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2016/17

FACULDADE DE PSICOLOGIA E CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO


UNIVERSIDADE DE COIMBRA

Inês Rodrigues

[ AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA I ]

1ª FREQUÊNCIA

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1ª FREQUÊNCIA

A Avaliação Psicológica é uma atividade que distingue os psicólogos de outros especialistas.


Pode também ser considerada uma área de especialização, no entanto, o foco central está no facto de
que é esta que permite autonomia profissional aos psicólogos. A Avaliação Psicológica é dotada de uma
singularidade técnico-científica e permite identificar aquilo em que cada sujeito é único e específico –
perspetiva individual da Avaliação Psicológica.

Definições de Avaliação Psicológica


→ Processo extremamente complexo de resolução de problemas (resposta a questões) que
utiliza vários procedimentos de recolha de dados (testes, entrevistas, análise funcional); os dados
obtidos a partir destes métodos são integrados na produção e confirmação de hipóteses acerca do
sujeito e do seu problema (Maloney & Ward, 1976, p. 5).
→ Processo variável que depende da questão colocada, das pessoas envolvidas, compromissos
temporais e de um número infinito de factores. Como tal, não pode ser reduzido a um conjunto
finito de regras específicas, de etapas (Maloney & Ward, 1976, p. 5) ou de “instrumentos” (Tallent,
1992, p. 4).
→ Processo através do qual uma pessoa tenta conhecer, compreender ou formar um juízo ou uma
opinião acerca de uma outra pessoa (McReynolds, 1975, p. iv).
→ Procedimento para fazer aprendizagens acerca das pessoas (...), para medir atributos
psicológicos (...), ou para obter amostras do comportamento psicológico (Kleinmuntz, 1982, p.
6).
→ Estudo descritivo, compreensivo e explicativo (em função do caso) do comportamento dos
sujeitos e dos grupos humanos (Avila-Espada, 1992, p. 62).
→ Processo para compreender e ajudar as pessoas a lidar com os seus problemas (Walsh & Betz,
1994, p. 2).
→ Processo de desenvolvimento de representações, tomada de decisões e verificação de hipóteses
acerca do comportamento de outra pessoa em interação com o meio” (Sundberg, 1977, p. 12).
→ Processo ... orientado por princípios, teorias, e relações empiricamente estabelecidas entre
características da personalidade e variáveis teste (Tallent, 1992, p. 186).
→ Identificação das características distintivas de cada caso (Achenbach, 1985, p. 7).
→ Utilização clínica de testes psicológicos para facilitar a avaliação da personalidade (Weiner, 1983,
p. 451).
→ Campo da ciência do comportamento, interessada nos métodos de identificação de semelhanças
e diferenças entre as pessoas, relativamente às suas capacidades e outras características
psicológicas (Weiner, 2013, p. 3).

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→ Objetivos: Exploração e análise do comportamento (em níveis de complexidade considerados
apropriados) de um sujeito humano (ou grupo especificado de sujeitos), com objetivos práticos
(descrição, diagnóstico, seleção/predição, explicação, [aconselhamento] mudança e/ou
avaliação/estimativa da eficácia dos tratamentos ou intervenções aplicadas” (Fernández-
Ballesteros, 2011, p. 21) [programas, ambientes]
→ Implica um processo de resolução de problemas e tomada de decisão que começa com o pedido
de um cliente e/ou sujeito (ou grupo de sujeitos) a um psicólogo (Fernández-Ballesteros, 2011, p.
21).
→ Este processo implica uma série de atividades científicas e profissionais, realizadas numa
sequência estabelecida, com as quais se pretende dar resposta a esse pedido: administração de
testes e técnicas de medida e procedimentos de recolha de informação (Fernández-Ballesteros,
2011, p. 21).

Avaliação Psicológica como Medida


“Se algo existe, existe em determinada quantidade e, como tal, é possível determiná-la”
Segundo Thorndike, conhecer realmente algo implica conhecer a sua quantidade. Quanto
melhor se consegue medir, mais real será. Com medições, a verificação de um facto pode tornar-se mais
precisa. Quando as medições de duas pessoas coincidem sabemos que estamos a observar o mesmo
objeto/a mesma realidade objetiva. A medida pode não ser precisa, pelo menos no início, mas, se existe,
é possível medi-lo.

Objetivos
 Despistagem/rastreio de problemas:
o Descrição (identificação de atributos);
o Compreensão
 Verificação de hipóteses:
o Explicação
 Diagnostico
 Prognóstico
 Planificação de Intervenção
 Medida de eficácia da Intervenção
 Investigação

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Contextos
A avaliação psicológica pode ser aplicada em inúmeros contextos, tais como:
 Escolar, em que se usam instrumentos de avaliação e relatórios psicológicos; neste contexto
a Avaliação Psicológica permite:
o Orientação Vocacional;
o Aconselhamento Psicológico;
 Clinica/Saúde, que utiliza a avaliação neuropsicológica, instrumentos de avaliação e
relatórios de avaliação psicológica; pode ser útil na reabilitação de idosos
(psicogerontologia) e na reabilitação em geral;
 Forense/Justiça, através de avaliação psicológica e perícias forenses;
 Trabalho/Organizações, recorrendo à avaliação psicológica num contexto de gestão de
recursos humanos;
 Militar
 Tráfego
 Desporto

Fases do Processo
 Consentimento Informado/Entrevista
 Identificação (geral, específica, contextual) da natureza do problema/Entrevista
 Primeira formulação ou conceptualização do caso/Planificação da avaliação
 Aplicação de uma bateria flexível de instrumentos (testes, escalas, …)
 Cotação das provas empregues
 Formulação/conceptualização do caso
 [Elaboração do Relatório Psicológico]
 Entrevista de devolução de informação e/ou elaboração do Relatório Psicológico
 Plano de intervenção
 Monitorização/Avaliação da eficácia da intervenção

Competências de pensamento crítico


Competências básicas
♡ Escolha justificada de metodologias e instrumentos
♡ Descrição; observação; caracterização; sistematização; reconhecimento de conceitos e
quantificação da informação

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Competências de nível mais avançado
♡ Comparação de observações
♡ Aplicação de conceitos (como é que os resultados dos testes influenciam a avaliação)
♡ Análise (in/consistências dos dados)
♡ Ordenação (valorização diferenciada da informação)
♡ Classificação/formulação/raciocínio diagnóstico
♡ Produção de hipóteses

Competências complexas
(“ir para além do nível da compreensão atual”)
♡ Síntese de observações e resultados para construir explicações
♡ Inferência de generalizações
♡ Prognóstico de comportamento
♡ Comunicação dos resultados
♡ Formulação do concetual do caso

Conhecimentos e Saberes Pressupostos


 Psicometria
 Estatística
 Metodologia da Investigação
 Psicologia do desenvolvimento
 Psicologia cognitiva/processos cognitivos
 Teorias da Inteligência
 Teorias da Personalidade
 Psicopatologia
 Psicofísica
 Neuropsicologia
 Psicologia Clínica
 Psicologia da Saúde
 Psicologia Forense
 Modelos Psicoterapêuticos

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História da Avaliação Psicológica
Contributos de Alfred Binet para a Avaliação Psicológica

• 1895 – Alfred Binet e V. Henri redigem artigo sobre “Psicologia Individual”:


→ O objetivo da psicologia individual é o estudo dos diferentes processos psíquicos do
homem;
→ “A atenção deve estar centrada sobre as diferenças individuais nestes processos”.

A Psicologia Individual, no entanto, tinha três grandes problemas. Primeiramente, (1) o estudo
das diferenças individuais dos processos psíquicos era feito sem ter em conta o estudo especial das
relações com os indivíduos que os apresentam; (2) o estudo das diferenças psíquicas é feito nos
indivíduos isoladamente ou em grupos (homens, mulheres, profissões, ...); em último lugar, (3) o estudo
das relações dos diferentes processos psíquicos entre si são estudados num mesmo indivíduo.

A função principal do teste da psicologia individual seria determinar as diferenças mais fortes
e mais importantes entre as faculdades psíquicas de dois ou mais indivíduos. Ainda que com menor
precisão, a função discriminativa do teste é assegurada através do recurso a provas que examinam as
faculdades psíquicas superiores.

Binet e Henri propõem o estudo dos seguintes 10 processos psíquicos:


1. Memória;
2. Imagens mentais (natureza);
3. Imaginação;
4. Atenção;
5. Compreensão;
6. Sugestibilidade;
7. Sentimento estético;
8. Sentimentos morais;
9. Força muscular e força de vontade;
10. Habilidade e “vista de olhos” (coup d’oeil).

Regras do método de estudo destes processos [regras atuais do método dos testes]:
→ Métodos simples e não tomem muito tempo;
→ Meios de determinação independentes da pessoa do experimentador;
→ Possibilidade de comparar os resultados obtidos por um observador com os resultados obtidos
por outro observador [identificar conceitos e tendências atuais de/na avaliação psicológica].

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Condições para o desenvolvimento dos testes:
→ Que sejam “tão variados quanto possível de maneira a abarcar o maior número possível de
faculdades psíquicas”;
→ Relativos às faculdades psíquicas superiores;
→ De curta duração para o indivíduo (não mais de 1h30m);
→ Diversificados para não fatigar ou aborrecer o sujeito;
→ “Apropriados ao meio do sujeito”;
→ Sem “aparelhos complicados”, nem “instalação especial”.

• 1899 – Binet e Simon começam as primeiras entrevistas metódicas tendo em vista medir a
inteligência.

• 1903 – Alfred Binet publica “L’étude expérimentale de l’intelligence”


Preferência por observações mais pormenorizadas com amostras reduzidas do que por
observações vagas com amostras importantes. Reserva em relação às técnicas estatísticas que, segundo
Binet, sacrificam a exatidão e precisão às observações com grandes números e preferência por
observações objetivas e minuciosas, com sujeitos reais, em situações concretas. Estudos no laboratório
e fora do laboratório.

• 1904 – Ministério Francês da Instrução Pública nomeia comissão para “estudar o regime a
aplicar às crianças da escola que não beneficiam tanto como os colegas da instrução ministrada”.
Ministério pretendia o desenvolvimento de uma metodologia para identificar estas crianças, ou seja, as
crianças com mais dificuldades. Houve, então, um impulso inicial proporcionado pela Sociedade
Francesa para o Estudo da Criança que instou os ministros franceses a desenvolver um sistema de
classes especiais para alunos que fracassavam na sua resposta à escolaridade normal.

• 1905 – Binet e Simon apresentam uma “escala de diagnóstico do nível intelectual de


crianças normais e anormais”, no contexto da Comissão criada em 1904.

Escala de Binet e Simon (1905)


A escala de Binet e Simon foi a primeira escala de inteligência [50 anos depois dos trabalhos de
Esquirol e Seguin]. Foi apresentada, não como um método de medida, mas sobretudo como um
instrumento de experimentação e investigação. Esta seria uma escala constituída por 30 questões e
problemas, colocados numa ordem de dificuldade crescente. Os seus itens cobririam várias funções:
juízo, raciocínio, compreensão, …, funções sensoriais e percetivas. A sua administração era

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estandardizada, ou seja, as instruções e o formato de administração eram os mesmos para todas as
crianças.
Como amostra de estandardização foram testadas 50 crianças normais com idades
compreendidas entre os 3 e os 11 anos de idade. Foi adotado o desenvolvimento de normas com base
nas quais o desempenho de uma criança pudesse ser comparado com o desempenho de outras crianças.
Foram, ainda, testadas “algumas” crianças e adultos com atraso mental.

