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CA PÍTULO 8

ICTERÍ CIA NEONATAL


Ilson Enk
Liana Andres
Flavia Lopes Enk

Introdução
Trata‑se de uma das manifestações mais frequentes do perío lirrubina no neonato é de 6 a 10 mg/kg, sendo 75% derivada
GR Q RQD DO R RUU QGR P U P QD GR 1 G RGD D do catabolismo dos eritrócitos e 25% do anel heme, das proteí
idades gestacionais. Designa a coloração amarelada da pele e/ nas hepáticas e da destruição de eritrócitos imaturos.
ou conjuntivas, sendo de nida como a concentração sérica de A classi cação da icterícia neonatal envolve 2 grandes gru
bilirrubina indireta (BI) > 1,5 mg/ dL ou de bilirrubina direta pos de patologias, que acolhem vários tipos de causas. Trata
(BD) > 1,5 mg/dL, desde que esta represente mais do que 10% ‑se da hiperbilirrubinemia indireta, produzida pelo aumento
do valor de bilirrubina total (BT). É visível na avaliação clínica sérico da fração livre (BI), e a direta, decorrente do acúmulo
quando o nível de BT sérica excede 5 mg/ dL. da fração conjugada, ou direta, da bilirrubina (BD).
1R RN, a maioria dos casos de icterícia decorre de um
aumento da fração indireta, ou livre, da bilirrubina (BI) e apre Hiperbilirrubinemia indireta
senta uma evolução benigna. Na prática, 85% dos RN a termo, A avaliação clínica de um RN ictérico por examinador expe
e também a maior parte dos prematuros, desenvolvem icterí riente é útil, porém apenas a estimativa clínica não é su ciente
cia clínica. Em torno de 6% de RN saudáveis a termo mostram para avaliar os RN com BI > 12 mg/dL. Nesses neonatos, reco
níveis de BT > 12,9 mg/ dL, e 3% > 15 mg/ dL. menda‑se a dosagem rotineira da bilirrubina sérica ou trans
8PD S QD SDU OD G SD Q QR Q DQ R DSU cutânea. O ideal é dosar as bilirrubinas em todos os bebês icté
senta níveis “críticos” elevados de BI, pode desenvolver a U R DPR UD G DQJ RO DGR G S UPDQ U P
encefalopatia bilirrubínica, complicação grave denominada frasco ou capilar envolto em papel alumínio para evitar o con
NHUQLFWHUXV 2 UPR NHUQLFWHUXV é reservado à forma crônica da tato com a luz e a degradação da bilirrubina.
doença, com sequelas clínicas permanentes por toxicidade da A avaliação da bilirrubina transcutânea é realizada, de
bilirrubina. Estima‑se que na década de 2000, nos países de preferência, no esterno. Os aparelhos atualmente utilizados
senvolvidos, tenha ocorrido um caso de NHUQLFWHUXV SDUD DGD apresentam coe ciente elevado de correlação (0,91 a 0,93)
40.000 a 150.000 nascidos vivos. com a BT sérica até valores de 13 a 15 mg/dL em RN a termo e
SU UPR QG S QG Q P Q GD RORUD R GD S O Entre
Fisiopatologia DQ R DORU ≥ 13 mg/dL devem ser con rmados pela men
Várias são as restrições do metabolismo da bilirrubina que ex suração sérica de BT.
plicam a chamada “icterícia siológica”: a origem da bilirrubi Na investigação de hiperbilirrubinemia indireta, alguns
na está na degradação de hemácias, siologicamente normal exames laboratoriais são essenciais (Quadro 1), outros são
nos RN. A partir desse fenômeno, instala‑se uma cascata de desdobrados conforme o curso do quadro.
eventos: a sobrecarga de bilirrubina ao hepatócito e a menor
capacidade de captação, conjugação e excreção hepática da bi Quadro 1 Investigação laboratorial da hiperbilirrubinemia
lirrubina. A sobrecarga de bilirrubina ao hepatócito decorre da indireta
produção aumentada de BI: o RN produz 2 a 3 vezes mais bilir Bilirrubina total e frações
rubina do que o adulto, por causa da maior quantidade propor Hemoglobina, hematócrito, contagem de reticulócitos
cional de hemoglobina e menor vida média das hemácias, que
Tipagem da mãe e RN, sistemas ABO e Rh (antígeno D)
é de 70 a 90 dias. Uma vez que o catabolismo de 1 g de hemo
Prova de Coombs direta (sangue de cordão ou amostra do RN)
globina fornece 34 mg de bilirrubina, a produção diária de bi
ICTERÍCIA NEONATAL • 1263

