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PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL

AÇÃO ORDINÁRIA.
PROCESSO N.º 2001.61.00.006078-6.
AUTORES: BERNADETE RODRIGUES DA SILVA, VALDEMIR
ALMEIDA LIMA, KATIA CILENE PEREIRA, ARLENE ABRAHÃO
NEGRÃO, CLARICE AZZONI ZACCAS, EDIVANIA GRACIOLI, NADIR
DE SOUZA PEREIRA, ROSANA CARDOSO, ISMAEL MAFRA CABRAL
E VALDIRENE APARECIDA MARQUES PERES.
RÉ: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL.
13a. VARA FEDERAL.
JUIZ FEDERAL: DR. WILSON ZAUHY FILHO.

Trata-se de ação de indenização pelo rito


comum ordinário, proposta em face da Caixa Econômica Federal, em que
os autores buscam a condenação da ré ao ressarcimento pelos danos
materiais que lhes foram causados, aduzindo, em síntese, o seguinte:
celebraram com a requerida contrato de mútuo de dinheiro com garantia
pignoratícia, disciplinado pelo Decreto-lei n.º 759, de 12 de agosto de
1.969, tendo como objeto de garantia jóias de uso pessoal; antes do
vencimento do contrato, no entanto, tomaram conhecimento de que a
agência bancária onde as jóias estavam depositadas fora roubada em 24
de outubro de 1999; que a indenização prevista para o caso de extravio
ou dano dos bens empenhados significa verdadeira cláusula de não
indenizar, isso porque a avaliação feita pela requerida, no momento da
contratação, é inadequada ao real valor dos bens. Invocam a culpa in
vigilando da requerida, tendo ocorrido o afrouxamento das normas de
segurança, uma vez que os assaltantes permaneceram dentro da
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agência roubada por mais de 7 (sete) horas, bem como a


responsabilidade objetiva do credor pignoratício previsto no art. 774,
incido IV, do Código Civil de 1916, e a responsabilidade objetiva derivada
da prestação de serviços prevista no art. 14, § 1º, do Código de Defesa
do Consumidor. Requerem, ao final, a reparação por danos materiais,
compreendendo a indenização o pagamento da diferença entre o previsto
na apólice e o efetivo valor dos bens.
Os autores juntaram documentos a fls. 15/130.
Regularmente citada, a CEF apresentou
contestação às fls. 74/163, alegando, preliminarmente, (a) a carência de
ação diante de sua ilegitimidade passiva, em razão de os atos
mencionados terem sido praticados por terceiros; (b) a ausência de
interesse processual dos autores, tendo em vista que cumpriu com sua
obrigação de indenizar ante a aplicação de cláusula contratual que previu
expressamente o pagamento da indenização na hipótese de perda ou
desaparecimento das jóias. No mérito, diz que (a) houve quitação de
valores previstos nas cautelas, não fazendo os autores a ressalva
prevista no artigo 1.531 do C.Civ, e, no (b) terreno da responsabilidade
civil diz que o evento decorreu de falha da segurança pública,
circunstância que caracteriza força maior, que afasta sua
responsabilidade pelo evento danoso; alega ainda que (c) o valor previsto
em contrato para indenização em caso de roubo deve ser respeitada , (d)
que não se aplica ao caso o Código de Defesa do Consumidor “pois,
como agente financeiro, apenas entabulou um contrato bancário com os
autores”, reportando-se em sua fundamentação a parecer doutrinário e,
por fim, que não se há de falar em indenização em razão de valor
sentimental, pois se ele existisse em relação às jóias, elas “não deveriam
ser oferecidas como garantia de dívida”. Requer, por fim, a
improcedência dos pedidos (fls. 140/225).

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Intimados, os autores apresentaram réplica (fls.


