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METODOLOGIAS

DE ENSINO DA
EDUCAÇÃO INFANTIL
METODOLOGIAS
DE ENSINO DA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Copyright © UVA 2019
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meio sem a prévia autorização desta instituição.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico


da Língua Portuguesa.

AUTORIA DO CONTEÚDO PROJETO GRÁFICO


Cristiane Bomfim Cruz UVA
do Nascimento
DIAGRAMAÇÃO
REVISÃO UVA
Theo Cavalcanti
Janaina Senna
Francine Souza
Janaina Vieira

N244

Nascimento, Christiane Bomfim Cruz do

Metodologia de ensino da educação infantil [livro


eletrônico] / Christiane Bomfim Cruz do Nascimento. – Rio de
Janeiro: UVA, 2019.

6,9 MB : PDF.

ISBN 978-85-5459-088-8

1. Educação de crianças. 2. Prática de ensino. 3.Ensino -


Metodologia. 4. Didática. 5. Educação pré-escolar. 6. Professores -
Formação profissional. I. Universidade Veiga de Almeida. II. Título.

CDD – 372.21

Bibliotecária Katia Cavalheiro CRB 7 - 4826.


Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central da UVA.
SUMÁRIO

Apresentação 6
Autor 7
UNIDADE 1

Metodologias de Ensino da Educação Infantil – 8


descortinando possibilidades de atuação no diálogo
com propostas diferenciadas.
• Pedagogias da infância

• Metodologias clássicas da Educação Infantil

• O construtivismo e a pedagogia de projetos nas propostas de atuação


com a infância

UNIDADE 2

Eixos estruturantes do trabalho com a infância - 35


interações, brincadeiras e o currículo da Educação
Infantil
• Os eixos estruturantes do trabalho com a infância

• Brincadeira: a principal linguagem da criança

• A construção do currículo para a Educação Infantil


SUMÁRIO

UNIDADE 3

Desenvolvimento e aprendizagem infantil 55


• Desenvolvimento infantil

• Desenvolvimento e aprendizagem na Educação Infantil

• Educação Infantil - O sujeito em foco

UNIDADE 4

Alfabetização e Letramento na Educação Infantil - A 75


relação da criança com a sociedade letrada
• Infância e sociedade letrada

• Alfabetização e letramento: conceitos diferenciados

• Práticas de letramento na Educação Infantil


APRESENTAÇÃO

Olá, estudante!

A partir deste momento, estaremos conectados neste ambiente de aula da disciplina


Metodologias de Ensino da Educação Infantil.

Esta disciplina foi organizada de forma a possibilitar a reflexão sobre a relação teórico-
prática essencial para a atuação do professor em sala de aula. Dessa forma, os objetivos
da disciplina estão voltados para a construção de competências e habilidades que levem
a uma formação crítica sobre a prática pedagógica na Educação Infantil.

Primeiramente, você estudará as diversas possibilidades metodológicas de atuação com


a primeira infância — cada proposta tem por trás uma concepção teórica que precisa
ser visitada para melhor compreensão das ações. Em seguida, você irá conhecer,
sob uma perspectiva crítica e reflexiva, os eixos estruturantes da Educação Infantil:
interação, brincadeira e currículo, tendo em vista que todas as propostas metodológicas
precisam contemplar esses aspectos. O próximo passo de seu estudo será conhecer
as características de desenvolvimento da criança de 0 a 5 anos para relacioná-lo às
metodologias. Finalmente, você poderá diferenciar alfabetização de letramento para
compreender como a criança da Educação Infantil precisa entrar em contato com a
leitura e a escrita.

A atuação com os pequenos exige um conhecimento amplo a respeito de seu


desenvolvimento e aprendizagem, pois a infância tem especificidades próprias que
precisam ser reconhecidas para validar uma atuação voltada ao desenvolvimento integral.

Será muito bom caminhar com você na construção desses conhecimentos e, desde já,
você está convidado a investigar, em quatro unidades de estudo, as possibilidades de
integração teórico-prática no universo da Educação Infantil.

Aproveite para interagir com sua turma e o tutor.

Bons estudos!

6
AUTOR

CRISTIANE BOMFIM CRUZ DO NASCIMENTO

Mestre em Psicanálise, Saúde e Sociedade pela Universidade Veiga de Almeida – UVA.


Especialista em Educação Infantil pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
– PUC-RJ. Graduada em Pedagogia pela UVA e em Psicomotricidade pelo Centro
Universitário IBMR-RJ. Professora no curso de Pedagogia da Faculdade São Judas
Tadeu – FSJT-RJ. Professora-tutora do curso de Pedagogia EAD da UVA. Professora-
autora das disciplinas Estágio Supervisionado e Prática de Ensino em Educação Infantil/
Metodologias de Ensino da Educação Infantil, da graduação EAD em Pedagogia da UVA.
Sua experiência também abrange regência em turmas da Educação Infantil ao 5º ano do
Ensino Fundamental. Áreas de atuação: Educação, Educação Infantil, Corpo e Movimento,
Arte e Educação.

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UNIDADE 1

Metodologias de Ensino da
Educação Infantil – Descortinando
possibilidades de atuação
no diálogo com propostas
diferenciadas
INTRODUÇÃO

Nesta unidade, serão abordadas as pedagogias da infância com foco nas metodologias
específicas da Educação Infantil. Em um diálogo constante com os autores, analisare-
mos a relação entre as concepções teóricas e as propostas metodológicas, de forma a
possibilitar uma ação em sala de aula cada vez mais consciente.

OBJETIVO

Nesta unidade você irá:

• Analisar as diferentes metodologias relacionando-as aos principais pressupostos


teóricos para a Educação Infantil.

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Pedagogias da infância

O desenvolvimento e a aplicação de pedagogias específicas para a infância são recentes


na história da Educação. Somente a partir do final do século XIX, começou-se a com-
preender que as crianças precisavam da aplicação de um trabalho diferenciado para sua
educação escolar, fato esse que não significava a ausência de propostas de trabalho
alinhadas com a infância, mas o que se tinha até então eram pedagogias de transmis-
são. Com o reconhecimento das especificidades infantis e a elaboração de teorias de
desenvolvimento infantil, começou-se a traçar propostas pedagógicas de participação.

Os autores considerados precursores ou pioneiros na construção de um pensamento


pedagógico voltado para a primeira infância pertencem a determinados contextos
históricos, sociais e culturais. Suas ideias norteiam uma visão de infância específica
que enxerga o aluno como um sujeito com voz e vez no processo de aprendizagem,
que possui suas opiniões ouvidas, acolhidas e respeitadas. Apresentavam, para a
época, ideias inovadoras tanto na forma de a criança ser vista e tratada como nas
concepções de escola, do processo ensino-aprendizagem e do posicionamento do
adulto diante da criança.

Para refletir

As propostas construtivistas que retomam, em muito, os textos dos pedagogos


do final do século XIX e princípio do século XX, se criam alguma ressonância ao
nível da retórica da política educativa, nunca conseguiram penetrar a carapaça
burocrática que protege a pedagogia transmissiva tradicional, ou seja, nunca
conseguiram transformar a esfera praxiológica. É assim que hoje assistimos

10
a uma quase esquizofrenia educativa em que se naturalizou a distância entre
as propostas e a realidade pedagógica experienciada por adultos e crianças.
(OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO; PINAZZA, 2007, p. 13)

Dialogar com os precursores da Educação Infantil justifica-se pela necessidade


contemporânea de reconstruir práticas significativas que, verdadeiramente, expressem
as construções teóricas que foram feitas na área educacional nos séculos XIX e XX.
Apesar do legado rico e bem diverso de propostas voltadas para a educação participativa,
ainda hoje a implementação dessas propostas enfrenta a força reguladora da pedagogia
de transmissão. Portanto, nos dias atuais há um confronto entre as pedagogias:

PEDAGOGIA PEDAGOGIA
DA TRANSMISSÃO DA PARTICIPAÇÃO

Vamos estudar agora o contexto histórico que possibilitou que se olhasse


para a educação de forma diferenciada, sobretudo a infantil.

Com a Modernidade, inaugurou-se um novo tempo no qual o homem passou a estar no


centro do pensamento da sociedade. O Iluminismo, movimento intelectual que surgiu
durante o século XVIII na Europa, marca o início da Idade Moderna. Baseado nos ideais
de liberdade, igualdade e fraternidade, os intelectuais que aderiram ao movimento
apontavam o uso da razão como único caminho para se chegar à conquista da autonomia
da emancipação. O foco do pensamento iluminista era tirar o ser humano das trevas em
que se encontrava durante a Idade Média, na qual o domínio da Igreja havida tolhido a
capacidade humana de usar a razão.

Tais ideias afetaram todas as esferas da sociedade: filosófica, política, econômica, social
e cultural, provocando diversas mudanças no comportamento das pessoas. Como o
objetivo principal era propiciar o alcance da razão, o povo precisava ser educado, precisava,
no mínimo, aprender a ler e a escrever, fato que não era oferecido a todos. Portanto, uma
das defesas dos iluministas era a criação de escolas, assim como pregavam a liberdade
religiosa, para que as pessoas fossem libertas dos dogmas da Igreja.

11
Saiba mais

O Iluminismo, em seu projeto de livrar os


homens do mal que representa a ignorância ou
o não saber e torná-los senhores do mundo por
via da razão, inaugura, em um certo sentido, a
preocupação com a criança e sua formação.
Essa preocupação [...] não tinha por objetivo
tratar das peculiaridades dessa etapa de vida.
Ao contrário, olhava-a negando-a, uma vez que
o que interessava é que ali estava um pequeno adulto, o homem de amanhã.
Nesse momento, portanto, a infância é compreendida como uma fase efêmera,
passageira e transitória que precisa ser apressada. Crescer é tornar-se um ser
de razão, e esse amadurecimento, tal como o das frutas na estufa, precisa ser
aligeirado. (NUNES; PEREIRA, 1996 apud PEREIRA; SOUZA, 2003, p. 29)

Dentro do projeto moderno a infância começou a ser olhada de forma diferenciada,


como um objeto de estudo para a ciência, que passou a explicar todas as etapas do
desenvolvimento infantil, determinando parâmetros de normalidade. A relação do
adulto com a criança passou a ser de controlador de seu futuro, pois assim o porvir
da sociedade podia ser supervisionado. A educação ficou, então, responsável por esses
pequenos seres de desrazão, incompletos e imperfeitos, que, porém, se bem orientados
e educados, poderiam se tornar futuros homens emancipados, dotados de razão e
capazes de exercer a cidadania com total autonomia. A criança começou a ser vista
como alguém que tinha um enorme potencial que precisava ser revelado — na verdade,
modelado — e que precisava, portanto, de orientação. A busca incansável pela prontidão
e pelo amadurecimento foram as marcas desse tempo.

Concepções pedagógicas para a infância

Algumas concepções de aprendizagem se destacaram, pois, apesar de partirem de


concepções inatistas ou empiristas, demonstravam um olhar mais atento à infância
e à sua capacidade de ser ativa no processo de aprendizagem. Assim, propunham
alternativas à passividade das pedagogias de transmissão.

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No entanto, você sabe no que consistem essas duas concepções? Veja a
diferença!

Concepções inatistas Concepções empiristas

Concepções que acreditam que a Concepções que acreditam que a


criança carrega em si todo o conheci- criança é um “papel em branco” sobre
mento e que este precisa apenas ser o qual o educador vai “escrever” os
despertado. conhecimentos.

Confira agora como a Educação Infantil foi abordada por dois importantes pensadores:
Jacques Rousseau e João Comênio.

Em termos pedagógicos, a atividade da criança começou a ser o centro dos interesses


com Jacques Rousseau (1712-1778), um filósofo suíço que viveu em Paris e conviveu
com os enciclopedistas da época, apesar de ter uma visão menos racionalista do que
a deles. Estava inserido no contexto iluminista e, assim como os filósofos do período,
considerava o ensino um meio para o combate à obscuridade religiosa causada pelo
teocentrismo medieval, ainda muito presente no século XVIII.

Em sua teoria, contrariava as pedagogias da época, que acreditavam que o centro do


processo educativo era o professor. Ao propor que o aluno estivesse no centro do processo,
defendia a educação voltada para a espontaneidade original, livre de hábitos impostos
pelas convenções sociais, a fim de que o indivíduo fosse dono de si mesmo e pudesse
agir de acordo com seus próprios interesses, que, por natureza, são originalmente bons,
sendo corrompidos pela sociedade que devasta sua liberdade. Recusava o intelectualismo
e o exercício do poder, defendendo que o aprendizado da criança se desse por meio de
experiências voltadas para a vida, e suas ações, movidas pela curiosidade, de forma a
provocar o pensar.

A partir de Rousseau, várias teorias sobre a infância se desenvolveram, construindo


o conceito de infância que temos atualmente — a criança tornou-se um objeto de
investigação.

Além de Rousseau, outro autor muito visitado pelos teóricos dos séculos XIX e XX foi
João Amós Comênio (1592-1670), educador e bispo protestante checo do século XVII.

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Ele apresentava a mãe como a primeira educadora e frisava em seu plano para a escola
maternal a importância do uso de materiais audiovisuais, como imagens em livros, para
o trabalho educacional com crianças.

