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zfflaE PODER JUDICIÁRIO


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTiCA
REGISTRADO(A) SOB N°

ACÓRDÃO I iiiiii mil iiiiijiiii uni iiiiijiiii um nu mi


Vistos, relatados e discutidos estes autos de
Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000, da Comarca de
São Paulo, em que são apelantes BANCO ABN AMRO REAL
S/A e ANTÔNIO CARLOS JORGE E OUTRO sendo apelado OS
MESMOS.

ACORDAM, em 11a Câmara de Direito Privado do


Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte
decisão: "POR MAIORIA, NEGARAM PROVIMENTO A AMBOS OS
RECURSOS, VENCIDO O REVISOR, QUE DAVA PROVIMENTO
PARCIAL AO RECURSO DO AUTOR E NEGAVA PROVIMENTO AO DO
RÉU. DECLARAM VOTOS O REVISOR E 3 o DESEMBARGADOR.",
de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que
integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos


Desembargadores GILBERTO DOS SANTOS (Presidente sem
voto), RÔMOLO RUSSO E MOURA RIBEIRO.

São Paulo, 10 de maio de 2012.

RENATO RANGEL DESINANO


RELATOR
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
1 I a Câmara de Direito Privado

Voto n° 5073
Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000
Comarca: São Paulo - 23a VC
Apelantes: Banco Abn Amro Real S/A, Antônio Carlos Jorge e Meire Alonso
Jorge
Apelado: Os Mesmos
Juiz(a) de Ia Inst.: Gustavo Santini Teodoro

Indenização por danos materiais e morais - Roubo


ocorrido em instituição financeira - Subtração de bens
armazenados nos cofres do banco - Previsão no contrato
sobre a impossibilidade de guarda de jóias e dinheiro nos
cofres - Infração contratual pelos autores - Validade da
cláusula limitativa de uso - O banco não pode ser
compelido a responsabilizar-se por obrigação maior que
a contratada -Recurso dos autores não provido.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - Fixação que


remunerou de forma condigna o patrono da parte, não
merecendo reparo ~ Recurso do réu não provido.

Cuida-se de recursos de apelação interpostos em


face da r. sentença, cujo relatório se adota, que julgou improcedente
"ação de ressarcimento de danos materiais e morais" ajuizada por
ANTÔNIO CARLOS JORGE e MEIRE ALONSO JORGE contra BANCO
ABN AMRO REAL S/A, tendo condenado os autores no pagamento das
custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em
R$ 5.000,00 (fls. 381/388).

Apelação n.° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo - Voto n° 5073


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1 Ia Câmara de Direito Privado

Inconformado apenas com o valor dos honorários


advocatícios, apela o Banco réu para fixá-los em 10% sobre o valor
atribuído à causa (fls. 394/402).

Os autores também recorreram. Alegam a nulidade


das cláusulas inseridas no contrato de adesão que não admitiam a
guarda de jóias e dinheiro no cofre do banco réu. Afirmam que houve
negligência na guarda e conservação dos bens dos clientes e da própria
agência bancária. Por fim, tendo em vista a comprovação da existência
dos bens, requerem seja acolhido o pedido de indenização.
«

Recursos recebidos e contrariados.

É o relatório.

PASSO A VOTAR.

Os recursos não merecem acolhida.

Depreende-se da narrativa da inicial que as partes,


em 29 de junho de 1998 e 23 de julho de 1998, entabularam "contrato de
locação de cofre" (fls. 30/31) e que em 1 de maio de 2000, tendo em vista
a ocorrência de roubo na agência do banco réu, foram subtraídos dos
autores jóias e dinheiro que se encontravam nos cofres locados. Daí
porque pleitearam indenização por danos materiais no valor de
US$655.000,00 e reparação pelos prejuízos morais sofridos em valor não

Apelação n.° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo - Voto n° 5073


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inferior a 3.600 salários mínimos (fls. 23/24).

