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Sumário

DIREITO CIVIL .....................................................................................................................................................6

1.Teoria Geral Dos Contratos (Artigos 421 Ao 480 Do Cc)...................................................6

Leitura Dos Artigos 421 A 480 Do Código Civil ..........................................................................6

Princípios Que Regem A Relação Contratual ............................................................................. 13

Dos Vícios Redibitórios ........................................................................................................................ 20

Da Evicção .................................................................................................................................................. 22

Da Responsabilidade Civil Pré-Contratual ................................................................................... 24

Os Contratos Preliminares .................................................................................................................. 25

Formação Dos Contratos..................................................................................................................... 27

Fase De Negociações Preliminares Ou De Puntuação ........................................................... 28

Fase De Proposta, Policitação Ou Oblação ................................................................................. 28

2.Direito Das Sucessões – Arts. 1.784 Ao 2.027 Do Cc ........................................................ 30

Leitura Dos Arts. 1.784 Ao 2.027 Do Cc ....................................................................................... 30

Conceitos Básicos E O Entendimento Jurisprudencial .. Erro! Indicador não definido.

Princípios Do Direito Sucesório ........................................................................................................ 33

Linha Sucessória – Sucessão Legítima ........................................................................................... 36

Da Primeira Classe De Sucessores .................................................................................................. 38

Da Sucessão Pelos Ascendentes ...................................................................................................... 40

Da Sucessão Do Cônjuge Ou Companheiro............................................................................... 41

Da Sucessão Dos Colaterais ............................................................................................................... 41

Da Sucessão Pelo Entre Público ....................................................................................................... 42

Sucessão Testamentária ....................................................................................................................... 45

Do Testamento ........................................................................................................................................ 45

Modalidades Do Testamento Ordinário ....................................................................................... 46


Do Testamento Público........................................................................................................................ 46

Do Testamento Cerrado ...................................................................................................................... 48

Do Testamento Particular.................................................................................................................... 49

Das Modalidades Especiais Ou Extraordinárias De Testamento ........................................ 50

Dos Testamentos Marítimo E Aeronáutico.................................................................................. 51

Do Testamento Militar.......................................................................................................................... 52

Do Codicilo ................................................................................................................................................ 53

Da Deserdação ......................................................................................................................................... 53

Da Indignidade ........................................................................................................................................ 55

Da Legitimidade Para Demandar A Exclusão Do Herdeiro Ou Legatário...................... 55

Dos Efeitos Da Exclusão Do Indigno.............................................................................................. 56

Da Reabilitação Do Indigno ............................................................................................................... 56

3.Direito Das Coisas (Arts. 196 Ao 1.276 Do Cc) ..................................................................... 57

Diferença Entre Direitos Reais E Direito Das Coisas................................................................ 57

Da Propriedade ........................................................................................................................................ 58

Principais Características Do Direito De Propriedade ............................................................. 60

Formas De Aquisição Da Propriedade Imóvel ........................................................................... 62

Posse ............................................................................................................................................................ 67

Regras Do Condomínio........................................................................................................................ 69

A Desapropriação Judicial Privada Por Posse-Trabalho (Art. 1.228, §§ 4.º E 5.º, Do


Cc/2002) ...................................................................................................................................................... 74

4.Direito Das Obrigações (Arts. 233 Ao 420 Do Cc) .............................................................. 76

Elementos Constitutivos Da Obrigação ........................................................................................ 76

Espécies De Obrigação Quanto Ao Seu Conteúdo ................................................................. 78

Diferenças Entre Solidariedade E Indivisibilidade ..................................................................... 80


Cessão De Crédito E Débito .............................................................................................................. 81

As Regras Do Pagamento Direto ..................................................................................................... 82

Consequências Do Inadimplemento Relativo E Absoluto..................................................... 88

A Cláusula Penal...................................................................................................................................... 90

Os Juros Legais ........................................................................................................................................ 92

5.Direito De Família ................................................................................................................................. 93

Casamento ................................................................................................................................................. 93

Capacidade Para O Casamento ........................................................................................................ 93

Relativamente Incapazes ..................................................................................................................... 94

Impedimentos .......................................................................................................................................... 94

Causas Suspensivas ................................................................................................................................ 95

Incompetência Da Autoridade .......................................................................................................... 97

Casamento Civil ....................................................................................................................................... 97

Casamento Por Moléstia Grave ........................................................................................................ 98

Casamento Por Procuração ................................................................................................................ 99

Possibilidade De Alteração Do Regime De Bens ....................................................................100

Espécies De Regime De Bens ..........................................................................................................101

Comunhão Parcial De Bens ..............................................................................................................101

Comunhão Universal De Bens.........................................................................................................102

Separação Obrigatória ........................................................................................................................103

Separação Convencional....................................................................................................................104

Participação Final Nos Aquestos ....................................................................................................104

Dissolução Da Sociedade Conjugal ..............................................................................................105

Divórcio Administrativo Ou Extrajudicial ....................................................................................105

União Estável ..........................................................................................................................................105


Do Casamento Entre Pessoas Do Mesmo Sexo ......................................................................106

Adoção Entre Pessoas Do Mesmo Sexo .....................................................................................107

Dos Alimentos (Lei 5.478/68) ..........................................................................................................108

Do Procedimento De Averiguação Oficiosa (Lei 8.560/92) ................................................112

Da Adoção Após A Morte ................................................................................................................114

Da Responsabilidade Civil Em Caso De Abandono Afetivo ...............................................116

Da Paternidade Socioafetiva ............................................................................................................122

Da Alienação Parental.........................................................................................................................123

Da Tomada De Decisão Apoiada...................................................................................................127

Da Guarda, Tutela E Curatela ..........................................................................................................130

6.Responsabilidade Civil (Arts. 185 Ao 188 E 927 Ao 954 Do Cc) ...............................133

Pressupostos Do Dever De Indenizar ..........................................................................................133

Responsabilidade Civil Subjetiva ....................................................................................................135

Responsabilidade Civil Objetiva .....................................................................................................136

Excludentes De Responsabilidade .................................................................................................138

Dano Moral .............................................................................................................................................141

Teoria Da Perda De Uma Chance ..................................................................................................141


DIREITO CIVIL

1.Teoria Geral dos Contratos (artigos 421 ao 480 do CC)

LEITURA DOS ARTIGOS 421 A 480 DO CÓDIGO CIVIL

Veremos abaixo os principais artigos comentados para você dar início ao estudo da teoria
geral dos contratos.

Art. 421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do
contrato. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019)

Flávio Tartuce afirma que a função social do contrato é uma norma geral de ordem
pública, através da qual o contrato necessariamente deve ser interpretado de acordo com o
contexto do todo social, não devendo trazer desproporções entre as partes e muito menos
desembocar em injustiças sociais. Os contratos também não podem extrapolar os interesses
metainidividuais ou aqueles que se relacionam com a dignidade humana.1

Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da


intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual. (Incluído pela
Lei nº 13.874, de 2019)

A Lei da Liberdade Econômica alterou o art. 421 do Código Civil. Destacamos o parágrafo
único, que acrescenta que devem prevalecer a intervenção mínima e que a revisão do contrato
por parte do poder público deve ser feita em caráter excepcional. O que demonstra que as

1
TARTUCE, Flávio. MANUAL DE DIREITO CIVIL. 9° Edição. Método, 2019.
relações contratuais devem ser construídas e resolvidas entre as partes, buscando garantir a
autonomia para contratar de maneira mais ampla.

Art. 421-A. Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos


até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa
presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, garantido
também que: (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

I - as partes negociantes poderão estabelecer parâmetros objetivos para a


interpretação das cláusulas negociais e de seus pressupostos de revisão ou de
resolução; (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

II - a alocação de riscos definida pelas partes deve ser respeitada e observada; e


(Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

III - a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada.


(Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

Mais um artigo acrescentado pela Lei da Liberdade Econômica, o qual possibilita a criação
de regras de interpretação das disposições contratuais.

 Ao estabelecer parâmetros objetivos para interpretação de cláusulas negociais e


pressupostos de revisão, ou resolução, há a óbvia possibilidade de serem
reduzidos os problemas das cláusulas que possam ser ambíguas. Além disso, há
um claro instrumento para que as disposições negociadas, bem como seus
desdobramentos, fiquem protegidas e evidentes na sua forma de aplicação.

 Ao estabelecer e desenvolver um negócio, as partes possuem ciência dos riscos


presentes. Com a inclusão deste inciso, os riscos assumidos serão respeitados, o
que pode prevenir alguma intervenção que provoque alguma mudança brusca
ou inviabilize a atividade.
Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato,
como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Os princípios da probidade e da boa-fé estão ligados não só à interpretação dos contratos,


mas também ao interesse social de segurança das relações jurídicas, uma vez que as partes
têm o dever de agir com honradez e lealdade na conclusão do contrato e na sua execução.

Jurisprudência Selecionada

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO


ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA.
DECLARATÓRIOS PROCRASTINATÓRIOS. MULTA. CABIMENTO.
CONTRATO. FASE DE TRATATIVAS. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA
BOA-FÉ. DANOS MATERIAIS. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. Não há falar em
negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva
adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a
aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no
sentido pretendido pela parte. 2. "No caso, não se pode afastar a
aplicação da multa do art. 538 do CPC, pois, considerando-se que a
pretensão de rediscussão da lide pela via dos embargos
declaratórios, sem a demonstração de quaisquer dos vícios de sua
norma de regência, é sabidamente inadequada, o que os torna
protelatórios, a merecerem a multa prevista no artigo 538, parágrafo
único, do CPC' (EDcl no AgRg no Ag 1.115.325/RS, Rel. Min. Maria
Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 4/11/2011). 3. A responsabilidade
pré-contratual não decorre do fato de a tratativa ter sido rompida
e o contrato não ter sido concluído, mas do fato de uma das
partes ter gerado à outra, além da expectativa legítima de que o
contrato seria concluído, efetivo prejuízo material. 4. As instâncias
de origem, soberanas na análise das circunstâncias fáticas da causa,
reconheceram que houve o consentimento prévio mútuo, a afronta
à boa-fé objetiva com o rompimento ilegítimo das tratativas, o
prejuízo e a relação de causalidade entre a ruptura das tratativas e o
dano sofrido. A desconstituição do acórdão, como pretendido pela
recorrente, ensejaria incursão no acervo fático da causa, o que, como
consabido, é vedado nesta instância especial (Súmula nº 7/STJ). 5.
Recurso especial não provido.

Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas que gerem dúvida
quanto à sua interpretação, será adotada a mais favorável ao aderente. (Redação
dada pela Medida Provisória nº 881, de 2019) (Vide Lei nº 13. 874, de 2019)

De acordo com o Código de Defesa do Consumidor (vide Art. 54) “Contrato de adesão é
aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas
unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa
discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.”
Porém, esta regra não exclui a possibilidade de a intenção das partes ser aclarada por
outros elementos, pois, nos termos do art. 112 do Código Civil, o fundamental é a intenção
consubstanciada nas declarações de vontade. Desse modo, por exemplo, a própria prática que
os contratantes estabelecerem para cumprimento do contrato revela o intento delas ao contratar.
A interpretação mais favorável ao aderente, é, portanto, uma regra subsidiária.

Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia
antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio.

O dispositivo determina a nulidade de cláusula relativa à natureza do negócio e, portanto,


pressupõe a validade do negócio. Isto é, embora determine a nulidade de cláusula essencial
para o contrato, o dispositivo permite que o contrato produza efeitos típicos validamente.

Art. 425. É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais
fixadas neste Código.
O dispositivo é dispensável, visto que ao código Civil cumpre regular apenas os negócios
jurídicos mais frequentes, complexos e de maior relevância prática, sem prejuízo de toda
variedade de negócios que possam ser criados.

Art. 426. Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.

Regra geral do direito das sucessões a respeito do patrimônio de terceiros, atente-se!

Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar


dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.

Para obrigar, a vontade deve ser certa. Exemplos de declarações não sérias são as feitas
por brincadeiras, por reserva mental conhecida do destinatário, com caráter puramente
potestativo, por mera cortesia e as incompletas.

Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta:

I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita.
Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio
de comunicação semelhante;

II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para
chegar a resposta ao conhecimento do proponente;

III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do
prazo dado;

IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte


a retratação do proponente.

Atente-se às hipóteses que a proposta perde a força obrigatória para o proponente!

Art. 429. A oferta ao público equivale a proposta quando encerra os requisitos


essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das circunstâncias ou dos usos.
Parágrafo único. Pode revogar-se a oferta pela mesma via de sua divulgação,
desde que ressalvada esta faculdade na oferta realizada.

De acordo com os artigos 30 e 35 do Código de Defesa do Consumidor, a oferta ao


público ou a pessoa determinada é a feita por meio de anúncios, circulares, catálogos,
aparelhos automáticos, exposição em vitrines, entre outros. Ela obriga o proponente se for
suficientemente precisa.

Art. 430. Se a aceitação, por circunstância imprevista, chegar tarde ao


conhecimento do proponente, este comunicá-lo-á imediatamente ao aceitante,
sob pena de responder por perdas e danos.

Chegar tarde, no caso acima, significa não apenas fora do prazo eventualmente fixado para
a resposta, nem apenas a que ultrapassa o prazo suficiente para chegar ao conhecimento do
proponente, mas a que, sendo extemporânea, deixa de ser acatada pelo proponente. Isto é, o
proponente deve comunicar imediatamente ao aceitante a recusa de se vincular ao contrato por
causa da extemporaneidade da chegada da resposta.

Art. 431. A aceitação fora do prazo, com adições, restrições, ou modificações,


importará nova proposta.

Para que haja o encontro de vontades, a proposta deve ser aceita tal como formulada.
Qualquer alteração introduzida pelo aceitante extingue a força vinculante da proposta inicial e
passa a representar nova proposta que tem de ser aceita integralmente pelo proponente original.

Art. 432. Se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação
expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o contrato,
não chegando a tempo a recusa.

Os contratos devem ser interpretados segundo os usos e costumes.

Por exemplo: Se é hábito de um comerciante adquirir produtos de um distribuidor para


revenda, de forma continuada, não poderá alegar ausência de aceitação se, após,
longo prazo deixar de recusar os produtos que recebeu com base na prática
comercial costumeira.
Art. 433. Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou com ela chegar ao
proponente a retratação do aceitante.

Este dispositivo é uma exceção à regra, pois, uma vez que o aceitante se arrependa e
comunique seu arrependimento ao proponente, fazendo chegar a este a retratação
simultaneamente ou anteriormente à própria aceitação, o contrato não estará formado.

Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação
é expedida, exceto:

I - no caso do artigo antecedente;

II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta;

III - se ela não chegar no prazo convencionado.

O dispositivo cuida de três exceções ao critério da expedição da aceitação.

 No caso do inciso I, fala-se é o de retratação do aceitante que a faz chegar ao


proponente antes ou no mesmo tempo em que este toma conhecimento da
aceitação;
 O contrato não será considerado formado com o envio da aceitação se o proponente
tiver condicionado a proposta ao recebimento da aceitação em determinado prazo
e isso não acontecer.
 Se o proponente houver se comprometido a esperar a resposta estará preso a essa
condição desde o momento em que envia a proposta, porém, o contrato somente
ter-se-á formado quando da expedição da aceitação, como na regra geral.

Art. 435. Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto.

Regra geral, a celebração do contrato é realizada no local da proposta.


PRINCÍPIOS QUE REGEM A RELAÇÃO CONTRATUAL

Alguns já foram citados na teoria geral dos contratos, mas é importante que você conheça
cada um deles.

I. PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PRIVADA


O princípio da liberdade das partes, ou autonomia da vontade, consiste na máxima da
liberdade contratual entre os contratantes, ou seja, o poder que os contratantes têm de estipular
livremente, mediante o acordo de vontades, a regulamentação de seus interesses.

Para Flávio Tartuce,2

Entre os autores nacionais, quem observa muito bem o significado do princípio


da autonomia privada é Francisco Amaral, sendo interessante transcrever as suas
palavras:

“A autonomia privada é o poder que os particulares têm de regular, pelo


exercício de sua própria vontade, as relações que participam, estabelecendo -
lhe o conteúdo e a respectiva disciplina jurídica. Sinônimo de autonomia da
vontade para grande parte da doutrina contemporânea, com ela, porém não se
confunde, existindo entre ambas sensíveis diferenças. A expressão ‘autonomia
da vontade’ tem uma conotação subjetiva, psicológica, enquanto a autonomia
privada marca o poder da vontade no direito de um modo objetivo, concreto
e real”.

Não se pode esquecer que o principal campo de atuação do princípio da autonomia


privada é o patrimonial, onde se situam os contratos como ponto central do Direito Privado.
Esse princípio traz limitações claras, principalmente relacionadas com a formação e
reconhecimento da validade dos negócios jurídicos. A eficácia social pode ser apontada como
uma dessas limitações, havendo clara relação entre o preceito aqui estudado e o princípio da
função social dos contratos.

2
TARTUCE, Flávio. MANUAL DE DIREITO CIVIL. 9° Edição. Método, 2019.
Ainda segundo Tartuce, é interessante deixar claro que a função social não elimina
totalmente a autonomia privada ou a liberdade contratual, mas apenas atenua ou reduz o
alcance desse princípio. Esse é o teor citado do Enunciado n. 23 do CJF/STJ, aprovado na I
Jornada de Direito Civil , um dos mais importantes enunciados entre todos os aprovados nas
Jornadas de Direito Civil, que merece mais uma vez transcrição: 3

“A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, não
elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance
desse princípio, quando presentes interesses metaindividuais ou interesse
individual relativo à dignidade da pessoa humana”.

II. PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS

A palavra função social deve ser visualizada com o sentido de finalidade coletiva, sendo
efeito do princípio em questão a mitigação ou relativização da força obrigatória das convenções
(pacta sunt servanda). Nesse contexto, o contrato não pode ser mais visto como uma bolha,
que isola as partes do meio social. Simbolicamente, a função social funciona como uma agulha,
que fura a bolha, trazendo uma interpretação social dos pactos. Não se deve mais interpretar
os contratos somente de acordo com aquilo que foi assinado pelas partes, mas sim levando-se
em conta a realidade social que os circunda. Na realidade, à luz da personalização e
constitucionalização do Direito Civil, pode-se afirmar que a real função do contrato não é a
segurança jurídica, mas sim atender aos interesses da pessoa humana. 4

III. PRINCÍPIO DA FORÇA OBRIGATÓRIA DO CONTRATO (PACTA SUNT


SERVANDIA)
A força obrigatória constitui exceção à regra geral da socialidade, secundária à função
social do contrato, princípio que impera dentro da nova realidade do direito privado
contemporâneo. Certo é, portanto, que o princípio da força obrigatória não tem mais encontrado
a predominância e a prevalência que exercia no passado.

3
TARTUCE, Flávio. MANUAL DE DIREITO CIVIL. 9° Edição. Método, 2019.
4
TARTUCE, Flávio. MANUAL DE DIREITO CIVIL. 9° Edição. Método, 2019.
De acordo com Tartuce, o princípio em questão está, portanto, mitigado ou relativizado,
sobretudo pelos princípios sociais da função social do contrato e da boa-fé objetiva. A par de
tudo isso, no momento, não há ainda como concordar com o posicionamento no sentido de que
o princípio da força obrigatória do contrato foi definitivamente extinto pela codificação
emergente. Isso porque, tal conclusão afasta o mínimo de segurança e certeza que se espera do
ordenamento jurídico, principalmente a segurança no direito, ícone também importante, como a
própria justiça, objetivo maior buscado pelo Direito e pela ciência que o estuda.

IV. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA


Tornou-se comum afirmar que a boa-fé objetiva, conceituada como sendo exigência de
conduta leal dos contratantes, está relacionada com os deveres anexos ou laterais de conduta,
que são ínsitos a qualquer negócio jurídico, não havendo sequer a necessidade de previsão no
instrumento negocial. São considerados deveres anexos, entre outros:

 Dever de cuidado em relação à outra parte negocial;


 Dever de respeito;
 Dever de informar a outra parte sobre o conteúdo do negócio;
 Dever de agir conforme a confiança depositada;
 Dever de lealdade e probidade;
 Dever de colaboração ou cooperação;
 Dever de agir com honestidade;
 Dever de agir conforme a razoabilidade, a equidade e a boa razão.

Segundo os ensinamentos de Tartuce, além da relação com esses deveres anexos,


decorrentes de construção doutrinária, o Código Civil de 2002, em três dos seus dispositivos,
apresenta três funções importantes da boa-fé objetiva.
1º Função de interpretação (art. 113 do CC) – eis que os negócios jurídicos devem ser
interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar da sua celebração. Nesse dispositivo, a boa-
fé é consagrada como meio auxiliador do aplicador do direito para a interpretação dos negócios,
da maneira mais favorável a quem esteja de boa-fé. Essa função de interpretação, repise-se,
também parece estar presente no Novo CPC, no seu art. 489, § 3.º, devendo o julgador ser guiado
pela boa-fé das partes ao proferir sua decisão.
2º Função de controle (art. 187 do CC) – uma vez que aquele que contraria a boa-fé
objetiva comete abuso de direito (“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao
exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes”). Vale mais uma vez lembrar que, segundo o Enunciado n. 37 do
CJF/STJ, aprovado na I Jornada de Direito Civil, a responsabilidade civil que decorre do abuso de
direito é objetiva, isto é, não depende de culpa, uma vez que o art. 187 do CC adotou o critério
objetivo-finalístico. Dessa forma, a quebra ou desrespeito à boa-fé objetiva conduz ao caminho
sem volta da responsabilidade independentemente de culpa, seja pelo Enunciado n. 24 ou pelo
Enunciado n. 37, ambos da I Jornada de Direito Civil. Não se olvide que o abuso de direito
também pode estar configurado em sede de autonomia privada, pela presença de cláusulas
abusivas; ou mesmo no âmbito processual. 3.º) Função de integração (art. 422 do CC) – segundo
o qual: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua
execução, os princípios de probidade e boa-fé”. Relativamente à aplicação da boa-fé em todas as
fases negociais, foram aprovados dois enunciados doutrinários pelo Conselho da Justiça Federal
e pelo Superior Tribunal de Justiça. De acordo com o Enunciado n. 25 do CJF/STJ, da I Jornada
de Direito Civil, “o art. 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação, pelo julgador, do princípio
da boa-fé nas fases pré e pós-contratual”. Nos termos do Enunciado n. 170 da III Jornada, “A
boa-fé objetiva deve ser observada pelas partes na fase de negociações preliminares e após a
execução do contrato, quando tal exigência decorrer da natureza do contrato”. Apesar de serem
parecidos, os enunciados têm conteúdos diversos, pois o primeiro é dirigido ao juiz, ao aplicador
da norma no caso concreto, e o segundo é dirigido às partes do negócio jurídico.

V. PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE DOS EFEITOS CONTRATUAIS


O contrato gera efeitos inter partes, em regra, máxima que representa muito bem o
princípio em questão. Contrapõe-se tal regramento, inerente ao direito obrigacional, à eficácia
erga omnes dos direitos reais, regidos pelo princípio da publicidade. De qualquer forma, o
princípio da relatividade dos efeitos contratuais, consubstanciado na antiga máxima res inter alios,
encontra exceções, na própria codificação privada. Em outras palavras, é possível afirmar que o
contrato também gera efeitos perante terceiros. Quatro exemplos de exceções podem ser
destacados:5

1ª Exceção – A estipulação em favor de terceiro, tratada entre os arts. 436 a 438


do CC – hipótese em que um terceiro, que não é parte do contrato, é beneficiado
por seus efeitos, podendo exigir o seu adimplemento. Exemplo típico é o que
ocorre no contrato de seguro de vida, em que consta terceiro como beneficiário.
Esse contrato é celebrado entre segurado e seguradora, mas os efeitos atingem
um terceiro que consta do instrumento, mas que não o assina. Em suma, na
estipulação em favor de terceiro, os efeitos são de dentro para fora do contrato,
ou seja, exógenos, tornando-se uma clara exceção à relativização contratual.

2ª Exceção – A promessa de fato de terceiro (arts. 439 e 440 do CC) – figura


negocial pela qual determinada pessoa promete que uma determinada conduta
seja praticada por outrem, sob pena de responsabilização civil. O art. 440 do
CC/2002, entretanto, enuncia que se o terceiro pelo qual o contratante se obrigou
comprometer-se pessoalmente, estará o outro exonerado de responsabilidade. No
caso, a promessa pessoal substitui a promessa feita por um terceiro, havendo uma
cessão da posição contratual, pois o próprio terceiro é quem terá a
responsabilidade contratual. O exemplo é o de um promotor de eventos que
promete um espetáculo de um cantor famoso. Caso o cantor não compareça ao
show, no melhor estilo Tim Maia, responderá aquele que fez a promessa perante
o outro contratante. Todavia, se o próprio cantor assumiu pessoalmente o
compromisso, não haverá mais a referida promessa de terceiro. Os efeitos são de
fora para dentro do contrato, ou endógenos, porque a conduta de um estranho
ao contrato repercute para dentro deste. Exceção – O contrato com pessoa a
declarar ou com cláusula pro amico eligendo (arts. 467 a 471 do CC) – no
momento da conclusão do contrato, pode uma das partes reservar-se à faculdade

5
TARTUCE, Flávio. MANUAL DE DIREITO CIVIL. 9° Edição. Método, 2019.
de indicar a pessoa que deve adquirir os direitos e assumir as obrigações dele
decorrentes (art. 467 do CC). Tal figura é muito comum no contrato preliminar.

