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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

O presente trabalho foi realizado no âmbito do Estágio Curricular em Psicologia


Clínica Cognitivo-Comportamental, realizado no Hospital Sobral Cid, integrado no 5º
Ano da Licenciatura em Psicologia da Faculdade de Psicologia e de Ciências da
Educação da Universidade de Coimbra, Ano Lectivo 2004/2005, pelos alunos
estagiários Ana Luísa Cardoso, Jorge Filipe Fernandes, Luís Miguel Simões,
Samuel Góis Silva e Sofia Ribeiro

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Índice

1. Introdução ao conceito de Esquema Precoce Mal-Adaptativo (EPM) 3


1.1 Modos Esquemáticos de Jeffrey Young 10

2. Caracterização detalhada das características e do funcionamento dos


pacientes com EPMs 11

3. Origem dos Esquemas Precoces Maladaptativos 40

4. O Processo de Perpetuação dos Esquemas Precoces Mal-Adaptativos 48


4.1 Rendição ao Esquema 50
4.2 Evitamento do Esquema 51
4.3 Compensação do Esquema 51

5. A relação terapêutica na Terapia Focada nos Esquemas 54


5.1 Esquemas e estilos de coping do terapeuta 56
5.2 Qualidades ideais do terapeuta na Terapia Focada nos Esquemas 59

6. Estratégias utilizadas na identificação e avaliação de Esquemas


Precoces Mal-Adaptativos 59
6.1 Identificação de Esquemas Precoces Mal-Adaptativos 60
6.2 Avaliação de Esquemas Precoces Mal-Adaptativos 64

7. Técnicas de Intervenção ao Nível da Mudança de Esquemas Precoces


Mal-Adaptativos 67
7.1 Técnicas emocionais/experienciais 68
7.2 Técnicas interpessoais 69
7.3 Técnicas cognitivas 70
7.4 Técnicas comportamentais 73

8. Guião de Estratégias para trabalho terapêutico com


Esquemas Precoces Mal-Adaptativos, no âmbito da Terapia Focada nos
Esquemas de Jeffrey E. Young 75

9. Recursos bibliográficos utilizados 106

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Introdução ao conceito de
Esquema Precoce Mal-Adaptativo (EPM)

Uma vez que o presente trabalho se desenvolve em torno do conceito de EPM,


parece-nos fundamental começar por esclarecer não só o próprio construto, mas
também o corpo de teoria e o contexto científico no seio do qual emergiu.

A palavra esquema não só nos é familiar do vocabulário comum, como é


também amplamente utilizada por outros campos de estudo e domínios profissionais,
como sejam a educação, a análise literária, a programação informática, entre outros.
O termo tem uma longa história de aplicabilidade na Psicologia, tendo sido
especialmente utilizado na área do desenvolvimento cognitivo, e posteriormente na
psicologia clínica baseada nos modelos cognitivos do comportamento. Todavia,
começaríamos por recuar até às raízes históricas da sua utilização teórica: este deriva
da Grécia antiga, onde os filósofos estóicos – particularmente Chrysippus – sugeriam
princípios de lógica expostos sob a forma de esquemas inferenciais. Mais tarde, no
século XVIII, ressurge pelas mãos de Kant, que o propôs para explicar a existência de
estruturas inatas na organização da nossa percepção do ambiente. A sua “importação”
para a Psicologia (cognitiva) deve-se a Bartlett, em 1932, que se serviu do construto
para explicar de que forma é que utilizamos aquilo que já sabemos para aprender algo
novo. Neste sentido, o autor propôs um “esquema” como sendo uma estrutura
cognitiva que contém a representação dos conhecimentos acerca de um domínio de
estímulos específico.
Todavia, é provavelmente a Piaget que se associa com mais frequência o uso
deste termo no seio da Psicologia Cognitiva. Este terá integrado o conceito na sua
teoria, que defendia a existência de estruturas sensório-motoras inatas (esquemas)
nas crianças, as quais permitiam filtrar e moldar o mundo na sua interacção com o
ambiente. Segundo o autor, as crianças desenvolveriam o seu conhecimento através
da interacção entre os esquemas e o ambiente, sendo que as novas informações
seriam integradas nos esquemas pré-existentes ou, na impossibilidade de
concretização deste processo, o esquema seria sujeito a modificações de forma a se
adaptar às pressões do meio.
Mas não terminou com Piaget a leitura esquemática do comportamento e da
mente humana. As teorias que sugeriam a presença de esquemas para a
compreensão do funcionamento mental humano sucederam-se ao longo dos anos.
Como nota Rijo (2000), não obstante algumas diferenças, estas várias teorias

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“defendem que o indivíduo desenvolve estruturas de conhecimento através da sua in-


teracção com o meio, estruturas estas através das quais tentam explicar a influência
das experiências passadas no processamento de nova informação, o que permite
fazer previsões acerca do mundo. Estas estruturas ou ‘esquemas’ possuem, como se
pode deduzir, uma função adaptativa, organizando experiências em padrões de signifi-
cado e reduzindo a complexidade do ambiente” (pág. 133).
Interessa-nos, contudo, perceber como é que este construto evoluiu até à
denominação de Esquema Precoce Mal-Adaptativo, sugerida por Jeffrey E. Young.
Para isso precisamos de avançar até à Terapia Cognitiva, proposta por Aaron T. Beck
em meados dos anos 60 e exponenciada na “Terapia Cognitiva da Depressão”,, não
sem antes fazer uma breve revisão do Paradigma do Processamento de Informação
que lhe está subjacente.
Este paradigma deriva da Psicologia Cognitiva Experimental (anos 50) que foi
buscar à cibernética o termo informação, e se sustenta na analogia cérebro-
computador. O seu foco de interesse é perceber a forma como prestamos atenção,
seleccionamos, percepcionamos, codificamos, damos significado, reorganizamos,
retemos e recuperamos a informação. Ou seja, os modelos do processamento de
informação estão dirigidos para os processos mentais superiores. Encaram o indivíduo
não como utilizador passivo da informação, mas antes como utilizador e ao mesmo
tempo criador activo dessa informação. Esta perspectiva constitui uma evolução
relativamente aos paradigmas da aprendizagem anteriormente propostos,
particularmente os condicionamentos clássico e operante, cuja tónica era sobretudo
colocada na determinação ambiental, subvalorizando o papel activo do sujeito neste
processo.
Na impossibilidade de reter toda a informação disposta pelo meio, uma vez que
o cérebro tem uma capacidade limitada, são os processos de atenção selectiva que
vão determinar que informação é que é processada por nós. Isto pressupõe que
apenas parte da informação seja retida e a outra parte seja inevitavelmente ignorada.
Pressupõe ainda que existam mecanismos capazes de determinar qual a informação a
ser processada. Por exemplo, numa situação ambígua, estes mecanismos permitiriam
a selecção de um significado, em detrimento de outros possíveis. Esta noção abre
assim portas ao pressuposto de uma atribuição idiossincrática de significados -
sustentada pela existência de estruturas pré-existentes de conhecimento - bem como
à possibilidade de enviezamentos nessa leitura. Foi a partir da constatação de
enviezamentos sistemáticos, protagonizados pelos indivíduos deprimidos, que Beck
deu início àquela que mais tarde viria a ser denominada de “Revolução Cognitiva”. O
que o autor constatou, primeiro naquela população clínica e posteriormente nos

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restantes distúrbios emocionais, é que aqueles enviesamentos não se circunscrevem


à atenção selectiva e à selecção de atribuições! Eles estendem-se também à forma
como a informação é posteriormente armazenada, postulando que aquela fica
arquivada com um significado específico, que a torna mais propensa à evocação de
memórias – sendo que a própria evocação destes conteúdos pode revelar-se
preferencial a outros possíveis.
O Paradigma do Processamento de Informação constituiu-se, assim, como um
quadro conceptual capaz de permitir o estudo da forma como os processos mentais
superiores medeiam o comportamento, as emoções e as cognições.
A teoria de Beck assenta em três conceitos fundamentais, a saber:
Pensamentos Automáticos, conceito de Esquema e conceito de Distorções ou Erros
Cognitivos. Os primeiros seriam conscientes mas involuntários, ou seja, surgiriam
espontaneamente na mente do indivíduo. Podem tomar a forma de pensamentos,
imagens, auto-avaliações, etc.. Os Esquemas Cognitivos remeter-nos-iam para um
nível inconsciente, ao qual não temos acesso directo. Beck entende-os como
representações estáveis do conhecimento que o sujeito faz acerca de si próprio, dos
outros e do mundo, que orientam o processamento de informação. Acrescenta que, ao
não podermos aceder-lhes directamente, teríamos todavia acesso ao produto da sua
activação: os Pensamentos Automáticos. Por fim os Erros Cognitivos seriam derivados
do própria Esquema, que seleccionaria aquela informação (a ser processada) e
atribuição de significado que fosse consistente com o seu conteúdo, ignorando
informação contraditória.
Ao assumir uma preferência sistemática dos indivíduos com perturbações
emocionais para escolherem leituras enviesadas das situações, a Terapia Cognitiva de
Beck representa uma abordagem da psicopatologia com base nesta perspectiva. O
autor propõe que a terapia tenha como objectivo final a modificação dos esquemas
que subjazem aos sintomas do doente.
A evolução deste modelo deu origem a refinamentos, e sobretudo a um
progressivo aumento do destaque destas estruturas de significado. Como nota Rijo
(2000), “é com a sistematização da terapia cognitiva dos Distúrbios de Personalidade
que o construto de esquema ganha maior destaque e complexidade no modelo
cognitivo” (p. 137). Em 1990, Beck e colaboradores publicam a primeira obra que
adapta a Terapia Cognitiva ao tratamento dos Distúrbios de Personalidade (Cognitive
Therapy of Personality Disorders), onde é proposta uma intervenção centrada na
identificação e modificação dos esquemas disfuncionais apresentados por estes
doentes. Nesta obra os autores esclarecem que os esquemas mal-adaptativos, que
caracterizam os distúrbios de personalidade, são activados na maior parte das

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situações, tem uma qualidade compulsiva e são mais difíceis de controlar e de mudar.
Como se percebe, a evolução teórica relativamente à concepção de esquema
adoptada para os doentes do Eixo I, consiste na assunção de que aqueles que estão
subjacentes às perturbações do Eixo II operam numa base mais contínua no
processamento de informação. Em suma, as atitudes e comportamentos dos doentes
com perturbações de personalidade são sobregeneralizados, inflexíveis, imperativos e
resistentes.
Convém ainda salientar que, segundo as concepções de Beck, estes esquema,
ou crenças, estão presentes tanto nos indivíduos normais como naqueles com
psicopatologia. O que os distingue é que os segundos possuem-nos de uma forma
mais pronunciada, dando origem a um maior número de comportamentos
desadequados. Os indivíduos que desenvolvem psicopatologia serão aqueles cujos
esquemas são mais difíceis de controlar e que serão evocados em muitas mais
situações.
Ainda uma noção que importa reter é a de que os esquemas, muitos dos quais
são formados precocemente na vida, continuam a elaborar-se ao longo da evolução
do indivíduo e a determinar o seu tipo de interacções, mesmo quando já não são
consistentes com o seu contexto. E dito isto, é preciso salvaguardar que em
determinado momento da vida do indivíduo, o esquema foi importante para dar sentido
à situação no seio da qual se encontrava. A disfuncionalidade começa quando essa
estrutura de significado se perpetua, independentemente de já não ser consistente
com o contexto, dando por isso origem a erros, distorções e enviezamentos no
processamento de informação. Este procedimento é muitas vezes entendido como
sendo fruto da “consistência cognitiva”, a qual implica que se mantenha uma
determinada visão de si próprio, dos outros e do mundo, apesar de ser imprecisa e
distorcida. Em suma, importa reter a noção de que os esquemas podem ser
adaptativos ou mal-adaptativos, e de que podem formar-se na infância ou mais tarde
na vida.
Mais recentemente surgiram evoluções ao modelo de terapia e compreensão
proposto por Beck para os Distúrbios de Personalidade. Na década de 90 Jeffrey
Young sugeriu um novo modelo, conhecido como Terapia Focada nos Esquemas, o
qual deriva do reconhecimento da dificuldade em utilizar a Terapia Cognitiva Breve
com este tipo de doentes. Este autor postulava que alguns dos esquemas,
particularmente aqueles desenvolvidos inicialmente em virtude de experiência infantis
nocivas, estariam subjacentes aos Distúrbios de Personalidade, a alguns problemas
de temperamento mais brandos, e a muitos dos distúrbios crónicos do Eixo I. Foi com
o intuito de explorar esta ideia que ele definiu um subconjunto de esquemas, aos quais

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deu o nome de ESQUEMAS MAL-ADAPTATIVOS PRECOCES. Inicialmente Jeffrey Young


postulou a existência de 16 EPMs tendo, após sucessivas re-conceptualizações,
chegado a um Modelo de 18 esquemas, que caracterizam a maioria dos doentes com
perturbação da personalidade ou outros distúrbios crónicos. Estes esquemas surgem
agrupados em cinco domínios gerais: Distanciamento e Rejeição, Autonomia e
Desempenho Deteriorados, Limites Deteriorados, Influência dos Outros e, por fim,
Sobrevigilância e Inibição - cada um dos quais relacionado com uma necessidade
nuclear da infância.
Rijo (2000) considera que esta proposta não deve ser encarada como uma
nova conceptualização teórica, mas antes como um desenvolvimento da compreensão
e tratamento proposta por Beck, para os doentes de Eixo II.

Seguidamente passamos a esclarecer o conceito de EPM proposto por Young,


de resto o mesmo que está subjacente a todo o conteúdo do presente trabalho.

De forma breve, podemos considerar que ESQUEMAS PRECOCES MAL-


ADAPTATIVOS (EPMs) são padrões cognitivos e emocionais que são auto-destrutivos,
que se desenvolvem desde cedo e que se repetem ao longo da nossa vida. De notar
que, de acordo com esta definição, o comportamento do indivíduo não faz parte do
esquema! A teoria de Young postula que os comportamentos mal-adaptativos se
desenvolvem como resposta ao esquema, ou seja, eles são conduzidos pelo esquema
mas não fazem parte dele.
De forma alargada diríamos que, segundo o autor, EPM é: um padrão ou tema
alargado e difuso; que abrange memórias, emoções, cognições e sensações
corporais; que diz respeito ao próprio indivíduo e à sua relação com os outros;
desenvolvido na infância ou adolescência; elaborado ao longo da vida do indivíduo; e
significativamente disfuncional.
Propomo-nos, agora, analisar algumas das principais características dos
EPMs.
Ao contrário do que possamos pensar, nem todos os esquemas derivam de
traumas ou de maltrato na infância. Para exemplificar esta ideia, vejamos o que se
passa no desenvolvimento do Esquema de Dependência/Incompetência: os sujeitos
com este esquema podem nunca ter experienciado episódios de mau trato! Em vez
disso, podem ter sido excessivamente vigiados e protegidos ao longo da infância.
Apesar de nem todos os esquemas terem sido erigidos sob vivências
traumáticas, todos eles são destrutivos, sendo que a maior parte é efectivamente
causada por experiências nocivas e repetitivas que ocorrem durante a infância e

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adolescência. O efeito dessas experiências é cumulativo, levando posteriormente à


emergência de EPMs.
Uma das principais características que Young aponta aos EPMs é o facto
destes lutarem pela sobrevivência, o que é resultado da necessidade humana de
consistência. Apesar do sofrimento que causa, o esquema é familiar e confortável ao
indivíduo, e é por isso que eles são tão resistentes à mudança. Os doentes assumem
os esquemas como verdades apriorísticas, permitindo-lhes desta forma influenciarem
as suas experiências de vida. Ao desempenharem um papel fundamental na forma
como os pacientes pensam, sentem, agem e se relacionam com os outros, os EPMs
levam inadvertidamente os doentes a recriarem em adultos os seus contextos de vida
de crianças. Esta recriação é habitualmente fidedigna. Queremos com isto dizer que
os relatos que os doentes fazem dos seus ambientes de criança são habitualmente
precisos, ou seja, os seus esquemas reflectem de forma justa o contexto em que
cresceram. Apesar de, no presente, as suas atribuições serem sistematicamente
enviesadas, o seu sentimento do clima emocional e da forma como foram tratados é
habitualmente válido.
Um EPM pode ser mais ou menos severo, sendo que quanto maior for o grau
de severidade, maior é também o número de situações que o activa. Veja-se o
exemplo de um indivíduo que experienciou criticismo desde cedo na vida, de uma
forma extrema e frequente, proporcionado por ambas as figuras parentais.
Provavelmente qualquer contacto interpessoal deste sujeito é capaz de activar o seu
Esquema de Defeito. Todavia, se as suas vivências de criticismo surgirem mais tarde
na sua vida, de forma ocasional e pouco pronunciada, e foram protagonizadas apenas
por uma das figuras parentais, neste caso o indivíduo tem bastantes menores
hipóteses de vir a activar o mesmo esquema.
Convém também salientar que quanto mais severo for o esquema, mais
intenso será o afecto negativo quando o esquema for activado e mais tempo irá
prevalecer.
No âmbito do processo terapêutico, o terapeuta deverá fornecer um racional
claro e sucinto, adequado ao desenvolvimento cognitivo do paciente, que exprima as
características basilares do Esquema Precoce Mal-Adaptativo, assim como que
elucide o paciente sobre a forma como está relacionado com o funcionamento actual
deste e, consequentemente, com as razões que o trazem à consulta.
A compreensão deste racional poderá ser promovida pela utilização de
metáforas, que consubstanciem o seu entendimento, potenciando, paralelamente, o
próprio processo terapêutico. Assim, o terapeuta poderá utilizar, neste sentido,
algumas imagens metafóricas como comparar o esquema e o funcionamento

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correspondente a uns óculos velhos, a uns velhos sapatos confortáveis que, muito
embora estejam ultrapassados, não nos conseguimos livrar deles pelo facto de nos
apegarmos a estes ou a um programa de computador com vírus, entre outras. No
quadro I, exemplificamos um possível racional, estabelecendo um paralelismo com a
metáfora dos óculos velhos, muito utilizada em contexto clínico.
No âmbito da conceptualização esquemática do paciente importa atender à
distinção entre EPMs nucleares,
Exemplo de racional do EPM a dar ao doente
secundários e associados. Assim,
O esquema é uma crença extremamente forte acerca
no início do processo terapêutico
de nós mesmos, dos outros e do mundo, que aprendemos nos
é importante proceder a uma primeiros tempos de vida, a partir das relações com os outros e

correcta avaliação de “alvos” de diferentes experiências de vida, que funciona como um filtro
entre nós e a realidade. Esta crença, uma vez adquirida é
terapêuticos, identificando um ou assumida por nós como uma verdade absoluta que, portanto,
dois Esquemas Precoces Mal- não colocamos em causa, pelo que, sem que tenhamos disso
consciência, interfere na forma como vemos o mundo e como
Adaptativos nucleares, por onde
encaramos o dia-a-dia, desencadeando a vivência de níveis de
começar o processo de mudança. desconforto muito intensos. Assim, o esquema influencia as
Os Esquemas Nucleares nossas relações, o nosso desempenho e o nosso bem-estar
físico e mental. Pelas suas características, o esquema “luta
são caracterizados pelo facto de
pela sua sobrevivência”, resistindo às nossas tentativas de
desencadearem níveis elevados encarar a realidade de outra forma.

de afecto, estando subjacente aos Os esquemas funcionam como uns óculos velhos,
cuja graduação é presentemente inadequada, pelo que aquilo
problemas de vida mais sérios e que vemos através destes, muito embora não nos
duradouros da vida do paciente, apercebamos, se encontra distorcido. Assim, apesar de
estarmos habituados e nos sentirmos confortáveis utilizando
estando ligados,
diariamente os óculos antigos, será positivo encontrar uma
fundamentalmente aos problemas nova graduação, mais consonante com as nossas
desenvolvimentais mais sérios, necessidades e, na verdade, com a própria realidade.

durante os anos iniciais, com os


pares e os familiares significativos.
Os Esquemas Associados são melhor explicados por referência a um esquema
nuclear, não desempenhando um papel fulcral na conceptualização da situação do
paciente.
Por fim, os Esquemas Quadro I – Proposta de racional de EPM

Precoces Mal-Adaptativos Secundários são relativamente independentes dos


Esquemas Nucleares e parecem ser menos salientes e prioritários no trabalho
terapêutico. Assim, estes esquemas particulares serão objecto de trabalho terapêutico
numa fase posterior do processo.

Dois autores - a saber, Elliott e Lassen (1997 in Young et al, 2003), sugerem
que para cada EPM proposto por Young, existe um esquema adaptativo

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correspondente. Young (2003) sugere que, considerando as etapas psicossociais de


Erikson (1950), podemos admitir que a resolução bem sucedida de cada etapa resulte
num esquema adaptativo, enquanto que a sua não resolução poderia dar origem a um
esquema mal-adaptativo.

Quadro II – Quadro-resumo das características dos EPMs


Em jeito de resumo, e atendendo à perspectiva de Young (1999), é possível
enunciar seis características que definem e caracterizam o Esquema Precoce Mal-
Adaptativo, enquanto construto utilizado na conceptualização da psicopatologia dos
pacientes. Assim:

1. Os EPMs são crenças incondicionais acerca do sujeito em relação ao mundo.


Desta forma funcionam como verdades a priori, que são tomadas como verdades
absolutas.
2. Os EPMs são auto-perpetuadores e, por isso, são resistentes à mudança.
3. Por definição, um EPM deve significativamente disfuncional e interferir na vida do
sujeito, podendo conduzir, de forma directa ou indirecta, ao surgimento de
perturbações psicopatológicas
4. Os EPMs são, geralmente, activados por estímulos do ambiente relacionados
com o seu conteúdo.
5. A activação emocional dos EPMs origina níveis de activação emocional mais
elevados do que os associados às assunções compensatórias correspondentes.
6. Os EPMs parecem resultar de padrões relacionais disfuncionais com os pais,
familiares, pares e outros significativos durante os primeiros anos de vida do
indivíduo, que progressivamente se consolidam e cristalizam, consubstanciados pela
forma como o indivíduo os vivencia e interpreta.

Modos Esquemáticos de Jeffrey Young

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Antes de terminar esta exposição torna-se ainda premente falar de um outro


conceito proposto por Young, uma vez que ele é mencionado não raras vezes ao
longo deste trabalho. Falamos dos Schema Modes ou Modos Esquemáticos, que o
próprio autor considera ser um dos conceitos mais difíceis de explicar da teoria, devido
ao facto de englobar muitos elementos. Vamos, por isso, tentar simplificar a explicação
do construto, deixando apenas antever as suas principais características.
Um Modo representa um grupo de esquemas que está activado em
determinado momento (nem todos os EPMs são activados em simultâneo), num
determinado sujeito, ou por outras palavras, diz respeito ao estado predominante em
que nos encontramos numa determinada altura. Dito ainda de outra forma, os modos
esquemáticos são os estados emocionais e estilos de coping que todos
experienciamos momento a momento, quer sejam adaptativos ou mal-adaptativos. A
determinada altura no nosso dia-a-dia, alguns dos nossos esquemas estão
inoperacionais, enquanto que outros ficam activados por algum acontecimento de vida,
predominando no nosso humor e comportamento. Esse predomínio representa um
Modo Esquemático activo. Ao longo do dia oscilamos entre vários Modos possíveis,
uns adaptativos, outros mal-adaptativos, sendo que activação de um deles obriga à
necessária desactivação do anterior. Consoante aquele activado, assim o tipo de
cognições, comportamentos e emoções que o indivíduo apresenta. Quando ocorre
uma alteração do modo, diferentes esquemas e estilos de coping previamente
“adormecidos” ficam activos.
Assim, poderíamos dizer que um Modo Esquemático pretende responder à
questão: “nesta altura, que conjunto de esquemas ou processos esquemáticos é que o
paciente está a manifestar?”.
Até ao momento Jeffrey Young e os seus colaboradores identificaram 10
Modos Esquemáticos, os quais podem ser agrupados em quatro categorias alargadas:
Modos de Criança, Modos dos Estilos de Coping Disfuncionais, Modos dos Pais
Disfuncionais e por fim Modo do Adulto Saudável.
As implicações deste construto para a terapia consistem em assumir a
necessidade do clínico utilizar estratégias terapêuticas diferentes, consoante o modo
que está activado. Acresce ainda que o objectivo final da terapia deva ser a eliminação
dos modos mal-adaptativos, promovendo simultaneamente o desenvolvimento e a
integração de modos saudáveis.

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Caracterização detalhada das características e funcionamento dos pacientes


com
Esquemas Precoces Mal-Adaptativos

Domínio do Distanciamento e Rejeição

Os esquemas pertencentes a este domínio são encarnados por pacientes que


se revelam incapazes de estabelecer ligações seguras e satisfatórias com os outros.
Eles acreditam que as suas necessidades de segurança, estabilidade, apoio,
cuidados, empatia, partilha de sentimentos, aceitação e respeito não serão
suficientemente satisfeitas. São doentes habitualmente originários de famílias instáveis
(Abandono/Instabilidade), abusivas (Desconfiança/Abuso), frias (Privação Emocional),
rejeitantes (Defeito/Vergonha) ou isoladas do contacto com o mundo (Isolamento
Social/Alienação). Young et al (2003) consideram que os esquemas deste domínio são
os que mais danos causam aos doentes, particularmente os quatro primeiros. São
habitualmente desenvolvidos num contexto de infâncias traumáticas, seguidas de uma
adultez onde os indivíduos se precipitam para consecutivas relações nocivas e auto-
destrutivas ou, em alternativa, evitam por completo qualquer relação íntima.
De notar que a relação terapêutica, a priori um elemento muito importante para
a terapia, é habitualmente central no tratamento de pacientes com esquemas deste
domínio.

Abandono / Instabilidade
Diz respeito à percepção de instabilidade ou de incerteza quanto à
disponibilidade daqueles que são fonte de suporte e de ligação/afiliação. Envolve a
sensação de que os outros significativos não conseguirão continuar a fornecer suporte
emocional, afiliação, força e protecção, por numerosas razões: devido ao facto de
serem emocionalmente instáveis e imprevisíveis, por não se poder contar com eles ou
por não estarem presentes quando precisamos deles; porque podem morrer a
qualquer momento; ou porque podem abandonar o indivíduo em favor de alguém
melhor.
Como consequência desta forma de ver o mundo/os outros, os indivíduos com
este esquema vivem na apreensão constante de perder aqueles que lhe são queridos,
estando por isso hipervigilantes a sinais que possam indicar a sua possível perda.
Nesse sentido, exibem frequentemente comportamentos do tipo possessivo, como
apegar-se demasiadamente às pessoas ou tornar-se controlador em relação aos
outros, chegando a acusá-los de o quererem deixar. A presença do esquema pode

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também levar a que a pessoa se torne ciumenta e manifeste competitividade para com
aqueles que ela entende serem seus rivais.
As emoções mais comuns, provocadas pela activação deste esquema, são a
ansiedade crónica (sustentada pelo tema da perda eminente dos outros), a tristeza e a
depressão quando de facto ocorre uma perda - ainda que esta possa ser apenas
percebida e não efectiva. Nestas circunstâncias, são ainda despoletadas emoções do
tipo da cólera ou da raiva para com a pessoa que a abandonou, podendo, na sua
forma mais intensa, chegar a atingir a fúria. De salientar que os pacientes com
esquema de abandono podem zangar-se mesmo quando as pessoas os deixam
apenas por curtos períodos de tempo.
A escolha desadaptativa do parceiro, enquanto processo de manutenção do
esquema, manifesta-se pela eleição de companheiros que, pelas suas contingências,
são inconstantes e/ou têm uma grande probabilidade de abandonar a relação (ex.:
pessoas comprometidas ou extremamente ocupadas). Será este o tipo de pessoas
que tipicamente surtem um sentimento de atracção por parte daqueles que possuem o
esquema tratado, chegando estes a apaixonarem-se perdidamente pelos primeiros.
Pode também ocorrer, enquanto forma de impedir a activação do esquema,
que estes sujeitos evitem toda e qualquer tipo de relação íntima, protegendo-se desta
forma do potencial abandono.
Não raras vezes, o Esquema de Abandono surge aliado a outros EPMs. Um
deles é o Esquema de Subjugação: os indivíduos acreditam que se não cederem
persistentemente à vontade dos outros, aqueles o podem abandonar. Nesse sentido
tornam-se submissos, como forma de garantir a perpetuação dos laços com os outros
significativos para si. Também o Esquema de Defeito surge frequentemente associado
a este, uma vez que o paciente tende a acreditar que será abandonado quando
aqueles que lhe são queridos descobrirem os seus defeitos. Por fim, o Esquema de
Dependência/Incompetência surge também ocasionalmente associado ao aqui
tratado, consubstanciado na crença que os pacientes alimentam de que serão
incapazes de sobreviver sozinhos.
A presença do Esquema de Abandono coloca alguns desafios à terapia, na
medida em que o tema da separação é frequentemente levantado, quer pelo final de
uma consulta, pelas férias do terapeuta ou simplesmente pela mudança de uma data
de consulta. Nestes momentos é possível assistir à activação do esquema sob a forma
de receio ou irritação por parte do doente. Estes episódios devem ser aproveitados
enquanto “material” a ser trabalhado entre ambos, através da confrontação empática.
Ou seja, o terapeuta deve explicar ao paciente que estas são boas experiências para
desconfirmar aquela crença, na medida em que, apesar de compreender o seu receio,

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a verdade é que a separação física de ambos não significa que não continuem ligados!
Além disso, o terapeuta irá voltar e desta forma, reencontrar o doente.
Todavia existem outras formas do Esquema de Abandono se manifestar em
consulta. Uma das variantes consiste no paciente revelar-se demasiadamente
complacente, procurando desta forma que o terapeuta não o deixe. Aquele, “veste” um
papel de bom doente, mas que não é genuíno.
Numa outra variante, os pacientes podem rodear demasiadamente o terapeuta,
procurando-o com muita frequência, mesmo no intervalo entre as consultas, quer para
buscar apoio, quer simplesmente para ter a oportunidade de falarem novamente.
Os pacientes evitantes revelam uma postura precisamente oposta. Podem
tornar-se erráticos na assiduidade às consultas, mostrando-se relutantes a respeitar
uma frequência regular, assim como podem abandonar precocemente a terapia, com o
intuito de não se apegarem demasiadamente ao terapeuta.
Por fim, uma última variante da forma como o esquema de abandono se
retracta na relação terapêutica, diz respeito às tentativas do paciente para testar o
clínico. Isto pode ser feito, quer através de ameaças de abandono da terapia, quer por
via de acusações de que o terapeuta tenha o intuito de ser ele a abandoná-la.
Há ainda um risco, proveniente do trabalho com doentes com Esquema de
Abandono, que importa salientar. É possível que estes façam do terapeuta a figura
central do seu mundo, em vez de desenvolverem relações interpessoais saudáveis,
capazes de os dotarem de estabilidade emocional. Obviamente, este não é de todo o
objectivo último da terapia, constituindo-se, pelo contrário, como a solução anti-
terapêutica para o esquema. O trabalho com estes doentes deve, portanto, ir no
sentido de os preparar para estabelecer relações de confiança no seu meio familiar e
social.

Desconfiança/Abuso
Consiste numa expectativa de que os outros irão magoar-nos, abusar de nós,
humilhar-nos, trair-nos, mentir-nos, manipular-nos ou aproveitar-se de nós.
Habitualmente, envolve a percepção de que o mal é intencional ou resultado de uma
negligência extrema e injustificada. Pode incluir a sensação de que se acabará sempre
por ser traído ou de que se sairá sempre a perder, independentemente das
circunstâncias.
Em virtude desta crença, os pacientes com este esquema não admitem que os
outros possam ser genuinamente honestos e agir com boas intenções, de boa fé,
envergando por isso uma postura defensiva e desconfiada. As suas interpretações
podem oscilar entre dois pólos: achar que as pessoas só se interessam por si próprias

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e portanto não se importam de passar por cima dos outros para conseguirem o que
querem; ou acreditar que os outros os querem prejudicar deliberadamente, por serem
cruéis e sádicos. Na vivência mais extrema deste esquema, os pacientes podem achar
que os outros os querem torturar e abusar sexualmente.
Daqui se compreende que estes indivíduos tendam a evitar as relações
íntimas, e não compartilhem os seus pensamentos e emoções com os demais. Pode
mesmo acontecer que sejam eles primeiramente a enganar e a abusar de terceiros,
numa lógica de atacar para não ser atacado (“enganá-los antes que eles me enganem
a mim”).
De uma maneira geral, poder-se-á dizer que os comportamentos típicos destes
sujeitos oscilam entre o desempenho do papel de vítima e o de abusador.
Relativamente à escolha de parceiros, assistimos frequentemente à selecção
de companheiros que são eles mesmos abusadores, seja física, psicológica ou
sexualmente. Podemos também observar o oposto, ou seja, ver estes indivíduos
desempenharem eles mesmos o papel de abusadores na relação. Há ainda a
possibilidade de que os pacientes, com o esquema aqui tratado, se invistam da função
de “salvadores” de pessoas abusadas.
Uma atitude não menos comum é a expressão de raiva que estes sujeitos
dirigem àqueles que vêem como abusadores.
O comportamento des1tes indivíduos, devido à sua busca incessante por
provas e pistas que esclareçam acerca da lealdade dos outros, aparece-nos muitas
vezes como paranóide, fruto da distorção no processamento de informação a que eles
involuntariamente se sujeitam enquanto reúnem “evidências” das más intenções dos
outros.
O Esquema de Desconfiança/Abuso, a par com o anteriormente descrito, são
habitualmente aqueles que mais tempo exigem para serem tratados. Não constituindo
completamente uma surpresa, a primeira dificuldade que ele coloca à terapia reside
na possível falta de confiança que o paciente pode expressar, no terapeuta. À
semelhança do que acontece nas demais relações interpessoais, o doente pode
encontrar alguma dificuldade em confiar no clínico e desta forma pôr em risco a
relação terapêutica, que pretende ser ela mesma desconfirmatória do esquema.
Particularmente se o indivíduo apresentar comportamentos compensatórios rígidos,
pode manter a distorção que faz habitualmente, não sendo por isso capaz de confiar
suficientemente no terapeuta para se abrir e consequentemente sujeitar-se a ser
tratado. Independentemente das estratégias eleitas pelo clínico, o paciente poderá
distorcer constantemente as suas intenções, no sentido de confirmar o seu próprio
EMP.

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Todavia, este constitui apenas um pior cenário, dentro de um leque maior de


possibilidades. Pode simplesmente acontecer que o paciente não deseje que o
terapeuta faça anotações, ou que se recuse a preencher questionários, ou que
sonegue dados importantes pelo receio de que a informação seja usada contra si.
Young et al (2003) sugerem que se acatem estas relutâncias tanto quanto possível,
não deixando contudo de as apresentar ao doente como exemplos da perpetuação do
Esquema de Desconfiança/Abuso.