Outros exames podem ser importantes para casos de ativi Quadro 2 Causas não fisiológicas de hiperbilirrubinemia
dade hemolítica não explicada por incompatibilidade ABO ou indireta
Rh, como pesquisa de anticorpos maternos para antígenos ir Sobrecarga de bilirrubina ao hepatócito
regulares (anti‑c, anti‑e, anti‑E, anti‑Kell), se mãe multigesta, Doenças hemolíticas
R SU DP Q UDQ I QG GD R D QGD P 1 RP SUR D G Incompatibilidade Rh
Coombs direta positiva sem fator identi cado. A dosagem de Incompatibilidade ABO
glicose‑6‑fosfatodesidrogenase (G6PD) pode contribuir para
Incompatibilidade por antígenos irregulares (c, E, Kell, etc.)
explicar icterícia sem outra causa de nida, e o teste do pezi
Deficiência de G6PD
nho avalia a função da tireoide. Dosagem sérica de sódio é útil
P DOJ Q D R Esferocitose, eliptocitose

O aparecimento de icterícia nas primeiras 24 a 36 horas de Hemoglobinopatias (alfatalassemia)


vida alerta para a presença de doença hemolítica por incompa Causas adquiridas
tibilidade sanguínea Rh ou, menos frequentemente, ABO, Infecções, especialmente sepse
sendo anemia e reticulocitose indicativos da hemólise. Coleções sanguíneas extravasculares (céfalo-hematomas e
outras hemorragias)
Icterícia fisiológica Policitemia
Trata‑se de quadro comum, benigno e autolimitado. O termo NPO prolongado, baixo aporte de leite
tem sofrido restrições, mas ainda é muito utilizado. Re ete Anomalias gastrointestinais/com obstrução de trânsito
uma adaptação neonatal ao metabolismo da bilirrubina. Estu
Deficiência ou inibição da conjugação da bilirrubina
do brasileiro com RN a termo, de peso ao nascer adequado
Icterícia por leite materno
SDUD D GDG J D RQDO D G P DO DP Q R PD UQR
exclusivo e adequado, mostrou o seguinte per l dos níveis sé Hipotireoidismo congênito

ricos de BT nos primeiros 12 dias de vida: percentil 50: 5,6 mg/ Síndrome de Gilbert
dL no 3º e 4º dias de vida, 4,8 mg/dL no 6º dia; percentil 95: Síndrome de Crigler-Najjar tipos I e II
8,2 mg/dL na 24ª hora de vida, 12,2 mg/dL no 4º dia e 8,5 mg/
dL no 12º dia. A literatura classicamente atribui o valor de 13
Quadro 3 Fatores de maior risco para hiperbilirrubinemia
mg/dL como o máximo para delimitar a icterícia siológica,
indireta
porém os níveis indicativos de tratamento com fototerapia
Mãe de tipagem O, e/ou Rh negativo
têm sido mais permissivos.
Irmão prévio que necessitou de tratamento para icterícia
neonatal
Causas não fisiológicas
Mãe diabética
As causas não siológicas encontram‑se sistematizadas no
Peso de nascimento entre 2.000 e 2.500 g e/ou idade
Quadro 2. Alguns fatores de risco têm sido valorizados para hi gestacional entre 35 e 38 semanas (maior risco entre 35 e 36
perbilirrubinemia indireta com necessidade de tratamento, re semanas)
sumidos no Quadro 3. Vale lembrar que o fator de maior risco Sexo masculino
é o surgimento de icterícia dentro das primeiras 24 horas de Baixo aporte de leite materno na primeira semana de vida, com
GD perda exagerada de peso pelo RN
A idade gestacional entre 35 e 36 semanas, independente Alta precoce da maternidade (antes de completar 48 horas de
P Q GR S R DR QD U RQ G UDGD P GR ID RU G U vida)