3ª Exceção – A tutela externa do crédito ou eficácia externa da função social do


contrato (art. 421 do CC) – repisando, veja-se o teor do Enunciado n. 21 do
Conselho da Justiça Federal, aprovado na I Jornada de Direito Civil: “A função
social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula
geral, a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em
relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito”. Ainda para ilustrar,
além do art. 608 do CC, poderia ser citado entendimento anterior da
jurisprudência superior pelo qual a vítima de evento danoso poderia propor ação
direta contra a seguradora, mesmo não havendo relação contratual direta entre
as partes (STJ, REsp 228840, 3.ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito,
m.v., DJU 04.09.2000, p. 402; e STJ, REsp 397229/MG, 4.ª Turma, Rel. Min. Ruy
Rosado de Aguiar, ac. un., DJU 12.08.2002). Com maior relevo, a seguinte decisão:
“A visão preconizada nestes precedentes abraça o princípio constitucional da
solidariedade (art. 3.º, I, da CF/1988), em que se assenta o princípio da função
social do contrato, este que ganha enorme força com a vigência do novo Código
Civil (art. 421). De fato, a interpretação do contrato de seguro dentro desta
perspectiva social autoriza e recomenda que a indenização prevista para reparar
os danos causados pelo segurado a terceiro seja por este diretamente reclamada
da seguradora. Assim, sem se afrontar a liberdade contratual das partes – as quais
quiseram estipular uma cobertura para a hipótese de danos a terceiros –,
maximiza-se a eficácia social do contrato com a simplificação dos meios jurídicos
pelos quais o prejudicado pode haver a reparação que lhe é devida. Cumpre-se
o princípio da solidariedade e garante-se a função social do contrato” (REsp
444.716/BA, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 11.05.2004). Todavia, cumpre anotar que
a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acabou por rever esse seu
entendimento anterior, passando a concluir que a vítima não pode ingressar com
ação apenas e diretamente contra a seguradora do culpado, mas somente contra
ambos. Vejamos os principais trechos de um dos acórdãos publicado no seu
Informativo n. 490: “Recurso repetitivo. Seguro de responsabilidade civil.
Ajuizamento direto exclusivamente contra a seguradora. A Seção firmou o
entendimento de que descabe ação do terceiro prejudicado ajuizada, direta e
exclusivamente, em face da seguradora do apontado causador do dano, porque,
no seguro de responsabilidade civil facultativo, a obrigação da seguradora de
ressarcir os danos sofridos por terceiros pressupõe a responsabilidade civil do
segurado, a qual, de regra, não poderá ser reconhecida em demanda na qual este
não interveio, sob pena de vulneração do devido processo legal e da ampla
defesa. Esse posicionamento fundamenta-se no fato de o seguro de
responsabilidade civil facultativa ter por finalidade neutralizar a obrigação do
segurado em indenizar danos causados a terceiros nos limites dos valores
contratados, após a obrigatória verificação da responsabilidade civil do segurado
no sinistro. Em outras palavras, a obrigação da seguradora está sujeita à condição
suspensiva que não se implementa pelo simples fato de ter ocorrido o sinistro,
mas somente pela verificação da eventual obrigação civil do segurado. Isso porque
o seguro de responsabilidade civil facultativo não é espécie de estipulação a favor
de terceiro alheio ao negócio, ou seja, quem sofre o prejuízo não é beneficiário
do negócio, mas sim o causador do dano. Acrescente-se, ainda, que o ajuizamento
direto exclusivamente contra a seguradora ofende os princípios do contraditório
e da ampla defesa, pois a ré não teria como defender-se dos fatos expostos na
inicial, especialmente da descrição do sinistro. (...)” (STJ, REsp 962.230/RS, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, j. 08.02.2012). O entendimento revisado causa estranheza, eis
que, presente a solidariedade, a vítima pode escolher contra quem demandar (art.
275 do CC). Ademais, a nova posição acaba representando um retrocesso em
relação ao entendimento anterior na perspectiva da função social do contrato. A
demonstrar a discordância da doutrina quanto a essa alteração na jurisprudência
do STJ, na VI Jornada de Direito Civil, em 2013, foi aprovado o Enunciado n. 544,
que admite a ação proposta diretamente contra a seguradora. É a sua redação:
“O seguro de responsabilidade civil facultativo garante dois interesses, o do
segurado contra os efeitos patrimoniais da imputação de responsabilidade e o da
vítima à indenização, ambos destinatários da garantia, com pretensão própria e
independente contra a seguradora”. Em suma, o debate parece ainda estar em
aberto no Brasil. De toda forma, essa discordância da doutrina não convenceu o
STJ que, em 2015, editou a Súmula 529, expressando que, “No seguro de
responsabilidade civil facultativo, não cabe o ajuizamento de ação pelo terceiro
prejudicado direta e exclusivamente em face da seguradora do apontado causador
do dano”.

DOS VÍCIOS REDIBITÓRIOS

Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada
por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada,
ou lhe diminuam o valor.

Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo às doações onerosas.

Art. 442. Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato ( art. 441 ), pode o
adquirente reclamar abatimento no preço.

Art. 443. Se o alienante conhecia o vício ou defeito da coisa, restituirá o que


recebeu com perdas e danos; se o não conhecia, tão-somente restituirá o valor
recebido, mais as despesas do contrato.

Art. 444. A responsabilidade do alienante subsiste ainda que a coisa pereça em


poder do alienatário, se perecer por vício oculto, já existente ao tempo da
tradição.

Art. 445. O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no


preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel,
contado da entrega efetiva; se já estava na posse, o prazo conta-se da alienação,
reduzido à metade.

§ 1º Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o
prazo contar-se-á do momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo
de cento e oitenta dias, em se tratando de bens móveis; e de um ano, para os
imóveis.
§ 2º Tratando-se de venda de animais, os prazos de garantia por vícios ocultos
serão os estabelecidos em lei especial, ou, na falta desta, pelos usos locais,
aplicando-se o disposto no parágrafo antecedente se não houver regras
disciplinando a matéria.

Art. 446. Não correrão os prazos do artigo antecedente na constância de cláusula


de garantia; mas o adquirente deve denunciar o defeito ao alienante nos trinta
dias seguintes ao seu descobrimento, sob pena de decadência.

Vício Redibitório é um vício oculto em uma coisa, que a torna imprestável para sua
utilidade ou que cause uma depreciação em seu apreço financeiro. É uma das manifestações do
princípio da segurança jurídica, já que o alienante tem que garantir o uso da coisa, para que sua
finalidade seja alcançada, ao adquirente.

VÍCIO REDIBITÓRIO ERRO

O prazo para reclamação no vício redibitório é Enquanto no erro o prazo é de quatro anos.
de 30 dias para bens móveis e um anoanos;
para
bens imóveis.

Enquanto no vício redibitório o defeito está na No erro a coisa é perfeita e o adquirente é quem
coisa. a adquire por engano;

Por fim, o vício redibitório dá ensejo à rescisão Enquanto o erro é passível de anulação do
ou revisão contratual. negócio.
O adquirente prejudicado pelo vício redibitório pode fazer uso das ações edilícias, nos
termos do art. 442 do CC. Anote-se que a expressão “edilícias” tem origem no Direito Romano,
pois a questão foi regulamentada pela aediles curules, por volta do século II a.C., “com o objetivo
de evitar fraudes praticadas pelos vendedores no mercado romano. Ressaltemos que os
vendedores eram, em geral, estrangeiros (peregrinos) que tinham por hábito dissimular muito
bem os defeitos da coisa que vendiam”.64 Assim, poderá o adquirente, por meio dessas ações:

1. Pleitear abatimento proporcional no preço, por meio de ação quanti minoris ou ação estimatória.

Requerer a resolução do contrato (devolvendo a coisa e recebendo de volta a quantia em


dinheiro que desembolsou), sem prejuízo de perdas e danos, por meio de ação redibitória.
Para pleitear as perdas e danos, deverá comprovar a má-fé do alienante, ou seja, que o
mesmo tinha conhecimento dos vícios redibitórios (art. 443 do CC). Todavia, a ação
redibitória, com a devolução do valor pago e o ressarcimento das despesas contratuais, cabe
mesmo se o alienante não tinha conhecimento do vício.

DA EVICÇÃO

Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção. Subsiste
esta garantia ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública.

Art. 448. Podem as partes, por cláusula expressa, reforçar, diminuir ou excluir
a responsabilidade pela evicção.

Art. 449. Não obstante a cláusula que exclui a garantia contra a evicção, se esta
se der, tem direito o evicto a receber o preço que pagou pela coisa evicta, se
não soube do risco da evicção, ou, dele informado, não o assumiu.
Art. 450. Salvo estipulação em contrário, tem direito o evicto, além da restituição
integral do preço ou das quantias que pagou:

I - à indenização dos frutos que tiver sido obrigado a restituir;

II - à indenização pelas despesas dos contratos e pelos prejuízos que


diretamente resultarem da evicção;

III - às custas judiciais e aos honorários do advogado por ele constituído.

Parágrafo único. O preço, seja a evicção total ou parcial, será o do valor da


coisa, na época em que se evenceu, e proporcional ao desfalque sofrido, no caso
de evicção parcial.

Art. 451. Subsiste para o alienante esta obrigação, ainda que a coisa alienada
esteja deteriorada, exceto havendo dolo do adquirente.

Art. 452. Se o adquirente tiver auferido vantagens das deteriorações, e não tiver
sido condenado a indenizá-las, o valor das vantagens será deduzido da quantia
que lhe houver de dar o alienante.

Art. 453. As benfeitorias necessárias ou úteis, não abonadas ao que sofreu a


evicção, serão pagas pelo alienante.

Art. 454. Se as benfeitorias abonadas ao que sofreu a evicção tiverem sido feitas
pelo alienante, o valor delas será levado em conta na restituição devida.

Art. 455. Se parcial, mas considerável, for a evicção, poderá o evicto optar entre
a rescisão do contrato e a restituição da parte do preço correspondente ao
desfalque sofrido. Se não for considerável, caberá somente direito a indenização.

Art. 457. Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia que a coisa
era alheia ou litigiosa.

Tendo em vista as regras constantes da codificação privada material e a interpretação


doutrinária e jurisprudencial que vem sendo dada à categoria, a evicção pode ser conceituada
como sendo a perda da coisa diante de uma decisão judicial ou de um ato administrativo que a
atribui a um terceiro. Quanto aos efeitos da perda, a evicção pode ser total ou parcial (arts. 447
a 457 do CC).
De toda a sorte, é interessante deixar claro que o conceito clássico de evicção é que ela
decorre de uma sentença judicial. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que a
evicção pode estar presente em casos de apreensão administrativa, não decorrendo
necessariamente de uma decisão judicial (nesse sentido: STJ, REsp 259.726/RJ, 4.ª Turma, Rel. Min.
Jorge Scartezzini, Data da decisão: 03.08.2004, DJ 27.09.2004, p. 361).6

DA RESPONSABILIDADE CIVIL PRÉ-CONTRATUAL

Responsabilidade pré-contratual ocorre no momento anterior à formação do contrato, no


momento das negociações para a efetivação deste, capaz de gerar direitos e obrigações
provenientes do princípio da boa-fé objetiva.

 Apresenta os seguintes requisitos:

o Consentimento às negociações;

o Confiança da seriedade das tratativas;

o Dano patrimonial;

o Relação de causalidade e inobservância ao princípio da boa-fé, vez que a


obrigação não se esgota ou limita à obrigação principal, mas, ao mesmo tempo,
impõe o respeito aos deveres anexos ou secundários.

Assim posto, aquele que consente a outra parte a efetuar despesas e trabalhos acerca das
negociações, tem responsabilidade pelo seu rompimento arbitrário ou imprudente, pois gerou
confiança na outra parte em relação à efetivação do contrato. Não pode, assim, o indivíduo
incorrer em prejuízo por uma atitude arbitrária ou imprudente da outra parte.

6
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2018.
Da mesma forma, a parte prejudicada deve demonstrar a legítima confiança da seriedade
das tratativas. O indivíduo necessita provar a sua convicção de que o contrato seria realizado. Por
fim, deve existir um dano efetivo, pois sem ele não haverá responsabilidade e muito menos o
consequente dever de indenizar.

OS CONTRATOS PRELIMINARES

Os contratos preliminares estão dispostos nos artigos 462 ao 466 da Código Civil, vejamos:

Art. 462. O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os
requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.

O dispositivo exige que o contrato preliminar deve atender aos requisitos necessários ao
contrato (que será definitivo). Estes requisitos são:
1. Partes;
2. Objeto;
3. Prazo;
4. Forma.

Sem o estabelecimento destes requisitos no pré-contrato, o mesmo torna-se inválido.

Se o pré-contrato preencher os requisitos mínimos exigíveis legalmente, de todo modo ele é válido.

Nesta esteira de raciocínio o artigo seguinte, 463 do mesmo diploma, a norma dispõe da
seguinte maneira:

Art. 463. Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo


antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer
das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à
outra para que o efetive.
Parágrafo único. O contrato preliminar deverá ser levado ao registro competente.

Como o pré-contrato tem por escopo a realização de um outro contrato, fica a critério
das partes a necessidade de convenção de cláusula de arrependimento. Ela inexistindo, garante a
qualquer das partes envolvidas a possibilidade de exigir, mediante notificação à outra, prazo para
que o contrato definitivo seja realizado, possibilitando o pedido por perdas e danos, caso não
realizado no tempo acordado.
O parágrafo único, ressalta a necessidade de ser levado o contrato preliminar ao registro
competente para ser validado publicamente perante terceiros.

A cláusula de arrependimento pactuada entre as partes no contrato preliminar,


impossibilitou a reclamação por danos morais e materiais à outra parte.

O artigo 464 do referido Código, preconiza a possibilidade do juiz, quando


esgotado o prazo, e a pedido da parte, conferir definitividade ao contrato
preliminar.

Art. 464. Esgotado o prazo, poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a


vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato
preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação.

Percebe-se que o que a norma deseja é o cumprimento da obrigação pactuada em sede


preliminar contratual.
Art. 465. Se o estipulante não der execução ao contrato preliminar, poderá a
outra parte considerá-lo desfeito, e pedir perdas e danos.

Isto posto, se o contrato preliminar preenche todos os requisitos pautados em Lei, e ainda
foi levado a registro, ele passa a gerar direitos e obrigações, caso que, o seu descumprimento
gera a parte lesada o direito as perdas e danos.

E por fim, resta a análise do artigo 466 da Lei em comento estabelece:


Art. 466. Se a promessa de contrato for unilateral, o credor, sob pena de ficar a
mesma sem efeito, deverá manifestar-se no prazo nela previsto, ou, inexistindo
este, no que lhe for razoavelmente assinado pelo devedor.

O dispositivo cuida do negócio unilateral que obriga o promitente a realizar contrato,


denominado promessa unilateral ou opção. Na promessa de compra (opção de venda) uma das
partes obriga-se a comprar algum bem nas condições que prevê (opção de compra)e a outra
obriga-se a vender um determinado bem. O descumprimento da promessa unilateral obriga a
parte inadimplente a indenizar em perdas e danos, ou realizar a obrigação específica.

FORMAÇÃO DOS CONTRATOS

De acordo com Flávio Tartuce,7 o contrato nasce da conjunção de duas ou mais vontades
coincidentes, sem prejuízo de outros elementos, o que consubstancia aquilo que se denomina
autonomia privada. Sem o mútuo consenso, sem a alteridade, não há contrato. Desse modo,
reunindo o que há de melhor na doutrina, é possível identificar quatro fases na formação do
contrato civil:

o Fase de negociações preliminares ou de pontuação;


o Fase de proposta;
o policitação ou oblação;
o Fase de contrato preliminar;
o Fase de contrato definitivo ou de conclusão do contrato.

7
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2018.
FASE DE NEGOCIAÇÕES PRELIMINARES OU DE PUNTUAÇÃO

Essa é a fase em que ocorrem debates prévios, entendimentos, tratativas ou


conversações sobre o contrato preliminar ou definitivo. Cumpre assinalar que a expressão
puntuação foi difundida, na doutrina clássica, por Darcy Bessone, estando relacionada a acordos
parciais na fase pré-contratual. A origem está no francês pourparlers e no italiano puntuazione
(antecontrato, declaração).

Essa fase não está prevista no Código Civil de 2002, sendo anterior à formalização da
proposta, podendo ser também denominada fase de proposta não formalizada, estando presente,
por exemplo, quando houver uma carta de intenções assinada pelas partes, em que elas apenas
manifestam a sua vontade de celebrar um contrato no futuro.

FASE DE PROPOSTA, POLICITAÇÃO OU OBLAÇÃO

A fase de proposta, denominada fase de oferta formalizada, policitação ou oblação,


constitui a manifestação da vontade de contratar, por uma das partes, que solicita a concordância
da outra. Trata-se de uma declaração unilateral de vontade receptícia, ou seja, que só produz
efeitos ao ser recebida pela outra parte. Conforme o art. 427 do CC, a proposta vincula o
proponente, gerando o dever de celebrar o contrato definitivo sob pena de responsabilização
pelas perdas e danos que o caso concreto demonstrar.

Esse caráter receptício é mantido se a promessa for direcionada ao público, conforme


enuncia o art. 429 do CC, hipótese em que o oblato é determinável, não determinado. Também
nessa hipótese, a proposta vincula aquele que a formulou quando encerrar os requisitos
essenciais do contrato, salvo se o contrário resultar das circunstâncias ou dos usos. Em
complemento, é possível revogar a oferta ao público, pela mesma via da divulgação, desde que
ressalvada esta faculdade na oferta realizada, isto é, desde que respeitado o dever de informar
a outra parte (art. 429, parágrafo único, do CC). Como exemplo de hipótese de oferta ao público,
cite-se a comum e contemporânea oferta de venda feita pela internet.

 São partes da proposta:


o Policitante, proponente ou solicitante – aquele que formula a proposta, estando
a ela vinculado, em regra.
o Policitado, oblato ou solicitado – aquele que recebe a proposta e, se a acatar,
torna-se aceitante, o que gera o aperfeiçoamento do contrato (choque ou
encontro de vontades). O oblato poderá formular uma contraproposta, situação
em que os papéis se invertem: o proponente passa a ser oblato e vice-versa.

Sobre a manifestação da vontade na proposta e na aceitação, o Código Civil exige que


esteja revestida pelas seguintes características:

o Proposta (ou oferta, policitação ou oblação) – Deve ser séria, clara, precisa e
definitiva – art. 427.
o Aceitação – Deve ser pura e simples – art. 431.

O art. 428 do CC/2002 desrespeito às hipóteses em que a proposta deixa de ser


obrigatória. Vejamos:

o Deixa de ser obrigatória a proposta, se, feita sem prazo a pessoa presente, não
foi imediatamente aceita (art. 428, I). Esse mesmo dispositivo enuncia que deve
ser considerada entre presentes a proposta feita por telefone ou outro meio
semelhante, podendo nesse dispositivo se enquadrar o contrato eletrônico
celebrado entre presentes (v.g., por videoconferência digital ou pelo Skype). A
categoria jurídica em questão é denominada pela doutrina como contrato com
declaração consecutiva.

o Não será obrigatória a proposta se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver
decorrido tempo suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do
proponente (art. 428, II, do CC). Trata-se do contrato com declarações intervaladas.
O tempo suficiente é um conceito legal indeterminado denominado como prazo
moral, deve ser analisado caso a caso pelo juiz, de acordo com a boa-fé, os usos
e costumes do local e das partes (art. 113 do CC).

o Não será obrigatória a proposta se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida
a resposta dentro do prazo dado pelo proponente (art. 428, III, do CC).

o Por fim, não obriga a proposta, se antes dela ou juntamente com ela, chegar ao
conhecimento da outra parte – o oblato – a retratação do proponente (art. 428,
IV, do CC).

2.Direito Das Sucessões – arts. 1.784 ao 2.027 do CC

LEITURA DOS ARTS. 1.784 AO 2.027 DO CC

Inicialmente, cabe ao aluno a leitura dos arts. 1.784


ao 2.027 do Código Civil para que conheça
fielmente a letra de lei, e consiga entender os
rumos do assunto.

INTRODUÇÃO

O evento morte marca o fim da personalidade jurídica da pessoa natural. Devemos


lembrar, contudo, que os direitos da personalidade (tais como o respeito à honra e à imagem da
pessoa humana) podem ser projetados para além da vida física do indivíduo – em razão do
efeito post mortem dos direitos da personalidade. Entretanto, em relação aos bens de titularidade
do indivíduo, após a sua morte, o seu patrimônio é transferido de imediato para os seus
sucessores, independentemente de qualquer formalidade, como a abertura do testamento ou a
instauração do procedimento de inventário. Tal ficção jurídica ocorre pelo denominado Droit de
Saisine.

O Direito Sucessório está diretamente ligado ao direito de propriedade, possuindo o


direto à sucessão aberta, status de norma constitucional fundamental, previsto no Art.
5º, XXX e XXXI, da Constituição Federal de 1988 (CF/88):

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: [...]

XXX - é garantido o direito de herança;

XXXI - a sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela


lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não
lhes seja mais favorável a lei pessoal do "de cujus". (CF, 1988.)

Busque estar por dentro do entendimento jurisprudencial, esteja atento às novidades


legislativas, aprenda a ler jurisprudências e entendê-las!

 Observe estes julgados recentes:

No CC/1916, o cônjuge viúvo que casasse de novo ou constituísse união estável


perdia o direito real de habitação; no CC/2002, não mais existe essa causa de
extinção

Ementa Oficial
DIREITO DAS SUCESSÕES. RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO ABERTA NA VIGÊNCIA
DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. DIREITO REAL DE
HABITAÇÃO. ART. 1.611, § 2º, DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. EXTINÇÃO.
CONSTITUIÇÃO DE NOVA ENTIDADE FAMILIAR. UNIÃO ESTÁVEL. RECURSO
ESPECIAL PROVIDO. 1. O recurso especial debate a possibilidade de equiparação
da união estável ao casamento, para fins de extinção do direito real de habitação
assegurado ao cônjuge supérstite. 2. Em sucessões abertas na vigência do Código
Civil de 1916, o cônjuge sobrevivente tem direito real de habitação enquanto
permanecer viúvo.
3. A atribuição do direto real de habitação consiste em garantia do direito de
moradia por meio da limitação do direito de propriedade de terceiros, uma vez
que herdeiros e legatários adquirem o patrimônio do acervo hereditário desde a
abertura da sucessão, por força do princípio da saisine.
4. Conquanto o marco para extinção fizesse referência ao estado civil, o qual
somente se alteraria pela contração de novas núpcias, não se pode perder de
vista que apenas o casamento era instituição admitida para a constituição de
novas famílias.
5. Após a introdução da união estável no sistema jurídico nacional, especialmente
com o reconhecimento da família informal pelo constituinte originário, o direito
e a jurisprudência paulatinamente asseguram a equiparação dos institutos quanto
aos efeitos jurídicos, especialmente no âmbito sucessório, o que deve ser
observado também para os fins de extinção do direito real de habitação.
6. Tendo em vista a novidade do debate nesta Corte Superior, bem como a
existência de um provimento jurisdicional que favorecia o recorrido e o induzia a
acreditar na legitimidade do direito real de habitação exercido até o presente
julgamento, deve o aluguel ser fixado com efeitos prospectivos em relação à
apreciação deste recurso especial.
7. Recurso especial provido.
(REsp 1617636/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA,
julgado em 27/08/2019, DJe 03/09/2019)

O indivíduo que recebeu um imóvel gravado com cláusula de inalienabilidade


pode transferir esse imóvel por meio de testamento, considerando que a cláusula
de inalienabilidade vitalícia dura apenas enquanto o beneficiário estiver vivo.
Ementa Oficial

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. AÇÃO ANULATÓRIA DE TESTAMENTO. NEGATIVA DE


PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CLÁUSULA DE
INALIENABILIDADE, INCOMUNICABILIDADE E IMPENHORABILIDADE. VIGÊNCIA
DA RESTRIÇÃO. VIDA DO BENEFICIÁRIO. ATO DE DISPOSIÇÃO DE ÚLTIMA
VONTADE. VALIDADE. RECURSO PROVIDO.

1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC/1973 quando a Corte local pronuncia, de


forma clara e suficiente, sobre as questões deduzidas nos autos, manifestando-
se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão
adotada pelo Juízo.

2. Conforme a doutrina e a jurisprudência do STJ, a cláusula de inalienabilidade


vitalícia tem duração limitada à vida do beneficiário - herdeiro, legatário ou
donatário -, não se admitindo o gravame perpétuo, transmitido sucessivamente
por direito hereditário.

3. Assim, as cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e


impenhorabilidade não tornam nulo o testamento que dispõe sobre transmissão
causa mortis de bem gravado, haja vista que o ato de disposição somente produz
efeitos após a morte do testador, quando então ocorrerá a transmissão da
propriedade.

4. Recurso especial provido para julgar improcedente a ação de nulidade de


testamento.

(REsp 1641549/RJ, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA,


julgado em 13/08/2019, DJe 20/08/2019)

PRINCÍPIOS DO DIREITO SUCESÓRIO

 Princípio da Saisine ou Droit de Saisine


Vejamos o conceito e a origem deste princípio, segundo os ensinamentos de Tartuce
(2019):

“Nas duas formas da sucessão, o regramento fundamental consta do


Art. 1.784 do CC, pelo qual aberta a sucessão – o que ocorre com a
morte da pessoa –, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros
legítimos e testamentários. Trata-se da consagração da máxima droit de
saisine. A expressão, segundo Jones Figueirêdo Alves e Mário Luiz
Delgado, tem origem na expressão gaulesa le mort saisit le vif, pela qual
com a morte, a herança transmite-se imediatamente aos sucessores,
independentemente de qualquer ato dos herdeiros. O ato de aceitação
da herança, conforme veremos posteriormente, tem natureza
confirmatória.”

Portanto, a base legal deste instituto está no Art. 1.784 do CC/2002, que assim inaugura
o Livro V do Código Civil de 2002, que trata do Direito Sucessório: “Aberta a sucessão, a herança
transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”.

 Princípio da Territorialidade

Pelo Princípio da Territorialidade, e nos


exatos termos do Art. 1.785 do CC/2002, “a
sucessão abre-se no lugar do último domicílio do
falecido”. Tal princípio possui extrema relevância,
principalmente no campo do Direito Processual,
pois, em razão desse princípio, por exemplo, pode-
se saber qual será o foro competente para a
distribuição da ação de inventário e partilha, de
arrolamento de bens ou, ainda, do pedido de alvará
judicial, medidas que serão analisadas ainda no
módulo de Direito Sucessório.
Art. 10. A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que
domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a
situação dos bens.

§ 1º A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei


brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os
represente, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus.

§ 2º A lei do domicílio do herdeiro ou legatário regula a capacidade para suceder.


(BRASIL, 1942.)

 Princípio Non ultra vires hereditatis

Você se pergunta se os sucessores do autor da herança (de cujus) responderão pelas dívidas
deixadas pelo falecido?

Este princípio estabelece que o herdeiro não responderá por débitos que ultrapassem o
patrimônio da herança. Ou seja, o sucessor, não aceitando a herança por ter percebido que o
patrimônio deixado é superado pelas dívidas do monte, não será economicamente penalizado,
conforme disposto no Art. 1.792 do CC/2002:

Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da


herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que
a escuse, demonstrando o valor dos bens herdados. (CC, 2002.)

 Princípio da Temporariedade

Com base na análise do Art. 1.787 do CC/2002, que assim dispõe:


“Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo
da abertura daquela”, podemos extrair o Princípio da Temporariedade
da Sucessão.

Portanto, a lei aplicável à sucessão será a vigente no momento


da abertura da sucessão, ou seja, no momento da morte do autor da
herança (Droit de Saisine).
 Princípio do Respeito à Vontade Manifestada

Pelo referido princípio, a vontade do titular originário do patrimônio (de cujus) deverá
ser respeitada sempre que tiver sido manifestada, desde que dentro dos limites impostos pela lei.

LINHA SUCESSÓRIA – SUCESSÃO LEGÍTIMA

Primeiramente, cabe ressaltar que a sucessão legítima se refere ao conjunto de normas


disciplinadoras da sucessão patrimonial causa mortis. Sobre as considerações iniciais acerca deste
tema, prelecionam Gagliano e Pamplona Filho:8

“A denominada “Sucessão Legítima” traduz o conjunto de regras que disciplina


a transferência patrimonial post mortem, sem a incidência de um testamento

válido.”

Nos termos do Código Civil, “morrendo a pessoa sem testamento, transmite a

herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não

forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o


testamento caducar, ou for julgado nulo”.9

8 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: contratos. Volume 4. TOMOS I e II. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 2019.
9 Art. 1.788 do CC.
Se as regras da Sucessão Legítima existem para a preservação da parte indisponível da
herança — prestigiando-se alguns dos herdeiros —, não se pode negar que o estabelecimento de
uma ordem de vocação hereditária tem por finalidade, também, permitir a transmissibilidade do
patrimônio do falecido, especialmente para os casos em que ele não manifestou, de forma prévia,
a sua vontade sobre o sentido do direcionamento daqueles bens. Por isso, a própria lei cuida de
imprimir destinação ao patrimônio, segundo uma suposta vontade presumível do autor da
herança.10

Nos
Nesse contexto, é muito importante frisarmos que é característica básica
do sistema a regra segundo a qual o sucessor mais próximo exclui o
mais remoto.

exatos termos do Art. 1.829 do atual Código Civil (CC/2002), a sucessão legítima defere-
se na seguinte ordem:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se


casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da
separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da

comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais.