Privação Emocional
Expectativa de que as nossas necessidades emocionais não serão
adequadamente satisfeitas pelos outros. Os três principais tipos de privação consistem
em:
A) Privação de Apoio e Cuidados: ausência de atenção, afecto, carinho ou
companheirismo; os indivíduos sentem que não têm ninguém que cuide deles com
especial dedicação, que os conforte e lhes dê amor; sentem que não têm ninguém que
se importe verdadeiramente com eles.
B) Privação de Empatia: ausência de compreensão, escuta, abertura ou
partilha mútua de sentimentos por parte dos outros; crença de que ninguém os escuta
realmente, ou os tenta compreender na essência das suas queixas.
C) Privação de Protecção: ausência de força, direcção e orientação por parte
dos outros; sentimento de que apesar de prestarem frequentemente apoio e protecção
aos outros, não possuem eles mesmos ninguém para os proteger e orientar.
Young et al (2003) referem-se a este esquema como sendo possivelmente
aquele que com mais frequência surge em consulta. Tipicamente os pacientes chegam
tristes, sentindo-se amargurados e deprimidos, sem no entanto serem capazes de
identificar as razões desse estado de espírito. Podem também surgir com queixas e
sintomas vagos ou pouco claros, que vêm mais tarde a revelar-se estarem
relacionados com este esquema.
De uma forma geral, estes pacientes sentem-se incompreendidos e sozinhos
no mundo, uma vez que não esperam que ninguém seja capaz de satisfazer as suas
necessidades emocionais e de os compreender, o que se estende ao terapeuta. Neste
sentido podem sentir-se vazios, enganados no amor, bem como invisíveis para os
outros.
Existe um conjunto de comportamentos, que derivam da presença do Esquema
de Privação Emocional, tais como: não expressar o seu desejo por carinho e conforto
emocional; falar pouco de si próprio, preferindo interpelar os outros acerca das suas
vidas; fazer-se passar por mais forte do que é na realidade; e ainda, reforçar o próprio

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esquema ao agir como se não tivesse necessidades emocionais, numa clara


estratégia de compensação. Uma vez que estes indivíduos não esperam conseguir
suporte emocional, tendem a não o pedir e, consequentemente, não o recebem – um
ciclo vicioso que apenas perpetua este esquema.
Importa também descrever como se desenha, para o esquema, a escolha
desadaptativa de parceiros. Estes pacientes tendem a eleger, para pessoas
significativas, indivíduos que não podem ou não querem entregar-se emocionalmente;
habitualmente pessoas frias, egoístas, que agem de forma distante, ou pelo contrário
que são elas próprias muito carentes, e portanto improváveis de serem capazes de
fornecer suporte emocional. Os pacientes mais evitantes poderão encarnar um outro
tipo de padrão: evitar relações próximas, uma vez que não esperam obter nada de
reconfortante das mesmas, tornando-se assim solitários; ou então suportar apenas
relações distantes.
O Esquema de Auto-Sacrifício surge frequentemente associado a este. A
relação estabelece-se provavelmente porque os indivíduos com privação emocional
procuram dar aos outros aquilo que necessitam para si, procurando ao mesmo tempo
obter o carinho e atenção dos outros pela sua dedicação e esforço. Mas esta relação
pode observar-se tendo como ponto de partida o auto-sacrifício: ao voluntariarem-se
para ajudar tudo e todos, podem não se sentir suficientemente gratificados do seu
esforço e, nesse sentido, sentirem que não recebem o amor e afeição equivalente
àquele que dão aos outros. Ou podem ainda sentir-se emocionalmente desprovidos
porque estão constantemente a direccionar a sua atenção para as necessidades dos
outros, descurando as suas próprias carências.
Uma forma destes sujeitos compensarem o seu Esquema de Privação
Emocional, consiste em tornarem-se exigentes para com os outros, revelando-se
irascíveis quando não vêem as suas necessidades satisfeitas. Ocorre também que
muitas das vezes estes pacientes sejam concomitantemente Narcísicos; isto porque,
uma vez que foram negligenciados e carenciados na infância, desenvolveram a noção
de que têm direito a ver satisfeitos os seus caprichos, acreditando que devem ser
inflexíveis na exigência dessas vontades, a fim de as alcançar.
Existe ainda uma minoria de pacientes, com este mesmo esquema, cuja sua
origem é significativamente diferente. Tratam-se de indivíduos que, enquanto crianças,
foram mimados com bens materiais, adorados por algum dom ou talento especial e/ou
desprovidos de uma educação assente em regras e valores, não tendo, contudo,
recebido afecto genuíno.
Há também uma pequena percentagem de doentes, cuja exibição do esquema
se faz noutros moldes. São sujeitos que manifestam exageradas necessidades, de tal

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forma que chegam a parecer desesperados ou mesmo histriónicos. Podem apresentar


diversas queixas físicas (de cariz psicossomático), como forma de obter, enquanto
ganho secundário, o apoio e a atenção dos outros. Refira-se, contudo, que os doentes
não têm habitualmente consciência disso.
O problema mais comum que se coloca à terapia, no trabalho com este
esquema, diz respeito ao facto dos pacientes ignorarem por completo a sua existência,
e o seu consequente modo de funcionamento. É fundamental ajudá-los a estabelecer
a ligação entre o seu estado de espírito (ex.: depressão, solidão, queixas
psicossomáticas) e a lacuna que existe na satisfação das suas necessidades
emocionais. Todavia este não é habitualmente um trabalho fácil. Como já foi
mencionado, os pacientes não reconhecem a presença do esquema, e revelam-se
resistentes em aceitar a ligação atrás referida. Frequentemente negam que as suas
necessidades emocionais sejam tão importantes e dignas de atenção. São
habitualmente pessoas que consideram uma prova de fraqueza pedir apoio emocional
aos outros. Nesse sentido, resistem bastante a aceitar a criança solitária que existe
dentro deles, e que anseia por suporte e afeição, quer do terapeuta, quer das outras
pessoas significativas do seu meio envolvente.
Uma outra dificuldade, proporcionada pela presença deste esquema, diz
respeito à crença, que por vezes estes pacientes têm, de que aqueles que lhe são
próximos têm o dever de conhecer as suas dificuldades, e por isso eles não tem de
lhas dizer. Este é também um entrave à tarefa que o paciente deve desenvolver, que
consiste em pedir aos outros para satisfazer as suas necessidades. Este entrave é
ultrapassado, explicando ao paciente que faz parte da natureza humana ter forças e
ter fraquezas. Ao cultivarmos apenas as forças, estamos a descurar e a negar uma
parte de nós, e a ambicionar não sermos humanos! É preciso sublinhar-lhes que a
vulnerabilidade e consequente procura de ajuda nos outros, é um comportamento
saudável e normativo.

Defeito/Vergonha
Sentimento de que se é “um defeito”, mau, indesejado, inferior ou sem valor
quando se trata de coisas importantes; ou de que não se seria amado por outros
significativos se se expusesse tal como é. Pode envolver uma série de atitudes, a
saber: hipersensibilidade à crítica, à rejeição e à culpa; uma consciência de si
aumentada quando está perto dos outros, bem como comparações e insegurança;
e/ou uma sensação de vergonha relativamente aos defeitos percepcionados.

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Estes defeitos podem ser privados (egoísmo, impulsos agressivos, desejos


sexuais inaceitáveis,…) ou públicos (aparência física indesejável, inadequação social,
…).
Uma vez que estes doentes têm uma tão má percepção de si mesmos, sofrem
habitualmente de sentimentos crónicos de vergonha acerca da pessoa que são. A
distorção é de tal forma insidiosa, que eles podem ver como defeituosa qualquer uma
das suas características (gordo de mais, magro de mais, alto de mais, baixo de mais,
preguiçoso de mais, feio de mais, mau de mais, fraco de mais...). Muitas das vezes a
vergonha que sentem de si mesmos não provém exactamente de algo que fizeram,
mas antes de algo que acham que são.
Entende-se, portanto, que estes indivíduos temam as relações interpessoais,
uma vez que receiam aquele momento inevitável em que os seus defeitos ficarão
expostos; em que os outros serão capazes de reconhecer as suas “tão graves”
imperfeições e despoletar-lhes o sentimento de vergonha, o que pode acontecer tanto
no seu domínio privado como público.
Os comportamentos habitualmente observados nestes doentes, incluem uma
atitude persistente de desvalorização pessoal e a permissão de que outros os
desvalorizem – quer tratando-os mal, quer ofendendo-os verbalmente.
Uma vez que, como referido, são hipersensíveis à crítica e à rejeição, a sua
resposta emocional é habitualmente muito forte. Esta pode expressar-se ficando o
indivíduo triste e abatido, ou por outro lado ficando zangado, sendo que a reacção
depende de estarmos perante um processo de compensação do esquema ou do
doente estar apenas rendido à sua activação.
Com frequência os sujeitos com Esquema de Defeito/Vergonha sentem
secretamente que são os responsáveis pelos seus problemas com as outras pessoas.
Tendem a sentir-se inseguros ao pé dos outros, particularmente quando estão junto
daqueles que eles consideram “não imperfeitos”, ou que acham que podem vir a
reconhecer os seus defeitos. Estes indivíduos podem ainda enveredar por uma atitude
ciumenta e competitiva, especialmente quando estão em causa os domínios em que
se sentem imperfeitos. Acontece também que conceptualizem, necessariamente, as
relações interpessoais como estabelecendo-se entre um elemento dominador e um
outro dominado.
Estes doentes tendem a seleccionar parceiros que são críticos e rejeitantes, ao
mesmo tempo que habitualmente criticam, eles mesmos, as pessoas que os amam
(«Groucho Marx expressed the latter sentiment when he said “I wouldn’t want to
belong to a club that would have me as a member”», Young et al, 2003, p.220).

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Se avaliarmos determinadas características de alguns dos distúrbios de


personalidade, percebemos facilmente a ponte que estabelecem com este esquema.
Veja-se o caso do Distúrbio de Personalidade Narcísica: características deste quadro,
tais como a grandiosidade ou os limites indefinidos, podem tratar-se de manifestações
do Esquema de Defeito/Vergonha, ao constituírem apenas um processo de
compensação de sentimentos de vergonha e de defeito.
Também o Distúrbio de Personalidade Evitante revela uma ligação com o
esquema aqui tratado. O evitamento de relações íntimas e de situações sociais, lido à
luz deste esquema, pode constituir-se como estilo de coping primário, cujo receio
subjacente é o de lhe serem reconhecidos os defeitos.
Convém ainda acrescentar que a presença deste esquema pode levar ao
abuso de substâncias, a distúrbios alimentares e a outros problemas sérios possíveis.
À semelhança do esquema anteriormente tratado, o principal problema para a
terapia que decorre da presença do Esquema de Defeito/Vergonha, consiste no seu
não reconhecimento por parte dos pacientes. Isto acontece sobretudo porque a grande
maioria deles está envolvida num processo de compensação ou evitamento da dor
provocada pelo mesmo, em lugar de sentirem essa mesma dor abertamente. Veja-se
o exemplo dos narcísicos: têm uma grande probabilidade de possuírem o esquema, e
uma baixíssima probabilidade de se tornarem conscientes do mesmo. A relação
terapêutica é afectada porque se torna mais provável que estes doentes entre em
competição com o terapeuta, do que colaborem com ele num processo de mudança.
Acontece também frequentemente, com os pacientes com este esquema, que
eles omitam informação relevante para compreender o seu caso, porque têm vergonha
de se exporem. Pode passar muito tempo até que finalmente sejam capazes de
confiar no terapeuta e partilhar com ele os aspectos que mais os embaraçam.
Finalmente, convém salientar que este esquema é bastante difícil de ser
trabalhado, e que essa dificuldade aumenta quanto mais precoces e severas forem as
suas experiências de criticismo e rejeição por parte dos pais.

Isolamento Social
Sentimento de que se está isolado do resto do mundo, de que se é diferente
das outras pessoas, e/ou de que não se faz parte de qualquer grupo ou comunidade.
Os pacientes com este esquema sentem que são postos de parte, e que olham
o ambiente de uma posição exterior ao mesmo. Os comportamentos tipicamente
encontrados nestes pacientes são, por exemplo, esta postura de ficar na periferia ou
mesmo evitar por completo os grupos sociais, manifestando preferência pelo

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desempenho de actividades solitárias. Acrescente-se, a este respeito, que a maioria


dos “solitários” são possuidores deste esquema.
A severidade da incidência do esquema determina o tipo de relações sociais
que estes indivíduos estabelecem. Podem fazer parte de uma sub-cultura, sentindo-se
na mesma alienados do resto do mundo; podem sentir-se alienados dos grupos
sociais, mantendo contudo algumas relações íntimas ou podem, no extremo, estarem
virtualmente separados de toda e qualquer pessoa.
A principal barreira que se coloca à terapia é a dificuldade que estes doentes
têm de ultrapassar o evitamento que fazem às situações sociais e aos grupos. O seu
padrão de evitamento é muito difícil de contrariar, porque o confronto com as situações
temidas exige deles um elevado grau de tolerância ao desconforto emocional. Nesse
sentido é preciso operar ao nível do evitamento, nomeadamente através de metáforas,
usando um adulto saudável que aconselha a criança receosa acerca da forma como
deve ultrapassar o seu medo de se integrar num grupo.

Domínio da Autonomia e Desempenho Deteriorados

Os pacientes com esquemas pertencentes a este domínio possuem


expectativas acerca de si mesmos, e do mundo que os rodeia, que interferem com a
sua capacidade para se diferenciarem das figuras parentais e funcionarem
independentemente. São pacientes que, quando crianças, viram-se sobre-protegidos e
diminuídos nas suas obrigações, uma vez que os pais lhes faziam tudo. Embora
bastante mais rara, há também a possibilidade de terem vivido a infância num contexto
absolutamente oposto: sujeitos a um total desinteresse pela sua educação, orientação
e crescimento. Em ambos os casos, as experiências levam a problemas na esfera da
autonomia.
As experiências precoces destes doentes foram marcadas por episódios em
que as figuras parentais minaram a sua autoconfiança e falharam no reforço de
desempenhos autónomos por eles protagonizados. O resultado destes contextos de
vida é que, agora adultos, aqueles indivíduos permanecem todavia crianças no que diz
respeito às suas obrigações! São incapazes de sustentar uma identidade própria e ter
uma vida autónoma, bem como de estabelecer objectivos a longo prazo.

Dependência/Incompetência

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Crença de que se é incapaz de exercer as responsabilidades quotidianas de


uma forma competente, sem a ajuda considerável dos demais (como por exemplo
tomar conta de si próprio, resolver os problemas diários, fazer bons julgamentos,
realizar novas tarefas, tomar boas decisões). Frequentemente toma a forma de
desespero.
Os pacientes com este esquema espelham uma imagem de desamparados e
infantis. Tal como foi descrito, acham-se incapazes de tomarem conta de si sozinhos,
ao mesmo tempo que olham o mundo como se ele fosse avassalador e eles próprios
não possuíssem estratégias de coping para lidar com isso.
Este esquema divide-se em dois elementos: a incompetência e a dependência.
O primeiro destes elementos diz respeito ao enorme receio que estes pacientes
sentem quanto à possibilidade de ter de enfrentar e resolver novos problemas, ou
mesmo problemas comuns, uma vez que não confiam na sua habilidade e julgamento.
Neste sentido têm sempre presente a necessidade de terem ao seu lado alguém que
lhes diga como e o que fazer, qual criança demasiadamente pequena que precisa dos
pais para sobreviver. Nas formas mais extremas deste esquema, os pacientes podem
mesmo chegar a acreditar que não só não serão capazes de cumprir as tarefas
rotineiras do dia-a-dia, como não serão capazes de se cuidarem, alimentarem,
protegerem e deslocarem.
O segundo destes elementos – a dependência – decorre do primeiro. Uma vez
que se acham incapazes de sobreviver sozinhos, precisam de depositar em alguém a
tarefa de cuidar deles. Habitualmente elegem, para essa tarefa, os pais ou então pais
substitutos, como sejam companheiros, irmãos, amigos, patrões - ou terapeutas. Esta
“figura parental” pode fazer tudo pelo paciente ou, em alternativa, mostrar-lhe como se
faz, ensinando-lhe progressivamente os paços que têm de tomar.
Os comportamentos habitualmente decorrentes deste esquema incluem: pedir
ajuda aos outros; fazer constantemente perguntas quando estão envolvidos em novas
tarefas; pedir constantemente conselhos acerca de decisões a tomar; ter dificuldade
em viajar sozinho e gerir as suas finanças; desistir facilmente; recusar
responsabilidades acrescidas (ex.: uma promoção no emprego); e evitar novas tarefas.
Habitualmente estes doentes não chegam à terapia para se tornarem mais
independentes, autónomos e competentes. Em vez disso chegam com a expectativa
de um “comprimido mágico” ou de um especialista que lhes diga o que fazer. Esta
expectativa compreende-se à luz do seguinte: as queixas destes doentes são
usualmente do eixo I, tais como ansiedade, evitamento fóbico ou sintomas
psicossomáticos. Estes doentes podem inclusivamente chegar à consulta deprimidos,
porque tem receio de deixar um(a) companheiro(a) abusador(a) ou controlador(a), ou

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uma figura parental – que se assemelha habitualmente àquela que induziu


primeiramente o esquema – por acreditarem que não conseguirão sobreviver
sozinhos. Neste sentido, aquilo que os doentes pretendem habitualmente é ver
removidos aqueles sintomas desagradáveis, em vez de quererem ver resolvido o
âmago do problema: a sua dependência e sentimento de incompetência.
Existe uma pequena percentagem de doentes com Esquema de
Dependência/Incompetência, que encetam um processo de compensação, tornando-
se contradependentes. Isto significa que, apesar de se sentirem incompetentes,
insistem em fazer tudo sozinhos e recusam terminantemente pedir ajuda, mesmo que
estejam perante situações em que é perfeitamente comum obtê-la. Levam a cabo as
tarefas, mas fazem-no com grande desconforto e ansiedade. Podem mesmo cumpri-
las eficazmente, mas no fundo mantêm sempre a sensação de que, na próxima, não
serão capazes de ter sucesso na sua consecução.
O maior risco para a terapia que decorre da presença deste esquema, diz
respeito ao perigo do paciente ficar dependente do terapeuta, em lugar de tratar o
próprio esquema. O terapeuta pode cair no erro de assumir o papel de figura parental
e comandar assim a vida do doente. Neste sentido, é muito importante que o clínico
consiga equilibrar a dependência que permite ao paciente, e o grau de autonomia que
lhe incute para a necessária evolução terapêutica. Contudo, é preciso notar que
negarmos logo de início algum grau de dependência ao paciente é diminuir-lhe a
motivação para a terapia. É preciso permitir-lhe alguma dependência de início, para
mais tarde removê-la gradualmente.
O desafio que se coloca ao tratamento com estes doentes consiste em
ultrapassar o evitamento de um funcionamento independente. Eles tem de estar
dispostos a trocar o desconforto a curto prazo por ganhos a longo prazo, precisando
para isso de tolerar a ansiedade decorrente de um funcionamento de adulto saudável.

Vulnerabilidade ao mal e à doença


Pacientes com este esquema vivem com a permanente sensação de que algo
de mal lhes vai acontecer. Estão convencidos de que a qualquer momento, e sem que
possam ter qualquer tipo de controlo, algo de terrível vai suceder (ex. doença,
desastre natural, crime, ruína, esgotamento).
Sendo a ansiedade a emoção predominante nestes doentes, esta pode
manifestar-se num vasto continuum (ex. pouca ansiedade, ataque de pânico).
Enquanto que doentes com esquemas de dependência temem situações quotidianas,
este tipo de paciente receia, por sua vez eventos catastróficos.

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Recorrendo habitualmente ao evitamento e a estratégias compensatórias,


estes doentes promovem facilmente a manutenção do conteúdo do esquema intacto.
Como forma de evitar que algo de mal aconteça estes sujeitos podem agir de
diferentes formas, nomeadamente: tornar-se fóbicos, restringir as suas vidas, tomar
tranquilizantes, utilizar rituais compulsivos, iniciar pensamentos mágicos ou acreditam
em “sinas de segurança” (ex. ter pessoas de confiança, garrafas de água,
tranquilizantes).
Um dos maiores problemas no trabalho terapêutico com estes doentes
prende-se com o medo em cortar com o evitamento e a compensação. O receio da
carga emocional provocada pela activação dos esquemas leva a que estes resistam a
extinguir com estes comportamentos. O trabalho de modos pode particularmente
ajudar o paciente a reforçar o seu lado saudável.

Emaranhamento/Eu Sub-Desenvolvido
Quando este tipo de doente entra na consulta o terapeuta observa um sujeito
de tal forma emaranhado com outro, que é difícil saber onde é que a identidade do
paciente começa e a do outro emaranhado acaba. Esta outra pessoa é normalmente
um parente, figura parental ou qualquer outra pessoa significativa do doente (pai,
irmão, patrão, melhor amigo, etc). Os sujeitos com este esquema sentem uma ligação
emocional muito forte com estas figuras. Este vínculo especial conduz a diversas
dificuldades no processo de individualização/autonomia do paciente. A título de
exemplo, um doente contou ao terapeuta que a sua mãe o desaconselhou a casar,
afirmando “eu sei o que é melhor para ti, afinal de contas sempre estive presente nas
tuas relações”. Muitos destes sujeitos acreditam que nem eles próprios, nem o outro
sujeito emaranhado conseguiriam sobreviver um sem o constante apoio do outro.
Estes doentes têm a percepção de que necessitam desesperadamente do outro
sujeito para viver. Para além disto sentem uma enorme ligação com a figura parental,
quase como se de uma só pessoa se tratasse (ex. podem sentir que lêem a mente um
do outro, que pressentem o que a outra pessoa quer, mesmo sem esta pedir). Acham
também que não devem existir barreiras para com esta pessoa especial, sentindo-se
muito desconfortáveis quando estas são criadas. Do mesmo modo, contam tudo à
outra pessoa, esperando que esta tenha o mesmo comportamento.
O esquema não só é composto por esta componente de emaranhamento,
como também pela do eu subdesenvolvido. Esta falta de individualização leva a que
estes doentes se sintam muitas vezes como vazios e à deriva no mundo. Isto acontece

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porque não tiveram oportunidade de constituir de forma adequada a sua identidade,


devido à especificidade da relação que estabeleceram. Por não terem explorado os
seus talentos e particularidades, assim como objectivos pessoais, muitos deles sentem
que não sabem quem são. Em casos extremos, estes sujeitos questionam-se acerca
da sua própria existência.
Estas duas partes do esquema não têm que necessariamente de existir em
conjunto. Alguns pacientes podem ter um eu subdesenvolvido, sem no entanto
estarem emaranhados com outrem (ex. esquema de subjugação). Por exemplo, o
doente pode ter sido sempre dominado pelos pais, pelo que não pôde desenvolver a
sua identidade.
No entanto, na maioria das vezes, os pacientes emaranhados têm um eu
subdesenvolvido. É importante salientar que as escolhas, opiniões e interesses do
sujeito são meros reflexos dos desejos do outro. É como se a existência do outro fosse
mais real do que a própria vida do paciente.
Copiar o comportamento da figura parental, falar ou pensar acerca deste, estar
em permanente contacto, assim como a supressão de todos os pensamentos,
sentimentos e comportamentos discrepantes com esta figura são típicos nestes
doentes. Quando estes pacientes se tentam “libertar” tendem a sentir-se culpados.
Uma das maiores dificuldades em lidar com estes doentes em contexto
psicoterapêutico, prende-se com o facto destes tenderem a emaranhar-se com o
terapeuta. É necessário que o técnico tenha em consideração qualquer libertação
rápida por parte do doente da antiga figura parental, porque isso pode demonstrar que
o terapeuta é a nova figura parental. Assim como no esquema de
dependência/incompetência, o terapeuta pode permitir algum emaranhamento numa
fase inicial da terapia. Com o evoluir das sessões este deverá encorajar
progressivamente movimentos de autonomia por parte do doente.

Fracasso
Pacientes com este esquema acreditam ter falhado, que irão inevitavelmente
fracassar relativamente aos seus pares em áreas como: carreira, estabilidade
económica, status, realização escolar ou desporto. Estes sujeitos sentem-se
fundamentalmente inadequados comparativamente com os seus semelhantes (mais
estúpidos, inaptos, ignorantes). Sentem também que lhes intrinsecamente falta a
chave para o sucesso, seja ela qual for.
Comportamentos típicos destes doentes incluem a submissão ao esquema,
(sabotando-se a si próprios ou tendo performances medianas), evitamentos
(procrastinação ou não realizar a tarefas), assim como comportamentos

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compensatórios (trabalhar sem descanso, alcançar objectivos sucessivamente mais


altos).
Sujeitos com comportamentos compensatórios podem esforçar-se
excessivamente na prossecução dum objectivo, de forma a compensar a crença de
que não são tão inteligentes como os outros. Nalgumas situações estes doentes têm
tanto sucesso quanto os outros indivíduos, residindo a diferença no facto dos primeiros
se sentirem fracassados.
A distinção entre Fracasso e Padrões Excessivos/ Hipercriticismo é importante.
Pacientes com o último esquema acreditam ter falhado no alcance dos objectivos de
vida propostos por si ou pelos outros (pais), mas sabem que conseguem obter bons ou
melhores resultados relativamente a sujeitos na mesma posição. Em contrapartida,
doentes com esquema de fracasso acreditam ter tido desempenhos inferiores em
relação aos colegas (o que é real na maior parte dos casos). A maior parte destes
doentes não conseguiu obter resultados tão satisfatórios como o resto dos indivíduos
do seu grupo de relações.
De salientar ainda a diferença entre o esquema de fracasso e o de
dependência/incompetência. Este último está mais relacionado com o funcionamento
diário do sujeito, enquanto que o primeiro diz mais respeito à obtenção de
determinados resultados.
As temáticas relacionadas com o esquema de fracasso são principalmente: o
dinheiro, o status, a carreira, o desporto e a escola, enquanto que as do esquema de
dependência/incompetência relacionam-se com decisões do dia-a-dia.
O esquema de fracasso conduz muitas vezes à formação do esquema de
defeito. Como o sujeito percepciona ter fracassado em determinados objectivos, sente
que é inferior aos outros.
Um dos problemas da intervenção terapêutica com estes doentes reside na
manutenção dos seus comportamentos desadaptativos. Eles tendem a render-se,
evitar ou compensar o esquema, em vez de o tentar mudar. Estes sujeitos estão tão
certos do seu fracasso que ficam relutantes em se esforçar para conseguir obter bons
resultados. O trabalho de modos ajuda os pacientes a fortalecer o seu adulto
saudável, para que este seja capaz de lutar com o esquema. Com a imagery os
doente “libertam-se” de algumas situações recentes e passadas relativas ao fracasso.
O adulto saudável ajuda a criança fracassada a criar estratégias de coping
adaptativas.

Domínio dos Limites Deteriorados


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Pacientes com esquemas pertencentes a este domínio não desenvolveram


adequadamente limites internos, não internalizaram a noção de reciprocidade ou
autodisciplina. Podem ter dificuldade em respeitar os direitos dos outros, em cooperar,
manter compromissos ou alcançar objectivos a longo-prazo. Usualmente são sujeitos
egoístas, “mimados”, irresponsáveis ou narcísicos. Comummente cresceram em
família permissivas e indulgentes. (O esquema de padrões excessivos pode ser
compensatório de outros esquemas. Nestes casos a indulgencia não tem origem
primária). A estes doentes, enquanto crianças, não lhes foi pedido que seguissem as
regras que se aplicavam aos outros sujeitos. Deste modo não desenvolveram um
auto-controle satisfatório, pelo que, em adultos, têm dificuldade em conter impulsos ou
adiar gratificações imediatas em prol de benefícios a longo-prazo.

Grandiosidade/Limites indefinidos
Um dos pressupostos base destes doentes é o de que são especiais. Estes
pacientes têm a percepção de que são superiores aos outros. Como se sentem parte
duma elite particular sentem-se também no direito de ter direitos e privilégios
especiais. Estes pacientes não se regem pela regra base da interacção humana que é
a da igualdade entre os seres humanos. Estes doentes tentam controlar o
comportamento dos outros, de forma a satisfazem os seus próprios propósitos. Para
além disto não sentem qualquer empatia para com os outros ou com as necessidades
destes, tendo comummente actos de egoísmo e grandiosidade para com estes. Este
tipo de doentes insiste na ideia de que pode dizer ou fazer o que quer, sem ter em
conta os direitos dos outros.
Comportamentos típicos destes doentes podem ser: competitividade excessiva,
postura altiva, domínio das outras pessoas, forçar o seu ponto de vista.
Antes de mais é importante referir que o esquema de limites indefinidos se
pode formar de duas formas: a pura e a frágil. Na forma pura a criança é muito
mimada na infância. Os pais incutem poucos limites na criança, não estimulando o
respeito pelas necessidades e direitos dos outros. Desta forma a criança não
desenvolve o princípio básico da reciprocidade das relações. No entanto a criança não
é negligenciada ou rejeitada. Desta forma o esquema de limites indefinidos não é
compensatório.

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De modo alternativo este esquema pode-se desenvolver como compensação


por sentimentos de inferioridade e privação emocional. Ao contrário dos pacientes
“mimados”, estes são “frágeis”. O esquema destes sujeito é denominado frágil porque
no seu íntimo estes doentes conhecem o sentimento de ser-se ignorado e
desvalorizado. Estes doentes vivem com o sentimento de que a qualquer momento os
seus comportamentos compensatórios podem falhar e que as suas vulnerabilidades
podem ficar expostas.
Tal como os pacientes com a forma pura do esquema, estes doentes também
de comportam de forma autoritária e altiva. No entanto os doentes “puros” não
possuem um modo de criança abandonada, ou seja, no seu íntimo não está uma
criança triste, sozinha, perdida e vulnerável. No cerne dos doentes “puros” está uma
criança impulsiva e irresponsável.
Os doentes “frágeis” comportam-se de forma a compensar os seus sentimentos
de inferioridade e privação emocional. O objectivo terapêutico nestes doentes prende-
se com o desmontar dos esquemas de defeito e privação emocional. Nestes casos, ao
contrário do sucedido para a forma pura do esquema, é importante, mas não
fundamental impor limites na consulta.
Existe outro tipo de pacientes com uma “mistura” do esquema de dependência
com o de limites deteriorados. Estes doentes “autorizam-se” a ser dependentes dos
cuidados das outras pessoas, ou seja crêem que os outros têm o dever de as vestir,
alimentar entre outros. Quando isto não acontece zangam-se com estes sujeitos. O
tratamento destes sujeitos tem que incluir necessariamente o “desmantelamento”
destes dois esquemas.
Uma das principais dificuldades no trabalho com estes doentes reside na
manutenção da motivação por parte destes. Um número significativo de pacientes
abandona a terapia pois esta implica a perda de uma grande número de ganhos
secundários. Como se pode compreender é gratificante alcançar os nossos objectivos.
O terapeuta deve encontrar com o doente um meio-termo, relembrando-o
continuamente das consequências negativas da manutenção do esquema.

Auto-disciplina e auto-controlo insuficientes


A estes pacientes tipicamente faltam duas qualidades: o auto-controlo e a
autodisciplina. A primeira qualidade refere-se à capacidade de controlar os
sentimentos e impulsos do próprio, enquanto que a segunda diz respeito à tolerância
relativa ao aborrecimento e à frustração inerentes à prossecução de tarefas. Estes
pacientes são incapazes de restringir os seus sentimentos e emoções de forma
apropriada. Quer a nível pessoal, quer profissional, estes doentes evidenciam uma

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dificuldade excessiva em atrasar ganhos a curto prazo para alcançarem objectivos a


longo prazo. Parecem não aprender com a experiência, ou seja, com as
consequências negativas do seu comportamento. Pacientes com formas muito
extremadas deste esquema assemelham-se a “crianças grandes”, enquanto que
outras em posições mais medianas evitam de forma excessiva qualquer tipo de
desconforto (ex. dor, conflitos, confrontos, responsabilidades, fadiga).
A impulsividade, distractabilidade e desorganização são comportamentos
comuns na elaboração de tarefas rotineiras, assim como demonstrações emocionais
extremas (histeria) e atrasos sucessivos. Todos estes comportamentos têm como
objectivo ganhos a curto prazo.
É importante realçar que o abuso de substâncias ou comportamentos
impulsivos (ex. jogo, sexo) não são a base dos problemas destes doentes, embora
muitas vezes sejam ser encontrados, comportamentos que podem, contudo, ser
encontrados em sujeitos com esquemas variados. O seu objectivo é o de “evitar” ou
minimizar o sofrimento provocado por estas estruturas.
As crianças nascem com um modo de impulsividade, ou seja, a indisciplina e a
falta de controlo fazem parte da sua natureza. Ao interagirmos com os outros vamos
ganhando mais auto-controlo e disciplina. Vamos internalizando o modo adulto
saudável, que por sua vez restringe a criança impulsiva, para que esta consiga
alcançar objectivos a longo prazo. Por vezes existem outros problemas relacionados
que complicam esta mudança gradual (ex- hiperactividade).
Normalmente não existem crenças ou sentimentos específicos associados a
este esquema. É muito raro ouvir estes pacientes dizer “não há problema em
expressar os meus sentimentos” ou “deveria agir impulsivamente”. Estes pacientes
experienciam o seu esquema como algo que está fora do seu controle, é-lhes
egodistónico. A maior parte dos pacientes gostaria inclusivamente de ter mais auto-
controlo e disciplina. O problema está no facto de não conseguirem manter os
esforços, neste sentido, por muito tempo.
O modo impulsivo tem vantagens associadas, como por exemplo, o
divertimento e a desinibição. Este modo só se torna problemático quando é excessivo,
quando não é contra-balanceado pelo modo adulto saudável.
Quando o problema tem uma origem biológica, como acontece no caso da
perturbação com défice de atenção ou na hiperactividade a terapia por só pode não
obter ganhos significativos. Nestes casos deve-se fazer acompanhar a terapia de
medicação.

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Domínio da Influência dos outros

Estes pacientes colocam uma enfâse excessiva na satisfação as necessidades


dos outros em detrimentos das suas próprias. Fazem isto de forma a obter
reconhecimento, manter relacionamentos, ou evitar retaliações. Em crianças, estes
sujeitos não puderam dar continuidades às suas características pessoais. Em adultos
dirigem a sua vida de forma externa, ou seja, de acordo com os desejos dos outros. A
típica família de origem é baseada no pressuposto da aceitação incondicional. Assim
sendo a criança deve evitar revelar-se aos outros, de forma a obter aprovação e
carinho. Em muitas destas famílias os pais sobrevalorizam as suas necessidades
emocionais ou aparência social, desvalorizando as necessidades únicas das crianças.

Subjugação
A característica base destes doentes é permitir que os outros os dominem.
Assim sendo, rendem-se à vontade das outras pessoas com medo de retaliação,
punição e/ou abandono. Existem dois tipos de subjugação, a primeira é a de
necessidades, em que suprimem as suas preferências, decisões e desejos; a segunda
diz respeito às emoções em que os doentes reprimem os seus sentimentos,
especialmente a raiva.
O esquema envolve a percepção de que as necessidades e sentimentos do
paciente não são válidas nem relevantes para os outros. Na maioria das vezes este
padrão leva a uma acumulação de raiva que se manifesta em comportamento passivo-
agressivo, explosões incontroláveis de raiva, sintomas psicossomáticos, teatralidade e
abuso de substâncias.
Este tipo particular de doentes apresenta um estilo de coping particular, que os
faz submeter ao esquema. Eles são demasiado condescendentes, assim como
hipersensíveis ao facto de se sentirem encurralados. Concludentemente sentem-se
ameaçados, abusados e indefesos. As figuras de autoridade são percepcionadas
como mais fortes e poderosas, logo os pacientes têm de se defender delas. Neste
sentido o esquema implica um grande nível de medo por parte dos doentes. A
subjugação não se baseia em valores internalizados, mas sim no medo de retaliação,
punição e/ou abandono. Usualmente este esquema conduz a comportamentos de
evitamento. Os pacientes evitam situações onde outras pessoas os possam controlar
ou onde se possam sentir encurralados. Isto leva a que alguns doentes evitem
relações amorosas pois consideram-nas claustrofóbicas. De forma compensatória ao

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esquema os sujeitos podem adoptar uma postura de desobediência, oposição e


rebeldia.
Doentes com esquemas de auto-sacrifício, inibição emocional e limites rígidos,
por sua vez, interiorizaram que não é correcto expressar as suas necessidades ou
sentimentos. Estes sujeitos acreditam que é incorrecto e negativo exprimir os seus
sentimentos e pensamentos, sentindo-se culpados ou envergonhados quando tal
acontece. Pacientes com qualquer destes três esquemas não se sentem controlados
pelos outros pois têm um locus de controlo interno.
Um dos obstáculos no trabalho terapêutico com estes doentes diz respeito ao
facto de, no início, os pacientes terem dificuldades extremas em expressar os seus
sentimentos de forma adequada, assertiva. Geralmente passam para o outro extremo
e ser agressivo com os outros. O terapeuta deverá reforçar a ideia de que irá demorar
algum tempo até ao doente encontrar o equilíbrio entre a supressão de sentimentos e
a forma adequada do demonstrar. Muitos doentes afirmam no início não saber o que
sentem nem o que querem. Nestes casos o esquema de subjugação pode estar ligado
ao do eu indiferenciado/subdesenvolvido. Nesta situação particular o terapeuta pode
ajudar o doente a desenvolver o seu sentido de self ensinando-o a monitorizar os seus
desejos e emoções (ex. imagery).
É necessário também ter em consideração que alguns terapeutas podem
inconscientemente estar a reforçar o comportamento de subjugação, pois o doente
aceita e adere tudo o que o técnico lhe diz.
A terapia focada nos esquemas tem uma elevada taxa de sucesso com nestes
doentes.