Muito antes de Piaget, foi Comênio quem percebeu a relação entre as sensações e a
inteligência, abordada na época como razão. O desenvolvimento desta ocorreria a partir
da exploração dos sentidos e da imaginação no ato de brincar, na manipulação do mundo
à sua volta. Para tanto, seria fundamental um trabalho bem planejado, com o uso de
recursos materiais adequados, assim como uso eficaz do tempo e do espaço escolar.
Para esse autor, ensinar seria uma arte que dependeria da criatividade do professor na
escolha dos recursos apropriados para propiciar a seu aluno experiências sensoriais
diversificadas, sugerindo, inclusive, passeios — atividade bastante frisada por Freinet já no
século XX — que levassem o aluno a desenvolver as aprendizagens abstratas. As ideias
de Comênio foram resgatadas no século XIX, inclusive a imagem de “jardim de infância”,
nome dado à instituição criada por Fröbel para atender à primeira infância. Apesar de a
criação do jardim de infância ser creditada a Fröbel, foi em Comênio que ele buscou a
metáfora que compara a criança com “arvorezinhas plantadas”.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 1 e veja o conteúdo complementar indicado


pelo professor sobre a inclusão da brincadeira e da diversão no currículo
escolar da Educação Infantil.

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Metodologias clássicas da Educação Infantil

Para iniciar esta aula, vamos refletir juntos?

Se todas as referências metodológicas


para a Educação Infantil são pautadas em
uma atuação participativa da criança, en-
tão por que muitas atuações em creches e
pré-escolas ainda se guiam pela pedagogia
transmissiva, esquecendo-se da especifici-
dade da infância?

Os autores considerados clássicos da Educação Infantil foram inovadores com relação


à proposta educativa da época. Alguns fizeram parte do movimento Escola Nova,
que lutava por uma educação mais participativa e propunha metodologias ativas.
Outros, questionando as ideias deste movimento — como Freinet, que considerava os
escolanovistas muito intelectualizados — possuíam uma proposta diferenciada.

Saiba mais

Você sabe o que foi o movimento Escola Nova?

De acordo com Aranha (2006), foi um movimento que buscou superar a pe-
dagogia transmissiva pautada no acúmulo de conhecimentos, tendo como
características: educação integral (intelectual, moral e física); educação ativa;
educação prática, com obrigatoriedade de trabalhos manuais; exercício de au-
tonomia; vida no campo; internato; coeducação; ensino individualizado.

Os processos do conhecimento são mais valorizados do que o produto educa-


tivo. Essa proposta exige metodologias mais ativas, criam-se espaços diferen-
ciados como laboratórios, oficinas, hortas e imprensa, e são valorizados jogos,
exercícios físicos, práticas de desenvolvimento da motricidade e da percepção.

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O psicológico também entra no foco, e procuram-se formas de despertar o
interesse infantil pelas atividades oferecidas pela escola.

Friedrich Fröbel (1782-1852), de origem alemã, influenciado por


Comênio, Rousseau e Pestalozzi, foi o responsável pela criação dos
jardins de infância.

Destacou-se por pensar a fundo o desenvolvimento infantil e suas


relações com a aprendizagem, além de ser o primeiro a falar sobre
Fonte: wikipedia.org. a formação dos educadores da infância e sua profissionalização.

Elaborou sua metodologia baseando-se nas relações que a criança estabelece com
a família, a comunidade e a natureza, e valorizou a brincadeira, considerando-a, para
além da diversão, como o primeiro recurso para compreender o mundo concreto. As
artes tinham um papel importante em sua proposta, tanto a pintura como a música.
Ele antecipou algumas propostas da Escola Nova, como o conceito de autoatividade
(capacidade de realizar ações de forma espontânea a partir do estímulo dos próprios
materiais disponibilizados).

Observe as imagens a seguir:

Fonte: kidsfirst.co.nz. Fonte: froebelgifts.com.

As imagens apresentam classes froebilianas aplicando dois diferenciais da proposta:


passeios ao ar livre e uso de jogos. Na primeira imagem, temos o segundo jardim
de infância a ser estabelecido em Christchurch, que abriu suas portas em 1912, o
Phillipstown Kindergarten.

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Metodologia de trabalho:

• Conversações (rodinhas).
• Hora dos contos.
• Estudo dos seres vivos.
• Passeios ao ar livre.
• Contato com a natureza (jardins e hortas).
• Valorização da brincadeira.
• Diversos tipos de jogos (construção, movimentação física e sensorial, atenção,
memória, linguagem, movimentos corporais, expressão rítmica e dramática, trabalhos
manuais e desenho).

As ideias de John Dewey (1859-1952), que se iniciaram nos EUA, não são específicas
para a Educação Infantil, mas sua abordagem nos permite construir uma metodologia
baseada na experimentação, pois considera que o pensar reflexivo seja a melhor forma de
aprendizagem. Para esse autor, a criança se assemelha ao cientista em suas investigações:

Curiosidade

Imaginação

Investigação
experimental

Fonte: amenteemaravilhosa.com.br.

Dewey questionou as instituições educacionais, que muitas vezes rompiam as


experiências vividas pela criança, moldando-a a uma educação apenas intelectual,
quando esta também deveria abranger a formação de atitudes. Questionou a ideia de
preparação e não considerava que a escola, em nenhuma de suas etapas, preparava a
criança para a vida futura, tratando a educação como um processo de vida:

Trata-se de uma compreensão da criança como ser imaturo


e incompleto, cuja estreiteza de mundo deve ser superada
mediante a apresentação ordenada de matérias de estudos e
lições. Nessa perspectiva, as práticas educativas assentam-se

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em programas previamente estabelecidos, que definem um
verdadeiro abismo entre as experiências trazidas pelas crianças
de suas práticas sociais e os conteúdos mais elaborados,
selecionados, classificados, ordenados e divididos, segundo
uma lógica diferente daquela que se opera no processo infantil.
(OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO; PINAZZA, 2007, p. 74)

Saiba mais

“Aprender fazendo” é a máxima da Es-


cola Nova, termo cunhado por Dewey,
que considera que a criança precisa
“colocar a mão na massa” para produ-
zir conhecimento, ou seja, para apren-
der é fundamental que a criança seja
ativa no processo.

Pensar reflexivamente

Na proposta metodológica de Dewey, o ambiente educativo precisa estimular o processo


investigativo. Toda produção de conhecimento é baseada na resolução de problemas
e no levantamento de hipóteses e sugestões por meio de inferências e interpretações,
sendo o caminho mais seguro para garantir a individualidade na elaboração de ideias
próprias sobre o problema.

LIBERDADE INDIVIDUALIDADE

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Para refletir

A única liberdade de importância durável é a liberdade da inteligência, [...] a


liberdade de observação e de juízo exercida com respeito a propósitos que
têm um valor intrínseco. (DEWEY, 1967, p. 73 apud OLIVEIRA-FORMOSINHO;
KISHIMOTO; PINAZZA, 2007, p. 75)

Observe o esquema a seguir que resume como o aluno deve ser estimulado de acordo
com a proposta metodológica de Dewey.

Projetar

Elaborar
julgamentos

Ser livre Selecionar

Ordenar

Buscar
soluções

Tal proposta permite pensar a construção de Projetos na Educação Infantil a partir do


pensar reflexivo e do aprender fazendo.

Maria Montessori (1870-1952), italiana, desenvolveu


um método para a educação de crianças pequenas.
É uma autora que trabalhou com as especificidades
dessa etapa de ensino, e, assim como Fröbel, sua
preocupação era possibilitar às crianças pequenas
o acesso ao conhecimento a partir de suas próprias
ferramentas para lidar com o mundo.

Fonte: ikmr.com.br.

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Desde sua formação médica, no trabalho com crianças com deficiência mental,
iniciou suas investigações pedagógicas munida de estudos nas áreas antropológica e
matemática. “Montessori desenvolve um método que pressupõe um ambiente favorecedor
da expressão do potencial da criança” (OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO; PINAZZA,
2007, p. 126).

Vamos conhecer as principais ideias desse método?

Ambiente pensado Disciplina ativa


Educação sensorial
para as crianças (sem coerção)

A criança atua em seu


processo de aprendi-
zagem. A autonomia
Móveis adaptados ao Materiais de estimu- é uma das principais
tamanho das crian- lação sensorial para metas da metodolo-
ças e disponibiliza- concentrar a atenção gia montessoriana. A
ção de objetos a seu e que provocam a au- criança tem liberdade
alcance. toeducação. de escolher a ativida-
de que deseja realizar
— princípio da livre-
-escolha.

As imagens a seguir mostram crianças em classes montessorianas, atuando de acordo


com a proposta da autora.

Fonte: lesvoyellescolorees.com. Fonte: paroquiaanunciacion.com.

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Fonte: f7city.pl.

A proposta de Maria Montessori procura garantir a independência da criança com relação


ao adulto. Veja como a própria autora explicou suas ideias:

O desenvolvimento da personalidade (ou seja, o que se chama


liberdade da criança) não pode ser outra coisa além de indepen-
dência progressiva do adulto, realizada por intermédio de um
ambiente adequado, em que a criança encontre os meios ne-
cessários ao desenvolvimento das suas funções (1936, p. 260).
Uma ação pedagógica sobre as crianças pequenas, para ser efi-
caz, deverá ser, em primeiro lugar, dirigida para este fim: ajudá-
-las a avançar na via da independência. Ajudá-las a aprender a
andar sem ajuda, a correr, a subir e a descer as escadas, a apa-
nhar objetos tombados, a vestir-se e a despir-se, a lavar-se, a
falar para exprimir claramente as suas próprias necessidades,
a fazer ensaios para chegar a satisfazer os seus desejos, eis a
educação da independência (1932, t.1, p. 35). (OLIVEIRA-FOR-
MOSINHO; KISHIMOTO; PINAZZA, 2007, p. 129)

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 1 e veja o conteúdo complementar indicado


pelo professor sobre o método montessoriano.

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Celestin Freinet (1896-1966), francês, propôs uma
pedagogia crítica voltada para a criança do proletariado.
Defendeu o estímulo à criatividade e à descoberta, mas
não se identificava com os autores da Escola Nova, pois
os considerava muito intelectualizados, precisando de
materiais e espaços específicos. Como pensava uma
escola para o povo, trabalhou com toda a falta de recurso
característica da atuação com esse público.
Fonte: escolacurumim.com.br.

Observe o esquema a seguir:

CANTOS OU OFICINAS

EXPERIMENTAÇÃO LEITURA

MÚSICA CRIAÇÃO

EXPRESSÃO E COMUNICAÇÃO
GRÁFICA E/OU ARTÍSTICA

Fonte: labroma.org

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O esquema mostra que a proposta pedagógica de Freinet tinha o foco no trabalho: as
crianças deveriam estar sempre produzindo. E a construção da imprensa foi um de seus
diferenciais.

Freinet propôs o trabalho com “Complexos de Interesses”, ampliando o conceito de


“Centros de Interesses” de Decroly, em que os temas de trabalho em sala eram definidos
a partir dos interesses das crianças. A organização dos temas apresentados pelos alunos
era feita de acordo com sua importância social, provocando reflexões sobre o real, em
uma atuação integrada entre trabalho, ensino, interesses e valores.

Princípios da metodologia de trabalho de Freinet:

• Educação nas instituições como um prolongamento da vida, portanto deve estar


associada a ela em todas as suas dimensões.
• Professores animadores e apoiadores das crianças.
• Programação que respeite as crianças, seus ritmos, sua autenticidade.
• Atividades de aprendizagem e atividades de vida comum devem possibilitar o bem-
estar físico e a expressão espontânea das crianças.

Momentos coletivos:

• Momento de planejamento: construção em conjunto das atividades do dia.


• Momento de conversa: partilha pessoal das crianças, na qual o professor exercita
intencionalmente a “pedagogia da escuta”.
• Momento de atividades coletivas diversas: exploração da comunicação e expressão.
• Momento da comunicação de trabalhos realizados nas oficinas: socialização das
produções.
• Momento da avaliação: reflexão conjunta sobre as atividades mais significativas
do dia.

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Técnicas do método Freinet:

• Texto impresso.
• Correspondência escolar.
• Texto livre.
• Livre-expressão.
• Aula-passeio.
• O livro da vida.

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O construtivismo e a pedagogia de projetos
nas propostas de atuação com a infância

Mesmo nas propostas de pedagogias participativas, os principais autores até agora


citados trabalhavam com o conceito de potencialidade, considerando que o sujeito
desenvolve, por meio de métodos ativos, a descoberta de suas potencialidades em um
viés inatista enquanto concepção de aprendizagem.

Saiba mais

Inatismo pode ser entendido como a concepção para a qual a carga genética
determina as capacidades de aprendizagem do sujeito e a função do educador é
propiciar um ambiente adequado, com estímulos, para que esse potencial aflore.

Fonte: darwin.com.br.

Na busca pela escola com significado encontramos várias propostas metodológicas,


como vimos anteriormente, todas elas buscando trabalhar com base em interesses
dos alunos. Em meio a todos os estudos a respeito do processo ensino-aprendizagem,
aparece o construtivismo.

Construtivismo

Você sabia que o construtivismo não é um método?

