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POLIPOSE E NEOPLASIA

INTESTINAL
CLÍNICA CIRÚRGICA

PÓLIPOS INTESTINAIS

O pólipo intestinal é uma alteração causada pelo um crescimento anormal da mucosa do intestino
grosso (cólon e reto). É uma das condições mais comuns que afeta o intestino, ocorrendo em 15 a 20
por cento da população. Alguns são baixos e planos, outros são altos e se assemelham a um cogumelo,
podendo aparecer em qualquer parte do intestino grosso. Podem também ocorrer de forma isolada
(esporádica), ou como manifestação de determinadas síndromes hereditárias. São comumente
detectados durante o exame de colonoscopia e geralmente são assintomáticos, mas podem ulcerar e
sangrar, causar tenesmo se estiverem no reto e, quando muito grandes, produzir obstrução intestinal. O
que confere maior importância clínica a essas estruturas é a possibilidade de se tornarem malignas,
sendo que a sua remoção, endoscópica ou cirúrgica, pode prevenir ou tratar esta transformação.

 Classificação

Os pólipos colorretais podem ser classificados pela sua histologia e morfologia. Outra informação
importante é seu tamanho estimado na colonoscopia, apresentando maior risco para neoplasia quando
são maiores ou iguais a 1 cm. Essas classificações são importantes para a decisão terapêutica na
colonoscopia e para o seguimento do paciente.

 Classificação Histológica

Podem ser neoplásicos ou não neoplásicos. Os neoplásicos podem ser malignos (adenocarcinoma) ou
benignos (adenomatosos), enquanto os não neoplásicos são basicamente três: hiperplásicos,
inflamatórios e hamartomas (pólipos juvenis e os pólipos de Peutz-Jeghers). Os chamados pólipos
serrilhados contêm ao mesmo tempo tecido hiperplásico e adenomatoso.
Embora sejam histologicamente “benignos”, os pólipos do tipo adenomatoso (os mais comuns) são
lesões pré-malignas que antecedem, em cerca de 7-10 anos, o adenocarcinoma colorretal. Isso faz com
que as neoplasias intestinais, em especial as colônicas, sejam o principal exemplo, dentro da medicina
oncológica, da sequência patogênica adenoma-carcinoma. Por conta disso, em princípio, todo pólipo
colônico deve ser ressecado, seguido de uma minuciosa análise histológica

 Classificação Morfológica

 Pólipos Adenomatosos

Os pólipos adenomatosos têm sua incidência aumentada com a idade, ocorrendo em 30-40% dos
indivíduos com mais de 50 anos atingindo uma prevalência superior a 50% nos idosos. São os pólipos
mais frequentes do intestino grosso, pelos estudos de colonoscopia. São definidos pela presença de
epitélio displásico (displasia), ou seja, o o epitélio passa a ser composto de células diferentes das células
normais, com núcleo hipercromático, perda da uniformidade de tamanho e orientação espacial. A
displasia é, na verdade, um precursor do câncer, embora nem sempre evolua para tal.

Todos os adenomas são displásicos, mas a maioria apresenta uma displasia de baixo grau (não
acometendo a lâmina própria). Cerca de 10-30% apresentam displasia de alto grau (acometendo a
lâmina própria). Do ponto de vista do arranjo histopatológico, o pólipo adenomatoso pode ser
classificado em:

 Tubular – mais comum e de melhor prognóstico; Os adenomas tubulares (85% dos casos) são
geralmente de pequeno tamanho (não ultrapassam o diâmetro de 2 cm) e pedunculados
(possuindo uma haste).
 Viloso – pior prognóstico; os adenomas vilosos (5-10% dos casos) costumam ser maiores que os
tubulares (podem atingir até 10 cm de diâmetro) e geralmente são sésseis (não pedunculados),
mesmo quando grandes, e possuem uma superfície aveludada
 Tubuloviloso – prognóstico intermediário. Os adenomas tubulovilosos (5-10% dos casos) são
uma “mistura” destes dois padrões, com arquitetura vilosa ocupando 25-75% do pólipo. Suas
características macroscópicas também são intermediárias.

Os principais fatores de risco para a malignização de um pólipo adenomatoso são:

 Tamanho: pólipos com mais de 2 cm têm até 40% de chance de se malignizarem


 Tipo Histológico: os adenomas vilosos têm uma tendência bem maior de sofrer malignização.
 Grau de Displasia: os adenomas com displasia de alto grau têm um risco bem maior de se
tornar um adenocarcinoma invasivo.

Manifestações Clínicas

A maioria dos pólipos adenomatosos é assintomática. Quando ocorrem sintomas, o sangramento retal
(hematoquezia) é a queixa mais comum. Assim, na maioria das vezes, ou os adenomas são descobertos
acidentalmente (na pesquisa de outras condições ou no rastreamento de familiares), ou são
descobertos pela investigação de hematoquezia. Mais raramente, um adenoma viloso grande de
localização retal se associa à diarreia mucoide profusa, ou um pólipo com pedículo grande sofre
prolapso através do ânus.