co mais importantes para hiperbilirrubinemia signi cativa em


razão da capacidade diminuída da conjugação hepática da bi Outra causa frequente de hiperbilirrubinemia indireta é o
lirrubina e da di culdade na sucção e deglutição para manter jejum prolongado, que favorece a absorção da bilirrubina no
RI U D DG DGD G O PD UQR nível intestinal e seu maior aporte para a circulação sanguínea.
O risco de RN com 36 semanas desenvolver BT > 20 mg/dL Lembrar que a icterícia prolongada pode ser a única mani
PD RU DQGR RPSDUDGR D 1 G PDQD G GD festação do hipotireoidismo congênito, pois o hormônio ti
de gestacional. O baixo aporte é fator associado importante U R G DQR P QG RU GD D GDG GD JO URQ O UDQ I UD
nesses RN, normalmente com poder de sucção ainda diminuí Na presença de céfalo‑hematoma, equimoses ou outros san
do, por favorecer o aumento da circulação êntero‑hepática da gramentos, a hiperbilirrubinemia manifesta‑se 48 a 72 horas
bilirrubina. Esses pacientes, sobretudo nos casos de alta preco após o extravasamento sanguíneo e pode causar icterícia pro
ce da maternidade, têm contribuído para reinternações em lei ORQJDGD
tos de hospitais pediátricos, elevando os custos no âmbito da A de ciência de G6PD deve ser pesquisada em todo RN que
saúde pública. apresente icterícia não siológica, mesmo que outra causa ex
A perda exagerada de peso nos primeiros dias de vida, em plique a hiperbilirrubinemia. É uma doença genética associa
RN sob aleitamento exclusivo, sem evidências de hemólise ou da ao cromossomo X e, ao contrário do que se esperaria, afeta
outra causa de icterícia, pode sugerir esse diagnóstico. Sódio igualmente indivíduos dos dois sexos. A maior incidência
U R ≥ 150 mEq/L reforça a hipótese. ocorre em pessoas com ancestrais provenientes do Mediterrâ
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neo, como Itália e Oriente Médio, da África Equatorial e de al orienta o pediatra a liberar ou não a alta hospitalar, bem como
gumas regiões do Sudeste Asiático. No período neonatal exis elaborar o plano de investigação e tratamento da icterícia.
tem duas formas da doença: a hemolítica aguda com rápida
ascensão da BI desencadeada por agentes oxidantes (antima Incompatibilidade Rh (antígeno D)
O U R QI R DO R P Q RODGR QDI DO QD Q U R UR A hemólise ocorre quando as hemácias do feto e RN, portadoras
a hemolítica leve associada ao polimor smo genético com ex do antígeno D, são destruídas por anticorpos maternos IgG an
SU R U G GD GD JO URQ O UDQ I UD RQ JD R O P D ti‑D. São mães sensibilizadas em gestações anteriores que não
da da bilirrubina, sem a presença de anemia.5 Estima‑se que receberam imunoglobulina especí ca, com prova de Coombs
pode atingir até 7% da população brasileira, sendo a triagem indireta positiva. A intensidade da hemólise pode determinar
neonatal da G6PD feita em papel de ltro e a dosagem quanti formas leves da doença, com icterícia tratável no máximo por
tativa realizada em sangue com reticulóticos normais. IR R UDS D DQ P D SRG S UG UDU Q U P IRU
A chamada “icterícia por leite materno” tipicamente se ini PD PRG UDGD UD DGD RP IR R UDS D SRU U R G D
cia entre 3 e 5 dias de vida, atingindo o pico após 2 semanas, vezes com indicação de exsanguinotransfusão (EST) anemia
DQGR RP D D G O QDU O Q DP Q G DSDU QGR Q U mais profunda e também encontrada até 1 a 3 meses, e formas
e 12 semanas após o nascimento. Ocorre em bebês saudáveis, graves, com hidropsia fetal e péssimo prognóstico. O Coombs
com bom ganho de peso, sob aleitamento natural, e constitui direto é sempre positivo, e a contagem de reticulócitos, alta.
diagnóstico de exclusão. O aumento de bilirrubinas se deve
exclusivamente à fração indireta. A causa não está totalmente Incompatibilidade ABO
ODU GD SRG QGR G RUU U G DOJ P ID RU SU Q QR O Caracterizada pela tipagem A ou B em RN de mãe O, seja Rh
materno que favoreça a absorção intestinal de bilirrubinas. positivo ou negativo. Mais encontrada na primeira gestação,
Entre 20 e 40% das mulheres apresentam níveis elevados de com curso variável. A icterícia costuma aparecer nas primeiras
beta‑glucuronidase no seu leite, o que explicaria a icterícia. 24 ou 36 horas de vida, e a hemólise pode ocorrer por até 2 se
Outro mecanismo proposto seria uma mutação polimór ca do manas. O nível de BT pode atingir valores altos, como 20 mg/
J Q *7 do leite de algumas mulheres.5,6 ' DO U IRU dL. A anemia não é proeminente. Menos grave do que a incom
ma, não há necessidade de tratamento da icterícia por leite patibilidade Rh, também exige cuidados. Usualmente tratada
PD UQR Q R QG DQGR D G RQ Q GDG GR DO DP Q R por fototerapia; em alguns casos, a EST é indicada. Prova de
Coombs positiva pode ser evidenciada em 20% dos casos, sem
Abordagem da hiperbilirrubinemia indireta traduzir hemólise maciça.
Importante contribuição para a abordagem da hiperbilirrubi
nemia indireta foi o nomograma de Bhutani (Figura 1), ainda Complicações da hiperbilirrubinemia indireta
muito utilizado. Esse nomograma classi cou os riscos do valor A mais temida é a encefalopatia bilirrubínica. A fase aguda da
de BT, com predomínio de BI, em RN com 35 semanas ou GR Q D R RUU QR SU P UR G D S UG UD SRU PDQD RP
mais de idade gestacional, conforme a idade pós‑natal. A de letargia, hipotonia e sucção débil. Se a hiperbilirrubinemia
signação de risco de RN saudável de termo ou próximo do ter não é tratada, aparece hipertonia com hipertermia e choro
mo é baseada nos valores de bilirrubina especí ca para sua agudo de alta intensidade. A hipertonia manifesta‑se com
idade em horas de vida. A zona de alto risco é designada pelo U URDU DP Q R GR S R R GR URQ R SURJU G QGR SDUD
canal de percentil 95. A zona de risco intermediária é subdivi apneia, coma, convulsões e morte. As crianças sobreviventes
G GD P RQD G U R S U RU QI U RU S OR DQDO G S U apresentam a forma crônica da doença, com a tétrade paralisia
centil 75. A zona de baixo risco foi eletivamente e estatistica cerebral atetoide grave, neuropatia auditiva, paresia vertical
mente de nida pelo canal de percentil 40. A classi cação do olhar, displasia dentária e, ocasionalmente, de ciência
mental. Nesses RN, a ressonância magnética cerebral eviden
cia sinais bilaterais e simétricos de alta intensidade no globo
S O GR
25 428
Tratamento da hiperbilirrubinemia indireta
Bilirrubina sérica (mg/dL)