Auto-Sacrifício
Assim como nos doentes com o esquema de subjugação, os com o esquema
de auto-sacrifício focalizam-se excessivamente nas necessidades e desejos dos
outros, em detrimento das suas. Mas ao contrário do que foi descrito no esquema
acima, estes doentes experienciam o seu auto-sacrifício de forma voluntária. Fazem-
no porque querem impedir que os outros fiquem magoados, para evitar que eles
próprios se sintam culpados ou de forma a manter uma relação significativa com
outrem. Este esquema usualmente resulta daquilo a que denominamos temperamento
excessivamente empático, ou seja, uma sensibilidade excessiva do sofrimento dos
outros. Alguns doentes “sentem” a dor dos outros de forma tão intensa que estão
altamente motivados para aliviá-la ou preveni-la. O auto-sacrifício muitas vezes implica
um excessivo sentido de responsabilidade pelos outros.

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É comum estes doentes padecerem de determinados sintomas


psicossomáticos como dores de cabeça, problemas gastrointestinais, dor crónica ou
fadiga. Esta sintomatologia pode funcionar como uma forma de chamar a atenção,
sem que os sujeitos a tenham de pedir voluntariamente. Estes sinais também podem
advir do stress causado por “dar” muito e receber pouco em troca.
Pacientes com este esquema na maioria das vezes têm também o de privação
emocional. Eles procuram ter em conta as necessidades dos outros, mas não as suas.
Aparentemente parecem satisfazerem-se com o seu auto-sacrifício, mas no seu intimo
têm um grande sentimento de privação emocional. Inclusivamente podem revoltar-se
contra os objectos do seu sacrifício. Alguns doentes afirmam não querer nada em
troca dos outros, mas ficam ressentidos quando estes não retribuem a sua
ajuda/amizade.
Não é demais sublinhar a diferença entre o esquema de subjugação e o de
auto-sacrifício. Os doentes “subjugados” sentem-se sob o controlo dos outros, os auto-
sacrificados sentem que as suas escolhas como voluntárias.
Ouvir os outros e não falar de si mesmo, tomar conta dos outros, dificuldade
em executar tarefas por estar demasiado preocupado com os outros, sentir-se
desconfortável quando os outros se focalizam em si são exemplos de comportamentos
e sentimentos típicos destas pessoas. Young et al destacam, em 2003, o exemplo de
uma paciente. Segundo esta, quando se dirigia para a cozinha para tirar um café,
passou pelo quarto da sua mãe e perguntou-lhe repetidamente se esta também queria
um, ao que esta respondeu negativamente. Quando a doente acabou de fazer a sua
chávena de café, a sua mãe disse-lhe “com que então não foste capaz de fazer uma
para mim!”.
É necessário ter em consideração que existem ganhos secundários na
manutenção do esquema. Esta estrutura tem consequências positivas se não for
levado ao extremo. Assim sendo os doentes podem sentir-se orgulhosos de si próprios
por terem uma postura altruísta para com os outros.
Outra fonte de benefícios secundários reside na amizade e empatia que os
outros sentem por este tipo de pessoas. É relevante realçar que na maior parte destas
amizades as necessidades dos pacientes não são satisfeitas.
Por outro lado existem sujeitos que nunca se sentem suficientemente
realizados com as suas acções pois pensam que conseguem fazer sempre melhor.
Em termos compensatórios alguns sujeitos podem de modo repentino passar
de um registo passivo para um agressivo. Uma paciente contou que após a morte da
sua mãe ficara encarregue de cozinhar, lavar e passar a roupa dela e do seu pai. Um
dia quando se encontrava a passar a ferro o seu pai entra na cozinha e diz “ a partir de

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agora abotoa a camisa antes de a pendurares”. Nesse momento a doente largou o que
estava a fazer e daí em diante passou a cuidar unicamente da limpeza das suas
coisas.
Uma questão a ter em conta com este esquema é que o auto-sacrifício é
valorizado culturalmente (ex. religião). Mais uma vez é preciso realçar que o auto-
sacrifício não é disfuncional se for dentro de certos limites. Quando é excessivo pode
criar problemas como explosões de raiva, sintomas psicossomáticos, sentimentos de
privação emocional ou outras condições emocionais.

Procura de aprovação/reconhecimento
Estes pacientes colocam uma enfâse excessiva na obtenção de aprovação
e/ou reconhecimento pela parte dos outros, em detrimento da expressão das suas
necessidades emocionais e características pessoais. Como usualmente estão
excessivamente focados nas reacções dos outros, raramente dão caso das suas,
fazendo com que não consigam desenvolver um sentido estável e intrínseco de si
mesmo (self).
Existem dois tipos de pacientes com este esquema, os que querem que todos
gostem deles, de forma a serem aceites e os que procuram admiração e
reconhecimento. Usualmente os últimos são doentes narcísicos, valorizando o status,
a aparência, o dinheiro ou a realização pessoais como formas de obter admiração por
parte dos outros.
Ambos os tipos estão excessivamente focalizados na procura de
reconhecimento e mérito. Young et al destacam, em 2003, o exemplo de uma jovem
paciente. Segundo palavras desta doente, “Está a ver aquelas mulheres, pelas quais
passamos diariamente na rua, que parecem ter uma vida estupenda? A vida delas até
pode ser horrível mas quando passamos por elas temos a nítida sensação que têm
uma vida fantástica. Eu se tivesse que escolher, preferiria ter essa aparência do que
não a ter e ser feliz”.
A busca de reconhecimento está algumas vezes ligada ao esquema de
privação emocional. No entanto alguns doentes podem ter sido acarinhados na sua
infância e desenvolver, de igual modo, o esquema. Isto normalmente acontece porque
embora os pais sejam muito afectuosos, também estão muito preocupados com as
aparências. As crianças destas famílias sentem-se amadas pelos pais mas não
conseguem desenvolver um sentido de identidade intrínseco. Para estas pessoas o
seu self está directamente ligado à opinião dos outros. Os pacientes narcísicos são a
forma mais extremada deste esquema. Em formas mais medianas, nas quais os

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doentes são mais saudáveis do ponto de vista psicológico, os sujeitos continuam


presos à aprovação dos outros, em detrimento da expressão genuína de si mesmo.
Ser condescendente e agradar aos outros constantemente são
comportamentos muito frequentes nestes pacientes. Alguns sujeitos que procuram a
aprovação dos outros são inclusivamente subservientes como forma de a alcançar. Os
que os rodeiam podem até se sentir desconfortáveis ao pé destas pessoas devido à
sua ânsia de agradar. Estes sujeitos dão grande ênfase à aparência, ao dinheiro, ao
status, à realização pessoal e ao sucesso como formas de obter atenção e
reconhecimento dos outros. Estes pacientes podem aparentar uma postura “humilde”
quando recebem elogios, mas subtilmente tentam sempre fazer com que nas
conversas surjam temas que os engrandeçam.
Este esquema difere de outros que também podem resultar em
comportamentos de aprovação externa. Embora possa ter origem semelhante à do
esquema de padrões rígidos, os sujeitos com o esquema de procura de
aprovação/reconhecimento lutam por obter validação externa, enquanto que os com
padrões rígidos querem alcançar um conjunto de objectivos internos a que se
propuseram. Em comparação com o esquema de subjugação podemos afirmar que
neste último os sujeitos manifestam comportamentos de procura de aprovação dos
outros porque temem que estes os castiguem ou abandonem. Não é objectivo deste
esquema ajudar os frágeis e necessitados, como acontece no de auto-sacrifício. Ainda
em relação a este último esquema é necessário referir que estes muitas vezes
procuram aprovação dos outros para não ferir os sentimentos destes, o que não
acontece no de procura de reconhecimentos/aprovação. Comparativamente ao
esquema de procura de aprovação/reconhecimento, as pessoas com um esquema de
limites indefinidos/grandiosidade procuram obter aprovação e/ou reconhecimento com
a finalidade de reforçar os seus sentimentos de superioridade e não com o intuito de
serem aceites.
A maioria dos sujeitos com o esquema de procura de
aprovação/reconhecimento tem crenças condicionais como: “as pessoas vão aceitar-
me, se me aprovarem ou admirarem” ou “se conseguir que os outros me admirem,
eles vão prestar-me atenção “. Estes pacientes vivem segundo esta contingência: para
se sentirem bem consigo próprios têm que conseguir a admiração dos outros.
Consequentemente a sua auto-estima depende muito da atitude das outras pessoas.
Este esquema é por vezes compensatório de outros esquemas, como por
exemplo o de defeito, privação emocional ou isolamento social. Nos pacientes em que
este esquema é primário os doentes procuram aprovação porque os seus pais
colocaram uma grande ênfase nesta busca de reconhecimento. Os progenitores

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colocaram objectivos e expectativas às crianças que não eram baseadas nas


necessidades e nas suas características pessoais, mas sim nos valores da sociedade
que os rodeiam.
Assim como acontece com todos os esquemas, estes podem ser adaptativos
ou inadaptativos, dependendo do grau em que se exprimam no sujeito. Assim sendo
podemos encontrá-lo em muitos políticos e artistas de sucesso.
Os ganhos secundários que estes pacientes usualmente têm podem constituir
um problema na terapia. A aprovação e reconhecimento podem ter grandes
recompensas interpessoais, logo o terapeuta vai encorajar o paciente para diminuir um
comportamento altamente aceite e valorizado socialmente. O técnico vai ter que
trabalhar com o doente no sentido de ambos analisarem os ganhos e custos da
manutenção de determinados comportamentos. O objectivo é moderar e não erradicar
totalmente o esquema.
Outra particularidade destes pacientes é que se confundem facilmente com
sujeitos ditos normais, o que faz com que o terapeuta inconscientemente reforce
muitas das suas acções. O doente vai inclusivamente tentar obter o reconhecimento
do terapeuta. Para que isto não aconteça é necessário identificar se esta necessidade
de aprovação advém dum self autêntico ou indefinido.

Sobrevigilância e Inibição

Pacientes com este esquema suprimem os seus sentimentos e impulsos


“espontâneos”. Estes sujeitos esforçam-se por internalizar regras rígidas relativas à
sua performance, em detrimento da sua felicidade, expressão própria, relaxamento,
relações íntimas e saúde. Este esquema tem origem numa infância reprimida, severa
e rígida, em que o auto-controle e o espírito de sacrifício se sobrepõem à
espontaneidade e prazer. Enquanto crianças, estes sujeitos não foram encorajados a
brincar e a alcançar a felicidade. Em vez disto aprenderam a estar hiper vigilantes a
acontecimentos de vida negativos e a encarar a vida como algo insípido.
Desenvolveram também a noção de que a sua vida poderá desmoronar-se, se não
estiver atento aos sinais de alarme e se não for cuidadoso em todas as situações.
Desenvolveram também a noção de que a sua vida poderá desmoronar-se, se não
estiver atento aos sinais de alarme e se não for cuidadoso em todas as situações.

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Negativismo/Vulnerabilidade ao Erro
Estes doentes são principalmente negativistas e pessimistas. Focalizam-se
excessivamente nos acontecimentos negativos da sua vida (ex. morte, dor, perda,
frustração, traição, fracasso, conflito), minimizando quase sempre os positivos. Têm
também expectativas negativas relativamente à maioria das situações futuras. Estes
sujeitos sentem-se particularmente vulneráveis às más decisões, pensando sempre
que estas os conduzirão dalguma forma ao colapso financeiro, a perdas significativas,
à humilhação social ou à perda de controlo. Passam muito tempo a tentar certificar-se
de que não cometem erros, tendo propensão para ruminações obsessivas.
Estes pacientes normalmente são muito ansiosos. Tensão crónica e
preocupação são sentimentos típicos deste tipo de pacientes, enquanto que os
comportamentos mais frequentes incluem queixas sucessivas e indecisão. Por vezes é
complicado estar perto destes doentes pois estão sempre a realçar os aspectos
negativos dos factos.
A intervenção terapêutica vai depender da forma como o técnico conceptualiza
a origem do esquema. Primariamente este esquema é aprendido por modelamento,
internalizando a atitude de outra pessoa. Ou seja, o paciente adquiriu a sua visão
negativa/pessimista de ver o mundo através de um progenitor/parente seu. O trabalho
experiencial é particularmente eficaz com este tipo de doentes. A imagery e o role-
playing colocam, inicialmente o terapeuta e depois o doente, o adulto saudável a lutar
com o parente pessimista. O objectivo deste confronto é assegurar e reconfortar a
criança.
Uma segunda forma do esquema se constituir resulta de situações de perda
e/ou acontecimento penosos durante a infância do paciente. Nestes casos os doentes
são pessimistas porque passaram por muitas adversidades durante a sua infância. Um
paciente de nove anos, cujo pai tinha falecido anos antes disseram “ não me tente
dizer que coisas más não acontecem porque eu sei que elas acontecem!”. Muitos
destes doentes precisam de fazer o luto de acontecimentos passados. Quando o
infortúnio é a origem dos esquemas todas as estratégias são importantes (cognitiva,
comportamental e experiencial).
Este esquema também pode ser uma compensação do esquema de privação
emocional. Neste caso o doente “queixa-se” como forma de chamar a atenção. Assim
sendo, o terapeuta deve ignorar os comentários pessimistas do doente e focalizar-se
antes nos sentimentos de privação, através da reparentização do doente.
Gradualmente o paciente aprende formas mais saudáveis de lidar com a sua privação
emocional, primeiro com o terapeuta e depois com as pessoas fora da terapia.

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Nalguns doentes o esquema pode ter origem biológica, provavelmente


relacionada com o distúrbio obsessivo-compulsivo ou com a perturbação distímica.
Neste caso os doente podem beneficiar de medicação.
Normalmente é um esquema difícil de mudar. Usualmente os pacientes não se
conseguem lembrar de momentos não pessimistas da sua vida, o que dificulta a tarefa
de se sentir doutra forma. O trabalho de modos pode ajudá-los a libertar o seu modo
criança feliz, que se encontra escondido atrás da imensa preocupação. O modo adulto
feliz, inicialmente representado pelo terapeuta, liberta imagens perturbadoras do
passado e do presente, ajudando deste modo a criança preocupada a formar uma
visão mais positiva de si mesma.
O terapeuta tem de ter muito cuidado para não representar sempre o mesmo
papel na argumentação do pensamento do doente, para que as consultas não se
assemelhem a debates. É aconselhável que alternem o papel positivo e negativo entre
ambos.
Tal como nos outros esquemas este também pode ter ganhos secundários se o
sujeito receber atenção quando se queixa. Se assim for o terapeuta pode entrar em
contacto com a família com o objectivo de alterar comportamentos que reforcem o
esquema. O técnico pode, por exemplo, ensinar os familiares a ignorar o paciente
quando ele está a agir negativamente e a reforça-lo aquando de comentários positivos.
Quando o esquema é difícil de mudar devido a uma história de inúmeros eventos
negativos é usual colocarmos o doente a irritar-se com situações passadas. Este
comportamento consegue que os doentes separem o presente, onde estão
razoavelmente seguros, do passado, onde sofreram danos traumáticos.

Inibição Emocional
Estes pacientes apresentam restrição emocional e são excessivamente inibidos
no que diz respeito à discussão e expressão das suas emoções. Não são emocionais,
expressivos ou espontâneos. Normalmente não exteriorizam manifestações de
carinho, conforto e evitam as explosões de raiva. Muitos destes paciente valorizam o
auto-controlo em detrimento da intimidade própria à interacção humana. Receiam que
ao mostrar o que sentem, possam perder completamente o controlo. Outras possíveis
consequências deste comportamento poderão ser: vergonha extrema, punição ou
abandono. Normalmente este controlo excessivo estende-se a outros significativos,
tentando prevenir que as outras pessoas ao seu redor expressem as suas emoções,
especialmente se estas forem intensas.
Estes pacientes inibem emoções saudáveis que são naturais ao modo criança
espontânea. Ao longo do seu crescimento as crianças aprendem a dominar as suas

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emoções e impulsos de forma a poder respeitar os outros. O problema destes sujeitos


é que dominaram a expressão dos seus sentimentos excessivamente. Eles inibiram e
sobre-controlaram a criança espontânea de tal forma que já não sabem ser naturais
nem brincar com os outros. Este controlo exagerado tem normalmente as seguintes
consequências: inibição da raiva, restrição de afectos positivos ou negativos (alegria,
amor, afeição, excitação sexual), adesão excessiva a rotinas e rituais, dificuldade em
expressar vulnerabilidade e sentimentos e racionalização desmedida.
Muitas vezes estes pacientes preenchem os critérios para distúrbio de
personalidade obsessivo-compulsivo. Para além de serem inibidos emocionalmente,
têm muita necessidade de passar uma imagem de compostura e são sujeitos muito
rígidos e inflexíveis. Pacientes com o esquema de privação emocional e o de limites
rígidos têm alguma tendência para desenvolver uma perturbação de personalidade
obsessivo-compulsiva, pois os dois esquemas juntos perfazem quase todos os
critérios.
A causa mais frequente deste esquema é a humilhação da criança, quando
está expressa o que sente, por parte dos pais ou figuras significativas.
Este esquema tem muitas vezes uma origem cultural. Young et al referem, em
2003, o seguinte exemplo. Um doente escandinavo contou a seguinte anedota para
ilustrar o que sentia: “ouviu falar daquele escandinavo que amava tanto a mulher que
quase lho disse?”. Este esquema pode fluir entre gerações, devido à crença de que é
incorrecto expressar o que pensamos e sentimos.
Os pacientes que sofrem de inibição emocional são sujeitos que passam uma imagem
de muito rigor, apatia e severidade. Por não expressarem emocionalmente o que
sentem, normalmente são indivíduos hostis e ressentidos.
Estes pacientes tendem a envolver-se emocionalmente com parceiros muito
emotivos e impulsivos. Isto geralmente acontece porque a parte saudável do doente
quer, de alguma forma, libertar a criança espontânea que há em si. Uma paciente,
cujos pais lhe ensinaram que era errado exibir-se, casou com um sujeito que adorava
comprar roupa chique e ir a sítios caros, pelo que dizia “quando estou com ele parece
que tenho autorização para me exibir”. Quando este tipo de união ocorre parece que
os pois pólos (o inibido e o emocional) se polarizam. Infelizmente algumas vezes os
parceiros começam a não gostar das qualidades que inicialmente os atraíram.
Quando os sujeitos são emocionalmente inibidos ao longo de toda a sua vida é
muito complicado para eles começarem a comportar-se de modo diferente. Para estes
pacientes, a expressão de sentimentos é-lhes uma acção completamente estranha,
pelo que têm grandes dificuldades em fazê-lo. O trabalho de modos pode ajudar estes

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sujeitos a aceder ao seu lado saudável que quer combater o esquema e expressar-se
emocionalmente.

Padrões Excessivos/Hipercriticismo
Pacientes com este esquema destacam-se por ser muito perfeccionistas. Estes
sujeitos têm como lema alcançar objectivos cada vez mais altos. Os pacientes que
procuram aprovação/reconhecimento baseiam o seu comportamento em função da
reacção dos outros (valorização externa), enquanto que os objectivos dos sujeitos
rígidos são internos. Estes doentes lutam para alcançar determinadas metas porque
“devem” fazê-lo e não para ganhar a aprovação dos outros. Eles não se importam se
as outras pessoas sabem ou não que concretizaram determinado objectivo. Por vezes
pode acontecer que o paciente tenha estes dois esquemas em simultâneo. Assim
sendo, o doente vai tentar alcançar objectivos muito altos quer para agradar aos
outros, quer para se satisfazer a si próprio.
Estes sujeitos vivem segundo uma pressão inexorável. Vivem presos na ideia
de que há muito para fazer e muito pouco tempo para o realizar. Uma consequência
comum deste modo de funcionamento é a exaustão. Embora a perfeição seja
praticamente impossível estes sujeitos tendem interminavelmente a esforçar-se cada
vez mais. Não obstante toda a dedicação prestada o sujeito vive constantemente com
muito medo de fracassar, o lhe causa muita ansiedade. O fracasso para pessoas com
este esquema implica que o trabalho esteja “apenas” a 95%, em vez de a 100%. Estes
sujeitos são geralmente muito hipercríticos acerca de si próprio e dos outros. Como
para eles as coisas nunca são feitas nem na forma nem no tempo ideal, geralmente
são sujeitos facilmente irritáveis. Normalmente os sujeitos rígidos são viciados no
trabalho (workaholics), trabalhando incessantemente em prol dos seus interesses
particulares (escola, trabalho, aparência, performance atlética, saúde, etnia, casa, etc).
Como perfeccionistas que são, prestam excessiva atenção aos pormenores, e
geralmente não conseguem aperceber-se de que a sua performance é superior à
norma. As suas regras rígidas aplicam-se a inúmeros campos da sua vida, como por
exemplo aos seus padrões éticos, culturais e religiosos. O pensamento dicotómico
está quase sempre presente nestes pacientes (“ou tenho sucesso ou vou falhar
redondamente”). Raramente tiram gratificação do sucesso obtido pois geralmente já
estão embrenhados noutro projecto. Outra característica destes sujeitos é que
raramente vêem o seu desempenho como perfeccionista. Os seus padrões de
exigência parecem-lhe normais, limitando-se a fazer o que lhes pedem.
Normalmente o doente reconhece que tem um padrão desadaptativo quando
algum campo da sua vida tem problemas (derivados do esquema). Isto pode traduzir-

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se em falta de interesse pela vida, problemas de saúde, baixa auto-estima, relações


íntimas e interpessoais insatisfatórias, ou noutro tipo de disfunções.
É muito complicado viver com este esquema, assim como passar muito tempo
ao pé de alguém que o tenha.
O problema maior no tratamento do esquema reside nos ganhos secundários
que advêm deste. Existem inúmeros benefícios em conseguir realizar objectivos o
melhor possível. Muitos pacientes ficam relutantes em tratar-se, pois os custos da
atenuação dos seus limites rígidos parecem-lhes muito maiores que os benefícios.
Para além disto muitos pacientes temem a culpa, o embaraço, a vergonha e a auto-
crítica que vão inicialmente sentir por não cumprirem as suas exigências. A
probabilidade de se sentirem mal parece-lhes tão elevada que ficam muito relutantes
em baixar um pouco os seus limites rígidos. A melhor táctica a utilizar nestes doentes
parece ser trabalhar calmamente estas questões, para que o doente se vá
apercebendo aos poucos dos resultados da diminuição do perfeccionismo. O trabalho
de modos pode ajudar estes doentes a construir o seu lado saudável, que quer trocar
o perfeccionismo por uma maior realização interior.

Punição
Estes doentes acreditam que as pessoas em geral, incluindo o próprio sujeito,
devem ser punidas pelos seus erros. Para além disso, são moralistas, intolerantes e
têm muita dificuldade em perdoar quer o seu erro, quer o dos outros. Acreditam que as
falhas não devem ser perdoadas mas sim punidas. Para estes pacientes não existem
desculpas, nem factores atenuantes. Não aceitam a imperfeição inerente ao ser
humano e sentem dificuldade em empatizar com os que erram. A palavra misericórdia
não existe no seu vocabulário.
A melhor forma de identificar este esquema é através do tom punitivo e
acusatório que estes sujeitos utilizam quando falam de alguém que errou.
Normalmente esta voz tem origem num parente próximo, que utilizava o mesmo
registo vocal. Este continha a mesma necessidade implacável de punição. O tom
acusatório não desaparece enquanto o “culpado” não for castigado. Frequentemente a
punição é mais severa do que o “crime” cometido. Uma imagem que exemplifica este
esquema é a da rainha de copas, no conto Alice no País das Maravilhas, a gritar
“Cortem-lhe a cabeça”. Para pessoas com carácter punitivo qualquer erro deve ser
punido de forma extrema e indiscriminada.
Este esquema está regularmente relacionado a outros esquemas,
especialmente os de limites rígidos e defeito. Os sujeitos com carácter punitivo e
limites rígidos, em vez de atenuarem o impacto dos seus erros, punem-se por estes.

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

No caso da comorbilidade com o esquema de defeito, o doente pune-se por se sentir


inferior aos outros. Esta combinação é frequentemente encontrada em doentes com
distúrbio de personalidade borderline. Estes pacientes em particular internalizaram o
modo parente punitivo, ou seja, aplicam o mesmo comportamento que os seus pais
tinham para com ele. Exemplos de comportamentos punitivos podem ser gritar consigo
mesmo, cortar-se a si próprio ou passar fome.
Este esquema pode ser particularmente difícil de desmontar se se encontrar
em comorbilidade com o de defeito. Os sentimentos de indignação moral e injustiça
podem ser muito difíceis de modificar. Potenciar a manutenção da motivação do
doente é o ponto-chave do tratamento. O terapeuta ajuda o paciente a manter-se
focado nos custos e benefícios do esquema no que concerne à sua auto-estima e ao
estabelecimento de relações interpessoais mais satisfatórias.

Origem dos Esquemas Precoces Mal-Adaptativos

Para a adequada compreensão deste tópico, importa salientar, desde logo, a


existência de cinco necessidades emocionais nucleares para os seres humanos. As
necessidades postuladas, presentes em todas as pessoas mas em graus de
intensidade diversos (carácter universal), são as seguintes:
1) Vínculos seguros aos outros;
2) Autonomia, competência e sentido de identidade;
3) Liberdade para expressar emoções e necessidades válidas;
4) Espontaneidade e jogo;
5) Limites realistas e auto-controlo.

Sendo os esquemas resultantes, sobretudo durante a infância, da não


satisfação destas necessidades e a pessoa psicologicamente saudável aquela que as
consegue de modo adaptativo satisfazer, facilmente se compreende que um dos
principais objectivos da Terapia Focada nos Esquemas consista em ajudar os
pacientes a descobrir meios adaptativos para a sua satisfação.
A vivência de experiências nocivas, de carácter repetitivo, durante a infância,
que habitualmente conduzem à não satisfação das necessidades enumeradas parece,
de facto, ser a origem primária dos EPMs.

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Os esquemas que se desenvolvem mais cedo e que são os mais rígidos são
geralmente originados no seio da família nuclear. Neste período, a dinâmica da família
da criança sobrepõe-se, em larga medida, à dinâmica do mundo da criança na sua
globalidade, uma vez que a criança não tem provavelmente acesso, durante esta fase,
a outras formas de funcionamento. Outras influências, como os pares, a escola,
grupos na comunidade e a cultura circundante, tornam-se progressivamente mais
importantes à medida que a criança cresce, podendo, também estes contextos,
conduzir à formação de EPMs. De destacar, contudo, que os esquemas que se
desenvolvem em idades mais tardias não são, regra geral, tão poderosos ou rígidos,
comparativamente com os que se desenvolvem durante as idades mais precoces. O
esquema de Isolamento Social/Alienação é um exemplo de um esquema que
habitualmente se desenvolve numa fase tardia da infância ou mesmo na adolescência
e que geralmente não reflecte a dinâmica da família nuclear.
A capacidade da criança para satisfazer as necessidades emocionais
nucleares referidas é influenciada não só por variáveis familiares (ex. estilo parental) e
sócio-culturais (ex. experiências de socialização com os pares), mas também pelo
temperamento emocional da criança, que, desde cedo, estabelece uma forte
interacção com as primeiras.
De salientar que o temperamento emocional da criança não só interage com
acontecimentos dolorosos, com ocorrência durante a infância, como também
diferentes temperamentos expõem selectivamente a criança a diferentes
circunstâncias de vida. Por exemplo, uma criança disposicionalmente agressiva
tenderá, com maior facilidade, a desencadear o abuso físico de um pai violento do
que uma criança disposicionalmente passiva e sossegada. Por outro lado, diferentes
temperamentos emocionais tornam as crianças diferenciadamente vulneráveis a
acontecimentos de vida semelhantes. Duas crianças podem, efectivamente, reagir de
forma muito diferente a um mesmo tipo de tratamento parental. Consideremos o
exemplo de duas crianças que são sistematicamente rejeitadas pela figura materna. A
criança tímida tenderá a isolar-se do mundo exterior e, por conseguinte, a tornar-se
progressivamente mais dependente da figura materna. A criança com traços
temperamentais de sociabilidade mais marcados tenderá provavelmente a orientar-se
para o mundo exterior e, como resultado desse movimento, a estabelecer outros
relacionamentos, naturalmente mais satisfatórios.
Não obstante a importância do temperamento emocional da criança, tem-se
observado que ambientes extremamente favoráveis ou aversivos podem minimizar ou
tornar nula a influência do primeiro na formação de EPM. Por exemplo, o contacto
precoce com um ambiente familiar seguro e afectuoso poderá transformar, mesmo

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uma criança temperamentalmente tímida, numa pessoa afável em muitas situações


do quotidiano. Inversamente, uma criança disposicionalmente sociável poderá tornar-
se tímida e isolada mediante a sua confrontação com um ambiente familiar
extremamente rejeitante. De modo semelhante, temperamentos emocionais extremos
podem minimizar ou neutralizar a influência de um ambiente familiar dito normal e
promover o aparecimento de psicopatologia em pessoas que, pela análise da sua
história de vida, não apresentariam qualquer justificação para essa condição.
Atendendo à informação exposta, é hoje defendido que a vivência de padrões
repetitivos de experiências disfuncionais com pais, parentes e pares, responsáveis
pela não satisfação das necessidades nucleares referidas, pode conduzir, de modo
probabilístico e nunca determinista, à formação de EPMs.
Serão enumeradas, de seguida, algumas destas experiências.
A forma de funcionamento familiar a seguir descrita potencia o aparecimento
de problemas no domínio esquemático Distanciamento e Rejeição, no qual se
inscrevem os seguintes EPMs: (1) Abandono/Instabilidade, (2)
Desconfiança/Abuso, (3) Privação Emocional, (4) Defeito/Vergonha e (5)
Isolamento Social/Alienação.
Com o intuito de se desenvolver de modo adequado, a criança necessita de um
ambiente familiar seguro, isento de um elevado grau de conflito, no qual sinta a
empatia dos pais em relação aos seus sentimentos, desejos e interesses e onde a
expressão destes últimos seja, em simultâneo, encorajada. Visando a mesma
finalidade, a criança deve, aquando da existência de outros irmãos, ser sujeita a um
grau equivalente de atenção e carinho por parte dos pais em relação a estes, bem
como ser encorajada a interagir com outras crianças que não apenas os irmãos.
Desempenha, ainda neste contexto, papel de particular relevância o resultado das
experiências de socialização levadas a cabo pela criança ao longo da infância e da
adolescência.
Assim, as crianças desenvolvem mais provavelmente os EPMs acima
enumerados quando não recebem níveis suficientes de afecto, respeito ou atenção por
parte das figuras parentais, resultando daqui uma lacuna no que respeita à satisfação
de uma das necessidades emocionais nucleares com que iniciámos o presente texto –
“vínculos seguros aos outros”. Uma insuficiência neste âmbito pode ter origens
diversas. Por vezes, a sua formação pode dever-se à morte precoce de um dos
progenitores e/ou ao abandono, também ele precoce, de um destes da residência da
criança. Outras vezes há que a emergência destes esquemas é potenciada quando a
criança é deixada sozinha em casa por longos períodos de tempo durante vários dias
(ex. EPM de Abandono, EPM de Defeito/Vergonha). A rejeição da criança por parte do

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grupo de pares e o fracasso no estabelecimento de relações amorosas pode


igualmente influir no aparecimento destes esquemas. De igual modo, a sua formação
pode também ser promovida quando a criança é submetida a um tratamento abusivo,
punitivo (física e/ou psicologicamente) e crítico por parte das figuras parentais e/ou
dos pares (ex. EPM de Desconfiança/Abuso, EPM de Defeito/Vergonha), ou quando a
família é imprevisível na satisfação das necessidades da criança (ex. EPM de Privação
Emocional). De destacar, por último, que a percepção de ser-se diferente ao longo do
processo de crescimento, qualquer que seja a origem desta percepção (ex. membros
de minorias étnicas, órfãos e crianças adoptadas, crianças filhas de pais alcoólicos,
crianças talentosas, crianças especialmente belas ou feias, crianças pertencentes a
famílias com um estatuto sócio-económico distinto do das restantes famílias
circundantes), desempenha um papel extremamente relevante na formação de EPMs
inscritos neste domínio, especialmente do EPM de Isolamento Social/Alienação. Com
igual relevância para a formação deste EPM salientam-se experiências de socialização
fracassadas, nas quais se poderão incluir vivências de ridicularização, humilhação e
de exclusão social por parte dos pares.
Quando os pais falham em fornecer um ambiente à criança que seja promotor
de um sentido de identidade, de competência e de autonomia, um dos seguintes
esquemas pode desenvolver-se: (1) Dependência/Incompetência; (2)
Vulnerabilidade ao Mal e à Doença; (3) Emaranhamento/Eu Subdesenvolvido e
(4) Fracasso.
A criança necessita, com o intuito de desenvolver um sentido de identidade, de
competência e de autonomia, de pais que, por um lado, encorajem a manifestação dos
interesses, necessidades e desejos da criança e, por outro, reforcem o esforço que é
empreendido por esta na satisfação ou prossecução dos mesmos. Assim, para que
seja alcançado um funcionamento independente, a criança deve ser adequadamente
apoiada, não devendo ser submetida a uma ajuda exagerada ou a restrições e/ou
punições excessivas por parte dos pais e/ou parentes. Necessita também que lhe seja
assegurado que se trata de um indivíduo robusto e saudável e que o mundo se trata
de um local relativamente seguro. Deve ainda ser-lhe concedida a liberdade de
exprimir toda a gama de emoções, incluindo a raiva, e, por último, serem-lhe atribuídas
algumas responsabilidades das quais se deve encarregar.
Problemas neste domínio de esquemas (“Autonomia e Desempenho
Deteriorados”) surgem habitualmente quando a criança é confrontada com pais que se
preocupam constante e desnecessariamente, catastrofizando a probabilidade e a
severidade da ocorrência de determinados acontecimentos (ex. EPM de
Vulnerabilidade ao Mal e à Doença), ou quando é criança é sobreprotegida,