229/250).
Instadas à especificação de provas (fls. 189),
os autores requisitaram a realização de prova pericial a fim de aferir o
valor real de mercado das jóias oferecidas em penhor (fls. 252/254),
enquanto que transcorreu o prazo para manifestação da Caixa
Econômica Federal (fls. 262).
No despacho de fls. 265 dos autos, foi
determinada a realização da prova pericial, sendo que os autores
indicaram o assistente técnico e apresentaram quesitos (fls. 277/279).
Laudo pericial acostado às fls. 289/293, dos
quais as partes se manifestaram. A requerida apresentou quesitos
suplementares, que foram recebidos como esclarecimento do laudo
pericial (fls. 317). O perito apresentou os esclarecimentos ao laudo
pericial (fls. 321/334), dos quais as partes se manifestaram.
Designada Audiência de Instrução e
Julgamento (fls. 443/453), na qual foram ouvidos o Sr. Perito Judicial e a
preposta da Caixa Econômica Federal, sendo formulado agravo retido
pelo patrono da requerida quanto ao indeferimento de pergunta à
representante da CEF. O pedido dos autores para determinar ao perito a
complementação de seu laudo, mediante a atribuição de valores às jóias
dadas em penhor foi deferido, concedendo-se o prazo de 60 (sessenta)
dias para entrega do laudo complementar.
Laudo complementar acostado às fls. 465, no
qual o perito atribuiu os valores das jóias dadas em penhor, dos quais as
partes se manifestaram. Posteriormente, os autos vieram-me conclusos.

É O RELATÓRIO.
DECIDO.

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A preliminar levantada pela requerida de


ilegitimidade passiva ad causam, na verdade se confunde com o próprio
mérito do pedido, que envolve o reconhecimento da responsabilidade
efetiva pelos danos causados aos autores, devendo ser apreciado com o
exame da questão de fundo.
Como se depreende da exposição inicial, o
móvel da indenização pretendida pela autora no presente feito decorre de
conduta atribuída à requerida de não exercício de vigilância da agência
bancária em que os fatos ocorreram, o que teria permitido a prática do
roubo que causou o dano noticiado.
Em relação a preliminar de interesse de agir
argüida pela requerida, não há de se cogitar sua ocorrência, já que os
autores igualmente têm legitimidade para a pretensão do direito material
deduzido, pois o fato de terem recebido a indenização pactuada não lhes
retira a possibilidade de pleitear a complementação da indenização.
Passo a apreciar a questão de fundo.
Verifica-se inicialmente que três questões
devem ser enfrentadas, de modo sucessivo, para a adequada solução da
lide, a primeira que diz com a existência de efetiva responsabilidade da
requerida pelo evento danoso, a segunda que reclama considerações
acerca do critério de avaliação dos bens dados em penhor, em particular
se ele importaria na redução significativa do valor de mercado das jóias
dadas em garantia e, a terceira, se respondida afirmativa a segunda
questão, qual seria o valor adequado para a justa indenização pecuniária
dos autores.
No tocante ao tema da responsabilidade das
instituições bancária pela guarda e segurança de seus clientes e de bens
a estes pertencentes, não serve para a exclusão dessa imputação o fato
de não existir a adequada segurança prestada pelo poder público, não

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podendo essa modalidade genérica de prestação de serviço ser invocada


para afastar a responsabilidade direta e pessoal de instituição bancária.
A propósito, é relevante consignar, voltando
vistas ao caso concreto, que a agência em que ocorreu o furto das jóias
dadas em penhor, encontrava-se fechada, já que era domingo, estando
de plantão o segurança da agência bancária, que ao ouvir bater na porta
da agência, avistou o veículo da empresa de segurança e três homens,
dois uniformizados e outro de traje social, dizendo-se supervisores, sendo
certo abriu a porta da agência e foi rendido, negligenciado o segurança
que não solicitou identificação dos homens, circunstância que de certo
modo facilitou a atuação dos meliantes.
Ademais, a instituição bancária não deveria só
contratar a empresa de segurança, como também disponibilizar meios
ainda mais adequados e seguros para a proteção do patrimônio de
terceiros, que se encontrava temporariamente sob sua guarda.
Assim, não vejo como se possa afastar a
responsabilidade da requerida ao argumento de que o ato ilícito e danoso
foi causado por terceiros, isso porque a prática do ilícito ocorreu nas
dependências da requerida, não se justificando a pretendida transferência
de responsabilidade.
Esse tema, aliás, já foi enfrentado pelo
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, que concluiu pela legitimidade de
instituição bancária para responder por fatos ocorridos em suas
dependências, verbis:

“EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO.


FURTO DE TALONÁRIO DE CHEQUES NO INTERIOR DE AGÊNCIA
BANCÁRIA. CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR. CC, ART. 1.058. NÃO
CONFIGURAÇÃO. PREVISIBILIDADE DO FATO. DANO MORAL.
RESSARCIMENTO DEVIDO.