Os pólipos retais podem ser palpáveis pelo toque, mas devem ser sempre evidenciados por endoscopia.
Os exames que podem detectar os pólipos do intestino grosso são os radiológicos (clister opaco) e os
endoscópicos (sigmoidoscopia flexível, colonoscopia)

 Abordagem do paciente com pólipo colorretal

A princípio, todos os pólipos colorretais devem ser removidos (polipectomia) para estudo
histopatológico, através da colonoscopia, após adequado preparo colônico, ou sigmoidoscopia flexível.
O mero aspecto macroscópico (endoscópico) não é capaz de diferenciar os pólipos adenomatosos dos
pólipos não neoplásicos. Pólipos encontrados no exame baritado e pólipos adenomatosos encontrados
na sigmoidoscopia indicam a realização de uma colonoscopia, pela necessidade de ressecção e pela
possibilidade de pólipos sincrônicos mais proximais.

Após a remoção, os pólipos adenomatosos devem ser exaustivamente examinados para malignidade.
Considera-se que a polipectomia foi CURATIVA para um pólipo maligno quando os seguintes critérios
forem preenchidos:

 todo o pólipo foi ressecado;


 as margens estão livres (sem evidências microscópicas de tecido neoplásico);
 histologia bem diferenciada;
 ausência de invasão vascular ou linfática

A colonoscopia sempre deve ser repetida após três meses, a fim de confirmar a ausência de lesões
residuais. Em pacientes cujo pólipo maligno não preenche estes critérios (bem como naqueles em que o
exame de controle demonstra lesões residuais) a cirurgia para ressecção do câncer colorretal está
indicada.

O acompanhamento dos pacientes submetidos a uma polipectomia é muito importante, pois a chance
de novos pólipos é de 30-40% após três anos. Uma nova colonoscopia deve ser realizada após três
anos, para flagrar possíveis recidivas. Na ausência de novos pólipos, o rastreamento colonoscópico pode
ser marcado a cada cinco anos.

Pacientes que apresentam múltiplos pólipos adenomatosos no cólon (ex.: ≥ 10 lesões) devem realizar
testes genéticos para a pesquisa de Polipose Adenomatosa Familliar (PAF). Se o paciente possuir um
parente de primeiro grau com adenoma colorretal esporádico a recomendação é indicar o
rastreamento por colonoscopia nos seguintes casos:

 O adenoma colorretal do caso índice é “avançado” (> 1 cm, viloso) e foi diagnosticado antes de
60 anos de idade.
 Em caso de ser irmão ou irmã, quando um dos pais teve câncer colorretal em qualquer idade.

 Síndromes Hereditárias de Polipose

Polipose adenomatosa familiar (PAF)

A Polipose Adenomatosa Familiar é a mais comum e o protótipo destas síndromes, aparecendo como
um distúrbio autossômico-dominante caracterizado pelo surgimento de numerosos pólipos
adenomatosos (adenomas), com frequência de centenas ou milhares, que atapetam todo o cólon e o
reto. A forma clássica é diagnosticada pelo encontro de pelo menos 100 pólipos adenomatosos na
colonoscopia; na forma atenuada, podemos encontrar entre 10-100 pólipos.

A doença começa na adolescência com o aparecimento de alguns poucos pólipos, e, com o passar dos
anos, estes se desenvolvem às centenas ou milhares na luz do intestino grosso, causando sintomas
como diarreia e sangramento retal, ou permanecendo assintomáticos. Pólipos adenomatosos gástricos e
duodenais também são comumente detectados.

Em 90% dos casos a doença está relacionada à ocorrência de mutações no gene APC localizado no braço
longo do cromossomo 5. Pacientes com PAF podem apresentar outros tumores tais como: carcinoma
gástrico, da ampola duodenal, do delgado, pancreático, colangiocarcinoma, hepatoblastoma etc. A
hiperpigmentação retiniana hipertrófica é um achado clássico da síndrome.

A probabilidade de ocorrência de câncer colorretal em indivíduos com polipose familiar aproxima-se de


100% por volta dos 40 anos de idade, estando por esta razão indicada a colectomia profilática para
todos os pacientes com a doença, assim que ela for detectada. A maioria dos autores recomenda a
realização do procedimento antes dos 20 anos de idade, evitando-se, no entanto, sua realização na
infância. Pacientes com múltiplos pólipos > 1 cm, com displasia de alto grau ou com histologia vilosa na
maioria dos adenomas devem ser operados imediatamente.

Portadores de PAF também devem ser realizar EDA a cada 1-3 anos, a partir da idade de 25-30 anos,
como screening de tumores gástricos/duodenais. Pólipos > 2 cm nessas regiões sempre devem ser
ressecados e submetidos ao estudo histopatológico em busca de uma neoplasia maligna.