Bilirrubina sérica ( mg/dL)

20 342 As formas de terapia mais utilizadas no tratamento da hiperbi


io a
lto P75 lirrubinemia indireta compreendem a fototerapia e a EST, e,
15 diár 257
rme aixo P40
a de
int e
ediá
rio b em alguns casos, a imunoglobulina VWDQGDUG QGR QR D
Zon term
10 Zon
ade in
171 Os níveis de bilirrubinas para indicar fototerapia e EST, de
Zona de baixo risco D RUGR RP GDG J D RQDO PSR G GD Q RQ UDP
5 85 resumidos nas Tabelas 1 e 2. A conduta frente aos resultados
0
da triagem para bilirrubina baseada no nomograma de Bhuta
0
0 12 24 36 48 60 72 84 96 109 123 132 144 ni também pode orientar a necessidade de fototerapia, confor
Idade pós-natal (horas)
P JXLGHOLQHV da Sociedade Canadense de Pediatria9 (Tabe
la 3). A Figura 2 mostra níveis de bilirrubina total indicativos
Figura 1 Nomograma de Bhutani. G IR R UDS D RQIRUP ID RU G U R 10 Hoje há vários apli
ICTERÍCIA NEONATAL • 1265

Tabela 1 Nível de BT para indicação de fototerapia e EST Tabela 3 Condutas diante de níveis de risco e fatores
em RN ≥ 35 semanas de idade gestacional8 preditivos em RN ≥ 35 semanas de idade gestacional9
Idade Bilirrubina total (mg/dL) Zona > 37 semanas 35 a 376/7 35 a 376/7
e CD negativo semanas ou semanas e
Fototerapia Exsanguinotransfusão CD positivo CD positivo
350/7 a 376/7 ≥ 380/7 350/7 ≥ 380/7 Alta Fototerapia Fototerapia Fototerapia
semanas semanas a 376/7 semanas
semanas Intermediária Investigação Fototerapia Fototerapia
a alta adicional ou
24 horas 8 10 15 18 necessita de
36 horas 9,5 11,5 16 20 tratamento