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promovendo um padrão de funcionamento onde a acção independente da criança é


imediatamente interrompida e apoiada (ex. EPM de Dependência/Incompetência; EPM
de Fracasso). O fornecimento de pouca orientação e/ou apoio à criança para e na
execução de determinadas tarefas e o fracasso no reforço da actuação competente da
criança fora da família, podem ser experiências igualmente conducentes à formação
dos EPMs deste domínio esquemático. De realçar que, não só o fracasso no reforço
da actuação competente da criança fora da família, como também a vivência de
experiências de humilhação, ridicularização, e, portanto, de desencorajamento na
infância, podem conduzir à formação de esquemas deste domínio, particularmente dos
EPMs de Fracasso e de Dependência/Incompetência. Embora menos frequente, há
uma outra experiência com relevância para a formação do esquema de Fracasso. Os
pais podem, ainda que de forma inconsciente, impedir a criança de ser bem sucedida
com o receio de que esta os abandone caso atinja um patamar de funcionamento
elevado. Assim, os pais enviam, mais uma vez inconscientemente, mensagens de que
irão rejeitar a criança ou privá-la emocionalmente, caso esta se tornasse
excessivamente bem sucedida. A criança desenvolve, neste âmbito, “medo do
sucesso”, transportando esta forma de funcionamento até à actualidade.
Atendendo à informação atrás exposta, salienta-se, por último, que o
desencorajamento, por parte das figuras parentais, da expressão das necessidades,
sentimentos e desejos únicos da criança, poderá conduzir a um funcionamento familiar
extremamente emaranhado e, em simultâneo, promover na criança a formação de
crenças habitualmente características do EPM de Emaranhamento/Eu
Subdesenvolvido.
De modo natural, outras formas de funcionamento familiar potenciarão a
emergência de outros EPMs, pertencentes a outros domínios de esquema.
Um funcionamento familiar caracterizado pela permissividade, sobre-
indulgência e sentido de superioridade, mais do que por confrontação apropriada,
definição de limites realistas em relação à tomada de responsabilidade e pela
aplicação de medidas disciplinares adequadas, conduz probabilisticamente à
emergência de EPMs pertencentes ao domínio esquemático designado por Limites
Deteriorados, composto pelos EPMs de Limites Indefinidos/Grandiosidade e Auto-
Controlo/Auto-Disciplina Insuficientes.
A falha na aprendizagem de que as relações envolvem partilha e reciprocidade,
permitindo-se, assim, à criança a realização das mais variadas actividades sem que
seja alertada para a necessidade de atender aos desejos e interesses dos outros,
assume peculiar importância na formação do EPM de “Limites
Indefinidos/Grandiosidade”. Não obstante, a formação deste EPM pode também

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dever-se à compensação de EPMs mais primários, nomeadamente os de


“Defeito/Vergonha” e de “Privação Emocional”. O fornecimento de uma supervisão e
orientação desadequadas, em virtude de um envolvimento parental deficitário,
desempenha um papel igualmente importante na formação do esquema em questão.
Estas crianças parecem ter permanecido, de facto, muitas vezes sozinhas em casa
enquanto os pais estavam a trabalhar, não tendo portanto ninguém que as
disciplinasse de forma adequada.
O fracasso na promoção de experiências que permitam à criança a aquisição
da capacidade de tolerância face à frustração ou a níveis normais de desconforto
conduz, geralmente, ao desenvolvimento do EPM de “Auto-Controlo/Auto-Disciplina
Insuficientes”. Outras vezes há que este esquema se associa a um esquema mais
primário, dos quais o mais frequente é o EPM de Subjugação. Nestas circunstâncias, o
EPM de “Auto-Controlo/Auto-Disciplina Insuficientes” emerge porque a pessoa vem,
desde há longa data, a suprimir as suas necessidades emocionais, desejos e
interesses em virtude de possuir, em simultâneo e de forma mais primária, um EPM de
Subjugação. A sua acumulação provoca uma mudança de funcionamento consonante
com o EPM “Auto-Controlo/Auto-Disciplina Insuficientes”. É habitual, neste particular,
haver mudanças de funcionamento relativamente frequentes (Subjugação→Auto-
Controlo/Auto-Disciplina Insuficientes→Subjugação…), o que permite, de modo
relativamente facilitado, a detecção de situações desta natureza.
Um ambiente familiar no qual as necessidades, desejos e interesses da criança
sejam subvalorizadas em detrimento das necessidades, desejos e interesses
parentais, e em que a expressão emocional da criança não seja, por conseguinte,
encorajada, pode levar ao aparecimento dos seguintes EPMs, todos eles pertencentes
ao domínio esquemático Influência dos Outros: (1) Subjugação, (2) Auto-sacríficio
e (3) Procura de Aprovação/Procura de Reconhecimento.
As interacções estabelecidas num ambiente familiar com estas características
são habitualmente baseadas na aceitação condicional: as crianças têm de suprimir
aspectos importantes de si próprios de forma a obterem amor, aprovação e atenção.
As necessidades e desejos dos pais, não só as de cariz emocional, mas também
social (ex. estatuto e aceitação sociais), são mais valorizadas e, portanto, prioritárias,
sendo relegados para segundo plano os sentimentos e necessidades únicos das
crianças. O não encorajamento da expressão emocional, em particular da raiva,
consequência directa da forma de funcionamento imediatamente atrás descrita,
conduz, de igual modo, à formação destes EPMs. Não obstante estas comunalidades,
determinadas experiências desenvolvimentais conduzem mais probabilisticamente à
formação de diferentes EPMs, ainda que pertencentes ao mesmo domínio. A

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interacção repetitiva precoce com um pai controlador, habitualmente punidor da


expressão espontânea da criança, conduz geralmente à formação do EPM de
Subjugação. Por sua vez, a interacção repetitiva precoce com um pai frágil, carente,
necessitado, a quem falta a capacidade de guiar e proteger a criança, leva
habitualmente ao aparecimento de um EPM de Auto-Sacrifício, sendo recorrente,
nestas circunstâncias, a criança assumir, desde cedo, um papel de criança
parentificada. No que diz respeito ao EPM “Procura de Aprovação/Procura de
Reconhecimento” encontram-se habitualmente duas origens para a sua formação. Por
um lado, as crianças podem ter sido encorajadas pelas figuras parentais, cujos
objectivos e expectativas incidiam no que era socialmente valorizado e reconhecido
pela cultura circundante, a lutar pela obtenção de aprovação e/ou reconhecimento
externos, mais do que lutar pela satisfação das suas necessidades, desejos e
interesses pessoais distanciando-se, assim, progressivamente mais do seu self
verdadeiro, autêntico e genuíno. A sua formação pode, por outro lado, tratar-se de
uma compensação de outros EPMs, dentro dos quais se destacam, pela sua maior
frequência, os seguintes: Defeito/Vergonha, Privação Emocional e Isolamento
Social/Alienação.
O confronto com um funcionamento familiar caracterizado pelo predomínio do
dever, do desempenho, do perfeccionismo, da obediência a regras e do evitamento de
erros, sobre o prazer, a alegria e o relaxamento, conduz, por sua vez, à emergência
probabilística de quatro EPMs, pertencentes ao domínio esquemático Sobrevigilância
e Inibição: (1) Negativismo/Vulnerabilidade ao Erro, (2) Controlo
Excessivo/Inibição Emocional, (3) Padrões Excessivos/Hipercriticismo e (4)
Punição.
Existe tipicamente, nestas famílias, uma “sub-corrente” de pessimismo e
preocupação, isto é, a crença de que as coisas poderão desabar a qualquer momento,
se a pessoa falhar na sua vigilância e cuidado. Uma vez que os resultados negativos
potenciais são exagerados (ex. colapso financeiro, humilhação), este funcionamento
familiar envolve um medo irregular de cometer erros, caracterizando-se os seus
elementos por preocupação, vigilância, pessimismo, queixas ou indecisão crónicos. É
ainda habitual, neste contexto, o entusiasmo da criança ser rapidamente interrompido
e a criança alertada recorrentemente para o que poderá eventualmente correr mal.
Estas famílias são frequentemente designadas por “famílias cinzentas”. De realçar que
as características descritas assumem peculiar preponderância no desenvolvimento do
EPM de “Negativismo/Vulnerabilidade ao Erro”.
Serão de seguida destacadas outras origens, ainda que menos frequentes,
para o aparecimento deste esquema. A vivência de uma infância marcada por uma

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quantidade anormalmente elevada de acontecimentos negativos (ex. perdas,


injustiças, dificuldades) pode promover, de igual modo, o surgimento deste EPM. A
sua formação pode ainda dever-se à compensação de outros esquemas, dos quais o
mais frequente é o de Privação Emocional. Pode, por último, ter uma origem biológica.
Não raras vezes, a criança vivencia no seio destas famílias, por intermédio de um ou
mais familiares (habitualmente uma das figuras parentais), experiências de humilhação
após manifestar espontaneamente as suas emoções e/ou impulsos.
Geralmente, a crença que é transmitida à criança é a seguinte: “é mau mostrar
o que sentimos, falar dos que sentimos ou agir de forma impulsiva; é bom manter os
nossos sentimentos e impulsos no nosso interior, sob o nosso controlo”. Este
funcionamento conduz probabilisticamente à formação do EPM de Controlo
Excessivo/Inibição Emocional. No seguimento do exposto, é recorrente haver um
comportamento punitivo no seio destas famílias, habitualmente concretizado por uma
das figuras parentais, no qual a criança é sistematicamente punida por manifestar de
forma espontânea as suas emoções e impulsos e por não cumprir os padrões
valorizados pelo sistema familiar.
Este funcionamento conduz à formação do EPM de Punição. A internalização
dos padrões de funcionamento familiar, nos quais se incluem, para além do
supracitado, o cumprimento de regras e expectativas rígidas e interiorizadas acerca do
desempenho e do comportamento (regras rígidas e “deveres” irrealisticamente
elevados em relação à moral, à ética, ao domínio cultural e religioso), muitas vezes
comprometendo a felicidade, a auto-expressão, o relaxamento, as relações próximas
e/ou a saúde, conduzem, usualmente, à formação do EPM de Padrões
Excessivos/Hipercriticismo. Este esquema pode igualmente ser formado como
compensação de um esquema de Defeito/Vergonha (os pacientes sentem-se
defeituosos e compensam este sentimento tornando-se perfeitos - evitam a activação
do primeiro).

O Processo de Perpetuação dos Esquemas

Segundo Young et al (2003), um dos processos fundamentais na análise do


funcionamento esquemático é a Perpetuação dos Esquemas. Este processo diz
respeito a tudo o que o paciente faz (de forma interna ou comportamental) que permite

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que o esquema se mantenha activo e preponderante no seu processamento de


informação.
“A Perpetuação do Esquema inclui todos os pensamentos, sentimentos e
comportamentos que reforçam o esquema em vez de conduzirem ao seu tratamento –
todas as profecias que se auto-cumprem do paciente em questão. Os esquemas são
perpetuados através de três processos fundamentais: distorções cognitivas, padrões
comportamentais auto-derrotistas e estilos de coping desenvolvidos a partir do
esquema” (Young et al, 2003, p. 30).
Através das distorções cognitivas, o paciente enviesa o seu Processamento da
Informação, interpretando as situações de forma consonante com o funcionamento do
seu esquema, privilegiando e maximizando a informação que seja concordante com
ele, e desprezando e minimizando a informação que contradiga a lógica inerente a um
determinado esquema.
Ao nível das distorções cognitivas, e segundo Beck (1996 in Rijo & Galhardo,
2001), podemos referir:
- Pensamento Dicotómico: manifesta-se na tendência para colocar
todas as experiências em uma de duas categorias opostas, sem haver lugar ao “meio
termo”. Ou se é um sucesso ou se é um fracasso, pelo que qualquer desempenho
abaixo da perfeição é um fracasso total.
- Sobregeneralização: entender um evento particular como
característico da vida em geral, mais do que como um simples evento entre muitos
outros.
- Abstracção Selectiva: consiste em focar a atenção num único detalhe
de uma situação complexa, ignorando outros aspectos relevantes dessa situação e
conceptualizando-a com base nesse detalhe.
- Desqualificar Experiências Positivas: desqualificar experiências posi-
tivas que entrariam em conflito com a visão negativa ditada pelo esquema.
- Leitura da Mente: assumir que se sabe o que os outros estão a pensar
ou como os outros estão a reagir, apesar de ter poucas ou nenhumas provas que isso
se verifique.
- Bola de Cristal: reagir como se as expectativas em relação a aconteci-
mentos futuros fossem realidades adquiridas e inabaláveis, em vez de as reconhecer
como medos, previsões ou esperanças.
- Catastrofização: encarar acontecimentos negativos actuais ou anteci-
pados, como catástrofes intoleráveis, em vez de procurar uma perspectiva mais
realista.

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- Magnificação/Minimização: tratar alguns aspectos de uma dada situa-


ção, características pessoais ou experiências triviais como muito ou pouco
importantes, independentemente do seu significado real.
- Raciocínio Emocional: assumir que as próprias reacções emocionais
reflectem, necessariamente, a situação verdadeira.
- “Deverias”/”Terias”: o uso de afirmações do tipo “deverias” ou “tenho
que” como mandamentos inatacáveis reguladores do pensamento e comportamento.
- Rotular: atribuir um rótulo global a si próprio, em vez de se referir a
acontecimentos ou acções específicos.
- Personalização: assumir que se é a causa de um determinado
acontecimento externo apesar de, na realidade, outros factores serem os
responsáveis.

Em termos afectivos, o indivíduo pode bloquear as emoções que são


despoletadas pela activação esquemática, o que leva, também, a perpetuação do
esquema, tal como se verifica nos processos de Evitamento emocional. Quando o
afecto é bloqueado, o esquema não atinge um grau de activação que permita que o
indivíduo o auto-percepcione, pelo que o impede de encetar medidas que visem o seu
enfraquecimento.
Em termos comportamentais, o indivíduo enceta comportamentos auto-
derrotistas, seleccionando e permanecendo, de forma não-consciente, em situações e
relações que despoletem e perpetuem o esquema, evitando, consequentemente,
relações que pudessem conduzir ao enfraquecimento do esquema e que invertessem
a lógica da progressiva sensibilização da activação esquemática. Em termos
interpessoais, o paciente tende a relacionar-se com os outros de forma que potencie
respostas negativas, reforçando, também, o esquema.
Ao nível dos estilos de coping mal-adaptativos e das respostas mal-adaptativas
consequentes, os autores supracitados referem que estes são desenvolvidos de forma
precoce, pelo paciente, de forma a evitar que experiencie as emoções intensas que a
activação dos esquemas pressupõe, desempenhando assim um papel importante na
perpetuação esquemática.
No contexto da infância, um Esquema Precoce Mal-Adaptativo represente uma
ameaça para o indivíduo, ligada à frustração de uma das suas necessidades
nucleares, assim como inclui o medo da intensidade emocional ligada à activação do
esquema. Face a esta ameaça, a criança pode responder através da combinação dos
três estilos de coping e das respostas consequentes: a criança pode render-se
(manutenção do esquema), pode evitar (evitamento do esquema) ou sobrecompensar

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

(compensação do esquema). Qualquer um destes estilos de coping opera de forma


“inconsciente”, sem que o indivíduo dê conta deles.
Estes estilos de coping são, habitualmente, eficazes e adaptativos na infância e
podem ser vistos como mecanismos saudáveis de sobrevivência, mas com o
crescimento do indivíduo tornam-se mal-adaptativos porque continuam a perpetuar o
esquema mesmo quando o indivíduo se confronta com situações diferentes nas quais
se poderia “socorrer” de estratégias também diferentes. Assim, pelo facto de se
tornarem rígidos e inflexíveis, os estilos de coping mal-adaptativos acabam, em última
análise, por “imprisionar o indivíduo” (Young et al, 2003, p.33), impedindo a vivência
de situações desconfirmadoras dos Esquemas Precoces Mal-Adaptativos.

Rendição ao Esquema

A rendição ao esquema implica que o indivíduo ceda ao funcionamento que ele


lhe impõe, não o evitando, nem lutando contra ele. Assim, o indivíduo age, e pensa, de
forma a confirmar os pressupostos basilares do esquema, “o que explica a rigidez, tão
característica dos doentes com Distúrbios de Personalidade” (Rijo, 2000, p. 155).
Sem darem por isso, os pacientes reproduzem os padrões de funcionamento
esquemáticos, revivendo as experiências precoces que criaram e reforçaram o
esquema. Quando se confrontam com situações potencialmente activadoras do
esquema, os indivíduos tendem a experienciar as emoções resultantes intensamente.
Comportamentalmente, tendem a seleccionar relacionamentos (ao nível dos parceiros
amorosos e dos amigos) que confirmem aquilo que o esquema lhes “prescreve”.
Estes processos de manutenção do esquema fazem com que o paciente possa
sentir-se desanimado quanto à possibilidade/plausibilidade de uma mudança dos seus
Esquemas Precoces Mal-Adaptativos, mesmo depois de ter aprendido o seu
funcionamento, de os conseguir reconhecer e monitorizar.

Evitamento do Esquema

Quando um paciente se regula pelo parâmetro do evitamento, ele organiza a


sua vida de forma a nunca se confrontar com situações que possam levar à activação
do esquema, tentando viver como se o esquema não existisse. Fazem-no porque a

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51
Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

activação dos Esquemas Precoces Mal-Adaptativos envolve níveis elevado de afecto


negativo (cólera, ansiedade, tristeza ou culpa), pelo que tentam, ao máximo, evitar a
activação esquemática.
Segundo Young (1990), o Evitamento do Esquema actua a três níveis:
cognitivo, afectivo e comportamental.
O evitamento cognitivo surge quando os pacientes evitam pensar sobre
temáticas ligadas ao esquema, bloqueando pensamentos e imagens que,
potencialmente, possam activá-lo. Quando tais pensamentos surgem, eles procuram
distraírem-se ou colocá-los fora das suas cabeças.
O evitamento afectivo leva a que os indivíduos evitem sentir o esquema, já que
quando as emoções emergem, eles, de forma reflexa, fazem-nas “submergir”. Assim,
os pacientes não sentem raiva, tristeza ou ansiedade mesmo quando seria normal que
experienciassem tais emoções. Este processo pode levar a que os pacientes bebam
excessivamente, consumam drogas, encetem actividades sexuais promíscuas, façam
limpezas compulsivas ou se tornem viciados em trabalho. Em consequência
experienciam emoções mais crónicas, difusas e generalizadas, além de sintomatologia
psicossomática em maior número.
O evitamento comportamental leva a que os pacientes evitem situações
concretas que possam activar o esquema, o que origina situações de agorafobia, de
isolamento social, desistências de casamentos ou mudanças de rumo profissional.
Muitas vezes, estes doentes evitam encetar um processo terapêutico. Por
exemplo, estes pacientes podem “esquecer-se” de realizar o trabalho de casa
terapêutico, refreiam as manifestações de afecto, abordam apenas questões
superficiais, atrasarem-se para as consultas ou abandonarem a terapia.

Compensação do Esquema

Quando os pacientes compensam, eles sentem, pensam, adoptam


comportamentos e relacionam-se com os demais de acordo com o oposto daquilo que
se poderia predizer a partir do conhecimento da estrutura esquemática do indivíduo.
Perante o esquema, os pacientes “encetam uma fuga para a frente”, contra-
atacando, como forma de fugir ao sofrimento que o esquema envolve, escapando à
vulnerabilidade que percepciona. Uma análise superficial diria que a pessoa é auto-
confiante e segura, mas, na verdade, ela sente a pressão da “erupção” da emoção
esquemática.

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

A compensação do esquema pode ser vista como uma tentativa parcialmente


bem sucedida para desafiar a lógica dos esquemas nucleares e conseguir que as suas
necessidades sejam satisfeitas. No entanto, em vez de enfraquecer o esquema, a
compensação acaba por perpetuá-lo, uma vez que o seu comportamento é excessivo,
intenso e pouco produtivo. É saudável lutar contra o esquema, desde que o
comportamento adoptado seja proporcionado à situação, tenha em conta os
sentimentos e susceptibilidades dos demais e que possa, razoavelmente, levar a um
resultado proveitoso. Assim, os pacientes ficam “encurralados” neste “contra-ataque”,
já que estes pressupostos nem sempre são respeitados.
Dado que a compensação envolve, habitualmente, o falhanço no
reconhecimento da vulnerabilidade subjacente ao esquema, ela não deixa o doente
preparado para a intensidade emocional que emerge, quando o processo
compensatório falha, e quando é activado o esquema subjacente.
A compensação ocorre, habitualmente, de um esquema oposto ao esquema
primário, como por exemplo, o desenvolvimento de um esquema de Grandiosidade em
“resposta” a um esquema de Defeito/Vergonha.
Neste contexto, importa enfatizar que os autores diferenciam o esquema
propriamente dito das estratégias que o indivíduo utiliza para lidar com o esquema,
pelo que o esquema contém memórias, emoções, sensações corporais e cognições,
mas não contém as respostas comportamentais do indivíduo. Ou seja, o esquema leva
ao comportamento, constituindo para da resposta de coping do indivíduo.
A diferenciação entre esquemas e estilos de coping e resposta ao esquema
radica no facto de o mesmo indivíduo utilizar diferentes estilos de coping em diferentes
situações e alturas da sua vida para lidar com o mesmo esquema. Por outro lado,
diferentes pacientes usam uma grande gama de comportamentos para lidar com o
esquema. Assim, os comportamentos que os indivíduos utilizam para lidar com o
esquema não são intrínsecos ao próprio esquema.
No quadro III, que apresentamos de seguida, são referidos exemplos do
padrão de funcionamento dos pacientes, para cada esquema, no que concerne aos
estilos de coping de manutenção, evitamento e compensação.

Exemplos de Exemplos de Exemplos de


EMP
manutenção evitamento compensação
Abandono/ Selecciona parceiros que Evita relações íntimas; Pressiona o parceiro de
não podem comprometer- bebe muito quando tal forma, que acaba
Instabilidade
se e permanecer na sozinho por afastá-lo
relação Ataca o seu parceiro
devido a pequenas
separações

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53
Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Desconfiança/ Selecciona parceiros Evita tornar-se vulnerável Usa e abusa dos outros
abusivos e permite que e confiar em alguém; (“abusar antes que
Abuso
estes o sejam guarda segredos abusem de mim…”)
Privação Emocional Selecciona parceiros que Evita todas as relações É emocionalmente
emocionalmente sejam íntimas exigente com os
insatisfatórios e não parceiros e amigos
requere que estes íntimos
satisfaçam as suas
necessidades
Defeito/ Selecciona amigos Evita expressar Aparenta ser perfeito,
críticos e que o rejeitem; pensamentos e enquanto critica e
Vergonha
autodesvaloriza-se sentimentos verdadeiros rejeita os outros
e evita que os outros se
aproximem
Isolamento Em encontros sociais Evita situações sociais e Torna-se um
Social/Alienação foca-se, exclusivamente, grupos “camaleão” para se
nas diferenças para com enquadrar em vários
os demais, em vez de grupos
atender às semelhanças
Dependência/ Pede a pessoas Evita encetar novos Torna-se tão “auto-
significativas (pais ou desafios, como aprender confiante” que não
Incompetência
esposa) para decidir a conduzir pergunta nada a
aspectos importantes do ninguém
seu quotidiano (pagar (contradependência)
contas, fazer compras…)
Vulnerabilidade ao Atende, de forma Evita locais que não Age de forma
Mal e à Doença obsessiva, a catástrofes sejam “totalmente imprudente, sem
e antecipa-as no seu seguros” atender ao perigo
quotidiano (contrafobia)
Emaranhamento/ Conta tudo aos pais, Evita a intimidade; Tenta tornar-se o
mesmo quando adulto; permanece independente oposto de outros
Eu Sub-Desenvolvido
vive através do parceiro significativos de todas
as formas
Fracasso Executa as tarefas de Evita totalmente tarefas Define objectivos com
forma descuidada e desafiantes; resigna nos base em expectativas
desinteressada trabalhos irrealistas e age com
base nesse padrão
Grandiosidade Vangloria-se dos seus Evita situações em que Atende,
próprios feitos e não é superior, mesmo excessivamente, às
“atropela”os outros que aquelas em que é necessidades dos
interferem com eles mediano outros
Auto-Disciplina/Auto- Desiste facilmente de Evita aceitar Tornar-se
Controlo Insuficientes tarefas rotineiras responsabilidades excessivamente auto-
controlado ou auto-
disciplinado
Subjugação Permite que outros Evita situações que Revolta-se contra o
indivíduos controlem possam envolver conflitos autoritarismo
situações e tomem com outros
decisões
Auto-Sacrifício De forma excessiva, dá Evita situações que Dá o mínimo possível
muito aos outros e não envolvam dar ou pedir aos outros
exige nada em troca

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Procura de Age de forma a Só interage com pessoas Age de forma a


Aprovação/ impressionar os outros que o aprovem provocar a
desaprovação dos
Reconhecimento outros; assume um
papel secundário nas
situações
Negatividade/ Foca-se nos aspectos Bebe para evitar Torna-se
negativos das situações, pensamentos negativos e excessivamente
Pessimismo
ignorando os positivos; infelizes optimista, negando
preocupa-se cenários desagradáveis
constantemente; evita
qualquer resultado
negativo
Inibição Emocional Mantém uma postura Evita situações em que Tenta assumir um
calma, emocionalmente as pessoas possam papel exageradamente
neutra discutir ou expressar emocional, mesmo que
sentimentos pareça pouco genuíno
Padrões Excessivos/ Gasta grandes Evita ou resigna em Faz as tarefas de forma
quantidades de tempo situações e tarefas em descuidada, não
Hipercriticismo
para atingir a perfeição que o seu desempenho atendendo a qualquer
possa ser avaliado tipo de padrões
Punição Lida com os outros e Evita os outros com Age de forma
consigo próprio de uma medo de ser castigado permissiva, perdoando
forma punitiva tudo e todos

Quadro III – Exemplos de manutenção, evitamento e compensação para cada um dos EPMs (adap. Young et al¸ 2003)

A Relação Terapêutica na Terapia Focada nos Esquemas

Tal como em todos os modelos existentes no âmbito da Psicologia Clínica,


também na Terapia Focada nos Esquemas, dadas as suas características e
idiossincrasias, é dada ênfase ao papel da relação terapêutica no processo
psicoterapêutico, de forma a que se estabeleça uma “aliança entre o terapeuta e o
lado saudável do paciente contra os seus esquemas “ (Young et al, 2003, p.178).
Neste contexto, Young et al (2003) referem que a relação terapêutica é “vital”
na abordagem dos Esquemas Precoces Mal-Adaptativos, sublinhando que na relação
terapêutica co-existem dois elementos particularmente relevantes para a Terapia
Focada nos Esquemas: a ênfase dada à confrontação empática e ao uso da
reparentização limitada. Assim, a relação terapêutica deve englobar, de forma
simultânea, uma transmissão clara das razões que subjazem à perpetuação dos
esquemas problemáticos do paciente e uma confrontação para a necessidade de os
alterar no decorrer do processo psicoterapêutico, de forma a que se dá a activação de
um dado esquema, “o terapeuta procure discutir os aspectos da relação terapêutica

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

que se tornam difíceis para o paciente” (Young, 1990, p. 26). A reparentização limitada
implica que o terapeuta procure, dentro dos constrangimentos inerentes à relação
terapêutica, colmatar as necessidades nucleares que resultaram daquilo que os
pacientes não obtiveram dos seus pais enquanto crianças.
A diversidade de constituições esquemáticas, inerente à multiplicidade de
diagnósticos e às próprias características intrínsecas dos doentes, leva a que, no
sentido de potenciar o sucesso da psicoterapia, o terapeuta deva conceptualizar, a
priori, a forma como implementará a relação, de forma a torná-la (verdadeiramente)
terapêutica, capitalizando o valor que esta terá no contexto terapêutico.
Assim, cada paciente, independentemente de eventuais semelhanças
esquemáticas com outros doentes, requer uma abordagem própria no que concerne à
efectivação da relação terapêutica, para que esta se constitua como “ingrediente”
fulcral na “receita psicoterapêutica”, para a qual não há receitas rígidas e inflexíveis.

A relação terapêutica, tal como referem Young et al (2003), assume


importância de forma transversal no processo terapêutico, quer na avaliação de
esquemas, quer na educação do doente sobre os seus esquemas, assim como na sua
mudança.
No que concerne à avaliação dos esquemas, a relação terapêutica permite que
se estabeleça rapport 1 (através da forma como o terapeuta orienta a sua acção pelos
vectores da empatia, confiança e aceitação genuína), que o terapeuta formule a
conceptualização do caso (através da activação de esquemas e da discussão e
exploração, de forma aberta com o paciente, que esta acarreta), decida qual o estilo
de reparentização limitada adequado (através da análise da sua história de vida,
revisão das suas dificuldades interpessoais, exercícios imagéticos ou da análise do
comportamento do paciente na consulta) e determine qual a forma como os seus
próprios esquemas interferem (ou não) com o processo psicoterapêutico.

Ao nível da educação do paciente, os terapeutas aproveitam a relação


terapêutica para elucidar os pacientes quanto às características dos esquemas,
capitalizando as situações em que estes são activados e em que utiliza a confrontação
empática, de forma contingente. Por outro lado, o terapeuta procurará não reforçar os

1
Beck et al (1967) referem que o rapport constitui um acordo harmonioso entre terapeuta e
paciente. Quando um terapeuta experimenta um senso de rapport, ele interessa-se pelo
paciente e importa-se com ele, envolvendo também uma certa liberdade, segurança de
comunicação e uma componente empática, potenciando a efectividade da relação terapêutica e
da própria intervenção.

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estilos de coping mal-adaptativos do paciente, comunicando-lhe porque não o faz,


criando, assim, oportunidades de aprendizagem para o paciente.

No que concerne à mudança esquemática, objectivo primordial da Terapia


Focada nos Esquemas, assumem relevância a confrontação empática e a
interpretação da reparentização limitada. A primeira implica que o terapeuta exprima
compreensão pela exposição do paciente e pelas dificuldades de alterar os seus
esquemas, enquanto, paralelamente, sublinha a importância dessa mesma mudança,
procurando um equilíbrio entre empatia com o paciente e confrontação dos seus
esquemas. Na segunda, cabe ao terapeuta proporcionar uma atmosfera que
preencha, de forma aproximada, as lacunas emocionais do paciente, de uma forma
que respeite a ética e os cânones profissionais. Aqui o terapeuta não procura “ser” o
progenitor do paciente, nem remetê-lo para uma dependência infantil, mas sim, e de
forma consistente, interagir com o paciente de uma forma conducente à mudança dos
Esquemas Precoces Mal-Adaptativos característicos do paciente.

Para a boa prossecução deste processo, e para a optimização da relação


terapêutica no contexto da Terapia Focada nos Esquemas, é necessário que, antes de
se debruçar sobre o paciente, o terapeuta construa uma noção bem definida de quais
são os esquemas e estilos de coping que o caracterizam, de forma a que estes não
interfiram com o modo como a intervenção terapêutica é idealizada e implementada.

Esquemas e estilos de coping do terapeuta

Segundo Young et al (2003), as reacções do terapeuta face ao paciente


constituem um recurso valioso durante o processo de avaliação dos esquemas do
paciente. No entanto, esse pressuposto só se verificará, se o terapeuta for capaz de
distinguir a sua intuição e interpretação clínica sobre o funcionamento do paciente da
activação dos seus próprios esquemas.
Deste modo, é importante que, no início do processo terapêutico, os terapeutas
tomem consciência da sua constituição esquemática em relação ao paciente com o
qual iniciará a psicoterapia, dado que o conhecimento dos próprios esquemas e estilos
de coping permitirá ao terapeuta prevenir erros no processo.
O terapeuta pode perguntar a si próprio determinadas questões sobre o
paciente em questão. Será que o terapeuta se preocupa verdadeiramente com o

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

paciente? Se não o faz, porque razão é que acontece? Será que o trabalho com o
paciente activa algum esquema do terapeuta? Qual ou quais? Como é que o terapeuta
lida com esse facto? Estará o terapeuta a agir de forma potencialmente arriscada para
o paciente? Como é que o terapeuta perspectivaria a realização de trabalho de
imagery com o paciente? Como se sentiria o terapeuta sobre a possibilidade de lidar
com as emoções do paciente, como pânico, raiva ou tristeza? Conseguirá o terapeuta
confrontar empaticamente os esquemas do paciente assim que eles surjam no
processo terapêutico? Será o terapeuta capaz de assegurar a reparentização que o
paciente necessita?

Face ao exposto, a interferência da constituição esquemática do terapeuta


pode ter um impacto negativo na consolidação da relação terapêutica e na
prossecução do processo psicoterapêutico. Seguidamente apresentaremos vários
exemplos, constantes em Young et al (2003), que ilustram alguns cenários em tais
interferências podem surgir.

1. Os esquemas do paciente chocam com os do terapeuta. Um risco no


processo psicoterapêutico é que os esquemas do paciente choquem com os
esquemas do terapeuta, levando a que se activem mutuamente, de uma forma auto-
perpetuadora.

2. Existe um desfasamento entre as necessidades dos pacientes e os


esquemas e estilos de coping do terapeuta. Os pacientes podem ter necessidades
às quais o terapeuta não consegue corresponder. Devido às características dos seus
esquemas e dos seus estilos de coping, os terapeutas podem não conseguir
assegurar os níveis de reparentização que o paciente necessita (Neste particular,
muitas vezes, o terapeuta assemelha-se ao progenitor que, originalmente, despoletou
o esquema no paciente).

3. Sobre-identificação que ocorre quando os esquemas do terapeuta e do


paciente se sobrepõem. Se quer o paciente, quer o terapeuta, têm o mesmo
esquema, o terapeuta pode identificar-se, de forma excessiva, com o paciente, e,
assim, perder objectividade. O terapeura acaba por confirmar o esquema que o doente
apresenta.

4. As emoções do paciente despoletam comportamentos de evitamento


do terapeuta. Por vezes, as emoções do paciente, pela sua intensidade, transcendem

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

o terapeuta e levam a que se torne evitante. O terapeuta retira-se psicologicamente,


muda de assunto ou comunica ao paciente que não é aceitável experienciar emoções
tão intensas.

5. O paciente activa os esquemas do terapeuta, o que leva a que o


terapeuta encete processos esquemáticos de compensação. Quando as emoções
do paciente alarmam o terapeuta, alguns terapeutas compensam. Por exemplo,
quando pacientes com perturbação borderline da personalidade agem de forma muito
emocional ou apresentam tendências suicidas, alguns terapeutas tornam-se evitantes
e abdicam, como já foi descrito. Outros terapeutas, por sua vez, que têm tendência a
compensar, podem retaliar. Zangam-se com o paciente, atacam-no e culpam-no.
Aquilo que estes pacientes necessitam é de um sinal claro que o terapeuta se
preocupa com eles, e tal sinal levará a uma maior acalmia dos pacientes. Nem o
terapeuta evitante, nem o terapeuta compensador asseguram a estes pacientes aquilo
que necessitam nas alturas mais críticas, respondendo de forma que tende a
amplificar as dificuldades do paciente.

6. O paciente activa o Modo Parental Disfuncional do paciente. O paciente


comporta-se como uma “criança má”, activando um Modo do Pai Rejeitante no
terapeuta. O terapeuta faz uma reprimenda ao paciente como se fosse um pai privador
e castigador.

7. O paciente preenche as necessidades que o esquema (schema-driven


needs) cria no paciente. Os terapeutas que não monitorizam os seus próprios
esquemas correm o risco de, inadvertidamente, explorar os seus pacientes, dado que,
em vez de se focar no bem-estar destes, usam-nos para preencher as suas
necessidades emocionais incompletas.

8. Os esquemas do terapeuta são activados quando o paciente não


apresenta “ganhos terapêuticos” suficientes. Muitas vezes, os pacientes com
esquemas de Defeito/Vergonha, Falhanço ou Dependência/Incompetência respondem
de forma imprópria a pacientes que não melhoram na terapia. Esses terapeutas
expressam raiva ou impaciência para com os pacientes, o que muitas vezes leva a
que os esquemas dos pacientes se perpetuem.

9. Os esquemas dos terapeutas são activados quando o paciente vive


momentos mais críticos, como risco de suicídio. As crises do paciente são

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

plausíveis de activar os esquemas do terapeuta. Elas testam a capacidade do


terapeuta de lidar com elas de uma forma positiva.

