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7- Winnicott e sua teorização sobre a

criança

Donald Woods Winnicott, nasceu em


7 de abril de 1896, em Plymouth. Era filho
de Elizabeth Martha e do Sr. John
Frederick Winnicott. Winnicott se sentia
oprimido por sua mãe com tendências
depressivas. Apesar disso, a família
aparentava ser uma família feliz. Winnicott
decide se tornar médico e em 1927 foi
aceito como iniciante na sociedade
britânica psicanalítica. Foi reconhecido
como psicanalista em 1934.

Winnicott morreu em 25 de janeiro de


1971, aos 74 anos de idade.

Conceitos

Winnicott afirma a inexistência do bebê no


sentido coloquial do termo. Ele afirma que
a existência não está dada. O bebe só
existe dentro de um ambiente que o
sustenta, ou holding. Winnicott tem uma
crítica a psicanálise tradicional por lidar
com pessoas inteiras e desconsiderar a
pessoa em formação, a indeterminação
do ser.

Segundo Winnicott, o ser humano


herda algo e esse algo é a tendência a
integração, que será a base para o
desenvolvimento psicológico. Quando o
bebê nasce, ele não está integrado. As
particularidades estão afastadas e para
que essas individualidades formem algo
que faça sentido, é preciso que sejam
integradas. O outro que cuida desse
bebê, terá a função de juntar essas
partes, tornando-as uma unidade. Esse
outro, como ambiente que equivale a
função materna, vai funcionar como um
ego auxiliar. Ego auxiliar: é o papel que a
função materna exerce que define as
experiências do bebê. Essa função tem o
objetivo de simbolizar as experiências
vividas do bebê. Segundo essa teoria, o
bebê não pode sofrer traumas, pois é
necessário que exista alguém para ser
traumatizado. Nesse caso, como a
criança não é ainda um ego, fica uma
lacuna de significação e só o ego auxiliar
poderá simbolizar esse evento para a
criança. A integração sofre variações.
Quando a função materna está presente,
o self está integrado, mas quando ela se
distancia, volta-se a desintegrar. Essa
constância faz com que, em um momento,
essa integração se sustente de forma
permanente. Sobre as intervenções do
analista, é algo que não tem efeito
terapêutico, pela incapacidade que o
analisando tem de integrar, por se tratar
de um ser não determinado, não
finalizado. Essa intervenção satisfaria
mais o analista do que necessariamente o
paciente.

Winnicott baseia sua teoria na


dependência. Ele afirma que, com o
processo de integração, a dependência
vai diminuindo. Entretanto, depender
menos não significa não depender. A
dependência é eterna, porém diferente
em outras etapas da vida. Ela deixa de
ser uma dependência absoluta, onde o
bebe não existe sem o outro e passa a
ser uma dependência relativa, onde existe
o outro, levando rumo a independência.
Note que o termo rumo a independência é
usado para se referir a uma
independência que nunca irá existir. Na
velhice retornamos à dependência relativa
e posteriormente podemos retornar a uma
dependência absoluta.

Self: o self ou si mesmo é o todo. A


essência individual de cada sujeito. O self,
diferentemente do ego na visão freudiana,
é o todo da personalidade. O self dá uma
visão de totalidade, o distanciando do ego
que é uma parte da segunda tópica do
Freud.

Contemplamos o nosso self de forma


a não o distinguir do self do passado. Não
temos a percepção separada no self
presente para o self passado. O
contemplamos como sendo invariável.
Quando a caminhada de rumo a
independência ocorre de maneira
adequada e as experiências do self vão
sendo entregues, vai dar uma sensação
de que a vida vale apena ser vivida. Mas
quando isso não ocorre, o indivíduo vai ter
uma sensação de vazio, de um “qual o
sentido da vida”. Falso self: sempre na
presença muito intensa ou uma ausência
muito intensa, a criança não terá tempo
de integrar essas experiências. O self
ficará em posição de submissão ao outro,
surgindo o falso self. Segundo Winnicott,
em clínica, quanto mais dá certo na visão
do analista, menos efeitos positivos a
clínica vai gerar, por estar lidando com o
falso self.

Para Winnicott, o objetivo da clínica é


oferecer condições ambientais para o
paciente, a fim de que ele possa se
organizar, para ser algo em relação ao
analista. Diferente de outras abordagens,
Winnicott vê os sofrimentos psíquicos,
não como patologia, mas sim, como uma
tendência inata a integração, e se o
ambiente não oferece essas condições, a
integração para, provocando problemas
emocionais. Quando a integração para,
desenvolve-se o falso self para responder
o outro, e esse falso self, em relação
analista e analisando, cria uma relação
não autêntica, o que não vai gerar efeitos
terapêuticos no processo clinico. Com a
escuta autêntica, o paciente volta ao seu
desenvolvimento ou processo de
amadurecimento.