48 horas 11 13 17 21 Intermediária Cuidados de Cuidados de Investigação


a baixa rotina rotina adicional ou
72 horas 13 15 18 22 necessita de
tratamento
96 horas 14 16 20 23
Baixa Cuidados de Cuidados de Cuidados de
5 a 7 dias 15 17 21 24 rotina rotina rotina
Diminuir em 2 mg/dL o nível de indicação de fototerapia ou EST se doença
hemolítica (Rh, ABO, outros antígenos), deficiência de G6PD, asfixia,
letargia, instabilidade na temperatura, sepse, acidose ou albuminemia <
3 g/dL.
Iniciar fototerapia de alta intensidade sempre que: BT > 17 a 19 mg/dL e
colher BT após 4 a 6 horas; BT entre 20 e 25 mg/dL e colher BT em 3 a
4 horas; BT > 25 mg/dL e colher BT em 2 a 3 horas, enquanto o material da
EST está sendo preparado. 25

Bilirrubina total sérica (mg/dL)


Se houver indicação de EST, enquanto ocorre o preparo, colocar o RN
em fototerapia de alta intensidade, repetindo a BT em 2 a 3 horas para
20
reavaliar a indicação de EST.
A EST deve ser realizada imediatamente se houver sinais de encefalopatia
bilirrubínica ou se a BT estiver 5 mg/dL acima dos níveis referidos. 15
A fototerapia pode ser suspensa, em geral, quando BT < 8 a 10 mg/dL,
sendo a BT reavaliada 12 a 24 horas após suspensão para detectar rebote.
10

5
Tabela 2 Nível de BT para indicação de fototerapia e
EST em RN < 34 semanas de idade gestacional8 0
ao nascer 24 h 48 h 72 h 96 h 5 dias 6 dias 7 dias
Peso ao nascer Bilirrubina total (mg/dL) Idade
Fototerapia Exsanguinotransfusão
RN de baixo risco ( 38 semanas e bem)
1.001 a 1.500 g 6a8 11 a 13 RN de médio risco ( 38 sem + fat.risco ou 35 a 376/7 sem e bem)
RN de alto risco (35 a 376/7 semanas + fatores de risco)
1.501 a 2.000 g 8 a 10 13 a 15
2.001 a 2.500 g 10 a 12 15 a 17
Figura 2 Valores de BT para indicação de fototerapia e EST
Considerar o valor inferior na presença de fatores de risco: doença
hemolítica, deficiência de G6PD, asfixia, letargia, instabilidade na em RN ≥ 35 semanas de idade gestacional conforme nível
temperatura, sepse, acidose, hipotermia ou albuminemia < 3 g/dL. de risco.10

D R G O ODU IRUQ P Q DQ DQ DP Q D RQG D trada de maneira adequada. A doença hemolítica grave por in
D U RPDGD G D RUGR RP D U RP QGD GD DG P D compatibilidade Rh tem sido a principal indicação de EST. A
Americana de Pediatria, utilizando as variáveis valor de bilir U DO D R G SUR G P Q R Q D R SRG SURG U O D
rubina total, tempo de vida e fatores de risco. Exemplo: Bilir da morbidade, que inclui complicações metabólicas, hemodi
rubin Calc®. nâmicas, infecciosas, vasculares, hematológicas, além das
IR R UDS D RP SUR R R ODU R P RGR PD O D reações pós‑transfusional e enxerto‑hospedeiro. Na hemólise
do nas últimas décadas. Visa a reduzir os níveis de bilirrubinas por incompatibilidade Rh, a EST pode ser indicada logo após o
que poderiam indicar EST. A e cácia desse tratamento depen nascimento, quando BI > 4 mg/dL e/ou hemoglobina < 12 g/
de do comprimento de onda da luz, da irradiância espectral e dL no sangue de cordão. Em casos de hidropsia fetal, o proce
da superfície corpórea exposta à luz. dimento inicia‑se somente após a estabilização das condições
Quando a bilirrubinemia é superior ao percentil 95 no no ventilatórias, hemodinâmicas, do equilíbrio acidobásico e da
mograma de Bhutani et al., é preferível indicar fototerapia de RUU R GD DQ P D
alta intensidade, de preferência com lâmpadas azuis especiais, Na doença hemolítica por incompatibilidade Rh, a BT deve
para aumentar a irradiância e a superfície corpórea exposta à ser determinada a cada 6 a 8 horas, e a EST, indicada se hou
luz. Nesses casos, não deve haver interrupção de exposição do ver elevação igual ou superior a 0,5 a 1 mg/dL/hora nas pri
RN ao aparelho sequer para mamar. meiras 36 horas de vida, ou ainda conforme os níveis de BT,
Atualmente, a maioria dos casos de hiperbilirrubinemia in peso ao nascer e presença de fatores agravantes da lesão bilir
G U D RQ URODGD SRU P R G IR R UDS D DQGR DGP Q rubínica neuronal.
1266 • TRATADO DE PEDIATRIA • SEÇÃO 16 NEONATOLOGIA