10 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: contratos. Volume 4. TOMOS I e II. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 2019.
Da primeira classe de sucessores

Como vimos pela leitura do inciso I do dispositivo anterior, os descendentes estão na primeira
classe de sucessores legítimos. Há, contudo, uma questão importante a ser enfrentada: o cônjuge
sobrevivente, a depender do regime de bens adotado no casamento, herdará em concorrência
com os descendentes.

Falecido o autor da herança, esta será deferida ao(s) seu(s) descendente(s), primeira classe
sucessória, respeitada a regra segundo a qual o parente mais próximo exclui o mais remoto. A
questão, porém, não é mais tão simples, pois é preciso verificar se haverá a concorrência do(a)
cônjuge em relação ao descendente, nos termos do referido inciso I do art. 1.829.11

Nos termos desse dispositivo legal, havendo cônjuge sobrevivente (viúva ou viúvo), este NÃO
terá direito de concorrer com o descendente, se o regime de bens adotado foi de:

COMUNHÃO
SEPARAÇÃO COMUNHÃO PARCIAL SE O
UNIVERSAL AUTOR DA HERANÇA NÃO
OBRIGATÓRIA
DEIXOU BENS
PARTICULARES

11
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: contratos. Volume 4. TOMOS I e II. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 2019.
Por outro lado, haverá, SIM, direito de concorrer com o descendente, se o regime de
bens adotado foi de:

PARTICIPAÇÃO
FINAL NOS COMUNHÃO

AQUESTOS SEPARAÇÃO PARCIAL, SE O


CONVENCIONAL AUTOR DA
HERANÇA
DEIXOU BENS
PARTICULARES

ATENÇÃO!

Como visto, o cônjuge sobrevivente, na parte do patrimônio em que for meeiro do autor
da herança, não concorrerá como herdeiro com os descendentes do de cujus, na hipótese
do inciso I do Art. 1.829.

Todavia, quando adotado determinado regime de bens em que há um patrimônio que


se submente à meação e outro patrimônio particular de cada cônjuge (como, por exemplo,
ocorre no regime da comunhão parcial de bens), será o sobrevivente meeiro da parte comum
(bens adquiridos na constância do casamento, por exemplo) e será herdeiro necessário sobre
a parte da qual não possui a meação (bens adquiridos antes do casamento, por exemplo),
concorrendo apenas sobre essa parte com os demais descendentes do falecido.

Inciso I do Art. 1.829 do CC/2002: Majoritariamente, no que se refere ao regime da comunhão


parcial de bens, da separação convencional de bens ou da participação final nos aquestos, há
o entendimento de que o cônjuge, além de meeiro, será também herdeiro necessário em
concorrência com os descendentes do falecido, apenas se o de cujus deixou bens particulares,
restringindo a concorrência apenas a tais bens (particulares).

Nesse sentido, assim expressa o enunciado 27 da II Jornada de Direito Civil do CJF:

O art. 1.829, inc. I, só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrência


com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da
separação convencional de bens ou, se casados nos regimes da comunhão
parcial ou participação final nos aquestos, o falecido possuísse bens
particulares, hipóteses em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo
os bens comuns (meação) ser partilhados exclusivamente entre os descendentes.

Da sucessão pelos ascendentes

Não havendo herdeiros na primeira classe (descendentes), serão chamados à sucessão os que
se encontram na SEGUNDA CLASSE, composta pelos ascendentes, em concorrência com o cônjuge.
Ou seja, na sucessão pelos ascendentes, o cônjuge será herdeiro necessário, independentemente
do regime de bens adotado no casamento, conforme disposto no inciso II do Art. 1.829 do
CC/2002.

No mesmo sentido expressa o enunciado 609, aprovado na VII Jornada de Direito Civil
do CJF:

“O regime de bens no casamento somente interfere na concorrência sucessória


do cônjuge com descendentes do falecido”.
Da sucessão do cônjuge ou companheiro

Sobre a sucessão do cônjuge e do companheiro, esclarece Tartuce:

"Faltando descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro e


isoladamente ao cônjuge sobrevivente, que está na terceira classe de herdeiros
(arts. 1.829, III, e 1.838 do CC). Como se pode notar, tal direito é reconhecido ao
cônjuge independentemente do regime de bens adotado no casamento com o
falecido. Com as recentes decisões do STF, publicadas no seu Informativo n. 864,
deve-se incluir o convivente em todas essas regras, inclusive se houver uma
relação homoafetiva."12

Assim, se o de cujus não deixou descendentes ou ascendentes, herdará o cônjuge e


também o companheiro, independentemente do regime de bens adotado no casamento.

Outra regra importante está prevista no Art. 1.830 do CC/2002:

"Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo


da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de
fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se
tornara impossível sem culpa do sobrevivente.”13

Da sucessão dos colaterais

São colaterais, nos termos do Artigo 1.592 do CC/2002, aquelas pessoas provenientes do
mesmo tronco, sem descenderem umas das outras. Entretanto, para efeitos sucessórios, há uma
limitação para que o colateral seja chamado a suceder:

12 TARTUCE, Flavio. Manual de Direito Civil. Volume único. 9. ed. São Paulo: Método, 2019.
13 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil Brasileiro. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm. Acesso em: 04 abr. 2019.
Art. 1.839. Se não houver cônjuge sobrevivente, nas condições estabelecidas no
art. 1.830, serão chamados a suceder os colaterais até o quarto grau.

Ou seja, apenas herdará o colateral do de cujus até o quarto grau. Contudo, no caso da
sucessão pelos irmãos do falecido, há uma importante regra que diferencia os irmãos bilaterais
(também conhecidos como germanos) dos irmãos unilaterais:

Art. 1.841. Concorrendo à herança do falecido irmãos bilaterais com irmãos


unilaterais, cada um destes herdará metade do que cada um daqueles herdar.

Art. 1.842. Não concorrendo à herança irmão bilateral, herdarão, em partes


iguais, os unilaterais.

Assim, se forem chamados à sucessão irmãos do de cujus, filhos do mesmo pai e da


mesma mãe, juntamente com outros que forem irmãos apenas por parte do pai ou da mãe,
os irmãos do mesmo pai e da mesma mãe herdarão o dobro do que os irmãos unilaterais
(irmãos apenas por parte de pai ou por parte de mãe).

Da sucessão pelo entre público

Assim dispõe o Art. 1.844 do CC/2002:

“Não sobrevivendo cônjuge, ou companheiro, nem parente algum sucessível,


ou tendo eles renunciado a herança, esta se devolve ao Município ou ao Distrito
Federal, se localizada nas respectivas circunscrições, ou à União, quando situada
em território federal”
Nesse caso, surgirá a herança jacente (quando não há qualquer herdeiro para receber
o patrimônio deixado pelo falecido) ou a herança vacante (quando todos os herdeiros
renunciarem à herança).

NOTÍCIA SELECIONADA

 Companheira tem direito à totalidade da herança na falta de filhos ou ascendentes


Nos casos de ausência de descendentes ou ascendentes, é garantido à companheira o
direito de recebimento dos bens deixados pelo companheiro falecido, ressalvada a
existência de manifestação de última vontade. Portanto, o direito da companheira
sobrevivente prepondera em relação aos parentes colaterais, como irmãos, tios e sobrinhos,
em virtude da ordem legal prevista pelo Código Civil.

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
ao negar provimento ao recurso especial de parentes de quarto grau contra acórdão do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que reconheceu à companheira o direito à
totalidade da herança do falecido, incluídos os bens adquiridos antes do início da união
estável.

“Não há mais que se considerar a concorrência do companheiro com os parentes


colaterais, os quais somente herdarão na sua ausência. O artigo 1.790, III, do Código Civil de
2002, que inseria os colaterais em terceiro lugar na ordem de vocação hereditária, não subsiste
mais no sistema”, apontou o relator do recurso especial, ministro Villas Bôas Cueva.

Norma geral e especial

Após reconhecer a existência de união estável, o juiz de primeiro grau resolveu a


questão do direito sucessório da companheira com base no artigo 1.790, inciso III, do
CC/2002, concluindo que ela deveria concorrer com os outros parentes do falecido – irmãos
e sobrinhos, especificamente – no processo de sucessão, com direito a um terço da herança.

Todavia, o TJMG reconheceu o direito da companheira à sucessão integral com base no


artigo 2º, inciso III, da Lei 8.971/94, que prevê ao companheiro o direito à totalidade da
herança, na falta de descendentes ou ascendentes. Para o tribunal, a norma especial não
foi revogada pela legislação geral – o Código Civil – e teria prevalência sobre ela.

Por meio de recurso especial, os parentes do falecido argumentaram violação do artigo


1.790 do Código Civil, ao argumento de que a companheira deveria concorrer com os
parentes colaterais até o quarto grau nos direitos hereditários do autor da herança. Para os
recorrentes, deveriam ser garantidos à companheira os direitos sucessórios, mas apenas em
relação aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, na proporção de um
terço da herança.

Dispositivo inconstitucional

O ministro Villas Bôas Cueva lembrou que, em maio de 2017, o Supremo Tribunal Federal
(STF) reconheceu incidentalmente a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil,
dispositivo que estabelecia a diferenciação dos direitos de cônjuges e companheiros para fins
sucessórios. Para o STF – em entendimento também adotado pelo STJ –, deveria ser aplicado
em ambos os casos o regime estabelecido pelo artigo 1.829 do CC/2002.

De acordo com o artigo 1.829, a sucessão legítima é estabelecida, em ordem, aos


descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente; aos ascendentes, em
concorrência com o cônjuge; ao cônjuge sobrevivente; e aos parentes colaterais.

Já de acordo com o artigo 1.839 do Código Civil, incidente por analogia aos
companheiros, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente no caso de
ausência de descendentes e ascendentes.

“Logo, é possível concluir que o companheiro, assim como o cônjuge, não partilhará
herança legítima com os parentes colaterais do autor da herança, salvo se houver disposição
de última vontade, como, por exemplo, um testamento”, concluiu o ministro, ainda que por
fundamentos diversos, ao manter o acórdão do TJMG.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.14

14
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Companheira tem direito à totalidade da herança na falta de filhos ou ascendentes.
2018.
SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Sucessão testamentária é aquela em que a transmissão hereditária se opera por ato


de última vontade, revestido da solenidade requerida por lei.

Do Testamento

O Art. 1.857 do Código Civil de 2002, dispõe que

“Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus
bens, ou de parte deles, para depois de sua morte”.

Há, segundo o Código Civil vigente, a classificação dos testamentos em duas modalidades
distintas, sendo elas:

TESTAMENTO ORDINÁRIO

TESTAMENTO ESPECIAL

O § 1º do Art. 1.857 faz uma importante limitação ao direito do testador em favor e em


proteção à legítima, prevendo que “a legítima dos herdeiros necessários não poderá ser incluída
no testamento”. Ou seja, tendo o testador herdeiros necessários, apenas poderá dispor em
testamento da metade do seu patrimônio.

Já o § 2º do Art. 1.857, estabelece que “são válidas as disposições testamentárias de


caráter não patrimonial, ainda que o testador somente a elas se tenha limitado” Assim,
disposições testamentárias sem caráter patrimonial serão válidas, tais como as que estabelecem a
destinação de perfis do falecido em redes sociais ou mesmo que disponham sobre a instituição de
um dos bens deixados como bem de família convencional.

O testamento é ato PERSONALÍSSIMO, podendo ser alterado a qualquer tempo (Art.


1.858). Ou seja, por mais que o testador tenha a possibilidade de recorrer à ajuda técnica de algum
profissional, será sempre um ato personalíssimo.

Modalidades do Testamento Ordinário

Nos termos do Art. 1.862 do Código Civil, são espécies de testamentos ordinários:

PÚBLICO CERRADO PARTICULAR

Do testamento público

Vejamos a explicação de Gagliano e Pamplona Filho sobre essa espécie de testamento:

“Entende-se por testamento público aquele elaborado por tabelião (ou por seu
substituto legal), devidamente registrado em cartório, na perspectiva do princípio
da publicidade. Trata-se de um negócio jurídico solene, para o qual a lei
expressamente estabelece requisitos formais de validade, cujo descumprimento
deve importar a nulidade da cláusula correspondente ou até mesmo de todo o
ato. ”

 Requisitos essenciais ao testamento público

O Art. 1.864 do CC/2002 elenca os seguintes requisitos essenciais dessa modalidade


de testamento:

 Ser escrito por tabelião ou por seu substituto legal em seu livro de notas, de
acordo com as declarações do testador, podendo este servir-se de minuta, notas
ou apontamentos;
 Lavrado o instrumento, ser lido em voz alta pelo tabelião ao testador e a duas
testemunhas, a um só tempo; ou pelo testador, se o quiser, na presença destas
e do oficial;
 Em seguida à leitura, ser o instrumento assinado pelo testador, pelas
testemunhas e pelo tabelião.
O testamento terá sempre a forma escrita e pode ser escrito manual ou
mecanicamente. Estabelece o parágrafo único do Art. 1.864 que:

“O testamento público pode ser escrito manualmente ou mecanicamente, bem


como ser feito pela inserção da declaração de vontade em partes impressas de
livro de notas, desde que rubricadas todas as páginas pelo testador, se mais de
uma.”

Sobre o testador surdo, cego ou que não souber ou não puder assinar, estabelece
o Código Civil algumas regras específicas nos Arts. 1.865 a 1.867:
Art. 1.865. Se o testador não souber, ou não puder assinar, o tabelião ou seu
substituto legal assim o declarará, assinando, neste caso, pelo testador, e, a seu
rogo, uma das testemunhas instrumentárias.

Art. 1.866. O indivíduo inteiramente surdo, sabendo ler, lerá o seu testamento,
e, se não o souber, designará quem o leia em seu lugar, presentes as
testemunhas.

Art. 1.867. Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido, em
voz alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra
por uma das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo
circunstanciada menção no testamento.

Do testamento cerrado

O testamento cerrado está previsto nos Arts. 1.868 e seguintes do CC/2002. Sobre o seu
conceito, ensina Tartuce:

“Denominado como testamento místico, pois não se sabe qual o seu conteúdo,
que permanece em segredo até a morte do testador. Trata-se de instituto sem
grande aplicação no presente, tendo pouca operabilidade na prática
sucessionista. O fato de não se saber o conteúdo gera vantagens e
desvantagens. Como desvantagem, se a integralidade do documento for atingida
de alguma forma (ex.: por uma enchente ou água de chuva), o testamento pode
não gerar efeitos.”

No testamento cerrado (também denominado místico), seu conteúdo é mantido em sigilo.


Trata-se de um mecanismo muito útil para evitar desavenças entre os herdeiros sobre a escolha
das disposições patrimoniais feitas pelo testador, pelo menos durante a sua vida.

 Requisitos essenciais ao testamento cerrado


Segundo os Arts. 1.868, 1872 e 1873 do CC/2002:

 Que o testador o entregue ao tabelião em presença de duas testemunhas.


 Que o testador declare que aquele é o seu testamento e quer que seja
aprovado.
 Que o tabelião lavre, desde logo, o auto de aprovação, na presença de duas
testemunhas, e o leia, em seguida, ao testador e às testemunhas.
 Que o auto de aprovação seja assinado pelo tabelião, pelas testemunhas e
pelo testador.
 Pode ser escrito mecanicamente, desde que seu subscritor numere e
autentique, com a sua assinatura, todas as páginas;
 Não pode dispor de seus bens em testamento cerrado quem não saiba ou
não possa ler;

Pode fazer testamento cerrado o surdo-mudo, contanto que o escreva todo e o assine
de sua mão, e que, ao entregá-lo ao oficial público, ante as duas testemunhas, escreva, na face
externa do papel ou do envoltório, que aquele é o seu testamento, cuja aprovação lhe pede.

O testamento pode ser escrito em língua nacional ou estrangeira, pelo próprio testador,
ou por outrem, a seu rogo (Art. 1.871).

Do testamento particular

Estabelece o Art. 1.876 do CC/2002 que

“o testamento particular pode ser escrito de próprio punho ou mediante processo


mecânico”

Portanto, o testamento particular ou privado tem a forma escrita, se tratando,


contudo, de um escrito particular.

 Requisitos essenciais ao testamento particular


 Se escrito de próprio punho, são requisitos essenciais à sua validade que seja
lido e assinado por quem o escreveu, na presença de pelo menos três
testemunhas, que o devem subscrever.
 Se elaborado por processo mecânico, não pode conter rasuras ou espaços
em branco, devendo ser assinado pelo testador, depois de o ter lido na
presença de pelo menos três testemunhas, que o subscreverão.
 Se as testemunhas forem contestes sobre o fato da disposição, ou, ao menos,
sobre a sua leitura perante elas, e se reconhecerem as próprias assinaturas,
assim como a do testador, o testamento será confirmado.
 Se faltarem testemunhas, por morte ou ausência, e se pelo menos uma delas
o reconhecer, o testamento poderá ser confirmado, se, a critério do juiz,
houver prova suficiente de sua veracidade.
 Em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o testamento particular
de próprio punho e assinado pelo testador, sem testemunhas, poderá ser
confirmado, a critério do juiz.
 Pode ser escrito em língua estrangeira, contanto que as testemunhas a
compreendam.

Das Modalidades Especiais ou Extraordinárias de Testamento

Conforme o Art. 1.886 do Código Civil, são modalidades especiais de testamento:

MARÍTIMO AERONÁUTICO MILITAR


Dos testamentos marítimo e aeronáutico

Sobre as duas primeiras modalidades de testamento, esclarecem Gagliano e Pamplona


Filho:

“A primeira modalidade de testamento extraordinário é o “testamento marítimo”.


Trata-se da possibilidade de uma pessoa, viajando em navio nacional — e,
portanto, longe de autoridades administrativas como um tabelião para redigir um
testamento público ou receber um testamento cerrado —, testar, na presença de
duas testemunhas. Agregou-se a ele, por força da codificação civil vigente, a
figura do “testamento aeronáutico”, que se diferencia somente pelo locus onde
é realizado (aeronave em vez de navio).”

“A previsão de um “testamento aeronáutico” talvez se afigure excessiva e


desnecessária. Se a intenção do legislador era abarcar outras formas de meio de
transporte, em que pessoas estivessem isoladas e impossibilitadas de testar de
forma ordinária, melhor seria disciplinar a matéria genericamente.”

ATENÇÃO!

Veja o que dispõe o Art. 1.888 do CC/2002:

Art. 1.888. Quem estiver em viagem, a bordo de navio nacional, de guerra ou


mercante, pode testar perante o comandante, em presença de duas
testemunhas, por forma que corresponda ao testamento público ou ao cerrado.

Parágrafo único. O registro do testamento será feito no diário de bordo.”

Pela leitura do Art. 1.888, percebemos que essas modalidades de testamento podem
corresponder ao formato dos testamentos público ou cerrado, conforme disponha o testador.
Assim, esse tipo especial de testamento apenas configura uma simplificação procedimental das
duas mencionadas formas ordinárias de testamento, em função das circunstâncias peculiares em
que é feita a disposição de última vontade.15

O testamento marítimo ou o aeronáutico ficará sob a guarda do comandante, que o entregará


às autoridades administrativas do primeiro porto ou aeroporto nacional, contra recibo averbado
no diário de bordo, conforme o Art. 1.890 do CC/2002.
Caducará o testamento marítimo ou aeronáutico se o testador não morrer na viagem, nem
nos noventa dias subsequentes ao seu desembarque em terra, onde possa fazer, na forma
ordinária, outro testamento, segundo o Art.1.891 do CC/2002.

Ressaltamos ainda que, conforme disposto no Art. 1.892 do CC/2002, como o testamento
marítimo é modalidade extraordinária de testamento, não valerá o testamento marítimo, ainda
que feito no curso de uma viagem, se, ao tempo em que se fez, o navio estava em porto onde o
testador pudesse desembarcar e testar na forma ordinária.

Do testamento militar

Estabelece o Art. 1.893 do CC/2202:

Art. 1.893 O testamento dos militares e demais pessoas a serviço das Forças
Armadas em campanha, dentro do país ou fora dele, assim como em praça
sitiada, ou que esteja de comunicações interrompidas, poderá fazer-se, não
havendo tabelião ou seu substituto legal, ante duas, ou três testemunhas, se o
testador não puder, ou não souber assinar, caso em que assinará por ele uma
delas.”

 Se o testador pertencer a corpo ou seção de corpo destacado, o testamento será


escrito pelo respectivo comandante, ainda que de graduação ou posto inferior;
 15 Se o testador estiver em tratamento em hospital, o testamento será escrito pelo
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: contratos. Volume 4. TOMOS I e II. 2.
respectivo oficial de saúde, ou pelo diretor do estabelecimento;
ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
 Se o testador for o oficial mais graduado, o testamento será escrito por aquele que o
substituir.
Do codicilo

Sobre o conceito de codicilo, nos ensina Tartuce:

“O codicilo ou pequeno escrito constitui uma disposição testamentária de


pequena monta ou extensão. Conforme constava de obra escrita em coautoria
com José Fernando Simão, trata-se de ato de última vontade simplificado, para
o qual a lei não exige tanta solenidade em razão de ser o seu objeto considerado
de menor importância para o falecido e para os herdeiros.”

Destarte, o codicilo nada mais é do que uma disposição testamentária que versa sobre um
patrimônio de pequena monta. Nesse sentido, assim estabelece o Art. 1.881 do CC/2002:

“Toda pessoa capaz de testar poderá, mediante escrito particular seu, datado e
assinado, fazer disposições especiais sobre o seu enterro, sobre esmolas de
pouca monta a certas e determinadas pessoas, ou, indeterminadamente, aos
pobres de certo lugar, assim como legar móveis, roupas ou joias, de pouco valor,

de seu uso pessoal.”16

Da Deserdação

A deserdação importa na exclusão do herdeiro em razão de uma declaração de última vontade,


confirmada por sentença. Estabelecem os arts. 1.962 e 1.963 do CC/2002 que, além das causas
mencionadas no Art. 1.814, autorizam a deserdação dos descendentes por seus ascendentes e vice-
versa as hipóteses ali tratadas. Vejamos os mencionados dispositivos:

Art. 1.962. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam


a deserdação dos descendentes por seus ascendentes:

16 TARTUCE, Flavio. Manual de Direito Civil. Volume único. 9. ed. São Paulo: Método, 2019.
I - ofensa física;
II - injúria grave;
III - relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;
IV - desamparo do ascendente em alienação mental ou grave
enfermidade.

Art. 1.963. Além das causas enumeradas no art. 1.814, autorizam a


deserdação dos ascendentes pelos descendentes:

I - ofensa física;
II - injúria grave;
III - relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a
do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da neta;
IV - desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave
enfermidade. (BRASIL, 2002.)

Consoante o Art. 1.961 do CC/2002, “os herdeiros necessários podem ser privados de sua
legítima, ou deserdados, em todos os casos em que podem ser excluídos da sucessão”.

Deve o testamento dispor sobre a declaração da causa da deserdação, expressamente,


conforme previsto no Art. 1.964 do mesmo diploma legal: “Somente com expressa declaração de
causa pode a deserdação ser ordenada em testamento” (BRASIL, 2002.)

Vejamos o prazo para propositura da ação de deserdação e seu termo inicial:

Art. 1.965. Ao herdeiro instituído, ou àquele a quem aproveite a deserdação,


incumbe provar a veracidade da causa alegada pelo testador.

Parágrafo único. O direito de provar a causa da deserdação extingue-se no prazo


de quatro anos, a contar da data da abertura do testamento. (BRASIL, 2002 –
grifo do autor.)
Da indignidade

Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I - Que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou


tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge,
companheiro, ascendente ou descendente;

II - Que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou


incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;

III - Que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da


herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade. (BRASIL,
2002.)

Como veremos a seguir, pela nova redação dada ao Art. 1.815 do CC/2002, o Ministério Público
passou a integrar o rol dos que podem demandar a exclusão de herdeiro ou legatário.

Da Legitimidade para Demandar a Exclusão do Herdeiro ou


Legatário

Art. 1.815. A exclusão do herdeiro ou legatário, em qualquer desses casos de


indignidade, será declarada por sentença.

§ 1º O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em


quatro anos, contados da abertura da sucessão.

§ 2º Na hipótese do inciso I do art. 1.814, o Ministério Público tem legitimidade


para demandar a exclusão do herdeiro ou legatário. (BRASIL, 2002.)
Além dos demais interessados, também o Ministério Público terá legitimidade para propor a
ação de exclusão na hipótese de o excluído ter sido coautor ou partícipe de homicídio doloso, ou
tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente
ou descendente.

Ainda é importante se atentar para o prazo decadencial a fim de se


demandar a aludida exclusão, que é de quatro anos.

Dos Efeitos da Exclusão do indigno

Os efeitos da exclusão não atingirão os sucessores do excluído, que serão chamados a suceder
no seu lugar. Vejamos a letra de lei:

Art. 1.816. São pessoais os efeitos da exclusão; os descendentes do herdeiro


excluído sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão.

Parágrafo único. O excluído da sucessão não terá direito ao usufruto ou à


administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança, nem à
sucessão eventual desses bens. (BRASIL, 2002.)

Ademais, os demais herdeiros do excluído serão chamados a suceder a quota que lhe caberia,
como se o excluído morto fosse antes da abertura da sucessão.

Da Reabilitação do Indigno

O indigno pode ser admitido a suceder se o ofendido expressamente o tiver reabilitado. Ou


seja, o indigno poderá suceder se o próprio autor da herança (trata-se de ato personalíssimo) o
tiver perdoado expressamente em testamento ou outro ato autêntico (como uma escritura pública,
por exemplo). Vejamos:

Art. 1.818. Aquele que incorreu em atos que determinem a exclusão da herança
será admitido a suceder, se o ofendido o tiver expressamente reabilitado em
testamento, ou em outro ato autêntico. (BRASIL, 2002.)

3.Direito das Coisas (arts. 196 ao 1.276 do CC)

Diferença entre Direitos Reais e Direito das Coisas

Direito das Coisas é o conjunto de normas direcionadas às relações jurídicas que envolvem
bens passíveis de apropriação pelo homem, ou seja, que são predispostas de valor econômico.

Sendo quaisquer bens que assim se descrevam, materiais ou imateriais.

Direito Real: é o direito absoluto capaz de subordinar determinada coisa à pessoa a quem
se acha diretamente vinculada, o seu dono. Os Direitos Reais são definidos em lei.

Direitos Obrigacionais Direitos das Coisas


Relação entre pessoas. Relação entre pessoa e coisa.

Eficácia inter partes: Direito de reclamar a Eficácia Absoluta: Possibilidade de


prestação tão somente do devedor. A reclamação da violação contra todos; efeito
terceiros, nada implica tal obrigação. “erga omnes”.

