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Émile Durkheim e o positivismo sociológico

A Sociologia Positivista

O Positivismo adotou parâmetros teóricos que pressupunham que os códigos reguladores dos
âmbitos físico e social diferiam quanto a seu caráter: os primeiros seriam relativos a acontecimentos do
mundo dos fenômenos exteriores aos homens; os segundos, aos fatos pertinentes à problemática das
questões humanas ligadas à interação e à convivência social. Os positivistas acreditavam que esses
âmbitos possuíam uma origem comum, natural, apesar do reconhecimento de suas diferenças. Eles
adotaram a lógica dos procedimentos de investigação das ciências naturais, como a Física, Química e
Biologia.
Os positivistas conceberam a sociedade como um organismo combinado de partes integradas e
coesas que funcionavam harmoniosamente, conforme um modelo físico ou mecânico de organização.
O Positivismo também foi denominado de organicismo e darwinismo social. Essa qualificação é
decorrente da influência que as pesquisas de Charles Darwin exerceram sobre sua forma de ver a
sociedade, que dizia que apenas os seres mais aptos e evoluídos sobreviveriam.
De um ponto de vista teórico, a sociologia positivista foi configurada pela tentativa de seus
formuladores em constituir seu objeto de pesquisa, pautar seus métodos e elaborar seus conceitos à luz
das ciências naturais, procurando chegar à mesma objetividade e ao mesmo êxito, nas formas de controle
sobre os fenômenos sociais estudados, que aquelas estavam obtendo.
Caracterizando-se pela valoração dada aos fatos e a suas relações, tal como dados pela experiência
objetiva, e pelo corte reducionista da filosofia aos resultados obtidos pela ciência, o positivismo foi o
pensamento social que aclamou o modus vivendi do apogeu da sociedade européia do sec. XIX, em
franca expansão econômica. Vem daí sua tentativa persistente na busca da resolução dos conflitos sociais
por meio da exaltação à coesão, à harmonia natural entre os indivíduos e ao bem-estar do todo social.

Émile Durkheim e os fatos sociais

Émile Durkheim, sociólogo Francês, vivenciou a Primeira Guerra Mundial e inaugura um novo
momento das Ciências Sociais. Durante seu percurso intelectual teve o compromisso de dar as Ciências
Sociais um caráter cientifico. Tem como base de sua teoria as influencias do positivismo representadas
por Augusto Comte (1798-1857) e Saint-Simon (1760-1825), além da forte influencia das teorias de
Charles Darwin e teorias biológicas
Esse intelectual viveu entre 1858 e 1917. Ele compreendia o quadro perturbador colocado pela
emergência da questão social, mas discordava essencialmente do conteúdo de soluções que começava a
ser proposto pelo pensamento socialista.
Suas convicções defendiam que os problemas sociais vividos pela sociedade europeia eram de
natureza moral e não de fundo econômico, e que estes sobrevinham devido à fragilidade decorrente de
uma longa época de transição, que provinha desde o imperialismo europeu.
No tocante ao problema da relação indivíduo-sociedade, Durkheim tomou posição a favor desta. Ele
entendia que a sociedade predominaria sobre o indivíduo, uma vez que ela é que imporia a ele o conjunto
das normas de conduta social. Seu esforço foi voltado para a emancipação da sociologia em relação às
filosofias sociais, tentando constituí-la como disciplina científica rigorosa, dotada de método investigativo
sistematizado, preocupando-se em definir com clareza o objeto e as aplicações dessa nova ciência,
partindo dos paradigmas e modelos teóricos das ciências naturais.
Ao desenvolver a sistematização de seu pensamento sociológico, Durkheim diferenciou-se de Saint-
Simon e Comte, uma vez que seu aparato conceitual foi além da reflexão filosófica, constituindo um corpo
elaborado e metódico de pressupostos teóricos sobre a problemática das relações sociais. Em função
desses aspectos teóricos originais, os estudos de Durkheim ganharam relevância para as ciências da
sociedade, tornando-se parâmetros para vários ramos de pesquisa sociológica até nossos dias.
Para ele, a Sociologia deveria ser um instrumento científico da busca de soluções para os desvios da
vida social, tendo, portanto, uma finalidade dupla: além de explicar os códigos de funcionamento da
sociedade, teria como missão intervir nesse funcionamento por meio da aplicação de antídotos que
pudessem diminuir os males da vida social. Em sua compreensão, a sociedade, como qualquer outro
organismo vivo, passaria por ciclos vitais com manifestações de estados normais e patológicos, ou seja,
saudáveis e doentios. O estado saudável seria o de convivência harmônica da sociedade consigo mesma
e com as demais sociedades, já o estado doentio seria caracterizado por fatos que colocassem em risco
essa harmonia, os acordos de convivência, o consenso.
Se a Sociologia devia, nessa concepção, ser uma espécie de medicina social, ela carecia de ocupar-
se de um objeto que lhe permitisse fornecer a chave explicativa dos códigos de funcionamento da
sociedade: os fatos sociais. Esses fatos foram levados por Durkheim à categoria de objeto de estudo, e
sua busca de compreensão deles direcionada para o favorecimento da normalidade do curso da vida
social, transformando-se, dessa maneira, em um tipo de técnica de controle social voltada para a
manutenção da ordem estabelecida pelo sistema social vigente.
Sua definição de fato social:

“toda a maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção
exterior, que é geral na extensão de uma sociedade dada, apresentando uma existência
própria, independente das manifestações individuais que possa ter.”