Nas doenças hemolíticas imunes, se houver aumento da dos de bilirrubina conjugada, discretos ou moderados aumen
BT apesar da fototerapia intensiva ou a BT se aproximar de 2 a R G DP QR UDQ I UD O D R GD JDPD JO DP O
3 mg/dL do nível de indicação de EST, pode‑se administrar transpeptidase (GGT). Estudo brasileiro demonstrou que a
imunoglobulina VWDQGDUG endovenosa 0,5 a 1 g/kg em 2 horas maioria dos pacientes é operada tardiamente (após 60 dias de
e repetir após 12 horas, se necessário.10 vida), situação relacionada a pior prognóstico. O encaminha
mento tardio dos pacientes com atresia biliar para correção ci
Hiperbilirrubinemia direta rúrgica continua sendo um problema em nível nacional, por
A elevação do nível de BD resulta de distúrbios hepáticos ou DQ R I QGDP Q DO R S G D UD D DS R DR
doenças sistêmicas potencialmente graves. A icterícia coles reconhecimento e diagnóstico precoce dessa patologia.
tática caracteriza‑se pelo aumento prolongado da bilirrubina A hepatite neonatal idiopática é uma doença de causa des
conjugada e é re exo da redução da excreção pelas células pa conhecida; inclui‑se no diagnóstico diferencial da atresia, sen
renquimatosas hepáticas ou doença do trato biliar. A icterícia do caracterizada por aumento prolongado da bilirrubina con
causada pela BD elevada confere à pele um tom esverdeado ou jugada e pelo achado histológico de células gigantes em
amarelo‑acastanhado opaco. As causas a serem consideradas biópsia hepática.15
envolvem obstrução, sepse, doença do trato biliar, toxinas, in S Q RQD DO D DGD SRU RUJDQ PR UDP SR R
amação e doenças metabólicas ou genéticas. R UDP Q JD R D R DGD D RO D 1R D R G Q
Entre os critérios que indicam hiperbilirrubinemia grave, está I R GR UD R U Q U R SRU (VFKHULFKLD FROL a icterícia pode ser
o aumento da bilirrubina conjugada > 1 mg/ dL, se BT < 5 mg/ o único sinal presente. Em infecções congênitas, como nos ca
dL, ou quando bilirrubina conjugada > 20% da bilirrubina total sos de toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus, herpes e sí lis,
se BT > 5 mg/dL. os recém‑nascidos também podem evoluir com icterícia coles
A colestase é causada por uma obstrução extra ou intra‑he D 15
pática ao uxo biliar e resulta em retenção no soro de substân Erros inatos do metabolismo cursam com hiperbilirrubine
cias que normalmente são excretadas na bile, e o marcador P D G U D RPR QR D R G JDOD R P D R UR Q P D
mais comum é a hiperbilirrubinemia conjugada. Apesar de SD RORJ D G P U G DJQR DGD SU R P Q SDUD
não ser neurotóxica, seu acúmulo é sempre patológico e deve início de um tratamento e caz e melhor prognóstico.
ser feito o diagnóstico de forma precoce em razão do potencial
de gravidade da atresia biliar, uma das causas mais comuns de Considerações finais
RO D A icterícia neonatal é uma das mais prevalentes manifestações
A icterícia pode ser o primeiro sinal de disfunção hepática. do período neonatal e precisa, em cada caso, ser compreendi
Outras manifestações clínicas podem estar presentes, como uri da, ter seu risco avaliado e ser abordada da forma mais ade
na de cor escura, fezes acólicas (descorada) e hepatomegalia. DGD SDUD SU Q U GDQR I UR PD RU SDU OD GR D R
Esses sinais contribuem para a identi cação da colestase, po não requer qualquer tratamento especí co.
rém oferecem poucos indícios para de nição da etiologia, fa Documento Cientí co do Departamento de Neonatologia
zendo‑se necessários exames complementares que auxiliem na da Sociedade Brasileira de Pediatria sobre o tema, publicado
diferenciação da patologia de base (Quadro 4). Entre as várias em 11/11/2012, emite as seguintes recomendações:
causas, as mais prevalentes são a atresia de vias biliares e a he 26. Aencefalopatiabilirrubínicaéumadoençaprevenívelesua
SD Q RQD DO prevenção engloba várias intervenções, desde a assistência
A atresia biliar é de nida como ausência ou obliteração dos pré‑natal às gestantes Rh (D) negativo até o acompanhamen
ductos biliares extra‑hepáticos, sendo a principal indicação de to da icterícia neonatal após a alta hospitalar.
transplante hepático em crianças. Os recém‑nascidos desen 27. EmrelaçãoaosRN≥35semanas,reforça‑sequeasaçõesmé
volvem icterícia progressiva nas primeiras 8 semanas de vida e dicas consistem em:
SRG P DSU Q DU D RO D I DO Q U DQ R P D QR • avaliar o risco epidemiológico de o RN evoluir com níveis
início do quadro aparentam bom estado geral e adequado ga de BT elevados;
nho de peso. Os testes laboratoriais apresentam níveis eleva • promover apoio, assistência e supervisão contínua ao
DO DP Q R PD UQR G G R QD P Q R G UDQ D Q
ternação e após a alta hospitalar no primeiro mês de vida;
• realizar a alta hospitalar somente após 48 horas de vida e
Quadro 4 Investigação inicial da hiperbilirrubinemia o retorno ambulatorial em 48 a 72 horas para acompa
direta nhamento da icterícia, aleitamento materno, entre ou
Hemograma completo, contagem de plaquetas tras intercorrências, conforme preconizado pela Socie
Bilirrubina total e direta, ALT, AST, fosfatase alcalina, glicose dade Brasileira de Pediatria e pelo Ministério da Saúde.
Tempo de protrombina, albumina
α-1 antitripsina Ao final da leitura deste capítulo, o pediatra deve estar apto a:
• Conhecer o conceito, a prevalência e a classificação da
Substâncias redutoras da urina
icterícia neonatal.
Ecografia abdominal
• Ter noções sólidas da fisiopatologia da icterícia.
ICTERÍCIA NEONATAL • 1267

