Você está na página 1de 15

Página 1 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos: uma


revisão da literatura

Relationship between parents’ social skills and children’s behavior: a


literature review

Relaciones entre habilidades sociales de padres y comportamiento de los


hijos: una revisión de la literatura

Erika Borges dos Santos1

João Wachelke2

Resumo

O presente artigo teve como objetivo efetuar uma revisão bibliográfica narrativa focada nas habilidades
sociais (HS) dos pais e sua influência no modo como criam seus filhos e no repertório social destes. HS
é um conjunto de capacidades utilizadas para se comportar no meio social. As HS educativas seriam um
conjunto específico utilizado na tarefa de educar. Foi feita uma análise de artigos encontrados nas bases
de dados: Lilacs e Scientific Electronic Library Online. A literatura aponta que pais com níveis mais
elevados de HS educativas (HSE) têm filhos socialmente habilidosos e com menos problemas de
comportamento. Além disso, o envolvimento positivo dos pais nas atividades em geral dos filhos faz
com que estes sejam mais competentes socialmente e academicamente. Treinamentos em habilidades
sociais, tanto educativas quanto educativas parentais, mostraram-se eficazes na melhora do repertório
social de pais e filhos, bem como na relação entre eles.

Palavras-chave: Habilidades sociais. Relacionamento pais e filhos. Habilidades sociais educativas.


Treinamento de habilidades sociais.

Abstract

The present article aimed at carrying out a narrative bibliographical review focused on the social skills
(SS) of parents and their influence on the way they raise their children and on the latter’s social
repertoire. SS are a set of capacities used to act in the social environment. Educational SS would be a
specific set employed in the task of education. An analysis of the papers found in the Lilacs and
Scientific Electronic Library Online databases was conducted. The literature points out that parents with
higher levels of Educational SS (ESS) have socially skilled children with less behavior problems.
Moreover, positive parental involvement in children’s activities in general leads them to being more
socially and academically competent. Social skills training, considering both educational and parental
educational skills, were effective in the improvement of parents’ and children’s repertoire, as well as in
their relationship

Keywords: Social skills. Parents and children relationship. Educational social skills. Social skills
training.

1
Universidade Federal de Uberlândia.
2
Professor na Universidade Federal de Uberlândia.

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 2 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

Resumen

El presente artículo tuvo como objetivo efectuar una revisión bibliográfica narrativa enfocada en las
habilidades sociales (HS) de los padres y su influencia en el modo como crean sus hijos y en el repertorio
social de éstos. HS es un conjunto de capacidades utilizadas para comportarse en el medio social. Las
HS educativas serían un conjunto específico utilizado en la tarea de educar. Se realizó un análisis de
artículos encontrados en las bases de datos: Lilacs y Scientific Electronic Library Online. La literatura
apunta que los padres con niveles más altos de HS educativas (HSE) tienen hijos socialmente habilidosos
y con menos problemas de comportamiento. Además, la participación positiva de los padres en las
actividades en general de los hijos hace que éstos sean más competentes social y académicamente. Los
entrenamientos en habilidades sociales, tanto educativas y educativas parentales, se mostraron eficaces
en la mejora del repertorio social de padres e hijos, así como en la relación entre ellos.

Palabras clave: Habilidades sociales. Relaciones padres y hijos. Habilidades sociales educativas.
Entrenamiento de habilidades sociales.

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 3 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

Passamos grande parte de nossas desde a infância por meio do ambiente (Del
vidas investindo em alguma forma de Prette & Del Prette, 2001).
relacionamento interpessoal, seja no Para compreender melhor o
contexto familiar, escolar, seja no trabalho. conceito de HS, primeiramente é preciso
Vemos que no contexto familiar os pais têm saber o que é desempenho social e
grande influência sobre os filhos, e competência social. Segundo Del Prette e
acreditamos que é nesse contexto no qual a Del Prette (2017), desempenho social
aprendizagem das HS começam. Por isso, remete à expressão de comportamentos em
analisar os estudos empíricos publicados até situações sociais, desempenhos estes
o momento sobre o tema se faz favoráveis ou não para o relacionamento. Já
imprescindível para guiar pesquisas futuras, a competência social está relacionada aos
as quais poderão vir a auxiliar na produção efeitos que o desempenho social produz,
de novos métodos clínicos que auxiliem os num sentido avaliativo, o resultado que este
pais na tarefa de educar os filhos. gera, se atende às demandas do contexto.
Este trabalho consiste em uma Assim, habilidades sociais são um conjunto
revisão bibliográfica narrativa e, portanto, de comportamentos sociais aceitos pela
um estudo qualitativo que descreve e respectiva cultura, que proporciona um
discute o desenvolvimento de uma área desempenho social competente e gera
específica (Rother, 2007), com foco nas resultados positivos para o indivíduo em
habilidades sociais (HS) dos pais e como sua relação com o outro, o que pode vir
estas influenciam na criação e nas também a colaborar para a competência
habilidades dos filhos. Diante disso, social (Del Prette & Del Prette, 2018).
primeiramente, será apresentada uma Del Prette e Del Prette (2018)
concepção geral do tema principal e dos listaram classes e subclasses das principais
conceitos relacionados a ele. Por fim, será habilidades sociais: a) de comunicação –
explicitada a análise dos artigos fazer e responder perguntas, dar e pedir
encontrados em duas bases de dados, Lilacs feedback, gratificar, elogiar, iniciar e
e Scientific Eletronic Library Online manter conversações; b) de civilidade –
(SciELO), de modo a avaliar o estado atual falar por favor, cumprimentar, despedir-se;
da arte e as direções de pesquisa na c) assertivas – defender os próprios direitos
literatura acadêmica brasileira sobre o e os dos outros, manejar críticas, discordar,
assunto. aceitar e recusar pedidos, desculpar-se,
admitir falhas e lidar com a raiva do outro;
Habilidades sociais educativas parentais d) empáticas – colocar-se no lugar do outro,
expressar compreensão, escutar, manter o
Cotidianamente, somos expostos a contato visual; e) fazer e manter amizade –
diversos meios sociais que demandam a expressar sentimentos, manter contato e
decodificação de sinais explícitos e responder ao contato, incentivar
implícitos, a capacidade de aperfeiçoá-los e confidências, iniciar conversa, realizar e
a decisão de emitir ou não comportamentos, aceitar convites; f) expressar afeto e
ou seja, aprendemos a decifrar os sinais por intimidade – demonstrar afeto por meio do
meio da percepção, a selecionar as frases e toque, sorriso, demonstrar gentilezas,
a deliberar sobre o contexto social. É nesse prezar pelo bem-estar do outro, alimentar o
cenário que ocorre a aprendizagem de bom humor, lidar com relações íntimas e
desempenhos sociais, os quais dependem de estabelecer limites quando necessário; g)
um repertório de HS que é desenvolvido manejar conflitos e resolver problemas

