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Dworkin
Alunos: Lincoln Renato Vieira Zanardine e Raquel Muniz Pereira Simões
Professora: Dra Estefânia Maria de Queiroz Barboza
Aula: 05/11/2021
1. A Integridade se ajusta?
Alguns filósofos negam a possibilidade de tal conflito, por acreditarem que, no final
das contas, uma dessas virtudes deriva da outra.
Alguns afirmam que, separada da equidade, a justiça não tem sentido, porquanto, na
política, tudo aquilo que provenha de procedimentos baseados na equidade é justo - “Esse é o
extremo da ideia denominada justiça como equidade” (Rawls).
Outros afirmam que, em política, a única forma de pôr à prova a equidade é através
do teste do resultado, segundo o qual nenhum procedimento é justo a menos que tenda a
produzir decisões políticas que sejam aprovadas num teste de justiça independente -
“Equidade como justiça” (James Mill).
“A maioria dos filósofos políticos - e, creio, a maioria das pessoas - adota o ponto de
vista intermediário de que a eqüidade e a justiça são, até certo ponto, independentes uma da
outra, de tal modo que as instituições imparciais às vezes tomam decisões injustas, e as que
não são imparciais às vezes tomam decisões justas”.
A questão que se coloca é saber se, coletivamente, existe (os diferentes grupos
sociais) uma razão de justiça para não concordar, antes mesmo de chegar a divergências
particulares, com a estratégia conciliatória como maneira de resolvê-las.
Aqui existe uma razão de equidade (política) em favor da estratégia da conciliação, e,
se não existe razão de justiça contra ela, nossa prática corrente precisaria de uma justificativa
que ainda não fomos capazes de prover, de assegurar.
Mostrarei que uma sociedade política que aceita a integridade como virtude política
se transforma, desse modo, em uma forma especial de comunidade, especial num sentido de
que promove sua autoridade moral para assumir e mobilizar o monopólio de força coercitiva.
3. O enigma da legitimidade
Um estado que aceite a integridade como ideal político tem um argumento melhor em
favor da legitimidade que outros que não a aceitem (porquanto a integridade imprime uma
noção de comunidade, de solidariedade da aceitação e práticas individuais de princípios
morais).
John Rawls propõe um contrato social imaginário como meio de selecionar a melhor
concepção de justiça no âmbito de uma teoria política utópica.
“Ele sustenta que, em condições específicas de incerteza, todos optariam por
certos princípios de justiça que pertençam à esfera de seus interesses, e afirma
que para nós esses princípios são, portanto, aqueles que consideramos corretos”.
Dworkin aponta, contudo, que tal contrato apresenta um problema. Para ele, o
consentimento não poderia ser obrigatório para as pessoas, da maneira que exige o
argumento, a menos que seja dado com maior liberdade.
Na posição original que defende, Rawls afirma que esse contrato social derivaria de
um dever natural, reconhecido pelas pessoas que o afirmam, de apoiar as instituições que
passem nos testes da justiça abstrata, “e que elas estenderiam esse dever ao apoio a
instituições não totalmente justas, pelo menos quando a justiça esporádica estiver nas
decisões tomadas por instituições imparciais e majoritárias" – p. 234.
Dworkin pontua, no entanto, que esse dever não é capaz de definir satisfatoriamente o
que seria a legitimidade, posto que não estabeleceria uma ligação suficientemente aceitável
entre obrigação política e comunidade específica. Em outras palavras, esse argumento não é
capaz de traduzir a essência do dever especial.
Ex. Não mostra, por exemplo, porque os ingleses não teriam o dever especial de
apoiar as instituições da Inglaterra.
4. As Obrigações da comunidade:
Circunstâncias e condições:
Em termos gerais, os membros de um grupo devem adotar certas atitudes com relação
a suas responsabilidades mútuas, caso se pretenda que estas sejam vistas como obrigações
fraternais (quatro condições):
4.1. Os membros do grupo devem encarar suas obrigações como especiais, ou seja,
como obrigações dotadas de um caráter distintivo no âmbito do grupo, que se
diferenciam dos deveres gerais que seus membros devem, igualmente, a pessoas que não
o integram;
Exemplo. Pensando na integração de uma comunidade internacional fraternal, os
norte-americanos, por exemplo, dirigem seus apelos políticos, inicialmente, aos próprios
norte-americanos e à sua comunidade, assim como os ingleses, brasileiros, e assim por
diante..
4.2. Deve-se admitir que essas responsabilidades são pessoais, ou seja, devem ser
direcionadas de um membro ao outro, sem percorrerem todo o grupo em um sentido
coletivo.
Exemplo. Meu colega pode pensar que tem, perante a reputação da universidade, a
responsabilidade de se concentrar em sua própria carreira, negando-me assistência na
elaboração de um artigo científico. Muito embora esteja certo quanto à utilização de seu
tempo em termos de sua responsabilidade geral junto à comunidade científica, ele falhou
comigo em firmar as bases necessárias para que eu continue a reconhecer obrigações
fraternais para com ele.
4.3. “Os membros podem ver essas responsabilidades como decorrentes de uma
responsabilidade mais geral, o interesse que cada um deve ter pelo bem-estar de outros
membros do grupo”.
Ou seja, dentro das diferentes formas de associação e de interesse geral, o interesse de seus
membros deve ser geral – dentro da forma ou do modo de vida constituído por uma prática
comunitária –, de modo a favorecer as bases às responsabilidades específicas, visando o
bem-estar da comunidade.