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I – A segurança é prestação essencial à


atividade bancária.
II – Não configura caso fortuito ou força
maior, para efeito de isenção de responsabilidade civil, a ação de
terceiro que furta, do interior do próprio banco, talonário de cheques e
cartão de garantia emitidos em favor de cliente do estabelecimento.
III – Ressarcimento devido ao autor, pela
reparação dos danos morais por ele sofridos pela circulação de cheques
falsos em seu nome, gerando diversas cobranças administrativas e,
inclusive, uma judicial, em que chegaram a ser penhorados, no curso de
ação de execução, bens do seu patrimônio.
IV – Recurso especial não conhecido.”
(RESP 126.819/GO, Rel. Min. ALDIR
PASSARINHO JÚNIOR, in DJU. 21.agosto.2000).

No voto proferido no precedente cita, o Ministro


ALDIR PASSARINHO JÚNIOR fundamenta o seu entendimento aduzindo
o seguinte:

“Com efeito, cuida-se de um banco, que


tem como uma de suas funções precípuas, senão a mais importante, a
guarda do dinheiro e dos demais bens que lhe são confiados, até jóias,
quando mantém cofres particulares postos a serviço de seus clientes.
Portanto, evidentemente que tudo o que cerca as suas atividades, sejam
elas atividades-meio ou fim, deve merecer cuidado absoluto, pois a
fidúcia é um fator inerente e essencial aos negócios bancários. O
cheque é uma ordem de pagamento a vista. Equivale a dinheiro, de
sorte que, ocioso até discorrer-se a respeito, há de ser guardado com a
máxima segurança, dizendo-se o mesmo do cartão de saque fornecido
ao cliente. Inadmissível, assim, escusar-se o banco de ressarcir o

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autor ao argumento de que não pode ser responsabilidade por


furtos ou roubos no interior do estabelecimento.
....
Destarte, descabido, mais do que isso,
absolutamente incongruente, que se exima, pela “janela” do caso
fortuito e da força maior, uma casa bancária, por furto de talão de
cheques e cartão dentro do estabelecimento, situação de total
previsibilidade e, por isso mesmo, resistível e evitável.” (grifei).

Como se vê a Jurisprudência é firme no


sentido de reconhecer a responsabilidade das casas bancárias pela
guarda e segurança de seus usuários e de papéis e valores que se
encontrem sob sua responsabilidade, não se prestando para afastá-la a
alegação de que o ato ilícito foi praticado por terceiros...
Fixada essa premissa inicial, passo a analisar
o outro ponto do pedido, que diz com o critério de avaliação das jóias
empenhadas, que teriam influência direta na reparação patrimonial
questionada pelos autores.
As cautelas que materializam o contrato de
penhor firmado pelos autores e a requerida estabelecem de maneira
geral que “a garantia que se extraviar ou sofrer danos na CEF, cuja
recuperação não alcance o valor da avaliação do contrato, será
indenizada em 1,5 (um inteiro e cinco décimos) vezes o valor de sua
avaliação devidamente atualizada monetariamente com base na
variação do índice de correção das contas de poupança verificado
desde a data de assinatura do contrato até a data do pagamento”,
prevendo ainda que “do valor da indenização será deduzido o débito do
contrato”.
Não obstante a previsão de ressarcimento, que
a requerida tem cumprido quando da ocorrência de furto ou roubo dos

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bens dados em garantia, o certo é que os autores questionam a própria


avaliação inicial das jóias, por ocasião da celebração do contrato que,
uma vez subdimensionadas, gerariam, na hipótese de extravio da
garantia, uma indenização aquém daquela efetivamente devida.
Acerca desse ponto do pedido, foi realizada
perícia por profissional de gemologia, que ao responder os quesitos
formulados pelos autores, sobre a possibilidade das avaliações
procedidas pela Caixa Econômica Federal descreverem de forma
circunstanciada as peças dadas em penhor, tais como categoria das
pedras, medidas, peso, montagem, formato, tipo de lapidação, cor,
pureza, enfim, suas propriedade, bem como sobre a possibilidade de tais
avaliações poderem realizar um exame minucioso em pedras
incrustradas, se manifestou no seguinte sentido, in verbis

“A avaliação procedida nas diversas seções


de penhor da CEF existentes na cidade de São Paulo não é feita de
forma circunstanciada. A simples leitura de uma cautela revela esse
fato. Em pedras cravadas não é possível um exame minucioso.”
(grifei)

