Você está na página 1de 3

Universidade de Brasília

Faculdade de Direito - FD/UnB


Direito das Coisas - Turma A 2022/2
Docente: Frederico Henrique Viegas de Lima
Discente: Hanna Luíza Souza Pereira
Matrícula: 200061658

Resenha Crítica
CALABRESI, Guido. MELAMED, A. Douglas. Property Rules, Liability Rules, and
Inalienability: One View of the Cathedral (1972). Yale Law School: Faculty Scholarship
Series. Paper, 1983.

Motivados pela variedade de assuntos legais não abarcados e geralmente separados em


“Propriedades” e “Direito Civil”, os professores Calabresi e Melamed elaboraram um modelo
de análise legal integrativo para ser aplicado nessa gama de problemas que estavam sendo
banalizados pelos escritores à época (p. 1089).
A partir de tal perspectiva unificada, foi possível definir direitos protegidos pela
propriedade, pela responsabilidade e pela inalienabilidade. O método de estudo se deu pela
análise dos aspectos que levaram aos copiosos conflitos jurídicos e análise das sanções
criminais, visando entender tais relações usualmente esquecidas (p. 1089).
Segundo os autores, o sistema legal deve abordar, primeiro, o problema do “direito”, o
qual provém do conflito entre duas ou mais pessoas e cabe ao sistema legal decidir qual é o
lado favorecido e que irá prevalecer (quem é mais forte ou perspicaz possui a vantagem). A
partir disso, o acesso a direitos fundamentais se baseia na lógica do “poder fazer o certo” (p.
1090-1091).
Não obstante, o Estado deve tomar outras decisões de segunda ordem que definem
quais direitos serão protegidos, quais se sobressaem sobre outros, e delimitar quando um
indivíduo pode negociar ou vender os seus direitos. Após a consolidação dessas bases iniciais,
a sociedade deve reforçar essas escolhas primárias que edificam o Direito, e com a ajuda de
uma intervenção mínima do Estado é possível perpetuar esse pacto firmado (p. 1090-1091).
A divisão dos tipos de direitos se dá da seguinte forma: direitos protegidos pelas leis
da propriedade (os quais podem ser vendidos em uma transação voluntária, sem grande
intervenção estatal), direitos protegidos pela responsabilidade (os quais se relacionam com o
estabelecimento de um acordo, e demandam maior intervenção estatal no que tange a sua
transferência e destruição) e os direitos protegidos pela inalienabilidade (não podem ser
transferidos pelo proprietário e estão submetidos a uma grande intervenção do Estado,
protegidos, limitados e regulados por leis). Um único bem pode estar submetido a essas três
categorias, a depender da situação (p. 1092-1093).
As regras dos direitos são dispostas de acordo com a eficácia econômica, ou óptimo de
Pareto, que compreende a alocação de recursos da maneira mais benéfica possível para todos
os envolvidos. Calabresi (p. 1093-1095) argumenta que uma possibilidade afora a garantia de
direitos, que espelha mais fielmente a eficiência de Pareto, seria a negociação entre os
indivíduos.
Outro fator importante são as preferências de distribuição, a qual é subdividida em
dois tipos: distribuição de riquezas e distribuição de certos bens específicos - os bens de
mérito -. Elas são delimitadas de maneiras diferentes em cada sociedade, e é papel da
coletividade escolher quais direitos e quais métodos serão utilizados para a distribuição, e
assim definir quais direitos podem ser vendidos e quais serão dados. Quando a escolha de
direitos afeta a distribuição de riquezas, acaba impactando na chance dos indivíduos obterem
os bens de mérito (p. 1098-1100).
As considerações sobre justiça também influenciam nas regras do direito, e esse senso
de justiça nada mais é do que a utilização das ideias gerais de eficiência e de distribuição em
análise perante um caso concreto. A noção de “justo” também engloba a derivação de um
direito por outro - ou seja, tratar casos parecidos de maneira parecida, como o direito ao
silêncio que deriva do direito a ser livre de apanhar pelo bel prazer de outros - (p. 1103-1105).
De tal forma, um direito pode ser assegurado para que outro seja garantido. Em suma,
o conceito de justiça na sociedade é relacionado com as preferências de distribuição, como a
igualdade, eficiência ou ambos (p. 1104-1105).
Quando a sociedade escolhe um direito inicial, também é preciso escolher qual regra
irá protegê-lo: as regras de propriedade, regras de responsabilidade ou regras de
inalienabilidade, como visto anteriormente. Muitas vezes, as regras de propriedade e
responsabilidade se encontram associadas, e essa última é necessária pois, frequentemente, o
direito não faz uma análise decente do mercado, sendo a avaliação coletiva mais eficiente e
mais barata, como também pela necessidade de se evitar acidentes e pela necessidade de
medidas de redistribuição (p. 1105-1110).
Já os direitos inalienáveis se manifestam como uma proibição de ações prejudiciais, de
forma que evitá-las é mais sensato do que pagar pelos seus custos. Constantemente eles estão
vinculados a questões associadas ao moralismo que desaguam em auto paternalismo (solicitar
que o Estado proíba ações prejudiciais, para que os indivíduos não cedam à tentação e sofram
consequências a longo prazo) e o verdadeiro paternalismo, este pode resultar em benefícios
não solicitados para grupos específicos (p. 1111-1114).
No caso da poluição, entende-se que três regras do direito são aplicadas: o direito de
estar livre de poluição, protegido por uma regra de propriedade no que tange o incômodo com
liminar, e protegido por uma regra de responsabilidade quando se trata de danos, e o direito de
Taney (aquele que gosta de poluição) não ser incomodado é protegido por uma regra de
propriedade (p. 1115-1117).
Há, no entanto, uma quarta regra que assegura o direito de Taney de poluir, protegido
pela regra de responsabilidade, no qual Marshall (o que não gosta de poluição) deve
compensar Taney se quiser impedi-lo de poluir. Seria possível, então, utilizar qualquer uma
das quatro regras, mas quando a poluição de Taney afeta vários Marshalls, é mais viável
assegurar o direito destes do que daquele (p. 1116-1120).
A eficiência econômica, todavia, não é capaz de resolver todas as questões de direitos.
Por exemplo, não é possível colocar em valor monetário os danos que um estupro causa na
vítima, nem mesmo pela delimitação coletiva e objetiva dos custos que o criminoso deve
pagar, uma vez que os direitos à integridade corporal vão além disso e não permitem que esse
direito seja vendido (p. 1124-1125).
E mesmo quando se trata de itens materiais que podem ser comercializados, impor um
preço de venda objetivo é muito complicado (especialmente nos casos em que o objeto possui
valor sentimental ou algo que não pode ser mensurado), por isso as sanções criminais se
destacam como punições importantes para impedir a conversão de regras de propriedade em
regras de responsabilidade (p. 1125-1126).
Obviamente, as regras são diferentes em casos de acidentes, e por isso é possível haver
alguma correção/compensação monetária em tais situações. Pois no caso de um acidente
automobilístico, a título de exemplo, o agressor não comete o crime por livre vontade e
consciência (como o próprio nome diz, se trata de um acidente). Já nos casos de furto e roubo,
o ladrão poderia ter negociado o bem sem infringir o direito de outrem, mas o escolhe fazer de
maneira onerosa para a vítima, de forma a ser penalizado por sua decisão (p. 1126-1127).

Você também pode gostar