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Na obra O Leviatã, de Thomas Hobbes (1588 - 1679), onde a célebre frase “o

homem é lobo do homem”, Hobbes argumenta que em um pressuposto estado de natureza,


sem intervenção do Estado ou forças moderadoras, o ser-humano agiria como predador
para si mesmo. Homens mais fortes usariam sua força para subjugar os mais fracos,
tomando-lhes posses e, se assim desejar, praticar atos violentos com o mais fraco. Em
outras palavras, Hobbes defende que o ser humano é naturalmente violento para com os
outros, e não possui a capacidade natural de se organizar ou viver em paz. Assim, faz-se
necessário a criação do Estado, que se torna a única entidade que pode usar a força.
Abrindo mão da liberdade, o homem pode viver em paz com seus semelhantes.
Já os escritores Fiódor Dostoiévski (1821 - 1881) e Friedrich Nietzsche (1844 - 1900)
veem o ser humano como uma espécie fraca e cruel. Dostoiévski chega, em Os Irmãos
Karamázov, a falar que comparar a maldade humana com a das feras seria um insulto às
feras, visto que nenhum animal poderia ser cruel da maneira que o humano é. Em
Memórias do Subsolo, o autor argumenta que a maldade humana é a pior, pois humano
sabe o que é maldade, o que é errado e o que é cruel, mas, mesmo assim, dia após dias
vemos atos bárbaros praticados por humanos que sabem que estão agindo de tal forma. É
uma escolha racional agir desta forma, logo, é uma crueldade pior.
Já para Nietzsche, em Sobre Verdade e Mentira no sentido Extramoral e em
Genealogia da Moral, o filósofo argumenta que o ser humano tenta constantemente negar
sua condição de ínfimo ser num universo imenso, e, para tal, cria razões e motivos de agir
que são sempre visando suprir suas paixões e desejos, estes que, muitas vezes, se
direcionam para a maldade: o humano sente prazer em destruir, matar, oprimir e controlar
outros seres, outros humanos, e a si mesmos. A violência vem tanto da natureza humana,
quanto das razões, visto que estas tentam frear o comportamento violento do ser humano
com regras e instituições. Contudo, estas regras e instituições também agem sob o desejo
violento da humanidade, matando punidores da lei, grupos minoritários e pessoas que
fogem da moral estabelecida pela sociedade.
Outros filósofos posteriores, como Sigmund Freud (1856 - 1939) e Michel Foucault
(1926 - 1984), argumentam que a sociedade é, em essência, uma complexa e violenta
organização caótica, onde a repressão dos desejos humanos, como a violência e a
sexualidade, são reprimidos em nome de uma ordem. Contudo, na obra Totem e Tabu e O
Mal-Estar na Civilização, Freud argumenta que as regras apenas permitem aquilo que os
humanos têm vontade de fazer, que suas pulsões o levam e fazer. E esses desejos, de
matar, praticar incesto, atos violentos como espancamento e abuso, entre outros desejos,
são tratados como tabus e as leis são criadas para proibir esses desejos, fazendo com que
os humanos reprimam. Ninguém precisaria criar uma lei contra o assassinato se os
humanos não tivessem esse desejo, o mesmo vale para o adultério, incenso e uso de
drogas que causam dependencia. Assim, a sociedade vive num constante mal-estar, visto
que seus desejos são proibidos, e, sem conseguir reprimir para sempre, os humanos criam
regras e instituições punitivas, criando um ciclo de violência sem fim. Para Freud, o humano
não pode reprimir para sempre suas pulsões, e estas são expressadas, inconscientemente,
de outras formas, como em doenças, sintomas psicológicos, histeria, violência, atos
passionais e, nos piores dos casos, brutalidade física. Seria como tentar segurar um leão
em uma caixa de papelão.
Já para Foucault, a sociedade se organiza numa norma de poder, que sempre se
altera de época em época e de lugar em lugar, fazendo com que grupos mais fracos sejam
perseguidos, mortos, excluídos e mal-vistos pela parte dominante da sociedade. A
sociedade se submete a uma constante vigilância em nome da segurança, perdem a
liberdade, visto que todo e qualquer ato é vigiado e, sendo assim, passível de ser punido.
Em sua teoria da Microfísica do poder, Foucault demonstra que até mesmo os membros
comuns de uma sociedade, o homem comum, passa a incorporar as regras e os
comportamentos que lhes são ensinados, de forma a agir repetindo as normas e regras sem
questionar e sem ter consciência de fazer isso. Para o autor, até mesmo nas escolas a
lógica de poder é reproduzida, ensinando crianças e adolescentes, cheios de paixão e
alegria, e ficarem quietos, obedecerem às regras, reprimir seus desejos e sonhos, e até
mesmo “dedurar” colegas mais comportados, reforçando a lógica de poder da sociedade.
Esta lógica molda como todos agem, e, para Foucault, vivemos numa sociedade da
vigilância e da punição, onde todos são vistos e punidos. Não por menos, as grandes
cadeias são invenções modernas, que cresceram junto de outros meios de vigilância e com
o avanço da eletricidade e das grandes cidades, que passaram a ser mais iluminadas,
perderam seus elementos míticos, como medo de bruxas, e passou a ver mais outros
humanos, cada vez mais próximos. Assim, todos passaram a se ver e se vigiar sob a lógica
imposta, a lógica do poder imposta a tal povo desde a educação.
O ser humano só vive em paz no papel, e nunca nenhuma utopia ideal (como o
próprio capitalismo) funcionou na prática. Todo e qualquer modelo proposto falhou em se
ver na prática ou, na maioria dos casos, sequer foi posto em prática. A sociedade é movida
pelos interesses dos grupos mais poderosos, e, assim sendo, o ciclo de opressão e
violência se perpetua nas relações cotidianas, jurídicas e sociais. O humano não é bom por
natureza. O homem decide praticar e maldade, e, em nome do avanço das cidades e em
prol de uma união, passou a criar cidades doentes, que vivem em constante conflito e
violência para com grupos específicos. Nunca houve nada que pudesse provar a bondade
humana além de pequenos atos individuais. Porém, não faltam exemplos de barbaridades e
crueldades praticadas por atos individuais. Logo, a primeira premissa não pode ser dita
verdade se a segunda também for. O homem não é bom por natureza.

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