• 1908 – Binet e Simon editam a segunda escala de inteligência


Esta segunda escala seria constituída por mais itens (mais itens dariam origem a uma maior
fiabilidade/precisão): 62 itens repartidos em 14 níveis de idade (3 meses, 9 meses, 1 ano, 2 anos, 3
anos, 4 anos, 5 anos, 6 anos, 7 anos, 8 anos, 9 anos, 10 anos, 12 anos e 15 anos). Coincidiu com a criação
desta escala a invenção da noção de “idade mental” (IM), sendo que esta corresponde a uma
classificação hierárquica; comparando duas crianças, a mais inteligente é aquela que é mais bem
sucedida numa certa ordem [hierarquia] de provas [tarefas]” (Binet). Houve, igualmente, uma melhor
amostra de estandardização (300 crianças normais) comparativamente à primeira escala.

• 1911 – Terceira Escala de Inteligência de Binet e Simon [considerada uma revisão menor]
Esta terceira escala inclui novos testes e provas para a idade adulta, bem como uma técnica
clirificada de notação de idade mental e das qualificações de “inteligência regular”, “inteligência
avançada” e “atraso de inteligência”. Binet morre após a “criação” desta escala.

Primeira regra de notação: Atribuir a uma criança uma inteligência correspondente à idade em
que esta realiza todas as tarefas. Uma criança que realiza todos os testes da idade de 7 anos será
considerada como tendo, pelo menos, uma inteligência de 7 anos (idade intelectual de base). Será
acrescentado um ano de inteligência por cada 5 testes superiores à idade de base. Foram fixadas
outras convenções de medida para os sucessos complementares em relação às idades base de 10, 12 e
15 anos.
Esta nova escala e os seus princípios de notação permitem dar um sentido métrico às noções de:
o Idiotia (adulto de nível inferior a 3 anos);
o Imbecilidade (adulto de nível compreendido entre 3 e 7 anos);
o Debilidade (adulto de nível compreendido entre 7 e 10 anos).

• 1912 – O legado de Binet nos Estados-Unidos: Revisão Kuhlmann-Binet (extensão da escala


de Binet para um nível etário mais baixo – 3 meses de idade).

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• 1916 – O legado de Binet: O psicólogo americano Lewis Madison Terman (1877-1956) e
colegas da Universidade de Stanford publicam uma adaptação revista da Escala Binet-Simon para uso
nos Estados-Unidos. Esta adaptação aumenta o número de provas e utiliza o quociente de Stern. Foi
testada em 2000 sujeitos (incluindo 400 adultos), sendo considerada uma prova psicometricamente
mais sólida. Proporcionou a introdução do termo QI que seria calculado através da fórmula:
Idade Mental
QI =
Idade Cronológica

Heurísticas, Enviesamentos Cognitivos e Erros Inferenciais no Processo de Avaliação


Psicológica
Formulação de juízos e tomadas de decisão (rotina central e pré-requisito para uma prática
rigorosa e eficaz):
o Natureza do problema, causas, gravidade e significado dos sintomas)
o Diagnóstico/Prognóstico
o Interlocutores
o Constructos/Variáveis a examinar
o Instrumentos/metodologias de avaliação (questões psicométricas)
Podemos obter três tipos de cenário: (1) informação consistente versus expectativas
inflexíveis/rígidas; (2) acumulação de informação versus confiança excessiva; (3) investigações,
publicações, acumulação de conhecimentos versus domínio eficaz da informação.
Em atividades e no processo de Avaliação Psicológica, os psicólogos desenvolvem e mantêm um
repertório de estratégias de raciocínio, processamento/elaboração de informação – heurísticas,
esquemas de conhecimento, representações cognitivas. Tais estratégias permitem “filtrar”, simplificar e
organizar a informação e elaborar as apreciações e inferências que vão servir de suporte aos processos
de avaliação, diagnóstico, intervenção, etc. Estas estratégias orientam, portanto, os processos de
formulação de juízos e tomada de decisão. Tais estratégias são, ainda, usadas inconscientemente.
Os processos de julgamento/formulação de juízos e tomada de decisão são frequentemente e,
muitas vezes, inevitavelmente, elaborados em condições de incerteza e de valor problemático na medida
em que as referidas estratégias de raciocínio podem conduzir a enviesamentos cognitivos e a erros.

Heurísticas
As heurísticas são estratégias de simplificação e redução da complexidade da informação;
regras, princípios organizadores, estratégias de julgamento inferencial e de descoberta. Estas ajudam-
nos a organizar e simplificar a informação disponível a formular inferências e a predizer, tendo por base

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informação escassa e/ou pouco fiável. As heurísticas são, também, suscetíveis de enviesar ou distorcer
o julgamento e de conduzir a erros.

Enviesamentos Cognitivos
O enviesamento cognitivo decorre de erros sistemáticos, ou seja, cria-se uma tendência para o
julgamento se desviar invariavelmente de uma norma ou critério aceite de validade. Há uma
preferência subjetivamente fundamentada por uma dada conclusão ou inferência em detrimento de
conclusões alternativas possíveis. Podem, ainda, funcionar como tendências para distorcer (isto é,
processos ou estratégias cognitivas subjacentes aos erros inferenciais cometidos devido ao uso
incorreto da informação disponível).

Erro
É definido a partir da existência de consequências indesejadas, inconsistência entre uma
hipótese, conclusão ou inferência. Pode, igualmente, ser uma crença não comprovada ou contradição
com aquilo que é prescrito por um modelo de desempenho optimal. Os erros inferenciais sistemáticos
podem corresponder a uma utilização excessiva de certas estratégias inferenciais, intuitivas e
geralmente válidas, ou a um recurso diminuto de estratégias formais, lógicas ou estatísticas.
Os erros ocorrem:
→ Porque as estratégias não são adequadas aos problemas
→ Porque a complexidade de informação excede a capacidade cognitiva do avaliador
→ Devido a “deficits de competência inferencial” ou a “lapsos de desempenho inferencial”
(não utilização de conhecimentos disponíveis)

Enviesamentos Confirmatórios
Tendência geral para codificar, processar e recuperar a informação que é consistente com um
processo – reter informação que confirma as hipóteses iniciais e resistência a novas evidências. Os
enviesamentos confirmatórios são associados a um trabalho quase instantâneo de elaboração inicial de
concetualizações ou categorizações acerca do sujeito tendo por base uma quantidade mínima de
informação. Nos enviesamentos confirmatórios, as primeiras impressões são prevalecentes (primeira
entrevista, primeiras quatro horas de terapia, primeiros 30 segundos de entrevistas filmadas, etc.).

Correlações Ilusórias
São interpretações ou atribuições de correlação, ou mesmo de causalidade, entre duas classes
de acontecimentos que não estão correlacionados. São baseadas em simples associações de ideias,
semelhantes ao senso comum, sem suporte empírico ou teoria credível. É um processo mais
pronunciado quando há mais informação a ser objeto de tratamento.

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Heurística da Disponibilidade
A heurística da disponibilidade acontece quando as inferências formuladas acerca da frequência
ou probabilidade de um acontecimento/resultado são excessivamente influenciadas por outros fatores,
como a recordação seletiva de acontecimentos anteriores, facilidade de evocação/acesso cognitivo.
Exemplo: Valorizar uma experiência isolada em detrimento de dados empíricos da pesquisa;
valorização de um acontecimento intenso, mas não representativo.
Quanto mais ambíguos os dados, mais as descrições são influenciadas por ideias pré concebidas
que estão mais facilmente disponíveis.

Erro Atribucional Fundamental


Tendência para esquecer ou subestimar a influência de variáveis situacionais na determinação
do comportamento do sujeito (ou as interações com o meio) e para valorizar excessivamente
determinantes internos do comportamento ou características pessoais.

Heurística da Representatividade
Apreciações relativas à probabilidade de determinada pessoa pertencer a uma determinada
classe ou a determinado acontecimento poder ser prognosticado a partir de determinada sequência de
antecedentes.
Exemplos: Considerar o desempenho de uma pessoa em dada situação/momento como sendo
representativo do seu comportamento geral ou do seu estado de funcionamento futuro.
o Recurso a um único instrumento ou interlocutor
o Diagnóstico de depressão
o Avaliação da inteligência
o Diagnóstico de hiperatividade
o Insensibilidade ao tamanho das amostras (amostra versus população)
o Importância de dados normativos, linha base do problema

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Heurística do Caráter Único
A heurística de caráter único exagera a confiança no caráter único e singular dos casos
individuais (“nós não lidamos com grupos, mas sim com casos únicos”), negligenciando, assim, os dados
relativos às distribuições, aos elementos comuns. Neste contexto, um erro é a ideia de que as
probabilidades e normas não se aplicam, também, à avaliação de casos singulares.

Enviesamento da Previsão a posteriori


Tendência para assumir, depois do conhecimento de um acontecimento ou dos seus resultados,
que estes são inevitáveis e poderiam ter sido facilmente prognosticados. É considerado um erro
construir um caso clínico a posteriori. Deste modo, é necessário pesquisar argumentos a favor e contra
uma determinada formulação do caso em questão.

Efeito da Regressão Estatística para a Média


Tendência para desempenhos ou acontecimentos extremos serem seguidos por outros menos
extremos, por exemplo, entrevistas (exagero de sintomas), escalas de avaliação, psicoterapia, etc.

Soluções
 Ter conhecimentos e consciência da ação das heurísticas, enviesamentos e erros, ainda que, por
si só, esta familiaridade com as fontes de erro não seja suficiente;
 Treino, formação e experiência profissional;
 Oportunidades para observar; exposição direta e prática a situações concretas; partilhar, em
voz alta, os processos de análise/decisão;
 Monitorização da prática de uma forma sistemática (colocar questões, discutir argumentos);
 O juízo clínico não deve, apenas, depender da intuição;
 Não basta a “capacidade/conhecimentos/competência”, é também necessária a performance;
 Diminuir a “confiança” na memória (registar, consultar registos, dados, informações, etc);
 Prestar atenção a causas de natureza contextual/ambiental;
 Maior prudência na formulação de juízos definitivos acerca da pessoa e do(s) seu(s)
problema(s);
 “O que é que necessito de saber?”;
 “Qual a exatidão dos relatos do cliente?”;
 “Que informação falta?”;
 “Hipóteses explicativas alternativas?” “Que dados são necessários para falsificar as minhas
hipóteses iniciais?” “Os dados podem ser explicados de outro modo?”;
 “Como conseguir fazer a decomposição do problema?”;
 Algoritmos, folhas de balanço, diagramas e gráficos, árvores de decisão.

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Entrevista(s) de Avaliação Psicológica
Comunicar corresponde a vários objetivos, como trocar informações, estabelecer relações,
“saber o que não se sabia antes”. Por definição, a entrevista é uma forma de comunicação e troca verbal
numa situação de face a face, orientada para a procura de informação relevante. Geralmente constitui o
primeiro momento de contacto com o sujeito (e pessoas significativas) e o caso. É o primeiro passo no
processo de avaliação e de formulação de hipóteses acerca dos problemas comunicados e identificados.

Objetivos
O objetivo geral de uma entrevista é o desenvolvimento de hipóteses testáveis acerca dos
fatores que contribuem para os atuais problemas do sujeito e que podem ser relevantes para a
posterior planificação da intervenção.