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 4 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

interpessoais – manter a calma, exercitar o estudos sobre tais relacionamentos para


autocontrole, identificar e definir o compreender a dinâmica e as consequências
problema, reconhecer em você e no outro destes para ambos (Boas & Bolsoni-Silva,
comportamentos que levam a ter 2010).
problemas, procurar possíveis soluções; h)
expressar solidariedade – reconhecer as Conceitos relacionados
necessidades do outro, participar de
campanhas solidárias, oferecer ajuda, Em meio a diversas maneiras que
apoiar, doar alimentos ou objetos, expressar existem para orientar a conduta dos filhos,
compaixão; i) coordenar grupos – organizar encontram-se na literatura fenômenos
e dividir tarefas, dar feedback, parafrasear, comportamentais que alicerçam os
resumir, saber explicar, incentivar a todos, seguintes conceitos: a) práticas parentais, b)
cobrar desempenho; j) falar em público – estilos parentais e c) habilidades sociais
usar um tom de voz audível, distribuir o educativas parentais (HSE-P). As práticas
olhar pelos ouvintes, fazer e responder educativas parentais são padrões e
perguntas, utilizar instrumentos estratégias comportamentais utilizados
audiovisuais adequados. Devido à pelos pais para educar, comunicar-se, impor
variabilidade e complexidade das relações limites, ensinar valores e responsabilidades,
interpessoais, sobreposições dos conjuntos transmitir a cultura e promover as HS dos
são inevitáveis. filhos. Essas práticas podem ser divididas
Os pais são os maiores modelos para em duas categorias: 1. Indutivas – nas quais
os filhos. Os responsáveis devem utilizar os pais estimulam os filhos a automanejar
suas próprias habilidades para ensinar as suas condutas, apontando as consequências
crianças a se expressarem, apontando, destas; 2. Coercitivas – por meio das quais
assertivamente, os comportamentos os pais usam da força, privações e punições
desejáveis e malquistos dos filhos, físicas para educar os filhos, suscitando
elogiando quando necessário e solicitando obediência por medo e sem reflexão sobre a
mudanças, explicando suas motivações e as necessidade de alteração de comportamento
possíveis consequências positivas ou (Cassoni, 2013).
negativas. Dessa forma, os pais evitam O modelo dos estilos parentais,
práticas coercitivas que os afetam proposto originalmente por Baumrind
negativamente e a seus filhos (Bolsoni- (1966) e modificado posteriormente por
Silva, 2003). Pais que não oferecem suporte Maccoby e Martin, mencionado por
social e não demonstram afeto para a Bolsoni-Silva (2003) e Cassoni (2013), é
criança infligem nela sentimentos de classificado em quatro tipos: autoritário,
vulnerabilidade e incapacidade, autoritativo, indulgente e negligente. O
prejudicando seu desenvolvimento e estilo autoritário refere-se a pais muito
deixando-a despreparada para suas rígidos e exigentes, que não valorizam o
interações futuras. Ao contrário destes, os diálogo e utilizam punições severas para a
pais habilidosos têm maior repertório para manutenção da ordem e da disciplina. Os
criar um ambiente acolhedor (Cardoso & indulgentes adotam uma postura “liberal”
Soares, 2011). diante dos filhos; são afetuosos, porém não
Assim, pode-se observar que o meio estabelecem regras ou limites, satisfazem as
onde a criança vive favorece tanto os vontades das crianças, deixando que elas se
comportamentos socialmente habilidosos monitorem. Pais negligentes demonstram
quanto os considerados desadaptados. O pouco afeto e pouca exigência, não
comportamento dos filhos também influi procuram se aproximar ou se envolver com
significativamente na relação com os pais; as atividades dos filhos. No estilo
diante disso, ressalta-se a necessidade de autoritativo, os pais sabem balancear entre

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 5 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

exigência e monitoramento, corrigem e humilham os filhos, por exemplo, mordê-


gratificam quando necessário, mantêm a los e queimá-los (Gomide et al., 2005;
comunicação clara e aberta, são afetivos, Marturano et al., 2010).
responsivos às necessidades de seus filhos e De acordo com Del Prette e Del
propiciam um maior desenvolvimento das Prette (2008), as HSE são definidas como
habilidades e da autonomia das crianças. um conjunto de competências utilizadas
Com o objetivo de classificar os com o objetivo de promover o
estilos parentais, Gomide, Salvo, Pinheiro e desenvolvimento e aprendizado do outro,
Sabbag (2005) elencaram sete práticas em contextos como o formal (instituições
parentais comumente divididas em de ensino) e informal (familiar,
positivas (comportamentos pró-sociais) e comunidade). As HSE podem ser divididas
negativas (comportamento antissocial). As em quatro classes mais gerais e suas
primeiras são subdivididas em monitoria subclasses, as quais podem ser observadas
positiva – diz respeito à atenção dos pais por meio das seguintes categorias: 1.
para com as atividades gerais e gostos dos Estabelecer contextos interativos
filhos, envolvendo expressões de carinho e potencialmente educativos, como saber
afeto; tal acompanhamento é realizado de organizar o material disponível e ser
forma saudável e não exagerada; e mediador das interações; 2. Transmitir ou
comportamento moral – prática na qual os expor conteúdos sobre HS, que seria saber
pais transmitem, por intermédio do ensino parafrasear, apresentar possíveis
ou do exemplo, valores e proporcionam consequências para determinados
condições para que seus filhos desenvolvam comportamentos e saber apresentar
senso de justiça, empatia, responsabilidade, objetivos e informações; 3. Estabelecer
generosidade, discriminar o certo e errado. limites e disciplina, chamar a atenção para
Já as práticas parentais negativas as regras, saber apontar/descrever
indicam o uso de formas agressivas e comportamentos desejáveis e indesejáveis e
passivas de educar, classificadas como solicitar a mudança desejada; 4. Monitorar
negligência, punição inconsistente, positivamente, elogiar, incentivar,
monitoria negativa, disciplina relaxada e demonstrar empatia e interesse pelo outro.
abuso físico. A negligência diz respeito à No cenário informal, em particular o
ausência de demonstração de afeto e de familiar, Boas e Bolsoni-Silva (2010)
interesse e às responsabilidades e ajuda definem as HSE-P como um conjunto de
omitidas pelos pais, o que pode levar a habilidades específicas utilizadas pelos pais
criança a se portar de forma agressiva ou na educação dos filhos. Para os autores, as
indiferente. Punição inconsistente ocorre mais importantes são: estabelecer limites e
quando os pais agem de acordo com seu diálogo; expressar opiniões e sentimentos
estado de humor na hora de educar a positivos/negativos; solicitar mudança
criança, não levando em consideração se o comportamental; cumprir promessas;
comportamento do filho foi ou não harmonia do casal quanto à criação dos
adequado. Na monitoria negativa, os pais filhos; e saber se desculpar.
supervisionam, excessivamente, a vida de A combinação de determinadas
seus filhos, causando um ambiente hostil. práticas educativas resulta no estilo
Disciplina relaxada se manifesta quando as parental. As HSE-P englobam as práticas
regras estabelecidas não são cumpridas, educativas e auxiliam na identificação
havendo confronto entre os filhos e pais, e destas e no reconhecimento dos
os genitores acabam por desobrigar-se ao comportamentos que precisam ser
estabelecimento de limites, escolhendo modificados e daqueles que devem ser
omitir-se. Abuso físico refere-se às incentivados. Outros autores apontam que
punições corporais, que machucam e pais com HS utilizam como estratégia