A função materna detém um estado


especial quando o bebê nasce, que
Winnicott chama de preocupação materna
primária. Esse conceito refere-se ao
estado inicial da mãe, após o nascimento
do bebê. Então ela desenvolve um estado
em que ela consegue suprir as
necessidades do bebê, como se, de
alguma forma, ela pudesse interpretar
exatamente o que o bebê está sentindo.
Mãe suficientemente boa. Esse conceito
refere-se a capacidade da função materna
de se colocar como ambiente adequado
para auxiliar o bebê, em seu processo de
amadurecimento. A mãe suficientemente
boa é aquela que é capaz de, não só
satisfazer as necessidades do bebê, mas
também de trazer falhas na medida certa,
para que o bebê possa se desenvolver de
forma adequada. No processo de
desenvolvimento, o indivíduo passa por
etapas, sendo elas Integração,
personalização e realização.

Saúde e doença em Winnicott

Saúde, para Winnicott, tem a ver com


sentir autenticidade de si, sentir que a
vida vale a pena ser vivida. Ele diz que é
mais difícil lidar com a saúde do que com
a doença. Ele se debruça na questão
psicossomática, com uma visão diferente
de corpo daquela apresentada pela
biologia. Para Winnicott, o indivíduo sente
com o corpo. Uma criança, quando fica
eufórica por alguma coisa, não só sorri,
mas expressa, de forma intensa, algumas
emoções. Então, para Winnicott, a
existência é uma experiência
psicossomática. Saúde é o processo
contínuo de amadurecimento. Quando
esse processo para, e não retorna, será
entendido como patologia.

Sobre a morte

Winnicott diz que a vida saudável é


uma vida com autenticidade, e que a
pessoa deve estar inteira para que possa
experienciar cada uma das situações.
Com isso, ele diz a seguinte frase: “Que
eu possa estar vivo quando eu morrer. ”
Com isso, Winnicott ressalta a
necessidade de experienciar a morte. De
estar inteiro nessa ocasião, para poder
integrar essa experiência. Por essas
experiências não terem sido integradas, a
tendência a integração leva o indivíduo a
essa direção. Em Freud, pode-se se
atribuir ao conceito de pulsão de morte e
em Lacan, pode ser atribuído ao processo
de repetição.

Sintomas

Os sintomas, para Winnicott, são mais


que questões orgânicas. São expressões
de sentimentos que se manifestam, por
alguma razão, incompreendida. Para ele,
adoecimento tem a ver com soluções
inteligentes para os conflitos emocionais.
O sintoma emerge como uma via de auto
cura. Na visão de Winnicott, a psicanálise
deve direcionar o paciente para o que ele
chama de auto cura. O analista deve
promover um ambiente que possibilite o
processo de integração. Ele diz que não é
o sintoma em si, mas o uso que se faz do
sintoma que o torna patológico. Quando
os sintomas se tornam padrões de
doenças, quando eles se tornam
ineficazes como comunicação, do
contrário, os sintomas têm uma função
importante nas relações sociais. A
integração dos sintomas, o que
chamamos de destino criativo dos
sintomas, é o que vai gerar a
diferenciação dos sintomas não
patológicos e dos sintomas patológicos.

As falhas ambientais

Um ambiente, para ser saudável, deve


ter a capacidade, não só de saciar as
necessidades do bebê, mas também de
falhar. Essas falhas são cruciais para o
desenvolvimento. Na dependência
relativa, a falha ambiental vai criar uma
experiência de não confiabilidade no
outro, na fase adulta, pois quando a
derivação da dependência relativa
ocorrer, a derivação de falha ambiental
também vai surgir, gerando desconfiança
por parte do indivíduo. Então, isso vai
testar o ambiente para ver se ele se
mantém. Para Freud, a realidade tem a
ver com a frustração. Para Winnicott, tem
a ver com segurança, pois a esperança
de que o ambiente se mantenha, gera
esse sentimento de segurança. Levando
essa base conceitual para a relação
analista x analisando, o analisando ataca
o analista de diversas formas, fazendo
uma testagem ambiental. Diferentemente
da abordagem freudiana, o analista
devolve isso. Ele mantém sua condição
de ambiente.

Winnicott atende uma paciente


chamada Margaret I. Little. Em uma
sessão, ela destrói o consultório de
Winnicott e ele sai da sala enquanto ela
destruía. Depois ele volta e diz a ela: “até
a próxima sessão”. Ela se surpreende,
pois achava que não haveria próxima
sessão. Isso que Winnicott faz é a
sobrevivência do ambiente. Ele devolve
como uma forma de manter-se como
ambiente estável.

As psicoses e o cuidado materno

Para Winnicott, existe uma psicose na


fase inicial da vida, e essa psicose iria se
desenvolvendo até chegar ao ponto de se
tornar outra coisa. O estado inicial do
bebê poderia ser correlato ao que seria a
psicose na fase adulta. Winnicott chama
de abstração do mundo exterior, o que ele
vivencia num trabalho que ele fez com
doze pacientes psicóticos. Ele observava
que os barulhos que estava externo ao
ambiente, não afetava os pacientes
psicóticos. Para ele, a psicose em
adultos, é uma deficiência materna
precoce na fase inicial da vida. Uma falha
ambiental.