Objetivos Intermédios:
 Facultar informação acerca dos problemas subjacentes ao pedido de consulta/avaliação:
funcionamento psicológico do sujeito, identificação do modo como os problemas o afetam
(ex.: nas relações familiares, sociais, profissionais/escolares, etc.);
 Obter consentimento informado e estabelecer a relação necessária e positiva entre avaliador,
sujeito e outros interlocutores;
 Delimitar e explicar as fases posteriores da avaliação (processo de avaliação, enquadramento
temporal, assegurar confidencialidade, custos/pagamento, por exemplo);
 Solicitar autorização para o envolvimento de outros interlocutores (professores, familiares,
colegas, etc.);
 A informação obtida a partir da(s) entrevista(s) permite a escolha de medidas e de
instrumentos de avaliação adicionais;
 Identificar preocupações, expetativas, objetivos, perceções e sentimentos acerca do problema;
 Precisar áreas “fontes” e áreas “de dificuldade” do sujeito;
 Motivação e recursos existentes para a modificação da situação;
 Informação relevante para a identificação e análise funcional dos comportamentos-alvo
(fatores que os suscitam e mantêm);
 Informação relevante para a planificação e avaliação da intervenção;
 Restituição de informação/entrevista de restituição de informação;
 Usualmente, as entrevistas são empregues como:
♡ Instrumentos de despiste (screening)
e/ou
♡ Diagnóstico de problemas

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Áreas ou Momentos de Avaliação
1. Informação demográfica
2. Áreas gerais de preocupação (descrição ou indicações gerais acerca do problema)
a) O que é que os traz à consulta?
b) Que tipo de dificuldades ou problemas tem tido?
3. Análise precisa da situação problemática
o No que diz respeito a este terceiro ponto, devemos questionar os pacientes de modo a
obter descrições objetivas, precisas e pormenorizadas de comportamentos específicos e
observáveis e motivos de preocupação:
→ O que o leva a dizer que o João é hiperativo?
→ Dê-me alguns exemplos
→ Descreva…
o Saber quais as condições do meio que circunscrevem o comportamento-alvo
(circunstâncias, acontecimentos que ocorrem antes (antecedentes), durante (estímulos
sequenciais) e depois (consequências) do comportamento-problema) – Análise Funcional;
o Saber em que situações e locais específicos o problema se manifesta;
o Documentar a natureza específica, frequência, duração, intensidade, o número e a
combinação de comportamentos;
o As circunstâncias do aparecimento do problema (incluindo a idade de aparecimento dos
sintomas) e a natureza crónica dos comportamentos, assim como a variação temporal e
situacional de comportamentos e consequências (gravidade da situação problemática e
intervenção);
o Variáveis normativas do desenvolvimento;
o Padrão de interação (crianças-pais-professores; análise funcional);
o Recurso a escalas de avaliação do comportamento (CBCL, TRF, etc.), inventários de
autorresposta (YSR).

A análise precisa da situação problemática continua até se determinar claramente a existência


de um “problema”, a sua natureza e extensão, os antecedentes do comportamento problema, as
consequências que acompanham tal comportamento.

4. Informação histórica acerca do problema (história de desenvolvimento, história médica,


escolar, social, etc.) e informação acerca de esforços prévios de intervenção.
5. Avaliação das expetativas e objetivos dos mediadores
a) Que comportamento gostaria que o João manifestasse nessa situação?
b) O que deseja mudar no comportamento do João?

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6. Varáveis relacionadas com a família (história familiar, suporte/recursos na família e na
continuidade)
7. Determinação do potencial de mediação dos pais e/ou professores
8. Determinação de condições, objetos, acontecimentos disponíveis que podem ser utilizados
como reforços
9. [Depois da entrevista com a criança] é realizada uma breve discussão com os pais e/ou
professores acerca da avaliação e da intervenção (concetualização do problema, estratégias
de modificação do comportamento, avaliações complementares).
10. Entrevista de restituição/devolução de informação

A entrevista, como instrumento de avaliação, continua através da formulação e implementação da


intervenção (pode, neste sentido, ser usada como medida de eficácia do programa de intervenção).

Conceitos técnicos e outras "entradas" para pensar a entrevista e os comportamentos do


entrevistador
Atenção;
Benevolência /Bondade;
Confidência;
Conselho/Aconselhamento;
Conteúdo manifesto e conteúdo latente;
Contradição;
Escuta;
Transferência e Contra-Transferência;
Empatia;
Identificação;
Relatório.

Em Avaliação Psicológica, a entrevista é o método mais básico e mais utilizado. Esta tem como
objetivos a avaliação psicológica; conhecimento da história clínica; diagnóstico (ICD-10; DSM-IV-
TR/DSM-5); aconselhamento psicológico; psicoterapia; monitorização e avaliação da intervenção; e
investigação. É um instrumento indispensável e insubstituível para obter informações relativas ao
sofrimento do sujeito, dificuldades de vida, acontecimentos vividos, história, relações com os outros,
vida íntima, sonhos, fantasmas. Para a entrevista há um conjunto de regras técnicas e atitudes que
devem ser adotados.

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A entrevista clínica é o paradigma do trabalho clínico em psicologia e faz parte do método clínico
(centrado no estudo de casos individuais). Na entrevista clínica o indivíduo constitui o quadro de
referência, sendo que é necessário compreender o sujeito na sua totalidade, na sua singularidade, em
situação e em evolução/desenvolvimento. O método clínico compreende uma “clínica de mãos nuas” –
entrevista e observação – e uma “clínica instrumental” – escalas, questionários e inventários clínicos;
testes de inteligência, testes projetivos e outros instrumentos de avaliação da personalidade.

1. Atenção
A atenção consiste num foco de concentração sobre um objeto, sobre o outro, sobre o que não
foi dito antes, entre outros. Usar melhor as suas capacidades para pensar e experimentar o que o sujeito
manifesta, durante a entrevista requer atenção e disposição interna do entrevistador para o
destinatário. Restaurar as ligações entre os vários elementos do discurso ou diferentes sequências
aparentemente heterogéneas do discurso do sujeito mostra se este está atento.
 “Atenção igualmente flutuante” (Freud, 1912): todas as palavras usadas, enunciadas por um
sujeito são, a priori, colocadas sob um mesmo plano, evitando privilegiar algumas ou
minimizar outras (técnica de escuta livre do sujeito que evita afastar os aspetos irracionais,
contraditórios, assim como o funcionamento em aspetos primários e secundários);
 Atenção clínica numa entrevista: ligar/associar tudo o que é presentemente dito ao que já
foi dito, estabelecer aproximações, conexões entre diferentes elementos do mundo interno
do sujeito (em uma ou mais entrevistas).
A atenção tem limites, assim, deve fixar-se a duração da entrevista, pois prolongar a duração da
mesma não permite acumular informações novas ou aprofundar a problemática enunciada. A atenção
será sustentada se for circunscrita no tempo da entrevista.

2. Benevolência/Bondade
“Neutralidade indulgente/benevolente” (Freud): intenção de fazer o bem, ajudar, analisar, curar.
A benevolência é um objetivo entre o psicólogo e o sujeito, tendo como fim a atenção benevolente do
sujeito para com o psicólogo e do sujeito relativamente a si próprio.
O entrevistador não deve formular juízos, críticas ou desaprovação relativamente ao sujeito,
mas deve, sim, assegurar-lhe confiança para este se exprimir livremente.

3. Confidência
A entrevista clínica pode ser representada como um espaço de confidências, discrição/reserva,
segredo e intimidade. Tem-se como objetivo que o paciente fale numa entrevista clínica, confie
qualquer coisa de íntimo a alguém disponível para acolher através de uma escuta atenta e discreta
(neste caso o entrevistador).

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4. Conselho/Aconselhamento
Entrevista de Aconselhamento: descobrir por si mesmo [expectativas, aspirações, desejos do
sujeito], suspender a resposta, guardar inteira disponibilidade, incentivar a tornar o pedido mais
preciso, acompanhar um trabalho de associação reconhecido pelo sujeito relativamente ao pedido
[problemática do sujeito]. Dar um conselho é como dar um testemunho da atenção ao sujeito, não uma
ordem imperativa ou obrigatória. No entanto, não é possível aconselhar sem primeiramente conhecer o
sujeito, a partir de uma nomenclatura/terminologia, de uma tipologia a priori.

5. Conteúdo Manifesto/Conteúdo Latente


O conteúdo manifesto é aquilo que o que o sujeito diz, enquanto que o conteúdo latente são as
representações e significações, por vezes implícitas, associadas ao discurso (aproximação ao
funcionamento verdadeiro do sujeito e à maneira como o próprio sujeito se posiciona relativamente ao
seu próprio discurso; atenção ao que é dito e ao modo como é dito: os silêncios, as mudanças temáticas,
os aspetos emocionais são tão importantes como a própria narrativa/discurso).

6. Contradição (Interna, Intersubjetiva)


A entrevista clínica é uma ocasião de dizer e de (se) contradizer, pois a lógica de um discurso
não é necessariamente governada pela regra da não contradição. A presença de contradições evidentes
entre os diversos elementos do discurso, entre diferentes momentos de expressão do sujeito, deve ser
reconhecida como índice possível de uma certa liberdade de expressão. A contradição é um “lance”,
uma ocasião de uma elaboração no caso de o sujeito tomar a iniciativa de a constatar.
Quando o técnico identifica uma contradição, formula um julgamento/juízo lógico deslocado
que pode conduzir, pelo menos, a uma restrição ou simplificações de enunciados. A tarefa do
entrevistador é, então, a benevolência com que pode sustentar a sua manifestação, sobretudo nos
sujeitos para quem a contradição é uma espécie de drama ou catástrofe. A aceitação da contradição pelo
entrevistador poderá constituir a primeira abordagem aceitável para quem sofre (postura clínica). A
contradição faz parte de toda a experiência subjetiva e arriscar a sua exclusão do discurso de um sujeito
pode expulsar toda a manifestação da subjetividade na entrevista clínica.

7. Escuta
A escuta é o “fazer” do entrevistador (clínico), a única manifestação possível do clínico. Não é
uma “intervenção” para falar, mas é sim uma condição necessária a qualquer forma de intervenção. É a
recusa de matar a palavra do outro, mas é também a recusa em cessar/descontinuar a avaliação no
sintoma [o sintoma pode ser um sinal, uma forma de linguagem]. Note-se que a escuta não é uma
aceitação plana/niveladora e sem crítica da palavra do sujeito; pressupõe, sim, uma disponibilidade
sem censura prévia, mas não significa aprovação sistemática das ideias, factos e gestos do sujeito. A

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aprovação, quando tem lugar, é relativa a sentimentos e tem como objetivo permitir a manifestação de
fantasmas e desejos. As defesas do psicólogo são afetadas pelas angústias e medos do sujeito.

8. Transferência
Os fenómenos de transferência desempenham um papel importante nas entrevistas de avaliação
e nas entrevistas psicoterapêuticas. Os fenómenos de transferência são observáveis, tanto no
entrevistado (paciente), como no entrevistador (psicólogo/clínico) – contratransferência.
A relação que o sujeito estabelece com o outro é função, em parte, da situação real (entrevista)
e, em parte, daquilo que cada um é (estrutura da personalidade) e do que cada um traz da sua história,
da sua organização mental e das suas relações passadas (a sua organização mental está dinamicamente
ligada à sua história). A transferência corresponde a este tipo de transposição para uma dada relação
(entrevista) de modalidades relacionais inconscientes e puramente imaginárias que dependem de
experiências anteriores (infantis, etc.).

