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ATENDIMENTO PRÉ-HOSPITALAR AO

TRAUMA
CLÍNICA CIRÚRGICA: PHTALS

INTRODUÇÃO

Considera-se atendimento pré-hospitalar toda e qualquer assistência realizada, direta ou indiretamente,


fora do âmbito hospitalar, através dos diversos meios e métodos disponíveis, com uma resposta
adequada à solicitação. Os serviços de Atendimento Pré-Hospitalar (APH) são importantes dispositivos
de assistência em saúde por proporcionarem, ainda fora do contexto hospitalar, o atendimento à vítima
e o transporte especializado. O APH consiste em um atendimento inicial ao acidentado, bem como sua
avaliação primária, seguido pela estabilização e transporte para centros de referências adequados,
dando seguimento ao processo de recuperação da vítima de acidente.

O Atendimento Pré-hospitalar ao Traumatizado PHTLS (Pre-hospital Trauma Life Support) é reconhecido


em todo o mundo como o principal programa de educação continuada para o atendimento pré-
hospitalar de trauma. Nesse protocolo os socorristas devem reconhecer e estabelecer as prioridades dos
doentes com lesões múltiplas, seguindo os “Princípios de Ouro” do atendimento pré-hospitalar ao
traumatizado. Esses são:

 Garantir a segurança dos socorristas e do doente;


 Avaliar a situação para determinar a necessidade de recursos adicionais;
 Controlar toda hemorragia externa significativa;
 Usar a avaliação primária para identificar condições de risco a vida;
 Reconhecer a cinemática de produziu as lesões;
 Cuidas adequadamente da via aérea enquanto a coluna vertebral permanece estabilizada
conforme indicado;
 Providenciar ventilação e oferecer oxigênio para manter o nível de SpO2 superior a 95%;
 Realizar terapia básica de choque, incluindo a imobilização adequada das lesões
musculoesqueléticas e o restabelecimento e manutenção da temperatura corpórea normal;
 Aplicar restrição ao movimento da coluna correta baseada nos princípios das necessidades do
paciente e do estado mental, considerando o mecanismo da lesão;
 Quando se trata de doentes traumatizados graves, iniciar o transporte à unidade adequada o
quanto antes, após a chegada do AME no local;
 Iniciar reposição de volume com fluídos intravenosos aquecidos a caminho do local de
atendimento;
  Obter histórico clínico do doente e realizar uma avaliação secundária quando os problemas de
risco à vida tiverem sido tratados de forma satisfatória ou tiverem sido descartados;
 Proporcionar alívio adequado da dor;
 Comunicar de forma minuciosa e precisa as informações sobre o doente e as circunstâncias do
trauma ao serviço médico de destino;
 Acima de tudo, não causar mais dano.

1. Garantir a segurança dos socorristas e do doente


A segurança do local do trauma deve ter a prioridade máxima na chegada em todos as ocorrências da
equipe de atendimento. Com base nas informações dadas pelos socorristas, os riscos em potencial
podem ser antecipados antes da chegada no local. O socorrista que se expõe a riscos desnecessários
pode tornar-se uma vítima também, contribuindo, assim, com as dificuldades de atendimento no local. O
equipamento de proteção deve ser sempre utilizado, especialmente no atendimento de doentes
traumatizados com a presença de sangue ou fluidos corporais

2. Avaliar a situação da cena para determinar a necessidade de recursos adicionais

Exemplos incluem unidades adicionais de SE para acomodar o número de pacientes, equipamento de


supressão de incêndios, equipes de resgates especiais, helicópteros médicos, além da quantidade de
profissionais da saúde.

3. Controlar Hemorragia Externa Significativa

Se a hemorragia externa exsanguinante estiver presente, deve ser controlada antes mesmo da
avaliação da via aérea (ou simultaneamente, se a assistência adequada estiver presente na cena) ou
realização de outras intervenções, como a imobilização da coluna cervical. Este tipo de sangramento
envolve tipicamente o sangramento arterial de uma extremidade, mas também pode ocorrer no couro
cabeludo ou na junção de uma extremidade com o tronco (sangramento juncional) e outros locais.