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O construtivismo é uma teoria do desenvolvimento cognitivo criada por Jean Piaget
(1896-1980). O autor estudou os processos de formação do conhecimento no homem
por meio da epistemologia genética. Algumas de suas reflexões, por exemplo, giravam
em torno dos seguintes questionamentos:

Como o adulto chega ao pensamento Como é gerado o conhecimento


hipotético dedutivo? lógico, mental?

A teoria piagetiana criticava duas vertentes teóricas: racionalista e empirista.

Racionalistas Empiristas

Conhecimento contido
Conhecimento inato.
no mundo externo.

Conhecimento pertence ao sujeito,


Conhecimento preexiste à
mesmo sem travar qualquer
própria existência do sujeito.
relação com o externo.

Maturação desencadeia
Sujeito como receptor passivo.
o desenvolvimento.

Sujeito totalmente moldado


de fora para dentro.

A teoria piagetiana nos permite uma compreensão diferenciada


da forma como o sujeito aprende, possibilitando a construção
de metodologias que permitam o desenrolar do desenvolvimen-
to cognitivo. Ao criticar essas duas vertentes teóricas, Piaget abre
uma terceira possibilidade de interpretação do processo de apren-
dizagem, na qual o sujeito não só absorve o conteúdo que lhe é
transmitido, nem somente aflora a potencialidade que carrega
geneticamente — a aprendizagem e o desenvolvimento cognitivo
Fonte: wikipedia.org

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do sujeito acontecem a partir da interação entre ele e o objeto do conhecimento. Piaget
estabeleceu fases para esse desenvolvimento, conforme mostra o quadro a seguir.

Desenvolvimento Cognitivo

• Período sensório-motor (0 a 2 anos).


• Período pré-operatório (2 a 6 anos).
• Período das operações concretas (7 a 11 anos).
• Período das operações abstratas ou formais
• (adolescência em diante).

Os estágios que nos interessam na Educação Infantil são os dois primeiros:

• No estágio sensório-motor (0 a 2 anos), a criança explora o mundo utilizando o


próprio corpo como principal instrumento de relação.

• No estágio pré-operatório (2 a 6 anos), suas conquistas baseiam-se na construção


da simbolização e da linguagem.

Para refletir

O conhecimento pela via das sensações e do movimento é algo a ser superado,


tendo em vista a competência mental, que se coloca como o ponto de chegada
final do desenvolvimento, o pensamento abstrato, formal, hipotético e dedutivo.
Conhecer é construir relações lógico-matemáticas no contato com os objetos.
(GUIMARÃES, 2008, p. 21)

Cada novo contato com o


Piaget saiu de uma perspectiva
objeto do conhecimento
linear de desenvolvimento,
mobiliza estruturas já existentes
considerando que este
para a construção de um
acontece em forma de espiral.
aprendizado novo.

27
Para Piaget, o desenvolvimento vai se desenrolando, e a aprendizagem acontece à
medida que o sujeito se desenvolve:

DESENVOLVIMENTO APRENDIZAGEM

Lev Vygotsky (1896-1934) também possuía uma visão


construtivista do processo de desenvolvimento cognitivo do
sujeito, considerando que ele acontece de forma interacionista,
na relação do sujeito com o meio. Inaugurou uma linha de
pensamento que considerava o sujeito historicamente e dentro
de seu contexto social.

Fonte: novaescola.org.

[...] dedicou-se a identificar o “nascimento cultural” da criança, a partir do


substrato biológico (essencialmente corporal) que a constitui. Esse autor
propõe uma abordagem dialética para a relação entre biológico e cultural,
corpo e mente, compreendendo que as construções socioculturais
transformam o suporte biológico que, paralelamente, abre-se para novas
elaborações simbólicas.(GUIMARÃES, 2008, p. 22)

Vygotsky estabeleceu dois conceitos bem específicos em sua teoria: Zona de


Desenvolvimento Proximal e Mediação. Seu diferencial está na consideração que faz
da inserção cultural do sujeito como peça-chave para o processo de desenvolvimento
e aprendizagem.

28
Saiba mais

Zona de Desenvolvimento Proximal

Zona entre o Desenvolvimento Real (o que o sujeito sabe fazer sozinho) e o


Desenvolvimento Potencial (o que o sujeito consegue fazer com ajuda).

DR ZDP DP

MEDIAÇÃO

Vygotsky considerou que todo conhecimento é internalizado pelo sujeito


a partir dessa relação de interação. Será na ZDP que o outro (um colega da
mesma idade, mais velho ou um adulto, como o professor, por exemplo) irá
realizar a mediação para ajudar o sujeito a transformar seu Desenvolvimento
Potencial em Desenvolvimento Real.

O autor considerou que a aprendizagem é resultado da mediação e que puxa o


desenvolvimento:

APRENDIZAGEM DESENVOLVIMENTO

Pedagogia de projetos

Assim como o construtivismo não é uma metodologia, a pedagogia de projetos também


não pode ser considerada uma metodologia, mas sim uma proposta que implica uma
concepção que acolha as necessidades infantis e esteja disposta a sair de um caminho
prefixado com os resultados previstos. Para trabalhar com projetos, é necessário estar
disposto a fazer reajustes na proposta constantemente.

29
Loris Malaguzzi (1920-1994) construiu uma proposta
pedagógica que conjugava o trabalho com projetos de trabalho
e a concepção construtivista histórico-social. Considerava que
a criança possuía cem linguagens e que estas precisariam ser
exploradas no espaço da Educação Infantil.

Malaguzzi expressou por um poema o que pensava a


respeito da linguagem da criança — aliás defendia que eram
“cem”. Veja como é claro em sua intenção de comunicar as
Fonte: fixquotes.com linguagens da criança:

A criança Dizem-lhe:
é feita de cem. de pensar sem as mãos
A criança tem cem mãos de fazer sem a cabeça
cem pensamentos de escutar e de não falar
cem modos de pensar de compreender sem alegrias
de jogar e de falar. de amar e maravilhar-se
Cem, sempre cem só na Páscoa e no Natal.
modos de escutar Dizem-lhe:
as maravilhas de amar. de descobrir o mundo que já existe
Cem alegrias e de cem roubaram-lhe noventa e nove.
para cantar e compreender. Dizem-lhe:
Cem mundos que o jogo e o trabalho
para descobrir. a realidade e a fantasia
Cem mundos a ciência e a imaginação
para inventar. o céu e a terra
Cem mundos a razão e o sonho
para sonhar. são coisas
A criança tem que não estão juntas.
cem linguagens Dizem-lhe enfim:
(e depois cem, cem, cem) que as cem não existem
mas roubaram-lhe noventa e nove.
A escola e a cultura A criança diz:
lhe separam a cabeça do corpo. ao contrário, as cem existem.

(Fonte: EDWARDS, C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. As cem linguagens da criança: a abordagem de Reggio
Emilia na educação da primeira infância. Tradução de Dayse Batista. Vol. 1. São Paulo: Penso, 2016.)

30
A proposta de Malaguzzi continua sendo aplicada na cidade italiana de Reggio Emilia:

Há séculos que as crianças esperam ter credibilidade. Credibilidade nos


seus talentos, nas suas sensibilidades, nas suas inteligências criativas,
no desejo de entender o mundo. É necessário que se entenda que isso
que elas querem é demonstrar aquilo que sabem fazer. Elas têm cem
linguagens a serem aprendidas e também a serem mostradas. A paixão
pelo conhecimento é intrínseca a elas. Em Reggio Emilia, acreditamos
nas crianças. Se acreditamos nelas, devemos mudar muitas coisas.
(MALAGUZZI, 1992 apud OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO;
PINAZZA, 2007, p. 278)

Uma pedagogia construída a partir dos direitos dos pais, dos educadores e das crianças,
em conjunto, em uma construção coletiva, não se trata de um modelo; seguindo seus
princípios, cada cidade, cada instituição vai construir sua própria proposta. A pedagogia
malaguzziana é complexa, demanda várias interpretações, transgride a hegemonia
pedagógica e psicológica, e dialoga com elas transcendendo-as:

Não é o caso de desprezarmos o ensino, mas declararmos: coloque-


se de lado por um momento e deixe espaço para aprender, observe
cuidadosamente o que as crianças fazem e então, se você entendeu
bem, talvez ensine de um modo diferente de antes. Piaget alertou-
nos de que deve ser tomada uma decisão sobre ensinar esquemas e
estruturas diretamente ou apresentar à criança situações ricas de
soluções de problemas, nas quais a criança aprende ativamente a partir
delas, no curso da exploração. O objetivo da educação é aumentar as
possibilidades para que a criança invente e descubra. As palavras não
devem ser usadas como atalho para o conhecimento. Como Piaget,
concordamos que o objetivo do ensino é oferecer condições para a
aprendizagem. (MALAGUZZI, 1999, p. 93 apud OLIVEIRA-FORMOSINHO;
KISHIMOTO; PINAZZA, 2007, p. 285)

31
MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 1 e veja o conteúdo complementar indicado


pelo professor sobre a prática pedagógica de acordo com as concepções de
Loris Malaguzzi.

NA PRÁTICA

Miriam é professora de uma turma de berçário, com crianças de 10 meses, e


tem muito receio de colocá-las juntas na hora do “soninho”, pois considera que
tumultua um momento que precisa ser tranquilo, já que, com sua experiência,
percebe que as crianças acabam se machucando. Considera o berço um
excelente aliado nesse momento, justamente porque ele isola cada criança.
Ficou irritadíssima porque sua coordenadora surgiu com uma ideia inovadora:
as crianças passariam a dormir em um espaço acolchoado, cada uma em seu
colchãozinho, porém sem divisórias, e colocadas próximas umas das outras.
Tal proposta vai ao encontro da afirmação de Daniela Guimarães:

Portanto, se considerarmos uma criança ativa, exploradora


e criadora de sentidos, é preciso pensar um espaço e um
educador que deem apoio aos seus movimentos, que
incentivem sua autoria e autonomia, que contribuam para
a diversificação de suas possibilidades. Compreender a
educação como mobilizadora da capacidade da criança de
produzir sentido sobre o mundo e não repetir padrões já
existentes implica um desenho de espaço e um determinado
papel de educador. (GUIMARÃES, 2006, p. 69)

32
Analisando essa situação, podemos entender que a proposta da coordenadora
é adequada. Os ambientes e os materiais devem ter flexibilidade suficiente para
serem modificados pelos professores e pelos alunos em atividades variadas.
Rotinas imobilizadoras, repetitivas em ambientes pouco flexíveis não geram
desafios que possam estimular o desenvolvimento integral e as aprendizagens.

33
Resumo da Unidade 1

Nesta unidade, você estudou as possibilidades metodológicas para a Educação


Infantil. Dessa maneira, na Aula 1, você conheceu a diferenciação entre as pedagogias
de transmissão e as participativas. Viu, também, que as propostas de trabalho com
a Educação Infantil já se iniciam, desde Fröbel, dentro da ideia de participação da
criança em seu processo de aprendizagem. Na Aula 2, você conheceu alguns autores
clássicos que oferecem propostas utilizadas no trabalho com a infância. Estudou que
Fröbel, Montessori e Freinet têm propostas metodológicas específicas para as crianças
pequenas, já Dewey pensa a educação de forma mais geral, porém suas ideias podem
ser bem exploradas no espaço de aprendizagem infantil. Na Aula 3, você compreendeu
as ideias do construtivismo e da pedagogia de projetos, considerando as peculiaridades
de suas propostas e a importância que têm para a construção de propostas inovadoras
para a Educação Infantil, sem confundi-las com metodologias.

CONCEITO

Nesta unidade, destacaram-se os conceitos de metodologias participativas da


Educação Infantil.

34
Referências

ARANHA, M. L. A. História da educação e da pedagogia: geral e Brasil. 3. ed., rev. e ampl.


São Paulo: Moderna, 2006.

BARBOSA, M. C. S. Por amor e por força: rotinas na educação infantil. Porto Alegre:
Artmed, 2006.

CARTAXO, S. R. M. Pressupostos da Educação Infantil. Curitiba: Ibpex, 2011.

GUIMARÃES, D. Educação de corpo inteiro. SALTO PARA O FUTURO. O corpo na escola.


Ano XVIII boletim 04, abril de 2008. TV Escola. Disponível em: <https://cdnbi.tvescola.
org.br/contents/document/publicationsSeries/181924Corponaescola.pdf>. Acesso em:
29 out. 2018.

. Educação Infantil: espaços e experiências. SALTO PARA O FUTURO. O cotidiano


na educação infantil. Boletim 23, novembro 2006. TV Escola. Disponível em: <https://
cdnbi.tvescola.org.br/contents/document/publicationsSeries/175810Cotidiano.pdf>.
Acesso em: 29 out. 2018.

EDWARDS, C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. As cem linguagens da criança: a abordagem de


Reggio Emilia na educação da primeira infância. Tradução de Dayse Batista. Vol. 1. São
Paulo: Penso, 2016.

PEREIRA, R. M. R.; SOUZA, S. J. Infância, conhecimento e contemporaneidade. In:


KRAMER, S.; LEITE, M. I. F. P. (Orgs.). Infância e produção cultural. 3. ed. Campinas:
Papirus, 2003.