10. O terapeuta inveja o paciente de uma forma permanente. Se o


terapeuta for narcísico, pode invejar o paciente. Nesses casos, o paciente tem
acesso a uma fonte de gratificação que o terapeuta sempre desejou mas nunca teve,
como beleza, riqueza ou sucesso. Ou o paciente preenche, na sua vida real, uma das
necessidades não preenchidas do terapeuta.

Qualidades ideais do terapeuta na Terapia Focada


nos Esquemas

Segundo Young et al (2003), a flexibilidade é um elemento essencial que deve


caracterizar o terapeuta, uma vez que o tipo de estilo adoptado deve adaptar-se às
necessidades emocionais do paciente, por forma a utilizar de forma a realizar de forma
adequada a função de reparentização limitada inerente à própria relação terapêutica.
Assim, o terapeuta terá de ser capaz de fornecer na relação terapêutica um antídoto
parcial para os esquemas nucleares do paciente, que varia consoante as suas
características intrínsecas, pelo que poderá ter de demonstrar apoio emocional, gerar
confiança, providenciar estabilidade, encorajar independência ou, por exemplo,
demonstrar capacidade de perdoar o paciente.

Estratégias utilizadas na identificação e avaliação de


Esquemas Precoces Mal-Adaptativos

No âmbito do trabalho terapêutico sobre os EPMs do paciente, assume


importância, numa fase inicial, uma boa identificação das estruturas cognitivas,
partindo da análise dos processos e dos produtos cognitivos que o sujeito revele.
Assim, e atendendo à lógica do Modelo Cognitivo, são sugeridas técnicas e
procedimentos que propiciarão ao psicoterapeuta a possibilidade de aceder aos
conteúdos e características das estruturas cognitivas, ou seja, dos Esquemas
Precoces Mal-Adaptativos que caracterizam o paciente.

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Assim, o terapeuta procurará proceder à avaliação e identificação dessas


estruturas, recorrendo a técnicas específicas que se consubstanciam nas estratégias
gerais do Modelo Cognitivo, como o empirismo colaborativo, o diálogo socrático ou a
descoberta guiada, de forma a, conjuntamente com o paciente, perceber se o
raciocínio hipotético que emprega encontra eco nas respostas e no funcionamento do
paciente.
A eficácia da intervenção psicoterapêutica subsequente está, por
consequência, directamente ligada à forma como se processa esta fase, dado que
está dependente da boa definição de “alvos terapêuticas” a perseguir.

Identificação de Esquemas Precoces Mal-Adaptativos

Segundo Young (1990, 1999), a identificação dos EPMs deve ser realizada ao
longo de oito etapas:

+ Identificação dos problemas e sintomas actuais, tal como a recolha breve de


informação relativa à história de desenvolvimento e de aprendizagens prévias do
paciente;
Este passo decorre nas primeiras sessões, procurando-se, através da
exploração horizontal, desenvolver hipóteses acerca de possíveis temas procurando
pesquisar redundâncias entre diferentes temáticas, procurando-se ligações entre
emoções específicas, sintomas, problemas de vida e os Esquemas Precoces Mal-
Adaptativos. Aqui é fundamental que se estabeleça uma boa relação terapêutica,
avaliando-se, paralelamente, a forma como o paciente interage com o terapeuta neste
processo.

+ Administração de escalas clínicas


Aqui assumem relevância instrumento de avaliação indirecta como o
Questionário de Esquemas de Young, o Questionário de Estilos Parentais de Young, o
Questionário de Evitamento e o Questionário de Compensação, por exemplo.

+ Familiarização do paciente com o conceito de EPM e debate das respostas


dadas no preenchimento dos questionários;
Aqui assumem importância os racionais dos EPMs que o terapeuta
fornece ao paciente, no sentido de potenciar a sua compreensão daquilo que constitui

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

e caracteriza o(s) Esquema(s) Precoce(s) Mal-Adaptativo(s). Esta compreensão pode


ser potenciada, nomeadamente quando os pacientes apresentam um funcionamento
cognitivo mais débil, se o terapeuta recorrer ao uso de metáforas (os esquemas
enquanto lentes que filtram e condicionam a percepção do sujeito; um sapato velho e
desactualizado do qual é difícil abdicar, dado o hábito de o usar; vírus num programa
de computador,…). A sugestão de leituras de apoio é também aconselhada, dado que
podem também potenciar essa compreensão, nos pacientes com um nível cultural
mais elevado. Neste particular, tem importância o “Guia do Cliente” da Terapia Focada
nos Esquemas ou o “Reinventing Your Life”, ambos da autoria de Jeffrey E. Young.

+ Activação dos esquemas, dentro e fora das sessões terapêuticas, através de


um conjunto de técnicas a descrever em seguida;
Até aqui, procurou-se, fundamentalmente identificar cognitivamente os
esquemas, pelo que o objectivo passa por proceder à sua activação recorrendo a
técnicas do foro emocional/experiencial. A constatação de activação emocional,
derivada da abordagem de uma determinada temática, significa que se deu a
activação de um determinado Esquema Precoce Mal-Adaptativo.
Nesta fase, o terapeuta deverá atender à influência dos processos de
evitamento e compensação, que poderão interferir com a forma se processará a
activação dos EPMs. O terapeuta deve ter em atenção que quanto maior é o nível de
afecto experienciado, mais primário e disfuncional é o Esquema Precoce Mal-
Adaptativo.

Estratégias de Activação
A) Técnicas de Imagerie
O terapeuta, utilizando técnicas imagéticas, introduz uma cena
activadora para o paciente, que, de olhos fechados, a imagina, de forma a identificar
produtos cognitivos que dela decorram e a “fornecer” informação para ser,
posteriormente, trabalhada.

B) Acontecimentos Actuais
Analisar situações da vida do paciente, que se revistam de uma
carácter perturbador e às quais o paciente dê importância, de forma a perceber qual o
significado que o paciente lhes atribui. Neste processo o terapeuta deverá estar atento
à activação emocional que possa surgir dessa descrição.

C) Memórias do passado do paciente

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Nesta estratégia particular, a activação é procurada pela análise


e debate de memórias e experiências desagradáveis do paciente, que poderão ter
estado na génese dos esquemas disfuncionais, e observação atenta do possível
surgimento de activação emocional da parte do paciente.

D) Relação Terapêutica
Através da relação privilegiada que se estabelece entre o
terapeuta e paciente, é possível debater acontecimentos relevantes, nomeadamente
aqueles que, supostamente, servirão de “gatilho” à activação emocional. O terapeuta
deverá, em caso de detectar activação emocional, investigar a sua possível ligação
com Esquemas Precoces Mal-Adaptativos.

E) Utilização terapêutica de livros, filmes e músicas


A sugestão pelo terapeuta de livros, filmes e músicas, ao
paciente, poderá ser útil, no sentido de lhe proporcionar situações potencialmente
activadoras, nomeadamente se os seus conteúdos abordarem temáticas ligadas aos
pressupostos de um ou mais esquemas, proporcionando informação a ser discutida
numa sessão subsequente.

F) Terapia de grupo
O grupo é um contexto activador, por excelência, dado que a
maior parte dos esquemas são de cariz interpessoal. Assim, as características do
grupo poderão funcionar como um “laboratório ecológico” para o paciente ser
confrontado com uma grande variedade de situações interpessoais, potencialmente
activadoras.

G) Análise de sonhos
A forma como o paciente recorda e aborda os seu sonhos, e as
temáticas que o caracterizaram, é um bom indicador da sua relevância para o
paciente, podendo validar a existência de uma determinada constituição esquemática
no paciente.

H) Trabalhos de casa
A sugestão de tarefas a realizar pelo paciente, por si próprio,
fora do contexto da sessão terapêutica, pode ser muito útil, dado que lhe possibilita
que se confronte com determinadas temáticas significativas. A forma como o fez e as
emoções daí resultantes, são informações importantes a abordar nas sessões

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

terapêuticas seguintes. O trabalho de casa pode ser pedir ao paciente que escreva
sobre uma determinada temática relevante, e potencialmente activadora, listas de
acontecimentos relevantes, realizar diários de pensamentos e emoções ou realizar
registos de auto-monitorização.

+ Confrontação do paciente com os processos de Evitamento e Compensação,


elucidando-o sobre as suas características e sobre a sua influência no seu
funcionamento;
Neste particular, importa perceber se um dado sintoma ou emoção é
consequência directa de um dado Esquema ou se é fruto de evitamentos ou
compensações. É importante que se dê ao paciente os racionaise e se debata com o
paciente as vantagens e desvantagens de lutar contra estes processos.

+ Identificação de comportamentos mal-adaptativos resultantes dos Esquemas


(o que inclui a manutenção, o evitamento e a compensação de esquemas);
Neste particular, deve ser enfatizada a componente auto-destrutiva dos
comportamentos que derivam dos Esquemas Precoces Mal-Adaptativos e que os
reforçam. Aqui o terapeuta deverá enfatizar que estes comportamentos:
- mantêm o esquema subjacente intacto;
- permitem evitar a activação do esquema;
- permitem ao paciente funcionar com o mínimo de desconforto
possível;
- mas que mantêm um equilíbrio periclitante, que não é
conveniente para o paciente.

+ Construção de uma compreensão integrada e idiossincrática do paciente


Construção de uma conceptualização coerente entre as origens do
esquema, os próprios esquemas, os acontecimentos activadores actuais, as emoções
que deles resultam, assim como analisar, nesse processo, a forma como se processa
a relação terapêutica. O terapeuta deverá, também, estabelecer uma ligação entre
estes componentes, procurando percebê-los à luz de um ou mais esquemas.

+ Distinção entre esquemas primários, secundários e associados


Nesta fase, o terapeuta deverá procurar conceptualizar, de uma forma
coerente e integrada, a constituição esquemática do paciente, de forma a seleccionar

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o Esquema Precoce Mal-Adaptativo mais nuclear para a intervenção terapêutica a


implementar, na sequência.

Avaliação de Esquemas Precoces Mal-Adaptativos

Rijo & Galhardo (2001) descrevem um conjunto de estratégias/técnicas que


visam proceder à avaliação de estruturas cognitivas, previamente identificadas através
da metodologia atrás descrita. Segundo os mesmos autores, a avaliação de estruturas
cognitivas consiste na tentativa de identificar os esquemas subjacentes ao
processamento da informação distorcido apresentado pelo paciente, dado que estes,
atendendo à perspectiva da maioria dos autores, são nucleares às vulnerabilidades
inerentes à psicopatologia, assim como à sua manutenção. Em seguida serão
enumeradas algumas estratégias conducentes à avaliação de estruturas cognitivas,
referidas por Rijo & Galhardo (2001).

+ Exploração vertical/Flecha descendente


A avaliação de hipotéticos esquemas nucleares do paciente, que
o desenrolar da terapia confirmará como significativos ou não, poderá ser realizada
através de uma metodologia menos estruturada (usando a exploração vertical) ou
mais estruturada (como a flecha descendente). Na exploração vertical, cada
pensamento automático negativo é explorado pelo terapeuta do ponto de vista do
significado desse pensamento para o self do paciente. Repetindo este procedimento,
analisando os diversos pensamentos que emergem numa dada situação, é possível
ter acesso, de forma mais facilitada, aos esquemas nucleares, que intervieram na
referida situação. O terapeuta não deverá, de forma imediata, iniciar a disputa racional
desses pensamentos, nem procurar a sua substituição por pensamentos racionais
alternativos, procurando, em vez, identificar aquilo que estará subjacente aos
pensamentos e emoções relatadas pelo paciente. Através deste processo, o terapeuta
poderá avaliar esquemas e, consequentemente, confirmar ou desconfirmar as suas
hipóteses acerca dos esquemas do paciente, permitindo que defina os alvos da
intervenção terapêutica.
A eficácia da avaliação de estruturas cognitivas está, também, dependente da
conjugação entre exploração vertical e exploração horizontal. Esta permite, segundo
Safran et al (1986 cit in Rijo & Galhardo, 2001), recolher e analisar informação
resultante da abordagem do maior número possível de situações relevantes para os

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65
Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

problemas do paciente, e dos pensamentos automáticos que delas resultam,


permitindo obter as temáticas presentes nessas situações, estabelecendo ligações
entre pensamento, emoção e comportamento. Apesar de, isoladamente, não ser a
estratégia ideal para avaliar esquemas, é importante utilizá-la, no sentido de
complementar a exploração vertical e permitir a obtenção de maior número de
informação, de forma integrada e consistente.
A flecha descendente, consiste num tipo mais estruturado de exploração
vertical, em que o terapeuta coloca, de forma continuada, questões, no sentido de,
partindo dos pensamentos automáticos negativos do paciente, alcançar o significado
que têm para o self do paciente. Assim, cada inferência que o terapeuta realiza,
conduz a uma nova pergunta, de forma a “descer” na pirâmide invertida típica do
Modelo Cognitivo. Algumas questões obrigatórias nesta técnica são, por exemplo:
- Se esse pensamento for verdadeiro, o que é que isso significa para si?
(questionar o PAN);
- O que é que de tão desagradável tem esse pensamento?
- O que é que de pior poderia acontecer se esse pensamento fosse
verdadeiro?
- O que é que isso diz acerca de si? (da resposta do paciente advirá a
sua crença/esquema nuclear).

+ Cognições Auto-Referentes
Para aceder aos esquemas nucleares do paciente, o terapeuta
deverá partir de pensamentos automáticos negativos e de suposições auto-referentes,
dado que os esquemas nucleares estão directamente ligados a uma avaliação do Eu e
à forma como o paciente vê o seu auto-conceito.

+ Temáticas comuns
Vários autores têm enfatizado a existência de temas comuns, no
contexto das manifestações psicopatológicas de diversos pacientes, que têm
desenvolvido esforços no sentido de identificar as principais crenças irracionais (Ellis &
Bernard, 1985; Ellis & Dryden, 1987 cit in Rijo & Galhardo, 2001) ou crenças
subjacentes (Beck et al,1979, 1985, 1990 cit in Rijo & Galhardo, 2001) a determinados
grupos de psicopatologia. Apesar da importância inequívoca de uma avaliação
ideográfica e idiossincrática, este tipo de abordagem mais nomotética e generalizada,
auxilia a compreensão da psicopatologia cognitiva das perturbações, e dos vários
grupos de perturbações.

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

+ Consistência Trans-Situacional
Dado que os auto-esquemas do paciente emergem, e intervêm,
ao longo das diversas situações em que o paciente intervém no seu quotidiano,
importa avaliar a facilidade com que as cognições que deles resultam emergem,
independentemente dos contextos situacionais. A magnitude dessa facilidade pode ser
tomada como prova da presença de um esquema nuclear, dado que, quanto maior a
facilidade, mais grave será a patologia do paciente, dado que a activação esquemática
está dependente de uma grande sensibilização a determinados pensamentos e
situações percepcionadas enviesadamente, e independente das características
situacionais e contextuais. Ou seja, patologia mais grave significa a existência de um
limiar mais baixo de activação de esquemas nucleares.

+ Marcadores de processo e de conteúdos


Safran et al (1986, 1990 in Galhardo & Rijo) enfatizam a
importância de se avaliar e trabalhar, sobretudo, as cognições capazes de activar um
determinado estado emocional, destacando a diferença entre “cognição quente”
(aquela que é capaz de o fazer) e “cognição fria” (aquela que não induz activação
emocional no paciente). A importância da activação emocional prende-se com a
perspectiva de que, quanto mais intensa é a emoção correspondente a uma
determinada cognição, maior probabilidade existe de se tratar de uma cognição
nuclear ou relevante para a psicopatologia. Neste sentido, o terapeuta deverá estar
atento às mudanças no estado de humor do paciente, dado que essas mudanças
fornecem informação importante sobre as cognições que assaltam o paciente, nesse
momento. Assim, é tão importante atender àquilo que o paciente diz (marcador de
conteúdo), como a forma como o diz (marcador de processo). Estes marcadores
devem ser atendidos, por forma a, posteriormente, se perceber qual o seu significado.

+ Recordações de memórias infantis


Dado que, segundo Young (1990; 1999) a formação dos
esquemas nucleares ligados a qualquer patologia estão directamente ligados a
experiências precoces e à forma como se estabeleceram as relações com os pares e
as figuras de vinculação, é importante atender às memórias infantis do paciente.
Assim, essas memórias são fontes de informação importantes, para além de a sua
discussão e reviver, através de técnicas imagéticas, fornecerem uma boa base de
trabalho terapêutico, dado que poderão estar na origem do aparecimento de um dado
esquema. Este tipo de estratégia pode ser particularmente útil para se comprovar a
relevância de uma dada experiência no contexto da análise de uma dado esquema.

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Young (1999) refere que esta experiências terão sido mais significativas, quanto mais
cedo ocorreram na vida do sujeito, quanto maior a intensidade dos afectos envolvidos
e quanto maior a importância para a criança das outras pessoas envolvidas nessas
situações e na forma como ocorreram.

+ Questionários de auto-resposta
Aqui destacam-se o Questionário de Esquemas e o Questionário
de Estilos Parentais, ambos da autoria de Jeffrey E. Young, que permitem, de uma
forma rápida, construir uma ideia sobre a constituição esquemática do paciente. No
entanto, tal como é referido por Pinto-Gouveia & Rijo (1999), existem algumas críticas
à utilização destes instrumentos no âmbito da Terapia Focada nos Esquemas. Assim,
dado que os esquemas são tácitos e inconscientes, dificilmente podem ser
reconhecidos e relatados pelo próprio paciente; por outro lado, ainda que tal fosse
possível, as capacidades metacognitivas requeridas para tal encontram-se alteradas
nos pacientes psicopatológicos; também os processos de evitamento e compensação
impedem a correcta avaliação dos esquemas; por fim, aquando do preenchimento do
questionário não existe activação emocional congruente, pelo que a avaliação de um
dado esquema pode ser enviesada por esse facto.

Técnicas de Intervenção ao Nível da Mudança


de Esquemas Precoce Mal-Adaptativos

Segundo Rijo & Galhardo (2001, p. 27), “mudar as cognições nucleares torna-
se fundamental e o único garante da mudança terapêutica duradoura”. Assim sendo, e
muito embora seja mais fácil obter mudança a níveis mais superficiais, isso pode
significar que outras estruturas cognitivas superficiais e nucleares não sofreram
qualquer alteração, pelo que só a mudança ao nível dos esquemas nucleares levará a
que haja uma mudança global do aparelho cognitivo, muito embora sejam estes as
estruturas mais difíceis de alterar. É importante referir que, neste contexto, é
importante ter “disponíveis” alternativas para as estruturas cognitivas que se
pretendem ver alteradas, no sentido de o paciente não se sentir “perdido”.
Neste sentido, Young (1990, 1999) e Young et al (2003) propõem um conjunto
de técnicas e estratégias terapêuticas, muitas delas derivadas da Terapia Cognitiva

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Breve de Aaron T. Beck, que visam a alteração das estruturas cognitivas profundas do
paciente e que se dividem em quatro grandes tipos:
- Técnicas emocionais/experienciais;
- Técnicas Interpessoais;
- Técnicas cognitivas;
- Técnicas comportamentais.

Apesar desta divisão em quatro grandes grupos, não deve ser feito um
entendimento estanque dos mesmos, dado que na conceptualização e implementação
da intervenção terapêutica, as diferentes técnicas deverão ser utilizadas de forma
interpendente, obedecendo, de forma permanente, ao princípio da confrontação
empática, cabendo ao terapeuta planear a intervenção tendo em atenção as
características dos diferentes grupos.

Técnicas emocionais/experienciais
Segundo Young (2003), as experiências emocionais/experienciais têm dois
grandes objectivos: primeiramente, activar as emoções ligadas aos Esquemas
Precoces Mal-Adaptativos e, em segundo lugar, “reparentizar” o paciente, de forma a
suprir as necessidades emocionais não satisfeitas durante a sua infância. Neste
particular assume grande importância a relação terapêutica que se estabelece,
permitindo que, através de trabalho experiencial, o paciente possa fazer a transição
entre a certeza intelectual de que os seus esquemas são falsos, e o acreditar em
termos emocionais. Segundo o mesmo autor, “as técnicas experienciais são aquelas
que produzem mudanças mais profundas” (Young et al, 2003, p. 110).
É aconselhável fornecer aos pacientes um breve racional do trabalho
terapêutico imagético, no sentido de potenciar a compreensão quer da técnica em si,
quer dos objectivos a ela subjacentes. Assim, deve ser explicado aos pacientes que o
objectivo do trabalho imagético é levar a que eles sintam os seus esquemas e que
percebam a forma tiveram origem nas suas experiências precoces.

+ Diálogos imaginários com os pais


Nesta técnica, é pedido ao paciente que feche os olhos e imagine, de
forma o mais real possível, o seu pai e a sua mãe numa determinada situação
significativa para si. Depois de o paciente a descrever, de forma breve, ele deve ser
conduzido a iniciar um diálogo com a figura parental, no qual o paciente deve
expressar, exactamente, aquilo que sente e deseja. Esta técnica permite que o

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

paciente se aperceba do papel desempenhado pelos próximos significativos na


formação e manutenção dos seus esquemas, permitindo, paralelamente, que comece
a modificar as crenças que o caracterizam. Existem algumas variantes desta técnica
particular: o terapeuta pode desempenhar o papel da figura parental e o doente o
papel complementar, na mesma técnica ou o paciente pode ser introduzido, já em
adulto, a ajudar-se a si próprio, enquanto criança, a lidar com as situações mais
dolorosas do período infantil. Neste particular, Young et al (2003) sugere três etapas
para este processo:
1 – O terapeuta pede permissão para introduzir a imagem e falar
directamente à “Criança Vulnerável”;
2 – O terapeuta reparentiza a “Criança Vulnerável”;
3 – Posteriormente, o “Adulto Saudável” do paciente, modelado a partir
do terapeuta, reparentiza a “Criança Vulnerável”.
A utilização da técnica da “cadeira vazia” é também exequível: eu saudável
versus eu doente.

+ Catarse emocional
Esta técnica, tal como a anterior, é frequentemente utilizada pelos
modelos gestaltistas, onde a tónica é colocada na resolução de assuntos inacabados.
O pressuposto-base é aquele que os doentes crónicos não expressam totalmente as
emoções relacionadas com determinados acontecimentos significativos da sua vida ou
não fizeram o luto de certos acontecimentos, ligados à privação e à perda. Ao
encorajar o doente a expressar (ventilar) emoções associadas a tais acontecimentos,
através de técnicas imagéticas, de role-playing ou de cartas e poemas, os esquemas
subjacentes podem mudar.

Técnicas interpessoais
Quanto maior o número de Esquemas Precoces Mal-Adaptativos activados
pela relação terapêutica, mais premente se torna o uso destas técnicas.

+ Reparentização
Esta técnica capitaliza o facto de a relação terapêutica ser um
ingrediente activo do processo terapêutico, permitindo que se construa uma relação
desconfirmadora dos esquemas do paciente, sobretudo nas áreas de desafiliação e
privação e que, em última análise, se preencham as necessidades emocionais do
paciente que advêm das suas relações precoces com as figuras parentais ou com

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

outras pessoas significativas. Por exemplo, num doente com o Esquema Precoce Mal-
Adaptativo de Privação Emocional, o terapeuta deverá fornecer muito suporte e
caracterizar a sua atitude pela empatia e aceitação incondicional, num grau superior
àquele que caracterizaria a relação terapêutica normal.

+ Activação esquemática na relação terapêutica


O terapeuta deverá manter-se atento à forma como se processa a
relação terapêutica, no sentido de detectar activação emocional, e, posteriormente,
ajudar o paciente a testar a validade das suas crenças. Neste particular, é importante
que se metacomunique sobre essa activação, para que se teste a sua veracidade. Nos
esquemas de tipo interpessoal, é importante identificar sentimentos e pensamentos do
terapeuta em relação ao doente, como forma de desconfirmação, adquirindo também
importância o “self-disclosure” do terapeuta (mas não o seu “strip-tease” emocional…).

+ Relações interpessoais
A análise da forma como o paciente interage com aqueles que o
rodeiam é importante, no contexto da intervenção terapêutica nos EPMs. Uma
hipótese de o fazer é observar aqueles que lhe são mais próximos em consulta, o que
permite que o paciente comunique sentimentos e pensamentos que, até aí, não havia
verbalizado, pelo que permite trabalhar “a quente” algumas cognições relacionadas
com os outros. Estas sessões são caracterizadas por um elevado nível de
emocionalidade, pelo que o terapeuta deverá estar consciente dessa probabilidade e,
a priori, preparado para ela.

+ Terapias de grupo
A integração do paciente em experiências de terapia de grupo constitui
uma boa forma de obter experiências desconfirmatórias dos seus esquemas
interpessoais, permitindo que ele quebre com determinados ciclos interpessoais
marcados pela disfuncionalidade, flexibilizando os seus padrões.

Técnicas cognitivas
Estas técnicas visam sistematizar o processo de mudança esquemático, e
potenciar a luta contra os esquemas disfuncionais do paciente, constituindo, muitas
delas, adaptações da Terapia Cognitiva Breve de Aaron T. Beck. A utilização destas
técnicas permite ajudar o paciente a fortalecer a sua “voz saudável”, fortalecendo,

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paralelamente, o modo “Adulto Saudável” do paciente e ajudando-o a construir uma


lógica racional contra o esquema.

+ Revisão de evidências que apoiam o esquema


Antes de iniciar a disputa racional do esquema, é muito
importante recolher toda a informação da história de vida que o paciente usa para
defender a lógica subjacente ao esquema e a sua validade. Neste processo, o
terapeuta explora a história de vida do paciente, revendo as origens de infância do
esquema, analisando as informações relevantes. Assim, o terapeuta poderá perceber
a forma como o esquema se desenvolveu e como foi reforçado durante a adolescência
e adultez do paciente. O paciente pode pedir ao paciente que represente o papel de
“advogado do diabo” defendendo o esquema. O terapeuta pode introduzir esta técnica
dizendo ao paciente:
T: “Eu quero que tente defender o seu esquema, enquanto eu procuro
mostrar-lhe as razões pelas quais, na minha opinião, ele não é verdadeiro. Tente
defender o seu “caso” da melhor forma possível, fundamentando o esquema o melhor
que consseguir e tente dar-me o maior número de exemplos possíveis que validem o
esquema” (Young, 1990).

+ Examinar criticamente as evidências que apoiam o esquema


O objectivo nesta técnica é analisar de forma cuidada as
evidências que o paciente apresenta para suportar o seu esquema, tentando descobrir
uma forma diferente de encarar essa mesma informação, de forma a que não seja
confirmadora do esquema. Para atingir este objectivo, o terapeuta pode recorrer a
algumas técnicas específicas como o empirismo colaborativo, a descoberta guiada ou
mesmo um confronto mais directo, caso a manutenção seja muito forte. No trabalho
com os Esquemas Precoces Mal-Adaptativos o terapeuta está continuamente a
procurar um equilíbrio entre empatizar com o sofrimento decorrente do esquema e
confrontá-lo com as evidências que o contradizem e desacreditam. Caso o estilo do
terapeuta for demasiado confrontativo, o paciente ignorará os seus contra-argumentos,
dado que entenderá que o terapeuta não entende aquilo que o paciente sente. Um
método relevante para invalidar as evidências apresentadas pelo paciente é
desacreditar e reenquadrar as experiências familiares precoces, relacionando-as com
os padrões e expectativas mal-adaptativos das suas figuras parentais, de forma a que
estes padrões não se generalizem a outras pessoas, como professores ou amigos, por
exemplo. O objectivo final é que o paciente consiga reenquadrar as suas experiências
precoces, não as vendo como sinais inequívocos de um defeito idiossincrático,

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

incompetência ou maldade. Neste sentido, o paciente é instruído a perceber que,


devido aos processos esquemáticos e aos comportamentos derivados do esquema,
nunca colocou o esquema à prova, pelo que nunca colocou em causa a sua
veracidade.

+ Revisão de evidências que contradigam o esquema


Nesta fase, o terapeuta recolhe toda a informação “positiva”
sobre o paciente, que, de uma forma directa, seja contraditória à lógica do esquema.
Este processo é, no entanto, mais difícil do que enumerar a informação negativa, dado
que a interferência da memória selectiva está directamente ligada à manutenção dos
esquemas, e opera, de forma continuada, no processamento de informação do
paciente.

+ Demonstrar como o paciente desvaloriza as evidências contraditórias


à lógica do esquema
Na Terapia Focada nos Esquemas é um dado adquirido que o
paciente, activamente, desvaloriza a informação contraditória ao esquema, pelo que,
com o fito de proceder à sua mudança, o terapeuta deverá demonstrar ao paciente a
forma como este processo opera. Assim, o terapeuta deverá educar o paciente, no
sentido de identificar os erros mais comuns que caracterizam o seu processamento de
informação. Algumas técnicas específicas poderão ser utilizadas, quer durante as
sessões terapêuticas, quer em contexto de trabalho de casa terapêutico:
# Técnica do Ponto/Contraponto – o terapeuta introduz a técnica
pedindo ao paciente que recrie o esquema, enquanto o terapeuta representa o papel
do lado saudável. O objectivo é originar um debate em que o doente começa por
defender a visão mais saudável e o terapeuta a visão derivada do esquema, trocando
de papéis posteriormente. A aplicação desta técnica torna evidente que o paciente não
tem qualquer tipo de dificuldade em aderir e explicitar a visão do esquema, mas que
lhe é difícil, por si só, descrever a visão mais saudável. Assim, o paciente poderá
comprovar a forma como actuam os processos de manutenção do esquema,
aprendendo, paralelamente, a pesquisar as evidências positivas da razão e da lógica.
# Uma variante da técnica referida acima consiste em colocar o
paciente a irritar-se com o esquema e a recusar-se a seguir a lógica que lhe está
subjacente. Aqui o terapeuta “encarna” a visão mais extrema do esquema, levando a
que o paciente “batalhe” contra ela, irritando-se e recusando-se a ceder aos seus
“intentos”.

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+ Construção de Flashcards que contradigam o esquema


Os flashcads são cartões, que são construídos em conjunto com o
paciente, que este deverá utilizar quando o paciente se confronta com situações
activadoras, dado que congregam as evidências e os contrargumentos mais fortes de
um dado esquema. Dado que um passo fundamental na Terapia Focada nos
Esquemas é a repetição constante de respostas racionais, especialmente quando o
esquema é activado, os flashcards permitem que o paciente aceda, e interiorize, a
visão mais saudável no lugar dos “ditames” do esquema. O paciente é encorajado a
trazer consigo estes cartões, de forma a que os possa consultar sempre que sinta que
um determinado esquema disfuncional foi activado numa dada situação. Segundo
Young (1999), estes flashcards são muito úteis para ajudar o doente a realizar a
transição entre a compreensão intelectual de padrões de pensamento mais
adaptativos e a aceitação emocional, progressiva, dos mesmos 2.

+ Desafiar o esquema sempre que é activado na sessão terapêutica ou


fora dela
Segundo Young (1990), quando um esquema é activado no
contexto da sessão terapêutica, o terapeuta deve assinalar esse facto e ajudar o
paciente a encetar a lógica contrária, de forma a que dê um significado mais funcional
para aquilo que sucedeu, o que pode dar origem a mais flashcards. Este passo é
realizado com o fito de o paciente treinar os pontos de vista mais razoáveis e
funcionais, em prejuízo da visão defendida pelo esquema do paciente. Quando o
esquema é activado fora do espaço da sessão terapêutica, o paciente instruído a
registar tudo o que se passou e a desenvolver respostas racionais alternativas ou a
seleccionar um flashcard, previamente construído, que corresponda ao esquema que
foi activado.

Técnicas comportamentais
Segundo Young (1999), estas técnicas envolvem a mudança de padrões
comportamentais de longa duração, como aqueles resultantes da escolha de parceiros
ou dos comportamentos que o paciente enceta nas suas relações mais íntimas. A
aplicação destas técnicas constitui a fase mais longa da terapia pois, mesmo que se
tenha alcançado uma mudança cognitiva e/ou emocional, há comportamentos que
exigem mais tempo para alcançar uma mudança significativa e profícua.

2
Em anexo encontram-se exemplos de flashcards para os 18 Esquemas Precoces Mal-
Adaptativos, segundo a conceptualização de Jeffrey E. Young (2003).

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+ Desenvolver novos comportamentos


Os novos comportamentos que se pretendem implementar
podem ser desenvolvidos através de exposição ao vivo ou, numa fase inicial, através
de exposição em imaginação ou de técnicas de role-playing. A utilização de flashcards
pode também ser necessária para que o paciente consiga implementar novos
comportamentos in vivo.

+ Quebrar com padrões comportamentais


A mudança esquemática passa, necessariamente, pela alteração
dos comportamentos que decorrem dos esquemas, através do encorajamento do
doente, no sentido que este pare com esses comportamentos que acabam por reforçar
o próprio esquema, concorrendo para a sua perpetuação ao longo da existência do
paciente. Complementarmente, é importante que o terapeuta e o paciente procurem
listar alternativas comportamentais aos comportamentos derivados do esquema, assim
como que as ensaiem, antecipando dificuldades e clarificando o seu propósito e as
razões subjacentes à sua eficácia terapêutica.

+ Implementar mudanças ambientais, caso seja necessário


Young (1999) reconhece a importância de o doente efectuar
alterações no seu ambiente, sempre que estas tornem o processo terapêutico mais
produtiva em termos de ganhos terapêuticos. Assim, os pacientes poderão ser
encorajados a, de uma forma devidamente contextualizada terapêuticamente,
afastarem-se de casa, reduzir as responsabilidades que assumem nas suas
profissões, tentar a prática de novas actividades desportivas ou de novos
passatempos ou, por exemplo, iniciar novos relacionamentos e amizades.

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Guião de Estratégias para trabalho terapêutico com Esquemas Precoces


Mal-Adaptativos, no âmbito da Terapia Focada nos Esquemas de Jeffrey E.
Young
(Young, 1990; Young et al, 2003)

Domínio do Distanciamento & Rejeição

Abandono
No que concerne, especificamente, ao esquema de Abandono, o objectivo da
terapia centra-se em ajudar o paciente a criar uma visão mais realista sobre a
estabilidade das relações que enceta e que vive, de forma a que seja mais improvável
que magnifique e interprete enviesadamente comportamentos dos outros no sentido
de um eventual, mas dado como adquirido, abandono. Os pacientes deixam de se
preocupar, de uma forma permanente e excessiva, que as pessoas significativas na
sua vida acabem por desaparecer, passando a entender o abandono como algo
possível de acontecer, mas cuja probabilidade deve ser calculada de forma realista e
racional.
Assim, ao nível das estratégias a relação terapêutica assume uma grande
relevância, dado que permite, por excelência, a desconfirmação dos pressupostos
subjacentes ao esquema em questão, constituindo-se como a “fonte primária de
tratamento” (Young et al, 2003, p.209).
Ainda segundo Young et al (2003), o terapeuta constitui-se como uma figura
parental transaccional, constituindo uma base estável a partir da qual o paciente se
pode aventurar no mundo e formar relações estáveis e frutíferas. Neste particular, a
reparentização limitada assume importância, cabendo ao terapeuta corrigir distorções
sobre a probabilidade de abandono pelo terapeuta, além de fazê-lo aceitar as suas
partidas, ausências sem que o paciente descompense, nem se comporte de uma
forma desadaptativa.
No campo das estratégias cognitivas, cabe ao terapeuta alterar a visão
exagerada que o doente possui de que os outros o irão abandonar, afastar-se ou
comportar-se de uma forma imprevisível, pelo que os pacientes deverão aprender a
não catastrofizar as separações temporárias das pessoas significativas. Assim, os
terapeutas deverão procurar alterar as expectativas irrealistas de que os outros
significativos se devem mostrar sempre consistentes e disponíveis,
incondicionalmente, aprendendo que os outros têm direito a estabelecer limites e a um

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

“espaço” próprio. Além do disso, dever-se-á procurar a redução da obsessividade do


paciente em assegurar-se que o outro ainda está disponível.
Em termos experienciais, o terapeuta utiliza técnicas imagéticas para que o
doente re-experiencie as memórias do progenitor imprevisível e instável, ou do
progenitor que o abandonou ou faleceu precocemente, para que o terapeuta se torne
uma figura estável para a “criança”. A expressão de raiva em relação ao progenitor
negligente é também utilizada, de forma a fortalecer o estabelecimento do paciente
como “Adulto Saudável” e não como “Criança Abandonada”, trabalhando a “criança
interna” do doente, no sentido de ajudar o paciente a “tomar conta” da sua “criança”
abandonada.
Comportamentalmente, os pacientes são encorajados a escolher parceiros
capazes de estabelecer compromissos, privilegiando relações marcadas pela
estabilidade, aprendendo a abandonar as relações que não preenchem estes
requisitos, construindo, consequentemente, uma tolerância gradual a permanecerem
sozinhos. Os pacientes aprendem também a não “arrastar” os parceiros para relações
que são pautadas por ciúmes, pela raiva, pelo apego excessivo ou por um ambiente
excessivamente controlador.