• Identificar os fatores de risco para reinternação 7. Bhutani VK, Johnson L, Sivieri EM. Predictive ability of a predischarge
hospitalar e encefalopatia, consagrados nos casos de hour‑speci c serum bilirubin for subsequent signi cant hyperbilirubi
icterícia, e sua aplicabilidade na conduta a ser adotada nemia in healthy term and near‑term newborns. Pediatrics 1999;
em cada caso. 103(1):6.
• Reconhecer no nomograma de Bhutani os riscos de 8. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departa
cada caso e entender a sua predição para indicações mento de Ações Programáticas e Estratégicas. Atenção à saúde do re
de tratamento da icterícia, observação ou alta cém‑nascido: guia para os pro ssionais de saúde/Ministério da Saúde,
hospitalar no seguimento. 6 U DU D G Q R 6D G ' SDU DP Q R G 3URJUDP D
• Saber quando e como investigar a icterícia, Estratégicas. v.2. Brasília: Ministério da Saúde, 2011. p.59.
compreendendo o conceito de icterícia fisiológica. 9. KJ Barrington, K Sankaran; Canadian Paediatric Society, Fetus and
• Utilizar com propriedade as curvas e tabelas de Newborn Committee. Paediatr Child Health 2007; 12(Suppl B):1B‑12B.
indicação de fototerapia ou exsanguinotransfusão. 10. American Academy of Pediatrics Subcommittee on Hyperbilirubinemia.
• Valorizar os casos de icterícia com aumento da fração Management of hyperbilirubinemia in the newborn infant 35 or more
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