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 6 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

educativa a monitoria positiva e o ou seja, quando e como os filhos emitem


comportamento moral (Bolsoni-Silva & seus comportamentos e de que modo as
Marturano, 2008; Gomide et al., 2005). mães respondem a isso. As crianças foram
indicadas pelos professores. Constatou-se
Estudos empíricos que crianças sem problemas de
comportamento apresentam, com maior
Realizou-se uma busca nas bases de frequência, HS do que crianças que exibem
dados Lilacs e Scientific Eletronic Library problemas de conduta na hora de expressar
Online (SciELO em janeiro de 2017 sentimentos, enfrentar obstáculos e
utilizando os termos “habilidades sociais interagir socialmente de maneira positiva.
pais e filhos”. Dos artigos encontrados, O grupo com problemas comportamentais
selecionamos 24, os outros foram excluídos também apresentou maior frequência de
por serem revisões bibliográficas, artigo conduta externalizante. Adicionalmente, as
teórico, ou não estarem de acordo com o mães do grupo com problemas relataram
tema. Primeiramente, apresenta-se um que quando os filhos as desobedeciam
relato sobre os estudos empíricos ficavam irritadas e recorriam,
encontrados e suas contribuições, que serão frequentemente, a práticas educativas não
divididos de acordo com o tema e o ano de habilidosas.
publicação: 1. HS e problemas de Leme e Bolsoni-Silva (2010b)
comportamento, 2. HS e práticas parentais, também avaliaram as HS e os problemas de
3. HS e envolvimento entre pais e filhos, e comportamento de crianças pré-escolares
4. Treinamentos em HS com pais e filhos. pela análise das contingências e das
Por último, propõe-se uma breve análise respostas das mães. Comparando o grupo
sobre o que já foi visto e as potenciais clínico com o não clínico, nota-se que os
lacunas nas linhas de pesquisa. escores médios de HSE-P do grupo não
clínico são maiores do que as do grupo
Habilidades sociais e problemas de clínico. Foi visto que as mães do grupo não
comportamento clínico conseguem reforçar mais
positivamente as habilidades dos filhos,
Bolsoni-Silva (2003) realizou um enquanto as do grupo clínico apresentaram
estudo cujo objetivo foi comparar as HSE nas praticas negativas. Assim como os
de pais com filhos com indicativo de estudos anteriores, este corrobora para a
problemas comportamentais e pais com confirmação de que mães com HSE-P
filhos com indicativo de conduta apresentam mais frequência de práticas
socialmente habilidosa, as indicações foram educativas positivas em diversos ambientes,
feitas pelos professores. Os resultados e seus filhos têm menos problemas de
mostraram que as mães emitem, com maior comportamento, já com as mães menos
frequência, ações relacionadas à HSE-P: habilidosas socialmente ocorre o oposto.
expressar sentimentos e manter Em relação ao ambiente familiar,
comunicação. De modo geral, os pais de Boas e Bolsoni-Silva (2010) realizaram um
filhos socialmente habilidosos destacaram- estudo buscando detalhar as HSE de mães
se dos demais por terem níveis maiores de separadas e sua interferência no
HSE-P, cumprindo promessas, comportamento habilidoso ou inadequado
demonstrando carinho e comunicando-se do filho. Observou-se uma correlação entre
mais frequentemente. problemas de comportamento das crianças
Leme e Bolsoni-Silva (2010a) e práticas negativas, em que mães com
expandiram a análise das HSE-P e sua menor índice de estabelecimento de limites
influência nos problemas comportamentais tinham filhos com maiores problemas de
avaliando as contingências dessas condutas, comportamento, já mães com habilidades

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 7 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