9. Contratransferência
Este é um conceito importante sobretudo na cura psicanalítica e refere-se a um conjunto de
reações inconscientes do analista à pessoa que está a ser analisada.
Este conceito aplicado à entrevista clínica serve para reconhecer os efeitos do discurso do
sujeito sobre os sentimentos inconscientes do entrevistador [Freud justifica a necessidade do próprio
analista se submeter a uma análise por causa dos complexos e resistências internas do analista/clínico
associadas a situações de contratransferência]. Assim, a contratransferência é um conjunto de reações
inconscientes do psicólogo (entrevistador) relativamente ao seu interlocutor e, particularmente, às
manifestações de transferência deste.
A contratransferência (contra atitude) comporta duas dimensões:
o Uma é constituída por respostas específicas conscientes e inconscientes do entrevistador
em relação à sua problemática pessoal, isto é, aquilo que o discurso do sujeito
(entrevistado) o pode fazer lembrar/trazer de volta ao entrevistador;
o Na outra dimensão, a contratransferência converte-se num instrumento diagnóstico; neste
último caso, as reações contra transferenciais induzidas pelo sujeito no entrevistador vão
ajudar este último a compreender melhor o sujeito entrevistado.
Alguns sujeitos podem desencadear movimentos contra transferenciais específicos junto do
entrevistador, como experimentar/sentir um pouco de aborrecimento/tédio e monotonia com
pacientes ditos psicossomáticos, cujo discurso operatório reenvia a dificuldades de gerir e verbalizar as
emoções. Esta ausência de emoção produz um discurso linear, concreto e centrado sobre o real, que
acarreta um sentimento de monotonia e aborrecimento no entrevistador (clínico). Face a uma pessoa
agressiva, o psicólogo não mobilizará a mesma empatia do que relativamente face a uma pessoa que

INÊS RODRIGUES 18
exprime o seu sofrimento psíquico e manifesta mais explicitamente um pedido de ajuda. A ansiedade do
entrevistador pode surgir quando o sujeito evoca recordações traumáticas ou dolorosas já vividas
também pelo técnico e, neste caso, não se trata de esconder a ansiedade, mas de compreender a sua
origem. Nestes casos, espera-se uma atitude de distância por parte do entrevistador, capacidade de
análise e domínio de si/autocontrolo relativo a dificuldades pessoais passadas ou presentes, calma e
serenidade.
A atitude caritativa ou super protetora subjacente a um forte desejo de reparação, de cuidar e
‘curar’/’remediar’ rapidamente é uma outra atitude que pode ser despertada no entrevistado. Uma
atitude bem-intencionada, mas que não resolve nada, não introduz nenhuma melhoria, sendo mesmo
prejudicial, já que inferioriza/infantiliza o sujeito, não lhe permitindo evoluir e autonomizar-se. O
sujeito deve ser considerado como um ator de parte inteira no processo terapêutico (relação entre
iguais, dimensão ética). Pode ser despertada agressividade e, neste caso, é necessário suportar a
agressividade do entrevistado, bem como a sua própria agressividade (do entrevistado); os pacientes
podem irritar-se e induzir afetos de ódio/ira no entrevistador. Aceitar a sua própria irritação, é também
ajudar o paciente a aceitar os seus próprios movimentos agressivos. Tal implica, por parte do
entrevistador, uma análise clara da sua agressividade, isto é, uma atitude de
benevolência/generosidade/disponibilidade para a escuta por parte do entrevistador.
Firmeza e distância são também passiveis de ser suscitadas, medidas eventualmente frustrantes
para o sujeito (não responder aos pedidos de proteção do sujeito, inscrever a entrevista numa duração
limitada). Neste caso, devemos adotar uma técnica muito rígida que desconhece as necessidades do
sujeito, podendo este colocar o problema da entrevista no facto de esta ser experienciada como
hostil/agressiva. A clínica [da avaliação] supõe sempre flexibilidade e preocupação de um justo
equilíbrio, nem muito longe, nem muito próximo, nem muito diretivo, nem pouco diretivo.

Preconceitos a priori
→ A contratransferência do entrevistador pode envolver preconceitos de natureza cultural,
ideológica, religiosa (crenças, representações socioculturais e valores, não partilhados). Estes
preconceitos podem constituir uma barreira à relação e ao sofrimento profundo do sujeito;
neste caso, as dificuldades mais íntimas do sujeito não são percebidas pelo entrevistador por
causa do sistema de valores deste;
→ História pessoal, referências sociais, culturais, ideológicas e/ou religiosas do Entrevistador
devem estar ausentes da relação de avaliação de modo a permitir compreender o sujeito no seu
funcionamento e na sua dimensão mais humana; é necessário trabalho mental específico e
insubstituível por parte do Entrevistador (psicólogo, clínico), trabalho frequentemente
demorado, progressivo e elaborativo.

INÊS RODRIGUES 19
Outros exemplos de manifestações contra transferenciais por parte do entrevistador podem ser
o esquecimento de uma sessão de avaliação/psicoterapêutica; receber a pessoa com atraso; prolongar
significativamente a duração de uma entrevista; abandonar-se a uma ligeira compaixão; pensar
noutra(s) coisa(s); e associar as intenções do sujeito à sua vida pessoal.
No que diz respeito ao inventário não exaustivo, sublinha-se que é impensável e inútil imaginar
poder dominar, controlar os movimentos originários do inconsciente, reconhecer que estilos de
resposta interpessoais, dependentes de características da personalidade, podem influenciar o curso da
Entrevista. É possível reconhecer e utilizar esta resposta/operação de reconhecimento orientada em
última instância para compreender e interpretar o discurso produzido pelo sujeito que pode realizar no
tempo de uma entrevista clínica.
Os movimentos de transferência e contratransferência coexistem na relação interativa da
entrevista, introduzem uma dinâmica e dão origem a múltiplas emoções e representações que suscitam
atitudes que, por sua vez, desencadeiam no outro novas representações e afetos.

10. Empatia
A empatia trata-se do princípio essencial da psicoterapia e da sua eficácia (conceção humanista
da psicologia). A compreensão empática é uma atitude clínica que se trata de compreender o mundo
interior do sujeito numa espécie de apreensão intuitiva (“intuição do que se passa no outro, sem
esquecer que somos nós próprios”/“entender, tão exatamente quanto possível, as referências internas e
as componentes emocionais de uma outra pessoa e compreendê-las como se fôssemos essa outra
pessoa”).
Ser empático é ter a capacidade de compreender o estado mental do outro, identificando-se
transitoriamente a esse outro. Representa um mecanismo psicológico constituído por “uma oscilação
permanente entre a diferença e a similitude”. Não é simpatia, ou seja, não se trata de partilhar um
sentimento ou uma crença, mas, sobretudo, de “representar os sentimentos, os desejos e as crenças do
outro”. É o que nos permite conceber uma subjetividade estranha à nossa, algo de fundamental uma vez
que permite a cada um entrar na virtualidade de um mundo objetivo.
O conceito de empatia associado à ideia de compreensão: compreender o outro não é uma tarefa
fácil uma vez que a nossa primeira resposta à escuta de alguém é de avaliação, julgamento, mais do que
efetuar um esforço de compreensão do sentido veiculado pelas palavras da pessoa (p. ex. “é justo”, “está
errado”, “é falso”, não é razoável ou normal”). Compreender comporta um risco, o medo da mudança:
“Se eu compreendo realmente uma pessoa, eu entro no seu quadro de referência, e é possível que esta
compreensão me faça mudar”.
Duas dimensões na empatia:
o Dimensão cognitiva: trata-se de tentar apreender o contexto representacional do sujeito e
compreender o seu ponto de vista;

INÊS RODRIGUES 20
o Dimensão afetiva: necessariamente ligada à primeira, onde se trata de se representar e
experienciar o que o sujeito experimenta, sem partilhar as suas crenças e os seus
sentimentos.

11. Identificação
Para Freud, a noção de empatia está associada à identificação. A identificação é a forma mais
originária de ligação afetiva a um objeto (psicanálise), um processo inconsciente (“um sujeito assimila
um aspeto, uma propriedade, um atributo do outro”), uma atividade consciente de reconhecimento. A
identificação pode ser vista no sentido de reconhecer, ou seja, sentir o que o sujeito pensa (“sentir
intuitivamente a sua sensibilidade”) de modo a estarmos parcial e temporalmente no lugar do outro. Há
necessidade de uma redefinição progressiva, mas constante, da identidade do sujeito [e do
entrevistador]. O acesso à intrasubjetividade através de uma relação intersubjetiva. A ausência ou o
excesso de identificação impossibilitam a compreensão.

12. Relatório
 Produção de relatórios de entrevista;
 Dar conta de um modo de funcionamento psíquico a partir do discurso do sujeito;
 Dar sentido e valor ao que é vivido (emergência do subjetivo);
 O relatório não é a difusão simples de um diagnóstico ou prognóstico, mas possibilidade de
apreender transferência e reações de contratransferência;
 O relatório não fecha, mas relança a atividade clínica: escuta, interrogações, associações
suscitadas pelo relatório;
 Relatório após a entrevista [de restituição de informação].

Comportamento do Entrevistador
Condições para uma “atitude positiva do entrevistador” – Carl Rogers, 1984
1. Atitude positiva de recetividade, acolhimento e disponibilidade para que o sujeito se sinta
num estado de aceitação incondicional, contrariamente ao que acontece perante uma
atitude de iniciativa que coloca o sujeito na obrigação de responder. É necessário fazer
com que o sujeito se sinta um convidado, demonstrando calor, atenção, interesse, afeição e
respeito;
2. Centrar-se sobre o que é vivido pelo sujeito e não sobre os factos que ele evoca; não
interessam tanto os factos objetivos, mas a maneira como o sujeito experiencia as coisas,
as pessoas e os acontecimentos. Interessar-se pelo sujeito e pelo problema (existencial) do

INÊS RODRIGUES 21
ponto de vista do sujeito e não pelo problema em si de um ponto de vista objetivo. Estar
centrado sobre o sujeito e as suas impressões, sentimentos e pensamentos;
3. Manifestar um respeito absoluto (consideração real) pela individualidade do sujeito. A
relação é de escuta e de compreensão e não uma relação de julgamento, crítica,
culpabilização, manifestação de perspicácia pedagógica ou de dominação por parte do
entrevistador que impede a comunicação. Dar ao sujeito a certeza de que o entrevistador
respeita a sua maneira de ver, viver ou compreender;
4. Estabelecer com o sujeito uma relação de empatia. A empatia permite compreender o
outro, perceber as emoções e significações pessoais do universo do sujeito sem
experimentar as mesmas emoções. O esforço do entrevistador deve ser orientado para
facilitar a comunicação, ajudando o sujeito a formular o seu problema;
5. Considerar o sujeito como um ser-em-devir, com potencialidades e aberto à mudança, e
não como algo definido por uma classificação diagnóstica ou determinado pelo seu
passado.

