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A classificação de Comte, aparece, pela de Comte, o “Curso de Filosofia Positiva” , foi pu
primeira vez, a Sociologia como ciência blicada de 1830 a 1842, em 6 volumes. A nova
independente. Foi em 1838 que o filósofo francês “ciência da sociedade” teve inicialmente o nome
apresentou o vccábulo sociologia. Desde então, de Física Social, alterado no 4 o volume do Curso
a nova ciência se desenvolveu impressionante para o de Sociologia.
mente. E ’ possível que para isso haja contribuí Scb o ponto de vista filosófico, o positivismo
do certa tendência em confundir sociologia com tentava descobrir uma lei de gravitação social, à
reforma social. Explica-se a confusão: a Sociolo semelhança da lei de Newtcn, e que servisse de
gia é o estudo científico da vida associativa e in instrumento hábil para interpretação de todos os
terativa ncs grupos humanos■ Assim, espera-se fenômenos sociais. Analisando a evolução do pen
muito naturalmente que ela possa indicar os meios samento humano, Ccmte propôs a famosa “lei dos
necessários ao aperfeiçoamento da vida social. A 3 estados” : o teológico (ou da superstição), o
verdade é que todo conhecimento científico deve metafísico (ou da especulação) e o positivo (ou
tender a se traduzir em aplicação técnica, em be científico). Neste último período, a ciência da
nefício da sociedade. sociedade devia adotar o método das ciências na
E ’ óbvio ainda que a sociedade não teria in turais e a Sociologia podia então ingressar no gru
teresse em manter um corpo de pesquisadores ci po das ciências exatas.
entíficos apenas para divertimento intelectual. A Herbert Spencer, nos seus “Princípios de So
civilização resulta de um lento processo de acumu ciologia” , define a missão da Sociologia como
lação de conhecimentos, traduzidos em ação prá sendo a de: explicar os fenômenos resultantes das
tica. ações combinadas das unidades sociais; explicar a
origem do desenvolvimento da organização polí
3. POSIÇÃO D A SOCIOLOGIA tica que regula diretamente os negócios do ho
mem; seguir as relações dêsse aparelho de coor
Origem da Sociologia denação e controle com a área sôbre a qual se
estende, com o número e a distribuição da popu
Na luta pela supremacia entre os barões m e lação, com os meios de comunicação; mostrar as
dievais, os reis desempenharam o papel de pro diferenças de forma que essa organização apre
tetores dos direitos das classes baixas contra o senta nos diferentes tipos sociais — o nômade,
poder dos senhores feudais. O nacionalismo daí o sedentário, o militar e o industrial; expor as re
emergente foi se firmando com a aceitação de um lações entre as instituições do govêrno civil, as
idioma vernáculo, e, depois, com a disseminação instituições eclesiásticas e as instituições de eti
da palavra escrita. Assim, os problemas da vida quete; anotar as modificações que os freios polí
coletiva surgiram à luz do debate público. Veri ticos persistentes provocam sempre no caráter das
ficou-se, mais tarde, que a instituição da realeza unidades sociais e as reações dos caracteres m o
em moldes absolutos, não satisfazia aos interesses dificados das unidades que operam sôbre a orga
da nova sociedade que se originou do maior inter nização política.
câmbio de utilidades e de idéias entre os povos.
Antes, porém, de tentar explicar fenômenos
Intenso anseio pelo bem-estar geral começou tão complicados — esclarece Spencer — é pre
a preocupar políticos e filósofos. Um espírito es ciso estudá-lcs a fim de apreender as suas rela
clarecido — Saint-Simon — advogava a instau ções atuais de coexistência e de seqüência. An
ração de uma nova ordem social capaz de con tes de recorrer à dedução para interpretar as ver
ferir aos trabalhadores “um maior quinhão da dades gerais, é necessário estabelecê-las por in
propriedade, da cultura e da felicidade do mun dução.
d o” . Ora, semelhante reforma social só poderia
se realizar através de uma doutrina, um novo sis
tema de pensamento, ou, em outros têrmos, de Evolução da Sociologia ,
uma filoiofia positiva, baseada na ciência e na
A noção de lei e o que caracteriza verdadei
experimentação.
ramente uma ciência. Aspirando à categoria de
Coube a um discípulo de Saint-Simon, Au- ciência positiva, a Sociologia tinha de admitir e
guste Comte, fundar a nova doutrina social — o provar que os fenômenos sociais obedecem a leis.