Os três tipos de hemorragias externas são descritos da seguinte forma: o sangramento capilar é causado
por escoriações que raspam os minúsculos capilares logo abaixo da superfície da pele; não é ameaça a
vida; o sangramento venoso é causado por laceração ou outra lesão de uma veia, o que leva a um fluxo
constante de sangue sendo controlado com pressão direta, geralmente não é uma ameaça à vida a
menos que seja prolongado ou uma grande veia esteja envolvida; por fim o sangramento arterial é
causado por uma lesão que lacera uma artéria geralmente caracterizado por jorrar sangue de cor
vermelho vivo, o controle rápido do sangramento arterial é um dos mais importantes objetivos nos
cuidados de um paciente traumatizado.

Isso se justifica porque pacientes de trauma com sangramento externo grave podem desenvolver um
distúrbio de coagulação característico e complexo, onde fatores etiológicos múltiplos como diluição,
consumo, acidose, hipotermia, deficiência na utilização do fibrinogênio e dissolução exacerbada do
coágulo (hiperfibrinólise) são responsáveis pelo seu desenvolvimento. Assim, o controle adequado da
hemorragia externa grave pode prevenir a mortalidade hospitalar tardia, causado pela falência múltipla
de órgãos.

O controle da hemorragia externa deve ser feito de maneira escalonada, progredindo se as medidas
iniciais não conseguirem controlar o sangramento. As etapas no manejo da hemorragia externa na cena
incluem:

 Compressão manual direta


 Curativos Compressivos
 Cobertura da ferida
 Ataduras elásticas
 Torniquete
 Agente Hemostático
 Torniquetes Juncionais quando indicados

Quase todos os casos de hemorragia externa são controlados pela aplicação de pressão direta na ferida.
É a técnica inicial utilizada e se baseia no princípio de Bernoulli e envolve várias considerações:
Vazamento de líquido= Pressão Transmural x Tamanho de orifício na parede do vaso
A pressão transmural é a diferença entre a pressão dentro do vaso e a pressão fora do vaso. Logo, quanto
mais compressão o socorrista aplicar, mais lenta será a perda sanguínea pelo aumento da pressão
extramural. A compressão direta também reduz a área de abertura e diminui ainda mais o fluxo
sanguíneo para fora do vaso. Mesmo se a perda sanguínea não for completamente interrompida, ela
pode ser diminuída até o ponto em que o sistema de coagulação interrompa a hemorragia. A
compressão direta sobre o ferimento deve ser feita em um tempo mínimo de 3 minutos ou conforme
as instruções do fabricante, sendo feita por 10 minutos no caso da gaze simples.

A compressão direta é sucedida por um curativo compressivo. Para alcançar o uso mais efetivo desse, o
material do curativo deve ser colocado pressionando a ferida para baixo com atadura elástica colocada
externamente. O enrolamento de um ferimento pode ser feito com uso de um agente hemostático. O
principal é colocar o material na base do ferimento, diretamente sobre o local de sangramento,
enrolando a ferida após.

É importante observar que, quando a pressão arterial do paciente estiver reduzida pela perda sanguínea,
é apropriado não aumentar para níveis normais; em vez disso, a perda sanguínea deve ser interrompida
e a PA mantida em um nível suficiente para garantir a perfusão dos órgãos vitais (entre 80-90mmHg).
Isso significa evitar infusão excessiva de líquidos IV e manter modesto grau de hipotensão.

Três pontos críticos Incluem:

 Não retirar objetos empalados, aplicar pressão aos lados


 Se as mãos forem necessárias para outras funções um curativo compressivo pode ser criado
com a utilização de coxins de gaze e uma atadura elástica ou um manguito de
esfigmomanômetro inflado até que hemorragia cesse
 A compressão direta deve ser feita antes da inserção de acesso IV e da administração de
líquidos

Torniquetes: Se o sangramento externo em uma extremidade não puder ser controlado pela
compressão, a aplicação de um torniquete é a próxima etapa no controle da hemorragia. Deve ser
aplicado na virilha ou na axila. Se um torniquete não interromper completamente a hemorragia, deve
ser aplicado outro proximalmente ao primeiro. Após a aplicação, o local do torniquete não deve ser
coberto para que ele possa ser facilmente visto e monitorado. Esse deve ser aplicado de maneira
suficientemente apertada para que bloqueie o fluxo arterial e oclua o pulso distal sendo que eles devem
ser utilizados por até 120-150 minutos. Da mesma forma, esse dispositivo pode causar doer em um
paciente consciente, sendo que o manejo dessa dor deve ser considerado.