OLIVEIRA-FORMOSINHO, J.; KISHIMOTO, T.; PINAZZA, M. (Orgs.). Pedagogia(s) da


infância. Dialogando com o passado: construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007.

35
UNIDADE 2

Eixos estruturantes do trabalho


com a infância - Interações,
brincadeiras e o currículo da
Educação Infantil
INTRODUÇÃO

Esta segunda unidade apresenta os eixos estruturantes: interações e brincadeiras, para


se pensar a construção do currículo na Educação Infantil. O foco não está nos conteú-
dos, mas nas experiências que serão propostas para as crianças. O processo de apren-
dizagem da infância passa pela forma como a criança experimenta o mundo à sua volta
por meio de interações e brincadeiras.

OBJETIVO

Nesta unidade você irá:

• Planejar atividades que contemplem os eixos estruturantes para a Educação


Infantil.

37
Os eixos estruturantes do trabalho com a
infância

A concepção de infância que temos hoje, na sociedade ocidental contemporânea, reconhece


que a criança tem uma especificidade, o mundo infantil está cada vez mais distanciado
do mundo adulto. Ao mesmo tempo, permanecem os marcos do Projeto Moderno que
apressam a criança para correr o mais rápido que puder e alcançar o seu futuro.

É preciso tornar-se um sujeito da razão. Prontidão. Amadurecimento.


Pressa. Rotina catalogada: escola inglês judô informática natação ufa!
Crianças vivendo na rua. Trabalho infantil. Erotização. Prostituição.
Objeto de consumo. Apressamento da infância. Empurrada/seduzida
cada vez mais para o futuro — o mundo adulto —, contempla o passado
e acumula ruínas a seus pés: brinquedo, fantasia, peraltice, imaginação,
burburinho. (PEREIRA; JOBIM; SOUZA, 2003, p. 32)

Nesse paradoxo é que nossas crianças estão crescendo, em um ambiente de antecipação


que muito se assemelha à forma como a criança era vista no século XVII, como adultos
em miniatura, de acordo com Ariès (1981).

Observe as duas imagens abaixo e reflita: será que a realidade do XVII é


muito diferente da que vemos hoje?

Figura 1: Las Meninas (1656), obra de Diego Vélasquez.

Disponível em: observador.pt.

38
Na contramão dessa “correria”, os estudos sobre a infância apontam para a importância
de a criança brincar e explorar o meio no qual está inserida. Ser criança! Em toda a sua
plenitude, convivendo com os demais e descobrindo o mundo físico e social nas relações
que estabelece a partir da brincadeira.

Figura 2: Brincadeiras de criança, s/d, óleo sobre tela, 120 x 190 cm, obra de Ricardo Ferrari
(Brasil, MG, 1951).

Disponível em: peregrinacultural.wordpress.com.

Muito já foi conquistado em termos de políticas públicas para a infância e muito ainda
precisa ser feito para colocar em prática o que dizem as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil, que definem a criança como:

Sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas


cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca,
imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona
e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura.
(DCNEI, 2010, p. 12)

39
Saiba mais

A integração da educação da infância ao sistema educacional brasileiro é um


processo recente. As crianças pequenas demandam um cuidado com seus
aspectos físicos de forma diferenciada das crianças do Ensino Fundamental.
Do profissional responsável por essa criança são exigidas outras competências
que estão para além do trabalho mental, tão característico da escola. Portanto,
trazer o cuidado como parte integrante do trabalho educacional na Educação
Infantil é o maior desafio desse nível de ensino.

Dessa forma, de acordo com as DCNEI (2010), definimos que as Práticas Pedagógicas
na Educação Infantil têm como eixos norteadores:

• Brincadeiras;
• Interações.

Vamos compreender melhor esses dois eixos?

Brincadeiras Interações

• Será a partir da brincadeira que a


criança construirá conhecimentones-
sa etapa de ensino. • A interação é o que permite a rela-
ção entre o mundo interno da criança
• A brincadeira permite experimentar e e o mundo externo; por meio dela, a
descobrir o mundo, em uma lingua- criança descobre as outras crianças,
gem infantil própria, que faz todo sen- os professores, os objetos, o espaço,
tido para ela. o conhecimento.
• O foco da atuação do professor será • Oferecer diferentes possibilidades de
proporcionar experiências lúdicas interação é a principal função do pro-
que abram caminho para a aprendi- fessor de Educação Infantil.
zagem e o desenvolvimento integral
da criança.

40
Para finalizar, é importante que você saiba “que a criança não aprende a brincar natural-
mente. Ela está inserida em um contexto social e cultural e seus comportamentos estão
impregnados por essa imersão inevitável [...]. A brincadeira é um processo de relações
interindividuais, portanto, de cultura” (BROUGÈRE, 2010, p. 104).

MIDIATECA

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pelo professor sobre Educação Infantil no Brasil.

41
Brincadeira: a principal linguagem da criança

Para a brincadeira acontecer, basta espaço e


tempo. A criança é capaz de transformar qual-
quer objeto em brinquedo e, muitas vezes, o
próprio corpo se torna o principal instrumento
da brincadeira. Ao brincar, a criança coloca em
jogo tudo o que vivencia na vida real e elabo-
ra, por meio da simbolização e da imaginação,
suas construções internas.

Para a teoria histórico-cultural, a brincadeira libera a criança das leis sociais ao mesmo
tempo que permite compreendê-las e internalizá-las. É na liberdade de ação caracte-
rística da brincadeira que a criança experimenta, inclusive, conflitos e sensações não
tão agradáveis.

Exemplo

Manoela, de quatro anos, está vivenciando muitas discussões em sua casa.


Seus pais andam brigando muito, ela tem receio de que um deles saia de casa,
pois já ouviu o pai dizendo que vai embora. Na escola, Manoela só quer brincar
de casinha, em todas as suas brincadeiras tem um casal discutindo. Suas
amigas, cansaram de estar sempre “brigando” e por isso propuseram casais
diferentes, já que veem outras relações em suas casas.

Na hora da brincadeira nem tudo é dito de forma tão clara como estamos
expondo aqui para análise, pois as crianças simplesmente brincam e nem
sempre têm consciência de que trazem para a brincadeira tudo o que vivenciam
na vida real.

Até os três anos, a predominância das brincadeiras tem a ver com as sensações e os
movimentos.

42
Porém, em uma criança com mais de três anos, emergem tendências
específicas e contraditórias, de um modo diferente; por um lado, surge
uma série de necessidades e de desejos não realizáveis, mas que, ao
mesmo tempo, não se extinguem como desejos; por outro, conserva-se,
quase por completo, a tendência para a realização imediata dos desejos.
É disso que surge a brincadeira, que deve ser sempre entendida como
uma realização imaginária e ilusória de desejos irrealizáveis, diante da
pergunta por que a criança brinca? A imaginação é o novo que está
ausente na consciência da criança na primeira infância, absolutamente
ausente nos animais, e representa uma forma especificamente humana
de atividade da consciência; e, como todas as funções da consciência,
forma-se originalmente na ação (VIGOTSKI, 2008, p. 25 apud PRESTES,
2016, p. 31).

O jogo simbólico é o terreno fértil da brincadeira,


a partir dele, os objetos irão se transformar. Por
isso, a oferta de materiais não estruturados é tão
importante quanto a presença de brinquedos
estruturados nas escolas.

Nesse sentido, quais podem ser os materiais pedagógicos da Educação


Infantil? Veja a seguir alguns exemplos!

Brinquedos.

Tecidos.

Caixas.

Papéis.

Sucata.

Massinha.

43
A maneira como a criança irá brincar indica a forma como está se apropriando do conteúdo
social e cultural contido naquele objeto. O brinquedo, portanto, se faz na brincadeira.

MIDIATECA

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pelo professor sobre brincadeira na Educação Infantil.

E agora, vamos conhecer a diferença entre brinquedo e brincadeira?

Brinquedo Brincadeira

Diz algo a respeito da cultura, é um


Encontro da criança com o objeto, com
objeto produzido por adultos para as
o ambiente ou com o outro. Situação de
crianças. Quando a criança entra em
interação na qual interpreta de modo
contato com ele, experimenta a função
único o mundo à sua volta, dando sig-
social do brinquedo, ao mesmo tempo
nificado aos brinquedos ou aos mate-
em que cria outras possibilidades de
riais que encontra e que transforma em
uso ou transforma o brinquedo des-
brinquedo.
montando suas peças.

A brincadeira que mais faz sentido para a criança é aquela escolhida por ela própria.
Entretanto, nas escolas, quando o espaço do brincar é oferecido, costuma ser para a

44
criança “relaxar” das atividades escolares ou em uma brincadeira dirigida pela professora.
As duas formas não estão erradas, porém demonstram uma não inclusão da brincadeira
como eixo condutor do trabalho pedagógico com as crianças.

[...] Para que haja brincadeira, é necessária uma decisão dos que brincam:
‘decisão de entrar na brincadeira, mas também de construí-la segundo
modalidades particulares’. Sem a livre escolha, não existe brincadeira,
‘mas uma sucessão de comportamentos que têm origem fora daquele
que brinca’ (ibidem, p. 100). A brincadeira aparece como um sistema
de sucessão de decisões que se exprime por meio de um conjunto de
regras. (PORTO, 2003, p. 181)

Importante

O brincar não é perda de tempo no espaço escolar. A criança não deixa de


aprender conteúdo quando está brincando; ao contrário, é na brincadeira e por
meio dela que a criança entra em contato com os conteúdos escolares, explo-
rando-os e internalizando-os. A função do professor é oferecer oportunidades
de brincadeiras variadas que permitam o contato da criança com o objeto do
conhecimento, sem nunca perder de vista a perspectiva da escolha.

45
A construção do currículo para a Educação
Infantil

A Educação Infantil enquanto primeira etapa da educação básica é recente no Brasil. Em


termos de legislação, foi com a LDB nº 9.394/1996 que se estabeleceu a entrada dessa
etapa na educação básica. Entretanto, historicamente, a educação da primeira infância
no Brasil vem da responsabilidade da saúde, quando sua perspectiva era o cuidado, e
passa para a educação. Essa relação tão próxima entre saúde e educação é uma das
principais características da Educação Infantil.

Por isso, o currículo na Educação Infantil tem especificidades muito peculiares que não
permitem simplesmente trabalhar os conteúdos, o cognitivo, a mente, como ainda vemos
acontecer no Ensino Fundamental. As próprias características desse nível de ensino
obrigam a escola a se repensar como tal, reconstruindo a sua função social.

Vamos ler agora o que as Diretrizes


Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil (DCNEI, 2010) consideram como
currículo?

Conjunto de práticas que buscam articular as


experiências e os saberes das crianças com os
conhecimentos que fazem parte do patrimônio
cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico,
de modo a promover o desenvolvimento integral de
crianças de 0 a 5 anos de idade. (DCNEI, 2010, p. 12)

Fonte: portalmec.gov.br

As Práticas Pedagógicas na Educação Infantil devem ser conduzidas pelas interações


e brincadeiras; portanto, sua proposta curricular está baseada na oferta de experiências
com os conteúdos selecionados que:

46
Promovam o conhecimento de si e do mundo por meio da ampliação
de experiências sensoriais, expressivas, corporais que possibilitem
movimentação ampla, expressão da individualidade e respeito pelos
ritmos e desejos da criança;
Favoreçam a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o
progressivo domínio por elas de vários gêneros e formas de expressão:
gestual, verbal, plástica, dramática e musical;
Possibilitem às crianças experiências de narrativas, de apreciação
e interação com a linguagem oral e escrita, e convívio com diferentes
suportes e gêneros textuais orais e escritos;
Recriem, em contextos significativos para as crianças, relações
quantitativas, medidas, formas e orientações espaço temporais;
A Ampliem a confiança e a participação das crianças nas atividades
individuais e coletivas;
Possibilitem situações de aprendizagem mediadas para a elaboração
da autonomia das crianças nas ações de cuidado pessoal, auto-
organização, saúde e bem-estar;
Possibilitem vivências éticas e estéticas com outras crianças e grupos
culturais, que alarguem seus padrões de referência e de identidades no
diálogo e conhecimento da diversidade;
Incentivem a curiosidade, a exploração, o encantamento, o
questionamento, a indagação e o conhecimento das crianças em relação
ao mundo físico e social, ao tempo e à natureza;
Promovam o relacionamento e a interação das crianças com
diversificadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas,
cinema, fotografia, dança, teatro, poesia e literatura;
Promovam a interação, o cuidado, a preservação e o conhecimento
da biodiversidade e da sustentabilidade da vida na Terra, assim como
o não desperdício dos recursos naturais; Propiciem a interação e o
conhecimento pelas crianças das manifestações e tradições culturais
brasileiras;
Possibilitem a utilização de gravadores, projetores, computadores,
máquinas fotográficas, e outros recursos tecnológicos e midiáticos.
(BRASIL/DCNEI, 2010, p. 25)

As Diretrizes Nacionais Curriculares para a Educação Infantil (2010) são bem claras quanto
ao tipo de atividade que deve ser proposta na Educação Infantil. A experimentação das
diferentes linguagens expressivas, fugindo do padrão da educação bancária, como dizia

47
Paulo Freire, característico do ensino fundamental, é a principal característica — sempre
fazendo uso da brincadeira e explorando a relação com os colegas.