de comunicação têm filhos com bom professoras, o tipo de família não


repertório social. Como em outros estudos, diferenciou nem nas HS nem na
o grupo sem problemas de comportamento, competência acadêmica das crianças. Isso
não clínico, apresentou maiores escores em mostra que no ambiente familiar houve
HSE e menos práticas negativas. Não foi mais impacto do recasamento nas HS e
encontrada relação entre HS e estado civil. problemas de comportamentos hiperativos
Considerando as variáveis dos e externalizante, o que não ocorre no
problemas conjugais como influenciadora ambiente escolar, sugerindo que o
de problemas de comportamento das comportamento da criança está suscetível a
crianças, Bolsoni-Silva e Marturano (2010) efeitos negativos do ambiente familiar.
compararam a relação conjugal de pais de
filhos com indicativo de problemas de Habilidades socais e práticas parentais
comportamento e com indicativo de
conduta socialmente habilidosa. Em relação Alguns autores vêm
à qualidade de comunicação e à frequência correlacionando as práticas educativas com
de características positivas relatadas, as habilidades sociais educativas, outros
verificou-se que pais de filhos com operacionalizaram as práticas educativas
indicativo de conduta socialmente positivas em habilidades sociais educativas
habilidosa obtiveram maiores escores. parentais. Utilizando o modelo de estilo
Porém, os autores chegaram à conclusão parental constituído por práticas parentais
que apesar do relacionamento conjugal positivas e negativas, Gomide, Salvo,
influenciar no comportamento dos filhos, Pinheiro e Sabbag (2005) correlacionaram
ele é só uma das variáveis envolvidas. essas práticas com habilidades sociais,
Ademais, admitiram que a falta de depressão e estresse. Os resultados
associação entre satisfação conjugal e indicaram correlação positiva entre estilos
problemas de comportamento pode ter sido parentais e HS, principalmente em relação à
devida ao instrumento utilizado. habilidade de expressar afeto positivo:
Leme, Marturano e Fontaine (2014) estilos positivos associaram-se a maiores
fizeram um estudo com o intuito de avaliar níveis de habilidade social; e correlação
semelhanças e diferenças entre famílias negativa entre estilos parentais positivos,
nucleares e recasadas em relação às estresse e depressão.
habilidades sociais, problemas de Marturano et al. (2010) realizaram
comportamento, indicadores de adaptação e uma pesquisa com o intuito de descrever as
competência acadêmica. Em relação às HS condutas dos filhos, as práticas parentais e
e problemas de comportamento, os HS de pais que procuram atendimento
resultados mostraram que, de acordo com a psicológico, comparando grupo de pessoas
descrição das mães de famílias nucleares, que abandonam e aquelas que continuam
seus filhos têm mais habilidades sociais de participando, bem como a diferença de
amabilidade e de autocontrole/civilidade se escores entre meninos e meninas. A
comparadas às de famílias recasadas. Em frequência de HSE-P foi correlacionada
relação aos filhos de famílias recasadas negativamente com práticas negativas, e
estáveis, os filhos de famílias nucleares positivamente com as HS das crianças e
apresentaram maior frequência de HS de práticas positivas dos pais. Também foi
cooperação e de autocontrole/passivo. observado que cuidadores que têm HSE-P
Além disso, as mães de famílias recasadas baixas têm maior probabilidade de
estáveis e recentes relatam que seus filhos abandonar o tratamento que os com melhor
têm mais problemas de comportamento (em repertório.
particular externalizante), se comparada aos Analisando relações entre práticas
filhos de famílias nucleares. Segundo as parentais aplicáveis às HSE e a variável

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 8 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

deficiência, Bolsoni-Silva et al. (2010) Habilidades sociais e envolvimento entre


compararam práticas negativas e positivas pais e filhos
de mães de crianças com deficiência de
linguagem (DL) e auditiva (DA), e crianças Levando em consideração a
sem deficiência (grupo não clínico). As importância da competência social na vida
crianças do grupo DL não apresentaram das crianças e como um ambiente acolhedor
diferenças significativas em relação às HS é favorável para um padrão de comunicação
com o grupo não clínico. No grupo DA, saudável entre pais e filhos, Cia, Pamplin e
tanto as mães quanto as crianças Del Prette (2006) compararam indicadores
apresentaram menores níveis de HS que as de envolvimento dos pais com os filhos e
do grupo não clínico. Foram verificadas esse envolvimento com o repertório de
correlações positivas entre qualidade da habilidades sociais, e também com
interação dos pais-filhos e HS das crianças, problemas de comportamento
e associações entre práticas educativas internalizantes e externalizantes. O estudo
negativas e problemas de comportamento, destaca-se por avaliar o envolvimento por
fornecendo mais evidências de que a meio do relato dos filhos. Medidas de
relação das crianças com as mães é comunicação e participação dos pais na vida
essencial para a aquisição e preservação das dos filhos correlacionaram-se ao repertório
HS. de HS em relação à frequência e adequação
Bolsoni-Silva e Loureiro (2011) às reações habilidosas.
compararam as práticas educativas das No mesmo ano, Cia, Pereira, Del
mães com comportamentos de crianças com Prette e Del Prette (2006) também
indicativo de problemas de comportamento realizaram um estudo sobre o envolvimento
e sem indicativo. As mães do grupo não pais-filhos e indicadores de HS, sendo que
clínico tiveram resultados mais positivos neste o envolvimento foi avaliado pela
que as do grupo clínico na expressão de visão dos pais. O estudo indica que quanto
sentimentos negativos, concordância com maior for o repertório de HS dos pais
cônjuge, habilidades sociais educativas e melhor será a comunicação entre eles e seus
infantis e estabelecimento de limites. Em filhos, e maior será também a participação
contraste, o grupo clínico teve médias deles na vida do filho.
maiores ao conversar sobre certo e errado e Cia e Barham (2009) compararam
problemas de comportamento indicadores de envolvimento paterno com
internalizantes ou externalizantes. habilidades sociais e problemas de
Para caracterizar a multiplicidade da comportamento, em que não só os pais
relação entre afeto parental, habilidades avaliaram os filhos, mas também os
socais, controle comportamental, controle professores. Constatou-se, novamente, que
psicológico, competência acadêmica e o bom relacionamento entre pais-filhos e o
variáveis demográficas, Martins et al. envolvimento destes nos cuidados, nas
(2014) realizaram uma pesquisa de acordo atividades escolares, de lazer e na
com o relato de cuidadores. Os autores comunicação entre eles pode proporcionar
concluíram que pais mais afetivos, um repertorio de HS adequado e também
responsivos e que exercem controle diminuir os índices de problemas de
positivo têm maior probabilidade de que os comportamento externalizantes e
filhos tenham um bom desempenho internalizantes.
acadêmico. Pais que não fazem uso de Semelhante aos estudos anteriores,
controle psicológico tem filhos mais Cardozo e Soares (2010) correlacionaram
sociáveis. indicadores de habilidades sociais de pais
com envolvimento destes na educação dos
filhos, mas a diferença é que dessa vez a