Violação pode ser por ato positivo (dar, Violação se dá sempre por ato positivo.
fazer) ou negativo (não fazer algo que
deveria ter feito).
Objeto: fato/comportamento (dar, fazer ou Objeto: coisa.
não fazer).

Prestação pode ser determinada ou Prestação é sempre determinada.


determinável.

Da Propriedade

Conforme conceitua Flávio Tartuce, pode-se definir a propriedade como o direito que
alguém possui em relação a um bem determinado. Trata-se de um direito fundamental,
protegido no art. 5.º, inc. XXII, da Constituição Federal, mas que deve sempre atender a uma
função social, em prol de toda a coletividade. A propriedade é preenchida a partir dos atributos
que constam do Código Civil de 2002 (art. 1.228), sem perder de vista outros direitos, sobretudo
aqueles com substrato constitucional.

A propriedade está relacionada a quatro atributos, previstos no caput do art. 1.228 do


CC/2002, cuja redação é a seguinte: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da
coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou
detenha”. O dispositivo apresenta diferenças substanciais em relação ao art. 524 do CC/1916,
cujo caput previa que “A lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus
bens, e de reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua”. Isso porque não há
mais a previsão da existência de direitos relativos ao uso, fruição e disposição da coisa, mas sim
de faculdades jurídicas, o que foi feito no sentido de abrandar o sentido do texto legal. Como
afirmam Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, “nos dias de hoje, a propriedade não
é mais considerada um direito ilimitado, como no passado”.17

17
TARTUCE, Flávio. MANUAL DE DIREITO CIVIL. 9° Edição. Método, 2019.
1. Faculdade de gozar ou fruir da coisa (antigo ius fruendi) – trata-se da faculdade
de retirar os frutos da coisa, que podem ser naturais, industriais ou civis (os frutos
civis são os rendimentos). Exemplificando, o proprietário de um imóvel urbano
poderá locá-lo a quem bem entender, o que representa exercício direto da
propriedade.

2. Direito de reivindicar a coisa contra quem injustamente a possua ou a detenha


(ius vindicandi) – esse direito será exercido por meio de ação petitória, fundada
na propriedade, sendo a mais comum a ação reivindicatória, principal ação real
fundada no domínio (rei vindicatio). Nessa demanda, o autor deve provar o seu
domínio, oferecendo prova da propriedade, com o respectivo registro e
descrevendo o imóvel com suas confrontações. A ação petitória não se confunde
com as ações possessórias, sendo certo que nestas últimas não se discute a
propriedade do bem, mas a sua posse. Prevalece o entendimento de
imprescritibilidade dessa ação (por todos: STJ, REsp 216.117/RN, 3.ª Turma, Rel.
Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 03.12.1999, DJ 28.02.2000, p. 78). O caput
do art. 1.228 do CC possibilita expressamente que a ação reivindicatória seja
proposta contra quem injustamente possua ou detenha a coisa. O exemplo típico
envolve a ação proposta contra um caseiro, que ocupa o imóvel em nome de um
invasor (injusto possuidor).

3. Faculdade de usar a coisa, de acordo com as normas que


regem o ordenamento jurídico (antigo ius utendi) – esse atributo
encontra limites na CF/1988, no CC/2002 (v.g., regras quanto à
vizinhança) e em leis específicas, caso do Estatuto da Cidade (Lei
10.257/2001).

4. Faculdade de dispor da coisa (antigo ius disponendi), seja por atos inter vivos
ou mortis causa – como atos de disposição podem ser mencionados a compra e
venda, a doação e o testamento
Para findar o tópico, é fundamental verificar o conceito de domínio, que para muitos é
sinônimo de propriedade. Todavia, há quem entenda de forma contrária, caso de Cristiano
Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, que lecionam:

“O domínio é instrumentalizado pelo direito de propriedade. Ele consiste na


titularidade do bem. Aquele se refere ao conteúdo interno da propriedade. O
domínio, como vínculo real entre o titular e a coisa, é absoluto. Mas, a
propriedade é relativa, posto ser intersubjetiva e orientada à funcionalização do
bem pela imposição de deveres positivos e negativos de seu titular perante a
coletividade. Um existe em decorrência do outro. Cuida-se de conceitos
complementares e comunicantes que precisam ser apartados, pois em várias
situações o proprietário – detentor da titularidade formal – não será aquele que
exerce o domínio (v.g., usucapião antes do registro; promessa de compra e venda
após a quitação). Veremos adiante que a propriedade recebe função social, não
o domínio em si”.

Principais características do direito de propriedade

A propriedade, como direito real por excelência, tem características muito próximas dos
direitos reais expostos no início do capítulo. Vejamos tais caracteres, à luz da melhor doutrina,
clássica e contemporânea, consultada para a composição deste livro:18
1. Direito absoluto, em regra, mas que deve ser relativizado em algumas situações –
ficou claro que a propriedade é o mais completo dos direitos reais. Diante do seu
caráter erga omnes, ou seja, contra todos, é comum afirmar que a propriedade é um
direito absoluto. Também no sentido de certo absolutismo, o proprietário pode
desfrutar da coisa como bem entender. Porém, existem claras limitações dispostas no
interesse do coletivo, caso da função social e socioambiental da propriedade (art. 1.228,
§ 1.º, do CC).

18
TARTUCE, Flávio. MANUAL DE DIREITO CIVIL. 9° Edição. Método, 2019.
Além disso, não se pode esquecer a comum coexistência de um direito de propriedade
frente aos outros direitos da mesma espécie, nos termos do art. 1.231 do CC, pelo qual se
admite a prova em contrário da propriedade de determinada pessoa. A propriedade deve
ser relativizada se encontrar pela frente um outro direito fundamental protegido pelo Texto
Maior. Por isso é que se pode dizer que a propriedade é um direito absoluto, regra geral,
mas que pode e deve ser relativizado em muitas situações.

2. Direito exclusivo – determinada coisa não pode pertencer a mais de uma pessoa, salvo
os casos de condomínio ou copropriedade, hipótese que também não retira o seu
caráter de exclusividade. Isso justifica a presente característica, a ser retirada do art.
1.231 do CC, pelo qual a propriedade presume-se plena e exclusiva, salvo prova ou
previsão em contrário (presunção relativa ou iuris tantum). É correto afirmar que, apesar
de ser um direito exclusivo, a propriedade envolve interesses indiretos de outras
pessoas, e até de toda a sociedade, que almejam o atendimento à sua função social.

3. Direito perpétuo – o direito de propriedade permanece independentemente do seu


exercício, enquanto não houver causa modificativa ou extintiva, sejam elas de origem
legal ou convencional. A propriedade, por tal característica, pode ser comparada a um
motor em constante funcionamento, que não para, em regra (moto contínuo), a não
ser que surja um fato novo que interrompa o seu funcionamento.

4. Direito elástico – característica que é atribuída, na doutrina nacional, a Orlando Gomes,


a propriedade pode ser distendida ou contraída quanto ao seu exercício, conforme
sejam adicionados ou retirados os atributos que são destacáveis. Na propriedade plena,
o direito se encontra no grau máximo de elasticidade, havendo uma redução nos
direitos reais de gozo ou fruição e nos direitos reais de garantia.
5. Direito complexo – por tudo o que está sendo exposto, a propriedade é um direito
por demais complexo, particularmente pela relação com os quatro atributos constantes
do caput do art. 1.228 do CC.

6. Direito fundamental – não se pode esquecer que a propriedade é um direito


fundamental, pelo que consta do art. 5.º, XXII e XXIII, da Constituição Federal. Esse
caráter faz que a proteção do direito de propriedade e a correspondente função social
sejam aplicados de forma imediata nas relações entre particulares, pelo que consta do
art. 5.º, § 1.º, do Texto Maior (eficácia horizontal dos direitos fundamentais). Em reforço,
o direito de propriedade pode ser ponderado frente a outros direitos tidos como
fundamentais, caso da dignidade humana (art. 1.º, III, da CF/1988), particularmente
naqueles casos de difícil solução (técnica de ponderação). Reafirme-se que essa técnica
foi adotada expressamente pelo art. 489, § 2.º, do Novo Código de Processo Civil.

Formas de aquisição da propriedade imóvel

Como ocorre na posse e também nos demais direitos, a propriedade admite formas de
aquisição originárias e derivadas. Nas formas originárias, há um contato direto da pessoa com a
coisa, sem qualquer intermediação pessoal. Nas formas derivadas, há intermediação subjetiva.

 Das acessões naturais e artificiais

Nos termos do art. 1.248 do CC, as acessões constituem o modo originário de aquisição da
propriedade imóvel em virtude do qual passa a pertencer ao proprietário tudo aquilo que foi
incorporado de forma natural ou artificial. Como acessões naturais estão previstas a formação de
ilhas, a aluvião, a avulsão e o abandono do álveo. Como acessões artificiais, decorrentes da
intervenção humana, o atual Código disciplina as plantações e as construções.
a) Da formação de ilhas

1.ª Regra. As ilhas que se formarem no meio do rio consideram-se acréscimos


sobrevindos aos terrenos ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na proporção
de suas testadas, até a linha que dividir o álveo em duas partes iguais.

2.ª Regra. As ilhas que se formarem entre a referida linha e uma das margens
consideram-se acréscimos aos terrenos ribeirinhos fronteiros desse mesmo lado.

3.ª Regra. As ilhas que se formarem pelo desdobramento de um novo braço do rio
continuam a pertencer aos proprietários dos terrenos à custa dos quais se
constituírem.

b) Da aluvião

Determina o caput do art. 1.250 do CC que “Os acréscimos formados, sucessiva e


imperceptivelmente, por depósitos e aterros naturais ao longo das margens das correntes, ou
pelo desvio das águas destas, pertencem aos donos dos terrenos marginais, sem indenização”.
Enuncia o seu parágrafo único que “O terreno aluvial, que se formar em frente de prédios de
proprietários diferentes, dividir-se-á entre eles, na proporção da testada de cada um sobre a
antiga margem”. Portanto, duas são as modalidades de aluvião tratadas.

Aluvião própria – é o acréscimo paulatino de terras às margens de um curso de água,


de forma lenta e imperceptível; depósitos naturais ou desvios das águas. Esses
acréscimos pertencem aos donos dos terrenos marginais, seguindo a regra de que o
acessório segue o principal. Didaticamente, pode-se dizer que na aluvião própria a terra
vem. Para ilustrar, A tem um rancho à beira de um rio, destinado às suas pescarias. Aos
poucos a sua propriedade vai aumentando, pois, um movimento de águas traz terra para
a sua margem.
Aluvião imprópria – as partes descobertas pelo afastamento das águas de um curso
são assim denominadas, hipótese em que a água vai, ou seja, do rio que vai embora. A
percebe que adquiriu propriedade, pois o rio que fazia frente ao seu rancho recuou.

c) Avulsão

Nos termos do art. 1.251, caput, do CC, quando, por força natural violenta, uma porção de
terra se destacar de um prédio e se juntar a outro, o dono deste adquirirá a propriedade do
acréscimo, se indenizar o dono do primeiro ou, sem indenização, se, em um ano, ninguém houver
reclamado. O esquema a seguir expõe que a avulsão é uma faixa de terra avulsa, que se desloca
de um terreno, por força natural de corrente, para se juntar a outro.

d) Álveo abandonado

Conforme o art. 9.º do Código de Águas, o álveo é a superfície que as águas cobrem sem
transbordar para o solo natural e ordinariamente enxuto. Assim sendo, o álveo abandonado é o
rio ou a corrente de água que seca (o rio que desaparece). No que interessa à aquisição da
propriedade, prevê o art. 1.252 do CC que o álveo abandonado de corrente pertence aos
proprietários ribeirinhos das duas margens, sem que tenham indenização os donos dos terrenos
por onde as águas abrirem novo curso, entendendo-se que os prédios marginais se estendem
até o meio do álveo.

e) As plantações e as construções

1ª Regra: Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno próprio com sementes, plantas
ou materiais alheios, adquire a propriedade destes; mas fica obrigado a pagar-lhes o valor,
além de responder por perdas e danos, se agiu de má-fé (art. 1.254 do CC). Exemplo: alguém
está guardando, por ato de amizade, cimento de um parente em sua fazenda. Certo dia, essa
pessoa utiliza o cimento e constrói um galpão na propriedade. No caso em questão, o
fazendeiro terá a propriedade do que foi construído, mas por óbvio terá que pagar ao amigo
o cimento, sem prejuízo de outros danos, pois claramente agiu de má-fé. O fazendeiro sabia
perfeitamente que o cimento não era seu, havendo desrespeito à boa-fé subjetiva, surgindo
daí a responsabilidade civil, pois a má-fé induz à culpa.
2ª Regra: Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do
proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a
indenização. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno,
aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante
pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo (art. 1.255 do CC, caput
e parágrafo único). Duas são as situações descritas. Primeiro, ilustrando, alguém está ocupando
a casa de um parente que está viajando para o exterior por um ano. Aproveitando a ausência
do familiar, essa pessoa constrói, com material próprio, uma piscina no fundo da casa. O
ocupante não terá qualquer direito, pois agiu de má-fé, já que sabia que a propriedade não
seria sua. Se agiu de boa-fé na construção, como no caso de algo que visava proteger o
imóvel de uma destruição, terá direito à indenização. Como segunda situação, se realizada de
boa-fé e a construção ou plantação tiver valor superior ao do imóvel, aquele que construiu
ou plantou adquirirá a propriedade do último, tendo apenas que pagar uma indenização a ser
fixada judicialmente, se não houver acordo entre as partes (art. 1.255, parágrafo único, do CC).
Esse último dispositivo, novidade no atual Código Civil, acaba por considerar como principal
a plantação ou a construção, fazendo com que o terreno o acompanhe, consagração do que
se denomina como acessão inversa ou invertida, o que está de acordo com o princípio da
função social da propriedade.

3ª Regra: Se de ambas as partes houve má-fé, adquirirá o proprietário as sementes, plantas


e construções, devendo ressarcir o valor das acessões. Presume-se má-fé do proprietário
quando o trabalho de construção, ou lavoura, se fez em sua presença e sem impugnação sua
(art. 1.256 do CC, caput e parágrafo único). Para concretizar, o proprietário de um imóvel deixa
que alguém construa uma piscina com os seus materiais, nos fundos da casa, pensando o
último que por isso poderá adquirir o domínio do bem principal. No caso descrito, há uma
má-fé recíproca ou bilateral, pois ambos pretendem o enriquecimento sem causa. O
proprietário da casa ficará com a piscina, mas deverá indenizar o outro pelos valores gastos
com a sua construção. O parágrafo único do art. 1.256 do CC traz ainda uma presunção relativa
de má-fé, quando a construção ou a plantação foi feita na presença do proprietário do imóvel
e sem qualquer impugnação. Em complemento, conforme o art. 1.257 do Código Civil, o
estabelecido no último dispositivo aplica-se ao caso de não pertencerem as sementes, plantas
ou materiais a quem de boa-fé os empregou em solo alheio. Ademais, o parágrafo único do
preceito determina que o proprietário das sementes, plantas ou materiais poderá cobrar do
proprietário do solo a indenização devida, quando não puder havê-la do plantador ou
construtor. A título de ilustração, recente aresto do Tribunal da Cidadania aplicou tal direito
de cobrança contra o proprietário do terreno a hipótese envolvendo empresa de engenharia
que realizou construção em terreno da Mitra Diocesana de Brasília. Como o Instituto Bíblico
local – que a havia contratado – não realizou os pagamentos devidos, foi reconhecido o direito
de reaver os valores gastos na obra em relação à Mitra Diocesana, de forma precisa e correta
(STJ, REsp 963.199/DF , 4.ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 11.10.2016, DJe 07.11.2016).

4ª Regra: Se a construção, feita parcialmente em solo próprio, invade solo alheio em


proporção não superior à vigésima parte deste, adquire o construtor de boa-fé a propriedade
da parte do solo invadido, se o valor da construção exceder o dessa parte, e responde por
indenização que represente, também, o valor da área perdida e a desvalorização da área
remanescente (art. 1.258, caput, do CC). Exemplo: alguém que constrói em sua propriedade
uma churrasqueira com cobertura, que vem a invadir o terreno alheio em percentual não
superior a 5% deste. Se a construção foi feita de boa-fé, ou seja, se o construtor não sabe da
invasão, poderá adquirir a parte invadida, desde que a construção exceda o que se invadiu.
Todavia, o construtor deverá indenizar o vizinho pela área que o último perdeu e por eventual
desvalorização do imóvel restante, se for o caso.

5ª Regra: Pagando em décuplo as perdas e danos previstos no art. 1.258, o construtor de


má-fé adquire a propriedade da parte do solo que invadiu, se em proporção à vigésima parte
deste e se o valor da construção exceder consideravelmente o dessa parte e não se puder
demolir a porção invasora sem grave prejuízo para a construção (art. 1.258, parágrafo único,
do CC). O comando legal está a prever o pagamento de dez vezes as perdas e danos ao
proprietário do imóvel invadido – que incluem o valor que a invasão acresceu à construção, a
área perdida e o correspondente à desvalorização do remanescente –, por parte do invasor
de má-fé. Isso se o percentual da invasão for de, pelo menos, 5% ou um vigésimo da área
total invadida. Sendo indenizado aquele que perdeu parte do bem, o construtor adquire a
propriedade do que se invadiu, desde que não seja possível a demolição da parte invasora e
sem que haja prejuízo à construção. Na IV Jornada de Direito Civil, aprovou-se o Enunciado
n. 318, prevendo que “O direito à aquisição da propriedade do solo em favor do construtor
de má-fé (art. 1.258, parágrafo único) somente é viável quando, além dos requisitos explícitos
previstos em lei, houver necessidade de proteger terceiros de boa-fé”.
6ª Regra: Se o construtor estiver de boa-fé, e a invasão do solo alheio exceder a vigésima
parte deste, adquire a propriedade da parte do solo invadido, e responde por perdas e danos
que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da área perdida e o da
desvalorização da área remanescente. Se o construtor estiver de má-fé, será obrigado a
demolir o que nele construiu, pagando as perdas e danos apurados, que serão devidos em
dobro (art. 1.259 do CC). A regra está relacionada com uma invasão por construtor superior a
5%, ou melhor, um vigésimo. Em uma primeira situação, se a invasão superior a um vigésimo
for de boa-fé, o construtor invasor adquire a propriedade do que foi invadido, mas responde
pelas perdas e danos correspondentes ao valor que a invasão acrescer à sua construção, ao
valor da área perdida e ao correspondente à desvalorização da área remanescente. Em
complemento, o dispositivo determina que se a invasão superior a um vigésimo ou 5% tiver
sido de má-fé, o proprietário do imóvel invadido poderá requerer a sua demolição, sendo
cabível, do ponto de vista processual, a ação demolitória. Além disso, poderá pedir as perdas
e danos mencionados, em dobro.

Posse

 Da usucapião de bens imóveis

Consoante os ensinamentos de Flávio Tartuce, “Na esteira da melhor doutrina, a usucapião –


grafada pelo CC/2002 no feminino –, constitui uma situação de aquisição do domínio, ou mesmo
de outro direito real (caso do usufruto ou da servidão), pela posse prolongada. Assim, permite a
lei que uma determinada situação de fato alongada por certo intervalo de tempo se transforme
em uma situação jurídica (a aquisição originária da propriedade). A usucapião garante a
estabilidade da propriedade, fixando um prazo, além do qual não se podem mais levantar dúvidas
a respeito de ausência ou vícios do título de posse. De certo modo, a função social da propriedade
acaba sendo atendida por meio da usucapião. ”
 Vejamos quais são as principais características que deve ter a posse ad
usucapionem:

1. Posse com intenção de dono (animus domini) – entra em cena o conceito de posse de
Savigny, que tem como conteúdo o corpus (domínio fático) e o animus domini (intenção
de dono). Essa intenção de dono não está presente, em regra, em casos envolvendo
vigência de contratos, como nas hipóteses de locação, comodato e depósito.

2. Posse mansa e pacífica – exercida sem qualquer manifestação em contrário de quem


tenha legítimo interesse, ou seja, sem a oposição do proprietário do bem. Se em algum
momento houver contestação dessa posse pelo proprietário, desaparece o requisito da
mansidão.

3. Posse contínua e duradoura, em regra, e com determinado lapso temporal – posse sem
intervalos, sem interrupção. Como exceção a ser estudada, o art. 1.243 do CC admite a
soma de posses sucessivas ou accessio possessionis. Quanto à duração, há prazos
estabelecidos em lei, de acordo com a correspondente modalidade de usucapião. Cumpre
destacar a aprovação de interessante enunciado na V Jornada de Direito Civil, realizada em
2011 estabelecendo que “O prazo, na ação de usucapião, pode ser completado no curso
do processo, ressalvadas as hipóteses de má-fé processual do autor” (Enunciado n. 497 do
CJF/STJ).

4. Posse justa – a posse usucapível deve se apresentar sem os vícios objetivos, ou seja, sem
a violência, a clandestinidade ou a precariedade. Se a situação fática for adquirida por meio
de atos violentos ou clandestinos, não induzirá posse, enquanto não cessar a violência ou
a clandestinidade (art. 1.208, 2.ª parte, do CC). Este autor, frise-se, também é favorável ao
convalescimento da posse precária.

5. Posse de boa-fé e com justo título, em regra – a usucapião ordinária, seja de bem imóvel
ou móvel, exige a boa-fé e o justo título (arts. 1.242 e 1.260 do CC). Para outras
modalidades de usucapião, tais requisitos são até dispensáveis, como se verá mais adiante,
havendo uma presunção absoluta ou iure et de iure de sua presença.

Aposte neste tema, conheça seus principais pontos e características.

Atente-se à recente Lei da multipropriedade!

Regras do Condomínio

 Neste tópico, importante atentar-se ao que a legislação afirma:

Art. 1.314. Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, sobre
ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro,
defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la.

Parágrafo único. Nenhum dos condôminos pode alterar a destinação da coisa


comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a estranhos, sem o consenso dos
outros.
Art. 1.315. O condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer
para as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que
estiver sujeita.

Parágrafo único. Presumem-se iguais as partes ideais dos condôminos.

Art. 1.316. Pode o condômino eximir-se do pagamento das despesas e dívidas,


renunciando à parte ideal.

§ 1 o
Se os demais condôminos assumem as despesas e as dívidas, a renúncia
lhes aproveita, adquirindo a parte ideal de quem renunciou, na proporção dos
pagamentos que fizerem.

§ 2 o Se não há condômino que faça os pagamentos, a coisa comum será dividida.

Art. 1.317. Quando a dívida houver sido contraída por todos os condôminos,
sem se discriminar a parte de cada um na obrigação, nem se estipular
solidariedade, entende-se que cada qual se obrigou proporcionalmente ao seu
quinhão na coisa comum.

Art. 1.318. As dívidas contraídas por um dos condôminos em proveito da


comunhão, e durante ela, obrigam o contratante; mas terá esta ação regressiva
contra os demais.

Art. 1.319. Cada condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da
coisa e pelo dano que lhe causou.

Art. 1.320. A todo tempo será lícito ao condômino exigir a divisão da coisa
comum, respondendo o quinhão de cada um pela sua parte nas despesas da
divisão.

§ 1 o Podem os condôminos acordar que fique indivisa a coisa comum por prazo
não maior de cinco anos, suscetível de prorrogação ulterior.

§ 2 o Não poderá exceder de cinco anos a indivisão estabelecida pelo doador ou


pelo testador.

§ 3 o A requerimento de qualquer interessado e se graves razões o aconselharem,


pode o juiz determinar a divisão da coisa comum antes do prazo.

Art. 1.321. Aplicam-se à divisão do condomínio, no que couber, as regras de


partilha de herança (arts. 2.013 a 2.022).
Art. 1.322. Quando a coisa for indivisível, e os consortes não quiserem adjudicá-
la a um só, indenizando os outros, será vendida e repartido o apurado,
preferindo-se, na venda, em condições iguais de oferta, o condômino ao
estranho, e entre os condôminos aquele que tiver na coisa benfeitorias mais
valiosas, e, não as havendo, o de quinhão maior.

Parágrafo único. Se nenhum dos condôminos tem benfeitorias na coisa comum


e participam todos do condomínio em partes iguais, realizar-se-á licitação entre
estranhos e, antes de adjudicada a coisa àquele que ofereceu maior lanço,
proceder-se-á à licitação entre os condôminos, a fim de que a coisa seja
adjudicada a quem afinal oferecer melhor lanço, preferindo, em condições iguais,
o condômino ao estranho.

 Entre os direitos do condômino, estão:

 Utilizar livremente de suas unidades e usar as partes comuns, conforme sua destinação,
desde que não exclua a utilização dos demais moradores.
 Participar e votar nas assembleias, desde que esteja com as despesas em dia.

 Deveres do condômino:

 Contribuir para as despesas do condomínio;


 Não realizar obras que comprometam a segurança da edificação;
 Não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;
 Não prejudicar o sossego, salubridade e segurança dos demais moradores.

 Multas
 Teto da multa por atraso de pagamento das taxas condominiais: 2%;
 Teto da multa por conduta antissocial: pode ser 10 vezes o valor da taxa condominial;
 Teto da multa por descumprimento das normas: com aprovação de 3/4 dos
condôminos, será possível aplicar multa de até 5 vezes o valor da taxa condominial
para infratores reincidentes.

 Eleição do síndico e conselho fiscal:


 A assembleia escolherá um síndico, que poderá não ser condômino, para administrar
o condomínio, por prazo não superior a dois anos, o qual poderá renovar-se;
 Poderá haver no condomínio um conselho fiscal, composto de 3 membros, eleitos pela
assembleia, por prazo não superior a 2 anos, que deverá aprovar as contas do síndico.

 Funções e deveres do síndico


 Convocar a assembleia dos condôminos;
 Dar imediato conhecimento à assembleia da existência de procedimento judicial ou
administrativo, de interesse do condomínio;
 Cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da
assembleia;
 Diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos
serviços que interessem aos possuidores;
 Elaborar o orçamento da receita e da despesa relativa a cada ano;
 Cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas
devidas;
 Prestar contas à assembleia, anualmente e quando exigido;
 Realizar o seguro da edificação.

 Obras
 Se a obra for voluptuária (para embelezamento da fachada, por exemplo), sua realização
depende de voto de 2/3 dos condôminos. Se for obra útil, o voto da maioria é
suficiente;
 As obras ou reparações necessárias podem ser realizadas, independentemente de
autorização, pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer
condômino;
 Se as obras ou reparos necessários forem urgentes e forem gerar despesas excessivas,
o síndico ou o condômino que tomou a iniciativa deverá convocar a assembleia e
comunicá-la;
 Não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários que demandem despesas altas
somente poderão ser efetuadas após autorização da assembleia;
 O condômino que realizar obras ou reparos necessários será reembolsado das despesas
que efetuar. Mas não tem direito à restituição dos gastos que tiver com obras ou
reparos de outra natureza, mesmo que de interesse comum;
 A realização de obras para aumentar a utilização de estruturas de uso comum já
existentes depende da aprovação de 2/3 dos votos dos condôminos.
 O Código Civil deve ser a base para a elaboração da Convenção do Condomínio e do
Regimento Interno. Também oferece orientações sobre as Assembleias.