Desconfiança/Abuso
A intervenção terapêutica no esquema de desconfiança/abuso visa ajudar os
pacientes a perceberem que, muito embora existam pessoas que não justificam a sua
confiança, existem muitas outras que a justificam, pelo que o paciente deverá agir de
uma forma racional, procurando afastar-se das pessoas abusadoras, defender os seus
direitos quando necessário e procurar manter pessoas de confiança nas sua relações,
focando a sua atenção nessa característica das referidas relações que estabelece.
Assim, os pacientes aprenderão a diferenciar as pessoas dignas de confiança,
daquelas que não a justificam, em vez de generalizarem a sua desconfiança a todos
aqueles que os rodeiam e com os quais estabelecem interacções.
A relação terapêutica assume, neste particular, uma importância crucial. Cabe
ao terapeuta exponenciar, dadas as características destes pacientes, a sua
honestidade e genuinidade no trato com o doente, nomeadamente quando os
pacientes sofreram experiências reais de abuso. Aqui cabe ao terapeuta constituir-se
como um “antídoto” para os sentimentos de terror, impotência e isolamento de que o
paciente é acometido. Cabe também ao terapeuta questionar, de forma regular, o
paciente acerca da confiança e intimidade, de forma a discutir, e enquadrar

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terapeuticamente, os possíveis sentimentos negativos em relação ao terapeuta e à


intervenção terapêutica propriamente dita.
Cognitivamente, o terapeuta deve procurar reduzir a sobrevigilância do
paciente em relação a possíveis situações de abuso, desconfiança ou maus tratos, de
forma a, paralelamente, construir uma nova visão dos outros, que não seja marcada
pela generalização dos demais como pessoas abusivas, manipulativas e desonestas.
A visão do paciente de si próprio como alguém culpado e digno de ser abusado é
também modificada, para além de se procurar que o paciente deixe de procurar
justificações para o comportamento do abusador e que se veja como indefeso contra
este.
Em termos experienciais, o terapeuta encoraja o paciente a recordar e reviver
memórias de abuso e humilhação que tenha experienciado e às quais atribua
importância, o que requer, normalmente, um grande trabalho de preparação nas
sessões terapêuticas. No contexto deste trabalho experiencial, o paciente deverá
exprimir raiva de forma verbal e física (passo importantíssimo neste particular) e
enfrentar, imageticamente, o agente abusador. Por fim, deverá encontrar um local
seguro, “afastado” do abusador, que poderá ser uma imagem do seu passado ou uma
imagem que tenha construído em conjunto com o terapeuta e que lhe transmita paz e
tranquilidade.
Em termos comportamentais, o paciente aprende, de forma gradual, a confiar
nas pessoas verdadeiras e honestas que o rodeiam, aumentando o grau de intimidade
das relações que estabelece, de forma que, quando apropriado, partilhe segredos e
memórias de abuso com elas. Por outro lado, os pacientes são aconselhados a
escolherem parceiros não abusivos e a procurarem a integração num grupo de apoio a
outras vítimas de abuso. Neste contexto, os pacientes são incitados a não maltratar e
abusar de outros (dado que alguns destes pacientes se tornam abusivos,
compensatoriamente), assim como a estabelecer limites quando são confrontados
com pessoas, potencialmente ou efectivamente, abusadores. Aprendem, também, a
ser menos punitivos com os erros dos outros e a deixar de testar, constantemente, a
confiança dos demais, para além de serem ensinados a deixar de procurarem
evidências da forma como os outros os terão abusado ou inferiorizado. O evitamento
das relações íntimas, inerente a este esquema específico, é também alvo de trabalho,
dado que os pacientes são incitados a aproximarem-se e a tornarem-se íntimos dos
parceiros, invertendo a lógica de permanecerem sozinhos.

Privação emocional

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O principal objectivo na abordagem psicoterapêutica relaciona-se com o


aumento da consciência do paciente acerca das suas necessidades emocionais, dado
que, para os pacientes, a impossibilidade dos demais responderem satisfatoriamente
às suas necessidades emocionais é dada como adquirida, pelo que tendem a não
tomarem consciência, dada a componente egossintónica, que isso é possível. Por
outro lado, a terapia visa ajudar os pacientes a que estes aceitem a naturalidade e
adequação das suas necessidades emocionais. Ou seja, há que conseguir que os
pacientes percebam que a questão não está no facto de as pessoas serem, por
natureza, incapazes de suprir as suas necessidades emocionais (tal como dita o
esquema), mas sim que as pessoas aprenderam a operacionalizar um padrão de
comportamento que os conduz a pessoas que não o conseguem fazer e,
paralelamente, os afasta de pessoas capazes de se constituírem como
emocionalmente reconfortantes.
Na abordagem a pacientes que possuam o esquema de Privação Emocional, a
forma como se processa a relação terapêutica assume relevância, ocupando um lugar
central no processo de tratamento, dado que constitui o primeiro momento em que os
pacientes permitem que alguém cuide deles, que alguém os compreenda ou que os
oriente. Para que isto aconteça, acabe ao terapeuta proporcionar um ambiente de
atenção e empatia, utilizando a reparentização limitada, procurando demonstrar
envolvimento emocional com o paciente. O terapeuta deverá também ajudar o
paciente a expressar os seus sentimentos de privação, sem reagir extremadamente ou
recorrer ao silêncio. Na relação terapêutica o paciente aprende também a lidar com
graus limitados de privação emocional, através da aceitação que processa das
limitações do terapeuta e das suas ausências, enquanto aprende a valorizar o suporte
que a relação implica. Na relação terapêutica, o paciente aprende também a
estabelecer ligações entre a forma como entende e percepciona os seus
relacionamentos e as suas memórias precoces, que estarão na origem da sua
constituição esquemática.
Cognitivamente, a terapia visa a alteração do sentimento exacerbado do
paciente de que todos os indivíduos agem de um modo marcado pelo egoísmo e pelo
sentimento de privação emocional, ou que os outros o estão permanentemente a agir
na base da privação. No sentido de contrapor o carácter dicotómico do raciocínio que
subjaz ao raciocínio inerente a este esquema, e que o potencia, o terapeuta procura
construir, com o paciente, um continuum de diferentes graus de privação, em vez de
dois pólos, a aceitação extrema e a privação emocional. Assim, o paciente aprende a
perceber que, muito embora as pessoas muitas vezes estabeleçam limites para aquilo
que “dão”, isso não significa que não gostem do paciente. Consequentemente, os

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pacientes aprendem também a identificar os momentos em que as suas necessidades


emocionais não estão a ser satisfeitas.
Em termos experienciais, o terapeuta deve utilizar trabalho experiencial no
sentido de ajudar os pacientes a reconhecer que as suas necessidades emocionais
não foram satisfeitas na sua infância, e a perceber o que é que os seus pais deveriam
ter feito para as satisfazer convenientemente. O terapeuta deve também levar a que o
paciente exprima raiva e dor aos seus progenitores privadores, de forma imagética.
Em compensação, o paciente pode também, em imaginação, pedir aos pais que
satisfaçam as suas necessidades emocionais.
Em termos de estratégias comportamentais no trabalho com este esquema
específico, estas visam a escolha de parceiros, por parte do paciente, que satisfaçam
as suas necessidades emocionais, assim como procurar que eles sejam capazes de
aceitar o cuidado e a preocupação dos outros, deixando de procurar refúgio no
evitamento das relações íntimas. Os pacientes aprendem também a, depois de
identificarem as suas necessidades emocionais, pedir, de forma apropriada, aos seus
parceiros que as satisfaçam. Por outro lado, os pacientes são instruídos a reagir de
forma adequada aos períodos de privação moderada (atendendo aqui ao continuum
de privação acima referido), não respondendo de forma enraivecida quando isso
acontece. Os pacientes são também instruídos a não se afastarem das relações, nem
procurarem o isolamento quando se sentem negligenciados pelos outros, de forma a
não agirem de uma forma que confirme os pressupostos do esquema de privação
emocional.

Defeito/Vergonha
Neste esquema particular, o objectivo do processo terapêutico visa aumentar o
sentido de auto-estima do paciente, de forma a que se sintam valorizados e dignos de
receberem amor e respeito, por parte dos demais indivíduos que o rodeiam. Assim, é
possível que o paciente perceba que o sentimento de desvalorização que o caracteriza
está errado e largamente exagerado, corrigindo, por vezes, o defeito que teme ter, ou,
em alternativa, perceber que, mesmo assim, é possível que os demais o aceitem e
amem.
Neste sentido, existem um conjunto de estratégias que permitem aceder a este
objectivo, sendo importante realçar, neste particular, a relação terapêutica, que ocupa
um papel central, dado que o terapeuta deverá valorizar e sublinhar as qualidades e
bons atributos do paciente, de forma a agir em contra-corrente em relação à lógica do
defeito auto-percebido. No entanto, é importante que o terapeuta não se constitua

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como uma entidade perfeita e omnipotente, que não permita que também nele seja
possível descortinar e perspectivar defeitos e qualidades.
A nível cognitivo, o terapeuta deverá alterar a visão do paciente que se vê
como um defeito. Os pacientes são incitados a examinar as evidências que apoiam e
rejeitam, sendo sugerido pelo terapeuta que encete diálogos entre a parte disfuncional
do esquema e a parte funcional que tem boa auto-estima, de forma a permitir que o
paciente aprenda a valorizar os seus feitos e a diminuir a importância que atribui às
suas falhas. Assim, as técnicas cognitivas ajudam a reatribuir sentimentos de defeito e
vergonha à postura crítica que caracterizava muitos daqueles com quem lidaram na
infância. A utilização de flashcards que enumerem as qualidades do paciente é útil
para lidar com esquema.
Em termos experienciais, é importante que ventilem raiva em relação aos seus
pais críticos e rejeitantes, de forma imagética, utilizando os diálogos imaginários com
os pais. Neste processo, o terapeuta introduz imagens infantis que incluam os pais a
criticarem e rejeitar o paciente, devendo o terapeuta confrontá-los, protegendo e
confortando o paciente, enquanto Criança Rejeitada. Posteriormente, o paciente será
capaz de, por si próprio, interpretar este papel, introduzindo a imagem do Adulto
Saudável que confronta e suplanta o progenitor crítico e conforta a Criança Rejeitada.
As estratégias comportamentais, particularmente a exposição com prevenção
de resposta, são importantes para o tratamento, nomeadamente quando se lida com
pacientes em que a presença deste esquema origina comportamentos evitantes.
Assim, os pacientes procuram encetar situações interpessoais que encerram um
potencial para melhorar as interacções e o quotidiano do paciente. Estas estratégias
poderão também ajudar o sujeito a corrigir “falhas legítimas” (melhorar o seu estilo
pessoal, melhorar as suas competências sociais,…). Os pacientes são, também,
instruídos a seleccionarem parceiros significativos que os apoiem e não os critiquem,
que os amem e aceitem. Os pacientes procuram, também, deixar de reagir
exageradamente às críticas dos demais, aprendendo a distinguir as críticas
destrutivas, daquelas marcadas por um carácter construtivo, aprendendo a perceber
que as críticas dos demais podem ser positivas. Assim, aprendem a estabelecer
limites interpessoais com pessoas hipercríticas e a deixar de tolerar os abusos dos
demais, aprendendo, também, a “auto-permitirem-se” a revelar alguns aspectos
pessoais a outros que sejam significativos e em quem confiem. Os processos de
compensação são também alvo de atenção, pelo que os pacientes são instruídos a
deixar de procurar parecer perfeitos, deixar de encetar comportamentos de diminuição
dos demais ou a procurar o estatuto.

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Isolamento Social
O objectivo básico do tratamento focado neste esquema é ajudar os pacientes
a sentirem-se menos diferentes das outras pessoas: somos todos seres humanos,
com as mesmas necessidades e desejos básicos.
Contrariamente ao que acontece com os outros esquemas deste domínio, o
trabalho terapêutico com o esquema de Isolamento Social não se foca principalmente
no trabalho experiencial com as origens infantis do esquema. Assim, as estratégias
cognitivas e comportamentais assumem aqui particular relevância. A terapia de grupo
pode também ser útil para os pacientes com este esquema, principalmente naqueles
que evitam estabelecer relações de amizade. Quanto mais isolado estiver o paciente,
mais importância assume a relação terapêutica no tratamento, porque vai ser uma das
únicas relações do paciente.
O objectivo principal das estratégias cognitivas é convencer os pacientes de
que não são, na realidade, tão diferentes dos outros quanto eles assumem. Há sempre
alguém igual ou parecido com eles. Os pacientes aprendem a focar-se nas suas
semelhanças com as outras pessoas, bem como nas diferenças. Aprendem a
identificar subgrupos de pessoas que são como eles – que partilham a mesma visão
de que são diferentes. Aprendem ainda a desafiar o pensamento automático negativo
que os impede de se juntarem a um determinado grupo de pessoas e de se ligarem às
pessoas nesse grupo.
As estratégias experienciais podem ajudar os pacientes que foram excluídos
em criança ou na adolescência a lembra-se de como foi essa situação. Em
imaginação, revivem estas experiências infantis e ventilam irritação e raiva para com
os pares que os excluíram e exprimem a sua solidão. Os pacientes lutam ainda contra
os preconceitos relativos àqueles que são diferentes.
As estratégias comportamentais, por seu lado, procuram ajudar os pacientes a
ultrapassar os evitamentos a situações sociais. O objectivo é que os pacientes,
gradualmente, passem a juntar-se a grupos, a ligar-se às pessoas desses grupos e a
cultivar amizades. De modo a trabalhar em prol deste objectivo, os pacientes sujeitam-
se, como trabalho de casa, a uma exposição gradual a estas situações. As estratégias
para lidar com a ansiedade são também úteis, ajudando os pacientes a lidar com a
ansiedade social que muitas vezes os incomoda. Visto, algumas vezes, estes doentes
terem aptidões de interacção social pouco desenvolvidas, o treino de aptidões sociais
pode assumir também um papel fulcral.
Relativamente à relação terapêutica, é bastante positivo os pacientes com este
esquema manterem uma relação próxima com o terapeuta. No entanto, é preciso ter

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em conta que, a não ser que os pacientes também se concentrem na aprendizagem e


aplicação de todas as outras estratégias, de forma a abandonarem os
comportamentos de evitamento a situações sociais, esta relação terapêutica, por si só,
não é suficiente para promover mudanças significativas na visão do mundo, dos outros
e de si do paciente. Assim, pode também ser importante a terapia em grupo, desde
que o grupo aceite e acolha devidamente o paciente e partilhe com este visões do
mundo, histórias de vida, interesses, etc.

Domínio da Autonomia e Desempenho Deteriorados

Dependência/Incompetência
O objectivo principal da terapia focada no esquema de
dependência/incompetência é aumentar o sentido de competência do paciente e
diminuir a sua dependência dos outros. O aumento do sentimento de incompetência
do doente envolve usualmente a construção quer de confiança quer de competências;
já a diminuição da dependência compreende a ultrapassagem do evitamento que
estes doentes fazem à resolução independente de problemas.
Desistir da dependência é a chave para o tratamento. O terapeuta guia o
paciente através de uma prevenção de resposta: os pacientes deixam de procurar
ajuda nos outros, resolvem as suas tarefas sozinhos, aceitam que cometer erros
constitui uma forma de aprendizagem, perseveram até terem sucesso e provam a elas
mesmos que podem eventualmente gerar as suas próprias soluções para os
problemas. Através de ensaios e erros, podem aprender a confiar na sua intuição e no
seu juízo.
Assim, as estratégias cognitivas utilizadas na terapia focada neste esquema,
visam alterar a visão que o doente tem de que precisa de assistência constante por
parte dos outros, de modo a conseguir funcionar. As técnicas utilizadas são as
habituais: flash cards, diálogos entre o lado esquemático e o lado saudável, resolução
de problemas para tomar decisões e o desafio de pensamentos negativos. O
terapeuta questiona a visão do paciente de que depender dos outros é uma boa
maneira de se viver. A dependência excessiva dos outros traz custos, tais como a não
satisfação de necessidades emocionais para a autonomia e a auto-expressão, que o
terapeuta e o paciente podem identificar e discutir em conjunto. O uso de estratégias
cognitivas para aumentar a motivação é essencial, porque no decorrer da terapia, o

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doente vai ter que ser capaz de tolerar elevados níveis de ansiedade. Aqui, o ensino
de técnicas de relaxamento, meditação ou outras técnicas que visam reduzir a
ansiedade é também nuclear.
Neste esquema, as técnicas experienciais são menos importantes. Por vezes,
é útil para os pacientes confrontarem-se em imaginação com o pai superprotector,
principalmente, se os pais ainda tratam os pacientes tal como os tratavam na infância,
sobreprotegendo-os e limitando a sua capacidade de autonomização. Se os pacientes
estão zangados com os pais por serem tratados desta forma, o terapeuta ajuda-os a
exprimir essa raiva. O facto de o pai ou a mãe com este tipo de comportamento o
manter porque acha que assim está a ajudar o paciente, pode dificultar a mobilização
desta raiva. No entanto, mesmo que as intenções dos pais sejam as melhores, o
resultado daqui resulta é uma incapacidade do paciente se autonomizar, ser
independente e confiar nas suas próprias competências.
O terapeuta pode conduzir sessões imagéticas em que o paciente recorda
situações da infância que poderão ter gerado o esquema. O paciente entra na
“imagem” como o Adulto Saudável que ajuda a “Criança Incompetente” a lidar e a
resolver problemas. Quando o paciente é incapaz de encontrar uma resposta
adequada a estes problemas, o terapeuta age como um “treinador”. O terapeuta pode
também conduzir sessões deste tipo nas quais o paciente imagina situações actuais
que requerem a utilização de competências de sobrevivência básicas. Uma vez mais,
o paciente entra na “imagem” como o Adulto Saudável que vai ajudar a Criança
Incompetente (muitos pacientes com este esquemas vêem-se a si mesmos como
crianças pequenas num mundo de adultos grandes). O Adulto Saudável diz à criança:
“Sei que és demasiado novo e estás muito assustado para tomar decisões. Mas não
tens que as tomar. Eu decido por ti. Sou um adulto apesar de tu seres uma criança.
Posso tomar decisões e fazer as coisas por mim mesmo”.
A parte comportamental do tratamento ajuda os pacientes a ultrapassar o
evitamento que fazem a um funcionamento independente. Aqui surge uma questão
essencial para o sucesso do tratamento: se os pacientes não alteram o seu
comportamento, não vão conseguir juntar evidências suficientes para por em causa o
esquema. Assim, os terapeutas ajudam os pacientes a listar um conjunto de tarefas
do dia-a-dia que devem ser realizadas pelo paciente sozinho. Começando pela mais
fácil, os pacientes vão realizando estas tarefas como trabalho de casa.
Os terapeutas podem também designar ensaios comportamentais com os
pacientes durante as sessões de modo a ajudá-los a lidar com os trabalhos de casa.
Os paciente imaginam-se a completar as tarefas com sucesso, resolvendo quaisquer
problemas que eventualmente surjam. É aqui importante que os pacientes se

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reforcem a eles mesmos quando completam com sucesso as tarefas designadas nos
trabalhos de casa.
Por vezes é também útil envolver a família no processo terapêutico,
principalmente se esta ainda está a manter o funcionamento dependente do paciente,
reforçando o esquema.
Na relação terapêutica é importante resistir às possíveis tentativas do paciente
em manter um funcionamento dependente relativamente ao terapeuta. Assim, o
terapeuta deve encorajar o paciente a tomar as suas próprias decisões, ajudando-os
apenas quando realmente necessário.

Vulnerabilidade ao Mal e à Doença


Os objectivos terapêuticos consistem em diminuir as estimativas dos sujeitos
acerca da probabilidade de acontecer algo de catastrófico e em melhorar a auto-
avaliação destes sujeitos acerca da capacidade para lidar eficazmente com estes
potenciais acontecimentos. Idealmente, os pacientes acabam por reconhecer que os
seus medos são grandemente exagerados e que, mesmo que ocorra uma catástrofe,
vão ser capazes de lidar com esta de um modo adequado e eficaz. O objectivo último
do tratamento passa por convencer os pacientes a abandonarem os evitamentos e os
compensamentos esquemáticos, enfrentando as situações temidas.
Assim, no tratamento dá-se especial ênfase à exploração, por parte do
paciente, das origens infantis do esquema e ao traçar de um padrão de funcionamento
esquemático ao longo da vida. Os pacientes exploram as mudanças que fariam nas
suas vidas se não vivessem constantemente com medo. É importante passar algum
tempo trabalhando a motivação do doente para a mudança. O terapeuta deve ajudar o
paciente a focar-se nas consequências negativas a longo-prazo de manter um estilo
de vida fóbico e nos benefícios de levar uma existência mais livre, com menos
preocupações e medos.
As estratégias cognitivas e comportamentais para lidar com a ansiedade e is
evitamentos são parte nuclear do tratamento.
As estratégias cognitivas ajudam ainda os pacientes a diminuir as suas
estimativas acerca da probabilidade da ocorrência de eventos catastróficos e a
aumentar as suas estimativas acerca da sua própria capacidade para lidar
adequadamente com um evento dessas características. O desafiar de pensamentos
catastróficos – descatastrofizando – por parte dos pacientes, ajuda-os a lidar com
ataques de pânico ou quaisquer outros sintomas de ansiedade. As estratégias

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cognitivas ajudam ainda os pacientes a aumentar a motivação destacando a


vantagens da mudança.
Por outro lado, as estratégias comportamentais assumem grande importância
ajudando os pacientes a abandonarem “rituais mágicos” e comportamentos de
segurança e a enfrentarem as situações temidas. Aos pacientes são também
designados trabalhos de casa entre sessões, consistindo estes, essencialmente em
tarefas de exposição gradual a situações temidas. De modo a preparar estas
exposições são feitos ensaios em imaginação nas sessões. Imaginam-se a entrar em
situações fóbicas específicas, com a assistência do “Adulto Saudável”. As estratégias
para lidar com a ansiedade, tais como os exercícios de respiração, a meditação e os
“flash-cards”, ajudam os pacientes a ultrapassar as situações de exposição.
As estratégias experienciais são também importantes. Se o esquema é uma
internalização de um pai, então o paciente pode conduzir diálogos com esse parente
em imaginação.
Já a relação terapêutica não assume particular importância no tratamento de
pacientes com este esquema. O que é realmente importante é o terapeuta adoptar
consistentemente uma atitude de confrontação empática relativamente à confiança do
paciente nos evitamentos e nos compensamentos e assegurar calma e
ponderadamente ao paciente que este vai ser capaz de lidar com as situações temidas
de uma forma mais saudável e adaptada. O terapeuta pode também modelar formas
não-fóbicas de ver e lidar com situações que encerram em si níveis de risco
aceitáveis.

Emaranhamento/Eu Sub-desenvolvido
O objectivo central do tratamento é ajudar os pacientes a expressarem-se de
forma natural e espontânea – as suas preferências, opiniões, decisões, talentos e
inclinações naturais – em vez de suprimirem os seus verdadeiros selfs e adoptarem a
identidade das figuras parentais com que estão emaranhados. Os pacientes que
resolveram adequadamente questões de emaranhamento não têm nas figuras
parentais o foco central das suas vidas. Eles são o próprio centro da sua própria
existência. Deixam de estar fundidos a uma figura parental, sabem que são
semelhantes em muitas coisas e diferentes noutras. Têm um sentido completo da sua
própria identidade.
Para os pacientes que evitaram manter uma relação próxima com alguém em
adultos, de modo a evitar emaranhar-se, o objectivo do tratamento passa por ajudar o

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paciente a manter relações com os outros que não sejam nem distantes nem
emaranhadas.
O tratamento foca-se na vida actual dos pacientes. As técnicas cognitivas e
experienciais ajudam os pacientes a identificar as suas preferências e inclinações
naturais e as comportamentais sustentam a expressão dos seus verdadeiros selfs.
Assim, as estratégias cognitivas desafiam a visão de que é preferível estar
emaranhado com uma figura parental do que ter uma identidade própria. O paciente e
o terapeuta exploram e discutem as vantagens e as desvantagens de desenvolver
uma identidade própria e separada da dos outros. Os pacientes identificam que são
simultaneamente semelhantes e diferentes das figuras parentais. É importante
identificar as semelhanças: o objectivo não passa por o paciente negar todas as
semelhanças e ligações com a figura parental. Por vezes, os pacientes negam
quaisquer semelhanças com as figuras parentais e referem que não pretendem ter
nada em comum com estes. Isto não passa de uma forma de compensação
esquemática: o paciente faz o oposto da figura parental.
Noutra técnica experiencial os pacientes visualizam a sua separação da figura
parental em imaginação. Os pacientes podem, por exemplo, recordar e reviver
acontecimentos na infância em que discordaram dos pais ou se sentiram diferentes
destes. Imaginam-se a dizer o que realmente sentiam e fazendo o que sempre
quiseram fazer. Imaginam-se também a dizer às figuras parentais passadas e
presentes o quão diferentes são e também, o quão parecidos são. Imaginam-se ainda
a estabelecer fronteiras com a figura parental, tais como recusarem-se a divulgar
certas informações ou recusarem-se a passar mais tempo juntos.
As estratégias comportamentais ajudam os pacientes a identificar as suas
preferências e inclinações naturais. Os pacientes começam por listar experiências que
considerem agradáveis, usando a sensação física de prazer como estimulo
discriminatório daquilo que realmente gostam. Como trabalho de casa podem fazer
listas das músicas preferidas, filmes, livres, restaurantes ou actividades. Estas
estratégias de índole mais comportamental podem também ser úteis ajudando o
paciente a agir segundo as suas próprias preferências, mesmo quando estas diferem
das figuras parentais. Adicionalmente, as estratégias comportamentais ajudam os
pacientes a seleccionar parceiros e amigos que não fomentam o emaranhamento.
Na relação terapêutica é importante que o terapeuta imponha limites bem
definidos, de modo a que esta relação não seja nunca demasiado próxima nem
demasiado afastada. Se terapeuta e paciente estão demasiado próximos, a relação
terapêutica vai recrear a relação emaranhada do paciente com as figuras parentais; se

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estão demasiado afastados, o paciente vai-se sentir desligado e desmotivado para a


mudança.

Fracasso
O objectivo central da psicoterapia centrada neste esquema é ajudar os
pacientes a sentirem-se e a serem tão bem sucedidos quando os seus pares (sempre
tendo em conta os seus limites e talentos). Com este objectivo em mente pode-se
proceder essencialmente de três formas: a primeira diz respeito ao aumento do
sucesso através do desenvolvimento de competências e confiança. A segunda, se o
paciente é bem sucedido relativamente ao seu nível potencial, compreende a
percepção correcta do seu nível de sucesso ou o dos seus pares. Já a última envolve
a aceitação por parte dos pacientes das suas próprias limitações, sem que isso ponha
em causa o seu valor intrínseco.
O primeiro passo na psicoterapia focada no esquema de fracasso é a avaliação
cuidada da sua origem para cada paciente. Este primeiro passo é nuclear, pois é desta
avaliação que se parte para a planificação da intervenção que deve então ter sempre
em conta a especificidade do paciente.
Assim, verifica-se que o “fracasso” de alguns pacientes se deve a uma falta e
capacidade inata, sendo que, nestes casos o trabalho do terapeuta passa por ajudar o
paciente a construir, a criar algumas competências e a estabelecer objectivos
realistas. Por outro lado, pacientes há que têm talento, inteligência e competências,
mas acabam por fracassar porque nunca se empenham se fundo, nunca fazendo uso
de todas as suas capacidades. Possivelmente falta-lhes direcção ou então têm-se
focado nas áreas erradas. Nestes casos, o terapeuta procura dirigir, estabelecer
direcções a seguir ou promover uma mudança do focus do paciente para áreas em
que mais facilmente se manifestam os seus talentos e capacidade naturais. Noutros
casos, os pacientes podem ter uma outra perturbação que interferiu no seu
desenvolvimento (tal como a Perturbação de Hiperactividade com Défice de Atenção).
Aqui, o trabalho terapêutico envolve o tratamento desta outra perturbação.
Verifica-se assim, que é nuclear avaliar porque falhou o paciente, de modo a
planear a intervenção mais adequada a cada caso.
Se os pacientes realmente falharam/fracassaram comparativamente aos pares,
então a estratégia cognitiva mais importante passa por desafiar o modo como o doente
se vê, como um incapaz, e atribuir o fracasso aos factores de manutenção do
esquema. Estes pacientes não fracassam por que são incapazes, porque não têm
capacidades, mas sim porque, inadvertidamente, agiram de modo a derrotar as suas

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tentativas para serem bem sucedidos. É o próprio esquema que os leva a falhar. Os
estilos de coping – o modo como se subjugam e evitam o esquema – são o problema,
não as habilidades, capacidades e/ou competências dos pacientes. Os pacientes
devem conduzir diálogos entre o esquema de fracasso e o lado saudável que quer
enfrentar o esquema.
Outra estratégia cognitiva passa por enfatizar os sucessos e as capacidades
dos pacientes. Tipicamente, os pacientes com este esquema ignoram ou subvalorizam
os seus sucessos e acentuam os seus fracassos. O terapeuta ajuda a corrigir este
enviezamento, ensinando os pacientes a observar e a ter em consideração todas as
vezes em que são bem sucedidos. O terapeuta também ajuda o paciente a identificar
competências, utilizando técnicas cognitivas tais como o exame de evidências. O
terapeuta ajuda ainda o paciente a estabelecer objectivos a longo prazo razoáveis. Os
pacientes que têm objectivos a longo prazo irrealistas, devem baixar as suas
expectativas para serem bem sucedidos, encontrar um outro grupo de comparação ou
mudar para outra área de acção.
As técnicas experienciais podem ser úteis ao preparar os pacientes para a
mudança comportamental. Em imaginação, os pacientes revivem experiências de
fracasso ocorridas no passado e exprimam raiva em relação às pessoas que os
desencorajaram, gozaram ou desvalorizaram em função desse fracasso. Muitas
vezes, essa pessoa foi um familiar, normalmente um pai, um irmão mais velho ou um
professor. Fazendo isto, o paciente pode reatribuir o fracasso ao comportamento
critico das outras pessoas e não à sua própria falta de capacidades.
Em alternativa, os familiares do paciente podem não ter querido que este fosse
bem-sucedido. Apesar de muitas vezes não se darem conta disto, os familiares podem
não ter querido que a criança se tornasse demasiado bem sucedida. Talvez por que
temessem que a criança os ultrapassasse ou os abandonasse. Assim, os familiares
transmitiram à criança mensagens subtis de que a abandonariam, a rejeitariam se se
tornasse muito bem sucedida. Deste modo, a criança desenvolveu um “medo do
sucesso”. As técnicas experienciais podem ajudar o paciente a identificar este tema e
a relacionar-se emocionalmente com ele.
A parte comportamental do tratamento é nuclear neste esquema.
Independentemente do progresso que os pacientes possam ter nas outras áreas, se
não abandonam os seus comportamentos de coping mal-adaptativos, vão continuar a
reforçar o esquema. O terapeuta ajuda então o paciente a trocar estes
comportamentos por outros mais adaptativos. O paciente estabelece objectivos,
estabelece tarefas graduais para atingir esses objectivos e depois completa estas
tarefas como trabalho de casa. O terapeuta ajuda aqui o paciente a ultrapassar

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possíveis bloqueios à prossecução destes objectivos. Se o problema remete para as


competências do paciente, então o terapeuta ajuda-o a desenvolver competências. Se
se trata de uma questão de atitude, o terapeuta ensina ao paciente técnicas para lidar
com a ansiedade. Se é um problema de autodisciplina, o terapeuta ajuda o paciente a
criar uma estrutura de forma a ultrapassar os comportamentos procrastinatórios e a
construir autodisciplina.
Relativamente à relação terapêutica, o terapeuta modela comportamentos que
são contrários ao esquema: se o terapeuta estabelece objectivos realistas, trabalha de
forma a atingi-los, pensa acerca de possíveis problemas antecipadamente, persiste
apesar de fracassos pontuais e reconhece progressos, então a vida profissional do
terapeuta pode servir como um “antídoto” para o esquema. O terapeuta procede
também a uma reparentização do paciente suportando os seus sucessos, dando
importância ao comportamento adaptativo do paciente, estabelecendo expectativas
realistas e estabelecendo limites bem definidos.

Domínio dos Limites Indefinidos

Grandiosidade
O objectivo básico da psicoterapia dirigida ao esquema de grandiosidade é
ajudar os pacientes a aceitar o princípio da reciprocidade das relações humanas.
Procura-se ensinar-lhes que, no que ao valor nuclear diz respeito, todas as pessoas
são criadas de modo igual e merecem direitos iguais.
Todas as pessoas têm valor: uma pessoa não é intrinsecamente melhor que
outra e nunca lhe está reservado nenhum tratamento especial. Indivíduos saudáveis
não dominam os outros, respeitam os seus direitos e necessidades; fazem também o
seu melhor de forma a controlar os seus impulsos e a não magoar ninguém e
respeitam normas sociais razoáveis, pelo menos a maior parte do tempo.
De modo a motivar os pacientes para a mudança, o terapeuta enfatiza toadas
as desvantagens do esquema de grandiosidade. Muitas vezes, estes pacientes não
vieram à terapia voluntariamente. Normalmente são forçados a vir por alguém ou
estão a enfrentar um conjunto de consequências que decorrem deste esquema –
emprego ou casamento em risco, por exemplo.
O trabalho nas relações interpessoais e na relação terapêutica constitui a
chave do processo terapêutico. O terapeuta encoraja os pacientes a sentir empatia e

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90
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preocupação pelos outros, de forma a reconhecerem os danos que provocam quando


usam de modo errado o seu poder sobre os outros. As estratégias cognitivo-
comportamentais, tais como as estratégias para lidar com a raiva e o treino assertivo,
são importantes pois permitem ao paciente substituir modos de interacção agressivos
por outros mais assertivos.
Os pacientes com este esquema passaram muitas vezes as suas vidas a focar-
se selectivamente nas suas posses e no seu poder, minimizando as suas falhas. Não
têm uma visão realista das suas forças e das suas vulnerabilidades/fraquezas. Não
aceitam ou compreendem que têm fragilidades e limitações normais e humanas. O
terapeuta usa assim técnicas cognitivas para ajudar os pacientes a desenvolver uma
visão mais realista de si mesmos. Simultaneamente o terapeuta usa estratégias
cognitivas para desafiar a visão destes pacientes de si mesmos como sendo especiais
e merecedores de direitos exclusivos. O terapeuta e o paciente estudam ainda
situações do passado em que o paciente agiu de acordo com este esquema e avaliam
as consequências adversas desse funcionamento.
Podem também ser usadas estratégias experienciais de modo a ajudar os
pacientes a expressar conhecimento do comportamento abertamente indulgente das
figuras parentais e significativas durante a sua infância.
O terapeuta observa o comportamento de grandiosidade do paciente em
consulta e na relação terapêutica e desafia esta conduta através da confrontação
empática. O terapeuta reparentiza estabelecendo limites à conduta inapropriada do
paciente e usa a relação terapêutica para confortar e suportar os pacientes sempre
que estes assumam uma falha sua, uma fraqueza ou experienciem sentimentos de
inferioridade. O terapeuta reforça o paciente, elogiando-o sempre que ele expressa
sentimentos de empatia para com os outros. Por último, o terapeuta desencoraja o
paciente a enfatizar o estatuto e outras qualidades superficiais no julgamento do valor
de si mesmos e dos outros.