Os ferimentos localizados nas chamadas áreas juncionais do corpo, locais onde as extremidades e a
cabeça se juntam ao tronco (virilha, axila, ombro e pescoço), podem causar lesão de grandes vasos
sanguíneos que podem sangrar profusamente. Para esses existem equipamentos específicos de controle
de hemorragia como os torniquetes juncionais.

4. Usar a avaliação primária para identificar condições de risco a vida:

Essa avaliação breve permite que as funções vitais sejam rapidamente avaliadas e que as condições
potencialmente fatais sejam identificadas por meio da avaliação sistemática dos XABCDEs.

Impressão Geral: A avaliação primária começa com uma visão geral rápida do estado respiratório,
circulatório e neurológico do paciente para a identificação de ameaças evidentes a vida ou a algum
membro. Na abordagem inicial o profissional procura por hemorragia compressível grave e observa se o
paciente parece estar movendo o ar de forma efetiva, se está acordado ou não responsivo e se está se
movendo espontaneamente. Podem ser feitas perguntas ao paciente e se responsivo com frases
completas já é provável que não haja ameaça imediata a vida. Se o paciente estiver instável para
fornecer uma resposta inicia-se uma avaliação primária detalhada para identificar os problemas
potencialmente fatais.

Sequência de Avaliação Primária:

 X-Hemorragia Exsanguinante
 A- Manejo da Via Aérea e Estabilização da Coluna Cervical

Via Aérea: Indivíduos sem prejuízo na fonação dificilmente apresentarão obstrução significativa das vias
aéreas, devendo este sinal ser observado imediatamente no primeiro atendimento. Nestes casos,
apenas a administração de oxigênio, sob máscara facial a 11 l/min, é necessária. O comprometimento
das vias aéreas pode se manifestar clinicamente de forma súbita ou progressiva, neste último caso
através de agitação, na presença de hipóxia, ou letargia, quando predomina a hipercapnia. Se houver
comprometimento da via aérea, ela terá que ser aberta, inicialmente usando métodos manuais
(elevação do mento ou tração da mandíbula), além de eliminar o sangue, substâncias corporais e corpos
estranhos, se necessário. O manejo pode avançar e incluir aspiração e meios mecânicos (cânula oral,
cânula nasal, via aérea supraglótica, intubação orotraqueal ou métodos trans traqueais). Em um
subgrupo de pacientes existe a necessidade de acesso definitivo às vias aéreas, as indicações são:

 Apneia
 Proteção das vias aéreas inferiores contra aspiração de sangue ou conteúdo gástrico.
 Comprometimento iminente das vias aéreas (por exemplo, lesão por inalação, fraturas faciais
ou convulsões reentrantes).
 TCE necessitando de hiperventilação.
 Incapacidade de manter oxigenação adequada com ventilação sob máscara.

Estabilização da Coluna Cervical: Todos os pacientes com trauma e com um mecanismo de lesão
fechada significativo são suspeitos de lesão espinal até que tenha sido descartado com segurança. A
solução é procurar manter a cabeça e o pescoço do paciente em posição neutra durante todo o
processo de avaliação. Se for preciso remover os dispositivos de imobilização para reavaliação, a
estabilização manual da cabeça e do pescoço é usada até que o paciente possa novamente se colocado
em imobilização da coluna, bem como para o procedimento de intubação orotraqueal. Para uma
imobilização correta da coluna cervical para o transporte da vítima, além do colar cervical, deve-se
utilizar uma prancha longa (rígida) somada ao emprego de coxins laterais para garantir a fixação da
cabeça

 B- Respiração (Ventilação e Oxigenação)

Após abertura das vias aéreas, a qualidade e a quantidade de respiração (ventilação) do paciente podem
ser avaliadas da seguinte maneira:

 Observar a movimentação torácica e sentir o movimento de ar pela boa ou pelo nariz. Pode-se
auscultar ambos os lados do tórax
 Se não estiver respirando iniciar imediatamente as ventilações assistidas com um dispositivo
bolsa-máscara-válvula e oxigênio suplementar
 Garantir que a via aérea esteja patente, continuar as ventilações e preparar para a inserção da
via aérea avançada
 Se respirando, estimar se estão adequadas a frequência e a profundidade da ventilação
 Garantir que não esteja hipóxico e que a saturação seja maior ou igual a 94%
 Se consciente, deve-se escutá-lo falar e avaliar se consegue dizer uma frase inteira sem
dificuldade