 Convenção do Condomínio
 A Convenção do Condomínio tem caráter estatutário ou institucional. Detalha regras
sobre quota proporcional e modo de pagamento das despesas do condomínio, forma
de administração, realização de assembleias e penalidades.
 Deve ser respeitada por todos os moradores. Para ter validade perante terceiros, precisa
ser registrada no Cartório de Registro de Imóveis.
 Uma convenção pode ser aprovada com a assinatura de 2/3 dos proprietários.

 Regimento Interno
 É elaborado pelos próprios condôminos para estabelecer regras sobre a conduta
de moradores e funcionários, uso de áreas e equipamentos compartilhados,
proibições, etc. Essas deliberações podem ser aprovadas por maioria simples.
 Deve ser parte da Convenção do Condomínio e registrada em Cartório. Trata-se de
um dispositivo que requer constante atualização, para se adaptar às mudanças
sociais e ao perfil dos ocupantes dos condomínios.
 Assembleias
 As Assembleias devem acontecer, no mínimo, uma vez ao ano. Tem o objetivo de
aprovar despesas, contribuições dos condôminos, prestação de contas e,
eventualmente, eleger o síndico substituto.
 Nas Assembleias, também é possível alterar a Convenção do Condomínio (com 2/3
dos votos dos condôminos) e o Regimento Interno (com maioria simples).

A desapropriação judicial privada por posse-trabalho (art.


1.228, §§ 4.º e 5.º, do CC/2002)

 Vejamos a redação dos dispositivos supracitados:

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o


direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou
detenha.

§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas


finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de
conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas
naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como
evitada a poluição do ar e das águas.

§ 2º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade,


ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.

§ 3º O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por


necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição,
em caso de perigo público iminente.

§ 4º O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado


consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco
anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em
conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse
social e econômico relevante.

§ 5º No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida


ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do
imóvel em nome dos possuidores.

Consoante os ensinamentos de Tartuce 19, não há dúvidas de que o instituto aqui estudado
constitui uma modalidade de desapropriação e não de usucapião, como pretende parte da
doutrina. Isso porque o § 5.º do art. 1.228 do CC consagra o pagamento de uma justa indenização,
não admitindo o nosso sistema jurídico a usucapião onerosa. A propósito de distinção, Jones
Figueiredo Alves e Mário Luiz Delgado elencavam quatro diferenças fundamentais entre essa
forma de desapropriação e a usucapião coletiva urbana, prevista no art. 10 do Estatuto da Cidade
(Lei 10.257/2001). Pontue-se que a norma foi alterada pela Lei 13.465/2017, conforme anotações
de atualização a seguir:

1. Na usucapião coletiva urbana, os ocupantes deveriam ser de baixa renda; na


desapropriação judicial privada, não há essa necessidade. Com a Lei 13.645/2017,
a lei deixou de mencionar as famílias de baixa renda, passando a mencionar
“núcleos urbanos informais existentes”. Assim, houve a substituição de um critério
subjetivo – levando-se em conta a situação econômica dos ocupantes –, por um
objetivo – a situação da área.
2. Na usucapião coletiva urbana, a área deveria ter, no mínimo, 250 m², exigência
que não está presente na desapropriação judicial privada, bastando uma “extensa
área”. Com a alteração do Estatuto da Cidade pela Lei 13.465/2017, está previsto
que a área total, dividida pelo número de possuidores, deve ser inferior a
duzentos e cinquenta metros quadrados, para cada possuidor. Portanto, não há
mais menção a uma área mínima total, considerando-se as áreas individualizadas.
De todo modo, nota-se que a lei específica continua a adotar um critério métrico
relativo à área, o que não ocorre com o instituto previsto no Código Civil.

19
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
3. A usucapião coletiva somente se aplica aos imóveis urbanos, enquanto a
desapropriação judicial privada pode ser aplicada aos imóveis urbanos ou rurais.
4. Na usucapião, não há direito à indenização, ao contrário da desapropriação
judicial privada.

4.Direito das Obrigações (arts. 233 ao 420 do CC)

Conceitua-se a obrigação como sendo a relação jurídica transitória, existente entre um


sujeito ativo, denominado credor, e outro sujeito passivo, o devedor, e cujo objeto consiste
em uma prestação situada no âmbito dos direitos pessoais, positiva ou negativa. Havendo
o descumprimento ou inadimplemento obrigacional, poderá o credor satisfazer-se no
patrimônio do devedor.20

Elementos constitutivos da obrigação

 Elementos subjetivos: o credor (sujeito ativo) e o devedor (sujeito passivo).

Sujeito ativo – é o beneficiário da obrigação, podendo ser uma pessoa natural ou jurídica
ou, ainda, um ente despersonalizado a quem a prestação é devida. É denominado credor,
sendo aquele que tem o direito de exigir o cumprimento da obrigação.

Sujeito passivo – é aquele que assume um dever, na ótica civil, de cumprir o conteúdo da
obrigação, sob pena de responder com seu patrimônio. É denominado devedor.

 Elemento objetivo imediato: a prestação.

20
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
Trata-se do conteúdo da obrigação. O objeto imediato da obrigação, perceptível de plano,
é a prestação, que pode ser positiva ou negativa. Sendo a obrigação positiva, ela terá como
conteúdo o dever de entregar coisa certa ou incerta (obrigação de dar) ou o dever de
cumprir determinada tarefa (obrigação de fazer). Sendo a obrigação negativa, o conteúdo
é uma abstenção (obrigação de não fazer).
Por outro lado, percebe-se que o objeto mediato da obrigação pode ser uma coisa ou uma
tarefa a ser desempenhada, positiva ou negativamente. Como exemplo de objeto mediato
da obrigação, pode ser citado um automóvel ou uma casa em relação a um contrato de
compra e venda. Esse também é o objeto imediato da prestação.

A obrigação em si, para ter validade, deve ser também economicamente


apreciável. A violação dessas regras gera a nulidade da relação obrigacional, sendo
aplicado o art. 166 do CC/2002.

 Elemento imaterial, virtual ou espiritual: o vínculo existente entre as partes.


O elemento em questão é o vínculo jurídico existente na relação obrigacional, ou seja, é o
elo que sujeita o devedor à determinada prestação – positiva ou negativa –, em favor do
credor, constituindo o liame legal que une as partes envolvidas. A melhor expressão desse
vínculo está estabelecida no art. 391 do CC 2002, com a previsão segundo a qual todos os
bens do devedor respondem no caso de inadimplemento da obrigação. Esse artigo traz o
princípio da responsabilidade patrimonial do devedor, sendo certo que a prisão civil por
dívidas não constitui regra de nosso ordenamento jurídico, mas exceção. Como se sabe, a
prisão civil somente seria possível em duas hipóteses, conforme prevê literalmente o art. 5.º,
LXVII, da CF/1988, nos casos de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação
alimentícia ou nos casos envolvendo o depositário infiel.
Quanto à última hipótese legal, houve uma mudança substancial diante da Emenda
Constitucional 45. Isso porque o Supremo Tribunal Federal, recentemente, afastou a
possibilidade de prisão por dívida do depositário infiel, havendo depósito típico, atípico
ou judicial. A conclusão girou em torno da Emenda Constitucional 45, que deu aos tratados
internacionais de direitos humanos o status constitucional, ou supralegal. É cediço que o
Brasil é signatário da Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto de São José
da Costa Rica), que proíbe a prisão civil por descumprimento contratual, não sendo a prisão
civil no depósito compatível com a realidade constitucional brasileira (cf. julgados
publicados no Informativo n. 531 do STF, de dezembro de 2008). Mais recentemente, em
2009, deixando bem clara essa opção, foi editada pelo STF a Súmula Vinculante 25, com
seguinte teor: “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade
do depósito”.

Espécies de Obrigação quanto ao seu conteúdo

 Obrigação de dar:
A obrigação de dar é aquela em que o sujeito passivo compromete-se a entregar algo, certo
ou incerto. Há, na maioria das vezes, uma intenção de transmissão da propriedade de uma
coisa, móvel ou imóvel.
a) Obrigação de dar coisa certa (arts. 233 a 242 do CC)
Ocorre quando o devedor se obriga a dar uma coisa única, móvel ou imóvel, cujas
características foram acertadas entre as partes, geralmente em um instrumento negocial.

Na obrigação de dar coisa certa, o credor não é obrigado a receber outra


coisa, ainda que mais valiosa, conforme consta no art. 313 do Código Civil.
b) Obrigação de dar coisa incerta (arts. 243 a 246 do CC)
Esta obrigação tem por objeto uma coisa indeterminada, ao menos inicialmente, sendo
ela somente indicada pelo gênero e pela quantidade, restando uma indicação posterior
quanto à sua qualidade que, em regra, cabe ao devedor, ou seja, o objeto deve ser
determinável, consoante o art. 104, inc. II, do CC.

Exemplo: As partes pactuam a entrega de um animal que faz parte do rebanho do


vendedor (devedor da coisa). Nesse caso, haverá a necessidade de determinação futura
do objeto, por meio de uma escolha.

 Obrigação de fazer

A obrigação de fazer é caracterizada por uma prestação que consiste no cumprimento de


uma tarefa ou atribuição por parte do devedor. Exemplos típicos ocorrem na prestação de
serviço e no contrato de empreitada de certa obra.

a) Obrigação de fazer fungível


É que aquela que ainda pode ser cumprida por outra pessoa, à custa do devedor
originário, por sua natureza ou previsão no instrumento.

b) Obrigação de fazer infungível


É aquela que tem natureza personalíssima, em decorrência de regra constante do
instrumento obrigacional ou pela própria natureza da prestação.

 A obrigação de não fazer

Tem como objeto a abstenção de uma conduta.

Art. 390. Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde
o dia em que executou o ato de que se devia abster.
Ou seja, o descumprimento da obrigação negativa se dá quando o ato é praticado. A
obrigação de não fazer é quase sempre infungível, personalíssima, sendo também
predominantemente indivisível pela sua natureza, nos termos do art. 258 do Código Civil.

Diferenças entre solidariedade e indivisibilidade

SOLIDARIEDADE INDIVISIBILIDADE
Baseia-se na relação jurídica subjetiva Baseia-se na relação jurídica objetiva

Cada devedor solidário pode ser obrigado a Quando há pluralidade de credor e/ou
pagar, individualmente, a dívida inteira. devedores, cada um é responsável pela dívida
toda, e o devedor que paga a dívida inteira sub-
roga-se no direito do credor, havendo ação de
regresso em relação aos demais coobrigados.

É a vontade das partes ou a disposição da lei É a natureza da prestação que impede a


que o impede. repartição em tantas quantas sejam os sujeitos

A responsabilidade continua para todos os Ocorrendo a perda da coisa, há conversão da


devedores, mesmo que a prestação se prestação em dinheiro e, consequentemente, a
converta em perdas e danos. indivisibilidade deixa de existir, ficando cada
devedor responsável apenas por sua quota parte.

A solidariedade cessa com a morte, não se A indivisibilidade se transmite aos sucessores


transmitindo aos sucessores, como tal.

Consiste em reforçar o direito do credor, em Destina-se a tornar possível a realização unitária


parte como garantia, em parte como da obrigação.
favorecimento da satisfação do crédito.
Cessão de crédito e débito
 Cessão de Crédito:

De acordo com os ensinamentos de Tartuce, a cessão de crédito pode ser conceituada


como um negócio jurídico bilateral ou sinalagmático, gratuito ou oneroso, pelo qual o credor,
sujeito ativo de uma obrigação, transfere a outrem, no todo ou em parte, a sua posição na
relação obrigacional. Aquele que realiza a cessão a outrem é denominado cedente. A pessoa
que recebe o direito de credor é o cessionário, enquanto o devedor é denominado cedido. A
última expressão não é recomendável, pois a pessoa não se transmite, mas tão somente a sua
dívida. De qualquer forma, como a doutrina a utiliza, aqui será feito o mesmo, ainda que com
ela não se concorde integralmente. Com a cessão são transferidos todos os elementos da
obrigação, como os acessórios e as garantias da dívida, salvo disposição em contrário. A cessão
independe da anuência do devedor (cedido), que não precisa consentir com a transmissão.

Não há, na cessão, a extinção do vínculo obrigacional, razão pela qual ela deve ser
diferenciada em relação às formas especiais e de pagamento indireto (sub-rogação e

Cessão de Débito novação), como demonstrado anteriormente.

Ainda, conforme explicação de Flávio Tartuce, a cessão de débito ou assunção de dívida é


um negócio jurídico bilateral, pelo qual o devedor, com a anuência do credor e de forma
expressa ou tácita, transfere a um terceiro a posição de sujeito passivo da relação obrigacional.
Seu conceito pode ser retirado também do art. 299 do CC/2002, pelo qual “é facultado a
terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consentimento expresso do credor, ficando
exonerado o devedor primitivo, salvo se aquele, ao tempo da assunção, era insolvente e o
credor o ignorava”. Prevê o parágrafo único desse dispositivo que “qualquer das partes pode
assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu
silêncio como recusa”. Na assunção de dívida, portanto, quem cala, não consente.
As regras do pagamento direto
 Elementos subjetivos – Quem paga e quem recebe?

Art. 304. Qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-la, usando, se o


credor se opuser, dos meios conducentes à exoneração do devedor.

Parágrafo único. Igual direito cabe ao terceiro não interessado, se o fizer em


nome e à conta do devedor, salvo oposição deste.

Art. 305. O terceiro não interessado, que paga a dívida em seu próprio nome,
tem direito a reembolsar-se do que pagar; mas não se sub-roga nos direitos do
credor.

Parágrafo único. Se pagar antes de vencida a dívida, só terá direito ao reembolso


no vencimento.

Art. 306. O pagamento feito por terceiro, com desconhecimento ou oposição do


devedor, não obriga a reembolsar aquele que pagou, se o devedor tinha meios
para ilidir a ação.

Art. 307. Só terá eficácia o pagamento que importar transmissão da propriedade,


quando feito por quem possa alienar o objeto em que ele consistiu.

Parágrafo único. Se se der em pagamento coisa fungível, não se poderá mais


reclamar do credor que, de boa-fé, a recebeu e consumiu, ainda que o solvente
não tivesse o direito de aliená-la.

a) Do solvens ou “quem deve pagar” (arts. 304 a 307 do CC)


Como regra geral, o solvens será o devedor. Porém, outras pessoas também podem
pagar, além do próprio sujeito passivo da relação obrigacional. Nesse sentido, enuncia
o art. 304 do CC/2002 que qualquer interessado na dívida pode pagá-la, podendo
usar, se houver oposição do credor, dos meios conducentes à exoneração do devedor.
A título de ilustração, havendo oposição do credor, poderá o terceiro interessado
utilizar-se do pagamento em consignação, judicial ou extrajudicial, previsto nos arts.
334 do CC/2002, 539 do CPC/2015 e 890 do CPC/1973).21

Um conceito que pode gerar dúvida é o de terceiro interessado na dívida. Este


corresponde à pessoa que tenha interesse patrimonial na sua extinção, caso do fiador,
do avalista ou do herdeiro. Em havendo o pagamento por esse terceiro interessado, esta
pessoa sub-roga-se automaticamente nos direitos de credor, com a transferência de
todas as ações, exceções e garantias que detinha o credor primitivo. Em hipóteses tais,
ocorre a chamada sub-rogação legal ou automática (art. 346, III, do CC).

Art. 308. O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o


represente, sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto
reverter em seu proveito.

Art. 309. O pagamento feito de boa-fé ao credor putativo é válido, ainda provado
depois que não era credor.

Art. 310. Não vale o pagamento cientemente feito ao credor incapaz de quitar,
se o devedor não provar que em benefício dele efetivamente reverteu.

Art. 311. Considera-se autorizado a receber o pagamento o portador da quitação,


salvo se as circunstâncias contrariarem a presunção daí resultante.

Art. 312. Se o devedor pagar ao credor, apesar de intimado da penhora feita


sobre o crédito, ou da impugnação a ele oposta por terceiros, o pagamento não
valerá contra estes, que poderão constranger o devedor a pagar de novo,
ficando-lhe ressalvado o regresso contra o credor.

21
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
b) Do accipiens ou “a quem se deve pagar” (arts. 308 a 312 do CC)
Como regra geral, o accipiens será o credor. Mas o pagamento também pode ser
feito ao seu representante, que tem poderes para receber o pagamento, sob pena de
só valer depois de ratificação, de confirmação pelo credor, ou havendo prova de
reversão ao seu proveito (art. 308 do CC). Esclareça-se que apesar de a norma
mencionar a validade – assim como os dois comandos seguintes –, o pagamento é
resolvido no plano da eficácia. Nessa linha, enunciado aprovado na V Jornada de
Direito Civil, com o seguinte sentido: “O pagamento repercute no plano da eficácia, e
não no plano da validade como preveem os artigos 308, 309 e 310 do Código Civil”
(Enunciado n. 425). O pagamento também poderá ser feito aos sucessores do credor,
como no caso do herdeiro e do legatário, que podem ser reputados como
representantes.22

 Elementos objetivos – O que se paga e como paga?

Art. 313. O credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é
devida, ainda que mais valiosa.

Art. 314. Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode
o credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim
não se ajustou.

Art. 315. As dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda


corrente e pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subseqüentes.

Art. 316. É lícito convencionar o aumento progressivo de prestações sucessivas.

Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta


entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o
juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor
real da prestação.

22
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
Art. 318. São nulas as convenções de pagamento em ouro ou em moeda
estrangeira, bem como para compensar a diferença entre o valor desta e o da
moeda nacional, excetuados os casos previstos na legislação especial.

Art. 319. O devedor que paga tem direito a quitação regular, e pode reter o
pagamento, enquanto não lhe seja dada.

Art. 320. A quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular,
designará o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem
por este pagou, o tempo e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor,
ou do seu representante.

Parágrafo único. Ainda sem os requisitos estabelecidos neste artigo valerá a


quitação, se de seus termos ou das circunstâncias resultar haver sido paga a
dívida.

Art. 321. Nos débitos, cuja quitação consista na devolução do título, perdido
este, poderá o devedor exigir, retendo o pagamento, declaração do credor que
inutilize o título desaparecido.

Art. 322. Quando o pagamento for em quotas periódicas, a quitação da última


estabelece, até prova em contrário, a presunção de estarem solvidas as anteriores.

Art. 323. Sendo a quitação do capital sem reserva dos juros, estes presumem-se
pagos.

Art. 324. A entrega do título ao devedor firma a presunção do pagamento.

Parágrafo único. Ficará sem efeito a quitação assim operada se o credor provar,
em sessenta dias, a falta do pagamento.

Art. 325. Presumem-se a cargo do devedor as despesas com o pagamento e a


quitação; se ocorrer aumento por fato do credor, suportará este a despesa
acrescida.

Art. 326. Se o pagamento se houver de fazer por medida, ou peso, entender-se-


á, no silêncio das partes, que aceitaram os do lugar da execução.
Pela interpretação do art. 313 do CC/2002 pode-se afirmar que o objeto do pagamento
é a prestação, podendo o credor se negar a receber o que não foi pactuado, mesmo sendo
a coisa mais valiosa.

Concretizando, se a obrigação do devedor é de entrega de um lote imobiliário, não pode


o credor ser obrigado a receber outro, ainda que seja mais valioso (TJSP, Apelação com
Revisão 415.544.4/8, Acórdão 4127884, Mogi-Mirim, 6.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des.
Sebastião Carlos Garcia, j. 15.10.2009, DJESP 24.11.2009). Em complemento à última norma,
determina o artigo seguinte que, mesmo sendo a obrigação divisível, não pode ser o credor
obrigado a receber, nem o devedor a pagar em partes, salvo previsão expressa em contrato
(art. 314 do CC). Eis aqui a consagração do princípio da identidade física da prestação.23

 Lugar do pagamento – Onde se paga?

Art. 327. Efetuar-se-á o pagamento no domicílio do devedor, salvo se as partes


convencionarem diversamente, ou se o contrário resultar da lei, da natureza da
obrigação ou das circunstâncias.

Parágrafo único. Designados dois ou mais lugares, cabe ao credor escolher entre
eles.

Art. 328. Se o pagamento consistir na tradição de um imóvel, ou em prestações


relativas a imóvel, far-se-á no lugar onde situado o bem.

Art. 329. Ocorrendo motivo grave para que se não efetue o pagamento no lugar
determinado, poderá o devedor fazê-lo em outro, sem prejuízo para o credor.

Art. 330. O pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia
do credor relativamente ao previsto no contrato.

Designados dois ou mais lugares, caberá ao credor escolher entre eles (art. 327, parágrafo
único, do CC). Por uma questão prática que lhe é mais favorável, é muito comum o credor
escolher o próprio domicílio para o pagamento. Percebe-se que se trata de uma das poucas
vezes em que a escolha cabe ao credor, e não ao devedor, na teoria geral das obrigações.
Por outro lado, se o pagamento consistir na tradição de um imóvel, ou em prestações a ele

23
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
relativas, far-se-á no lugar onde situado o bem (art. 328 do CC). Paulo Luiz Netto Lôbo
esclarece o teor do dispositivo exemplificando da seguinte forma:

“Entende-se que a referência do art. 328 do Código Civil a ‘prestações relativas a imóveis’
só não atinentes a direitos reais limitados (e.g.: direito do promitente do comprador, hipoteca
e penhor) ou a direito pessoal de uso do imóvel (e.g.: locação). O locador tem de entregar o
prédio no lugar em que este é situado; o locatário tem de recebê-lo onde está situado. Os
aluguéis prestam-se no lugar de situação do imóvel, e não no lugar do domicílio do devedor,
que pode não ser o do imóvel”.24

 Tempo de pagamento – Quando se paga?

Art. 331. Salvo disposição legal em contrário, não tendo sido ajustada época para
o pagamento, pode o credor exigi-lo imediatamente.

Art. 332. As obrigações condicionais cumprem-se na data do implemento da


condição, cabendo ao credor a prova de que deste teve ciência o devedor.

Art. 333. Ao credor assistirá o direito de cobrar a dívida antes de vencido o prazo
estipulado no contrato ou marcado neste Código:

I - no caso de falência do devedor, ou de concurso de credores;

II - se os bens, hipotecados ou empenhados, forem penhorados em execução


por outro credor;

III - se cessarem, ou se se tornarem insuficientes, as garantias do débito,


fidejussórias, ou reais, e o devedor, intimado, se negar a reforçá-las.

Parágrafo único. Nos casos deste artigo, se houver, no débito, solidariedade


passiva, não se reputará vencido quanto aos outros devedores solventes.

24
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
O vencimento é o momento em que a obrigação deve ser satisfeita, cabendo ao credor
a faculdade de cobrá-la. Esse vencimento, tempo ou data de pagamento, pode ser fixado
pelas partes por força do instrumento negocial. Como se sabe, o credor não pode exigir o
adimplemento antes do vencimento; muito menos o devedor pagar, após a data prevista, sob
pena de caracterização da mora ou do inadimplemento absoluto, fazendo surgir a
responsabilidade contratual do sujeito passivo obrigacional (Haftung).25

Consequências do inadimplemento relativo e absoluto

 DA MORA

A mora pode ocorrer por atuação do devedor ou do credor. Ambos os polos de uma
relação obrigacional podem se encontrar em eventual inadimplemento por mora. O art. 394
do Código Civil traz os casos em que o devedor e o credor podem ser considerados em
mora.

Quando o devedor não quiser efetuar o pagamento ou o credor não quiser recebê-lo no
tempo, lugar e forma que a lei estabelecer, considerar-se-ão em mora. Assim, desse
dispositivo denota-se que a mora pode se dar em face do tempo, do lugar do pagamento
ou da forma como o pagamento é realizado.

Existem, portanto, dois tipos de mora: a mora solvendi (mora do devedor) que não
paga no tempo, no local ou na forma ajustada (mora solvendi) e a mora accipiendi (mora
do credor) que se recusa sem justa causa a receber o pagamento (mora accipiendi). Desse
conceito, destaca-se o elemento objetivo da mora que é o cumprimento imperfeito da
obrigação, ou seja, a obrigação não foi corretamente cumprida.

25
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
Além desse elemento objetivo, para o devedor entrar em mora se faz necessária a
presença de um elemento subjetivo que é a culpa. Assim, o devedor só entra em mora se
provado que ele foi culpado pelo atraso no adimplemento da obrigação. Essa é a inteligência
do art. 396 do Código Civil ao dispor que “não havendo fato ou omissão imputável ao
devedor, não incorre este em mora”. Se um determinado devedor não paga sua dívida na
data ajustada em razão de naquele dia estar ocorrendo greve bancária, esse devedor não
está em mora. O atraso do pagamento não se deu por sua culpa, mas sim por caso fortuito,
ou seja, fato que a ele não pode ser imputado, razão pela qual não ocorre mora pela
ausência de elemento subjetivo para a sua configuração.

Por outro lado, o devedor incorre em mora se não paga a sua dívida injustificadamente.
Havendo negligência por parte do credor em cumprir a prestação, a sua mora está
configurada. Observa-se que a culpa descrita no art. 396 do Código Civil é presumida, isto
é, o devedor é quem deve provar o fato alheio a sua vontade que lhe impede adimplir a
obrigação.26

Há uma inversão no ônus da prova, pois o credor não precisa provar que o
devedor está em mora. Caso o devedor não constitua prova em seu favor, presume-se
a sua culpa e ele estará em mora.

 DO INADIMPLEMENTO ABSOLUTO

Existem casos em que o descumprimento da obrigação extingue a utilidade da prestação


obrigacional ao credor. Nessas situações, a obrigação não foi cumprida e nem poderá ser, e
o credor não terá mais a possibilidade de receber aquilo a que o devedor se obrigou. Tal
ocorre, por exemplo, quando o objeto da obrigação perece por culpa do devedor. Essas
hipóteses configuram o chamado inadimplemento absoluto, o qual se diferencia do
inadimplemento relativo que se dá na hipótese de mora. Na mora, o descumprimento da

26
Série Aperfeiçoamento de Magistrados 13t10 Anos do Código Civil - Aplicação, Acertos, Desacertos e
Novos Rumos | Volume 2
obrigação não é definitivo, mas é sanável, porque a obrigação ainda pode ser cumprida com
utilidade para o credor.

A mora é passível de purga, conforme se depreende do art. 401, inciso I, do Código Civil.
Com o inadimplemento absoluto a situação é oposta, pois o descumprimento gera a “morte”
da relação obrigacional. No inadimplemento absoluto ou a obrigação não pode mais ser
cumprida, ou ainda que possa ser cumprida, a prestação não é mais útil ao credor. O
inadimplemento absoluto ocorre, então, quando a prestação, em razão do atraso, se torna
inútil para o credor O interesse do credor caracterizará o inadimplemento como absoluto
ou relativo. Desse modo, o credor poderá exigir o cumprimento da obrigação ajuizando uma
tutela específica, ou poderá ter interesse na resolução contratual, pois a prestação se tornou
inútil em razão da mora (art. 395, § único, do CC).