Auto-Controlo Insuficiente
O principal objectivo na terapia focada no esquema de auto-controlo
insuficiente é ajudar os pacientes a reconhecer as vantagens de desistir das
gratificações a curto-prazo de forma a alcançar objectivos a longo-prazo. Os
benefícios de fazer o que no imediato nos dá prazer não são suficientes para cobrir os
custos que este tipo de comportamento tem no avanço da carreira e nas relações com
os outros e com nós mesmos.

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


91
Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

As estratégias cognitivo-comportamentais são as mais úteis na psicoterapia


focada neste esquema. Deste modo, o terapeuta ensina os pacientes a exercitar o
auto-controlo e a auto-disciplina. A ideia básica, subjacente a estas técnicas, é a
noção de que, entre o impulso e a acção, os pacientes devem aprender a inserir um
pensamento. Devem aprender a pensar nas consequências de se deixarem levar pelo
impulso antes de agirem de acordo com este.
Nos trabalhos de casa designados, os pacientes passam por uma série de
tarefas de dificuldade gradual, tais como tornar-se organizado, executar trabalhos
aborrecidos ou rotineiros, ser pontual, tolerar a frustração e controlar emoções
excessivas e impulsos.
Os pacientes aprendem técnicas que os ajudam a controlar as suas próprias
emoções, tais como o time-out, a meditação, o relaxamento, a distracção e flash-cards
que os lembram das razões pelas quais se devem controlar e dos métodos que podem
usar para o conseguir.
Nas sessões terapêuticas, pode ser usado o ensaio comportamental em
imaginação ou o role-play para praticar o auto-controlo e a auto-disciplina. Podem
reforçar-se a si mesmos quando conseguem manter-se controlados e disciplinados no
dia-a-dia.
Ocasionalmente, este esquema pode estar associado a um outro que pode ser
mais primário. Neste caso, o terapeuta deve centrar-se no esquema mais central bem
como o esquema de Auto-Controlo Insuficiente. Por exemplo, por vezes o esquema
emerge porque os pacientes suprimiram durante demasiado tempo as suas emoções.
Isto acontece frequentemente com o esquema de Subjugação. Assim, durante longos
períodos de tempo, os pacientes com este esquema vivenciam fortes sentimentos de
raiva, irritação e não os exprimem. Gradualmente, estes sentimentos acumulam-se e,
num dado momento, explodem de um modo completamente descontrolado. Quando
os pacientes mostram um padrão de funcionamento que alterna entre a passividade e
a agressividade espontânea, deve colocar-se a hipótese da presença simultânea de
um esquema de subjugação e um esquema de auto-controlo insuficiente. Se os
pacientes aprenderem a expressar os que precisam e sentem num determinado
momento, então a raiva não se vai acumular. Quanto menos os pacientes esconderem
e suprimirem os seus sentimentos e necessidades, menos provável é que ajam
impulsivamente.
Algumas técnicas experienciais são também úteis. Os pacientes podem
imaginar cenas passadas e actuais nas quais mostraram uma pobre capacidade de
auto-controlo e auto-disciplina e actuar, em imaginação, de uma forma mais proactiva
e adaptada.

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Na relação terapêutica é importante o terapeuta ser firme e estabelecer limites


bem definidos. Isto é especialmente importante quando a origem do esquema se
relaciona com o facto de, enquanto crianças, estes pacientes não terem tido ninguém
que lhes impusesse limites. Muitas vezes, estes pacientes são filhos de pessoas que
trabalhavam bastante e eram deixados sozinhos, não tendo ninguém que os
disciplinasse. Quando a falta de envolvimento parental é a “causa” do esquema, o
terapeuta pode reparentizar o paciente de uma forma activa. O terapeuta estabelece
punições para comportamentos tais como chegar atrasado às sessões ou não cumprir
os trabalhos de casa designados.

Influência dos Outros

Subjugação
Atendendo às principais características deste esquema, não é pois de
estranhar que os objectivos do trabalho terapêutico consistam, em primeiro lugar,
na identificação das preferências, decisões, desejos e/ou emoções do doente, para, de
seguida, proceder ao encorajamento da sua manifestação. São, neste âmbito,
naturalmente trabalhadas algumas das consequências que o doente antecipa caso aja
da forma pretendida.
Visando a sua obtenção, é habitual recorrer-se a estratégias variadas, nas
quais se incluem as estratégias cognitivas, experienciais, comportamentais e
interpessoais. De realçar que todas estas desempenham um papel relevante no
trabalho com este EPM.
Uma vez que os doentes com o EPM de Subjugação antecipam
consequências negativas exageradas (ex. punição, abandono, retaliação) por
exprimirem as suas necessidades e sentimentos aos outros, é profícuo o recurso a
técnicas cognitivas no seio das quais se reúna informação acerca de episódios
passados onde o doente tenha, excepcionalmente, manifestado as suas necessidades
e sentimentos. Após a sua reunião, a informação que apoia o esquema é examinada
criticamente, encorajando-se o doente para a formulação de outros significados para
as reacções externas então observadas. Poder-se-á, neste contexto, proceder à
reatribuição das intenções dos pais e/ou de outras figuras de autoridade para o
doente. De igual modo, é revista a informação que contradiz o esquema e o doente
alertado para o facto de desvalorizar, habitualmente, todos os dados que não estão de

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93
Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

acordo com o conteúdo do seu esquema de subjugação, sendo instruído para fornecer
“uma experiência justa ao esquema para testar a sua validade”.
No que respeita às estratégias experienciais, poderá ser benéfica a
construção de diálogos imaginários com os pais. Nestes, o doente deve ser conduzido,
atendendo às características do esquema de subjugação, a estabelecer um diálogo
com a figura parental controladora, e, simultaneamente, estimulado a expressar de
forma assertiva os seus interesses e necessidades emocionais e/ou raiva. Não
obstante os doentes manifestarem habitualmente dificuldades significativas em
expressar raiva, em particular quando esta é direccionada para a figura parental
controladora, é fulcral, dada a importância que a expressão da raiva assume na
modificação do esquema em questão, que o terapeuta insista na concretização destes
diálogos imaginários. De facto, quanto mais os pacientes se confrontarem com a
experienciação da raiva e quanto mais potenciarem a sua ventilação em exercícios de
imagery e/ou em exercícios de role-play, tanto mais capazes estarão de desafiar o
esquema sempre que este for activado, no interior e no exterior das sessões
terapêuticas. É ainda salientada a importância da raiva em termos da sua utilidade
para contra-estimular a passividade que frequentemente caracteriza estes doentes,
encorajando-os a rotulá-la como um sinal para expressar as suas preferências e
sentimentos, não se pretendendo, portanto, apenas promover a sua ventilação.
A nível comportamental, o paciente é alertado para os comportamentos de
manutenção que derivam do esquema, dentre dos quais se destaca o papel
desempenhado pela selecção maladaptativa de parceiros. Assim, revela-se
extremamente importante dificultar que o paciente seleccione, para um futuro
relacionamento íntimo, uma pessoa controladora, potenciando, nestas circunstâncias,
a confirmação do seu conteúdo esquemático. De modo semelhante, é alertado para
atender a esta informação aquando da formação de novas relações de amizade. A
implementação de técnicas assertivas, outra estratégia comportamental, assume
particular importância no trabalho com este EPM, dadas as enormes dificuldades que
os pacientes experienciam em ser assertivos aquando da expressão das suas
preferências e necessidades emocionais. Sobretudo numa fase inicial, os doentes
experienciam, de facto, muitas dificuldades na expressão do seu “verdadeiro self”,
fazendo-o ou de forma muito passiva ou agressiva. Os doentes são, assim, ensinados
a afirmarem, gradualmente, as suas inclinações naturais e necessidades perante os
outros, através da utilização destas últimas técnicas, podendo recorrer-se, com vista à
sua facilitação, a exercícios de role-play. Outras vezes há que os doentes manifestam
francas dificuldades na identificação dos seus desejos, interesses e/ou emoções, em
virtude de terem passado a totalidade das suas vidas a satisfazer as necessidades e

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94
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desejos dos outros. Nestes casos, em que o processo de individuação não foi
completado com sucesso, poderá ser profícua a nova implementação de estratégias
de imagery, solicitando-se o doente, por exemplo, a imaginar um episódio em que
tenha suprimido as suas necessidades emocionais e interesses e que, desta feita, as
verbalize e antecipe as consequências. Os exercícios de role-play poderão também
revelar alguns resultados positivos neste âmbito. Uma vez identificadas as emoções e
desejos do paciente, isto é, uma vez descoberto o seu “verdadeiro self”, as técnicas
anteriormente referidas são aplicadas.
A nível relacional, donde se destaca de imediato a relação terapêutica, é
importante, da parte do terapeuta, não assumir uma atitude directiva, permitindo ao
doente a tomada de algumas decisões terapêuticas: quais os problemas que pretende
trabalhar na consulta, que técnicas e trabalhos de casa julga mais apropriados para si,
são alguns exemplos destas decisões. O terapeuta deve, ainda no que respeita a este
domínio, ajudar o doente a identificar e a expressar a raiva em direcção a si
(terapeuta) e, em simultâneo, a invalidar os comportamentos do doente direccionados
à satisfação das necessidades emocionais do terapeuta, relegando para segundo
plano as suas. De facto, não raras vezes, os terapeutas apreciam as qualidades
distintivas dos pacientes com um EPM de Subjugação, podendo, por um lado, reforçar
a validade do conteúdo esquemático, numa atitude claramente anti-terapêutica, e, por
outro, confundir um “bom paciente” de um paciente com um EPM de subjugação.
Ambas as situações são prejudiciais à evolução do doente.

Auto-sacríficio
A concretização dos seguintes objectivos assume particular importância com
estes doentes. Um destes passa por potenciar o reconhecimento, por parte do doente,
de que algumas das suas necessidades emocionais não estão a ser adequadamente
satisfeitas, algo que muitos destes não têm sequer consciência. É, adicionalmente,
debatido que os pacientes têm o mesmo direito que as outras pessoas de satisfazer as
suas necessidades, tentando com isto superar a privação emocional que muitos
destes vivenciam. O paciente é, neste contexto, encorajado a atender às suas próprias
necessidades, a permitir que as outras pessoas encetem um esforço no sentido de as
satisfazer, a endossar pedidos concretos e directos às outras pessoas, bem como a
autorizarem-se a sentir-se vulneráveis, ao invés de se esforçarem permanentemente
por ser fortes. É ainda profícuo promover a redução do sentido de responsabilidade
habitualmente evidenciado por estes pacientes em relação às outras pessoas.

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Visando a sua obtenção, é habitual recorrer-se a estratégias variadas, nas


quais se incluem estratégias cognitivas, experienciais, comportamentais e
interpessoais.
A nível cognitivo é benéfico o debate de algumas crenças disfuncionais que
habitualmente estes doentes possuem, nomeadamente a percepção exagerada
acerca da fragilidade e carência das outras pessoas, bem como a necessidade que
estes pacientes sentem em responsabilizar-se pela satisfação das necessidades e
carências dos outros. O doente poderá, neste contexto, ser incentivado a recordar
alguns episódios em que não satisfez as necessidades destas pessoas,
percepcionadas como mais frágeis e carentes, e a tentar evocar as consequências
que resultaram desse seu comportamento. Deste exercício mnésico, é retirada alguma
informação que posteriormente será analisada criticamente. A informação que apoia o
esquema é analisada criticamente e o doente estimulado a gerar interpretações
alternativas para esse mesmo acontecimento. A informação que contradiz o esquema
é reunida e o doente alertado para o facto de desvalorizar, habitualmente, todos os
dados que não estão de acordo com o conteúdo do seu esquema de auto-sacrifício.
Serão igualmente debatidas algumas situações actuais, procedendo-se de forma
semelhante à anteriormente descrita. Pretende-se, ainda, aumentar a consciência do
doente acerca das suas próprias necessidades, realçando o desequilíbrio no ratio dar
e receber que é habitualmente promovido por estes em diferentes relações. Neste
seguimento poderá ser feita a distinção entre relações horizontais e relações verticais.
Poderá também ser benéfica a potenciação do reconhecimento de outros esquemas
que habitualmente se associam ao esquema em questão (ex. privação emocional,
abandono).
No que respeita às técnicas experienciais, a construção de diálogos
imaginários com os pais, onde se possibilite ao doente confrontar-se com o pai que o
privou emocionalmente poderá ser bastante eficaz. Nestes, o doente deve ser
instruído para expressar a sua tristeza e raiva em relação à figura parental
responsável pela sua privação emocional, onde habitualmente se incluem, entre
outros, pais carentes e demasiadamente frágeis, e em relação ao facto de ter sido
forçada a adoptar, numa idade tão precoce, um papel de criança parentificada.
Poderão também ser realizados alguns exercícios de role-play, nos quais se trabalhem
situações de privação actual e onde sejam ensaiadas respostas no sentido de solicitar
a satisfação de algumas das suas necessidades pessoais.
A nível comportamental, o doente é alertado para os comportamentos de
manutenção que derivam do esquema, dentre dos quais se destaca o papel
desempenhado pela selecção maladaptativa de parceiros. Assim, revela-se

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

extremamente importante dificultar que o paciente seleccione, para um futuro


relacionamento íntimo, uma pessoa frágil e/ou carente ou uma pessoa com um
esquema de grandiosidade, potenciando, nestas circunstâncias, a confirmação do
conteúdo do seu esquema. Adicionalmente, os doentes são instruídos para
monitorizarem aquilo que dão e o que recebem no seio de dada relação e encorajados
equilibrar o ratio quando tal se revelar necessário, sendo habitualmente motivados
para dar menos e exigir mais. Poderão, neste seguimento, ser ensaiadas algumas
respostas comportamentais em exercícios de role-play.
A nível relacional, é importante que o terapeuta adopte uma atitude muito
carinhosa, possibilitando ao doente o confronto com uma relação claramente diferente
daquelas que tem estabelecido ao longo de toda a sua vida. Paralelamente à adopção
de uma postura carinhosa, é ainda importante que o terapeuta esteja alerta a
quaisquer tentativas do doente no sentido de “tomar conta” do terapeuta, confrontando
imediatamente estas tentativas através de um processo de confrontação empática. Ao
invés, o paciente é incentivado a adoptar uma postura de vulnerabilidade para com o
terapeuta, validando-se, desta forma, as necessidades do doente. O doente é, assim,
estimulado, a confiar no terapeuta, experiência pela qual o doente nunca passou. De
salientar, por último, o extremo cuidado que o terapeuta, igualmente possuidor de um
esquema de auto-sacrifício, deve ter em não promover o modelamento de
comportamentos promotores da confirmação do conteúdo do esquema do doente.
Esta ressalva foi efectuada uma vez que este esquema é o mais frequente entre
profissionais de saúde mental, julgando-se desempenhar um papel de alguma
relevância na escolha desta área profissional.

Procura de Aprovação/Procura de Reconhecimento


Tendo presentes as características deste esquema, o trabalho com estes
doentes visa, em primeiro lugar, promover o reconhecimento de que estes possuem
um self autêntico, distinto da sua forma habitual de funcionamento, isto é, do self que
procura persistentemente a aprovação e/ou reconhecimento das outras pessoas,
fazendo dessas reacções externas depender a sua auto-estima ou valor próprio. Os
pacientes são, neste seguimento, ajudados a identificar as suas verdadeiras
necessidades emocionais e inclinações naturais e encorajados a movimentarem-se no
sentido de procurar a sua satisfação, isto é, a adoptarem um funcionamento coerente
com o seu verdadeiro self. A transmissão da noção de que a aprovação e o
reconhecimento externos mais não são do que formas de gratificação momentâneas, e
que, inversamente, a satisfação das verdadeiras necessidades emocionais e

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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inclinações naturais consubstancia-se em resultados claramente mais benéficos para


o paciente, constitui outro importante objectivo no trabalho com este esquema.
Visando a obtenção dos objectivos referidos, é habitual recorrer-se a diferentes
estratégias, nas quais se incluem estratégias cognitivas, experienciais,
comportamentais e interpessoais.
Em termos cognitivos, é usualmente benéfico consciencializar o doente de
que o grau com que procura a aprovação e/ou reconhecimento dos outros é
excessivo, informando-o contudo de que este desejo está presente na maioria das
pessoas, embora em graus de intensidade manifestamente inferiores. É-lhe
transmitida, desde logo, a noção de que uma mudança de funcionamento para o
extremo oposto é também disfuncional, tentando com isto prevenir a ocorrência deste
último resultado. O debate acerca das vantagens e desvantagens de manter um
funcionamento consonante com um self que procura persistentemente a aprovação
e/ou reconhecimento das outras pessoas, ou de adoptar um novo funcionamento,
maioritariamente baseado na identificação e posterior satisfação das suas verdadeiras
necessidades emocionais e inclinações naturais, isto é, a adopção de um
funcionamento coerente com o seu self verdadeiro, revela, de igual forma, particular
relevância neste âmbito. É, neste seguimento, profícuo salientar a gratificação
momentânea advinda da aprovação e/ou reconhecimento das outras pessoas, e
estabelecido uma comparação com as formas de gratificação geralmente resultantes
da satisfação das verdadeiras necessidades do self.
Após a educação de que a forma de funcionamento habitual do doente foi
aprendida na infância, etapa onde revelou alguma funcionalidade, o terapeuta deve
ajudar o paciente a recordar alguns episódios, usualmente com ocorrência na infância,
que podem ter potenciado a formação do esquema em questão (estratégias
imagéticas). A interacção com pais cujos objectivos e expectativas eram sobretudo
baseados nos valores e normas culturais, em detrimento das necessidades e
inclinações naturais da criança, e, por conseguinte, encorajadores da concretização de
objectivos maioritariamente sociais (ex. estatuto, popularidade, aparência) são
experiências desenvolvimentais comuns a estas pessoas. Uma vez identificados
alguns destes episódios, o doente deve ser estimulado a expressar, através do
recurso a técnicas imagéticas (ex. diálogos imaginários com os pais), aquilo que
realmente pensava nessas situações, o que sentia e a forma segundo a qual gostaria
de se ter comportado. O doente poderá também realizar este exercício, recordando,
inicialmente, aquilo que lhes foi exigido pelas figuras parentais, onde se inserem os
comportamentos de procura de aprovação e/ou de reconhecimento, e, posteriormente,
aquilo que realmente pensavam e sentiam, estabelecendo-se, com o recurso a esta

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variante do exercício, uma clara distinção entre estas duas formas de funcionamento.
O paciente deverá, ainda, ser incentivado a expressar raiva às figuras que não lhe
possibilitaram a satisfação das suas verdadeiras necessidades e inclinações naturais.
Encorajar o doente, uma vez mais recorrendo a estratégias imagéticas, a
desempenhar o papel de “adulto-saudável” a ajudar a criança, cujo funcionamento é
baseado na procura de aprovação, a transitar para a “criança vulnerável”, com um
funcionamento sustentado na expressão das suas verdadeiras necessidades e na
procura de satisfação das mesmas, revela geralmente bastante utilidade neste
domínio. Poderá, ainda no que respeita ao último exercício descrito, ser necessário o
terapeuta realizar primeiro o papel de “adulto-saudável”, modelando assim o
comportamento do doente.
A nível comportamental, é extremamente benéfica a planificação de alguns
exercícios comportamentais, nos quais possam tornar-se evidentes as verdadeiras
necessidades e inclinações naturais do doente. O preenchimento de registos de auto-
monitorização poderá desempenhar um importante papel para a obtenção deste fim.
Após o seu acesso, poderão ser realizados alguns exercícios de role-play, onde se
ensaie a eliminação dos comportamentos de procura de aprovação e/ou
reconhecimento, e, em simultâneo, a adopção de comportamentos que visem a
satisfação das verdadeiras necessidades do paciente. Será importante, neste
seguimento, precaver o doente de que esta tarefa será muito activadora do ponto de
vista emocional, pretendendo-se com isto que este aprenda a tolerar situações em que
não seja aprovado ou reconhecido ou mesmo em que seja criticado. Serão destacados
ainda os ganhos que o doente obterá caso adopte este funcionamento e, uma vez
mais, salientado o carácter momentâneo da gratificação advinda dos comportamentos
de procura de aprovação.
A nível relacional, é importante que o terapeuta esteja a atento a quaisquer
tentativas, mais ou menos conscientes, que o doente elabore no sentido de obter a
aprovação e/ou reconhecimento do terapeuta, confrontando-o de forma empática com
o sucedido. Nestas circunstâncias, o doente deverá ser encorajado a expressar aquilo
que pensa e sente, ao invés de tentar omitir pensamentos e/ou emoções negativos
que surjam no decorrer das consultas (função de reparentização limitada).

Domínio da Sobrevigilância e Inibição

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Negativismo/Vulnerabilidade ao Erro
O objectivo base do tratamento de pacientes com este esquema é ajudá-los a
prever o futuro de uma forma mais objectiva e mais positiva. Alguma pesquisa sugere
que a forma mais saudável de “olhar para a vida” é com um brilho ilusório, ou seja, de
uma forma ligeiramente mais positiva do que a realidade. Uma visão negativa não
parece ser, de forma alguma, tão saudável ou adaptativa. Talvez porque se
esperamos que as coisas corram mal e de facto estas não correm bem, não nos
sentimos muito melhor. É provavelmente mais saudável esperar que as coisas corram
bem – desde que as expectativas não sejam disparatadas e completamente
desfasadas da realidade.
Não se espera, realisticamente, que os pacientes com este esquema se tornem
descuidados e/ou optimistas; espera-se, isso sim, que adquiram uma visão menos
negativa e mais moderada.
Diversas estratégias cognitivas podem ser úteis no trabalho com este
esquema: identificação de distorções cognitivas, exame de evidências, gerar
alternativas, uso de flash-cards, condução de diálogos entre o “lado esquemático” e o
“lado saudável”. O terapeuta ajuda os pacientes a fazerem previsões acerca do futuro
e a observarem o quão infrequentemente as suas expectativas se tornam realidade.
Os pacientes auto-monitorizam o seu pensamento negativo e pessimista e tentam
olhar para as suas vidas de uma forma mais objectiva, baseando-se na lógica e nas
evidências empíricas. Aprendem a deixar de focar o lado negativo das situações,
passando a enfatizar o lado positivo.
Quando os pacientes têm um passado cheio de acontecimentos negativos, as
técnicas cognitivas podem ajudá-los a analisarem estes acontecimentos e a
distinguirem o presente e o futuro do passado. Se um acontecimento negativo era
controlável, então o terapeuta e o paciente podem trabalhar juntos, corrigindo o
problema de forma a que não volte a ocorrer. Por outro lado, deve-se enfatizar que
mesmo quando o paciente vivenciou acontecimentos negativos incontroláveis no
passado, não há motivos para se ser pessimista.
Quando um esquema tem uma função protectora, as técnicas cognitivas
podem ajudar os pacientes a desafiar a crença de que é preferível assumir uma
perspectiva negativa e pessimista, de modo a não se desapontarem. Esta ideia está
normalmente incorrecta: se os pacientes esperam que alguma coisa corra mal e, de
facto, acaba por correr mal, não se sentem muito melhor por se terem preocupado e
previsto essa situação; se esperam que algo corra bem e, ao invés, algo corra mal,
não se sentem muito pior. Os pacientes listam as vantagens e as desvantagens de

Hospital Sobral Cid


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

assumir e esperar sempre o pior, experimentando ambas as posições e observando os


efeitos decorrentes do assumir de umas das posições.
Alguns pacientes evidenciam o que Borkovec denomina “magia da
preocupação”. Acreditam que a preocupação é um ritual mágico que pode prevenir
certos acontecimentos negativos. A verdade, no entanto, é que muitos objectos de
preocupação fogem do controlo dos pacientes. Assim, os pacientes podem
estabelecer diálogos entre o lado negativista e pessimista e o lado positivista e
optimista, que a terapia vai ajudando a desenvolver. Desta forma, podem observar os
benefícios de terem uma atitude mais positiva perante a vida.
As técnicas experienciais ajudam os pacientes a ligar-se ao Modo Criança
Feliz. Se na origem do esquema esteve um familiar pessimista e negativista, os
pacientes podem estabelecer diálogos em imaginação com este familiar. Enquanto
Adulto Saudável, primeiro o terapeuta, depois o paciente, interage em imaginação em
recordações da infância em que o Familiar Pessimista contrariou o entusiasmo da
criança. O Adulto Saudável desafia o Familiar Negativista e reassegura a Criança
Preocupada. A criança exprime irritação e raiva para com o Familiar Negativista por
ser uma presença tão negativa e stressora.
Os terapeutas podem ainda usar técnicas experienciais para ajudar os
pacientes a resolverem sentimentos de privação emocional acerca de eventos
dolorosos do passado.
Os pacientes podem ainda conduzir experiências comportamentais para testar
crenças negativas. Podem, por exemplo, prever a pior consequência possível
decorrente de determinada situação e ver quantas vezes essa previsão estava
correcta ou testar a hipótese de que a preocupação conduz a resultados melhores.
Os terapeutas podem ainda ensinar aos pacientes técnicas de “prevenção de
resposta” de forma a que estes reduzam a sobrevigilância à possível ocorrência de
erros. Os pacientes aprendem gradualmente a tornar-se menos “obsessivos” acerca
do evitamento de erros e a não entrarem em comportamentos de prevenção de erros.
Depois observam o aumento da satisfação e do prazer decorrente destas mudanças.
Instruir os pacientes a não se queixarem aos outros pode ser um trabalho de
casa útil. Quando o esquema Negativismo/Vulnerabilidade ao Erro é compensatório
relativamente a um esquema de Privação Emocional, o terapeuta pode ensinar os
pacientes a questionarem os outros mais directamente de forma a estes irem de
encontro às suas necessidades emocionais.
Limitar o tempo dispendido em preocupações, reservando um “tempo de
preocupação” de duração previamente definida, é uma estratégia comportamental útil
no tratamento destes pacientes. Aprendem a identificar quando se estão a preocupar e

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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depois adiam esta preocupação até ao “tempo de preocupação” prescrito. Muitos


destes pacientes beneficiam igualmente da calendarização e prescrição de mais
tempo para entretenimento. É comum estes pacientes orientarem a sua vida para a
sobrevivência e não para o prazer. A vida, para estes pacientes, não é conseguir
“coisas boas” mas sim prever “coisas más”. Assim, levando estes doentes a reservar
um tempo especial para se envolverem em actividades satisfatórias, pode ser um
“antídoto” à tendência destes doentes para passarem demasiado tempo a preocupar-
se.
O terapeuta deve evitar dar importância às queixas e às previsões negativas do
paciente. Se o terapeuta conseguir dar apoio ao paciente relativamente a perdas
passadas, não dando importância às queixas excessivas acerca de eventos actuais,
então o paciente pode começar a “curar-se”. Esta “reparentização limitada” promove o
luto sem reforçar o pessimismo e as queixas.

Inibição Emocional
O objectivo principal do tratamento é ajudar os pacientes a expressarem mais
facilmente as suas emoções e a serem mais espontâneos. O tratamento ajuda-os a
discutirem e a expressarem adequadamente muitas das emoções que procuram
omitir.
Os pacientes aprendem a manifestar irritação de forma adequada, a envolver-
se em actividades mais satisfatórias, a expressar afecto e a falar acerca dos seus
sentimentos. Aprendem a valorizar tanto as emoções quanto a racionalidade,
aprendem a deixar de controlar as vidas daqueles que os rodeiam, a deixar de
humilhar os outros por estes expressarem emoções normais e a perder a vergonha
por expressarem as suas próprias emoções. Em vez disso, permitem-se a eles
próprios, e aos outros, a serem mais expressivos acerca das suas emoções.
As técnicas experienciais e comportamentais são provavelmente as mais
importantes no trabalho terapêutico com este esquema. As técnicas comportamentais
procuram trabalhar com o paciente a discussão e expressão de emoções positivas e
negativas com os outros significantes e a envolver-se em mais actividades
satisfatórias. Alguma educação pode ser útil; as estratégias cognitivas geralmente não
são tão úteis – acabam por reforçar a enfâse excessiva na racionalidade que já existe.
O trabalho experiencial pode ajudar os pacientes a acederem às suas
emoções. Em imagens da infância, o Adulto Saudável ajuda a Criança Inibida a
expressar as emoções que os pais procuram anular. Nas situações actuais,

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102
Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

experienciadas em imaginação, o Adulto Saudável ajuda o paciente a articular as suas


próprias emoções e a encorajar os outros a articularem também as suas emoções.
Em imagerie, os pacientes podem também reviver situações importantes da
infância, expressando, desta vez, as suas emoções.
A relação terapêutica pode também ser bastante útil no tratamento deste
esquema. Um terapeuta que é, regra geral, mais expressivo e emocional pode
“reparentizar” o paciente e agir como modelo. Um terapeuta bastante racional e inibido
pode, por sua vez, reforçar o esquema. A reparentização pode envolver,
ocasionalmente, comportamentos espontâneos, tais como contar anedotas ou usar o
humor doutra forma. Mais importante ainda é o doente reforçar o paciente quando este
exprime as suas emoções em vez de as reprimir. Se os pacientes têm sentimentos
fortes relativamente ao terapeuta, este deve encorajá-los a exprimirem-se em voz alta.
As estratégias cognitivas ajudam os pacientes a aceitarem as vantagens de
serem emocionais e a decidirem enfrentar o esquema.
Estas técnicas cognitivas podem também ser usadas de forma a permitirem
que o doente faça uma avaliação correcta das consequências que advêm do facto de
exprimirem as suas emoções. Os pacientes com este esquema temem que a
exposição das suas emoções e sentimentos lhes traga consequências negativas.
Geralmente, temem ser humilhados ou sentirem-se envergonhados. Se os pacientes
perceberem que a expressão de sentimentos e emoções não implica muito
provavelmente qualquer tipo de humilhação, então vão-se sentir mais confortáveis na
expressão de emoções e sentimentos.
Os pacientes podem também discutir os seus sentimentos com as outras
pessoas, exprimindo sentimentos negativos e positivos, brincando e sendo
espontâneos e participando em actividades que lhes dêem prazer. O terapeuta pode
ainda encorajar o doente a listar as consequências decorrentes da expressão de
sentimentos que prevê, confrontando-o depois com aquilo que realmente aconteceu.
Os pacientes podem também ensaiar em role-plays a interacção com outras pessoas.
O terapeuta modela e encoraja a expressão emocional adequada. O trabalho
em grupo terapêutico pode também ser útil ajudando os pacientes com este esquema
a expressarem mais confortavelmente as suas emoções em frente aos outros.

Hipercriticismo/Padrões Elevados Rígidos


O objectivo principal do tratamento é ajudar os pacientes a diminuir os seus
padrões rígidos e o seu criticismo. O objectivo divide-se em dois: levar a que os
pacientes tentem alcançar menos e a alcançar isso de um modo menos perfeccionista.

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103
Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Os pacientes tratados com sucesso conseguem alternar mais adequadamente entre


momentos de lazer e momentos de trabalho, não se preocupando tanto em estarem a
“perder tempo”, e não se sentindo menos culpados por isso. Permitem que algo seja
imperfeito e, mesmo assim, com valor. Tornam-se menos críticos para com eles
mesmos e para com os outros, exigem menos de si, aceitam mais facilmente a
imperfeição dos seres humanos e são menos rígidos acerca de regras. Idealmente
acabam por perceber que os padrões elevados rígidos trazem mais custos do que
ganhos.
As estratégias cognitivas e comportamentais são as mais importantes no
tratamento deste esquema. Apesar das técnicas experienciais e a relação terapêutica
serem também úteis, normalmente não são centrais ao tratamento.
O terapeuta utiliza estratégias cognitivas para ajudar os pacientes a desafiarem
o seu perfeccionismo. Aprendem a ver a sua performance como passível de ser
avaliada num continuum de pobre a perfeito, em vez de a verem como um fenómeno
tudo-ou-nada.
O terapeuta enfatiza as vantagens do paciente baixar os seus padrões. O custo
da manutenção do esquema é bem maior do que os benefícios: esta conclusão é peça
chave na motivação do doente para a mudança. O terapeuta ajuda também os
pacientes a reduzir o risco percebido de se ser imperfeito. Cometer erros não tem, de
forma alguma, o impacto negativo que os pacientes temem.
Este esquema parece ter duas origens distintas, com diferentes implicações na
terapia. A primeira origem, mais comum, tem que ver com a internalização dos
padrões excessivos de uma figura parental. Quando esta é a origem, exercícios em
imaginação podem ajudar o paciente a construir uma parte do self que consiga lutar o
pai internalizado.
A outra possível origem deste esquema é compensatória relativamente a um
esquema de Defeito: os pacientes sentem-se inferiores e depois compensam,
tentando ser perfeitos. Quando esta é a origem, ajudar os pacientes a identificar este
esquema é parte importante do tratamento. Estratégias experienciais podem ajudar o
paciente a aceder a este esquema. Assim, todas as técnicas imagéticas utilizadas no
tratamento do esquema de Defeito são relevantes na terapia focada neste esquema.
As estratégias comportamentais podem ajudar os pacientes a reduzir
gradualmente os seus padrões rígidos. O terapeuta e o paciente concebem
experiências comportamentais que ajudam a atenuar o perfeccionismo – fazer menos
e fazer menos bem. Alguns exemplos de experiências comportamentais incluem a
calendarização do tempo que se passa a trabalhar e do tempo que se passa a fazer
outras coisas, tais como divertir-se e ligar-se aos outros significantes; o

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

estabelecimento de padrões menos elevados e agir de acordo com estes ou o cometer


erros na execução de tarefas intencionalmente. Os pacientes aprendem ainda a
desafiar o sentimento de culpa por não se esforçarem mais.
Idealmente, o terapeuta modela padrões equilibrados na sua abordagem à
terapia e no retratar da sua própria vida. Os terapeutas que são demasiado
perfeccionistas podem dificultar o progresso dos pacientes na terapia. O uso da
confrontação empática quando os padrões rígidos do paciente se manifestam em
terapia é igualmente útil. O terapeuta não envergonha ou critica os pacientes quando
estes agem imperfeitamente, devendo focar-se na relação e em ajudar o paciente a
curar em vez de se preocupar em avaliar a performance do paciente em terapia.