Comportamentos a adotar pelo entrevistador – Andrews, 1952


1. Experimentar um interesse autêntico pelo sujeito, interesse este compreensivo e
benevolente que o cliente possa reconhecer imediatamente como sincero e verdadeiro. O
sujeito deve sentir-se recebido e “aceite” como um amigo;
2. Saber ouvir; ser capaz de deixar o sujeito exprimir-se com liberdade, sem o contrariar, com
as suas próprias opiniões, desejos ou teorias. Ser capaz, pela sua maneira de ser, de
persuadir o sujeito que o entrevistador está a ter um interesse autêntico pelo que o sujeito
está a tentar dizer;
3. Ser um observador dos comportamentos. Estar atento, não apenas às respostas verbais,
mas também aos comportamentos não-verbais e mudanças de expressão. A linguagem
verbal (o que é dito) não esgota as possibilidades de comunicação e avaliação;
4. Ser capaz de captar a motivação do seu comportamento, ou seja, o entrevistador deve
conhecer os seus “pontos fracos” e “pontos fortes”.

Princípios Gerais e Concelhos Técnicos – Rothlisberger & Dickson, 1943


1. Tratar de tudo o que é dito numa entrevista como um elemento inseparável do seu
contexto. Cada proposição anunciada apenas encontra o seu sentido pelo contexto
discursivo e situacional. Assim, é necessário estar atento, não apenas ao conteúdo
manifesto (numa entrevista é o nível informativo que predomina), mas também aos
motivos latentes. Não considerar tudo o que é dito como pertencendo ao mesmo nível
psicológico;

INÊS RODRIGUES 22
2. Estar atento, não apenas ao que a pessoa tem vontade de dizer, mas igualmente àquilo que
a pessoa não deseja ou não pode dizer sem ajuda. As omissões detetadas devem ser
exploradas com tato, pois podem traduzir resistências, receios, dúvidas que impedem o
entrevistado de se exprimir livremente;
3. Deve considerar aquelas atitudes mentais como pistas ou índices e tentar descobrir o
problema pessoal que elas revelam ou ocultam. É necessário considerar as respostas do
sujeito como sintomas, mais do que como realidades objetivas inquestionáveis. Pode não
haver uma relação direta entre o que é dito e o que é pensado;
4. Situar o problema pessoal do sujeito num contexto social/relacional especial. A entrevista
constitui uma situação social que determina o que é dito. O entrevistador não dá ordens
não critica, não faz advertências (a relação estabelecida é diferente das relações sociais
habituais). O entrevistado diz coisas que nunca disse a mais ninguém e pode até dizer
coisas que nunca formulou em palavras para si mesmo. O entrevistador pode ser o objeto
sobre o qual se projetam os receios e as expetativas do entrevistado, deve evitar que os
sentimentos da pessoa entrevistada reajam sobre os seus e deve, simultaneamente, ouvir
de uma maneira paciente, benevolente e critica;
5. Deve falar ou colocar questões apenas nas seguintes condições:
→ Ajudar a pessoa a falar;
→ Diminuir a ansiedade que é suscetível de modificar a situação;
→ Encorajar uma narrativa fiel e precisa de sentimentos e pensamentos;
→ Orientar a discussão sobre pontos esquecidos ou negligenciados;
→ Evocar, se isso é oportuno, a emergência do implícito.

Fundamentos da Entrevista
Sem colocar questões/perguntas não é possível obter respostas. Não é possível formular uma
teoria unificada (isto é, uma hipótese de trabalho) explicativa do motivo ou circunstâncias que levam
uma pessoa a procurar ajuda profissional sem compreender mais completamente essa pessoa, quem é
ou no que se tornou. A entrevista é a melhor ligação para compreender e avaliar o sujeito e as situações
de dificuldade que o levam ao pedido de consulta. Explorar o passado e as circunstâncias atuais são
modos de obter indicações acerca de como modificar comportamentos, pensamentos ou sentimentos
problemáticos.
Uma entrevista bem conduzida produz uma compreensão que permite formular recomendações
mais adequadas, uma vez que a informação é conhecimento e conhecimento é poder. Assim, adquirir
conhecimento acerca dos fatores e variáveis críticas na vida da pessoa é fundamental. A informação é
um ingrediente necessário para compreender a condição humana, ajudar a aliviar/mitigar o sofrimento

INÊS RODRIGUES 23
das pessoas e/ou para resolver os seus problemas, sendo esta mesma informação que ajuda alguém a
ser mais genuíno, realista e eficaz. A entrevista é, simultaneamente, um processo, um método e uma
técnica básica e central para obter a seguinte informação:
o Vulnerabilidade das pessoas na comunicação dos seus problemas (sofrimento físico como dor,
doença, fadiga, envelhecimento, morte e sofrimento psicológico como tristeza, medo, frustração,
desanimo, dificuldades cognitivas, etc.;
o Problemas que dificultam a sua realização ou ameaçam os seus sentimentos de sobrevivência e
segurança (constructo influenciado por um grande conjunto de variáveis);
o Sentimentos de ansiedade acerca de como comunicar a alguém os seus medos/receios mais
profundos, preocupações ou problemas que são incapazes de explicar a si próprios
adequadamente.
O sentimento de confiança e de conforto (físicos, emocionais e espirituais) relativos ao
entrevistador são necessários para que as pessoas interajam com profundidade/densidade numa
entrevista clínica. Os entrevistadores necessitam de estar focalizados na comunicação da pessoa, mais
do que na escuta dos seus próprios pensamentos e sentimentos (atitude clínica: trabalho de reflexão
sobre a prática), bem como necessitam de ser capazes de desenvolver uma relação de trabalho positiva,
com o objetivo de obter informação útil do ponto de vista da avaliação e do diagnóstico.
Alguns desafios (algoritmo) da situação de entrevista clínica para o entrevistador (variáveis
essenciais para obter cooperação e participação da pessoa e assegurar eficácia, sentimento de ser
ouvido e relação por parte do entrevistado) são:
o Treino/formação especializados;
o A técnica que é indissociável da dimensão humana da interação;
o A relação que é essencial em qualquer interação clínica;
o Competências sociais básicas e sensibilidade clínica;
o Preocupação com a relevância, profundidade/exaustividade e detalhe da avaliação;
o Compaixão e cuidado para com o entrevistado;
o Nunca esquecer que a pessoa é um ser humano que merece respeito e tem dignidade e valor
intrínsecos;
A entrevista é um fundamento, um ponto de partida para todas as intervenções posteriores, não
apenas uma conversa “normal” ou uma simples conversa.

Competências Básicas do Entrevistador


1. Conhecimento:
→ Psicopatologia e sistemas de classificação diagnóstica (DSM-5; ICD-10);
→ Entrevistas estruturadas de natureza diagnóstica;
→ Compreensão do desenvolvimento normal e patológico;

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→ Consciência da influência do desenvolvimento na apresentação de sintomas;
→ Consciência da influência da cultura no desenvolvimento na manifestação de sintomas;
→ Conhecimento dos processos de condução da entrevista;
2. Empatia: capacidade para perceber e compreender os sentimentos do cliente como se o
entrevistador os estivesse a experimentar;
3. Validação: capacidade para usar técnicas verbais e não-verbais (expressões faciais, postura
corporal) que comuniquem empatia;
4. Linguagem do entrevistador:
→ Capacidade para formular questões de uma maneira clara e compreensiva, sem uso de
jargão clínico e considerando o nível escolar, experiências de vida, vocabulário e
linguagem do cliente;
→ É o instrumento através do qual os pacientes são orientados para a especificidade e
clareza das suas respostas;
5. Gestão do tempo:
→ Capacidade para estimar a duração da entrevista;
→ Capacidade para estimar o andamento/ritmo apropriado da entrevista;
→ Capacidade para realizar uma avaliação completa no tempo previsto;

Entrevista a Crianças: Sugestões Úteis


 Tornar o contexto da entrevista o mais neutro e distendido (relaxado) possível;
 Permitir que a criança explore o ambiente antes de iniciar o tempo de questionamento
(perguntas);
 Usar tapetes no chão, sentar-se ao mesmo nível da criança em idade pré-escolar;
 Mesas e cadeiras apropriadas para as crianças mais novas (5-6 anos) para facilitar a tarefa de
desenhar;
 Permitir que a criança deixe ocasionalmente o seu lugar (cadeira);
 Sentar-se na diagonal (à direita ou à esquerda da criança) em vez do lado oposto da mesa. Esta
postura reduz a atmosfera de testing do contexto de entrevista;
 Preparar previamente a sala antes de iniciar a entrevista, minimizando os elementos distrativos;
 Se possível, remover brinquedos, jogos, objetos mais infantis antes de iniciar a entrevista com
adolescentes;
 Disponibilizar materiais manipulativos (plasticina, materiais para desenhar) para a criança ficar
mais à vontade enquanto fala.

Entrevista com Pais e Professores: Sugestões Úteis


 Estabelecer relação;

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 Começar a entrevista com questões abertas;
 Identificar os problemas mais salientes e relevantes;
 Desenvolver descrições precisas, traduzindo preocupações vagas em comportamentos
observáveis;
 Conceber hipóteses acerca das variáveis que podem causar ou manter o comportamento que é
objeto de preocupação;
 Desenvolver um plano de avaliação;
 Definir uma data para a revisão e comunicação dos resultados da avaliação.

Estratégias do Entrevistador
1. “Conhece-te a ti próprio”: o entrevistador é o próprio instrumento através do qual ouve e responde
aos clientes. Por isso, é necessário estar consciente dos seus próprios bias (enviesamentos), estilo
e presença física. Para manter uma “boa distância” com o sujeito, o entrevistador deve analisar e
clarificar as suas próprias contra atitudes e emoções, ter domínio de si e manifestar serenidade em
relação aos problemas encontrados;
2. Conhecer o domínio/território da entrevista: ser capaz de conduzir a entrevista onde os clientes se
sintam confortáveis;
3. Saber como ouvir: ouvir com todos os sentidos e assegurar que o cliente sabe (através das
respostas do entrevistador) que este o está a ouvir com atenção;
4. Prática: apenas através da experiencia direta de entrevista se fica perito na administração dos
princípios básicos da mesma;
5. Aplicar as competências de avaliação e entrevista em diversos contextos;
6. Saber como resolver problemas: estar familiarizado com conceitos e sintomas diagnósticos de
modo a identificar necessidades do cliente.

Condições Essenciais para Afirmações de Causalidade


→ Comportamento-alvo Presente + Variável Causal Presente = Condição Necessária
 Evidencia que suporta a afirmação de causalidade
→ Comportamento-alvo Ausente + Variável Causal Ausente = Condição Suficiente
 Evidência que suporta a afirmação de causalidade
→ Comportamento-alvo Presente + Variável Causal Ausente
 Evidência que contraria a afirmação de causalidade
→ Comportamento-alvo Ausente + Variável Causal Presente
 Evidência que contraria a afirmação de causalidade

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Técnicas
Competências de escuta que traduzem a atenção ao que o sujeito verbaliza.
→ Comportamentos Verbais:
o Confrontação
o Clarificação
o Exploração
o Humor
o Reestruturação (reframing)
o Reflexão sobre os sentimentos transmitidos
o Reflexão sobre os conteúdos cognitivos das afirmações
o Autorrevelação (Self-disclosure)
o Questões Abertas
o Encorajamentos mínimos
→ Comportamentos Não-verbais:
o Contacto Visual
o Postura
o Silêncio(s)

Comportamentos Verbais
As respostas verbais do entrevistador devem ser dadas num tom expressivo, amistoso e
caloroso, pois ajudam o sujeito a sentir-se mais à vontade e a concentrar-se no que está a dizer/ser
discutido. Além disto, devem ser dadas a um ritmo apropriado, pois a rapidez excessiva pode deixar no
sujeito a impressão de que ele está a gastar/fazer perder tempo ao entrevistador e aumenta o risco de o
sujeito se sentir sob pressão, induzido ou incitado a responder rapidamente e pode inclusive não ser
capaz de responder. A seguir aos comentários do sujeito, o entrevistador não deve falar muito (o sujeito
deve falar durante 80% do tempo), não deve falar de si próprio ou dar respostas, mas sim ajudar o
sujeito a encontrar as suas próprias respostas.
As respostas do entrevistador devem estar relacionadas com as preocupações previamente
expressas pelo sujeito, e os seus comentários e questões devem ajudá-lo a clarificar o problema. Devem,
ainda, estar relacionadas com o comportamento verbal (conteúdo e tom) e com o comportamento não-
verbal (olhar, gestos, etc.).