Em caso de mora, o credor tem direito de ajuizar uma ação de resolução do negócio
jurídico porque o inadimplemento gera para ele o direito potestativo de resolver o negócio
jurídico. O credor ainda poderá cumular o pedido de desfazimento do negócio jurídico com
o pedido de perdas e danos. Esse entendimento é ainda sufragado pelo conteúdo do art.
389 do Código Civil, pois quando há inadimplemento, existe a culpa do devedor, sendo

devida ao credor indenização pelas perdas e danos.27

A cláusula penal

A cláusula penal pode ser conceituada como sendo a penalidade, de natureza civil, imposta
pela inexecução parcial ou total de um dever patrimonial assumido. Pela sua previsão no Código
Civil, sua concepção está relacionada e é estudada como tema condizente ao inadimplemento
obrigacional, entre os arts. 408 a 416. A cláusula penal é pactuada pelas partes no caso de violação
da obrigação, mantendo relação direta com o princípio da autonomia privada, motivo pelo qual

27
Série Aperfeiçoamento de Magistrados 13t10 Anos do Código Civil - Aplicação, Acertos, Desacertos e
Novos Rumos | Volume 2
é também denominada multa contratual ou pena convencional. Trata-se de uma obrigação
acessória que visa a garantir o cumprimento da obrigação principal, bem como fixar,
antecipadamente, o valor das perdas e danos em caso de descumprimento. Por ser acessória,
aplica-se o princípio pelo qual a obrigação acessória deve seguir a principal (princípio da
gravitação jurídica), fazendo com que no caso de nulidade do contrato principal a multa também
seja declarada nula. De acordo com a melhor doutrina, a cláusula penal tem basicamente duas
funções. Primeiramente, a multa funciona como uma coerção, para intimidar o devedor a cumprir
a obrigação principal, sob pena de ter que arcar com essa obrigação acessória (meio de coerção,
com caráter punitivo). Além disso, tem função de ressarcimento, prefixando as perdas e danos no
caso de inadimplemento absoluto da obrigação (caráter de estimação). De qualquer forma, apesar
de ser essa a visão clássica, Gustavo Tepedino, entre outros, aponta a tendência europeia de
afastar o caráter punitivo da cláusula penal compensatória.28

Cumpre consignar que, aplicando a ideia constante desse dispositivo, entende o Superior
Tribunal de Justiça pelo caráter duplo da penalidade – para ambas as partes –, nos contratos
bilaterais e onerosos, aqueles com direitos e deveres recíprocos. Isso mesmo se a multa estiver
expressamente prevista para apenas um dos negociantes. Conforme julgado publicado no
Informativo n. 484 do Tribunal: “cinge-se a questão em definir se a cláusula penal dirigida apenas
ao promitente comprador pode ser imposta ao promitente-vendedor ante o seu inadimplemento
contratual. Na hipótese, verificou-se cuidar de um contrato bilateral, em que cada um dos
contratantes é simultânea e reciprocamente credor e devedor do outro, oneroso, pois traz
vantagens para os contratantes, comutativo, ante a equivalência de prestações. Com esses e
outros fundamentos, a Turma deu provimento ao recurso para declarar que a cláusula penal
contida nos contratos bilaterais, onerosos e comutativos deve aplicar-se para ambos os
contratantes indistintamente, ainda que redigida apenas em favor de uma das partes” (STJ, REsp
1.119.740/RJ, Rel. Min. Massami Uyeda, j. 27.09.2011).

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TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
Os juros legais

Um dos principais efeitos do inadimplemento da obrigação, segundo Tartuce, é a incidência


de juros a serem suportados pelo devedor. Os juros podem ser conceituados como frutos civis
ou rendimentos devidos pela utilização de capital alheio. No âmbito do Direito Civil, os juros
podem ser assim classificados:

 Quanto à origem:
Juros convencionais – decorrem de acordo entre as partes.

Juros legais – decorrem da norma jurídica.

 Quanto à relação com o inadimplemento:

Juros moratórios – Constituem um ressarcimento imputado ao devedor pelo


descumprimento parcial da obrigação. Como regra geral, os juros moratórios são devidos desde
a constituição em mora e independem da alegação e prova do prejuízo suportado (art. 407 do
CC).

Juros compensatórios ou remuneratórios – São aqueles que decorrem de uma utilização


consentida do capital alheio, como nos casos de inadimplemento total da obrigação.

A respeito dos juros legais moratórios, enuncia o art. 406 do CC que, mesmo não estando
previstos pelas partes, serão devidos de acordo com a taxa que “estiver em vigor para a mora do
pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional”. Na opinião deste autor, o correto
posicionamento a respeito desse dispositivo é ser a taxa mencionada aquela prevista no art. 161,
§ 1.º, do Código Tributário Nacional, ou seja, 1% ao mês (12% ao ano). Nesse sentido, o Enunciado
doutrinário 20 da I Jornada de Direito Civil, com conteúdo a que se filia:

“A taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 é a do art. 161, § 1.º, do
Código Tributário Nacional, ou seja, 1% (um por cento) ao mês. A utilização da
taxa Selic como índice de apuração dos juros legais não é juridicamente segura,
porque impede o prévio conhecimento dos juros; não é operacional, porque o
seu uso será inviável sempre que se calcularem somente juros ou somente
correção monetária; é incompatível com a regra do art. 591 do novo Código Civil,
que permite apenas a capitalização anual dos juros, e pode ser incompatível com
o art. 192, § 3.º, da Constituição Federal, se resultarem juros reais superiores a
12% (doze por cento) ao ano”.

5. Direito de Família

CASAMENTO

O casamento se realiza no momento em que duas pessoas (não mais apenas homem e
mulher), manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz
os declara casados, sendo civil e gratuita sua celebração.

O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil,
equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da
data de sua celebração.

CAPACIDADE PARA O CASAMENTO

As pessoas podem se casar a partir dos 16 (dezesseis) anos de idade.

Atenção!

Art. 1.520. Não será permitido, em qualquer caso, o casamento de quem não
atingiu a idade núbil, observado o disposto no art. 1.517 deste Código.
Relativamente incapazes

Os relativamente incapazes podem casar desde que obtenham autorização dos pais ou
tutores, ou ainda o suprimento. A respeito deste assunto, duas questões são dignas de nota:

1. Se o casamento ocorrer por força de suprimento, o regime de bens será o da separação


obrigatória, a teor do art. 1.641 do Código Civil;

2. A autorização concedida pode ser revogada até a data da celebração.

Em virtude dos impactos da Lei 13.146/15 (Estatuto da Pessoa com


Deficiência) no Código Civil, passou-se a compreender o deficiente como
plenamente capaz. Logo, o casamento do deficiente será válido.

IMPEDIMENTOS

São situações taxativamente previstas na norma que, acaso presentes, vedam o casamento.
Diz o art. 1.521 do Código Civil: “Não podem casar...”. Como se vê, trata-se de uma proibição
jurídica cujo desrespeito acarreta a nulidade do casamento, a teor do art. 1.548 do Código Civil:

Art. 1.548. É nulo o casamento contraído:

II - por infringência de impedimento.

 Mas quem são os impedidos de casar?


Conforme o art. 1.521 do Código Civil vigente:
Art. 1.521. Não podem casar:

I - Os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural


ou civil;

II - Os afins em linha reta;

III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado


com quem o foi do adotante;

IV - Os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até


o terceiro grau inclusive;

V - O adotado com o filho do adotante;

VI - As pessoas casadas;

VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou


tentativa de homicídio contra o seu consorte.

CAUSAS SUSPENSIVAS

São obstáculos transponíveis, constituindo meras recomendações do legislador, segundo as


quais certas pessoas “Não devem casar” (CC, art. 1.523). O receio aqui é que o casamento acabe
por gerar confusão entre patrimônios.

Como conselho que é, a causa suspensiva poderá ser desrespeitada, sendo a


consequência jurídica a imposição do regime da separação obrigatória de bens,
disciplinado no art. 1.641 do Código Civil.
 Quem não deve casar?

Art. 1.523. Não devem casar:

I - O viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido,


enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos
herdeiros;

II - A viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo


ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez,
ou da dissolução da sociedade conjugal;

III - O divorciado, enquanto não houver sido homologada ou


decidida a partilha dos bens do casal;

IV - O tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes,


irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou
curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não
estiverem saldadas as respectivas contas.

Parágrafo único. É permitido aos nubentes solicitar ao juiz que


não lhes sejam aplicadas as causas suspensivas previstas nos
incisos I, III e IV deste artigo, provando-se a inexistência de
prejuízo, respectivamente, para o herdeiro, para o ex-cônjuge e
para a pessoa tutelada ou curatelada; no caso do inciso II, a nubente
deverá provar nascimento de filho, ou inexistência de gravidez, na
fluência do prazo.
INCOMPETÊNCIA DA AUTORIDADE

A incompetência da autoridade celebrante é causa apenas de anulabilidade do casamento,


conforme art. 1.550, VI, do Código Civil.

Entretanto, é possível a celebração do casamento sem a presença da autoridade competente


para o ato. É o denominado casamento in extremis vitae momentis / nuncupativo.

Ocorre na hipótese em que um dos nubentes se encontra em iminente risco


de vida, e, não sendo possível a presença da autoridade competente para presidir
o ato, o casamento é celebrado na presença de 6 (seis) testemunhas, que não
sejam parentes dos nubentes nem na linha reta e nem colaterais de segundo
grau. (art. 76, LRP)

CASAMENTO CIVIL

A teor do art. 1.534 e seguintes do Código Civil, o casamento se realiza, regra geral, na sede
do cartório.

Art. 1.534. A solenidade realizar-se-á na sede do cartório, com toda


publicidade, a portas abertas, presentes pelo menos duas
testemunhas, parentes ou não dos contraentes, ou, querendo as
partes e consentindo a autoridade celebrante, noutro edifício
público ou particular.
Entretanto, poderá acontecer em outro edifício público ou particular. Se realizado em edifício
particular, o ato deverá ser feito na presença de quatro testemunhas. Serão as testemunhas em
número de quatro também se um dos nubentes não puder ou não souber escrever.

§ 1º Quando o casamento for em edifício particular, ficará este de


portas abertas durante o ato.

§ 2º Serão quatro as testemunhas na hipótese do parágrafo


anterior e se algum dos contraentes não souber ou não puder
escrever.

Caso contrário, bastam duas testemunhas para o ato


solene realizado em cartório.

CASAMENTO POR MOLÉSTIA GRAVE

O casamento por Moléstia Grave está disciplinado no art. 1.539 do Código Civil:

Art. 1.539. No caso de moléstia grave de um dos nubentes, o


presidente do ato irá celebrá-lo onde se encontrar o impedido,
sendo urgente, ainda que à noite, perante duas testemunhas que
saibam ler e escrever.

Seria mais um caso específico em que a celebração não será realizada em cartório. Neste caso,
o presidente do ato irá até o local em que se encontra o nubente que possui a moléstia grave e
lá celebrará o casamento na presença de 2 (duas) testemunhas que saibam ler e escrever.

Sendo urgente, o ato poderá ser feito à noite!


A falta ou o impedimento do presidente do ato será suprida por um dos seus substitutos
legais ou por um oficial ad hoc, nomeado pelo presidente do ato. Sendo celebrado por oficial ad
hoc, o termo avulso, lavrado por ele, será registrado no respectivo registro em cinco dias, perante
duas testemunhas, ficando arquivado.

§ 1º A falta ou impedimento da autoridade competente para


presidir o casamento suprir-se-á por qualquer dos seus substitutos
legais, e a do oficial do Registro Civil por outro ad hoc, nomeado
pelo presidente do ato.

§ 2º O termo avulso, lavrado pelo oficial ad hoc, será registrado no


respectivo registro dentro em cinco dias, perante duas
testemunhas, ficando arquivado.

Ad hoc é uma expressão latina cuja tradução literal é "para isto" ou "para
esta finalidade". É geralmente empregada em contexto jurídico, também no
sentido de "para um fim específico". Exemplo: um advogado "ad hoc"
(nomeado apenas para um determinado ato jurídico).

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO

O Casamento por procuração está previsto no art. 1.542 CC.

Art. 1.542. O casamento pode celebrar-se mediante procuração,


por instrumento público, com poderes especiais.
Aqui o nubente será representado por um procurador, mediante instrumento público (forma
também exigida para sua revogação), contendo o mandato poderes especiais e validade por
apenas 90 dias (mesmo prazo de validade da habilitação).

Não será possível representação através de procuração em casamento


in extremis.

POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS

Uma das questões mais inovadoras do Código Civil está na possibilidade de alteração do
regime de bens entre os cônjuges. Isto é possível desde que: o pedido seja conjunto, sem litígio
algum e, apuradas as razões do requerimento, haja decisão judicial, com a máxima publicidade e
sem causar um só prejuízo a terceiros, art. 1.639 CC, § 2º.

Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento,


estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.

A mudança de regime é ex nunc, ou seja, não retroage, não altera o passado, nem as relações
jurídicas perfeitas e acabadas. O procedimento judicial de mudança de regime de bens, diga-se,
passou a ser expressamente contemplado no art. 734 do Novo Código de Processo Civil,
caminhando com os mesmos requisitos do Código Civil e exigindo publicação de edital por trinta
dias, ou meio alternativo, e parecer do Ministério Público.
ESPÉCIES DE REGIME DE BENS

Cinco são as espécies de regime de bens, quais sejam: o regime supletivo, também denominado
de comunhão parcial de bens, o regime da separação obrigatória, o regime da separação
convencional, o regime da comunhão universal e, finalmente, o regime da participação final nos
aquestos.

É possível, em regra, que o casal escolha um regime misto de forma a definir


disciplina distinta das acima indicadas. Outrossim, viável a escolha de regime
diverso da comunhão parcial. Nestas circunstâncias deverão os nubentes lançar
mão de um pacto antenupcial, feito por escritura pública, sob pena de
nulidade absoluta, e que apenas produzirá seus efeitos após o casamento
(CC, art. 1.653).

Perante terceiros, somente produzirá efeitos o pacto se registrado pelo


oficial de Registro de Imóveis do domicílio conjugal (art. 1.657).

COMUNHÃO PARCIAL DE BENS

O regime supletivo da comunhão parcial de bens aplica-se nos casos em que não há pacto
antenupcial, ou este é nulo ou ineficaz, a teor do art. 1.640 do Código Civil.

Art. 1.640. Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz,


vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da
comunhão parcial.

No regime supletivo, com as exceções previstas no art. 1.659 do CC, todos os demais bens
“entram na comunhão”, nos termos do art. 1.660, dentre os quais os “adquiridos na constância
do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges, como ainda os
“adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior”, os
adquiridos por doação, ou herança, feita a ambos os cônjuges, as “benfeitorias em bens
particulares de cada cônjuge” e os “frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge,
percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão”.

COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS

Este regime de bens importa na comunicação de todo o patrimônio presente e futuro do


casal, inclusive as dívidas, com poucas exceções de incomunicabilidade, que estão previstas no art.
1.668 do Código Civil.

Art. 1.668. São excluídos da comunhão:

I - Os bens doados ou herdados com a cláusula de


incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;

II - Os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro


fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;

III - As dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de


despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;

IV - As doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro


com a cláusula de incomunicabilidade;

V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.


SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA

Separação obrigatória, legal ou cogente - o art. 1.641 do Código civil impõe o regime de
separação obrigatória de bens para três hipóteses específicas: casamento celebrado com maior
de 70 (setenta) anos de idade; casamento decorrente de Suprimento de autorização para casar
em favor de relativamente incapaz e, finalmente, casamento que não observa as causas
suspensivas previstas no art. 1.523 do Código Civil, segundo o qual “Não devem casar” as pessoas
submetidas àquele regime. Nestes casos não há escolha do regime de bens, mas sim imposição.

Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no


casamento:

I - Das pessoas que o contraírem com inobservância das causas


suspensivas da celebração do casamento;

II – Da pessoa maior de 70 (setenta) anos; (Redação dada pela Lei


nº 12.344, de 2010)

III - De todos os que dependerem, para casar, de suprimento


judicial.

15.1. Na separação obrigatória não deve haver comunicação entre os bens


adquiridos pelos cônjuges, seja no passado, no presente ou no futuro. A
incomunicabilidade é a marca característica deste regime. Apesar disto, a Súmula
377 do Supremo Tribunal Federal ordena a comunicação dos bens onerosamente
adquiridos na constância do casamento.
SEPARAÇÃO CONVENCIONAL

A Separação convencional, absoluta ou voluntária é possível a um casal que não esteja obrigado
ao regime da separação obrigatória, mas queira optar, mediante convenção matrimonial, pelo
regime da separação convencional de bens. Neste caso, o regime jurídico é idêntico ao da
separação obrigatória, a única diferença reside no fato de o mesmo não surgir de imposição
normativa, mas sim da autonomia privada, através de um pacto antenupcial.

Ademais, aqui não haverá incidência da Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, falando-
se, genuinamente, em um regime de separação.

PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQUESTOS

Segundo dispõe o art. 1.672 do CC, neste tipo específico de regime cada cônjuge possui
patrimônio próprio, lhe cabendo à época da dissolução da sociedade conjugal metade dos bens
adquiridos pelo casal (aquestos), a título oneroso, na constância do casamento.

Art. 1.672. No regime de participação final nos aqüestos, cada


cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo
seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal,
direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso,
na constância do casamento.
DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL

De acordo com o Código Civil Brasileiro, a dissolução da sociedade conjugal termina com a
morte de um dos cônjuges, com a nulidade ou anulação do casamento, pela separação judicial ou,
finalmente, pelo divórcio.

O instituto da separação foi mantido mesmo após o advento da EC 66/2010. Este é o


entendimento atual e pacífico sobre o tema.

DIVÓRCIO ADMINISTRATIVO OU EXTRAJUDICIAL

É possível o chamado divórcio administrativo ou extrajudicial, realizado perante um tabelião


e desde que não haja litígio entre os divorciandos, nem incapazes e nascituros envolvidos. A
presença do advogado é imprescindível no divórcio extrajudicial, sendo possível, inclusive, um só
causídico para ambos os clientes.

O Código de Processo Civil dedica-se ao tema no art. 733. Neste caso, a escritura pública do
divórcio deverá versar sobre os temas alimentos, sobrenome e meação.

UNIÃO ESTÁVEL

Prevista nos artigos 1.723 a 1.726 do Código Civil, trata-se da união pública, contínua e
duradoura, entre homem e mulher, desimpedidos de casar ou separados, com o objetivo de
constituir família.
LEMBRE-SE!
Em que pese não esteja previsto em lei, existem
entendimentos no sentido de que a união estável
poderá ser caracterizada não apenas entre homem e
Os impedimentos do casamento se aplicam à união estável, à exceção do impedimento
relacionado à pessoa casada. Explica-se: o casado, porém separado, apenas se não puder contrair
novo casamento até o divórcio ou viuvez, poderá viver em união estável com outra pessoa.

Quanto às causas suspensivas do casamento, previstas no art. 1.523 do Código


civil, estas não se aplicam à união estável, de modo que sua eventual
inobservância não acarretará a imposição do regime obrigatório da separação de
bens.

A união estável, regra geral, submete-se ao regime da comunhão parcial de bens, salvo
contrato por escrito em sentido contrário.

Do Casamento entre pessoas do mesmo sexo

Os cartórios de todo o Brasil não poderão recusar a celebração de casamentos civis de casais
do mesmo sexo ou deixar de converter em casamento a união estável homoafetiva, como
estabelece a Resolução n. 175, de 14 de maio de 2013, aprovada durante a 169ª Sessão Plenária
do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

O texto aprovado pelo CNJ proíbe as autoridades competentes de se recusarem a habilitar


ou celebrar casamento civil ou, até mesmo, de converter união estável em casamento entre pessoas
de mesmo sexo.

“A Resolução veio em uma hora importante. Não havia ainda no âmbito das corregedorias
dos tribunais de Justiça uniformidade de interpretação e de entendimento sobre a possibilidade
do casamento entre pessoas do mesmo sexo e da conversão da união estável entre casais
homoafetivos em casamento”, disse o conselheiro Guilherme Calmon. “Alguns estados
reconheciam, outros não. Como explicar essa disparidade de tratamento? A Resolução consolida e
unifica essa interpretação de forma nacional e sem possibilidade de recursos”, ressaltou.
Caso algum cartório não cumpra a Resolução do CNJ, o casal interessado poderá levar o caso
ao conhecimento do juiz corregedor competente para que ele determine o cumprimento da
medida. Além disso, poderá ser aberto processo administrativo contra a autoridade que se negar
a celebrar ou converter a união estável homoafetiva em casamento.29

Adoção entre pessoas do mesmo sexo

O Estatuto da Criança e do Adolescente não faz qualquer menção à orientação sexual como
um fator a ser considerado no processo de adoção e nem cita que a futura família da criança deva
ser composta por pais de gêneros diferentes.

Como vimos, desde que os homoafetivos atendam aos requisitos estabelecidos pelo Estatuto
e demonstrem condições psicológicas e sociais de serem bons pais ou boas mães, não há qualquer
impedimento.
Desde maio de 2011 é reconhecida a união estável entre pessoas do mesmo sexo no Brasil a
partir de uma decisão do Supremo Tribunal Federal, que entendeu que a definição de família como
união de um homem e de uma mulher em nossa Constituição não exclui as outras formas de afeto
existentes.
A partir de 2013, também se tornou possível que pessoas do mesmo gênero se casem, após
o Conselho Nacional de Justiça editar a Resolução nº 175/2013, que impede que cartórios se
recusem a celebrar casamento entre pessoas do mesmo sexo em todo território nacional.
Antes disso, quando a união homossexual não era juridicamente reconhecida como entidade
familiar, muitas vezes se negava a adoção por estes casais sob a alegação de que a dupla não vivia
em união estável, nem era casada, requisito essencial estabelecido pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente.
Atualmente, entretanto, após a equiparação de direitos das uniões homoafetivas com as
heteroafetivas, a controvérsia sobre a constituição ou não de casamento ou união estável

29 Resolução sobre casamento civil entre pessoas do mesmo sexo é aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça. Disponível em:

<https://www2.stf.jus.br/portalStfInternacional/cms/destaquesNewsletter.php?sigla=newsletterPortalInternacionalDestaques&idConte
udo=238515. Acesso em: 10 de Dezembro de 2019.
desaparece, tornando-se possível que os homossexuais atendam todos os requisitos objetivos
estabelecidos pelo Estatuto.
Em relação aos requisitos subjetivos, como já dito anteriormente, o ECA limita-se a estabelecer
que a criança ou o adolescente deverá ser colocado em ambiente familiar adequado e que os
futuros pais apresentem uma paternidade/maternidade responsável, sem mencionar que a
composição do casal por pessoas de mesmo gênero seja, de alguma forma, uma característica
desabonadora para a medida ou prejudicial para a criança.30

Dos alimentos (Lei 5.478/68)

Com base nos ensinamentos de Orlando Gomes e Maria Helena Diniz, os alimentos podem ser
conceituados como as prestações devidas para a satisfação das necessidades pessoais daquele que
não pode provê-las pelo trabalho próprio. Aquele que pleiteia os alimentos é o alimentando ou
credor; o que os deve pagar é o alimentante ou devedor. O pagamento desses alimentos visa à
pacificação social, estando amparado nos princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da
Solidariedade Familiar, ambos de índole constitucional. No plano conceitual e em sentido amplo,
os alimentos devem compreender as necessidades vitais da pessoa, cujo objetivo é a manutenção
da sua dignidade: a alimentação, a saúde, a moradia, o vestuário, o lazer, a educação, entre outros.
Em suma, os alimentos devem ser concebidos dentro da ideia de patrimônio mínimo.

Pois bem, nos termos dos arts. 1.694 e 1.695 do CC, os pressupostos para o dever de prestar
alimentos são os seguintes:

 Vínculo de parentesco, casamento ou união estável, inclusive homoafetiva. Em relação


ao parentesco, deve ser incluída a parentalidade socioafetiva, conforme o Enunciado n.
341 do CJF/STJ (“Para os fins do art. 1.696, a relação socioafetiva pode ser elemento
gerador de obrigação alimentar”).
 Necessidade do alimentando ou credor.

30
Casais homossexuais podem adotar no brasil? Disponível em: < https://www.politize.com.br/casais-homossexuais-podem-adotar-
no-brasil/> Acesso em: 10 de Dezembro de 2019.
 Possibilidade do alimentante ou devedor. Para a verificação dessa possibilidade, poderão
ser analisados os sinais exteriores de riqueza do devedor, conforme reconhece o
Enunciado n. 573 do CJF/STJ, da VI Jornada de Direito Civil (2013).

Como é notório, os dois últimos elementos constituem o famoso binômio alimentar


(necessidade/possibilidade). Para o Superior Tribunal de Justiça, não é possível rever o valor
alimentar antes fixado pelas instâncias inferiores, por se tratar de matéria de fato, como estabelece
a sua Súmula 7.