Em relação ao quesito referente à


aparelhagem utilizada pela Caixa Econômica Federal para análise dos
componentes das jóias (gemas e metais), respondeu o perito:

“Pelo que pude informar-me a CEF dispõe


de alguns instrumentos especializados, mas deles não faz uso. Os
avaliadores se utilizam fazem isso apenas de uma “pedra de toque”
e a partir dela definem se é ouro 18k, 14k ou ouro baixo, uma lupa e
uma balança para aferir o peso da jóia, ou conjunto de peças.”
(grifei)

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Sobre o quesito da importância da ourivesaria


em relação ao valor da jóia, esclareceu o perito:

“Sim há um trabalho de criação, design,


fundição e acabamento, que se define por ourivesaria. O valor de uma
jóia é dado pelo trabalho de ourivesaria associado ao tipo de
material utilizado e sua quantidade, prevalecendo o primeiro item.”
(grifei)

Na conclusão do laudo, o perito manifestou-se


sobre a diferença existente entre o valor arbitrado pela requerida nos
contratos de penhor e o valor real das jóias, bem como sobre o critério de
avaliação das jóias dadas em penhor utilizada pela requerida, in verbis:

“Após avaliarmos quase uma centena de


jóias, posteriormente colocadas no penhor da CEF, através da avaliação
de pelo menos 6 diferentes funcionários-avaliadores daquela instituição,
pudemos estabelecer um parâmetro confiável, sem qualquer receio
de engano, ou erro, de que a Caixa Econômica Federal avalia as
jóias que penhora entre 10 e 14% (dez e quatorze porcento) quando
há predomínio de ouro nas peças e entre 8 e 12% (oito e doze
porcento) para as jóias onde predominam as pedras de qualquer
natureza. No quesito diamantes (brilhantes) a avaliação da CEF é
muito mais conservadora chegando, de acordo com nosso
testemunho, à penhoras peças por até 5% (cinco porcento) de seu
valor de mercado.
Ao fim do nosso trabalho resolvemos
conversar com um avaliador da CEF para sabermos o porque de tão
baixa avaliação para peças com nítido trabalho de alta ourivesaria.
Esse senhor nos informou que se as peças não forem resgatadas, a
instituição as coloca em leilão e nesse os valores auferidos são

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muitos baixos, não podendo a Caixa correr o menor risco na


operação. Esta foi à explicação dada como justificativa para os
valores tão diversos entre os de mercado e aqueles atribuídos por
ela.
Resumidamente, pudemos concluir que a
Caixa Econômica Federal avalia as jóias a ela penhorada entre 8%
(oito porcento) e 14% (quatorze porcento) de seu valor de
mercado.”(grifei)

Em audiência, na qual foi realizada a oitiva do


perito, este confirmou a conclusão do laudo, in verbis:

“... esclarece o perito que para chegar à


conclusão de seu lado, utilizou uma metodologia empírica, consistente
na entrega de jóias de sua esposa em penhor na CEF, tudo após visitar
quatro agências e informar-se dos critérios utilizados para a avaliação
da jóias entregues em penhor; verificou em razão disso que a
requerida utiliza um critério de avaliação que leva em conta o risco
de não se resgatar essa mercadoria em eventual leilão pelo preço
da avaliação; em razão disso, avaliam-se as jóias, dependendo de
sua natureza, entre 6 a 14% de seu valor de mercado. (grifei)

O que se vê num primeiro momento, tanto na


conclusão do laudo como no depoimento pessoal do perito, é que
efetivamente a requerida não possui uma metodologia técnica e uniforme
para a avaliação de jóias que são dadas em penhor, ao desconsiderar o
valor dos metais, e levar em conta o risco econômico que a operação
possa lhe trazer, quando as jóias não são resgatadas pelos clientes que
realizam o contrato de penhor e não alcançam o preço da avaliação
posteriormente no leilão.