CÂNCER COLORRETAL
O câncer colorretal é, na maioria das vezes (95% dos casos), o adenocarcinoma, derivado do epitélio
glandular colônico (criptas). A neoplasia maligna colorretal corresponde, em nosso país, à quarta causa
de morte por câncer em homens, e à terceira causa em mulheres. No Brasil, estima-se algo em torno
de 34.000 casos novos da doença por ano. A incidência é muito maior na região Sudeste quando
comparada às regiões Norte e Nordeste. Mais da metade dos casos se manifesta em pessoas com > 60
anos.

 Patogenia
Duas teorias estão relacionadas na fisiopatologia desses cânceres. A primeira é a sequência adenoma-
carcinoma que explica os casos de adenocarcinoma, e a segunda é a via de instabilidade de
microssatélites, relacionada com a síndrome de câncer colorretal hereditário não polipose.

Sequência adenoma-carcinoma: Essa via corresponde a 80% dos CCR esporádicos. Nós temos duas
cópias do gene supressor de tumor Polipose adenomatosa coli (APC), que é um regulador negativo de
uma proteína multifuncional, componente da via de sinalização, chamado b-catenina. Algumas pessoas
já nascem com uma cópia do gene APC mutada ou inativada.

No entanto, os adenomas só se desenvolvem quando há a mutação ou ativação das duas cópias do


gene. A fisiopatologia do CCR se inicia quando ocorre uma mutação da APC, fazendo com ele perca a sua
função. Normalmente, esse gene promove a degradação da b-catenina, entretanto, como o APC está
inativo, ocorre acumulo da b-catenina. Esse componente da via de sinalização em grande quantidade se
transloca para o núcleo celular e ativa a transcrição de genes, como os que codificam Myc e Ciclina,
responsáveis pela proliferação celular.

Esse processo pode ser acompanhado por mutações adicionais, como mutações de ativação do gene
KRAS, que também promovem o crescimento celular e evita a sua apoptose; mutações que codificam os
genes SMAD2 e SMAD4, efetores da sinalização do fator TGF-β, que está envolvido na inibição do ciclo
celular; e em outros genes, como DCC e caderina-E. Mutações de TP53 também ocorrem em fases
tardias da progressão do tumor, sendo este um gene supressor de tumor que está mutado em 70-80%
dos cânceres do cólon. Em suma, fatores que levam a mutação em genes que regulam a proliferação
celular estão alterados, fazendo surgir os adenomas com displasias celulares.

Via de instabilidade de microssatélites: Essa via está associada ao aparecimento do câncer colorretal
hereditário não polipose. Em pacientes que tem perdas de genes relacionados ao reparo do DNA,
existem mutações que se acumulam em repetições microssatélites, uma condição chamada de
instabilidade microssatélite. Essas mutações geram irregularidades em genes envolvidos na regulação
do crescimento celular, como TGF-β tipo II e a proteína pró-apoptótica BAX. Mutações no oncogene
BRAF e silenciamento de alguns genes devido a hipermetilação da ilha CpG também são comunsAssim,
ocorre o crescimento celular descontrolado e a sobrevivência de células geneticamente anormais..

Fatores de Risco

Dieta e Hábitos de Vida: A dieta tem sido implicada como um dos fatores de risco para o
desenvolvimento de Ca colorretal: as dietas ricas em calorias e gorduras de origem animal e/ou
carboidratos refinados estariam associadas estatisticamente a uma maior incidência deste câncer. A
explicação mais aceita atualmente é que um consumo elevado destes nutrientes aumenta a densidade
da microbiota anaeróbia do cólon. Tais micro-organismos – de forma ainda pouco compreendida –
metabolizariam sais biliares presentes no bolo fecal transformando-os em carcinogênios.

História pessoal ou familiar de adenoma esporádico ou de CA colorretal esporádico: Pacientes que já


apresentaram adenomas colorretais esporádicos ou Ca colorretal esporádico têm maior probabilidade
de apresentar novamente estas neoplasias. Ainda, história familiar de Ca colorretal esporádico em um
familiar de primeiro grau aumenta o risco de Ca colorretal em 1,7 vezes em relação à população geral. A
presença de pólipo adenomatoso > 1 cm ou de adenoma colônico com histologia avançada (viloso ou
túbulo viloso) em história familiar, também aumenta a probabilidade de Ca colorretal.

Doença Inflamatória Intestinal: Em pacientes com DII, a lesão precursora do Ca colorretal não é um
pólipo e sim uma displasia epitelial que surge na parede colônica. Tanto a Retocolite Ulcerativa
Idiopática (RCUI) quanto a Doença de Crohn (DC) colorretal são consideradas fatores de risco. Na RCUI, o
Ca colorretal é encontrado com maior frequência no colón sigmoide e no reto. Na DC, o Ca colorretal se
distribui igualmente entre cólon direito e o retossigmoide

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