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Poder Judiciário da União

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

Órgão 4ª Turma Cível


Processo N. Apelação Cível 20070111217799APC
Apelante(s) LAF EMPRESA DE SERVIÇOS HOSPITALARES LTDA E
OUTROS
Apelado(s) OS MESMOS
Relator Desembargador ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS
Revisor Desembargador ANTONINHO LOPES
Acórdão Nº 599.546

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CURETAGEM.


MÁ-PRESTAÇÃO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO
HOSPITAL CONDICIONADA À RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO
PREPOSTO. QUANTUM. PROPORCIONAL.
1. A responsabilidade do hospital é objetiva quanto à atividade de seu
profissional plantonista (CDC, art. 14). Com efeito, em interpretação do art.
932, III, do CC, em que se exige a comprovação da culpa do preposto
(responsabilidade subjetiva), a responsabilidade objetiva do hospital, por ato
de seu plantonista, é condicionada à responsabilidade subjetiva do médico
plantonista.
2. Age com imperícia o médico residente que realiza o primeiro procedimento
de curetagem, deixando saco gestacional na cavidade intra-uterina da parte
autora, causando quadro infeccioso e a necessidade de se submeter a novo
procedimento cirúrgico e internação.
3. A indenização por danos morais deve ser fixada considerando a
intensidade do dano, bem como as condições da vítima e do responsável, de
modo a atingir sua dupla função: reparatória e penalizante. De igual modo, não
pode ser fonte de enriquecimento ilícito.
4. Recurso da autora e da ré não providos.

Código de Verificação:
APELAÇÃO CÍVEL 2007 01 1 121779-9 APC

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores da 4ª Turma Cível do Tribunal de


Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS -
Relator, ANTONINHO LOPES - Revisor, CRUZ MACEDO - Vogal, sob a
Presidência do Senhor Desembargador ANTONINHO LOPES, em proferir a
seguinte decisão: NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA E DA
RÉ, UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 20 de junho de 2012

Certificado nº: 63 3A 02 5E 00 04 00 00 0C DF
29/06/2012 - 14:44
Desembargador ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS
Relator

Código de Verificação:
7X6F.2012.MZMZ.NVO8.UX0I.X31T7X6F.2012.MZMZ.NVO8.UX0I.X31T
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APELAÇÃO CÍVEL 2007 01 1 121779-9 APC

RELATÓRIO

O Senhor Desembargador ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS -


Relator

Cuida-se de apelação cível interposta por LAF – Empresa de


Serviços Hospitalares Ltda. (Hospital Brasília) e recurso adesivo interposto por
Marcela de Faria Campelo Bezerra contra sentença proferida pelo Juízo da 16ª
Vara Cível de Brasília, que julgou o pedido de indenização por danos morais
procedente, condenando a empresa a pagar à Marcela de Faria Campelo
Bezerra o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), com correção monetária e
juros legais (1% a.m.), a contar da sentença. Condenou-o, ainda, ao pagamento
das custas e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10%, sobre o valor
da condenação.

A LAF – Empresa de Serviços Hospitalares Ltda. (Hospital


Brasília) alega que não pode ser responsabilizada, em razão de complicações na
curetagem realizada na autora, após um aborto espontâneo, porque se trata de
responsabilidade de meio. Sustenta que a realização de nova curetagem em
paciente constitui procedimento comum, que não configura erro de técnica
médica. Aduz que não ficou comprovado que a apelada tenha sofrido algum
dano. Alternativamente, insurge-se contra o valor da condenação, alegando que
não atendeu aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Requer o
provimento do apelo, para que o pedido inicial seja julgado improcedente.

Marcela de Faria Campelo Bezerra, por sua vez, alega que deve
ser considerada a condição econômica e financeira do apelado para fixar o
quantum indenizatório, que tem patrimônio líquido superior a R$ 840.000.000,00
de reais e lucro líquido anual acima de R$ 70.000.000,00. Aduz que o valor
arbitrado não contribuirá para a mudança dos procedimentos da apelada. Requer
o provimento do recurso, para que a indenização seja majorada.

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Contrarrazões da ré, pugnando pelo improvimento da apelação


da autora. Esta não apresentou contrarrazões.

É o relatório.

VOTOS

O Senhor Desembargador ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS - Relator

As apelações serão analisadas conjuntamente.

A relação é de consumo, incidindo as disposições do Código de


Defesa do Consumidor, uma vez que a autora é a destinatária final do serviço
prestado (art. 2º, do CDC) e o réu, é fornecedor, nos termos do art. 3º, do CDC.