1. Confrontação
É uma descrição, não uma acusação que suscita respostas defensivas. É uma técnica que se apoia
na escuta das verbalizações e na observação dos comportamentos e utiliza-se depois de se ter

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estabelecido uma boa relação. Esta técnica só poderá ser útil quando é usada de uma maneira não hostil
e factual. Quando é usada num registo “destrutivo” (negativo) pode aumentar a resistência do cliente.
Esta técnica é usada quando o sujeito estabelece objetivos irrealistas e/ou em casos de pessoas
em situações de abuso de substâncias. O entrevistador chama a atenção para as discrepâncias e
contradições entre as palavras e as ações do sujeito, a perceção do sujeito e do entrevistador e os
valores pessoais e sociais do sujeito. O entrevistador centra-se na discrepância, confronta o sujeito com
essa incongruência e encoraja-o a explorá-la.

2. Exploração
Algumas áreas requerem uma revisão mais profunda do que aquela inicialmente apresentada
pelo cliente. Na exploração, o entrevistador estrutura mais aprofundadamente o questionário numa
determinada área. Alguns clientes esperam ser questionados acerca de determinados tópicos e podem
interrogar-se porque é que isso não é/foi feito. O entrevistador não deve ser relutante em explorar
áreas consideradas mais sensíveis.
Exemplo: Sujeito – “No meu grupo observei muitas pessoas a serem agredidas e roubadas.”;
Entrevistador – “Teve pesadelos mais tarde?”.

3. Reformulação/Reestruturação (Reframing)
Técnica por vezes denominada de reestruturação cognitiva. Observa-se quando atitudes,
opiniões, crenças ou sentimentos são reformulados de modo a assegurar uma maior adequação à
realidade. Pode facultar ao entrevistado uma nova perspetiva e contribuir para eliminar algumas auto
verbalizações frequentemente irracionais e mal adaptativas. Pode sugerir novos comportamentos e
diferentes modos de pensar.
Exemplo: Sujeito – “A minha namorada deixou-me por outro”; Entrevistador – “Embora se veja
confrontado com uma situação perturbadora e difícil, tem agora a oportunidade de conhecer alguém
novo…”.

4. Reflexão sobre os pensamentos ou conteúdos cognitivos das afirmações


Pode ser aplicada de duas maneiras:
→ Parafrasear:
 Frequentemente usada para promover a compreensão e a clarificação (diferente da
reflexão que é usada sobretudo como instrumento terapêutico);
 Permite confirmar junto do cliente que ele está a ser ouvido com atenção;
 Permite verificar e clarificar as afirmações do sujeito;
→ Sumariar:
 Quando os comentários do sujeito são extensos e/ou confusos;

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 Para dar direção e coerência à entrevista;
 Para concluir a entrevista;
 Proporciona uma introdução a uma entrevista posterior.

5. Reflexão sobre os sentimentos ou os conteúdos afetivos das afirmações


Remete para o modo como é transmitida a informação. É importante considerar não apenas o
que é dito (conteúdo discursivo), mas também a maneira como é dito (postura, voz, etc.). Baseia-se em
sumarizar os aspetos emocionais daquilo que é comunicado.

6. Humor
Deve ser usado positivamente: pode reduzir a ansiedade, facilitar o movimento terapêutico e
melhorar o fluxo/ritmo da entrevista/sessão psicoterapêutica. Usado negativamente pode levar o
cliente a sentir ou perceber que não esta a ser considerado com seriedade

7. Autorrevelação (Self-disclosure)
Tradição da psicoterapia psicanalítica: o analista deve manter-se como uma folha em branco
(blank slate) no decurso da terapia para permitir que a transferência se desenvolva. Não deve revelar
informação pessoal. A ideia atual é que a autorrevelação pode ser usada com objetivos terapêuticos

8. Questões Abertas vs. Questões Fechadas vs. Encorajamentos Mínimos


Questões Abertas: São introduzidas/iniciadas de várias maneiras e podem facilitar a aquisição
de diferentes tipos de informações, pois a resposta implica várias palavras ou frases. Suscitam,
frequentemente, informações factuais, encorajam o cliente a dar a sua perspetiva pessoal/subjetiva
acerca da situação/problema ou a falar dos seus sentimentos. Estimulam respostas mais
pormenorizadas e específicas, facilitam mais flexibilidade na formulação da resposta, responsabilizam o
cliente no que diz respeito à sua contribuição para a discussão e ajudam-no a explorar e clarificar as
suas preocupações e problemas (ex.: “o que o traz à consulta?”). Este tipo de questões colocam os
entrevistados mais à vontade, contribuindo para um maior envolvimento e participação; constituem
melhores oportunidades para discutir tópicos relevantes para o sujeito; ajudam os clientes a explorar e
clarificar as suas preocupações, suscitam exemplos específicos de situações gerais; não podem ser
respondidas com um “sim” ou um “são” ou com um facto, oferecem dificuldades técnicas na análise de
conteúdo das respostas; e pessoas de NSE mais baixo sentem-se menos à vontade a responder a
perguntas abertas.
Questões Fechadas: Podem ser respondidas com “sim/não” com um simples facto. Algumas das
vantagens deste tipo de questões é que são úteis para obter informação precisa e para ajudar o
entrevistado a centrar-se num ponto específico. No entanto, tem limitações como a produção de pouca

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informação e o impedimento ao sujeito de explorar e clarificar a situação. De um modo geral, devem ser
pouco utilizadas – a seguir a uma questão fechada deve colocar-se uma aberta. O recurso excessivo a
questões fechadas pode introduzir incomodidade, aborrecimento e irritação ao sujeito.
Os Encorajamentos Mínimos são defensáveis ao uso intermitente de frases mínimas (estímulos
verbais mínimos), ajudam o cliente a continuar o seu discurso, indicam que o entrevistador está a
seguir a comunicação do cliente com atenção, que o está a escutar e que deseja que ele continue e têm o
mesmo objetivo que comportamentos como “contacto visual” ou “acenar com a cabeça”. No entanto,
têm um grande risco, pois o seu uso excessivo pode ter um efeito negativo – efeito papagaio.

Comportamentos Não-verbais
1. Postura Corporal
Uma postura aberta, natural e relaxada comunica interesse. Assim, o corpo do entrevistador
deve estar ligeiramente inclinado para a frente, na direção do sujeito, deve mostrar movimentos de
aceno com a cabeça e expressões faciais (inclui contacto visual, sinais de aceno com a cabeça,
manipulação dos músculos faciais para sinais de indiferença, sorrisos, etc.) apropriadas em relação ao
que está a ser transmitido/discutido. A ausência de expressão facial pode sugerir falta de interesse. O
uso apropriado de sorrisos pode ter um efeito poderoso sobre os sujeitos, particularmente quando é
acompanhado com sinais de assentimento/aceno. No entanto, o uso contínuo do sorriso torna-se,
virtualmente, num estímulo negativo.
O entrevistador deve evitar estar sentado de maneira excessivamente rígida que não é natural,
pois o sujeito terá dificuldade em ficar relaxado, bem como deve evitar estar excessivamente relaxado,
pois o sujeito poderá sentir-se incomodado e hesitar discutir as suas dificuldades com o entrevistador.

2. Olhar, Contacto Visual


É frequentemente indicativo da natureza/qualidade da relação entre as pessoas. Um bom
contacto visual reforça o entrevistado, torna a comunicação mais fácil e situa-se entre o “olhar fixo” e o
“olhar evasivo ou fugidio”. O olhar deve ser natural e direto, sem ser fixo, e comparativamente
constante. É mais adequado interromper este contacto quando há um corte na discussão, uma das
partes esta a pensar ou se muda de assunto/tópico.
Um contacto visual apropriado é uma das componentes de escuta mais importantes, no sentido
de sugerir ao sujeito que ele está a ser acompanhado com atenção. A ação de tomar notas deve ser feita
depois da entrevista, quando se está mais consciente das questões essenciais, pois durante a entrevista
corre-se o risco de distrair, perturbar ou contrariar o sujeito.

INÊS RODRIGUES 30
3. Silêncio(s)
Os silêncios não têm sempre o mesmo valor/significado e não traduzem necessariamente uma
recusa de comunicação; não raras vezes são vividos como inquietantes; longe de extinguirem a
comunicação, tornam-na mais intensa e fortemente emocional. Podem constituir uma forma e uma
técnica de comunicação (positiva ou negativa).
Existem vários tipos de silêncios:
→ Necessidade de tempo: Para pensar, observar/compreender, para si próprio. O entrevistador
não deve pensar pelo sujeito; não tem que preencher todos os silêncios, a menos que
estejam num impasse. É necessário dar tempo ao sujeito para ele trabalhar o problema,
comunicar, “trazer as coisas cá p’ra fora”;
→ Resistência (intervenção de mecanismos de defesa);
→ (Percebido como uma) Situação/Condição ameaçadora e intimidante;
→ Pode veicular mensagens mais ou menos subtis;
→ (Pausas ou silêncios prolongados): Dificuldade em falar sobre determinado assunto;
→ Sentimentos de vergonha e dificuldade em relacionar-se com o técnico, medo de ser
descoberto, adivinhado.

Formatos de Entrevista
Estruturada
Uma entrevista estruturada é um modelo de entrevistas diagnósticas, questionários, etc.
→ Vantagens:
o Maximiza a precisão e a validade (garantia de não omissão de tópicos assegura maior
sistematização, objetividade e comparabilidade);
o Minimiza possíveis bias (enviesamentos) do entrevistador;
o Produz dados consistentes;
o Especifica o início e duração dos sintomas;
o Quantificação dos sintomas;
→ Limitações:
o Foco no diagnóstico e não na intervenção;
o Requer mais treino/formação;
o Informação limitada relativa a fatores não diagnósticos;
o Proporcionam resultados dicotómicos acerca da ausência ou presença de um
diagnóstico particular (a investigação em psicopatologia sugere que esta deve ser
concetualizada como dimensional e não categorial).

INÊS RODRIGUES 31
Não estruturada
Uma entrevista do tipo não estruturada serva para explorar mais amplamente uma questão.
→ Vantagens:
o Altamente flexível;
o Permite adaptação a necessidades de informação mais específicas;
o Útil na concetualização do problema e na planificação da intervenção;
→ Limitações:
o Uma estrutura mínima introduz problemas de fiabilidade e validade;
o Dificuldade comparativa com entrevistas estruturadas;
o Requer elevado nível de competências de entrevista.

Semiestruturada
→ Vantagens:
o Possibilita flexibilidade dentro de um formato estandardizado (menos restritiva em
relação às questões e à sua ordem);
o Proporciona um contexto organizativo;
o Possibilita seguimento em função de necessidades de informação (através da introdução
de questões suplementares);
→ Limitações:
o Fiabilidade e validade fracas.