Procurando apresentar uma proposta coerente com as DCNEI (2010), a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC, 2017) foi construída de forma a proporcionar para as crianças
a experimentação dos conteúdos a partir de cinco campos de experiências, que ainda
dialogam entre si.

Vamos conhecer melhor esses campos de experiência?

1) O eu, o outros e o nós

A identificação do sujeito como ser individual e social surge na medida em que as inte-
rações com os outros acontece. É na relação com o outro que a criança se descobre
única e ao mesmo tempo percebe-se parte de um grupo. Nessas relações, a diversi-
dade é percebida sem teoria, em situações cotidianas, nas quais cada um precisa lidar
com as diferenças.

Ao mesmo tempo que participam de relações sociais e de cuidados


pessoais, as crianças constroem sua autonomia e senso de autocuidado,
de reciprocidade e de interdependência com o meio. (BNCC, 2017, p. 36)

2) Corpo, gestos e movimentos

O corpo é o principal instrumento do ser humano para a comunicação com o mundo,


é a primeira forma de exploração da criança para a descoberta de si mesma, do outro,
do espaço e dos objetos. Atrelando cuidado e educação, os educadores da infância
devem procurar levar as crianças a se posicionarem diante do mundo com autonomia
e liberdade.

Por meio das diferentes linguagens, como a música, a dança, o teatro,


as brincadeiras de faz de conta, elas se comunicam e se expressam no
entrelaçamento entre corpo, emoção e linguagem. As crianças conhecem
e reconhecem com o corpo suas sensações, funções corporais e, nos seus
gestos e movimentos, identificam suas potencialidades e seus limites,
desenvolvendo, ao mesmo tempo, a consciência sobre o que é seguro e o
que pode ser um risco à sua integridade física. (BNCC, 2017, p. 36)

48
3) Traços, sons, cores e formas

Experimentar várias possibilidades de registro gráfico possibilita à criança se apropriar


do que tem vivenciado, internalizando conceitos e conhecimentos sobre a realidade à
sua volta. Explorar vários instrumentos de registro (pincéis diversos, mãos e dedos,
escova de dente, cotonete, canetinha, lápis de cor, giz de cera de diversos tamanhos...)
em diferentes aportes (papéis variados, planos diferenciados) permite desenvolver o
senso estético e crítico.

Portanto, a Educação Infantil precisa promover a participação das crianças


em tempos e espaços para a produção, manifestação e apreciação
artística, de modo a favorecer o desenvolvimento da sensibilidade, da
criatividade e da expressão pessoal das crianças, permitindo que elas se
apropriem e reconfigurem, permanentemente, a cultura e potencializem
suas singularidades, ao ampliar repertórios e interpretar suas experiências
e vivências artísticas. (BNCC, 2017, p. 37)

4) Escuta, fala, pensamento e imaginação

A oralidade é fundamental para a organização de pensamento. Na Educação Infantil o


enriquecimento da linguagem oral está em plena atividade, sendo muito importante o
estímulo adequado para a ampliação de vocabulário. Dentre as ações que o educador
precisa realizar, a contação de histórias é das mais importantes, tendo em vista que é
um momento extremamente rico de aprendizagens para a criança: a escuta atenta, as
palavras novas, a construção de questionamentos, a sequência lógica. A reflexão sobre a
escrita vai acontecendo a partir do momento em que a criança entra em contato com os
textos e tenta reproduzi-los nos registros gráficos, inicialmente com garatujas, aos poucos
começando a produzir a escrita espontânea com símbolos que vão se aproximando da
escrita convencional.

Desde cedo, a criança manifesta desejo de se apropriar da leitura e da


escrita: ao ouvir e acompanhar a leitura de textos, ao observar os muitos
textos que circulam no contexto familiar, comunitário e escolar, ela vai
construindo sua concepção de língua escrita, reconhecendo diferentes
usos sociais da escrita, gêneros, suportes e portadores. Sobretudo a
presença da literatura infantil na Educação Infantil introduz a criança na
escrita: além do desenvolvimento do gosto pela leitura, do estímulo à

49
imaginação e da ampliação do conhecimento de mundo, a leitura de
histórias, contos, fábulas, poemas e cordéis, entre outros, realizada pelo
professor, o mediador entre os textos e as crianças, propicia a familiaridade
com livros, com diferentes gêneros literários, a diferenciação entre
ilustrações e escrita, a aprendizagem da direção da escrita e as formas
corretas de manipulação de livros. (BNCC, 2017, p. 37)

5) Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações

A curiosidade sobre o mundo e as relações que existem entre seus aspectos é um impulso
próprio da criança. Compreender os fenômenos naturais, as relações entre espaço e
tempo, as relações socioculturais, assim como os conhecimentos matemáticos presentes
no mundo como a relação número/quantidade; comparações; as formas geométricas;
ordenações — são descobertas incríveis.

Portanto, a Educação Infantil precisa promover interações e brincadeiras


nas quais as crianças possam fazer observações, manipular objetos,
investigar e explorar seu entorno, levantar hipóteses e consultar fontes de
informação para buscar respostas às suas curiosidades e indagações.
Assim, a instituição escolar está criando oportunidades para que as
crianças ampliem seus conhecimentos do mundo físico e sociocultural e
possam utilizá-los em seu cotidiano. (BNCC, 2017, p. 38)

Dessa forma, você pode perceber que construir o currículo para a Educação Infantil está
muito distante de apenas listar conteúdos e pensar em temas geradores. É necessária uma
integração entre os conceitos de mundo fundamentais para a infância, experimentados
nas diversas possibilidades de experiências.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 2 e veja o conteúdo complementar indicado


pelo professor sobre brincadeira as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (DCNEI).

50
NA PRÁTICA

Hora da comida! Duas monitoras vêm


ajudar as quatro permanentes da sala
nesta tarefa (são 20 bebês). O almoço
vem servido em pequenas bacias, as
crianças não enxergam os alimentos,
que estão lá no fundo. Algumas mon-
itoras, enquanto dão o almoço, con-
versam com as crianças em voz baixa,
outras não. O almoço é uma situação
de malabarismo das educadoras,
pois elas dão comida a três crianças
ao mesmo tempo (Diário de Campo)
(BARBOSA, 2006, p. 168).

A situação descrita acima por Maria Carmem Barbosa é bem comum nas
creches. A preocupação costuma ser com a alimentação em si, a criança pre-
cisa comer bem, é isso que os pais querem. Muitas vezes esquecemo-nos de
que a refeição na escola, além de ter um viés de cuidado, essencial no trato
com crianças pequenas, tem um caráter educativo que precisa ser levado em
conta, visando o desenvolvimento integral das crianças.

Nesse sentido, é correto afirmar que a intencionalidade educativa na situação


de alimentação está muito além do controle de comportamentos. Essas situ-
ações de cuidado possibilitam-nos observar com mais atenção particulari-
dades de cada criança, podendo dar uma atenção especial às suas necessi-
dades específicas. Por mais que saibamos que é complicado uma educadora
alimentar três crianças ao mesmo tempo e dar atenção específica a todas,
precisamos ter em mente que a ação educativa deve ser a prioridade. Portan-
to, conversar com as crianças interagindo com elas é fundamental, nem que
a cada dia escolha-se uma criança para estabelecer essa relação. Assim, em
sistema de rodízio, de alguma forma todas terão essa experiência.

51
Resumo da Unidade 2

A unidade 2 tratou da construção do currículo para a Educação Infantil. Nesse sentido,


você conheceu os eixos estruturantes deste nível de ensino: interações e brincadeiras.
Em seguida, estudou mais especificamente a brincadeira e a importância dela na apren-
dizagem infantil. Por último, você analisou a proposta curricular para a Educação Infantil
a partir dos cinco eixos, atrelando o educar e o cuidar na exploração de campos de expe-
riências integrados.

CONCEITO

Os conceitos trabalhados nesta unidade são currículo, interação e brincadeira


na Educação Infantil. A concepção de currículo vai influenciar a forma de con-
struí-lo, por isso é fundamental conceituar e conhecer as propostas atuais para
este nível de ensino. Interação e brincadeira são conceitos clássicos, mas nem
sempre bem compreendidos. Na nova proposta de currículo para a Educação
Infantil, eles funcionam como eixos estruturantes, tal a sua importância para o
processo de aprendizagem infantil.

52
Referências

ARIÈS, P. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1981.

BARBOSA, M. C. S. Por amor e por força: rotinas na educação infantil. Porto Alegre:
Artmed, 2006.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes Curriculares


Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI). Secretaria de Educação Básica. Brasília:
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BRITO, K. R. S. Um estudo reflexivo sobre o currículo na educação infantil. Educação Por


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CORSINO, Patrícia (Org.). O cotidiano na Educação Infantil. Salto para o Futuro. Boletim
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br/index.php/tint/article/view/9807/6068 Acesso em: 4 nov. 2018.

53
UNIDADE 3

Desenvolvimento e
aprendizagem infantil
INTRODUÇÃO

Nesta unidade, você estudará o desenvolvimento infantil em uma perspectiva integrada,


considerando que todos os aspectos do desenvolvimento da criança atuam conjuntamente,
em uma relação de interdependência. Os padrões de desenvolvimento infantil são
parâmetros que possibilitam ao professor acompanhar a evolução de seus alunos sem
usar esse recurso como “amarras”. O foco é o sujeito e como se relaciona com o mundo à
sua volta, as conquistas que vai realizando no decorrer de seu crescimento.

OBJETIVO

Nesta unidade, você será capaz de:

• Aplicar em situações problema de sala de aula o conhecimento sobre as


características do desenvolvimento infantil e suas relações com o processo
de aprendizagem.

55
Desenvolvimento infantil

O desenvolvimento infantil tem várias facetas, e inúmeros autores trataram do tema


e elaboraram teorias do desenvolvimento e da aprendizagem. Neste tópico, não
explicaremos detalhadamente cada teoria. Nosso objetivo é apenas selecionar o que o
educador da primeira infância precisa conhecer.

Henri Wallon (1879-1962) é um autor que precisamos destacar para pensarmos sobre o
assunto tendo em vista que ele olha para o desenvolvimento infantil de forma integrada,
considerando os diferentes aspectos do progresso da criança que dialogam entre si.

Wallon afirma que a criança é organicamente social, portanto precisa do outro para
aprender e se desenvolver. Isolar a criança, considerando-a fora de sua realidade social,
não é suficiente para conhecer seu desenvolvimento.

É fundamental que os critérios de padronização como idade, níveis maturacionais e a


forma como se relaciona com os adultos e os objetos do conhecimento estejam balizados
pelo contexto no qual a criança esteja inserida. Cada criança é única; nenhum modelo
consegue abarcar todas as crianças. Dessa forma, a padronização serve apenas como
uma referência, porém o desenvolvimento é uma construção pessoal que, muitas vezes,
foge aos padrões estabelecidos.

Para Wallon, os três aspectos — cognição, afetividade e motricidade — se inter-relacionam


constantemente no decorrer de todo o desenvolvimento do sujeito.

MOTRICIDADE

COGNIÇÃO AFETIVIDADE

56
De acordo com a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Nova LDB Lei nº 9.394/1996),
o desenvolvimento integral é a finalidade da Educação Infantil:

Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como
finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em
seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando
a ação da família e da comunidade. (Redação dada pela Lei nº 12.796,
de 2013)

Assim, o trabalho com a educação da infância está para além do desenvolvimento


intelectual: todos os aspectos do desenvolvimento precisam ser vistos de forma integrada,
e a criança é entendida e estimulada como um todo, no qual cada parte tem o mesmo
nível de importância.

Para Wallon, a afetividade é um importante aspecto que precisa ser levado em conta ao
olharmos a criança. Ele defende a afetividade sob um ponto de vista mais amplo do que o
carinho. Para esse autor, precisamos estar atentos à forma como eu afeto o outro e sou
afetado por ele. Por isso, valoriza a ação do sujeito, já que é por meio da ação que ele irá
lidar com o mundo à sua volta.

A Educação Infantil é uma etapa da Educação Básica na qual as crianças estão em


pleno desenvolvimento, sofrem muitas mudanças — físicas e emocionais — em pouco
tempo, e seu processo de aprendizagem é intenso.

Vamos ver algumas características deste desenvolvimento?

57
0 a 3 meses

Desde a gestação, o bebê se relaciona com o


mundo externo por meio da audição, respon-
dendo, desde muito cedo, ao estímulo sonoro.
Ao nascer, o bebê passa a ser tocado e olha-
do, e seu sistema visual vai sendo ampliado de
forma gradativa. Por isso, os estímulos visuais
são extremamente importantes — roupas e ob-
jetos coloridos atraem sua atenção. Seus movi-
mentos ainda são regidos por muitos reflexos,
sobre os quais ele não tem controle.

Ele ainda tem a sensação de ser um só com a mãe, sentindo-se mal quando está distante
dela. Aos poucos, vai descobrindo que existem outras pessoas, começa a fazer contato
visual, e as músicas o excitam ou acalmam. Todas a situações de muita mudança geram
estresse, assim a rotina é um recurso importante para a organização interna do bebê.