A responsabilidade das sociedades empresárias hospitalares por


dano causado ao paciente-consumidor, em regra, pode ser sintetizada como
sendo subjetiva. Todavia, a jurisprudência do STJ, firmou-se no sentido de que,
quanto à atividade de seu profissional médico plantonista (CDC, art. 14), trata-se
de responsabilidade objetiva. Confirma-se nos seguintes julgados:

“RECURSO ESPECIAL: 1) RESPONSABILIDADE CIVIL - ERRO


DE DIAGNÓSTICO EM PLANTÃO, POR MÉDICO INTEGRANTE DO CORPO
CLÍNICO DO HOSPITAL - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO HOSPITAL; 2)
CULPA RECONHECIDA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM - 3) TEORIA DA PERDA
DA CHANCE - 4) IMPOSSIBILIDADE DE REAPRECIAÇÃO DA PROVA PELO
STJ - SÚMULA 7/STJ

1.- A responsabilidade do hospital é objetiva quanto à


atividade de seu profissional plantonista (CDC, art. 14), de modo que
dispensada demonstração da culpa do hospital relativamente a atos lesivos

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decorrentes de culpa de médico integrante de seu corpo clínico no


atendimento.

[....]

3.- Recurso Especial do hospital improvido” (REsp 1184128/MS,


Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/06/2010, DJe
01/07/2010).

“RECURSO ESPECIAL: 1) RESPONSABILIDADE CIVIL -


HOSPITAL - DANOS MATERIAIS E MORAIS - ERRO DE DIAGNÓSTICO DE
SEU PLANTONISTA - OMISSÃO DE DILIGÊNCIA DO ATENDENTE -
APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR; 2) HOSPITAL
- RESPONSABILIDADE - CULPA DE PLANTONISTA ATENDENTE,
INTEGRANTE DO CORPO CLÍNICO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO
HOSPITAL ANTE A CULPA DE SEU PROFISSIONAL; 3) MÉDICO - ERRO DE
DIAGNÓSTICO EM PLANTÃO - CULPA SUBJETIVA - INVERSÃO DO ÔNUS DA
PROVA APLICÁVEL - 4) ACÓRDÃO QUE RECONHECE CULPA DIANTE DA
ANÁLISE DA PROVA - IMPOSSIBILIDADE DE REAPRECIAÇÃO POR ESTE
TRIBUNAL - SÚMULA 7/STJ.

1.- Serviços de atendimento médico-hospitalar em hospital de


emergência são sujeitos ao Código de Defesa do Consumidor.

2.- A responsabilidade do hospital é objetiva quanto à


atividade de seu profissional plantonista (CDC, art. 14), de modo que
dispensada demonstração da culpa do hospital relativamente a atos lesivos
decorrentes de culpa de médico integrante de seu corpo clínico no
atendimento.

[...]

5.- Recurso Especial do hospital improvido” (REsp 696.284/RJ,


Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/12/2009, DJe
18/12/2009).

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Com efeito, deve ser condicionada a responsabilidade objetiva do


hospital à comprovação da culpa do médico plantonista, fazendo uma
interpretação do art. 932, III, do CC, em que se exige a comprovação da culpa do
preposto (responsabilidade subjetiva). Assim, a responsabilidade do hospital é
objetiva, mas, a do médico, subjetiva.

No caso, conforme consta dos autos, a autora sofreu um aborto


espontâneo em 08/09/2007 (fls. 22) e foi atendida na emergência do Hospital
Brasília. Na ocasião foi submetida ao procedimento médico de aspiração manual
intra-uterina a vácuo – AMIU e, após, recebeu alta.

Em casa, durante uma semana, apresentou febre, razão pela


qual voltou à emergência do hospital no dia 16/09/2007 e fez nova ecografia. Foi
detectada a presença de saco gestacional, vindo a se submeter à nova
curetagem uterina no dia 17/09/2007.

Tal fato demonstra a ocorrência do dano, uma vez que a paciente


ficou, por uma semana, em seu ventre, com saco gestacional, causando-lhe febre
alta e colocando-a em risco de saúde.

Conforme laudo pericial, a ecografia transvaginal de fls. 26


mostra que, de fato, o saco gestacional ficou na cavidade intra-uterina, após a
realização da primeira curetagem.

Ademais, a perita fez registrar no laudo que a presença de restos


embrionários no útero pode causar perfuração uterina, laceração do cólo uterino,
hemorragia uterina.