Positivismo — •, na qual preconizava a incorpora As instituições humanas variam no tempo e no
ção do proletariado à sociedade. A imortal obra espaço, e, portanto, os sociólogos passaram a con
14 REViSTA d o s e r v iç o p ú b l ic o JULHO DE 1 9 5 1
siderar que não se podia ligar a noção da perma tivamente, o método histórico. Isso não se vê, à
nência das leis sociológicas à da fixidez das formas primeira vista, no Capital, porque é a crítica da
ou das instituições. sociedade capitalista que nêle ocupa o maior lu
gar e porque essa crítica está exposta sob a forma
Outra noção básica em Sociologia é a da
de análise e silogismo. Mas, fora da dialética
especificidade do social, ou, segundo Durkheim. a
rigorosamente aplicada ao estudo do regime eco
de que 03 fenômenos sociais constituem um “reino
nômico moderno, a concepção marxista das for
natural” , com os seus caracteres próprios e distin
mas sucessivas de organização social é um produ
tos das outras ordens de fenômenos.
to autêntico do método histórico e indutivo” ;
Na evolução da Sociologia, distinguimos, com Marx e Engels empregaram o método histórico-
A. Cuvillier, as seguintes grandes escolas, que re comparativo, o estatístico e o etnográfico. M an;
presentam marcos importantes no m odo de in escreveu: “Não é a consciência d o homem que de
terpretar e conceber os fatos sociais: termina a sua existência, mas, pelo contrário, é a
a) s o c i o l o g i a n a t u r a l i s t a — A antropo-
sua existência social que determina a sua consci
sociologia baseava na raça o substrato dos fenô ência” . Respondendo a críticas à concepção m a
menos sociais, enquanto a sócio-geografia 110 meio terialista da história, disse Engels que “A situação
geográfico- Da sociologia naturalista, destacam- econômica era base, mas os diferentes fatores da
se a teoria organicista, que compara a sociedade superestrutura — formas políticas da luta das
a um ser vivo, e a zoo-sociologia, que parte do es classes e seus resultados: constituições estabeleci
tudo das sociedades animais. das após à vitória pela classe vitoriosa, etc., for
mas jurídicas; e também, bem entendido, os re
b ) s o c i o l o g i a p s i c o l ó g i c a — Diversos so flexos de tôdas essas lutas reais no cérebro dos
ciólogos situaram, porém, os problemas concer
que nelas participam, teorias políticas, jurídicas,
nentes à sociedade humana no domínio da Psico
filosóficas, instituições religiosas e seus ulteriores
logia: 1.°, a teoria da imitação, de Gabriel Tarde;
desenvolvimentos em sistemas dogmáticos —
2.°, as teorias da alma coletiva, com a escola cri-
minalista italiana, a “psicologia dos povos” , alemã, exercem igualmente a sua influência sôbre o cur
de Hegel, Herbart e Wundt; 3.°, a psico-sociolo- so dag lutas históricas e determinam-lhes, em mui
gia americana, de Franklin H. Giddings, C. Horton tos casos, as formas de maneira preponderante.
Cooley, Charles A. Ellwood e M ac Dougall. Na Há ação e reação de todos êsses fatores” .
sua “An Introduction to Social Psychology” , Mac d) s o c io lo g ia c ie n tífic a co n te m p o râ n e a .
Dougall assevera que a ordem social é o efeito — Partindo do determinismo sociológico, a socio
de fôrças mentais inatas na natureza humana; as logia científica visa o conhecimento objetivo da
instituições sociais resultariam de certos desejos realidade social. A sociologia contemporânea en
ou instintos fundamentais da natureza humana. volve postulados, métodos e hipóteses fundamen
c ) d e t e r m i n i s m o s o c i o l ó g i c o — Irredutí tais, a noção de “tipo” ( “certas instituições m o
vel a fatores puramente biológicos ou sociológi rais, jurídicas, certas crenças religiosas são idênti
cos. Destacam-se: 1.° — as escolas formalistas, cas a si mesmas em tôda parte onde as condições
segundo as quais o objeto próprio da Sociologia é de vida social apresentam a mesma identidade” ),
o estudo das propriedades do grupo social como a noção de leis de estrutura, leis de evolução e
grupe, as interações que o constituem e as formas leis estatísticas.