4 a 7 meses

Essa é a fase na qual o bebê vai conquistando a


posição sentada, mudando sua visão do mun-
do. É capaz de estender as mãos para alcançar
o que deseja e passa a levar todos os objetos
à boca como forma de explorar e conhecer o
mundo que o cerca. Faz eco de sua própria
fala, repetindo os sons que produz, foca os ob-
jetos, é capaz de sacudi-los, chacoalhando-os,
e gosta do efeito de atirá-los ao chão.

58
8 a 10 meses

As conquistas continuam, e ele começa a sair


do lugar para explorar o mundo, engatinhando
e se arrastando. Fica de pé com apoio e desco-
bre o espelho, conquistando o reconhecimen-
to de sua própria imagem no reflexo. Intensi-
fica as vocalizações monossilábicas: “ma-má”,
“da-dá”, “ne-nê”, e começa a construir a noção
de permanência do objeto, dando-se conta de
que continuam a existir mesmo quando não os
está vendo.

1 a 2 anos

A próxima conquista é extremamente liberta-


dora, pois a criança começa a dar os primei-
ros passos, incialmente com apoio do adulto,
e logo se lançando em caminhadas para pegar
o que deseja. Coopera com o vestir e começa
a comer sozinha. A partir dos dois anos, a fala
é o mais marcante. Nesta idade, está com um
vocabulário de mais ou menos 50 palavras,
conseguindo formar frases simples, com até
três palavras.

Sua relação com o mundo ainda está baseada no contato com a boca, e as mordidas
podem surgir tanto como experimentação do outro enquanto objeto como reação rela-
cionada a defesa ou conquista do que deseja. A mordida é uma forma de comunicação.

59
3 a 4 anos
Aos três anos, a criança realiza atividades com
maior destreza, que vão sendo refinadas tanto
na movimentação ampla como nas atividades
manuais. Gosta de atividades plásticas, pois
exigem essa habilidade, tendo a oportunidade
de exercitá-la. Está construindo sua relação
com os outros, e as disputas ainda existem,
mas começa a aprender a lidar com elas por
meio da linguagem verbal, logo as mordidas
tendem a diminuir.

5 anos
Sua relação com o grupo já está diferenciada,
e é capaz de brincar e resolver seus conflitos
sozinha, solicitando o auxílio do adulto quando
necessário. Expressa-se verbalmente e apreen-
de os conteúdos escolares com facilidade.
Aprecia ouvir histórias e recontá-las, e sua ca-
pacidade de atenção fica cada vez maior.

Conhecer os padrões de desenvolvimento permite ao professor estar atento às conquis-


tas de cada criança, percebendo quando ela está muito à frente ou muito aquém do
desenvolvimento esperado, podendo intervir de forma eficiente e eficaz. Algumas crian-
ças fogem aos padrões preestabelecidos, e isso não é ruim, apenas apresentam um
desenvolvimento diferenciado, de modo que o professor precisa justamente conhecer os
padrões para reconhecer quando uma criança sai deles.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 3 e veja o conteúdo complementar indicado pelo


professor sobre a importância da “infância livre” para o desenvolvimento infantil.

60
Desenvolvimento e aprendizagem na Educa-
ção Infantil

Neste tópico, você se aprofundará em algumas questões que já foram sinalizadas


na disciplina. A relação entre desenvolvimento e aprendizagem é fundamental para a
construção de um trabalho eficaz na Educação Infantil. O ser humano se desenvolve e
aprende durante toda a sua vida, entretanto será no período de 0 a 5 anos que realizará
uma série de conquistas que definirão a forma como ele se relacionará com o mundo à
sua volta.

Ao falar das metodologias da Educação Infantil, não é possível pensar a prática


metodológica sem conhecer as propostas teóricas que as embasam. Da mesma forma,
a concepção de desenvolvimento e aprendizagem que o professor possui conduzirá toda
a sua atuação prática com as crianças, seja conscientemente ou não. Muitas vezes, o
professor é um mero reprodutor de atitudes que observou em seu processo de formação
e nem sempre identifica em suas posturas as concepções de desenvolvimento e
aprendizagem que adota.

Exemplo

Ao posicionar-se diante da
criança com recompensas pe-
las boas ações e punições pe-
las más ações está trazendo
uma concepção de educação
behaviorista — uma das cor-
rentes do empirismo sobre a
qual falaremos mais à frente
—, que considera o condicionamento como o principal fator que impulsiona a
aprendizagem.

O reforço positivo de uma conquista não é ruim — ao contrário, deve ser incenti-
vado. O que é questionado é o uso do reforço como condição para aprender, ou
seja, a criança fica condicionada a só fazer determinada tarefa porque receberá
uma recompensa..

61
Para pensar a aprendizagem, temos três correntes:
1. Inatismo.
2. Empirismo.
3. Interacionismo.

Vejamos, a seguir, o conceito de cada uma delas e o que alguns estudiosos


afirmam sobre essas correntes!

Inatismo (ou Racionalismo)

Concepção de aprendizagem que considera que todo o conhecimento está dentro


da criança, é inato, bastando à escola fazer desabrochar tal conhecimento. Com
os estímulos adequados, toda criança pode despertar suas potencialidades.

No racionalismo (ou inatismo) é às variáveis biológicas e à situação


imediata que se deve recorrer para explicar a conduta do sujeito. Essa
corrente lida com o conceito de estruturas mentais, enquanto totalidades
organizadas, numa extrema oposição ao atomismo behaviorista.
(GIUSTA, 1985 apud NEVES; DAMIANI, 2006, p. 4)

Empirismo

Concepção de aprendizagem que trata a criança como uma “tábula rasa”, um


“pen drive vazio”, no qual serão depositados todos os conhecimentos. Tudo o que
o indivíduo conhece vem das experiências que tem com o mundo.

O conceito de aprendizagem emergiu das investigações empiristas


em Psicologia, ou seja, de investigações levadas a termo com base no
pressuposto de que todo conhecimento provém da experiência. Isso
significa afirmar o primado absoluto do objeto e considerar o sujeito como
uma tábula rasa, uma cera mole, cujas impressões do mundo, formadas
pelos órgãos dos sentidos, são associadas umas às outras, dando lugar
ao conhecimento. O conhecimento é, portanto, uma cadeia de ideias
atomisticamente formada a partir do registro dos fatos e se reduz a uma
simples cópia do real. (NEVES; DAMIANI, 2006, p. 2)

62
Interacionismo

Concepção de aprendizagem que considera que o conhecimento do indivíduo


provém das interações que tem com o meio. O que o indivíduo traz de
potencialidade interna interage com as informações do meio, construindo novos
conhecimentos.

A perspectiva epistemológica do interacionismo, representada pelo


pensamento de Piaget, é uma síntese do empirismo e do racionalismo.
O autor põe em xeque as ideias de que o conhecimento nasce com
o indivíduo ou é dado pelo meio social. Afirma que o sujeito constrói o
conhecimento na interação com o meio físico e social, e essa construção
vai depender tanto das condições do indivíduo como das condições do
meio. (DARSIE, 1999 apud NEVES; DAMIANI, 2006, p. 5)

Piaget e Vygotsky

Piaget Vigotsky

Fonte: wikipedia.org. Fonte: teoria da aprendizagem.

Com suas teorias, Piaget e Vygotsky marcam o campo da educação por frisarem
a interação entre o sujeito e o meio como vital para o processo de aprendizagem e
desenvolvimento. Entretanto, apesar de parecerem complementares, suas teorias
se distinguem principalmente na forma como cada um concebe a relação entre
desenvolvimento e aprendizagem, concepção que afetará todas as conclusões posteriores
a que cada um chegará.

Vamos conhecer um pouco da teoria de Piaget e Vygotsky?

63
Questão que é oposta
Para Piaget, ao se para Vygotsky, que
desenvolver, a criança considera que a
aprende. aprendizagem impulsiona
o desenvolvimento.

A partir desses dois autores, ratifica-se de uma vez por todas que a função do professor
está além da função de transmissor de conteúdos. Entretanto, muitos educadores e
espaços escolares ainda tratam o aluno a partir das concepções inatistas e empiristas.

Com Piaget, aprendemos a provocar o aluno, a problematizar todas as situações de


aprendizagem e a respeitar o tempo de cada um ao lidar com o conhecimento. Oferecer
os estímulos de acordo com o momento de aprendizagem da criança é um exercício
constante que passamos a fazer. Piaget aproxima-se dos estruturalistas quando quebra
a ideia de desenvolvimento linear e propõe que o desenvolvimento ocorre em forma de
espiral, pois cada novo conhecimento que se apresenta precisa ser ligado a estruturas
anteriormente construídas para ter significado.

Com Vygotsky, a intencionalidade nas ações humanas é o principal diferencial do humano


em relação aos animais.

Importante

Consciência, vontade e intencionalidade

Para Vygotsky, o ser humano é dotado de certas capacidades que possibilitam


comportamentos intencionais de tomada de decisão perante informações
novas, enquanto que os animais fazem, no máximo, associações simples
entre eventos.

É possível ensinar um animal a acender a luz num quarto escuro.


Mas o animal não seria capaz de, voluntariamente, deixar de
realizar o gesto aprendido porque vê uma pessoa dormindo no
quarto. (OLIVEIRA, 2010, p. 28)

64
A função do professor, então, é única a mediar a relação do sujeito com o objeto de
conhecimento. O professor deixa de ser aquele que irá controlar o que o aluno aprendeu
para observar como cada um aprende e intervir no momento adequado para propiciar
seu desenvolvimento.

Vygotsky [...] dedicou-se a identificar o “nascimento cultural” da criança


a partir do substrato biológico (essencialmente corporal) que a constitui.
Esse autor propõe uma abordagem dialética para a relação entre
biológico e cultural, corpo e mente, compreendendo que as construções
socioculturais transformam o suporte biológico que, paralelamente,
abre-se para novas elaborações simbólicas. (GUIMARÃES, 2008, p. 22)

Por mais que sejam muitos os alunos na turma, o professor precisa


sempre ter um olhar detalhado sobre a forma como cada um constrói o
seu conhecimento.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 3 e veja o conteúdo complementar indicado pelo


professor sobre o desenvolvimento humano.

65
Educação Infantil - O sujeito em foco

Neste tópico, refletiremos sobre a proposta atual para a Educação infantil, presente nos
documentos oficiais brasileiros, que contempla o que foi discutido até o momento sobre
desenvolvimento e aprendizagem.

Dentro da perspectiva proposta pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2017):

Na Educação Infantil, as aprendizagens essenciais compreendem tanto


comportamentos, habilidades e conhecimentos quanto vivências que
promovem aprendizagem e desenvolvimento nos diversos campos de
experiências, sempre tomando as interações e brincadeiras como eixos
estruturantes. Essas aprendizagens, portanto, constituem-se como
objetivos de aprendizagem e desenvolvimento. (BNCC, 2017, p. 39.
Grifo nosso.)

A proposta da BNCC prevê o trabalho na Educação Infantil por “campos de experiências”,


ou seja, o foco deixa de ser o conteúdo e passa a ser as competências que devem ser
construídas pela criança em seu processo de desenvolvimento e aprendizagem. Será
nas experiências e nas vivências oferecidas pela escola que a criança poderá exercitar
seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento.

PARTICIPAR
CONVIVER EXPRESSAR-SE
ATIVAMENTE

BRINCAR EXPLORAR CONHECER-SE

A escola é responsável, desde a creche, por sistematizar as oportunidades de


aprendizagem que serão oferecidas à criança no exercício desses direitos. O trabalho
com a criança pequena muito se aproxima das vivências que ela tem no seio familiar,
por isso o cuidar é um dos eixos do trabalho educativo, e a forma como o educador lida
com os cuidados cotidianos é o diferencial. A intencionalidade educativa será o motor
para a atuação do professor:

66
Uma intenção educacional preside as práticas de orientação da criança
para o alimentar-se, vestir-se, higienizar-se, brincar, desenhar, pintar,
recortar, conviver com livros e escutar histórias, realizar experiências,
resolver conflitos e trabalhar com outros. A construção de novos
conhecimentos implica, por parte do educador, selecionar, organizar,
refletir, planejar, mediar e monitorar o conjunto das práticas e interações.
(BNCC, 2017, p. 35)

A articulação entre as atividades de cuidado e educação na intenção de educar em qualquer


situação que apareça é uma práxis reflexiva, na qual o educador observa atentamente as
conquistas infantis e suas dificuldades, individualmente e em grupo, acompanhando por
meio de diversos registros e buscando aperfeiçoar e corrigir quando necessário.

Os objetivos de desenvolvimento e aprendizagem, na BNCC (2017), são divididos em


três grupos etários na Educação Infantil. Para cada grupo, são definidos objetivos dentro
dos cinco campos de experiências, sempre buscando a construção da socialização, da
autonomia e da comunicação.

Vamos conhecer esses grupos e seus respectivos objetivos dentro dos


campos de experiências?