Punição
O tratamento deste esquema passa por ajudar os pacientes a tornarem-se
menos punitivos e a desculparem mais facilmente. O terapeuta começa por ensinar
aos pacientes que, na maior parte do tempo, não “vale a pena” punir alguém. A
punição não é um modo eficaz de alterar comportamentos, particularmente quando
comparado com outros métodos, nomeadamente com o reforço de comportamentos
adequados e o modelamento.
Cada vez que um paciente exprime o desejo de punir alguém, o terapeuta
levanta uma série de questões: “As intenções da pessoa eram boas ou más? Se as
intenções eram boas, isso não interessa? Se as intenções eram boas, como é que a
punição vai resolver alguma coisa? Mesmo que a pessoa se comporte melhor da
próxima vez, não terá sido o custo demasiado elevado? A punição vai complicar o
relacionamento com essa pessoa e a sua auto-estima. Era esse o seu objectivo?”
Estas questões guiam o paciente e ajudam-no a descobrir que a punição não é o
modo mais benéfico de resolver o que quer que seja.
Os pacientes trabalham no sentido de criar empatia e em aumentar a sua
capacidade para perdoar os seres humanos em toda a sua fragilidade e imperfeição.
Aprendem a ter uma resposta adequada quando alguém comete um erro ou não é
capaz de agir de acordo com as expectativas do paciente. A punição deve estar
reservada aqueles que têm intenções imorais ou são completamente negligentes.
As estratégias cognitivas adquirem aqui particular importância na construção
da motivação do paciente. A estratégia principal é educacional: os pacientes exploram
as vantagens e desvantagens de punição e do perdão. Listam as consequências
decorrentes de se punir alguém e aquelas que decorrem do acto de perdoar alguém.
Esta exploração é um modo produtivo de levar o paciente a perceber que a punição

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

não é uma estratégia eficaz para lidar com os erros. Os pacientes conduzem ainda
diálogos entre o lado punitivo e o lado “misericordioso”, de modo a haver um debate
de argumentos entre ambos os lados. Inicialmente, o paciente pode defender o lado
saudável e o paciente o lado doente mas, com o decorrer da terapia, o paciente acaba
por assumir os dois papéis. Convencer-se, a um nível cognitivo, que os custos da
manutenção deste esquema é maior que os seus benefícios pode ajudar os pacientes
a reforçarem a convicção de que devem desafiar e lutar contra o esquema.
Considera-se que este esquema é, na maior parte das vezes, uma
internalização de um esquema de Punição de uma figura parental, pelo que o trabalho
experencial pode constituir-se como uma parte importante do tratamento. Assim, este
trabalho experiencial foca-se na externalização e no desafio do Modo Pai Punitivo. Em
imagerie, os pacientes imaginam essa figura parental a falar para eles de um modo
punitivo. Respondem então, dizendo “Não te vou ouvir mais. Não vou acreditar mais
em ti. Estás errado, e não és bom para mim.” Este trabalho imagético com o Pai
Punitivo constitui uma forma dos pacientes se distanciarem do esquema e o tornarem
menos egossintónico. Em vez de ouvirem a voz punitiva como a sua própria voz,
ouvem-na como a voz de uma figura parental.
O objectivo chave do trabalho comportamental, por outro lado, é a prática de
respostas mais piedosas, mais clementes, nas situações em que o paciente tem o
ímpeto de culpar os outros ou a ele próprio. Os pacientes podem começar por ensaiar
estes comportamentos em exercícios imagéticos ou em role-plays com o terapeuta,
dando-lhes depois continuidade sob a forma de tarefas para trabalho em casa.
O terapeuta usa ainda a relação terapêutica para modelar o perdão. A
“reparentização limitada” efectuada pelo terapeuta enfatiza a compaixão em vez da
punição. Por exemplo, se o paciente comete um erro ou se esquece de efectuar as
tarefas designadas para trabalho de casa, o terapeuta não pune, castiga ou censura o
paciente. Em vez disso, ajuda-o a evitar esse mesmo erro no futuro.

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Recursos bibliográficos utilizados

DSM-IV-TR

Apontamentos e material de apoio da disciplina de Terapias Cognitivo-


Comportamentais em Adultos I, Ano Lectivo 2003/2004, da responsabilidade do Prof.
Doutor José Augusto Pinto Gouveia e do Mestre Daniel Rijo

Apontamentos e material de apoio da disciplina de Terapias Cognitivas dos


Distúrbios de Personalidade, Ano Lectivo 2003/2004, da responsabilidade do Mestre
Daniel Rijo

Beck, A. T. (1967); Cognitive Therapy of Depression

Beck, A. T., Freeman, A. (1990); Cognitive Therapy of Personalities Disorders;


The Guilford Press: New York

Rijo, D., Galhardo, A. (1999)

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Rijo, D. (2000)

Young, J. E. (1990)

Young, J. E. (1999)

Young, J. E., Klosko, J., Weishaar, M. (2003); Schema Therapy: a Practitioner’s


Guide; The Guilford Press: New York

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Anexos

Esquema de Abandono/Instabilidade

Reconhecimento de Sentimentos actuais


No presente momento sinto-me angustiada (emoções) porque o meu marido
viajou para o Zimbabwé, por motivos profissionais (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
abandono/instabilidade que aprendi através de uma experiência de abandono, quando
o meu pai emigrou para o Congo (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que penso que o meu marido me
abandonará em favor de uma outra pessoa.

Teste da realidade
Apesar de acreditar que o meu marido me abandonará em favor de uma colega
de trabalho (pensamento negativo), a realidade é que po meu marido tem-me dado

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

força, suporte e protecção, independentemente das ausências por motivos


profissionais (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
situações em que o meu marido se ausentou, por diversos motivos, e me continuou a
fornecer suporte e apoio, sem que tivesse havido um prejuízo para a nossa relação.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja procurar impedir o meu marido de
viajar (comportamento negativo), vou, em vez disso, sentar-me no sofá a ver televisão
ou empreender uma outra actividade (comportamento alternativo).

Esquema de Desconfiança/Abuso

Reconhecimento de Sentimentos actuais


No presente momento sinto-me irritado (emoções) porque o meu colega de
trabalho se voluntariou junto de mim, para realizar uma tarefa que, originalmente, era
da minha responsabilidade (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
desconfiança/abuso que aprendi através de experiências repetidas de
abuso/humilhação na relação com os meus pais e com os colegas de escola (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que antecipo que as outras
pessoas me vão manipular, trair ou aproveitar-se de mim.

Teste da realidade

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Apesar de acreditar que o meu colega se voluntariou com o objectivo de me


prejudicar, não fazendo, propositadamente, a tarefa, com o intuito de denegrir a minha
imagem e reputação perante os meus superiores (pensamento negativo), a realidade é
que po meu colega pode ter-se voluntariado para me ajudar, por se ter apercebido que
estou com pouco tempo para realizar tudo aquilo que me foi pedido (explicação
alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
situações em que fui ajudado por outros, sem que a minha desconfiança se tenha
revelado fundada.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja não aceitar a ajuda oferecida pelo
meu colega, confrontando-o (comportamento negativo), vou, em vez disso, aceitar a
sua ajuda e agradecer-lhe a atenção prestada (comportamento alternativo).

Esquema de Privação Emocional

Reconhecimento de Sentimentos actuais


No presente momento sinto-me enraivecida (emoções) porque o meu marido
me deu pouca atenção e carinho depois de lhe ter contado um problema que me
sucedeu no trabalho (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
privação emocional que aprendi através de experiências repetidas em que os meus
pais se manifestaram emocionalmente distantes e frios para comigo (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que assumo que aqueles que me
são significativos não vão satisfazer as minhas necessidades.

Teste da realidade

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Apesar de acreditar que esta situação que demonstra que o meu marido não é
capaz de me dar toda a atenção, carinho e afecto que penso necessitar (pensamento
negativo), a realidade é que o meu marido podia, simplesmente, não se ter apercebido
que aquilo que se passou foi muito importante para mim (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
situações que demonstram que ele tem estado presente, dando-me suporte emocional
nos momentos em que mais preciso.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade irritar-me com ele por não me ter dado a
tenção e o carinho que desejava (comportamento negativo), vou, em vez disso, atentar
fazer-lhe ver aquilo que se passou, e agradecer-lhe por me ter ouvido (comportamento
alternativo).

Esquema de Defeito/Vergonha

Reconhecimento de Sentimentos actuais


No presente momento sinto-me ansiosa (emoções) porque comecei a corar
quando me confrontei com um grupo de colegas (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
defeito/vergonha que aprendi através de experiências repetidas em que me senti
inferior na relação com o meu pai, com a minha irmã e com os colegas de escola
(origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que diminuo as minhas
capacidades e competências nas situações em que interajo com outros.

Teste da realidade

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Apesar de acreditar que o facto de ter corado faz de mim uma pessoa imatura
e doente (pensamento negativo), a realidade é que tenho uma tendência natural para
corar facilmente e ficar um pouco mais vermelha é perfeitamente natural quando me
sinto mais ansiosa. (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
situações em que as minhas interacções sociais decorreram positivamente,
independentemente do facto de corar.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade evitar o contacto com pessoas que
conheço (comportamento negativo), vou, em vez disso, agir normalmente, sem
valorizar excessivamente o facto de corar quando lido com as demais pessoas
(comportamento alternativo).

Esquema de Isolamento Social

Reconhecimento de Sentimentos actuais


No presente momento sinto-me ansiosa (emoções) porque comecei a corar
quando me confrontei com um grupo de colegas (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
defeito/vergonha que aprendi através de experiências repetidas em que me senti
inferior na relação com o meu pai, com a minha irmã e com os colegas de escola
(origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que diminuo as minhas
capacidades e competências nas situações em que interajo com outros.

Teste da realidade

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Apesar de acreditar que o facto de ter corado faz de mim uma pessoa imatura
e doente (pensamento negativo), a realidade é que tenho uma tendência natural para
corar facilmente e ficar um pouco mais vermelha é perfeitamente natural quando me
sinto mais ansiosa. (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
situações em que as minhas interacções sociais decorreram positivamente,
independentemente do facto de corar.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade evitar o contacto com pessoas que
conheço (comportamento negativo), vou, em vez disso, agir normalmente, sem
valorizar excessivamente o facto de corar quando lido com as demais pessoas
(comportamento alternativo).

Esquema de Auto-Sacrifício

Reconhecimento de Sentimentos actuais


No presente momento sinto-me ansiosa (emoções) porque o Presidente do
Conselho Executivo me pediu para dar uma aula extra a uma aluna (situação
activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de auto-
-sacrifício que aprendi através de experiências no meu desenvolvimento em que
remeti para segundo plano as minhas vontades, em nome das responsabilidades que
sentia ser assim (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que subvalorizo as minhas
necessidades em favor das necessidades e interesses de outros.

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Teste da realidade
Apesar de acreditar que é meu dever e responsabilidade aceitar tudo o que ele
em pede profissionalmente (pensamento negativo), a realidade é que posso dizer não,
até porque a aluna em questão não é da minha responsabilidade (explicação
alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
situações em que não aceitei os pedidos dos outros, não tendo esse facto provocado
as consequências que antecipei ou abalado o meu valor enquanto pessoa.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja aceitar e dar a aula extra à aluna,
sobrecarregando-me (comportamento negativo), vou, em vez disso, recusar o pedido e
recomendar à aluna que frequente as aulas de compensação (comportamento
alternativo).

Esquema de Dependência/Incompetência

Reconhecimento de Sentimentos actuais


No presente momento sinto-me desesperado (emoções) porque não tenho
ninguém que me ajude a escolher a roupa que devo vestir, para ir tomar café com os
meus amigos (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
dependência/incompetência que aprendi através de experiências repetidas de
sobreprotecção dos meus pais que impediram o desenvolvimento das minhas
capacidades de tomada de decisão (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que penso necessitar das outras
pessoas ou em que penso ser incapaz de funcionar adequadamente sem a ajuda dos
demais.

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Teste da realidade
Apesar de acreditar que sou incapaz de decidir adequadamente aquilo que
devo vestir (pensamento negativo), a realidade é que já tomei, no passado, boas
decisões (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
situações em que não procurei a ajuda de outros e consegui decidir da melhor forma,
solucionando positivamente os meus problemas.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja telefonar a alguém, para me dizer o
que devo vestir (comportamento negativo), vou, em vez disso, escolher a roupa que
considero mais adequada para sair com os meu amigos (comportamento alternativo).

Esquema de Vulnerabilidade ao Mal e à Doença

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me ansioso (emoções) porque estou a viajar de carro
numa auto-estrada (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
vulnerabilidade ao mal e à doença que aprendi através de experiências repetidas com
pais muito protectores e preocupados com problemas de saúde (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que uma catástrofe possa ocorrer
inesperadamente e de que vou ser incapaz de a evitar.

Teste da realidade

Hospital Sobral Cid


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Apesar de acreditar que vou ser vítima de um choque em cadeia na auto-


estrada em que circulo (pensamento negativo), a realidade é que a probabilidade de
eu ter um choque em cadeia é diminuta (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
episódios em que temi a ocorrência de acontecimentos catastróficos e que estes não
aconteceram ou que, então, fui capaz de lidar adaptativamente com a sua ocorrência.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade a de sair da auto-estrada e parar
imediatamente o carro (comportamento negativo), vou, em vez disso, continuar a
conduzir de forma a chegar ao destino pretendido a tempo (comportamento
alternativo).

Esquema de Emaranhamento/Eu Sub-Desenvolvido

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me ansioso (emoções) porque arranjei uma namorada e
não contei aos meus pais (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
Emaranhamento/Eu Sub-Desenvolvido que aprendi através de experiências infantis
em que os meus desejos e vontades, assim como a sua satisfação, eram
determinados pelos meus pais (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que sub-avalio as minhas
capacidades para agir individualmente sem atender à perspectiva e pontos de vista
dos meus pais.

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Teste da realidade
Apesar de acreditar que é inadmissível da minha parte não partilhar este facto
com os meus pais (pensamento negativo), a realidade é que existem determinadas
coisas que posso guardar para mim, sem lhes contar (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
situações em que resolvi determinadas questões e tomei decisões sem atender à
perspectiva dos meus pais, sem que isso tivesse acarretado qualquer prejuízo.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja procurar, imediatamente, os meus
pais e contar-lhes que iniciei um relacionamento (comportamento negativo), vou, em
vez disso, guardar a “novidade” para mim e contar-lhes numa altura em que for mais
oportuno e em que a relação estiver mais consolidada (comportamento alternativo).

Esquema de Fracasso

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me desesperada (emoções) porque vou ter um exame
daqui a uma hora de estatística (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
fracasso que aprendi através de experiências repetidas com pais muito críticos, que
sistematicamente não valorizaram os resultados positivos que eu alcancei e o esforço
que despendi na sua obtenção (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que antecipo ser mal sucedido
nas tarefas que me disponibilizo a realizar.

Hospital Sobral Cid


118
Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Teste da realidade
Apesar de acreditar que vou ser incapaz de passar no exame (pensamento
negativo), a realidade é que já passei muitos exames em relação aos quais antecipava
fracassar (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
episódios em que fui bem sucedida na realização de diversas tarefas.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja faltar ao exame (comportamento
negativo), vou, em vez disso, fazer uma revisão da matéria e dirigir-me à faculdade
com o intuito de realizar o exame (comportamento alternativo).

Esquema de Grandiosidade

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me irritado (emoções) porque estou há meia hora no
restaurante à espera de mesa para me sentar (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
grandiosidade/limites indefinidos que aprendi através de experiências com os meus
pais que me possibilitaram o envolvimento em diferentes actividades sem atender aos
desejos e necessidades dos outros (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que me considero especial e em
que acredito que as pessoas devem satisfazer, sem questionar, os meus desejos e
necessidades emocionais.

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Teste da realidade
Apesar de acreditar que me deve ser cedida imediatamente uma mesa no
restaurante (pensamento negativo), a realidade é que não sou diferente das outras
pessoas e como tal mereço ser tratada de modo indiferenciado (explicação
alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
episódios em que o facto de estar centrado exclusivamente nos meus desejos e
necessidades me conduziu a conflitos a nível interpessoal e outros episódios em que
não exigi a satisfação das minhas necessidades e nos quais obtive, ainda assim,
níveis de gratificação satisfatórios.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja a de exigir a presença do
responsável pelo restaurante com o intuito de me ser cedida uma mesa imediatamente
(comportamento negativo), vou, em vez disso, aguardar pela minha vez
(comportamento alternativo).

Esquema de Auto-Controlo/Auto-Disciplina Insuficientes

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me ansioso (emoções) porque tenho um exame daqui a
uma semana e não consigo suportar o desconforto de estar a estudar (situação
activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de auto-
controlo/auto-disciplina insuficientes que aprendi através de experiências em que não
fui adequadamente disciplinado por parte dos meus pais e da inexistência de
situações em que aprendesse a valorizar os objectivos a longo prazo em detrimento
de gratificações imediatas (origem).

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Este esquema leva-me a exagerar o grau em que me considero incapaz de


alcançar objectivos cuja obtenção passa necessariamente pela tolerância de níveis
moderados de desconforto.

Teste da realidade
Apesar de acreditar que vou ser incapaz de tolerar níveis moderados de
desconforto (pensamento negativo), a realidade é que, embora desagradável, a
vivência do desconforto não me impossibilita de completar com sucesso a actividade
em que me envolvo (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
episódios em que tive que suportar algum desconforto para alcançar objectivos a
longo prazo, fui capaz de o fazer e acabei por obter níveis mais elevados de
gratificação.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja ir ver televisão, evitando o
desconforto decorrente do facto de estar a estudar (comportamento negativo), vou, em
vez disso, continuar a estudar, fazendo o melhor que consiga (comportamento
alternativo).

Esquema de Subjugação

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me ansiosa (emoções) porque discordei da opinião de
um dos meus amigos que julgo não ser a mais correcta em relação ao tema que
estávamos a discutir (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
subjugação que aprendi através de experiências infantis nas quais, de forma
sistemática, as necessidades dos meus pais eram mais importantes, em detrimento
das minhas necessidades, interesses e desejos que eram relegados para segundo
plano (origem).

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Este esquema leva-me a exagerar o grau em que antecipo poder ser punida ou
abandonada se expressar os meus desejos, interesses e necessidades, em detrimento
das necessidades dos outros.

Teste da realidade
Apesar de acreditar que vou ser punida ou abandonada se expressar aquilo
que penso (pensamento negativo), a realidade é que os meus amigos contra-
argumentam algumas das minhas opiniões, sem que isso signifique que eu deixe de
gostar deles e os abandona ou puna (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
alguns episódios em que manifestei os meus desejos, necessidades e interesses e
esforcei-me no sentido de os satisfazer, sem que tenha sido punido ou abandonado.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja a de dizer ao meu amigo que eu
estava errado e que a opinião dele é a mais correcta (comportamento negativo), vou,
em vez disso, apresentar-lhe os motivos pelos quais discordo da opinião dele
(comportamento alternativo).

Esquema de Procura de Reconhecimento/Aprovação

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me ansioso (emoções) porque estou numa discussão
com alguns amigos, tenho vontade de dar a minha opinião mas tenho medo que eles
não concordem com ela (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
procura de aprovação/reconhecimento que aprendi através da interacção que tive com
os meus pais que se preocupavam muito em ser bem vistos por todos, em agradar a
toda a gente, dando muita importância aquilo que diziam e davam a mostrar aos
outros (origem).

Hospital Sobral Cid


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Este esquema leva-me a exagerar o grau em que sinto necessidade de ser


aceite e apreciado.

Teste da realidade
Apesar de acreditar que estes amigos me vão rejeitar se eu der a minha
opinião e eles não gostarem (pensamento negativo), a realidade é que se eles não
gostassem de mim e da minha visão sobre este assunto não estavam aqui a discutir
esta questão comigo e não pediam a minha opinião (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
várias discussões que tive em que dei a minha opinião, eles não concordaram mas
continuaram a dar-se bem comigo e a pedir a minha opinião.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja ficar calado (comportamento
negativo), vou, em vez disso, dar a minha opinião e defende-la mesmo que eles não
concordem com esta (comportamento alternativo).

Esquema de Negativismo/Vulnerabilidade ao Erro

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me ansiosa (emoções) porque o meu pai vai ser operado
amanhã e sei que vai correr mal (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
negativismo/vulnerabilidade ao erro que aprendi devido ao facto de ter experienciado
um conjunto de experiências bastante negativas e adversas na minha infância
(origem).

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Este esquema leva-me a exagerar o grau em que acredito que algo de mal,
muitas vezes o pior, vai acontecer. Não tenho grande esperança no futuro, se algo
pode correr mal então vai mesmo correr mal.

Teste da realidade
Apesar de acreditar que a operação do meu pai vai correr mal amanhã
(pensamento negativo), a realidade é que a operação não é nada complicada e vai ser
levada a cabo por um bom cirurgião (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
várias situações em que temi que acontecesse o pior e isso não se veio a verificar.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja ligar aos familiares a pedir para
virem ver o meu pai antes que seja tarde de mais (comportamento negativo), vou, em
vez disso, aguardar calmamente pela operação e telefonar depois aos familiares a
dizer que o meu pai está internado e que se quiserem, podem vir fazer-lhe uma
visitinha (comportamento alternativo).

Esquema de Controlo Excessivo/Inibição Emocional

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me ansioso (emoções) porque reencontrei um amigo que
já não via há muito tempo, e demonstrei alegria junto dele (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
controlo excessivo/inibição emocional que aprendi através de experiências infantis em
que fui humilhado ou ridicularizado por ter expressado as minhas emoções e desejos
de forma espontânea (origem).

Hospital Sobral Cid


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Este esquema leva-me a exagerar o grau em que me sinto desconfortável ao


expressar as minhas emoções, assim como o grau em que temo sofrer consequências
negativas em função desse facto.

Teste da realidade
Apesar de acreditar que o meu amigo, por exemplo, me poderá ridicularizar
(pensamento negativo), a realidade é que o meu amigo terá ficado contente por me
ver, além de que na minha reacção foi perfeitamente normal (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
alguns episódios em que expressei de forma espontânea e sentida as minhas
emoções sem que tenha sido ridicularizado por isso.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja procurar o meu amigo para perceber
se aquilo que eu previ é correcto (comportamento negativo), vou, em vez disso,
prosseguir a minha vida normalmente, sem fazer esforços adicionais para o procurar
(comportamento alternativo).

Esquema de Padrões Excessivos/Hipercriticismo

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me ansioso (emoções) porque considero que o trabalho
por mim elaborado não está suficientemente bom, ainda que lhe tenha dedicado vários
dias para a sua realização (situação activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
padrões excessivos/hipercriticismo que aprendi através de experiências repetidas com
pais muito exigentes e críticos, que sistematicamente subavaliavam o meu

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

desempenho e me confrontaram, desde cedo, com regras de funcionamento


excessivamente elevadas em relação a domínios diversos (origem).
Este esquema leva-me a exagerar o grau em que subavalio a qualidade do
trabalho e a auto impor-me patamares sucessivamente superiores de realização.

Teste da realidade
Apesar de acreditar que o meu trabalho não está suficientemente bem
elaborado (pensamento negativo), a realidade é que posso obter resultados
satisfatórios com níveis de exigência inferiores (explicação alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
alturas em que o meu desempenho foi médio e que, independentemente disto, não
sofri consequências negativas.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja a de reformular o meu trabalho com
o intuito de o tornar melhor (comportamento negativo), vou, em vez disso, entregar o
trabalho tal qual como está e esperar a sua apreciação (comportamento alternativo).

Esquema de Punição

Reconhecimento de Sentimentos actuais


Neste momento sinto-me irritado (emoções) porque um colega cometeu um
erro, na realização de um relatório, e não foi castigado por isso pelo patrão (situação
activadora).

Identificação do Esquema
No entanto, eu sei que isto se deve provavelmente ao meu esquema de
punição que aprendi através de experiências infantis em que era sistematicamente
castigado por todos os erros que cometia, pelos meus pais (origem).

Hospital Sobral Cid


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Este esquema leva-me a exagerar o grau em que mas outras pessoas devem
ser punidas, independentemente das circunstâncias que rodearam um determinado
erro.

Teste da realidade
Apesar de acreditar que o meu colega deve ser castigado exemplarmente
(pensamento negativo), a realidade é que o meu colega poderá ter cometido o erro
inadvertidamente ou não ser capaz de realizar a tarefa de outra forma (explicação
alternativa).
Ao longo da minha vida, as provas que apoiam a visão mais saudável incluem
situações em que procurei compreender os erros, contextualizando todos os factores
que os rodearam, sem atender à variável da punição, e sem que isso tenha constituído
um problema.

Instrução comportamental
Portanto, ainda que a minha vontade seja procurar o meu patrão para que este
tome conhecimento da situação e aja em conformidade (comportamento negativo),
vou, em vez disso, procurar o meu colega, incentivando-o a corrigir o erro que
cometeu na feitura do referido relatório (comportamento alternativo).

Conceptualização resumida dos Esquemas Precoces Mal-Adaptativos, segundo


Jeffrey E. Young (2003)

Inicialmente Jeffrey E. Young postulou a existência de 16 Esquemas Precoces


Mal-Adaptativos tendo, após sucessivas re-conceptualizações, chegado a um Modelo
de 18 EPMs, agrupados em cinco domínios gerais, cada um dos quais relacionado
com uma necessidade nuclear da infância (Young, 1998 in Rijo, 2000).

Distanciamento e Rejeição

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Expectativa de que as nossas necessidades de segurança, estabilidade, apoio,


cuidados, empatia, partilha de sentimentos, aceitação e respeito não serão satisfeitas
de maneira previsível.

1. Abandono/Instabilidade
Diz respeito à percepção de instabilidade ou de indisponibilidade das pessoas
que poderiam ser fonte de suporte e de ligação/afiliação. Envolve a sensação de que
os outros significativos não conseguirão continuar a fornecer suporte emocional,
afiliação, força e protecção, devido ao facto de serem emocionalmente instáveis e
imprevisíveis, a não se poder contar com eles ou a não estarem presentes quando
precisamos deles, porque podem morrer a qualquer momento ou porque podem
abandonar o indivíduo em favor de alguém melhor.

2. Desconfiança/Abuso
Expectativa de que os outros irão magoar-nos, abusar de nós, humilhar-nos,
trair-nos, mentir-nos, manipular-nos ou aproveitar-se de nós. Habitualmente, envolve a
percepção de que o mal é intencional ou resultado de uma negligência extrema e
intencionada. Pode incluir a sensação de que acabará sempre por se ser traído ou de
que se sairá sempre a perder.

3. Privação Emocional
Expectativa de que os outros não satisfarão adequadamente o nosso desejo de
termos um grau normal de suporte emocional. Os três principais tipos de privação são:
A. Privação de Apoio e Cuidados: ausência de atenção, afecto, carinho
ou companheirismo;
B. Privação de Empatia: ausência e de compreensão, escuta, abertura
ou partilha mútua de sentimentos por parte dos outros;
C. Privação de Protecção: ausência de força, direcção e orientação por
parte dos outros.

4. Defeito/Vergonha
Sentimento de que se é “um defeito”, mau, indesejado, inferior ou sem valor
quando se trata de coisas importantes; ou de que não se seria amado por outros
significativos se se expusesse. Pode envolver uma hipersensibilidade à crítica, à
rejeição e à culpa; consciência de si, comparações e insegurança quando se está
perto dos outros; ou uma sensação de vergonha relativamente aos defeitos
percepcionados. Estes defeitos podem ser privados (egoísmo, impulsos agressivos,

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

desejos sexuais inaceitáveis,…) ou públicos (aparência física indesejável, inaptidão


psicomotora,…).

5. Isolamento Social/Alienação
Sentimento de que se está isolado do resto do mundo, de que se é diferente
das outras pessoas, de que não se faz parte de qualquer grupo ou comunidade.

Autonomia e Desempenho Deteriorados


Expectativa sobre si mesmo e sobre o ambiente que interferem com a
percepção das próprias aptidões para se “separar”, sobreviver, funcionar
independentemente e actuar com sucesso.

6. Dependência/Incompetência
Crença de que se é incapaz de exercer as responsabilidades quotidianas de
uma forma competente, sem a ajuda considerável dos demais, como por exemplo
tomar conta de si próprio, resolver os problemas diários, fazer bons julgamentos,
realizar novas tarefas, tomar boas decisões). Frequentemente toma a forma de
desespero.

7. Vulnerabilidade ao Mal e à Doença (Acontecimentos Aleatórios)


Medo exagerado que a catástrofe ocasional possa atacar a qualquer altura e
que se vai ser incapaz de a evitar. Os medos focam-se num ou mais dos seguintes
aspectos:
A. Médicos, como um ataque cardíaco ou contrair o vírus da SIDA;
B. Emocionais, como enlouquecer;
C. Naturais/Fóbicos, como elevadores, crimes, aviões ou tremores de
terra.

8. Emaranhamento/Eu sub-desenvolvido
Envolvimento emocional excessivo e proximidade com um ou vários outros
significativos (muitas vezes os pais), comprometendo uma individualização completa
ou um desenvolvimento social normal. Muitas vezes envolve a crença de que pelo
menos um dos indivíduos emaranhados não pode sobreviver ou ser feliz sem o
constante apoio dos outros. Pode também incluir sentimentos de se ser sufocado por,
ou “fundido” com outros ou identidade individual insuficiente. Frequentemente é

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

experimentado como um sentimento de vazio e desorientação, não tendo qualquer


direcção ou, em casos extremos, questionando a sua própria existência.

9. Fracasso
Crença de que se fracassou, se irá inevitavelmente falhar ou se é
fundamentalmente inadequado face aos seus pares, em áreas de realização pessoal
(escola, carreira, desporto,…). Várias vezes envolve a crença de que se é estúpido,
inapto, sem talento, ignorante, de baixo estatuto, inferior em relação aos demais,…

Limites Deteriorados
Deficiência nos limites internos, responsabilidade para com os outros ou
orientação/objectivos a longo prazo. Conduz a dificuldades respeitantes aos direitos
dos outros, cooperação com os outros, assumir compromissos ou estabelecer e
alcançar objectivos pessoais irrealistas.

10. Limites Indefinidos/Grandiosidade


Crença de que se é superior aos outros, com direito a privilégios especiais ou
não subjugado às regras de reciprocidade que caracterizam a interacção social
normal. Frequentemente envolve a insistência de que se deve ser capaz de fazer ou
de ter aquilo que se quer, independentemente daquilo que é realista, do que os outros
consideram razoável ou do que custa aos outros ou um enfoque exagerado na
superioridade de maneira a atingir poder ou controlo (e não, primariamente, para obter
atenção ou aprovação). Às vezes, inclui uma excessiva competitividade para com, ou
dominação dos outros: afirmando o seu próprio poder ou impondo o seu próprio ponto
de vista ou controlando o comportamento dos outros de acordo com os seus próprios
desejos, sem empatia ou preocupação para com as necessidades ou sentimentos dos
outros.

11. Auto-Disciplina e Auto-Controlo Insuficientes


Dificuldade intensa ou recusa em exercer um auto-controlo e tolerância à
frustração suficientes para atingir os seus objectivos pessoais ou para refrear a
expressão excessiva das suas próprias emoções e impulsos. Na sua forma branda, o
paciente apresenta-se com uma ênfase exagerada no desconforto-evitamento,
comprometendo a auto-realização pessoal, empenho ou integridade.

Hospital Sobral Cid


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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

Influência dos Outros


Enfoque excessivo nos desejos, sentimentos e respostas dos outros,
comprometendo as suas próprias necessidades – de forma a ganhar o amor e
aprovação, manter o seu próprio sentido de ligação ou evitar retaliação. Envolve
muitas vezes a supressão ou falta de “consciência” no que diz respeito à sua própria
cólera e inclinações naturais.

12. Subjugação
Excessiva rendição de controlo aos outros porque se sente coagido – normal
mente para evitar encolerização, retaliação ou abandono. As duas principais formas de
subjugação são:
A. Subjugação de necessidades: supressão das suas próprias
preferências, decisões e desejos;
B. Subjugação de emoções: supressão da expressão emocional,
especialmente a raiva.
Envolve normalmente a percepção de que os seus próprios desejos, pontos de
vista ou sentimentos não são válidos ou importantes para os outros. Comummente
apresenta-se como uma excessiva concordância, combinada com hipersensibilidade a
sentir-se encurralado.

13. Auto-Sacrifício
Enfoque excessivo na satisfação voluntária das necessidades dos outros nas
situações do quotidiano, comprometendo a sua própria gratificação. As razões mais
comuns são para evitar causar dor aos outros, para evitar a culpa de se sentir egoísta
ou para manter a ligação com outros, a qual é vista como necessária e inquestionável.
Várias vezes resulta de uma sensibilidade aguda á dor dos outros. Por vezes, leva a
um sentimento de que as suas próprias necessidades não estão a ser adequadamente
satisfeitas e ao ressentimento para com aqueles de quem cuidamos.

14. Procura de Aprovação/Procura de Reconhecimento


Ênfase excessiva na obtenção de aprovação, reconhecimento ou atenção por
parte dos outros ou de adaptação, comprometendo o desenvolvimento de um sentido
do eu verdadeiro e seguro. O sentido de estima do indivíduo depende, primariamente,
mais das reacções dos outros do que das suas inclinações naturais. Por vezes, inclui
uma ênfase excessiva no estatuto, aparência, aceitação social, dinheiro ou realização,
como forma de obter aprovação, admiração ou atenção (não, primariamente, por

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

poder ou controlo). Resulta frequentemente em importantes decisões da vida que não


são autênticas ou em hipersensibilidade à rejeição.

Sobrevigilância e Inibição
Ênfase excessiva no controlo dos seus sentimentos espontâneos, impulsos e
escolhas de modo a evitar cometer erros ou em cumprir regras e expectativas rígidas
e interiorizadas acerca do desempenho e do comportamento ético, muitas vezes
comprometendo a felicidade, auto-expressão, relaxamento, relações de proximidade
ou a saúde.

15. Negativismo/Vulnerabilidade ao Erro (Acontecimentos Controláveis)


Um enfoque intenso e duradouro nos aspectos negativos da vida (dor, morte,
perda, decepção, traição, coisas que podem correr mal,…), enquanto se minimiza ou
negligencia os aspectos positivos e optimistas ou uma expectativa exagerada de que
as coisas irão correr mal, numa larga variedade de situações de trabalho, financeiras
ou interpessoais que são, tipicamente, vistas como “controláveis”, ou de que os
aspectos de vida da pessoa que parecem estar a correr bem irão desabar a qualquer
altura. Normalmente, envolve um medo irregular de cometer erros que possam levar a
um colapso financeiro, perda, humilhação, ficar atrapalhado numa situação má ou
perda de controlo. Dado que os resultados negativos potenciais são exagerados, estes
pacientes caracterizam-se por preocupação, vigilância, pessimismo ou indecisão
crónicos.

16. Controlo Excessivo/Inibição Emocional


Inibição excessiva da acção espontânea, sentimentos ou comunicação,
normalmente para criar um sentido de segurança e de predictabilidade, ou para evitar
cometer erros, ser desaprovado pelos outros, catástrofe e caos ou perder o controlo
dos seus impulsos:
A. Inibição da raiva ou agressão:
B. Ordenamento e planeamento excessivos;
C. Ênfase na racionalidade, se atender às necessidades emocionais.

17. Padrões excessivos/hipercriticismo


A crença subjacente é a de que a pessoa deve esforçar-se para atingir padrões
internalizados de comportamento e desempenho muito elevados, habitualmente para
evitar críticas. Normalmente resulta em sentimentos de pressão ou dificuldade em

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Uma Leitura Esquemática da Psicopatologia: os EPMs de Jeffrey Young

abrandar, e no hipercriticismo para consigo próprios e para como os outros. Tem que
envolver uma deterioração significativa em: actividades de prazer, relaxamento, saúde
ou relacionamentos satisfatórias.
Os padrões rígidos/Excessivos apresentam-se como:
A. Perfeccionismo, uma desordenada e excessiva atenção ao detalhe
ou uma subestimada noção do quão bom é um dado desempenho, em comparação
com a média.
B. Regras rígidas e deveres em muitas áreas da vida, incluindo uma
moral, ética, cultural ou preceitos religiosos irrealisticamente elevados.
C. Preocupação com tempo e eficiência, para que se consiga atingir
mais e melhor.

18. Punição
Crença de que as pessoas deveriam ser severamente punidas pelos erros que
cometem. Envolve a tendência para se ser agressivo, intolerante, punitivo e
impaciente para com as pessoas (incluindo ele próprio) que não se enquadram nas
suas próprias expectativas ou padrões. Normalmente inclui a dificuldade em desculpar
os erros a si próprio e aos outros, dada a relutância em considerar circunstâncias
atenuantes, em aceitar a imperfeição da espécie humana ou em empatizar com
sentimentos.

Estágio em Psicologia Clínica Cognitivo-Comportamental


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