mais geral, definida em termos de processos específicos de
flexibilidade e fundamentada em princípios básicos comportamentais, cognitivos e evolutivos.

Para mais informações

Para uma visão geral da pesquisa sobre a ACT, consulte Hooper & Larsson (2015).
Para uma visão geral introdutória da RFT, a teoria da linguagem e cognição subja-
cente à ACT, consulte o excelente tutorial on-line de quatro horas disponível gratui-
tamente (em inglês) em http://www.foxylearning.com.
Para uma introdução do livro RFT, leia Törneke (2010).
Para um artigo sobre a relevância dos princípios evolucionistas para a flexibilidade
psicológica e a ciência comportamental aplicada, consulte Hayes, Monestès, & Wil-
son (no prelo).
Para uma descrição do livro da ciência do comportamento contextual, consulte
Zettle, Hayes, Barnes-Holmes, & Biglan (2016).
O modelo hexagonal é uma boa maneira, tanto científica quanto prática, de resumir
os processos que compõem a flexibilidade psicológica, e é por isso que estamos
usando-o na organização deste livro. No entanto, os processos de RFT podem ser
usados diretamente
​​ para organizar o trabalho clínico (ver M. Villatte, Villatte, &
Hayes, 2015), e outras ferramentas clinicamente úteis são amplamente utilizadas da
ACT, como a matrix (Polk & Schoendorff, 2014).

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