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 9 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

amostra foi composta por pais de filhos com também para não clínicos, Salvo,
deficiência, em particular diagnóstico de Mazzarotto e Löhr (2005) realizaram
retardo mental. Os autores observaram que programas de intervenção para o
os pais são mais assertivos que as mães, e desenvolvimento de habilidades sociais
estas têm mais desenvoltura social e com crianças. Os programas tiveram caráter
habilidades de conversação que os pais. preventivo, e enquanto essas crianças
Elas também são mais envolvidas nas recebiam o treinamento de HS, os pais
atividades dos filhos com retardo mental estavam em outra sala recebendo sessões de
que os pais. Constatou-se também que orientações em grupo. Suas descobertas
casais que expressam com mais facilidade foram que a intervenção combinada com
sentimentos positivos tendem a demonstrar pais e filhos tem efeitos positivos nas
mais cuidados com os filhos, já os que atividades, socialização e na diminuição
participam dos cuidados pessoais do filho dos problemas de comportamento
tendem a apresentar mais dificuldades de internalizante e externalizante dos filhos.
serem assertivos. Defendendo a ideia de que o estilo
Custodio e Cruz (2008) realizaram parental e as habilidades sociais educativas
um estudo com o objetivo de verificar as influenciam no desenvolvimento e na
relações das representações mentais que as relação entre pais e filhos, Pinheiro, Haase,
crianças têm em relação aos pais como Del Prette, Amarante e Del Prette (2006)
figuras de afeto (prazer, bem-estar do filho) realizaram um programa de treinamento em
e de disciplina (modo como age quando habilidades sociais educativas que teve
considera o comportamento da criança como objetivo a capacitação dos pais, os
inadequado), e sua relação com a quais escolhiam qual filho achavam que
competência social. Os filhos de pais com tinham mais problemas de comportamentos
baixa escolaridade percebiam seus pais para ser o foco de sua atenção no programa.
como mais rejeitadores e punitivos. A avaliação do programa mostrou que este
Relacionando as representações e a teve efeitos de intensidade moderada. Na
competência social, observou-se que as análise qualitativa, feita por meio das
crianças que percebiam seus pais como entrevistas, observou-se que os pais
mais rejeitadores foram avaliadas pelos continuaram as atividades ensinadas no
professores como tendo menos programa, e muitos chegaram a dizer que
comportamentos de autocontrole, de conseguiram conversar melhor com os
asserção e mais problemas internalizados e filhos depois disso e seus comportamentos
pouca competência acadêmica. As crianças inadequados diminuíram. A melhora das
que associavam seus pais à representação de HS dos pais repercutiu no relacionamento
punição física foram avaliadas como menos deles com os filhos e na diminuição de
competentes e com mais problemas problemas de comportamentos dos últimos,
internalizados. apesar de estes não terem participado.
Coelho e Murta (2007) executaram
Treinamentos em habilidades sociais um programa de treinamento em grupo para
com pais e filhos pais com o intuito não só de promover
habilidades sociais, mas também de práticas
Muitos estudos na literatura parentais positivas e estratégias para
estrangeira vêm mostrando a eficácia de enfrentamento de problemas. Buscaram
trabalhos preventivos com pais, filhos e desenvolver, também, um trabalho para os
professores na área de treinamento de filhos paralelamente ao grupo dos pais, no
habilidades sociais. Tendo em vista que o qual estes passavam por um treinamento em
treinamento de habilidades sociais é eficaz HS. Analisando as entrevistas feitas, os
não só para problemas clínicos, mas autores consideraram a intervenção eficaz,

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 10 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

pois os pais diminuíram suas práticas com os anteriores é que não só os pais
educativas negativas, melhoraram as participaram, mas cuidadores de crianças
positivas, ampliaram suas habilidades em com transtorno psiquiátrico, e também
enfrentar eventos estressores e também foram feitas sessões para follow-up 30 dias
avaliaram as mudanças dos filhos de forma após o fim do grupo e outro 60 dias depois.
positiva, tanto no que diz respeito às Não houve melhora significativa no
atividades acadêmicas como de cuidados desempenho escolar, o que era esperado
consigo mesmo. devido o diagnóstico de TDAH. Porém,
Bolsoni-Silva, Salina-Brandão, houve melhora significativa nos problemas
Versuti-Stoque e Rosin-Pinola (2008), de comportamento, e pôde-se perceber que
efetuaram um programa de intervenção em com o treinamento dos pais os filhos com
grupo para pais que procurou promover transtorno psiquiátrico diminuíram a
HSE. Os resultados de pré e pós-teste incidência de comportamentos
demonstraram, assim como nos outros inadequados.
estudos, que houve aprendizagem de Considerando a variável de tempo
algumas HSE, tais como, expressar para a eficácia dos programas de
sentimentos positivos, agradecer, fazer intervenção, Bolsoni-Silva e Borelli (2012)
pedidos e estabelecer limites. Porém, descreveram a avaliação de 2 programas de
diferentemente dos outros, para outras intervenções realizados com
habilidades alguns participantes pais/cuidadores, os quais se diferiram
demonstraram redução dos escores, que foi apenas em relação ao tempo de ministração,
explicada como sendo devido à capacidade em que o Grupo 1 teve sessões uma vez por
crítica adquirida pelos participantes ao semana durante um ano letivo, e o Grupo 2
aprenderem sobre as HSE. tinha duas vezes por semana durante um
Considerando a importância de se semestre letivo. Analisando os resultados,
intervir nos problemas de comportamento foi observada uma melhora no Grupo 1, em
por meio de alterações estratégicas no modo particular nas HSE-P e nas habilidades
como os pais lida com os filhos, Bolsoni- sociais infantis. Já no Grupo 2 observou-se
Silva, Silveira e Marturano (2008) uma melhora nas práticas educativas, sendo
descreveram uma intervenção feita com um que as negativas diminuíram e os problemas
grupo de pais que teve como objetivo de comportamento dos filhos também.
desenvolver a competência social e Apesar de os dois grupos apresentarem
melhorar o relacionamento destes com os resultados positivos, acredita-se que para
filhos. Houve melhora nas HSE-P, em aprender melhor sobre HS e consolidar o
particular nas categorias “comunicação”, repertório é preciso mais tempo, o que foi
“expressividade” e “consistência”, os filhos demonstrado pelos resultados do Grupo 1.
também apresentaram melhora nos Utilizando um delineamento
problemas de comportamento. Na avaliação experimental com grupo controle, Rocha,
feita seis meses após a intervenção, na Del Prette e Del Prette (2013) avaliaram os
categoria “consistência” ,os escores não se efeitos de um programa de treinamento de
mantiveram. Apesar dos ganhos em habilidades sociais educativas com pais de
consistência não terem sido mantidos, os crianças com diagnóstico de Transtorno do
resultados sugerem que o programa ajudou Deficit de Atenção e Hiperatividade
os participantes em comunicação e (TDAH) em relação às habilidades sociais,
expressividade. problemas de comportamento e
De modo similar, Fernandes, Luiz, competência acadêmica dos filhos.
Miyazaki e Marques Filho (2009) Observou-se que a intervenção gerou
efetuaram um programa com o intuito de mudanças positivas significativas nas HS
ensinar e melhorar as HSE. Sua diferença das mães e dos filhos, assim como na