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Essa constatação feita pelo perito é confirmada


pela avaliadora da Caixa Econômica Federal que, ouvida em audiência,
esclareceu como é feita a avaliação das peças dadas em garantia de
penhor, verbis:

“Informa que quando da avaliação das jóias


dada em penhor leva-se em conta uma tabela elaborada periodicamente
pela própria CEF, em que as jóias são classificadas segundo faixas ou
categorias; a essa tabela agregam-se também os percentuais de
aceitação dessas mesmas jóias no “mercado de licitação” da
própria CEF; esse critério de risco na venda eventual das jóias não
é no entanto determinante na avaliação das jóias, mas apenas um
dado a mais na definição do valor da mercadoria.
...
Informa a depoente que a metodologia
utilizada na avaliação das jóias leva em conta, na hipótese de a peça ser
confeccionada em ouro, o peso dessa jóias, descontando-se o
correspondente à liga utilizada em sua confecção; em algumas
situações, valendo-se naturalmente do bom senso, o avaliador
considera também o desenho dessa jóia para atribuição de valor.
Quando a peça em ouro contenha gemas não sintéticas, como
pérola, por exemplo, avalia-se a peça segundo o peso, convertido
em ouro, não se avaliando individualmente essa gema. Quando se
trata de peça em ouro e diamantes, é realizada a avaliação
individualizada do ouro e do diamante. Na avaliação do diamante não
é discriminada a peça em que ele se encontra posto que as
cautelas não descem a essa minúcia descritiva, sendo bastante
genérica quando da identificação das peças. Esclarece ainda que
quando se trata da gema sintética, o seu valor é também auferido
no critério peso/ouro e descontado do peso total da peça
apresentada.
(...)
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...a depoente exerce a atribuição de


avaliadora na mesma agência Senador Fláquer há seis anos, sendo que
no primeiro ano exercia essa atribuição de modo eventual, mas nos
últimos cinco anos realiza de forma efetiva essa atividade. Esclarece
que os avaliadores da CEF são recrutados dentre os próprios
empregados, mediante concurso interno e, após a classificação
desse concurso, a CEF oferece um curso de formação de
avaliadores. Esclarece que esse curso é dado pela própria CEF
tendo em conta que ela detém a exclusividade das operações de
penhor. Para torna-se avaliador da CEF não é necessária nenhuma
formação ou escolaridade específica, mas a depoente possui
graduação em Química; atualmente também não é exigida nenhuma
formação prévia para torna-se avaliador da CEF. (grifei)

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Como se vê, a requerida, ao promover a


avaliação de peças utiliza-se de uma tabela por ela elaborada
periodicamente, na qual leva em conta a aceitação dessas jóias no
“mercado de licitação” da própria requerida, sendo que o critério de risco
da venda eventual das jóias é um dado que pode refletir na definição do
valor da jóia. Além disso, a requerida não tem um critério uniforme para a
avaliação das jóias, uma vez que alguns elementos que agregam valor à
jóia, como seu desenho, são considerados de forma subjetiva pelos
avaliadores da requerida, dependendo de seu “bom senso”.
Deve-se frisar ainda, que na avaliação de jóias
que contenham gemas não sintéticas, a requerida não avalia
individualmente essa gema, levando em conta exclusivamente o peso da
peça, atribuindo-lhe o valor equivalente em ouro, e quando se trata de
jóias que contenham gema sintética, a requerida aufere seu valor no
critério peso/ouro, descontado a gema sintética do peso total da peça
apresentada.
Destarte, deve-se observar, que os avaliadores
da requerida não tem formação técnica e específica para a função de
avaliadores, possuindo apenas um curso de formação de avaliadores
oferecida pela própria requerida.
Evidente, portanto, que o critério de avaliação
da requerida é inadequado para que se possa afirmar, com segurança,
que o valor dado à peça objeto de garantia corresponda à realidade.
Essa conclusão, portanto, desautoriza também
que se aceite como suficiente à indenização prevista nos contratos de
penhor, pois se há subavaliação no momento do contrato, por certo que a
indenização, mesmo que com algum acréscimo sobre o valor atribuído à
garantia, restará também insuficiente, como decorrência lógica.
Diante da verificação da insuficiência da
avaliação das peças dadas em penhor, resta verificar se há nos autos
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elementos para quantificar a indenização postulada ou, mais


precisamente, se os critérios expostos pelo perito do Juízo são idôneos
para a fixação da responsabilidade da requerida.
Ao realizar a avaliação das jóias, como se
verificou no laudo complementar, o perito valeu-se das informações
constantes das respectivas cautelas, assim justificando sua conduta
verbis:

“...indagado acerca do valor de mercado


utilizado em seu trabalho, especificamente se esse valor reporta-se
ao mercado de jóias usadas ou de jóias nova, esclarece que
utilizou-se dos dados constantes das cautelas elaboradas no
momento do contrato de penhor, para atribuir o valor de mercado
de jóias usadas; esclarece no entanto que as jóias usadas, por vez,
atinge valor maior do que jóias novas, tudo a depender do tipo e
composição desse bem; a requerida no momento da avaliação não
leva em conta tanto o designer quanto a ourivesaria, o que torna
possível imaginar que, segundo esse critério, bastaria tomar por conta o
valor do metal nobre apresentado, descontado-se a quantidade utilizada
para a liga desse mesmo metal para se atingir o valor estimado da
garantia. Quanto à resposta dada ao quesito de nº 6 formulado pelos
autores (página 290/291), esclarece que não seria possível chegar-se
a minúcias pretendidas de avaliação do “valor da matéria prima
contida nas jóias” pois as cautelas não fornecem esses elementos;
em razão dessa subdivisão pretendida no questionamento é que
conclui pela dificuldade de execução dessa avaliação pretendida;
reafirma, no entanto, que desprezando-se essa subdivisão
pretendida, teria condições de realizar a avaliação indireta das
jóias, mediante os dados constantes das cautelas. (grifei)

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Como se depreende da exposição do perito, a


metodologia por ele utilizada comprovou ser a mais adequada, pois levou
em conta os dados constantes das cautelas elaboradas no momento
contrato de penhor, para atribuir o valor de mercado das jóias usadas.
Desta forma, o critério mostra-se razoável para
o efeito de permitir a exata indenização em prol dos autores.
Face a todo o exposto, JULGO PROCEDENTE
o pedido para o efeito de CONDENAR a requerida a indenizar aos
autores a perda das jóias dadas em penhor, nos seguintes montantes:
Bernadete Rodrigues da Silva, R$ 1.640,00 (um mil, seiscentos e
quarenta reais – cautela nº 1786-7); Valdemir Almeida Lima, R$
9.880,00 (nove mil, oitocentos e oitenta reais – cautela nº 608-3); Kátia
Cilene Pereira, R$ 31.905,00 (trinta e um mil, novecentos e cinco reais –
cautela nº 108.096-6); Arlene Abrahão Negrão, R$ 936,00 (novecentos
e trinta e seis reais – cautela nº 6.076-2); Clarice Azzoni Zaccas, R$
9.248,00 (nove mil, duzentos e quarenta e oito reais – cautela nº 3.228-9,
R$ 6.903,00 (seis mil, novecentos e três reais – cautela nº 3.844-9);
Edivania Gracioli, R$ 8.140,00 (oito mil, cento e quarenta reais – cautela
nº 10.981-8); Nadir de Oliveira Souza, R$ 1.040,00 (um mil e quarenta
reais – cautela nº 113.345-8); Rosana Cardoso, R$ 3.690,00 (três mil,
seiscentos e noventa reais – cautela nº 10.716-5); Ismael Mafra Cabral,
R$ 5.720,00 (cinco mil, setecentos e vinte reais – cautela nº 110.029-0) e
Valdirene Aparecida Marques Peres, R$ 1.638,00 (um mil e seiscentos
e trinta e oito reais – cautela nº 8.378-9) e R$ 6.690,00 (seis mil,
seiscentos e noventa reais – cautela nº 9.147-1).
Os valores ora estipulados serão corrigidos
pela variação da TAXA SELIC, compreensiva de correção monetária e
juros (STJ, REsp 98.0064944-1, Ministro José Delgado e STF, RE
363.777, Ministro Sydney Sanches), a partir da data das respectivas
avaliações feitas pela requerida nas cautelas.
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Por ocasião da liquidação da sentença deverão


ser abatidas desses valores as indenizações percebidas por alguns
autores, pagas pela requerida, segundo o pactuado no contrato de
penhor, valores que serão corrigidos pelos mesmos critérios definidos
para o pagamento da indenização ora determinada.
A liquidação de sentença far-se-á na
modalidade de cálculos aritméticos, segundo o disposto no artigo 604, do
CPC.
CONDENO a requerida ao pagamento de
verba honorária, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da
indenização devida aos autores, devidamente atualizada, bem como ao
pagamento de custas processuais.
P.R.I.
São Paulo, 31 de agosto de 2005.

WILSON ZAUHY FILHO


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