67
“O eu, o outro e o nós”

0 a 1 ano 1 ano e 7 meses a 3 anos 4 anos a 5 anos


e 6 meses e 11 meses e 11 meses

A criança nesta faixa


etária vai demonstrando
empatia com relação às
maneiras de pensar e agir
Neste campo de expe-
dos outros, por seus sen-
riência, a criança irá des- A partir de 1 ano e 7 me-
timentos e necessidades.
cobrir-se a partir das in- ses, a criança começa a
Age com autonomia reco-
terações que realiza com demonstrar cuidado con-
nhecendo suas limitações
as outras crianças e com sigo e com os outros, e a
e conquistas, torna-se
os educadores. Ela per- compartilhar objetos, re-
mais participativa e cola-
cebe os efeitos de suas solvendo disputas com a
borativa nas atividades, a
ações, as limitações de ajuda do adulto. Ela busca
cada dia comunica suas
seu corpo e as sensações a comunicação de forma
ideias e seus sentimentos
nas situações de cuidado, mais intensa, constrói a
com mais desenvoltura
como higiene e alimenta- confiança em suas capa-
e valoriza as atitudes de
ção. Comunica suas ne- cidades e respeita regras
higiene, alimentação e
cessidades, seus desejos nas interações e brinca-
cuidado consigo mesma.
e suas emoções, além de deiras. Na identificação
As regras de convívio são
construir as relações de das diferenças, aprende a
compreendidas como
confiança em si mesma e valorizar a diversidade.
uma necessidade, e ela
nos outros.
se opõe a qualquer tipo
de discriminação, lidando
com os conflitos baseada
no respeito mútuo.

68
“Corpo, gestos e movimentos”

0 a 1 ano 1 ano e 7 meses a 3 anos 4 anos a 5 anos


e 6 meses e 11 meses e 11 meses

Adequação do próprio
Neste campo de expe-
A apropriação cultural de movimento ao ambiente
riência, o movimento e a
gestos e movimentos no em que está em situa-
expressão de necessida-
cuidado de si é uma con- ções de cuidado e de
des, emoções e desejos,
quista desta faixa etária. brincadeiras e atividades,
ampliando as possibi-
O deslocamento espacial como escuta de histórias
lidades de atuação no
será ampliado com a ex- e propostas. Ela passa a
espaço, serão o foco do
ploração de movimentos explorar os movimentos
trabalho. Nesse contexto,
como pular, saltar e dan- não apenas pela imitação,
a criança experimentará
çar não apenas isolada- mas criando possibilida-
as possibilidades de seu
mente, mas associando des corporais por meio de
próprio corpo em situa-
esses movimentos entre gestos, mímicas e sons
ções diferenciadas, que
si, além de posiciona- em situações artísticas di-
provoquem desafios, po-
mentos em relação a seu versas, como dança, tea-
rém sempre dentro de um
próprio corpo no espaço, tro e reconto de histórias.
ambiente de acolhimento,
como: em cima/embaixo, Essa exploração também
fundamental para essa
em frente/atrás, dentro/ se dá com relação à ex-
faixa etária. O manuseio
fora. A criança conquista pressão de sentimentos,
de objetos explorando os
a independência no cuida- sensações e emoções.
movimentos de preensão,
do com o corpo, e as ha- A valorização das ca-
encaixe e lançamento
bilidades manuais serão racterísticas específicas
também serão prioriza-
mais exploradas agora, de seu próprio corpo e a
dos. A imitação de ges-
buscando um maior con- coordenação precisa nas
tos, sons e movimentos é
trole ao rasgar, pintar, de- representações gráficas
o principal recurso utiliza-
senhar e folhear. também são conquistas
do pela criança.
dessa faixa etária.

69
“Traços, sons, cores e formas”

0 a 1 ano 1 ano e 7 meses a 3 anos 4 anos a 5 anos


e 6 meses e 11 meses e 11 meses

É a fase de integrar as
explorações de sons e
Neste campo de expe-
Além da exploração li- músicas às brincadeiras,
riência, a criança explo-
vre de sons, a criança encenações e festas. A
rará os sons de seu pró-
agora irá criá-los com expressão livre deve ser
prio corpo e dos objetos,
materiais, objetos e ins- bastante explorada em
e deixará suas marcas
trumentos musicais, produções bidimensio-
gráficas em suportes di-
acompanhando ritmos nais e tridimensionais por
versificados, utilizando
diferenciados. Ela passa meio de desenhos, pintu-
instrumentos também
a se expressar por dife- ras, colagens, dobraduras
diferenciados. A manipu-
rentes linguagens: gráfi- e esculturas, assim como
lação de materiais varia-
cas (desenho), corporais, em possibilidades expres-
dos como argila e mas-
música e teatro, imitando sivas por meio da dança.
sa de modelar também
e criando movimentos A criança passa a apreciar
fará parte da proposta.
próprios. Nas expressões manifestações artísticas
Os brinquedos cantados
gráficas, utiliza suportes e a participar delas. A mú-
devem ser bem explora-
e materiais variados, ex- sica deve ser trabalhada
dos nessa fase, pois, ao
perimentando cores, tex- de forma mais minuciosa
acompanhar melodias, a
turas, superfícies, planos, a partir do reconhecimen-
criança explora diferen-
formas e volumes. to das qualidades do som
tes fontes sonoras.
(intensidade, duração, al-
tura e timbre).

70
“Escuta, fala, pensamento e imaginação”

0 a 1 ano 1 ano e 7 meses a 3 anos 4 anos a 5 anos


e 6 meses e 11 meses e 11 meses

Passa-se a estabelecer
diálogos expressando A partir dos 4 anos, a
sentimentos, desejos e expressão escrita come-
necessidades, e brincar ça a ser mais explorada
com rimas e cantigas, (escrita espontânea),
Desde cedo, a criança
identificando e criando assim como a expres-
deve ser trabalhada em
sons e rimas. Aprofun- são oral de vivências. A
oralidade e escrita, e o
da-se o hábito de ouvir invenção de brincadeiras
hábito de ouvir histórias
histórias, acompanhando cantadas, ritmos, melo-
permite a construção de
as imagens, quando há, dias, aliterações e rimas
diversas competências.
e começando a acompa- deve ser estimulada, as-
Nesse momento, os pe-
nhar a escrita na direção sim como folhear livros
quenos reconhecerão
correta (de cima para procurando identificar
oralmente seu próprio e
baixo, da esquerda para a história pelas figuras
os nomes das pessoas
a direita). É preciso inter- e palavras conhecidas.
que convivem com eles.
pretá-las, identificando A participação em re-
Ao ouvir histórias, imita-
personagens e cenários. contação de histórias e
rão os adultos contando
O relato de situações construções de roteiros
histórias ou cantando. O
vividas ou observadas, para vídeos e apresenta-
contato com diferentes
como filmes e peças, or- ções estimula a inserção
gêneros textuais e a ex-
ganiza o pensamento. no mundo da escrita, as-
ploração de traços colo-
Manusear diferentes por- sim como a produção de
cam o bebê mais perto
tadores textuais e criar histórias escritas e orais,
da escrita.
histórias oralmente tam- experimentando diver-
bém são uma exploração sos gêneros textuais e
importante. Passa-se a construindo hipóteses
experimentar a escrita sobre a escrita.
com seus sinais gráficos.

71
“Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações”

0 a 1 ano 1 ano e 7 meses a 3 anos 4 anos a 5 anos


e 6 meses e 11 meses e 11 meses

Há a descoberta das pro-


priedades dos objetos, A observação é o primeiro
como odor, cor, sabor trabalho a ser feito com
e temperatura, assim as crianças desta faixa Além de observar as ca-
como as relações de etária: observar objetos e racterísticas dos objetos,
causa e efeito que suas fenômenos da natureza, a criança desta faixa etá-
ações têm sobre o meio identificando suas carac- ria é capaz de estabele-
ao mover objetos, mis- terísticas, semelhanças cer comparações. A par-
turar, tingir, transbordar. e diferenças, para clas- tir de agora, observará e
Nesse primeiro contato sificá-los e organizá-los registrará fenômenos e
com o mundo, a criança no espaço identificando mudanças nos materiais
percebe as semelhanças as relações espaciais e a partir de suas ações
e as diferenças entre os temporais. Estimula-se vi- sobre eles, e manipulará
objetos, além de, com o venciar o cuidado de plan- medidas e fará registros
próprio corpo, vivenciar tas e animais juntamente de diversas formas.
diferentes ritmos e velo- com os colegas, dentro e
cidades ao dançar, balan- fora da escola.
çar e escorregar.

Ao colocar o sujeito em foco, permite-se repensar a inclusão de crianças com


deficiências nas classes regulares, justamente porque o olhar diferenciado possibilita
alcançar cada criança independentemente de suas necessidades.

72
MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 3 e veja o conteúdo complementar indicado pelo


professor sobre concepções de criança e creche.

NA PRÁTICA

Uma classe de Educação Infantil do berçário (de 1 a 2 anos) está na brinquedoteca


brincando livremente quando, de repente, duas crianças iniciam uma disputa por
um carrinho. José tenta tirar o carrinho das mãos de Joana; como ela não cede,
ele, em uma ação extremamente rápida, dá uma mordida na bochecha de Joana,
que começa a chorar imediatamente. Ao verificar o rosto da menina, a professora
constata uma grande marca e fica preocupada: como contar para os pais sobre
o ocorrido? Qual será a reação deles?

Essa é uma situação extremamente comum nos berçários, pois a mordida faz
parte da rotina de turmas dentro dessa faixa etária. Apesar de sempre esperar por
episódios assim, é comum os professores ficarem melindrados para conversar
com os pais da criança que recebeu a mordida. Além da preocupação com a
reação dos pais, os educadores precisam estar atentos ao desenvolvimento da
criança e a seu processo de aprendizagem para compreender os motivos que a
levaram a morder. No caso relatado acima, ficou claro que José esgotou suas
possibilidades de comunicação e apelou para a mordida para resolver a situação.
De acordo com os objetivos de desenvolvimento e aprendizagem traçados pela
BNCC (2017), perceber o efeito de suas ações e comunicar-se com os colegas
de forma a expressar seus desejos são construções fundamentais a serem feitas
pelas crianças, e o ato da mordida faz parte desse processo de descoberta da
interação com o outro.

73
Resumo da Unidade 3

Nesta unidade, você estudou algumas perspectivas a respeito do desenvolvimento e da


aprendizagem infantil. No tópico 1, você pôde refletir um pouco sobre as características
do desenvolvimento das crianças de 0 a 5 anos de idade, conhecendo um pouco mais
as conquistas específicas de cada período. Também foi apresentada a intrínseca relação
que existe entre os vários aspectos do desenvolvimento: o cognitivo, o motor e o afeti-
vo, que não se desenvolvem isoladamente, mas em uma relação de interdependência e
parceria. No tópico 2, você conheceu os diferentes posicionamentos teóricos a respeito
do processo de aprendizagem, que influenciam na forma como o professor lida com
os alunos e nas interferências que faz para estimular suas aprendizagens. Já o tópico 3
possibilitou a você relacionar o desenvolvimento e a aprendizagem à proposta curricular
atual para a Educação Infantil.

CONCEITO

O conceito abordado nesta unidade é a relação entre desenvolvimento e


aprendizagem na infância, destacando que os padrões de desenvolvimento são
parâmetros que ajudam os professores a conhecer a forma como seus alunos se
relacionam com o processo de aprendizagem.

74
Referências

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Ministério da Educação. Secretaria


de Educação Básica. Brasília, DF: MEC, dezembro 2017. Disponível em: <file:///C:/Users/
CRISTIANE/Documents/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf>. Acesso em: 25 nov.
2018.

. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro


de 1996. Dispõe sobre as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Presidência da
República. Casa civil. Brasília, DF,1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/LEIS/L9394.htm>. Acesso em: 25 nov. 2018.

CAMARA, S. A. S. (Org.). Psicologia da aprendizagem. São Paulo: Pearson Education do


Brasil, 2015.

GUIMARÃES, D. Educação de Corpo inteiro. SALTO PARA O FUTURO. O corpo na escola.


Ano XVIII boletim 04, abril de 2008. TV Escola. Disponível em: <https://cdnbi.tvescola.
org.br/contents/document/publicationsSeries/181924Corponaescola.pdf.> Acesso em:
29 out. 2018.

NEVES, R. A.; DAMIANI, M. F. Vygotsky e as teorias da aprendizagem. UNIrevista, v. 1,


n. 2, abril 2006. Disponível em: <http://repositorio.furg.br/bitstream/handle/1/3453/
Vygotsky%20e%20as%20teorias%20da%20aprendizagem.pdf?sequence=1>. Acesso
em: 15 nov. 2018.

NOGUEIRA, M. O. G.; LEAL, D. Teorias da aprendizagem: um encontro entre os


pensamentos filosófico, pedagógico e psicológico. 3. ed. rev. ampl. e atual. Curitiba:
InterSaberes, 2018. (Série Construção Histórica da Educação)

OLIVEIRA, M. K. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento – Um processo sócio-


histórico. 5. ed. São Paulo: Scipione, 2010.

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UNIDADE 4

Alfabetização e letramento na
Educação Infantil — A relação da
criança com a sociedade letrada
INTRODUÇÃO

Nesta unidade, você irá refletir sobre o lugar da leitura e da escrita na Educação Infantil,
diferenciando a alfabetização do letramento, buscando conceituar a construção da
aprendizagem da leitura e da escrita.

OBJETIVO

Nesta unidade, você será capaz de:

• Diferenciar alfabetização de letramento definindo o lugar destes na educação.