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 11 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

competência acadêmica dos filhos. Isso socialmente habilidosos e que emitem com
leva a crer que programas de intervenção mais frequência (em diversas situações)
para mães de crianças com TDAH são HSE-P, tais como cumprir promessas,
eficazes na promoção de práticas educativas concordar com o cônjuge, estabelecer
positivas, de um desenvolvimento de limites, expressar sentimentos e discriminar
qualidade para as crianças e uma melhor comportamentos adequados. Já pais de
interação entre mãe-filho. Diferente do crianças com indicação de problemas de
estudo de Fernandes, Luiz, Miyazaki e comportamento internalizantes e
Marques Filho (2009), este observou uma externalizantes emitem com menos
melhora na competência acadêmica. frequência HSE-P e usam de práticas
educativas negativas e coercitivas,
Reflexões críticas e síntese principalmente diante de comportamentos
inadequados dos filhos. Apesar de pais de
Em geral, podemos constatar em crianças socialmente habilidosas e crianças
publicações que pais que participam com com problemas de comportamento usarem
mais frequência das atividades diárias dos praticas negativas em algumas situações do
filhos e que têm uma comunicação de cotidiano (por exemplo, quando a criança
qualidade com eles apresentam níveis mais faz birra), o que diferencia ambos é a
elevados de habilidades sociais. Até mesmo frequência com que o fazem, e também o
pais de filhos com deficiência e, em fato de os pais de crianças com problemas
consequência, seus filhos também são mais de comportamento não reforçarem condutas
socialmente habilidosos e emitem com adequadas dos filhos. Uma das questões
menos frequência condutas inadequadas. levantadas pelos próprios autores foi a
Crianças com deficiência de linguagem que relação de causa e efeito entre o
apresentam um bom repertório de HS têm comportamento inadequado do filho e as
uma interação de mais qualidade com os práticas educativas negativas dos pais,
pais. Apesar de ambos os pais participarem levando a indagar se seria por conta do
da vida dos filhos, as mães se destacam, em comportamento inadequado do filho que o
particular na comunicação com os filhos, pai utilizaria de práticas coercitivas ou as
participação nas atividades escolares e práticas dos pais que levam à conduta
tarefas diárias, culturais e de lazer (Cia et inadequada (Bolsoni-Silva, 2003; Leme &
al., 2006; Cia, Pereira, Del Prette & Del Bolsoni-Silva 2010a; Leme & Bolsoni-
Prette 2006; Cia & Barham 2009; Cardozo Silva, 2010b). Apesar de alguns autores
& Soares, 2010; Bolsoni-Silva et al., 2010). procurarem analisar a influência do
Elas também se mostraram mais comportamento do filho sobre o pai, seria
socialmente habilidosas que os pais em preciso uma análise mais detalhada das
diversas categorias, tais como habilidades contingências para se saber o efeito que a
de comunicação (fazer perguntas, ouvir conduta dos pais provoca nas HS dos filhos.
perguntas sobre sexo) e expressividade Isso ajudaria na formulação de treinamentos
(expressar sentimentos positivos e mais eficazes para os filhos. Vimos também
opiniões), o que pode estar relacionado com que grande parte das avaliações de
essa maior participação delas na vida dos comportamento e HS dos filhos foram
filhos, algo que poderia ser investigado realizadas por pais, professores ou ambos,
mais a fundo (Bolsoni-Silva, 2003; Leme & as quais poderiam ser expandidas para
Bolsoni-Silva, 2010a; Leme & Bolsoni- colegas com quem o sujeito convive
Silva, 2010b). diariamente e até mesmo outros familiares.
Crianças consideradas socialmente Na maior parte dos estudos, os próprios pais
habilidosas ou sem indicativo de problemas se avaliavam, não havendo oportunidade
de comportamento têm pais mais para que os filhos também o fizessem.

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 12 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