 Vejamos suas características, consoante entendimento de Flávio Tartuce31:

a) Obrigação que gera um direito personalíssimo:


No que tange ao credor ou alimentando, o direito aos alimentos é personalíssimo, uma vez
que somente aquele que mantém relação de parentesco, casamento ou união estável com o
devedor ou alimentante pode pleiteá-los (caráter intuitu personae). Por isso, o direito a
alimentos não se transmite aos herdeiros do credor.

b) Reciprocidade:
A obrigação de alimentos é recíproca entre cônjuges e companheiros (art. 1.694 do CC). A
reciprocidade do mesmo modo existe entre pais e filhos, sendo extensivo a todos os
ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns na falta de outros (art.
1.696 do CC).

c) Irrenunciabilidade:
O CC/2002 é expresso ao vedar a renúncia aos alimentos. Prevê o seu art. 1.707 que “Pode o
credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo
crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora”. Segue-se, em parte, o entendimento

31
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019. Pg. 1376 -1387
que constava da Súmula 379 do STF (“No acordo de desquite, não se admite renúncia aos
alimentos, que poderão ser pleiteados ulteriormente, verificados os pressupostos legais”). Mais
uma vez repise-se que a separação judicial não mais existe no sistema jurídico nacional, diante
da Emenda do Divórcio (EC 66/2010).

d) Obrigação divisível (regra) ou solidária (exceção):


Pelo que consta do art. 1.698 do CC, nota-se que a obrigação de prestar alimentos, em regra,
é divisível. Enuncia esse comando que “sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos,
todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos”. Ilustrando, se um pai não
idoso necessita de alimentos e tem quatro filhos em condições de prestá-los e quer receber
a integralidade do valor alimentar, a ação deverá ser proposta em face de todos (litisconsórcio
passivo necessário).

e) Obrigação imprescritível:
A pretensão aos alimentos é imprescritível, por envolver estado de pessoas e a dignidade
humana. Porém, deve-se atentar ao fato de que a pretensão para a cobrança de alimentos
fixados em sentença ou ato voluntário prescreve em dois anos, contados a partir da data em
que se vencerem (art. 206, § 2.º, do CC). Além disso, se o alimentando for absolutamente
incapaz (menor de 16 anos), contra ele não corre a prescrição (art. 198, I, do CC). Desse modo,
todos os alimentos fixados em sentença e vencidos só terão a prescrição iniciada quando o
menor completar 16 anos. Mais uma regra referente à prescrição da pretensão deve ser
lembrada. Se o pai ou a mãe forem os devedores dos alimentos, a prescrição não começa a
correr quando o filho se torna relativamente capaz (aos 16 anos), porque, por expressa
disposição de lei, a prescrição não corre entre ascendentes e descendentes durante o poder
familiar (art. 197, II, do CC). Em suma, em casos tais, a prescrição de dois anos só se inicia, em
regra, quando o menor se tornar capaz aos 18 anos, salvo as hipóteses de emancipação.

f) Obrigação incessível e inalienável:


O art. 1.707 do CC expressa que a obrigação de alimentos não pode ser objeto de cessão
gratuita ou onerosa. Ilustrando, os alimentos não podem ser objeto de cessão de crédito. Os
alimentos, do mesmo modo, são inalienáveis, não podendo ser vendidos, doados, locados ou
trocados.

g) Obrigação incompensável:
O mesmo art. 1.707 do Código Civil veda que a obrigação alimentar seja objeto de
compensação. A mesma proibição consta do art. 373, II, do CC. Mais uma vez, apesar da
literalidade da lei, parte da doutrina e da jurisprudência entende pela possibilidade de
compensação dos alimentos. Da jurisprudência há decisões que compensam os alimentos
pagos a mais pelo devedor, aplicando a vedação do enriquecimento sem causa constante dos
arts. 884 a 886 do CC (TJSP, Agravo de Instrumento 394.691-4/7-00/SP, 5.ª Câmara de Direito
Privado, Rel. Silvério Ribeiro, 06.07.2005, v.u. e TJSP, Agravo de Instrumento 257.458-4/4/SP,
4.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Armindo Freire Mármora, 06.02.2003, v.u.).

h) Obrigação impenhorável:
Por ser personalíssima, incessível, inalienável, a obrigação de prestar alimentos é impenhorável
(arts. 1.707 do CC/2002, 833, IV, do CPC/2015 e 649, IV, do CPC/1973).

i) Obrigação irrepetível:
A irrepetibilidade dos alimentos é construção antiga, relacionada ao fato de existir uma
obrigação moral. Em reforço, vale o argumento da existência de uma obrigação essencialmente
satisfativa. Assim, não cabe ação de repetição de indébito para reaver o que foi pago (actio in
rem verso). Ilustrando, imagine-se que um homem foi enganado quanto à prole por uma
mulher, que lhe disse que o filho era seu. Constatada a inexistência de vínculo biológico, via
DNA, esse homem não poderá reaver os alimentos pagos, pois esses são irrepetíveis. Porém,
poderá ele pleitear indenização por danos morais, diante do engano, como já entendeu o STJ:
“Responsabilidade civil. Dano moral. Marido enganado. Alimentos. Restituição. A
mulher não está obrigada a restituir ao marido os alimentos por ele pagos em
favor da criança que, depois se soube, era filha de outro homem. A intervenção
do Tribunal para rever o valor da indenização pelo dano moral somente ocorre
quando evidente o equívoco, o que não acontece no caso dos autos. Recurso
não conhecido” (STJ, REsp 412.684/SP, 4.ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar,
j. 20.08.2002, publicado em 25.11.2002).
j) Obrigação intransacionável e não sujeita à arbitragem:
Por todas as características demonstradas incansavelmente, a obrigação alimentar não pode
ser objeto de transação, ou seja, de um contrato pelo qual a dívida é extinta por concessões
mútuas ou recíprocas (arts. 840 a 850 do CC). Como é notório, apenas quanto a direitos
patrimoniais de caráter privado se permite a transação (art. 841 do CC). Como outrora exposto,
a natureza da obrigação de alimentos é especial, fundada na dignidade humana em direitos
da personalidade. Além de ser intransacionável, a obrigação alimentar não pode ser objeto de
compromisso ou arbitragem. Enuncia o art. 852 do CC que está vedado o compromisso para
solução de questões de estado e de direito pessoal de família, caso dos alimentos.

k) Obrigação transmissível:
É a expressão do art. 1.700 do CC/2002: “A obrigação de prestar alimentos transmite-se aos
herdeiros do devedor, na forma do art. 1.694”. Como se nota, há transmissibilidade da
obrigação de alimentos em relação aos herdeiros do devedor.

Do procedimento de averiguação oficiosa (Lei 8.560/92)

O procedimento de Art. 1° O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e


será feito:
averiguação oficiosa de
paternidade, previsto na I - no registro de nascimento;

Lei nº 8.560/92, não II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;

constitui condição para a III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;
propositura de ação
IV - por manifestação expressa e direta perante o juiz, ainda que o
judicial de investigação reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.
de paternidade. Em
Art. 2° Em registro de nascimento de menor apenas com a maternidade
outras palavras, a ação
estabelecida, o oficial remeterá ao juiz certidão integral do registro e o nome e
poderá ser proposta prenome, profissão, identidade e residência do suposto pai, a fim de ser
independentemente de o averiguada oficiosamente a procedência da alegação.

procedimento ter sido ou


não instaurado.
O juízo competente para
conduzir a averiguação
§ 1° O juiz, sempre que possível, ouvirá a mãe sobre a paternidade alegada e
oficiosa é o da vara de
mandará, em qualquer caso, notificar o suposto pai, independente de seu estado
registros públicos, salvo
civil, para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é atribuída.
se a lei de organização
§ 2° O juiz, quando entender necessário, determinará que a diligência seja
judiciária dispuser de
realizada em segredo de justiça.
forma diversa.
§ 3° No caso do suposto pai confirmar expressamente a paternidade, será lavrado
termo de reconhecimento e remetida certidão ao oficial do registro, para a devida
averbação.
Não é necessário que o
§ 4° Se o suposto pai não atender no prazo de trinta dias, a notificação judicial,
suposto pai constitua
ou negar a alegada paternidade, o juiz remeterá os autos ao representante do
advogado para participar Ministério Público para que intente, havendo elementos suficientes, a ação de

do procedimento de investigação de paternidade.

averiguação oficiosa. Se § 5o Nas hipóteses previstas no § 4o deste artigo, é dispensável o ajuizamento de


não for assistido por ação de investigação de paternidade pelo Ministério Público se, após o não

defesa técnica, não haverá comparecimento ou a recusa do suposto pai em assumir a paternidade a ele
atribuída, a criança for encaminhada para adoção.
qualquer nulidade. Vale
ressaltar, no entanto, que, § 6o A iniciativa conferida ao Ministério Público não impede a quem tenha legítimo
interesse de intentar investigação, visando a obter o pretendido reconhecimento
se ele quiser constituir
da paternidade.
advogado, isso não lhe
poderá ser negado. Art. 2o-A. Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem
como os moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos.

Parágrafo único. A recusa do réu em se submeter ao exame de código genético


- DNA gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o
contexto probatório

Não cabe recurso contra


Art. 3° E vedado legitimar e reconhecer filho na ata do casamento.
a decisão do juiz, sendo,
Parágrafo único. É ressalvado o direito de averbar alteração do patronímico
no entanto, possível a
materno, em decorrência do casamento, no termo de nascimento do filho.
propositura de correição
parcial. Art. 4° O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento.

Art. 5° No registro de nascimento não se fará qualquer referência à natureza da


filiação, à sua ordem em relação a outros irmãos do mesmo prenome, exceto
gêmeos, ao lugar e cartório do casamento dos pais e ao estado civil destes.
Art. 6° Das certidões de nascimento não constarão indícios de a concepção haver
sido decorrente de relação extraconjugal.

§ 1° Não deverá constar, em qualquer caso, o estado civil dos pais e a natureza
da filiação, bem como o lugar e cartório do casamento, proibida referência à
presente lei.

§ 2º São ressalvadas autorizações ou requisições judiciais de certidões de inteiro


teor, mediante decisão fundamentada, assegurados os direitos, as garantias e
interesses relevantes do registrado.

Art. 7° Sempre que na sentença de primeiro grau se reconhecer a paternidade,


nela se fixarão os alimentos provisionais ou definitivos do reconhecido que deles
necessite.

Art. 8° Os registros de nascimento, anteriores à data da presente lei, poderão ser


retificados por decisão judicial, ouvido o Ministério Público.

Da adoção após a morte

Apesar de a adoção ser uma relação inter vivos, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê
uma hipótese, em seu art. 42, 6º, em que pode ocorrer a adoção após a morte:

Art. 42. Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do


estado civil.

§6º A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação
de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a
sentença

O Superior Tribunal de Justiça decidiu com base na afetividade, que comprovando que o
adotante tinha a intenção de adotar enquanto estava em vida, sua vontade deve ser mantida
após sua morte. Vejamos:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA.


RECONHECIMENTO DE FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA. ADOÇÃO PÓSTUMA.
POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. INEQUÍVOCA MANIFESTAÇÃO DE
VONTADE DO ADOTANTE FALECIDO. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA DAR
PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Em que pese o art. 42, § 6º, do ECA
estabelecer ser possível a adoção ao adotante que, após inequívoca manifestação
de vontade, vier a falecer no curso do procedimento de adoção, a jurisprudência
evoluiu progressivamente para, em situações excepcionais, reconhecer a
possibilidade jurídica do pedido de adoção póstuma, quando, embora não tenha
ajuizado a ação em vida, ficar demonstrado, de forma inequívoca, que, diante de
longa relação de afetividade, o falecido pretendia realizar o procedimento. 2.
Segundo os precedentes desta Corte, a comprovação da inequívoca vontade do
falecido em adotar segue as mesmas regras que comprovam a filiação
socioafetiva: o tratamento do adotando como se filho fosse e o conhecimento
público dessa condição. Nesse sentido: REsp 1.663.137/MG, Rel. Ministra NANCY
ANDRIGHI, Terceira Turma, julgado em 15/08/2017, DJe de 22/08/2017; REsp
1.500.999/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Terceira Turma,
julgado em 12/04/2016, DJe de 19/04/2016. 3. A posse do estado de filho, que
consiste no desfrute público e contínuo da condição de filho legítimo, foi atestada
pelo Tribunal de origem diante das inúmeras fotos de família e eventos sociais,
boletins escolares, convites de formatura e casamento, além da robusta prova
testemunhal, cujos relatos foram uníssonos em demonstrar que os adotandos
eram reconhecidos como filhos, tanto no tratamento como no sobrenome que
ostentavam, e assim eram apresentados ao meio 4. Afastada a impossibilidade
jurídica do pedido, na situação concreta o pedido de adoção post mortem deve
ser apreciado, mesmo na ausência de expresso início de formalização do processo
em vida, já que é possível extrair dos autos, dentro do contexto de uma sólida
relação socioafetiva construída, que a real intenção do de cujus era assumir os
adotandos como filhos. 5. Agravo interno provido para dar provimento ao recurso
especial. AgInt no REsp 1520454.

Destaca-se que deve haver provas inequívocas da vontade do adotante falecido


de que tinha mesmo a intenção de adotar a criança ou adolescente. Por exemplo,
fotos da convivência, o convívio público para que as demais pessoas possam
afirmar que realmente já existia a vontade de adotar, ou outros documentos que
juntos dão a certeza da vontade do falecido.
Da responsabilidade civil em caso de abandono afetivo

A respeito deste tema tão abordado


atualmente, é importante fazer leitura de um
artigo esclarecedor publicado por Flávio
Tartuce.32

A responsabilidade civil no Direito de


Família projeta-se para além das relações de
casamento ou de união estável, sendo
possível a sua incidência na parentalidade ou filiação, ou seja, nas relações entre pais e filhos. Uma
das situações em que isso ocorre diz respeito à responsabilidade civil por abandono afetivo,
também denominado abandono paterno-filial ou teoria do desamor.

Trata-se de aplicação do princípio da solidariedade social ou familiar, previsto no art. 3º, inc. I,
da Constituição Federal, de forma imediata a uma relação privada, ou seja, em eficácia horizontal.
Como explica Rodrigo da Cunha Pereira, precursor da tese que admite tal indenização, "o exercício
da paternidade e da maternidade – e, por conseguinte, do estado de filiação – é um bem
indisponível para o Direito de Família, cuja ausência propositada tem repercussões e consequências
psíquicas sérias, diante das quais a ordem legal/constitucional deve amparo, inclusive, com
imposição de sanções, sob pena de termos um Direito acéfalo e inexigível" (Responsabilidade civil
por abandono afetivo. In: Responsabilidade civil no direito de família. Coord. Rolf Madaleno e
Eduardo Barbosa. São Paulo: Atlas, 2015, p. 401).

O jurista também fundamenta a eventual reparabilidade pelos danos decorrentes do abandono


na dignidade da pessoa humana, eis que "o Direito de Família somente estará em consonância
com a dignidade da pessoa humana se determinadas relações familiares, como o vínculo entre
pais e filhos, não forem permeados de cuidado e de responsabilidade, independentemente da
relação entre os pais, se forem casados, se o filho nascer de uma relação extraconjugal, ou mesmo

32
Da indenização por abandono afetivo na mais recente jurisprudência brasileira. Disponível em
www.migalhas.com.br/FamiliaeSucessoes. Acesso em: 10 de Dezembro de 2019.
se não houver conjugalidade entre os pais, se ele foi planejado ou não. (...) Em outras palavras,
afronta o princípio da dignidade humana o pai ou a mãe que abandona seu filho, isto é, deixa
voluntariamente de conviver com ele" (PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Responsabilidade Civil por
abandono afetivo. In: Responsabilidade Civil no Direito de Família, ob. cit., p. 406). Para ele, em seu
texto mais recente, além da presença de danos morais, pode-se cogitar uma indenização
suplementar, pela presença da perda da chance de convivência com o pai.

O doutrinador e presidente nacional do IBDFAM atuou na primeira ação judicial em que se


reconheceu a indenização extrapatrimonial por abandono filial. Na ocasião, o então Tribunal de
Alçada de Minas Gerais condenou um pai a pagar indenização de duzentos salários mínimos a
título de danos morais ao filho, por não ter com ele convivido (Apelação Cível n. 408.550-5 da
Comarca de Belo Horizonte. Sétima Câmara Cível. Presidiu o julgamento o Juiz José Affonso da
Costa Côrtes e dele participaram os Juízes Unias Silva, relator, D. Viçoso Rodrigues, revisor, e José
Flávio Almeida, vogal).

Filiando-se ao julgado mineiro e à possibilidade de indenização em casos semelhantes também


está a Professora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, uma das maiores juristas deste País
na atualidade, expoente não só do Direito de Família, mas também da Responsabilidade Civil. De
acordo com as suas lições, "a responsabilidade dos pais consiste principalmente em dar
oportunidade ao desenvolvimento dos filhos, consiste principalmente em ajudá-los na construção
da própria liberdade. Trata-se de uma inversão total, portanto, da ideia antiga e maximamente
patriarcal de pátrio poder. Aqui, a compreensão baseada no conhecimento racional da natureza
dos integrantes de uma família quer dizer que não há mais fundamento na prática da coisificação
familiar (...). Paralelamente, significa dar a devida atenção às necessidades manifestas pelos filhos
em termos, justamente, de afeto e proteção. Poder-se-ia dizer, assim, que uma vida familiar na
qual os laços afetivos são atados por sentimentos positivos, de alegria e amor recíprocos em vez
de tristeza ou ódio recíprocos, é uma vida coletiva em que se estabelece não só a autoridade
parental e a orientação filial, como especialmente a liberdade paterno-filial" (HIRONAKA, Giselda
Maria Fernandes Novaes. Os contornos jurídicos da responsabilidade afetiva nas relações entre pais
e filhos: além da obrigação legal de caráter material. Disponível em: . Acesso em 21 jun. 2017).

Entretanto, como se sabe, o Superior Tribunal de Justiça reformou a primeira decisão do Tribunal
de Minas Gerais, afastando o dever de indenizar no caso em questão, diante da ausência de ato
ilícito, pois o pai não seria obrigado a amar o filho. Em suma, o abandono afetivo seria situação
incapaz de gerar reparação pecuniária (STJ, Recurso Especial 757.411/MG, Relator Ministro
Fernando Gonçalves; votou vencido o ministro Barros Monteiro, que não conhecia do recurso. Os
Ministros Aldir Passarinho Junior, Jorge Scartezzini e Cesar Asfor Rocha votaram com o Ministro
relator. Data do julgamento: 29 de novembro de 2005).

De qualquer modo, tal decisão do Tribunal da Cidadania não encerrou o debate quanto à
indenização por abandono afetivo, que permanece intenso na doutrina. Cumpre destacar parte da
doutrina se posiciona no sentido de existir o dever de indenizar em tais casos, especialmente se
houver um dano psíquico ensejador de dano moral, a ser demonstrado por prova psicanalítica. O
desrespeito ao dever de convivência é muito claro, eis que o art. 1.634 do Código Civil impõe
como atributos do poder familiar a direção da criação dos filhos e o dever de ter os filhos em sua
companhia. Além disso, o art. 229 da Constituição Federal é cristalino ao estabelecer que os pais
têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. Violado esse dever e sendo causado o
dano ao filho, estará configurado o ato ilícito, nos exatos termos do que estabelece o art. 186 do
Código Civil em vigor.

Quanto ao argumento de eventual monetarização do afeto, nota-se que a Constituição Federal


encerrou definitivamente tal debate, ao reconhecer expressamente a reparação dos danos morais
em seu art. 5º, incs. V e X. Aliás, se tal argumento for levado ao extremo, a reparação por danos
extrapatrimoniais não seria cabível em casos como de morte de pessoa da família, por exemplo.

A propósito, demonstrando evolução quanto ao tema, surgiu, no ano de 2012, outra decisão
do Superior Tribunal de Justiça em revisão à ementa anterior, ou seja, admitindo a reparação civil
pelo abandono afetivo. A ementa foi assim publicada por esse Tribunal Superior:

"Civil e Processual Civil. Família. Abandono afetivo. Compensação por dano moral. Possibilidade.
1. Inexistem restrições legais à aplicação das regras concernentes à responsabilidade civil e o
consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Família. 2. O cuidado como valor jurídico
objetivo está incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa expressão, mas com
locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da
CF/1988. 3. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se
reconhecer a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non facere, que
atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e
companhia – de cuidado –, importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí, a
possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico. 4. Apesar
das inúmeras hipóteses que minimizam a possibilidade de pleno cuidado de um dos genitores em
relação à sua prole, existe um núcleo mínimo de cuidados parentais que, para além do mero
cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à afetividade, condições para uma
adequada formação psicológica e inserção social. 5. A caracterização do abandono afetivo, a
existência de excludentes ou, ainda, fatores atenuantes – por demandarem revolvimento de matéria
fática – não podem ser objeto de reavaliação na estreita via do recurso especial. 6. A alteração do
valor fixado a título de compensação por danos morais é possível, em recurso especial, nas
hipóteses em que a quantia estipulada pelo Tribunal de origem revela-se irrisória ou exagerada. 7.
Recurso especial parcialmente provido" (STJ, REsp 1.159.242/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy
Andrighi, j. 24/04/2012, DJe 10/05/2012).

Em sua relatoria, a julgadora ressalta, de início, ser admissível aplicar o conceito de dano moral
nas relações familiares, sendo despiciendo qualquer tipo de discussão a esse respeito, pelos
naturais diálogos entre livros diferentes do Código Civil de 2002. Desse modo, supera-se totalmente
a posição firmada no primeiro julgado superior sobre o tema, especialmente o que foi desenvolvido
pelo então Ministro Asfor Rocha, da impossibilidade de interação entre o Direito de Família e a
Responsabilidade Civil.

Para a Ministra Nancy Andrighi, ainda, o dano extrapatrimonial estaria presente diante de uma
obrigação inescapável dos pais em dar auxílio psicológico aos filhos. Aplicando a ideia do cuidado
como valor jurídico, com fundamento no princípio da afetividade, a julgadora deduz pela presença
do ilícito e da culpa do pai pelo abandono afetivo, expondo frase que passou a ser repetida nos
meios sociais e jurídicos: "amar é faculdade, cuidar é dever". Concluindo pelo nexo causal entre a
conduta do pai que não reconheceu voluntariamente a paternidade de filha havida fora do
casamento e o dano a ela causado pelo abandono, a magistrada entendeu por reduzir o quantum
reparatório que foi fixado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, de R$ 415.000,00 (quatrocentos e
quinze mil reais) para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais).

Esse último acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça representa correta concretização
jurídica do princípio da solidariedade; sem perder de vista a função pedagógica ou de desestímulo
que deve ter a responsabilidade civil, no sentido de evitar que outros pais abandonem os seus
filhos.

De todo modo, fazendo uma pesquisa mais atual, posterior ao último aresto superior, nota-se
que há ainda grande vacilação jurisprudencial na admissão da reparação civil por abandono afetivo,
com ampla prevalência de julgados que concluem pela inexistência de ato ilícito em casos tais,
notadamente pela ausência de prova do dano.

Trilhando esse caminho, de acordo com a primeira orientação do Tribunal da Cidadania, na


Corte Estadual que despertou o debate, deduziu-se que "por não haver nenhuma possibilidade de
reparação a que alude o art. 186 do CC, que pressupõe prática de ato ilícito, não há como
reconhecer o abandono afetivo como dano passível de reparação" (TJMG, Apelação Cível n.
1.0647.15.013215-5/001, Rel. Des. Saldanha da Fonseca, julgado em 10/05/2017, DJEMG
15/05/2017).

Na mesma linha, sem prejuízo de muitas outras ementas de negação do ilícito: "a pretensão de
indenização pelos danos sofridos em razão da ausência do pai não procede, haja vista que para a
configuração do dano moral faz-se necessário prática de ato ilícito. Beligerância entre os genitores"
(TJRS, Apelação Cível n. 0048476-69.2017.8.21.7000, Teutônia, Sétima Câmara Cível, Rel. Des. Jorge
Luís Dall’Agnol, julgado em 26/04/2017, DJERS 04/05/2017). De todo modo, pode ser notada certa
confusão técnica no último decisum, pois não é o ilícito que é elemento do dano moral, mas vice-
versa.

Por outra via, concluindo pela ausência de prova do dano, entendeu o Tribunal de Justiça de
São Paulo que "a jurisprudência pátria vem admitindo a possibilidade de dano afetivo suscetível
de ser indenizado, desde que bem caracterizada violação aos deveres extrapatrimoniais integrantes
do poder familiar, configurando traumas expressivos ou sofrimento intenso ao ofendido.
Inocorrência na espécie. Depoimentos pessoais e testemunhais altamente controvertidos.
Necessidade de prova da efetiva conduta omissiva do pai em relação à filha, do abalo psicológico
e do nexo de causalidade. Alegação genérica não amparada em elementos de prova. Non liquet,
nos termos do artigo 373, I, do Código de Processo Civil, a impor a improcedência do pedido"
(TJSP, Apelação n. 0006195-03.2014.8.26.0360, Acórdão n. 9689092, Mococa, Décima Câmara de
Direito Privado, Rel. Des. J. B. Paula Lima, julgado em 09/08/2016, DJESP 02/09/2016).
Em complemento, e mais recentemente, o Tribunal gaúcho aduziu que "o dano moral exige
extrema cautela no âmbito do direito de família, pois deve decorrer da prática de um ato ilícito,
que é considerado como aquela conduta que viola o direito de alguém e causa a este um dano,
que pode ser material ou exclusivamente moral. Para haver obrigação de indenizar, exige-se a
violação de um direito da parte, com a comprovação dos danos sofridos e do nexo de causalidade
entre a conduta desenvolvida e o dano sofrido, e o mero distanciamento afetivo entre pais e filhos
não constitui, por si só, situação capaz de gerar dano moral" (TJRS, Apelação Cível n. 0087881-
15.2017.8.21.7000, Porto Alegre, Sétima Câmara Cível, Relª Desª Liselena Schifino Robles Ribeiro,
julgado em 31/05/2017, DJERS 06/06/2017). Consta-se que muitos julgamentos seguem a última
frase da ementa, segundo a qual o mero distanciamento físico entre pai e filho não configura, por
si só, o ilícito indenizante.

Diante desse panorama recente, recomenda-se que os pedidos de indenização por abandono
afetivo sejam bem formulados, inclusive com a instrução ou realização de prova psicossocial do
dano suportado pelo filho. Nota-se que os julgados estão orientados pela afirmação de que não
basta a prova da simples ausência de convivência para que caiba a indenização.

Acrescente-se que no próprio Superior Tribunal de Justiça existem acórdãos recentes que não
admitem a reparação de danos por abandono afetivo antes do reconhecimento da paternidade.
Desse modo, julgando "alegada ocorrência de abandono afetivo antes do reconhecimento da
paternidade. Não caracterização de ilícito. Precedentes" (STJ, AREsp 1.071.160/SP, Terceira Turma,
Rel. Min. Moura Ribeiro, DJE 19/06/2017). Ou, ainda, "a Terceira Turma já proclamou que antes do
reconhecimento da paternidade, não há se falar em responsabilidade por abandono afetivo" (STJ,
Agravo Regimental no AREsp n. 766.159/MS, Terceira Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro, DJE
09/06/2016).

Em suma, parece que a doutrina contemporânea foi bem festiva em relação à admissão da
reparação imaterial por abandono afetivo, em especial após o julgamento do REsp 1.159.242/SP,
em 2012. Porém, no âmbito da jurisprudência, há certo ceticismo, com numerosos julgados que
afastam a indenização. Muitos deles o fazem também com base na existência de prescrição da
pretensão.
Da paternidade socioafetiva

Os filhos que são adotados possuem os mesmos direitos que os demais. De igual forma,
aqueles que foram reconhecidos como parentes em virtude do longo convívio, apto a gerar
afeto indiscutível, também possuem a mesma proteção legal.

O enunciado 103 CEJ dispõe que:

[...] ocódigo civill reconhece, no art.1593, outras espécies de parentesco civil


além daquele decorrente da adoção, acolhendo, assim, a noção de que há
também parentesco civil no vínculo parental proveniente quer das técnicas de
reprodução assistida heteróloga relativamente ao pai (ou mãe) que não
contribuiu com seu material fecundante, quer da paternidade socioafetiva,
fundada na posse de estado de filho.

Conforme ementa abaixo, já foi reconhecida a repercussão geral da matéria:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE


ANULAÇÃO DE ASSENTO DE NASCIMENTO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE.
IMPRESCRITIBILIDADE. RETIFICAÇÃO DE REGISTRO. PATERNIDADE BIOLÓGICA.
PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. CONTROVÉRSIA GRAVITANTE EM TORNO DA
PREVALÊNCIA DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA EM DETRIMENTO DA
PATERNIDADE BIOLÓGICA. ART. 226, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
PLENÁRIO VIRTUAL. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. (ARE 692186 RG,
Relator: Min. LUIZ FUX, julgado em 29/11/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-
034 DIVULG 20-02-2013 PUBLIC 21-02-2013).

O certo é que, elevando os princípios constitucionais, o Código Civil, em boa hora, colocou
em evidência a circunstância de que a paternidade e a maternidade podem ter origem fora da
mera vinculação biológica.
Da alienação parental
 Assim dispõe a Lei da Alienação Parental:

Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação


psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos
genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua
autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo
ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos


atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados
diretamente ou com auxílio de terceiros:

I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da


paternidade ou maternidade;

II - dificultar o exercício da autoridade parental;

III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;

IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;

V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a


criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;

VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra


avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar
a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares
deste ou com avós.

Art. 3º A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança


ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de
afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral
contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à
autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.

Art. 4º Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de


ofício, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente,
o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido
o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da
integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar
sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos,
se for o caso.

Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia


mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de
prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado
por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das
visitas.

Art. 5º Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação


autônoma ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou
biopsicossocial.

§ 1º O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial,


conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes,
exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da
separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos
e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual
acusação contra genitor.