A inconstância psíquica

A instabilidade emocional,
diferentemente da visão freudiana, em
Winnicott, se trata, não de forças opostas
incompatíveis em conflito, mas sim, da
localização do self no corpo. O estado
inicial não integrado, graças a função
materna, vai se juntar, dando a
possibilidade da integração referencial, o
que vai dar a condição de experienciar ou
integrar. Isso vai gerar um senso de
autenticidade que precisa habitar em
algum lugar. Essa tentativa de habitar em
algum lugar vai promover a junção entre
mente e corpo. No geral, ele considera
mente e corpo como um conluio
psicossomático. Vamos imaginar o
exemplo de quando você começa a
aprender a digitar no teclado do
computador. No início é preciso ficar
olhando cada tecla que vai pressionar.
Com o tempo, começa-se a digitar sem
olhar porque o teclado vai sendo
integrado a psique. É como se fosse uma
extensão do nosso próprio corpo.
Algumas pessoas têm dificuldade em lidar
com sua própria imagem ou até mesmo,
de se reconhecer no espelho ou em
fotografias. Isso se dá por uma dicotomia
entre corpo e mente, que é produzida pelo
falso self e a dificuldade de localizar o
verdadeiro self no corpo. O falso self vai
surgir como uma proteção ao verdadeiro
self. No processo de desenvolvimento, o
ambiente vai tentar integrar algo que o
bebê não necessita mais e o self
verdadeiro vai articular uma forma de
resolver isso. Então, vai se criar um falso
self que é um mecanismo de defesa do
self verdadeiro. O desejo do ambiente vai
interagir diretamente no bebê, que vai
produzir esse falso self. O falso self surge
para lidar com as falhas ambientais que
podem ser falta ou excesso.

Ilusão e realidade.

A ilusão, em Winnicott, se distancia da


tentativa de fuga da realidade. A ilusão é
criada quando as necessidades do bebê
se encontram com a tentativa do
ambiente de satisfazer essa necessidade,
e nesse encontro se dá a ilusão ou
realidade externa. Esse encontro requer
dois participantes, mas para o bebê é
uma experiência de uma única unidade.
Para Freud, a realidade está vinculada a
frustração, já em Winnicott, está mais a
vontade para a satisfação.

O inconsciente para Winnicott


O inconsciente, para Winnicott, trata-
se de circunstâncias que não puderam ser
experienciadas, por estarem em um
período onde não se tratava de uma
pessoa inteira, mas de um indivíduo em
formação, impossibilitando a integração
total. Esse é o inconsciente que está do
lado de fora do indivíduo. A clínica do não
vivido ou clínica do vazio. Diferentemente
da visão de outros, o trauma em Winnicott
está relacionado a experiências não
vividas. Em outros autores, não existe
trauma que fuja a onipotência do ser.
Esse é o ponto principal da discordância
de Winnicott. Ele chama de experiência
comprometida.

Criatividade

Winnicott, em associação a clínica do


não vivido, vai afirmar que só existe
experiência quando existe um ego para
legitimá-las. Conclui-se que exista um ego
anterior ao citado nas obras freudianas,
pois do contrário, as experiências ficariam
perdidas. Onde existe o id do bebê, existe
um ego materno para auxiliá-lo. Desse
ponto, começamos a entender a
criatividade. Sempre que o id tem
necessidades de algo, aparece o seio.
Pelo estado de preocupação materna
primária, deduz que a necessidade é o
seio. Vai se criar uma sensação no bebê
de que encontrou o que precisava sem
saber o que precisava. O termo “primeira
mamada teórica” refere-se a repetição
dessa ação citada anteriormente. Essa
constância vai gerar no bebê, a ilusão de
que ele cria o seio. Uma forma de
onipotência. Essa sensação vai se
perpetuar em outras áreas da vida, nas
fases posteriores.
Sobre a técnica em Winnicott

As particularidades da psicanálise
Winnicottiana vão dar origem a um
modelo unido de atendimento. Tratam-se
de três particularidades mais expressivas.
A alteração de relação objetal para
ambiental vai mudar a percepção do
processo de análise com crianças. Isso
porque, na relação objetal, tem-se dois
objetos: mãe e criança. Mas na relação
ambiental só se tem dois na visão de
quem está de fora, pois na percepção do
bebê, essa é uma relação de unidade. Em
Winnicott, o bebê não existe. Ele é
indeterminado, por estar em formação.
Esse é um segundo elemento particular
que vai contribuir para uma modificação
na estrutura clínica. A terceira
particularidade é a exploração do conceito
de dependência. Ele chama de
dependência absoluta, dependência
relativa e rumo a independência. No
setting analítico, Winnicott diz que o
analista deve se colocar na posição de
ambiente que sustenta, um ego auxiliar.
Isso porque a relação que se estabelece é
uma relação de dependência. O bebê,
sendo compreendido como uma
indeterminação, não ficará isolado da
função materna e isso se justifica pelo
conceito de dependência. O analista,
como ego auxiliar que suporta as faltas do
paciente, deve se atentar para não
exagerar na função de suporte, pois
precisamos considerar o conceito de mãe
suficientemente boa, que é aquele que
tem falhas na medida certa. É necessário
falhar para que o paciente possa ser.

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