No que diz respeito ao âmbito filhos (Gomide, Salvo, Pinheiro & Sabbag,
familiar, alguns estudos (Boas & Bolsoni- 2005).
Silva, 2010; Bolsoni-Silva & Marturano, Constata-se também que pais vistos
2010) não identificaram relação entre a como mais rejeitadores têm filhos com
separação dos pais e as HS dos filhos. menos autocontrole, mais problemas de
Observou-se também que casais com filhos comportamento internalizantes e baixa
mais socialmente habilidosos avaliaram os competência acadêmica e social, e que
cônjuges com características mais positivas aqueles que não fazem uso de controle
quanto à comunicação, e comparando tipos psicológico nas práticas educativas têm
de famílias, observaram diferença nas HS filhos mais sociáveis (Custodio & Cruz,
entre filhos de familiar nuclear e recasada, 2008; Martins et al., 2014). Isso aponta o
em que as crianças da família nuclear quão importante é ouvir os filhos e saber a
apresentaram maiores níveis de HS de percepção que eles têm dos pais e seu
amabilidade e autocontrole/civilidade. relacionamento.
Porém, isso foi verificado apenas no âmbito Os treinamentos feitos com os pais,
familiar e não no escolar, em que as com o objetivo de influenciar os filhos com
professoras avaliaram as crianças como ou sem transtorno psiquiátrico (Pinheiro et
socialmente habilidosas e academicamente al., 2006; Bolsoni-Silva et al., 2008;
competentes (Leme, Marturano & Fontaine, Bolsoni-Silva, Silveira & Marturano, 2008;
2014; Bolsoni-Silva & Marturano, 2010). Fernandes et al., 2009; Bolsoni-Silva &
Dentre os relatos de pesquisa considerados, Borelli, 2012; Rocha, Del Prette & Del
não foram observadas comparações das HS Prette, 2013), obtiveram melhoras nas HSE-
do sujeito em diferentes ambientes (escola, P em geral e também em particular nas de
trabalho, família), e fica evidente, após comunicação (manter dialogo, dizer não),
análise dos resultados encontrados, que há expressividade (agradecer, elogiar,
diferença entre eles: na escola as crianças expressar sentimentos) e consistência,
são avaliadas de uma forma e em casa de habilidades que vimos anteriormente como
outra. Isso indica a pertinência de estudos importantes para a qualidade da relação
posteriores sobre o impacto que o ambiente entre eles. Já as crianças, com as mudanças
exerce sobre as HS do sujeito e sua dos pais, melhoraram os problemas de
manifestação comportamento e competência social.
As práticas educativas negativas Treinamentos em conjunto para pais e
foram correlacionadas com problemas de filhos (Salvo, Mazzarotto & Löhr, 2005;
comportamento dos filhos, em que pais com Coelho & Murta, 2007) também foram
HS utilizam práticas parentais positivas eficazes na melhora das HS de ambos, nos
com mais frequência e seus filhos têm problemas de comportamento e no
menores índices de problemas desempenho acadêmico dos filhos e
comportamental (Marturano et al., 2010; diminuição das práticas negativas dos pais,
Bolsoni-Silva & Loureiro, 2011). em que muitas estavam com classificação
Observou-se também que famílias com clínica no início e passaram para não clínico
estilo parental positivo são mais habilidosas no fim, demonstrando que ambos os
socialmente e expressam mais sentimentos métodos foram efetivos para as HS.
positivos que famílias com estilo parental Avaliações feitas certo tempo
negativo. Isso nos mostra que as HS de depois dos treinamentos mostraram que,
comunicação, expressão de afeto, apesar dos ganhos obtidos nas HSE, houve
concordância com o cônjuge e habilidades também redução nos escores (Bolsoni-Silva
relacionadas à consistência são importantes et al., 2008; Bolsoni-Silva, Silveira &
no âmbito familiar e para a educação dos Marturano, 2008, Fernandes et al., 2009;
Rocha, Del Prette & Del Prette, 2013), o

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 13 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

que gera a questão do que aconteceu para tanto das pesquisas feitas quanto dos
isso ocorrer: se foi apenas por conta do treinamentos, o que nos leva a questionar
aprendizado sobre HS e consequente qual o impacto que isso gera nos resultados.
aumento da autocrítica, ou se foram Um artigo em particular (Bolsoni-Silva &
características da intervenção que levaram a Marturano, 2010) citou esse problema
isso, tais como tempo da intervenção e como a possível causa de os resultados
conteúdo proposto. Antes de começar uma encontrados não serem estatisticamente
intervenção, é importante avaliar a significativos.
necessidade dos participantes para realizar Em síntese, a literatura brasileira na
um plano que possa ser eficaz; nenhum dos área tem evidências sólidas de que
treinamentos fez uma pesquisa inicial sobre intervenções em grupo para habilidades
quais HS mais precisavam ser aprendidas; sociais são eficazes e que o treinamento
alguns realizaram adaptações durante ou ajuda a melhorar o repertório social de pais
antes das sessões para se adequarem à e filhos, além de diminuir os problemas de
população, mas não um levantamento comportamento destes. Pode-se concluir
inicial. As intervenções realizadas com os que pais com habilidades sociais
pais e seus filhos eram feitas influenciam na competência social e
separadamente. Seria interessante que pais acadêmica dos filhos, no comportamento
e filhos pudessem trabalhar em conjunto adequado deles e também que eles
para melhorar suas HS e também seu participam mais das atividades diárias dos
relacionamento. Afinal, como visto, os pais filhos, o que favorece o envolvimento entre
são grandes exemplos para os filhos e eles. Em termos de lacunas e caminhos
ambas as partes seriam beneficiadas se abertos para desenvolvimentos futuros,
houvesse ocasiões para trabalharem em apontamos a necessidade de estudos para
conjunto. verificar a influência dos pais sobre as HS
Alguns estudos detectaram dos filhos em outros contextos além do
correlação entre competência acadêmica e familiar, e também avaliar como outros
HS (Coelho & Murta, 2007; Rocha, Del cuidadores interferem nas HS dos filhos.
Prette & Del Prette, 2013), outro não
(Fernandes et al., 2009), o que torna a Referências
situação inconclusiva, e nos leva a pensar se
o tipo de escola frequentada pela criança foi Boas, A. C. V. B. V., & Bolsoni-Silva, A.
levado em conta na hora da coleta dos T. (2010). Habilidades sociais
dados, se algumas delas têm tutoria, ou educativas de mães separadas e sua
então, que para algumas pessoas é relação com o comportamento de pré-
necessária mais do que intervenção de HS escolares. Psico-USF, 15(3), 301-
para a melhora no desempenho acadêmico. 310.
Observou-se que é preciso mais Bolsoni-Silva, A. T. (2003). Habilidades
tempo de intervenção para consolidar as sociais educativas, variáveis
HS. Porém, a grande dificuldade que os contextuais e problemas de
pesquisadores vêm enfrentando é o comportamento: comparando pais e
frequente abandono dos treinamentos, o que mães de pré-escolares. Tese de
dificulta a análise de sua eficácia (Bolsoni- doutorado, Universidade de São
Silva & Borelli, 2012). Paulo, São Paulo.
Devido à escassez de medidas na Bolsoni-Silva, A. T., & Borelli, L. M.
área, nem todos os instrumentos utilizados (2012). Treinamento de habilidades
nas pesquisas foram validados, o que sociais educativas parentais:
frequentemente levou à construção de comparação de procedimentos a partir
instrumentos próprios para as avaliações, do tempo de intervenção. Estudos e

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 14 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

Pesquisas em Psicologia, 12(1), 36- Cardozo, A., & Soares, A. B. (2011).