Estratégias para Aumentar a Utilidade das Entrevistas


1. Preparar a entrevista:
 Obter previamente tanta informação quanto possível;
 Saber a natureza do problema subjacente ao pedido de avaliação;
 Pensar em questões, perguntas relevantes;
 Solicitar ao entrevistado que traga consigo, para a 1ª entrevista, registos, exames e
relatórios anteriores;
2. Definir o objetivo da entrevista;
3. Clarificar o objetivo e os parâmetros da entrevista junto do entrevistado;
4. Concetualizar a entrevista como um processo colaborativo;
5. Ouvir verdadeiramente/autenticamente o que o entrevistado tem para dizer;
6. Usar entrevistas estruturadas;
7. Encorajar o entrevistado a descrever concretamente as suas queixas em termos
comportamentais;

INÊS RODRIGUES 32
8. Complementar a entrevista com outros métodos de avaliação, particularmente testes
psicológicos;
9. Identificar os antecedentes e as consequências dos comportamentos problemáticos;
10. Distinguir competência e motivação;
11. Obter linhas-base dos comportamentos (para avaliar os progressos da terapia);
12. Evitar expetativas e enviesamentos:
 O entrevistador deve monitorizar os seus próprios sentimentos, atitudes, crenças e
contratransferência de modo a acautelar a manutenção de uma orientação subjetiva;
13. Usar estratégias infirmativas (considerar informação que contraria as suas hipóteses);
14. Deferir decisões (não apressar juízos ou conclusões);
15. Considerar alternativas;
16. Proporcionar um termo/conclusão adequados à entrevista (sugerir um curso de ação).

Exame do Estado Mental


Aspetos de Caracterização
O exame do estado mental é uma componente integrante do processo de entrevista. Consiste
numa combinação ou conjunto de questões e observações e tem como finalidade estabelecer um perfil,
padrão ou quadro subjetivo da condição atual do sujeito, isto é, do estado mental, cognitivo e
comportamental do sujeito, considerando/avaliando aspetos verbais e não-verbais a partir de um
conjunto de elementos/parâmetros, numa perspetiva integrativa/compreensiva.

Objetivos/Utilidade
O exame do estado mental tem como objetivo estabelecer um diagnóstico prévio/provisório e
elementos de diagnóstico diferencial, delinear uma formulação da etiologia da condição atual, isto é,
fatores biológicos, psicológicos e/ou sociais que predispõem, precipitam e mantêm a condição atual, e
estabelecer a capacidade/funcionamento psicológico do sujeito.

Elementos/Parâmetros de Análise (5 áreas)


1. Observações clínicas
a) Aparência/aspeto;
b) Nível de atividade (psicomotor);
c) Discurso/linguagem;
d) Atitude face ao examinador.

INÊS RODRIGUES 33
As observações clínicas constituem um elemento crucial da entrevista. Frequentemente, o
comportamento do sujeito em situação de entrevista sugere o seu grau/qualidade de funcionamento
(“normal”/“patológico”; “adequado”/“desadequado”).

a) Aparência/aspeto:
Inclui elementos de observação relativos ao aspeto físico, comportamental e afetivo. Apesar
de, por si só, não fornecerem informação clínica relevante, quando integrados num quadro
mais amplo de informação clínica, podem contribuir para validar um diagnóstico e
definir/circunscrever as preocupações do sujeito. Por exemplo, o modo de vestir, acessórios,
maquilhagem, asseio/limpeza (cabelo, unhas, odor, etc.), idade aparente (vs. idade real),
expressão facial, postura, “saúde”, entre outros. É possível, também, verificarmos se a
aparência é consonante com a idade, ocupação e estatuto socioeconómico do sujeito.

b) Nível de atividade (psicomotor):


Inclui elementos de atividade física/movimento (comportamento psicomotor, quer em
termos de quantidade, quer de qualidade). Uma atividade física/movimento atípico
observado pode exigir avaliação adicional, por exemplo, abuso de substâncias,
hiperatividade, comportamento maníaco, tiques, ansiedade, efeitos de medicação, entre
outros. O nível de atividade do sujeito pode ser influenciado, ainda, pela sua condição física,
uso de medicação, capacidade de interação/relacionamento e afeto.

c) Discurso/linguagem:
A linguagem/discurso é observável ao longo de todo o processo de entrevista, sendo um dos
indicadores mais relevantes para o exame do estado mental (relação linguagem-
pensamento). Pode fornecer uma boa estimativa da dimensão comunicacional, incluindo
comportamento social, cognição/funcionamento intelectual, aspetos físicos de pensamentos
e obsessões.

d) Atitude face ao examinador:


Influencia a validade da entrevista e pode ser um indicador de prognóstico da intervenção
(ex.: adesão ao tratamento). Devem ser monitorizados ou verificados aspetos relativos ao
nível de cooperação, de defesa e a seriedade do sujeito ao facultar a informação. Exemplos
que nos mostram a atitude do sujeito para com o examinador são o nível de atenção, o
interesse, a cooperação, a postura, etc.

INÊS RODRIGUES 34
2. Consciência/pensamento
Indica em que medida o discurso do sujeito reflete os seus processos de pensamento (a partir de
observação em contexto de entrevista). Refere-se aos padrões de pensamento e não a conteúdos
específicos. Áreas problemáticas surgem frequentemente associadas a perturbações/desordens de
pensamento, mas também podem ocorrer em perturbações severas de humor.
Exemplos: Discurso (se é espontâneo, coerente, inibido, lentificado, com bloqueios, vago ilógico,
desorganizado, disperso); pensamento (se é relevante, coerente, dirigido/com uma finalidade,
desregrado); processos de pensamento (considerando o número de ideias a comunicar, hesitação,
dispersão, coerência).

3. Conteúdo do Pensamento
Indica áreas de preocupação do sujeito, quer do domínio cognitivo, quer do afetivo, a partir de
questões que são colocadas no âmbito do processo de entrevista. Inclui tópicos de preocupação que o
sujeito experiencia, considerando se são recentes ou crónicos, quando ocorrem, e em que circunstâncias
ocorrem.

4. Afeto e Humor
Afeto refere-se às observações clinicas (observação de aspetos emocionais) no momento da
entrevista, a partir de elementos como o contacto visual, expressões faciais, choro, sorriso, etc. Deve
avaliar-se a amplitude, adequabilidade, intensidade, mobilidade/psicomotricidade, nível de ansiedade,
expressão de raiva, humor predominante, entre outros.
Humor é definido como o padrão de sintomas emocionais que é persistente ao longo do tempo,
de acordo com a informação reportada pelo sujeito, via questões colocadas no âmbito do processo de
entrevista (ex.: problemas de raiva, ataques de pânico, ansiedade, depressão, mania).

5. Cognição/Dimensão Cognitiva
Refere-se a um conjunto de variáveis/funções cognitivas, como memória,
concentração/atenção, capacidade de abstração, inteligência geral, entre outras. Inclui, ainda,
elementos de dimensão sensorial, como a acuidade dos sentidos na perceção da realidade/mundo, o
nível de consciência e o nível de ativação. Pode fornecer uma boa estimativa do funcionamento
cognitivo (ajustado/”normal”, declínio ligeiro, deterioração).
o Contacto com a realidade – A partir da avaliação da qualidade da conversação e do
fluxo/curso da mesma, da adequabilidade das respostas do sujeito;
o Orientação – Inclui orientação no tempo, no espaço e autorreferência/relativa ao próprio;
o Concentração – Refere-se, em geral, à capacidade para manter a atenção;
o Memória – Inclui memoria de curto e longo prazo (remota, recente e imediata);

INÊS RODRIGUES 35
o Informação – Inclui conhecimento de acontecimentos e informação geral do meio, do
ambiente e histórica;
o Capacidade de abstração – Indicador de desenvolvimento cognitivo;
o Juízo/compreensão – Inclui aspetos relativos à consciência e compreensão das
regras/normas sociais e dos valores e à atuação/comportamento adequado, em
determinadas situações;
o Insight – Referente à consciência que o sujeito tem de si e da sua situação/condição, sendo
um elemento crucial no planeamento do tratamento;
o Funcionamento intelectual (geral) – Inclui o funcionamento intelectual atual e nível pré-
mórbido, permite a avaliação da capacidade cognitiva geral, é relevante na seleção de
tratamento e no estabelecimento de potencial necessidade de serviços.

Exame Breve do Estado Mental (MMSE)


Instrumentos de avaliação neuropsicológica:
1. Instrumentos de Rastreio Cognitivo:
→ Testes breves, de fácil e rápida administração;
→ Fornecem uma indicação do funcionamento das várias funções cognitivas;
→ São úteis na discriminação entre uma situação normal e patológica, bem como na deteção
primária de áreas lesadas.

2. Baterias Neuropsicológicas Gerais:


→ Provas numerosas e extensas (+/- 1h);
→ Analisam mais detalhadamente as várias funções cognitivas.

3. Testes Específicos:
→ Instrumentos que permitem o exame mais individualizado e exaustivo de determinada
função cognitiva:
→ Permitem a despistagem/rastreio (insuficiente do ponto de vista diagnóstico) e a
quantificação global do defeito/deficit;
→ É de fácil e rápida aplicação.

Limitações
Algumas das limitações do MMSE são a sua baixa sensibilidade aos estádios de declínio
cognitivo mais ligeiros, o que conduz a uma elevada taxa de falsos negativos e a uma relativa
insensibilidade aos quadros clínicos de DCL; a reduzida complexidade de muitas das tarefas incluídas
no teste, principalmente ao nível da memória e da linguagem, o que gera um frequente efeito teto dos

INÊS RODRIGUES 36
desempenhos, sobretudos nos indivíduos com escolaridade mais elevada; uma relativa incapacidade
para diferenciar distintas condições clínicas; ausência de tarefas para a avaliação das funções
executivas, o que compromete a sua sensibilidade na identificação de condições clínicas como a
demência frontotemporal (DFT) ou o défice cognitivo de origem vascular (p. ex.).

Escalas de Avaliação do Comportamento


Elementos de Caracterização
As Escalas de Avaliação do Comportamento podem ser designadas desta mesma forma, como
Questionários do Comportamento ou, ainda, Inquéritos de Comportamento.
Estas escalas são conjuntos diversificados de itens/perguntas, a serem respondidas por
adultos/mediadores significativos (ex.: pais, professores), em referência ao comportamento de uma
criança ou adolescente; no caso de adultos, usualmente são respondidas pelo cônjuge.

Especificidades/ Características
Estes questionários caracterizam-se por serem um método indireto de avaliação, isto é,
envolvem descrições retrospetivas do comportamento, sendo igualmente uma forma estandardizada de
obter informação junto de pais/professores, avaliando, assim, a perceção dos mediadores.
Juntamente com a entrevista, estes constituem o principal método de aquisição de informação
na fase inicial do processo da avaliação e podem ser multidimensionais (referentes a uma larga
variedade de problemas/dimensões) ou unidimensionais (referentes a uma única variável – ex.:
hiperatividade). As escalas de resposta podem ser de tipo Sim/Não, ou de tipo Likert e, neste último
caso, avaliar a intensidade, frequência e/ou duração de um determinado comportamento.

Estratégias de Utilização
Estas escalas podem ser completadas no início da avaliação (ex.: enviadas previamente pelo
correio, para serem preenchidas por pais e/ou professores). O recurso a escalas multidimensionais
permite despistar pedidos inapropriados, clarificar queixas vagas e estruturar e focalizar a entrevista a
uma forma mais específica, ou decidir utilizar uma escala unidimensional.
Podem, também, ser completadas a seguir à entrevista inicial e à clarificação dos problemas
atuais, ou mesmo fazendo parte de uma entrevista estruturada. Este tipo de aplicação permite
estabelecer linhas para a avaliação funcional do comportamento e não excluir áreas significativas, de
relevância, para a análise e compreensão da situação problemática.