4.4. Os membros devem pressupor que as práticas do grupo mostram não apenas
interesse, mas um interesse igualitário para todos os membros.
Ou seja, os papeis e funções desempenhadas por cada membro em uma comunidade devem
refletir o interesse de todos, de modo que a vida de uma pessoa não se torne mais importante
do que a outra, porquanto, se assim o for, criam terreno fértil para a emergência de
organizações exclusivas (a exemplo do sistema de castas; diferentemente de um exército, que
pode ser considerado uma organização fraternal).
Este cenário só seria plausível, explica Dworkin, se a estrutura (política) geral das
obrigações associativas permita explicar as condições que, primeiramente, devem ser
satisfeitas antes que se enfoque a questão da obrigação política – e as circunstâncias
(problemas morais e jurídicos colocados pelo direito) que deveriam invalidá-las ou colocá-las
em conflito com outros tipos de obrigações.
Na sua visão, o simples fato de uma pessoa não participar da escolha de integrar uma
determinada comunidade política por, a exemplo, já nascer nela, não afasta a legitimidade de
tal afirmação. Isto porque, às pessoas é conferido o direito de migrar, conscientemente, de
uma comunidade política a outra, pois lhes é dado um direito de escolha intermediário, ainda
que posterior.
Ex1. O caso de dois estrangeiros que se veem presos em uma ilha deserta após uma
guerra.
“É uma arena de debates sobre quais princípios a comunidade deve adotar como
sistema, que concepção deve ter dejustiça, eqüidade e justo processo legal e não
a imagem diferente, apropriada a outros modelos, na qual cada pessoa tenta
fazer valer suas convicções no mais vasto território de poder ou de regras
possível- p. 255”
“As práticas políticas que exprimem uma ou outra dessas atitudes satisfariam as
condições da verdadeira comunidade associativa que identificamos?”
Pode ser enquadrada no argumento do jogo limpo – “essas são as regras sob as quais
você se beneficiou e é por elas que você deve pautar-se” (p. 256) –, que vê a política como
uma espécie de jogo.
Isto não quer dizer, contudo, que no âmbito deste modelo não possa haver
injustiças ou violações de direitos, mas o fato de que tal comunidade é regida por
princípios comuns permite concluir que o Modelo de princípios é aquele que melhor
satisfaz as condições de uma verdadeira comunidade associativa, ou seja, voltada à
promoção da integridade.
É dizer, por fim, que, se pudermos identificar, nas nossas práticas, atitudes
compatíveis com o modelo de princípios, podemos defender a legitimidade das nossas
instituições e das obrigações políticas que delas derivam, como uma questão de fraternidade.
[1]Equidade política: o direito de controle, por cada pessoa ou grupo da comunidade, mais ou
menos igual sobre as decisões tomadas pelo Parlamento ou Congresso, ou pelo legislativo
estadual.
“Mas o ajuste pode ser inconsciente; nesse caso, você acha que está
reprimido, mas, no sentido que nos interessa aqui, na verdade não o está. A
possibilidade de as convicções de um intérprete exercerem um controle
recíproco, como deve ser o caso se ele estiver realmente interpretando, vai
depender da complexidade e da estrutura do conjunto de suas opiniões sobre
o assunto em questão.” (DWORKIN, p. 284)
Outra crítica apontada por Dworkin diz respeito ao mito do juiz Hércules.
Trata-se de uma crítica baseada no realismo jurídico, que enxerga a decisão do juiz apenas
como uma justificação posterior daquilo que ele já decidiu anteriormente em sua convicção
íntima (p. 315-316). Para Dworkin, a função do Hércules é revelar na estrutura de uma
sentença, as razões que levaram àquela decisão, assim, podendo criticar a decisão tomada de
maneira fundamentada.
Na mesma esteira, os críticos do juiz Hércules argumentam que criar uma teoria
tão sofisticada é desnecessário para a casos de simples solução e que a fundamentação do
direito como integridade é um exercício exagerado. O que Dworkin responde é que a
distinção entre casos fáceis e difíceis se dá, nomeadamente, a partir do exercício do direito
como integridade e sua alocação principiológica.
Para encerrar o capítulo, Dworkin se debruça sobre o conceito cético de que não
existem respostas certas em casos difíceis, o que o direito como integridade rejeita. Dworkin
destaca que:
“.. o direito está longe de ter uma coerência perfeita. Sabe que a supremacia
legislativa dá força a algumas leis que, em princípio, são incompatíveis com
outras, e que a compartimentalização do "common law", juntamente com a
prioridade local, favorece a incoerência inclusive ali. Mas ele pressupõe que
essas contradições não são tão abrangentes e intratáveis dentro de cada ramo
ou instituto do direito que sua tarefa se torne impossível.” (DWORKIN, p.
319).
Assim, apesar das incoerências do direito em razão da sua construção por
diversas mãos, o juiz Hércules consegue trazer coerência para o direito a partir da teoria da
integridade. O autor encara o ceticismo no direito como um problema “esquizofrênico” de
interpretação e aponta a efervescência do movimento de “estudos críticos do direito” que
aproximam-se de uma leitura à esquerda e buscam uma reação maior do direito com outras
áreas (p. 324).
Uma corrente dos “estudos críticos” se aproxima do realismo jurídico americano
e nega a preexistência de um direito, e dá ênfase aos discursos enquanto exemplos de
enfrentamentos na arena do direito. Por outro lado, a corrente mais filosófica dessa escola dá
ênfase às ideologias constitutivas do direito e destaca os discursos hegemônicos e
contraditórios por trás deles.