58. Habilidades sociais e o envolvimento
Bolsoni-Silva, A. T., & Loureiro, S. R. entre pais e filhos com deficiência
(2011). Práticas educativas parentais intelectual. Psicologia: Ciência e
e repertório comportamental infantil: Profissão, 31(1), 110-119.
comparando crianças diferenciadas Cassoni, C. (2013). Estilos parentais e
pelo comportamento. Paidéia, práticas educativas parentais:
21(48), 61-71. revisão sistemática e crítica da
Bolsoni-Silva, A. T., & Marturano, E. M. literatura. Tese de doutorado,
(2008). Habilidades sociais Universidade de São Paulo, São
educativas parentais e problemas de Paulo.
comportamento: comparando pais e Cia, F., & Barham, E. J. (2009). O
mães de pré-escolares. Aletheia, 27, envolvimento paterno e o
126-138. desenvolvimento social de crianças
Bolsoni-Silva, A. T., & Marturano, E. M. iniciando as atividades escolares.
(2010). Relacionamento conjugal, Psicologia em Estudo, 14(1), 67-74.
problemas de comportamento e Cia, F., Pamplin, R. D. O., & Del Prette, Z.
habilidades sociais de pré-escolares. A. P. (2006). Comunicação e
Psicologia: Teoria e Pesquisa, 26(1), participação pais-filhos: Correlação
67-75. com habilidades sociais e problemas
Bolsoni-Silva, A. T., Rodrigues, O. M. P. de comportamento dos filhos.
R., Abramides, D. V. M., Souza, L. S. Paidéia, 16(35), 395-406.
D., & Loureiro, S. R. (2010). Práticas Cia, F., Pereira, C. D. S., Del Prette, Z. A.
educativas parentais de crianças com P., & Del Prette, A. (2006).
deficiência auditiva e de linguagem. Habilidades sociais parentais e o
Revista Brasileira de Educação relacionamento entre pais e filho.
Especial, 16(2), 265-282. Psicologia em Estudo, 11(1), 73-81.
Bolsoni-Silva, A. T., Salina-Brandão, A., Coelho, M. V., & Murta, S. G. (2007).
Versuti-Stoque, F. M., & Rosin- Treinamento de pais em grupo: um
Pinola, A. R. (2008). Avaliação de um relato de experiência. Estudos de
programa de intervenção de Psicologia (Campinas), 24(3), 333-
habilidades sociais educativas 341.
parentais: um estudo-piloto. Custódio, S., & Cruz, O. (2008). As
Psicologia: ciência e profissão, representações mentais das crianças
28(1), 18-33. acerca das figuras parentais.
Bolsoni-Silva, A. T., Silveira, F. F., & Psicologia: Teoria e Pesquisa, 24(4),
Marturano, E. M. (2008). 393-405.
Promovendo habilidades sociais Del Prette, A., & Del Prette, Z. A. (2017).
educativas parentais na prevenção de Psicologia das habilidades sociais na
problemas de comportamento. infância: teoria e prática. Petrópolis:
Revista Brasileira de Terapia Vozes.
Comportamental e Cognitiva, 10(2), Del Prette, A., & Del Prette, Z. A. P. (2001).
125-142. Psicologia das relações
Cardozo, A., & Soares, A. B. (2010). A interpessoais: vivências para o
influência das habilidades sociais no trabalho em grupo. Petrópolis:
envolvimento de mães e pais com Vozes.
filhos com retardo mental. Aletheia, Del Prette, Z. A., & Del Prette, A. (2018).
31, 39-53. Competência social e habilidades

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964
Página 15 de 15

Santos, E. B. & Wachelke, J. Relações entre habilidades sociais de pais e comportamento dos filhos:
uma revisão da literatura

sociais: manual teórico-prático. parentais e repertório infantil:


Petrópolis: Vozes. caracterização da demanda por
Del Prette, Z. A. P., & Del Prette, A. atendimento e predição de abandono.
(2008). Um sistema de categorias de Aletheia, 32, 121-133.
habilidades sociais educativas. Pinheiro, M. I. S., Haase, V. G., Del Prette,
Paidéia, 18(41), 517-530. A., Amarante, C. L. D., & Del Prette,
Fernandes, L. F. B., Luiz, A. M. A. G., Z. A. P. (2006). Treinamento de
Miyazaki, M. C. D. O. S., & Marques habilidades sociais educativas para
Filho, A. B. (2009). Efeitos de um pais de crianças com problemas de
programa de orientação em grupo comportamento. Psicologia: Reflexão
para cuidadores de crianças com e Crítica, 19(3), 407-414.
transtornos psiquiátricos. Estudos de Rocha, M. M., Prette, Z. A. P. D., & Prette,
Psicologia (Campinas), 26(2), 147- A. D. (2013). Avaliação de um
158. Programa de Habilidades Sociais
Gomide, P. I. C., Salvo, C. G. D., Pinheiro, Educativas para mães de crianças
D. P. N., & Sabbag, G. M. (2005). com TDAH. Acta Comportamentalia,
Correlação entre práticas educativas, 21(3), 273-283.
depressão, estresse e habilidades Rother, E. T. (2007). Revisão sistemática ×
sociais. Psico USF, 10(2), 169-178. revisão narrativa. Acta Paulista de
Leme, V. B. R., & Bolsoni-Silva, A. T. Enfermagem, 20(2), v-vi.
(2010a). Habilidades Sociais Salvo, C. G. D., Mazzarotto, I. H., & Löhr,
Educativas Parentais e S. S. (2005). Promoção de habilidades
comportamentos de pré-escolares. sociais em pré-escolares. Journal of
Estudos de Psicologia (Natal), 15(2), Human Growth and Development,
161-173. 15(1), 46-55.
Leme, V. B. R., & Bolsoni-Silva, A. T.
(2010b). Habilidades sociais e Recebido em: 13/6/2018
problemas de comportamento: um Aprovado em: 27/2/2019
estudo exploratório baseado no
modelo construcional. Aletheia, 31,
149-167.
Leme, V. B. R., Marturano, E. M., &
Fontaine, A. M. G. V. (2014).
Habilidades sociais, problemas de
comportamento e competência
acadêmica de crianças de famílias
nucleares e recasadas. Estudos e
Pesquisas em Psicologia, 14(3), 854-
876.
Martins, R. P., Nunes, S. A. N., Faraco, A.
M. X., Manfroi, E. C., Vieira, M. L.,
& Rubin, K. H. (2014). Práticas
parentais: associações com
desempenho escolar e habilidades
sociais. Psicologia Argumento,
32(78), 89-100.
Marturano, E. M., Barbosa, C. G., Paiva, M.
M. D., Costa, N. L., Santos, L. C., &
Bolsoni-Silva, A. T. (2010). Práticas

Pesquisas e Práticas Psicossociais 14(1), São João del-Rei, janeiro-março de 2019. e2964

Você também pode gostar