Na sociologia durkheimiana, a perspectiva é holística, ou seja, o todo (sociedade), apesar de ser


composto por suas inúmeras partes (indivíduos), prevalece sobre elas. Desse modo, o fato social teria a
faculdade de constranger, de vir de fora e de ter validade para todos os membros da sociedade.
Os fatos sociais possuem três características fundamentais: a coerção social, que seria o influxo
exercido pelos fatos sobre o indivíduo, induzindo-o à aceitação das regras vigentes na sociedade, a
exterioridade, que seria a função de os fatos existirem antes e fora das pessoas, e, por fim, a
generalidade, que existiria devido ao fato repetir-se, pela imposição, na maioria ou em todos os membros
da sociedade.
Durkheim defendeu ainda uma postura de absoluto rigor e não envolvimento frente ao objeto de
estudo da Sociologia. Para ele, o comportamento do cientista social deveria ser de distanciamento e sua
posição, de neutralidade frente aos fatos sociais. Essa atitude garantiria a objetividade de sua análise e,
portanto, suas bases científicas.

Durkheim e a questão da solidariedade

Em sua concepção, a Sociologia deveria voltar-se também para outro objetivo fundamental: a
comparação entre as diversas sociedades. Para isso, Durkheim estabeleceu um novo campo de estudo, a
morfologia social, que consistiria na classificação do que ele chamou de espécies sociais.
Em sua compreensão, o que ele chamou de solidariedade mecânica imperou na história de todas
as sociedades anteriores ao advento da Revolução Industrial e do capitalismo. Nelas, os códigos de
identificação social dos indivíduos eram diretos e se davam por meio dos laços familiares, religiosos, de
tradição e costumes, sendo completamente autônomos em relação ao problema da divisão social do
trabalho, que não interferiria nos mecanismos de constituição da solidariedade. Nesse caso, a consciência
coletiva exerceria todo o seu poder de coerção sobre os indivíduos, uma vez que aqueles laços os
envolviam em uma teia de relações próximas que acentuavam o controle social direto por parte da
comunidade.
A solidariedade orgânica se manifestaria, por sua vez, de modo inteiramente diferente da
mecânica. Própria da sociedade capitalista moderna, em função direta da divisão acelerada do trabalho,
que nessa sociedade exerceria influência decisiva em todos os setores da organização social, levaria os
indivíduos a se tornarem interdependentes entre si, garantindo a constituição de novas formas de unidade
social no lugar dos antigos costumes, das tradições ou das relações sociais estreitas, que caracterizavam
a vida pré-moderna. Os antigos laços diretos da consciência coletiva se afrouxariam, conferindo aos
indivíduos maior autonomia pessoal e cedendo espaço aos mecanismos de controle social indiretos,
definidos por sistemas e códigos de conduta consagrados na forma da lei.

Comte e Durkheim

Se para Comte a Teoria da História pressupunha a passagem contínua das sociedades por etapas,
ou estágios de desenvolvimento, que iriam do teológico ao positivo, findando a marcha histórica da
humanidade neste, para Durkheim a postura finalista quanto ao devir do processo histórico não muda,
apenas sofistica-se, uma vez que sua compreensão continuou sendo etapista e fatalista, ou seja, seguiu
prescrevendo para as civilizações o percurso único e inevitável que as levaria dos estágios inferiores aos
superiores de cultura e organização social, que findariam, necessariamente, com o advento da sociedade
capitalista industrial. A visão de História dos positivistas padeceu de seu fascínio pela modernidade
burguesa, a ponto de admitir que, além dela, restava para o homem apenas o aperfeiçoamento da ordem
que ela fundou, por meio das revoluções liberais.
Contudo, Comte e Durkheim são pensadores positivistas. Ambos acreditam que a sociedade possa
ser analisada da mesma forma que os fenômenos da natureza. A sociologia tem, assim, como tarefa, o
esclarecimento de acontecimentos sociais constantes e recorrentes. O papel fundamental da sociologia
seria o de explicar a sociedade para manter a ordem vigente.
Na clara síntese de Michel Löwy, o tipo ideal de positivismo pode ser dito em três idéias principais:
 a primeira é a hipótese fundamental do positivismo: "a sociedade humana é regulada por leis
naturais", leis invariáveis, independentes da vontade e da ação humana, como a lei da
gravidade ou do movimento da terra em torno do sol, de modo que na sociedade reina "uma
harmonia semelhante à da natureza, uma espécie de harmonia natural".
 dessa primeira hipótese decorre, para o positivismo, a conclusão epistemológica de que "a
metodologia das ciências sociais tem que ser idêntica à metodologia das ciências naturais,
posto que o funcionamento da sociedade é regido por leis do mesmo tipo das da natureza".
 a terceira ideia básica do positivismo, talvez a de maior consequência, reza que "da mesma
maneira que as ciências da natureza são ciências objetivas, neutras, livres de juízos de valor,
de ideologias políticas, sociais ou outras , as ciências sociais devem funcionar exatamente
segundo esse modelo de objetividade científica". Ou seja: o positivismo "afirma a
necessidade e a possibilidade de uma ciência social completamente desligada de qualquer
vínculo com as classes sociais, com as posições políticas, os valores morais, as ideologias,
as utopias, as visões de mundo", pois este conjunto de opções são prejuízos, preconceitos ou
pré noções que prejudicam a objetividade das Ciências Sociais".

Bibliografia

COSTA, Cristina. Sociologia: Introdução à ciência da sociedade. 3. ed. São Paulo: Moderna,2012.
FERREIRA, Delson. Manual de Sociologia. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

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