Uma vez obtida uma via aérea pérvia, o próximo passo consiste em garantir uma ventilação adequada.
Todas as vítimas de trauma devem receber oxigênio suplementar, seja através de máscara facial (fluxo
de, pelo menos, 11 l/min) ou de tubo endotraqueal; é necessária a monitorização com oximetria de
pulso e eletrocardiografia contínua. O tórax deve ser exposto, observado e palpado rapidamente.
Depois, a ausculta pulmonar identificará ruídos respiratórios anormais, diminuídos ou ausentes. Três
situações podem comprometer criticamente a ventilação/oxigenação, sendo consideradas as armadilhas
ou ciladas da fase B: pneumotórax hipertensivo, pneumotórax aberto e tórax instável. O hemotórax e o
pneumotórax simples podem também prejudicar a ventilação, porém em menor grau.

No que diz respeito a FR, essa pode ser dividida em cinco categorias:

 Apneia- Não está respirando e isso inclui as respirações agonizantes ocasionais. Está indicado
ventilação total om >85% de oxigênio
 Bradipneia- Abaixo de 10 ventilações por minuto e pode indicar lesão grave ou isquemia
encefálica. Será necessário auxiliar ou controlar completamente a respiração do doente
 Taquipneia- 20 a 30 RPM pode indicar que o paciente precisa de uma melhor perfusão,
oxigenação ou ambas
 Extremamente rápida- Maior que 30 RPM indica hipóxia, metabolismo anaeróbico ou ambos,
com resultante acidose.

 C- Circulação e Sangramento (Perfusão e Hemorragia Interna)

Nessa etapa o socorrista deve obter uma estimativa geral adequada do débito cardíaco e da perfusão do
paciente. A hemorragia interna ou externa é a causa mais comum de morte previnível no trauma.

Perfusão: Se avalia os pulsos periféricos, cor, temperatura e umidade da pele. Os possíveis locais de
hemorragia interna massiva incluem o tórax (cavidades pleurais), abdome (cavidade peritoneal), pelve,
espaço retroperitoneal e as extremidades (coxas). Se houver suspeita esses locais devem ser despidos
para rápida inspeção e palpação.

Pulso: Avaliado quanto a presença, qualidade e a regularidade. A determinação de uma frequência de


pulso não é necessária nessa etapa e somente se obtém uma estimativa grosseira, sendo a FC real
obtida mais tarde.

Na presença de instabilidade hemodinâmica, a reposição volêmica deve ser feita preferencialmente


através de acessos periféricos.

 D- Incapacidade

Um exame neurológico rápido deve ser realizado. Esta avaliação inclui a aferição da escala de coma de
Glasgow e a observação do tamanho da pupila e da movimentação das extremidades. A presença de
tubo orotraqueal e o uso de bloqueadores neuromusculares atrapalham, sem dúvida alguma, a
avaliação neurológica pela escala de coma de Glasgow. Condições como hipoxemia, hipotensão e uso de
álcool e/ou drogas podem levar a rebaixamento do nível de consciência no paciente vítima de lesões
multissistêmicas. Excluídas essas causas, alterações do exame neurológico devem ser atribuídas, até
segunda ordem, a traumatismo do sistema nervoso central.

 E- Exposição/Ambiente
A vítima é despida e examinada rapidamente dos pés à cabeça. As lesões em região dorsal, o
envolvimento do períneo e os traumas penetrantes, ainda não diagnosticados, podem ser revelados.
Após esta avaliação, o paciente deve ser aquecido com cobertores térmicos e a temperatura da sala de
reanimação deve estar adequada, pequenas medidas que previnem a hipotermia.

Avaliação Secundária

O objetivo da avaliação secundária é identificar lesões ou problemas não identificados durante a


avaliação primária e ela só é realizada após a avaliação primária. Essa, por definição lida com situações
menos graves. A avaliação secundária usa abordagem ‘’enxergar, escutar, sentir’’ para avaliar o
paciente, sendo o exame craniocaudal. Também se obtém uma história rápida sobre o paciente, sendo
que o mnemônico SAMPLE serve como lembrete dos principais componentes:

 Sintomas
 Alergias
 Medicamentos
 Passado clínico e cirúrgico
 Lanches/último período menstrual
 Eventos

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