INÊS RODRIGUES 37
amplitude de valores dentro do qual podemos estar bastante seguros de que cai o resultado verdadeiro
do examinando – intervalo de confiança.
Quanto mais preciso for um teste/instrumento, menor será o seu erro padrão da medida e,
consequentemente, menor o intervalo de confiança. Quando menor precisão o teste tiver, maior será o
erro padrão da medida e, consequentemente, maior o intervalo do confiança.
Se EPM = 3 e 𝑥 = 100 (QI = 100), conclui-se que:
→ Com 68% de confiança, o resultado verdadeiro do sujeito está entre 97 e 103 (isto é,
100 ± 3);
→ Com 95% de confiança, o resultado verdadeiro do sujeito está entre 94 e 106 (isto é,
100 ± 2𝑥3);
→ Com 99.7% de confiança, o resultado verdadeiro do sujeito está entre 91 e 109 (isto é,
100 ± 3𝑥3).

Modelos Teóricos de Avaliação Psicológica


As teorias são visões do mundo, pontos de vista adotados para olhar a realidade; tentativas
sistemáticas de explicar fenómenos, postulando as relações entre esses fenómenos e um certo número
de variáveis explicativas, também elas relacionadas entre si. Epistemologicamente, uma teoria quer
dizer “ver” (tarefa prática de “dar a ver”). No que diz respeito aos modelos, estes são abordagens
concetuais ou conceções particulares acerca dos fenómenos. São mais particularizados, representativos
de uma realidade bem determinada e restringidos a objetivos limitados e bem definidos. A teoria
assegura a coerência do modelo.
Quando falamos em modelos de avaliação psicológica, pressupomos a existência de diferentes
teorias, isto é, categorias distintas de entendimento, diferentes maneiras de conceber a realidade
psicológica. Existe uma pluralidade de registos de avaliação, pois nenhuma teoria ou modelo de
avaliação consegue lidar com todos os níveis de análise, não existindo um nível adequado que seja único
(todos são repletos de incompletude e diversificação). No entanto, a escolha de um modelo é uma
“implicação”, uma referenciação que age sobre o avaliador e que guia a ação da avaliação
(problematização/interrogação). Os modelos que existem são (i) médico-psiquiátrico; (ii) traços ou
atributos (psicométrico); (iii) psicodinâmico (analítico); (iv) fenomenológico.

A. Modelos de avaliação centrados na pessoa


o Modelo psicométrico, dos traços ou atributos
o Modelo psicodinâmico/psicanalítico
o Modelo fenomenológico, humanista, existencial

INÊS RODRIGUES 64
Nos modelos de avaliação centrados na pessoa, a ênfase avaliativa está centrada no que o sujeito
é (variáveis inerentes ao organismo) ou no que este tem (por exemplo, o modelo situacional salienta o
que o sujeito faz). O objetivo da avaliação é captar a essência da pessoa (aquilo que ela é) com a máxima
precisão possível.
A conduta é um sinal ou reflexo externo de variáveis subjacentes/internas do sujeito que não
podem ser apreendidas diretamente, mas que determinam o comportamento do mesmo. Uma vez que
estas variáveis são substantivas e inerentes ao sujeito, deduz-se que a conduta é relativamente estável
através do tempo e das situações devido à existência de traços de personalidade (construtos hipotéticos
com elevado grau de abstração e possibilidades de operacionalização).

1. Modelo Psicométrico, dos Traços ou Atributos


A conduta está/é determinada pela organização interna dos traços que representam um forte
componente constitucional. As respostas dos sujeitos são interpretadas como “sinais” da variável
interna que se procura analisar, uma vez que as variáveis internas têm um estatuto estrutural, ou seja,
introduzem consistência e estabilidade ao comportamento ao longo do tempo e em várias situações. O
factor g de Speaman, o temperamento [traços temperamentais, traços dinâmicos – motivos (Cattell)], e
os fatores da personalidade [neuroticismo, extroversão, psicoticismo (Eysenck)] constituem exemplos
destas variáveis Os autores deste modelo são Galton, Cattel, Binet, Eysenck, Guilford e Kline, e este
utiliza testes psicológicos e de indicadores, como a idade mental (IM) e o quociente intelectual (QI) com
o objetivo de quantificar aspetos psicológicos.
A avaliação psicológica procura captar os traços que determinam e dão forma à personalidade.
Um traço isolado só adquire o seu sentido interpretativo mais amplo quando é analisado em relação ao
conjunto de traços que determinam estrutura. A avaliação psicológica pretende, desta forma, identificar
a estrutura global da personalidade, centrando a sua análise nas diferentes categorias de traços que a
compõem (temperamentais, cognitivos, dinâmicos).

 Perspectiva Nomotética: Determina as leis gerais da conduta, contrariamente ao modelo


ideográfico (centrado na análise do sujeito como unidade funcional). O traço é analisado,
não apenas em função da sua presença ou ausência, mas, fundamentalmente, com base na
intensidade da sua manifestação relativamente a um grupo normativo.

No que toca a aspetos metodológicos, este é um modelo correlacional e de análise fatorial, ou


seja, procede à quantificação de traços ou dimensões relativamente a um grupo normativo. Utiliza
questionários de personalidade [16 PF de Cattell; Eysenck Personality Questionnaire de Eysenck; MMPI-
2], inventários de interesses; escalas e testes de inteligência [Escalas de Inteligência de Wechsler (WPPSI-
R; WISC-III; WAIS-III); e matrizes progressivas de Raven (CPM, SPM, APM)].

INÊS RODRIGUES 65
Este modelo tem como objetivos a descrição (identificar as características mais importantes do
comportamento do sujeito a partir dos dados obtidos através de diferentes técnicas de avaliação), a
classificação (organização da informação em função de critérios previamente estabelecidos) e a
predição (estabelecer a previsão probabilística de uma conduta futura através da condição atual).
O grande problema deste modelo é o debate entre a consistência e estabilidade versus
inconsistência e especificidade do comportamento (perspectivas situacionais). Mischel fundamenta a
ideia de inconsistência da conduta em estudos de comportamentos muito específicos e pontuais mais
influenciados pela situação do que pela trajectória comportamental da vida real.

2. Modelo Psicodinâmico/Psicanalítico
A conduta é determinada por instâncias intrapsíquicas e pulsões/instintos, sendo o
comportamento função do organismo (O). No entanto, o conceito de organismo não se circunscreve aos
elementos fisiológicos do corpo humano e inclui as funções psíquicas que se encontram em toda a
atividade psicológica e cuja perturbação é a causa dos sintomas neuróticos, psicóticos e histéricos. O
aparelho psíquico (psiquismo) seria composto por uma série de instâncias ou sistemas, absolutamente
independentes da anatomia real do cérebro. Este modelo provém, essencialmente, dos trabalhos de
Freud. A avaliação psicológica desenvolve-se em torno de três eixos fundamentais:
 Sistema dinâmico da conduta: É constituído pelas pulsões (fonte energética motivadora da
conduta) cujo objetivo pulsional é a redução da tensão. A quantidade de energia de um
organismo é limitada, mas não estática, podendo adotar formas de expressão muito distintas
através de diferentes canais. As grandes categorias pulsionais são as pulsões de vida
(impulsos sexuais, líbido, autoconservação) e as pulsões de morte (tendência de retorno
estado primitivo). As pulsões, os conflitos entre pulsões e os mecanismos de defesa
elaborados para reduzir a angústia dão lugar a processos mentais;
 Organização ou estrutura da personalidade: Numa concepção topográfica, refere-se aos
graus distintos de consciencialização que um sujeito pode ter relativamente ao seu próprio
comportamento: conduta consciente, pré-consciente e inconsciente. A nível de concepção
estrutural, estas correspondem ao Ego, Super-Ego e Id, respetivamente;
 Etapas do desenvolvimento: Estádios de desenvolvimento psicoafetivos ligados pelas
necessidades biológicas primárias do sujeito em distintas zonas erógenas: estádios pré-
genitais (1-3 anos); estádio do complexo de Édipo (4-7 anos); período de latência (7-12
anos); período genital (puberdade e adolescência).

O principal objetivo deste modelo é a análise da estrutura intrapsíquica do sujeito, entendida


como a resultante do equilíbrio dinâmico entre diferentes instâncias. Existe uma ênfase na história

INÊS RODRIGUES 66
passada dos sujeitos, sendo dada importância a esta história, às elaborações mentais/subjetivas e aos
motivos latentes.
Este modelo utiliza o método indutivo, isto é, a partir de observações clínicas são inferidos
elementos dinâmicos e estruturais que dão corpo à conduta. A investigação consiste em técnicas
basicamente clínicas (há uma reduzida preocupação com as questões psicométricas como a validade de
constructo). A avaliação ideográfica coloca a sua ênfase no sujeito concreto, relativamente ao qual se
tenta captar a sua personalidade de um modo global.
As técnicas mais utilizadas são entrevistas livres ou semiestruturadas, associação livre, análise
dos sonhos, lapsos e esquecimentos, e técnicas projetivas, isto é, tudo o que facilite a introdução à vida
mental inconsciente do sujeito. O principal problema é o determinismo fisicalista versus conceção
probabilística; a cientificidade deste modelo seria imune à refutabilidade (por exemplo, a problemática
da redução da tensão).

3. Modelo Fenomenológico, Humanista, Existencial


O homem é concebido como um ser com um potencial de crescimento positivo, com uma
capacidade inata e criativa, que o impele para a auto-realização e aperfeiçoamento (conceção contrária
às ideias freudianas de uma conduta predeterminada pela força do instinto/pulsões e para elementos
que escapam à vontade e consciência). A ênfase na perspetiva existencialista remete para aspetos como:
(i) relevo para a consciência de si mesmo e para a sua capacidade de escolha; (ii) conceção do homem
como ser em constante evolução e mudança; (iii) cada pessoa tem capacidade para transcender o
mundo físico. Homem como ser holístico e ativo do ponto de vista percetivo; os pensamentos,
sentimentos, acções, perceções e processos biológicos interrelacionam-se de forma inseparável e
interatuam com o mundo que o rodeia. As origens deste modelo estão no autor Carl Rogers, algo
influenciado pela psicologia individual de A. Adler e de O. Rank.
O modelo fenomenológico, humanista e existencial centra-se no estudo das experiências
subjetivas do individuo, no significado que este atribui aos acontecimentos da realidade, e na forma
como se percebe a si próprio. Existe um primado dos aspetos dinâmicos da conduta relativamente aos
aspetos permanentes ou estruturais, apesar de ambos os aspetos estarem presentes, e enfatiza-se a
diferença entre o eu real (o que o indivíduo realmente é) e o eu ideal (aquilo que o indivíduo idealiza
ser). Além disto, a avaliação neste contexto não se centra naquilo que a pessoa é, mas sim no potencial
que tem para chegar a ser.
Relativamente a aspetos metodológicos, o essencial é a relação de compreensão empática e de
aceitação incondicional. A técnica principal é a entrevista livre ou não estruturada, incluindo a análise
de conteúdo, e as técnicas projetivas (as provas psicométricas são utilizadas apenas num contexto de
investigação).

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