77
Infância e sociedade letrada

Nesta primeira parte da unidade, você irá refletir sobre o lugar da infância na sociedade
ocidental contemporânea, que é letrada, fato que exige interação constante com o
material escrito. Nas grandes cidades — onde se vive cercado por placas, outdoors, mídias
impressas e digitais —, a internet faz parte da vida de uma grande parcela da população;
por meio do celular, o acesso às redes sociais é constante, independentemente da
condição socioeconômica do sujeito.

E as crianças?

Será que participam desse mundo cheio


de informações ou apenas se inserem nele
quando começam a ler e escrever?

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A tirinha da Mafalda demonstra de forma explícita como as crianças estão expostas às
informações na sociedade atual:

Disponível em: espaçoeducar.net

Apesar de ter acesso a diversos tipos de informações, as crianças lidam com elas con-
forme suas experiências. Emilia Ferreiro (2001) ratifica essa informação:

Muito antes de serem capazes de ler, no sentido convencional do termo,


as crianças tentam interpretar os diversos textos que encontram a seu
redor (livros, embalagens comerciais, cartazes de rua), títulos (anúncios
de televisão, histórias em quadrinhos, etc.)
(FERREIRO, 2001, p. 65)

De acordo com a autora, a criança integra seu meio ambiente e age nele, construindo
constantemente hipóteses sobre as informações com as quais se depara. A cada dia o
acesso a informações visuais é ampliado. Nesse contexto, principalmente crianças de
classes média e alta costumam ter o acesso digital de forma antecipada, manuseando
ainda bem pequenas tablets e celulares, sem falar no acesso a jogos on-line por Smart
TVs ou videogames.

79
Dessa forma, as crianças chegam à escola repletas de informações, cercadas de desenhos
animados que trazem uma série de conceitos que somente a escola costumava trabalhar.
Show da Luna, Doki, Sid: o cientista são bons exemplos desse tipo de desenho animado.

Cena de Show da Luna.

. Disponível em: altoastral.com.br

Importante

Na Educação Infantil, crianças de 0 a 5 anos de idade estão cheias de


questionamentos, procurando entender a gama de informações a que estão
expostas diariamente. Formulam hipóteses constantemente, não absorvendo as
informações de forma passiva.

A leitura de mundo acontece independentemente da atuação da escola.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 4 e veja o conteúdo complementar indicado


pelo professor sobre a Educação Infantil como parte do processo de alfaletrar.

80
Alfabetização e letramento: conceitos dife-
renciados

Nesta segunda parte da unidade, você irá diferenciar dois conceitos: alfabetização e
letramento e, ao mesmo tempo, identificará como eles precisam caminhar juntos no
processo de aprendizagem da língua escrita. Refletir sobre a alfabetização na Educação
Infantil permaneceu durante muito tempo como um tabu, devido à especificidade dessa
etapa e ao seu uso errôneo durante um bom tempo.

Mas o professor da Educação


Infantil vai alfabetizar?

Como você acompanhou na primeira parte desta unidade, a criança dos centros urbanos
está em contato com a escrita desde muito pequena e quando chega à escola traz con-
sigo uma série de hipóteses sobre ela.

Importante

O professor da Educação Infantil precisa conhecer muito bem o processo de


alfabetização para que possa fazer as inferências adequadas em cada etapa do
processo de aprendizagem da criança.

81
A clareza quanto à função da Educação Infantil é fundamental para uma atuação precisa
do professor. Em termos históricos, essa atual etapa da Educação Básica surgiu em
assistência às mães que precisavam trabalhar e não tinham com quem deixar seus filhos.
Devido ao caráter assistencial da Educação infantil, as crianças de 0 a 6 anos não recebiam
um atendimento pedagógico específico. Essa construção foi feita gradualmente.

Inicialmente, a criança era alfabetizada na 1ª série do ensino fundamental, hoje 2º


ano. Portanto, a alfabetização ocorria por volta dos sete anos de idade. Começou-se
a perceber que um ano era pouco para que a criança pudesse se alfabetizar. Criou-se,
então, a “Classe de Alfabetização – C.A”, uma série de apoio anterior à 1ª serie. Dessa
forma, as crianças teriam dois anos para serem alfabetizadas: no C.A e na 1ª serie.

Devido à diversidade de realidades no Brasil, a C.A não era obrigatória, fato que acabou
gerando uma enorme discrepância. Em alguns lugares, a alfabetização concentrou-se
apenas na C.A, antecipando a finalização dessa aprendizagem, que passou a iniciar aos
seis anos. Com a implementação dos nove anos no ensino fundamental, a C.A foi inserida
obrigatoriamente como 1º ano.

Paralelamente, com a implementação cada vez maior da Educação Infantil, começou-


se a considerar que as crianças deveriam ser “preparadas” para a alfabetização aos
quatro e cinco anos. A partir de então, houve uma intensificação de trabalhos motores
com as crianças, principalmente manuais. Considerava-se que o domínio manual era
fundamental para a aprendizagem da leitura e escrita. Com o aumento das pesquisas na
área essa concepção, caiu por terra, tendo em vista que outros fatores — que estão muito
além do controle motor — influenciam essa aprendizagem. Porém, a ideia de preparação
ainda permeia muitos espaços de Educação Infantil.

Entretanto, a língua escrita é uma descoberta que vai sendo construída pela criança
desde muito cedo, e cabe à escola sistematizar esse conhecimento, respeitando o
desenvolvimento infantil e seu processo de aprendizagem.

82
Letramento Aquisição

Letramento é uma prática social, não


Aquisição do código escrito, a crian-
é função apenas da escola e sim de
ça aprende a decodificar o uso das
toda a sociedade.
letras para escrever palavras, frases
e textos.
A escola coloca a criança em conta-
to com a escrita de forma a significar
Diferencia a escrita do desenho, reco-
este conteúdo, propiciando que formu-
nhecendo que a escrita é a represen-
le hipóteses cada vez mais elaboradas
tação da fala.
a respeito de seus diversos usos.

Importante

A alfabetização, aprendizagem do código escrito, é uma parte do letramento.

No processo de construção da escrita, esta se torna o objeto do conhecimento e passa


a ser o foco de investigação das crianças. A função da escola é sistematizar a prática de
leitura de mundo que acontece fora dela. Dependendo do grupo social no qual a criança
está inserida, a ação da escola precisará ser mais ou menos abrangente.

Uma criança inserida em uma família que tem o hábito de contar histórias, terá uma
relação diferenciada com a escrita em relação a uma criança que vive em uma família
que não valoriza esse tipo de ação. Vale lembrar que a contação de histórias acontece
apenas via oral. Muitos pais analfabetos conseguem significar a leitura para seus filhos
devido à valorização que dão para a língua escrita.

83
MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 4 e veja o conteúdo complementar indicado


pelo professor sobre a diferenciação entre alfabetização e letramento.

84
Práticas de letramento na Educação Infantil

Nesta terceira parte da unidade, você irá se deparar com possibilidades de ações efetivas
de letramento na Educação Infantil que vão incluir alguns trabalhos com a aquisição do
código escrito, alfabetização, sem se restringirem a eles. Tais ações acontecerão de
acordo com os limites dessa etapa de ensino, sem a preocupação de antecipação ou
preparação para as aprendizagens do ensino fundamental.

[...] exercícios sistemáticos e mecânicos que têm o objetivo


de aprimorar a coordenação motora e assegurar a aquisição
da leitura e da escrita, que são repetidos muitas vezes
PRONTIDÃO (independentemente da significação que tenham para os
alunos); que ignoram as interações infantis e a sua capacidade
de realizar autonomamente atividades que proporcionam
descobertas e desafios não programados.

A proposta de trabalho em Educação Infantil é de letramento, de certa forma “alfaletrar”,


como propõe Magda Soares (professora doutora da Universidade Federal de Minas Gerais
– UFMG, especialista em alfabetização e responsável por difundir o termo “letramento”
no Brasil) em seu projeto na cidade de Lagoa Santa, Minas Gerais). É fundamental que a
escola esteja atenta à realidade de seus alunos para, juntamente com a família, inserir as
crianças no mundo da escrita de forma significativa.

85
É preciso diminuir as expectativas em relação às famílias e procurar formas de inseri-las
no processo de aprendizagem de seus filhos, pois a parceria com a família é de extrema
importância. Dependendo da realidade, a escola precisará investir mais intensamente nas
atividades de letramento, já que precisará suprir o pouco contato com material escrito
que as crianças tenham em casa.

Independentemente da relação que a família estabelece com a escrita, a escola precisa


sistematizar o conteúdo escrito que as crianças veem no mundo, alguns com mais
intensidade e outros menos. Nesse sentido, propiciar o encontro diário com livros é uma
ação que não pode passar em branco. As crianças devem manusear livros desde muito
pequenas, pois há uma infinidade de possibilidades de livros para bebês — livros de pano,
de plástico, com sons, folhas mais duras —, que precisam ser explorados pela escola.

Importante

O manuseio de livros é fundamental. As crianças precisam estar em contato


com livros todos os dias. É assim que o livro passa a fazer parte do cotidiano
das crianças.

O encantamento com as histórias contidas nos livros é o caminho mais fecundo. As


crianças precisam se encantar com os livros e querer descobrir sobre o que falam. Nesse
ponto, entra a ação direta dos professores ao contar as histórias.

A imaginação não é um divertimento ocioso da mente, uma atividade suspensa no ar,


mas uma função vital necessária (VYGOTSKY, 2009, p. 20).

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Curiosidade

O interesse em decodificar a escrita vai surgindo conforme as crianças vão se


dando conta de que a escrita reflete a fala.

Todas as atividades que explorem a escrita são extremamente importantes e devem ser
trabalhadas com as crianças de acordo com o desenvolvimento delas:

• Construção de textos coletivos.


• Chamadinha: identificação dos nomes das crianças da turma.
• Janelinha do tempo: identificação do tempo (sol, chuva, nublado).

Saiba mais

Vygotsky aprofunda a discussão sobre o processo de criação no livro sugerido


abaixo. Acesse a biblioteca e complemente seu conhecimento.

VYGOTSKY, L. S. Imaginação e criação na infância. [Livro digital]. Col. Ensaios


comentados. São Paulo: Ática, 2009.

MIDIATECA

Acesse a midiateca da Unidade 4 e veja o conteúdo complementar indicado


pelo professor sobre a leitura e a escrita na Educação Infantil.

87
NA PRÁTICA

Disponível em: feitodesamba.wordpress.com

Na tirinha de Mafalda acima, coloca-se em evidência uma situação muito


comum da prática com o trabalho da escola a respeito da língua escrita. Nem
sempre o que é ensinado na escola respeita as construções feitas anteriormente
pela criança. Como você viu nesta unidade, a criança dos centros urbanos
está inserida no mundo da escrita desde seu nascimento, e constrói hipóteses
sobre a escrita o tempo todo. É fundamental que a escola signifique o que a
criança vê no mundo, sistematizando esse conteúdo de forma a fazer sentido.
A preocupação excessiva com a decodificação muitas vezes leva à escrita de
palavras e frases que não fazem sentido nenhum para a criança por estarem
distantes de sua realidade. Letrar significa inserir criança em um mundo real do
qual a escrita faz parte.

88
Resumo da Unidade 4

Nesta unidade, você estudou sobre o lugar da leitura e da escrita na Educação Infantil.
Na primeira parte, você verificou como a criança de centros urbanos lida com a escrita
que está disposta no mundo à volta dela. Na segunda parte, você diferenciou letramento
de alfabetização, compreendendo a integração que existe entre esses dois conceitos. Na
terceira parte, você pôde identificar possibilidades de ações educativas voltadas para o
letramento na Educação Infantil, destacando a contação de histórias como uma ação
extremamente efetiva.

CONCEITO

O conceito de letramento é a definição mais importante desta unidade. Para


compreender o processo de aprendizagem da língua escrita e as funções
da educação infantil nesse processo, faz-se necessário enveredar-se pelo
letramento como função social, identificando as relações da infância com a
sociedade letrada.

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Referências

FERREIRO, E. Alfabetização em processo. 14. ed. São Paulo: Cortez, 2001.

______. Reflexões sobre alfabetização. 24. ed. São Paulo: Cortez, 1995.

LUCAS, M. A. O. F. Os processos de alfabetização e letramento na educação infantil:


contribuições teóricas e concepções de professores. Tese (Doutorado em Pedagogia) -
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. Disponível em: <file:///C:/Users/CRISTIANE/
Downloads/MariaAngelicaFrancisco%20(2).pdf>. Acesso em: 20 nov. 2018.

SOARES, M. O problema não é o método de alfabetização, é alfabetizar sem


método. Disponível em: <http://cadernos.cenpec.org.br/cadernos/index.php/cadernos/
article/view/355/367>. Acesso em: 15 nov. 2018.

TIRIBA, L. O tato. In: CORSINO, P. (Org.). Linguagens e sentidos. Salto para o futuro,
boletim linguagens e sentidos – O corpo silenciado, agosto, 2001. Disponível em:
<http://cdnbi.tvescola.org.br/resources/ VMSResources/contents/document/
publicationsSeries/181924Corponaescola.pdf>. Acesso em: 20 jul. 2018.

VYGOTSKY, L. S. Imaginação e criação na infância. [Livro digital]. São Paulo: Ática, 2009
(Coleção Ensaios Comentados).

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