que toma nas diferentes sociedades concretas —
família, clã, grupo profissional, classe, partido, na Aspectos e relações da Sociologia
ção, Estado, etc., e a sociologia geral deve ser in
dependente da sociologia econômica, jurídica, re Neste ensaio, demos propositadamente realce
ligiosa, estética, etc.; 2-°, a sociologia de Durkheim à Sociologia. E ’ que esta ciência surgiu quando
(que não separa a sociologia das ciências sociais as outras já estavam bem definidas- Ainda hoje
especiais) explicava cs fenômenos sociais pela há controvérsia quanto ao verdadeiro campo da
morfologia social, isto é, pelas noções de volume Sociologia. Há outras ciências que tratam da so
e de densidade dos grupos, inclinando-se, depois, ciedade humana. Que relações têm elas com a
para o sentido idealista, com a idéia de “represefn- Sociologia?
tações coletivas” — produzidas pelas ações e rea
Pode-se encarar a Sociologia sob dois princi
ções trocadas entre as consciências elementares de
pais aspectos — ciência social de caráter geral,
que é feita a sociedade — e negando que o “fator
ciência de processos e produtos sociais.
econôm ico” seja a mola do progresso; 3.°, a socio
logia marxista, ( * ) sôbre cuja metodologia escre Há diversas ciências que estudam a socieda
ve Maurice Bourguin: “Olhando apenas ao pro de. Esta, porém, é uma entidade, e a subdivisão
cesso de investigação e de raciocínio, temos de feita é puramente artificial. Assim — argumen
reconhecer que o método seguido por Marx é, efe tam os partidários da primeira corrente — torna-
se necessário uma ciência social de feição geral,
que abrace a sociedade com o um todo unitário-
(*) R ecom endam os ao leitor, na parte relativa a A Sociologia “tomou os dados das ciências sociais
doutrinas sociológicas, o excelente trabalho de A . C uvil especializadas, unificando-os e interpretando-os por
lier “ In trcd u ção à S ociologia ” , tradução portuguesa ds meio de uma ciência teórica geral dos princípios e
1940 . leis das relações humanas associativas” .
CLASSIFICAÇÃO DAS CIÊNCIAS ( l i ) 15
0 outro grupo prefere considerar a Sociolo ocorre em coletividade e percebido sob a forma
gia, restringindo-a, ccm o o estudo dos processos e de uses, convenções, tradições, crenças, etc., ( 3 )
produtos da vida humana associativa, manifesta Símbolos da linguagem externa usados para pro
dos particularmente nas relações interativas den jetar os tipos de conduta acima descritos e con
tro dos grupos sociais. dicionar as reações em nós e nos outros, ( 4 ) As
Essa noção de “grupo social” vai nos condu invenções, inicialmente físicas, que executam um
zir à análise e classificação do ambiente humano. serviço semelhante condicionando respostas psí
quicas, mas usualmente com menos facilidade.
O ambiente humano
Por mais complexas que sejam as relações en IV — Ambiente institucionalizado, derivado
tre o homem e o meio em que vive, é possível cias- de controle (combinação de vários tipos de am
sificá-las. Tal obra de sistematização foi tentada biente, organizada para fins de controle so cia l):
com sucesso pe!o professor L. L- Bernard e divul 1. De caráter geral:
gada em sua “Introduction to Social Psychology” .
Ei-la: Ambiente econômico, político, racial, ético,
educacional, etc.
1 — Ambiente físico (inorgânico):
»• 2. De caráter especial:
( 1 ) Cósmico, ( 2 ) Físico-geográfico, ( 3 ) Solo,
( 4 ) Clima, ( 5 ) Recursos inorgânicos, ( 6 ) Agen Ambiente americano, italiano, judeu, escan
tes físico-naturais, ( 7 ) Processos mecânico-na- dinavo, argentino, republicano, democrático, ca
tólico, budista, revolucionário, conservador, femi
turais.