Apesar de a perícia ter informado que “essas complicações estão


associadas à complexidade do procedimento, quando a paciente apresenta
hemorragia intensa e processo infeccioso, que dificulta a realização da AMIU,
sendo nesses casos necessário a repetição do procedimento por ter ficado restos
ovulares na cavidade intra-uterina”, o prontuário da paciente não havia registro de
que tinha apresentado hemorragia intensa ou processo infeccioso que justifique
as complicações apresentadas pela paciente.

Código de Verificação:
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Por fim, a perícia concluiu: “Houve negligência no atendimento


médico prestado a pericianda, no entanto não deixou sequelas”.

Destaca-se, ainda, da perícia, a resposta do quesito 7, em que foi


perguntado à expert se “a segunda ecografia obstétrica realizada pela paciente
autora (documento 02) constatou a existência de feto ‘no interior do saco
gestacional com idade estimada de 07 semanas e um dia”. A perita respondeu
afirmativamente. A perita constatou, ainda, que a condição uterina da paciente
autora posterior a realização da primeira curetagem indicada na segunda
ecografia obstétrica (documento 02) não era normal.

O fornecedor responde tanto pelo risco causado ao consumidor


como pela potencialidade de risco, eis que está obrigado a prestar serviço com
segurança.

Com efeito, não há como negar que a situação vivida pela


paciente atingiu sua esfera psicológica. Portanto, a douta juíza sentenciante
analisou o feito de forma percuciente e irretocável, confira-se o seguinte trecho
da sentença, in verbis:

“Observo, pois que agiu com imperícia o médico residente que


realizou o primeiro procedimento de curetagem, eis que deixou o saco
gestacional na cavidade intra-uterina da parte autora, o que lhe acarretou um
quadro infeccioso e a necessidade de se submeter a novo procedimento cirúrgico
e internação. Diante do serviço defeituoso prestado pela requerida resta
demonstrada a sua responsabilidade civil e o seu dever de indenizar.

Em relação aos danos morais tenho que eles também restaram


configurados.

Como é cediço, o que configura o dano moral é a alteração do


bem estar do indivíduo, é a lesão aos sentimentos que determina dor ou
sofrimentos físicos, inquietação espiritual, abarcando qualquer menoscabo das
possibilidades de querer, pensar ou sentir e de perda de alguma capacidade e de
atributos.

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No caso dos presentes autos, configura-se o dano moral em


razão do sofrimento decorrente do processo infeccioso e a necessidade de se
submeter a uma segunda cirurgia, em razão do qual a autora sofreu dores e
precisou ficar internada por 3 (três) dias, o que já é um grande choque para
qualquer pessoa.

O que houve foi dor íntima apta a atrair a reparação por dano
moral, conforme ensina a doutrina:

‘Só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame,


sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no
comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e
desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação
ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral (...)’ .

Uma vez considerado presente os danos morais, passo a sua


quantificação. Para tanto, entendo que seu montante deve ser fixado em patamar
moderado, atendendo aos ditames da razoabilidade, de modo a evitar o
enriquecimento indevido da parte lesada ou nenhum sentimento de reprovação à
parte lesante.

A fixação dos danos morais deve se pautar, pois, pela prudência,


considerando a repercussão do dano, a capacidade patrimonial das partes e o
grau de culpa do ofensor pelo evento. A indenização não pode de nenhum modo
servir de enriquecimento ilícito para a vítima, mas também deve inibir o ofensor
em reincidir na mesma conduta.

No tocante ao aspecto econômico, o 1º requerido é clínica


conceituada. A autora, por sua vez, detem poucos recursos.

Destarte, observando os elementos analisados, e tendo em vista


a responsabilidade do réu, o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) espelha
bem a realidade em testilha, e observa os princípios de moderação e
razoabilidade recomendados”.

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Com efeito, a indenização por danos morais deve ser fixada


considerando a intensidade do dano, bem como as condições da vítima e do
responsável. De igual modo, não pode ser fonte de enriquecimento ilícito. Tendo
em vista esses parâmetros, tem-se como correto o valor de fixado para o dano
moral, por não ser excessivo, mas adequado ao dano sofrido. Como ficou
constatado, após a segunda cirurgia, a autora não teve qualquer outro problema
e não saiu com sequelas permanentes. Por isso, mostra-se adequado e
suficiente o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais).

Diante do exposto, nego provimento ao apelo da autora e da ré,


mantendo, na íntegra, a respeitável sentença.

É como voto.

O Senhor Desembargador ANTONINHO LOPES - Revisor

Com o Relator

O Senhor Desembargador CRUZ MACEDO - Vogal

Com o Relator.

DECISÃO

NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA E DA RÉ,


UNÂNIME.

Código de Verificação:
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