§ 2º A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar


habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico
profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.

§ 3º O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de


alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo,
prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa
circunstanciada.

Art. 6º Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta


que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação
autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da
decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de
instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a
gravidade do caso:

I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;

II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;

III - estipular multa ao alienador;

IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;

V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;


VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;

VII - declarar a suspensão da autoridade parental.

Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou


obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de
levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por
ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.

Art. 7º A atribuição ou alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor


que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor
nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada.

Art. 8º A alteração de domicílio da criança ou adolescente é irrelevante para a


determinação da competência relacionada às ações fundadas em direito de
convivência familiar, salvo se decorrente de consenso entre os genitores ou de
decisão judicial.

Nos termos do art. 2.º da Lei 12.318, de 26 de agosto de 2010, “considera-se alienação
parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou
induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob
a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao
estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”. O dispositivo exemplifica algumas
situações concretas de alienação parental:

 Realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da


paternidade ou maternidade;
 Dificultar o exercício da autoridade parental;
 Dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
 Dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
 Omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou
adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
 Apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para
obstar o dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
 Mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando dificultar a convivência
da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

Conforme o art. 3º da Lei 12.318/2010 “a prática de ato de alienação parental fere direito
fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a
realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral
contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental
ou decorrentes de tutela ou guarda”. Desse modo, não há dúvida que, além das consequências
para o poder familiar, a alienação parental pode gerar a responsabilidade civil do alienador,
por abuso de direito art. 187 do CC).

O art. 4º da mesma lei, vem para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a
efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso. Conforme decisão do Superior Tribunal de
Justiça do ano de 2014, essa última norma gera a conclusão de incidência do Código de Processo
Civil para os casos de alienação parental, o que deve ser mantido no que diz respeito ao Novo
CPC.

Da tomada de decisão apoiada

Conforme o art. 1.783-A, a tomada de decisão apoiada


é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo
menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as quais mantenha
vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe
apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil,
fornecendo-lhes os elementos e informações necessários
para que possa exercer sua capacidade.

Art. 1.783-A. A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a


pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas,
com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para
prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil,
fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que
possa exercer sua capacidade. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
(Vigência)

§1º Para formular pedido de tomada de decisão apoiada, a pessoa


com deficiência e os apoiadores devem apresentar termo em que
constem os limites do apoio a ser oferecido e os compromissos
dos apoiadores, inclusive o prazo de vigência do acordo e o
respeito à vontade, aos direitos e aos interesses da pessoa que
devem apoiar. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 2º O pedido de tomada de decisão apoiada será requerido pela
pessoa a ser apoiada, com indicação expressa das pessoas aptas a
prestarem o apoio previsto no caput deste artigo. (Incluído pela Lei
nº 13.146, de 2015) (Vigência)
§ 3º Antes de se pronunciar sobre o pedido de tomada de decisão
apoiada, o juiz, assistido por equipe multidisciplinar, após oitiva do
Ministério Público, ouvirá pessoalmente o requerente e as pessoas
que lhe prestarão apoio. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
(Vigência)

O §4º da lei dispõe que a decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos sobre
terceiros, sem restrições, desde que esteja inserida nos limites do apoio acordado.

§ 4º A decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos


sobre terceiros, sem restrições, desde que esteja inserida nos limites
do apoio acordado. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)

Conforme § 5º, o terceiro com quem a pessoa apoiada mantenha relação negocial pode
solicitar que os apoiadores contra-assinem o contrato ou acordo, especificando, por escrito, sua
função em relação ao apoiado.

Por sua vez, caso de negócio jurídico que possa trazer risco ou prejuízo relevante, havendo
divergência de opiniões entre a pessoa apoiada e um dos apoiadores, deverá o juiz, ouvido o
Ministério Público, decidir sobre a questão.
§ 5º Terceiro com quem a pessoa apoiada mantenha relação negocial pode
solicitar que os apoiadores contra-assinem o contrato ou acordo, especificando,
por escrito, sua função em relação ao apoiado. (Incluído pela Lei nº 13.146, de
2015) (Vigência)

§ 6º Em caso de negócio jurídico que possa trazer risco ou prejuízo relevante,


havendo divergência de opiniões entre a pessoa apoiada e um dos apoiadores,
deverá o juiz, ouvido o Ministério Público, decidir sobre a questão. (Incluído pela
Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)

O § 7º acrescenta que "se o apoiador agir com negligência, exercer pressão indevida ou não
adimplir as obrigações assumidas, poderá a pessoa apoiada ou qualquer pessoa
apresentar denúncia ao Ministério Público ou ao juiz.

§ 7º Se o apoiador agir com negligência, exercer pressão indevida ou não adimplir


as obrigações assumidas, poderá a pessoa apoiada ou qualquer pessoa
apresentar denúncia ao Ministério Público ou ao juiz. (Incluído pela Lei nº 13.146,
de 2015) (Vigência)

Prevê o §8º que se procedente a denúncia, o juiz destituirá o apoiador e nomeará, ouvida
a pessoa apoiada e se for de seu interesse, outra pessoa para prestação de apoio.

§ 8º Se procedente a denúncia, o juiz destituirá o apoiador e nomeará, ouvida a


pessoa apoiada e se for de seu interesse, outra pessoa para prestação de apoio.
(Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)

Por sua vez, o §9º dispõe que "a pessoa apoiada pode, a qualquer tempo, solicitar o término
de acordo firmado em processo de tomada de decisão apoiada".

§ 9º A pessoa apoiada pode, a qualquer tempo, solicitar o término de acordo


firmado em processo de tomada de decisão apoiada. (Incluído pela Lei nº 13.146,
de 2015) (Vigência)

O §10 acrescenta que "o apoiador pode solicitar ao juiz a exclusão de sua participação do
processo de tomada de decisão apoiada, sendo seu desligamento condicionado à
manifestação do juiz sobre a matéria".
§ 10. O apoiador pode solicitar ao juiz a exclusão de sua participação do processo
de tomada de decisão apoiada, sendo seu desligamento condicionado à
manifestação do juiz sobre a matéria. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
(Vigência)

Finalmente, conforme dispõe o §11 do supramencionado artigo, aplicam-se à tomada de


decisão apoiada, no que couber, as disposições referentes à prestação de contas na curatela.

§ 11. Aplicam-se à tomada de decisão apoiada, no que couber, as disposições


referentes à prestação de contas na curatela. (Incluído pela Lei nº 13.146, de
2015) (Vigência)

Da guarda, tutela e curatela

 Guarda

A guarda consiste na atribuição de um dos pais, quando separados ou a ambos,


quando juntos, dos encargos de cuidado, proteção, zelo e custódia do filho. Quando
é exercida por um dos pais, diz-se unilateral ou exclusiva; quando por ambos,
compartilhada.

 Guarda Uniparental ou Exclusiva


Aqui, o filho fica sob responsabilidade de um dos pais, cabendo ao outro o
direito de visita, sendo atribuída pelo juiz a um dos pais quando não chegarem
ao acordo e se tornar inviável a guarda compartilhada.
Pode também ser atribuída a terceiros, quando o juiz se convencer que
nenhum dos pais preenche as condições necessárias para tal.

 Guarda Compartilhada
Na guarda compartilhada os pais dividem a responsabilidade na condução da
vida do filho, de forma conjunta, sem haver a prevalência de um sobre o
outro. A Lei 11.698/08 instituiu a guarda compartilhada, que passa a ser
prioridade para o juiz quando não existe acordo entre os pais, podendo ser
fixada também por consenso entre os genitores. Essa guarda compartilhada
de filhos aplica-se para casais divorciados, de uniões estáveis ou de relações
individuais.

 Guarda Alternada
Na guarda alternada, há a possibilidade de cada um dos pais deter a guarda
do filho alternadamente. Nesse período, que pode ser de um ano, um mês,
uma semana ou qualquer outro período acordado, o responsável detém de
forma exclusiva os direitos e deveres em relação ao menor.

 Tutela
A tutela é um encargo a que se submete determinada pessoa, a quem se atribui a
incumbência de administrar os bens e reger a vida de indivíduo menor de idade
que não se encontra sob o poder familiar do pai e nem da mãe. É o dever de
solidariedade que se atribui ao Estado, à sociedade e aos parentes. Ao Estado, para
que regule as respectivas garantias e assegure a prestação jurisdicional. À sociedade,
pois qualquer pessoa que preencha os requisitos legais poderá ser investida pelo
Judiciário desse múnus. Aos parentes, porque são os primeiros a serem convocados,
salvo se legalmente dispensados. Trata-se, então, de um serviço público prestado por
particular em caráter compulsório.

 Documental
A tutela deve ser instituída através de documento autêntico, firmado por um
ou ambos os pais, em conjunto ou separadamente. Vale qualquer escrito
(carta, escritura pública, escrito particular, desde que deixe claro a nomeação
e a identidade do signatário).
 Testamentária
O pai ou a mãe, através de testamento ou documento autêntico indicam a
pessoa que será o tutor para os filhos menores, que deixam ao morrer. Por
ser vedado testamento em conjunto, cada um deve indicar o tutor em
instrumento distinto. Mesmo que um testamento seja considerado nulo ou
anulável, a nomeação do tutor, se não tiver maculada a vontade do nomeador,
terá validade. Caberá ao tutor, no prazo de 30 dias após a abertura da
sucessão, ingressar com pedido de controle judicial do ato (ECA 37), sendo
concedida se comprovado que a medida é vantajosa para o tutelado e que
não existe outra pessoa em condições melhores para assumi-la.

 Legítima
Na falta de tutela testamentária, serão convocados os parentes consanguíneos
(ascendentes e os colaterais, conforme ordem disposta no Art. 1731 do CC).
Porém, em benefício do tutelado, o juiz poderá escolher quem entender mais
apto a exercer esta função. É imperioso atender ao melhor interesse do
infante, devendo o encargo ser atribuído a quem já tiver com ele alguma
afinidade, ainda que se afaste o juiz do rol legal.

 Dativa
Na falta ou exclusão do tutor legítimo ou testamentário, bem como ausência
de parentes em condições de exercer a tutela, o juiz nomeará, através de
sentença judicial, pessoa estranha, mas idônea e que resida no domicílio do
menor para que assuma este encargo da tutela. Trata-se de uma tutela
subsidiária, e tem como regra, em caso de irmãos menores, apenas um tutor
para todos. Em se tratando de pais desconhecidos, falecidos, ou suspensos ou
destituídos do poder familiar, serão incluídos no programa de colocação
familiar (Art. 1.734 do CC).
 Curatela
A curatela é um instituto protetivo dos maiores de idade, mas incapazes, ou seja, sem
condições de zelar por seus próprios interesses, reger sua vida e administrar seu
patrimônio. O processo de interdição é o meio próprio para incapacitar aqueles
desprovidos de discernimento, sujeitando-se também à curatela os nascituros,
ausentes, enfermos e os deficientes físicos. Também trata-se de múnus público. A
curatela está diposta no CC/02, em seu Título IV do Livro IV, Capítulo II, art. 1767 a
1783, bem como no ECA (Lei 8069/90) como também na Lei de Registros Publicos (Lei
6.015/73.

6.Responsabilidade Civil (arts. 185 ao 188 e 927 ao 954 do CC)


A responsabilidade civil surge diante do descumprimento obrigacional, por deixar
determinada pessoa de observar um preceito normativo que regula a vida, ou pela desobediência
de uma regra estabelecida em um contrato.

Inicialmente, cumpre ressaltar que é imprescindível a leitura dos artigos 185 ao 188 e 927 ao
954 do Código Civil, dada sua importância e incidência nos certames.

Pressupostos do Dever de Indenizar

Consoante os ensinamentos de Flávio Tartuce, existem quatro pressupostos do dever de


indenizar:

 Conduta humana
Para alguns autores, como exposto, a conduta humana e a culpa podem ser
fundidas como um só elemento subjetivo da responsabilidade civil. Para fins didáticos,
preferimos dividi-las. Assim sendo, a conduta humana pode ser causada por uma ação
(conduta positiva) ou omissão (conduta negativa) voluntária ou por negligência,
imprudência ou imperícia, modelos jurídicos que caracterizam o dolo e a culpa,
respectivamente. A regra é a ação ou conduta positiva; já para a configuração da
omissão é necessário que exista o dever jurídico de praticar determinado ato (omissão
genérica), bem como a prova de que a conduta não foi praticada (omissão específica).

 Culpa genérica ou lato sensu


Esclareça-se que, quando se fala em responsabilidade com ou sem culpa, leva-se
em conta a culpa em sentido amplo ou a culpa genérica (culpa lato sensu), que engloba
o dolo e a culpa estrita (stricto sensu).
O dolo, na responsabilidade civil, merece o mesmo tratamento da culpa grave ou
gravíssima.
A partir das lições do italiano Chironi, a culpa pode ser conceituada como sendo o
desrespeito a um dever preexistente, não havendo propriamente uma intenção de violar
o dever jurídico. Na doutrina nacional, Sérgio Cavalieri Filho apresenta três elementos
na caracterização da culpa: a) a conduta voluntária com resultado involuntário; b) a
previsão ou previsibilidade; e c) a falta de cuidado, cautela, diligência e atenção.
Conforme os seus ensinamentos, “em suma, enquanto no dolo o agente quer a
conduta e o resultado, a causa e a consequência, na culpa a vontade não vai além da
ação ou omissão. O agente quer a conduta, não, porém, o resultado; quer a causa, mas
não quer o efeito”. Concluindo, deve-se retirar da culpa o elemento intencional, que
está presente no dolo.

 Nexo de causalidade
O nexo de causalidade ou nexo causal constitui o elemento imaterial ou virtual da
responsabilidade civil, constituindo a relação de causa e efeito entre a conduta culposa
– ou o risco criado – e o dano suportado por alguém.

 Dano ou prejuízo
Como é notório, para que haja pagamento de indenização, além da prova de culpa
ou dolo na conduta é necessário comprovar o dano patrimonial ou extrapatrimonial
suportado por alguém. Em regra, não há responsabilidade civil sem dano, cabendo o
ônus de sua prova ao autor da demanda, aplicação do art. 373, I, do CPC/2015,
correspondente ao art. 333, I, do CPC/1973.
De toda sorte, cabe lembrar que, em alguns casos, se admite a inversão do ônus
da prova do dano ou prejuízo, como nas hipóteses envolvendo as relações de consumo,
presente a hipossuficiência do consumidor ou a verossimilhança de suas alegações (art.
6.º, VIII, da Lei 8.078/1990).
Ademais, o Novo CPC ampliou essa inversão para qualquer hipótese em que houver
dificuldade na construção probatória, tratando da carga dinâmica da prova. Nos termos
do § 1.º do seu art. 373, nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da
causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo
probatório ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz
atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada.
Em hipóteses tais, nos termos do mesmo preceito, o juiz deverá dar à parte a
oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído. Parte da doutrina
considera que o entendimento pode ser aplicado a vulneráveis que não são
consumidores, caso dos aderentes contratuais para quem o conteúdo do negócio é
imposto.

Responsabilidade civil subjetiva

A responsabilidade civil subjetiva constitui regra geral em nosso ordenamento jurídico,


baseada na teoria da culpa. De acordo com a teoria da responsabilidade subjetiva, para que o
agente responda civilmente, é necessária a comprovação da sua culpa genérica, que inclui o dolo
(intenção de prejudicar) e a culpa em sentido restrito (imprudência, negligência ou imperícia).

A responsabilidade civil trabalha nos limites da conduta comissiva ou omissiva do agente


agressor (subjetiva) ou do mero risco de determinada atividade gerado por ele (objetiva). Ou
seja, o ofensor tem o dever de reparar ou restituir o mal causado desde que comprovado o
dano, o nexo causal e a sua culpa.
Neste sentido, Sergio Cavalieri Filho33 expõe que "Por essa concepção clássica, todavia, a
vítima só obterá a reparação do dano se provar a culpa do agente, o que nem sempre é
possível na sociedade moderna. O desenvolvimento industrial, proporcionado pelo advento do
maquinismo e outros inventos tecnológicos, bem como o crescimento populacional geraram
novas situações que não podiam ser amparadas pelo conceito tradicional de culpa".

Responsabilidade Civil Objetiva

O Código Civil em seu art. 927, parágrafo único, declara expressamente a existência da
Responsabilidade Objetiva. Vejamos:

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano
a outrem, é obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,


independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

A responsabilidade objetiva independe de culpa e é fundada na Teoria do


Risco.

A responsabilidade objetiva é tratada como sistema subsidiário, segundo a qual deve o


ofensor reparar, restituindo ou restaurando o ofendido independentemente de culpa,
bastando a comprovação do dano e do nexo causal, elementos essenciais para o seu
surgimento.

33 Programa de responsabilidade civil, 7ªedição, p. 16. São Paulo : Atlas, 2007.


Vejamos o que ensina Tartuce a respeito dos elementos essenciais para o surgimento da
responsabilidade objetiva:

”Haverá responsabilidade independentemente de culpa em duas


situações:

1.º). Nos casos previstos expressamente em lei. Como primeiro


exemplo, cite-se a responsabilidade objetiva dos fornecedores de
produtos e prestadores de serviços frente aos consumidores,
prevista no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990).
Como segundo exemplo, destaque-se a responsabilidade civil
ambiental, consagrada pela Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente (art. 14, § 1.º, da Lei 6.938/1981). O terceiro exemplo é
a Lei 12.846, de 1.º de agosto de 2013, que dispõe sobre a
responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas, pela
prática de atos contra a administração pública, especialmente por
corrupção. De acordo com o art. 2.º da última norma, as pessoas
jurídicas serão responsabilizadas objetivamente, nos âmbitos
administrativo e civil, pelos atos lesivos previstos no seu texto,
praticados em seu interesse ou benefício, exclusivo ou não.

2.º). Uma atividade de risco normalmente desempenhada pelo


autor do dano, o que é consagração da cláusula geral de
responsabilidade objetiva. Como se pode notar, trata-se de uma
atividade normalmente lícita, que causa danos aos direitos de
outrem. Esses “direitos de outrem” devem abranger não apenas a
vida e a integridade física, mas também outros direitos, de caráter
patrimonial ou extrapatrimonial, conforme o preciso Enunciado n.
555 do CJF/STJ, da VI Jornada de Direito Civil (2013).”

Para o surgimento do dever de indenizar em ambas as espécies de responsabilidade,


devem estar presentes os requisitos ensejadores já retratados anteriormente, com a
diferença que na responsabilidade civil subjetiva a culpa é demonstrada com a
comprovação do descumprimento do pactuado entre as partes.
Excludentes de responsabilidade
 Legítima Defesa
De acordo com o art. 188, I, do CC:

Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito


reconhecido;

Ou seja, não constituem atos ilícitos os praticados em legítima defesa.


Um dos conceitos de legítima defesa pode ser retirado do art. 25 do Código Penal.34
Na legítima defesa, o agente não pode atuar além do indispensável para afastar o dano
ou a iminência de prejuízo material ou imaterial.

A legítima defesa putativa não exclui o dever de indenizar. Na legítima defesa


putativa o agente imagina que está defendendo um direito seu, o que não ocorre
realmente no plano fático.

Havendo excesso na defesa em relação a terceiros, não estará presente a mencionada


excludente de ilicitude, surgindo o dever de indenizar diante do ato praticado (aberratio ictus).
De qualquer forma, estará assegurado o direito de regresso contra eventual culpado, seja com
base no art. 930 do CC, seja com fundamento no art. 934 da mesma codificação material.

34
“Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta
agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
 Do estado de necessidade ou remoção de perigo iminente
De acordo com o art. 188, II, do CC:

Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

(...)

II - A deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de


remover perigo iminente.

Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as
circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites
do indispensável para a remoção do perigo.

Ou seja, não constitui ato ilícito a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão
à pessoa, a fim de remover perigo iminente, prestes a acontecer, por se tratar de um estado
de necessidade. Em complemento, o parágrafo único do mesmo dispositivo disciplina que o
ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário,
não excedendo os limites do indispensável à remoção do perigo.

Em havendo excesso, mais uma vez, tanto poderá estar configurado o abuso de
direito (art. 187 do CC) quanto o ato ilícito propriamente dito (art. 186 do CC).

 Do exercício regular de direito ou das próprias funções


De acordo com o art. 188, II, do CC:

Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito


reconhecido;
Ou seja, não constitui ato ilícito o praticado no exercício regular de um direito reconhecido.
Trata-se de uma das excludentes do dever de indenizar mais discutidas no âmbito da
jurisprudência.35
Um primeiro exemplo refere-se à inclusão do nome de devedores no rol dos inadimplentes
ou devedores, em cadastros de natureza privada (Serasa e SPC).
Por uma questão lógica, a inscrição nos casos de inadimplência constitui um exercício regular
de direito do credor, conforme entendimento unânime de nossos Tribunais e dicção do art. 43
do CDC. O raciocínio serve para o protesto de título em casos de não pagamento no prazo fixado
(nessa linha de conclusão: STJ, Ag. 4.4.4 a) b) c) Rg. no Ag. 555.171/RS, Data da decisão:
25.05.2004, 3.ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 02.08.2004, p. 379).
Alerte-se apenas que, antes da inscrição no cadastro de inadimplentes, deve ocorrer a
comunicação ao devedor pela empresa que mantém o cadastro (Súmula 359 do STJ). A falta dessa
comunicação constitui abuso de direito, gerando o dever de reparar. Em reforço, conclui-se
corretamente que “nas ações de responsabilidade civil por cadastramento indevido nos registros
de devedores inadimplentes realizados por instituições financeiras, a responsabilidade civil é
objetiva” (Enunciado n. 553 da VI Jornada de Direito Civil, de 2013).

SAIBA MAIS!

Cláusula de não indenizar


Considerada por parte da doutrina como uma excludente de responsabilidade, a cláusula
de não indenizar constitui a previsão contratual pela qual a parte exclui totalmente a sua
responsabilidade. Essa cláusula é também denominada cláusula de irresponsabilidade ou
cláusula excludente de responsabilidade.

35
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
Dano moral

Conceitua-se o dano moral como lesão a direitos da personalidade, sendo essa a visão que
prevalece na doutrina brasileira.36

Sua reparação não é a determinação de um preço para a dor ou o sofrimento, mas sim um
meio para conter, em parte, as consequências do prejuízo imaterial, o que traz o conceito de
lenitivo, derivativo ou sucedâneo.37

Por esta razão é que se utiliza a expressão reparação e não ressarcimento para os danos
morais.

Cumpre esclarecer que não há, no dano moral, uma finalidade de acréscimo patrimonial para
a vítima, mas sim de compensação pelos males suportados. Tal dedução justifica a não incidência
de imposto de renda sobre o valor recebido a título de indenização por dano moral, o que foi
consolidado pela Súmula 498 do Superior Tribunal de Justiça, do ano de 2012.38

Teoria da perda de uma chance

A perda de uma chance está caracterizada quando a pessoa vê frustrada uma expectativa,
uma oportunidade futura, que, dentro da lógica do razoável, ocorreria se as coisas seguissem o
seu curso normal. A partir dessa ideia, como expõem os autores citados, essa chance deve ser
séria e real. Buscando critérios objetivos para a aplicação da teoria, Sérgio Savi leciona que a

36
sendo essa a visão que prevalece na doutrina brasileira.
37
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019
38
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019
perda da chance estará caracterizada quando a probabilidade da oportunidade for superior a 50%
(cinquenta por cento).39

Recente julgado do Superior Tribunal de Justiça analisou a questão, em acórdão, com a


seguinte publicação:

”A teoria da perda de uma chance pode ser utilizada como critério para a
apuração de responsabilidade civil ocasionada por erro médico na hipótese em
que o erro tenha reduzido possibilidades concretas e reais de cura de paciente
que venha a falecer em razão da doença tratada de maneira inadequada pelo
médico. De início, pode-se argumentar ser impossível a aplicação da teoria da
perda de uma chance na seara médica, tendo em vista a suposta ausência de
nexo causal entre a conduta (o erro do médico) e o dano (lesão gerada pela
perda da vida), uma vez que o prejuízo causado pelo óbito da paciente teve
como causa direta e imediata a própria doença, e não o erro médico. Assim,
alega-se que a referida teoria estaria em confronto claro com a regra insculpida
no art. 403 do CC, que veda a indenização de danos indiretamente gerados pela
conduta do réu. Deve-se notar, contudo, que a responsabilidade civil pela perda
da chance não atua, nem mesmo na seara médica, no campo da mitigação do
nexo causal. A perda da chance, em verdade, consubstancia uma modalidade
autônoma de indenização, passível de ser invocada nas hipóteses em que não se
puder apurar a responsabilidade direta do agente pelo dano final. Nessas
situações, o agente não responde pelo resultado para o qual sua conduta pode
ter contribuído, mas apenas pela chance de que ele privou a paciente. A chance
em si – desde que seja concreta, real, com alto grau de probabilidade de obter
um benefício ou de evitar um prejuízo – é considerada um bem autônomo e
perfeitamente reparável. De tal modo, é direto o nexo causal entre a conduta (o
erro médico) e o dano (lesão gerada pela perda de bem jurídico autônomo: a
chance). Inexistindo, portanto, afronta à regra inserida no art. 403 do CC, mostra-
se aplicável a teoria da perda de uma chance aos casos em que o erro médico
tenha reduzido chances concretas e reais que poderiam ter sido postas à
disposição da paciente” (STJ, REsp 1.254.141/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, j.
04.12.2012, publicado no seu Informativo n. 513).

39
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Editora Método: 2019.
Em outro campo, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul responsabilizou um curso
preparatório para concursos públicos que assumiu o compromisso de transportar o aluno até o
local da prova. Porém, houve atraso no transporte, o que gerou a perda da chance de disputa em
concurso público, surgindo daí o dever de indenizar (TJRS, Processo 71000889238, Data: 07.06.2006,
2.ª Turma Recursal Cível, Juiz Rel. Clovis Moacyr Mattana Ramos, Origem: Comarca de Cruz Alta).
De toda sorte, em caso também envolvendo concurso público, o Superior Tribunal de Justiça
entendeu pela não incidência da teoria, pois a chance do candidato que teve a sua expectativa
frustrada não era séria e real. Vejamos a ementa publicada no Informativo n. 466 daquele Tribunal:

“Teoria. Perda. Chance. Concurso. Exclusão. A Turma decidiu não ser


aplicável a teoria da perda de uma chance ao candidato que pleiteia
indenização por ter sido excluído do concurso público após reprovação
no exame psicotécnico. De acordo com o Min. Relator, tal teoria exige
que o ato ilícito implique perda da oportunidade de o lesado obter
situação futura melhor, desde que a chance seja real, séria e lhe
proporcione efetiva condição pessoal de concorrer a essa situação. No
entanto, salientou que, in casu, o candidato recorrente foi aprovado
apenas na primeira fase da primeira etapa do certame, não sendo
possível estimar sua probabilidade em ser, além de aprovado ao final
do processo, também classificado dentro da quantidade de vagas
estabelecidas no edital” (STJ, AgRg no REsp 1.220.911/RS, Rel. Min.
Castro Meira, j. 17.03.2011).

Caso tenha gostado do material, ou tenha sugestões de material que gostaria

de receber mais, manda um oi para sugestoes@adverum.com.br.


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