nino, masculino, etc-
II — Ambiente biológico ou orgânico:
Programa de investigações sociológicas
( 1 ) Microrganismos, ( 2 ) Insetos e parasi
tas, ( 3 ) Plantas usadas em alimentação, vestuá Apesar de tôdas as controvérsias surgidas, a
rio e abrigo, etc., ( 4 ) Animais usados para fins Sociologia está se transformando cm uma ciência
de alimentação, vestuário, etc., ( 5 ) Plantas e ani integral da sociedade, contribuindo mesmo para o
mais nocivos, ( 6 ) Relações ecológicas de plantas mais rápido aperfeiçoamento social. Não é por
e animais que agem indiretamente sóbre o ho- acaso, certamente, que cs regimes políticos basea
ir.em, ( 7 ) M eio pré-natal do homem, ( 8 ) Proces dos na violência, inimigos do consentimento livre
sos biológicos naturais (reprodução, crescimento, dos cidadãos, opõem os maiores obstáculos às pes
decomposição, assimilação, circulação, etc.). quisas sociológicas.
Da posição da Sociologia no quadro geral
III — Ambiente social:
das ciências, basta mencionarmos o vasto pro
1. Ambiente íisico-social: grama de estudos delineado por Emile Durkheim
( 1 ) Instrumentos, ( 2 ) Armas, ( 3 ) Orna e sua escola:
mentos, ( 4 ) Máquinas, ( 5 ) Sistema de transpor I — s o c i o l o g i a g e r a l : 1.°, Filosofia social;
tes, ( 6 ) Sistema de comunicações, ( 7 ) Equipa 2.°, Psicologia e Sociologia; 3.°, História das dou
mento doméstico, ( 8 ) Equipamento do trabalho, trinas; 4.°, Metodologia; 5.°, Civilizações; 6.°,
( 9 ) Aparelhos para investigações científicás. Raça e Sociedade.
2. Ambiente bio-social: II — s o c i o l o g i a r e l i g i o s a : 1.°, Filosofia e
psicologia religiosas; 2.°, Sistemas religiosos das
A. Não-humano:
sociedades inferiores (totêmicas, de totemismo
(1 ) Plantas domésticas usadas para alimen evoluído, de tribos); 3 .°, Sistemas religiosos na
tação, vestuário, ''abrigo, medicina, ornamentos, cionais; 4.°, Sistemas religiosos universalistas; 5.°,
(2 ) Animais domésticos usados como base de ali Sistemas religiosos dos grupos secundários (sei
mentação, ( 3 ) Animais domésticos usados como tas); 6.°, Cultos especiais; 7.°, Crenças e práticas
fcnte He energia, ( 4 ) Medicina e perfume de ca populares; 8.°, Crenças e atos referentes aos mor
ráter orgânico, ( 5 ) Animais usados como enfeites tos; 9.°, Magia; 10.°, Ritual; 11.°, Mitos, lendas e
e ornamentos, etc- contos, dogmas; 12.°, Organização religiosa.
B. Humano: III — s o c i o l o g i a m o r a l e j u r í d i c a : 1.°
Direito e Moral; 2.°, Sistemas jurídicos e morais;
( 6 ) Sêres humanos servindo como trabalha
3 -° Organização doméstica e matrimonial (fa
dores (escravos, etc.), ( 7 ) Sêres humanos servin
mília, casamento, condição da mulher, moral se
do como ornamentos, distrações, etc., ( 8 ) Sêres
xual); 4.°, Organização dos grupos secundários;
£• humanos prestando serviço impessoal, voluntário
5.°, Organização política ( o Estado, tipos de orga
ou profissional, ( 9 ) Grupos humanos arregimen nização política); 6.°, Direito de propriedade, di
tados, como exércitos, operários, (1 0 ) Homens
reito contratual; 7.°, Direito penal; 8.°, Organiza
cooperando voluntariamente através do uso da
ção judiciária, processo; 9.°, Direito internacional,
linguagem. moral internacional.
3. Ambiente psico-social: IV — s o c i o l o g i a c r i m i n a l e e s t a t í s t i c a
(1 ) Comportamento íntimo (atitudes, idéias, m oral — 1 .°, Criminalidade em geral; 2.°, Crimi
desejos, etc.) de indivíduos com os quais entramos nalidade segundo os países, as condições econômi
contato, ( 2 ) Comportamento íntimo que cas, as confissões religiosas, a idade e o sexo; 3.°,
16 REVISTA DO SERVIÇO PUBLICO ----- JULHO DE 1951