Ocorre que os bens indicados na petição inicial não


poderiam ter sido guardados nos cofres, dada a vedação constante da
cláusula 9 do contrato, que dispõe:

*o($) locatârio(s) somente poderá(âo) guardar


documentos e títulos e valores mobiliários nominativos,
sendo expressamente vedada a guarda ou depósito de
títulos e valores mobiliários ao portador, dinheiro, jóias e
outros assemelhados (...)".

E não há que se falar em abusividade da cláusula


limitativa supra, pois não trata da exclusão da responsabilidade do banco
réu, mas apenas determina quais bens podem ou não ser guardados.

Tampouco há que falar em ignorância quanto aos


termos do contrato, pois os autores são pessoas esclarecidas, sendo
inconcebível que não tenham compreendido o quanto expresso
claramente na cláusula contratual.

Com efeito, o banco somente poderia responsabilizar-


se pelos objetos subtraídos, caso armazenados regularmente no interior
dos cofres. Sobre os bens indevidamente guardados, não há o dever de
proteção. Entender de modo contrário, seria equivalente a estimular o
descumprimento contratual.

Como bem explanou o douto juiz "a quo":

Apelação n.° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo - Voto n° 5073


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"Bem diferente é a cláusula limitativa de uso do


cofre, pois ela, como já assinalado, apenas limita as
obrigações assumidas pelo locador, de acordo com o
milenar princípio de que ninguém pode ser coagido a
assumir maior obrigação do que deseja. Essa é a própria
essência da liberdade de contratar; as partes manifestam
livremente a sua vontade, criando as obrigações que
entenderem possíveis. (...)
Se essa limitação era desinteressante para os
autores, bastava que não firmassem o contrato de
adesão, ou que pagassem mais por outros cofres, se o
caso em outro banco, que lhes desse p serviço desejado"
(fls. 387).

Ressalte-se que os contratantes têm acesso direto


aos cofres e o banco nem sequer tem ciência sobre o que é armazenado,
sendo-lhe obstada a análise da regularidade dos objetos inseridos nos
receptáculos.

Assim, diante da afronta ao contrato, os autores é que


devem arcar com eventual prejuízo decorrente do roubo de seus
pertences.

Nesse sentido:

"RECURSO ESPECIAL - CONTRATO DE


ALUGUEL DE COFRE - ROUBO - RESPONSABILIDADE
OBJETIVA - CLÁUSULA LIMITATIVA DE USO -
ABUSIVIDADE - INEXISTÊNCIA - DELIMITAÇÃO DA
EXTENSÃO DOS DIREITOS E DEVERES DAS PARTES
CONTRATANTES - RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
I - Os eventos "roubo" ou "furto", ocorrências
absolutamente previsíveis, a considerar os vultosos
valores mantidos sob a guarda da instituição financeira,

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que assume profissionalmente todos osriscosinerentes à


atividade bancária, não consubstanciam hipóteses de
força maior, mantendo-se, por conseguinte, incólume o
nexo de causalidade existente entre a conduta negligente
do banco e o prejuízo suportado por seu cliente;
II - A cláusula limitativa de uso, assim
compreendida como sendo aquela que determina quais
seriam os objetos que poderiam (ou não) ser
armazenados e sobre os quais recairiam (ou não) a
obrigação (indireta) de segurança e proteção, não se
confunde com a cláusula que exclui a responsabilidade
da instituição financeira anteriormente mencionada.
III - O contrato, ao limitar o uso do receptâculo
posto à disposição do cliente, preceitua que a instituição
financeira tem por obrigação zelar pela segurança e
incolumidade do receptâculo posto à disposição do
cliente, devendo ressarci-lo, na hipótese de roubo ou de
furto, os prejuízos referentes aos bens subtraídos que,
por contrato, poderiam encontrar-se no interior do
compartimento. Sobre os bens, indevidamente
armazenados, segundo o contrato, não há dever de
proteção, já que refoge, inclusive, do risco profissional
assumido;
IV - O Banco não tem acesso (nem ciência)
sobre o que é efetivamente armazenado, não podendo
impedir, por conseguinte, que o cliente infrinja os termos
contratados e insira, no interior do cofre, objeto sobre o
qual, por cláusula contratual (limitativa de uso), o banco
não se comprometeu a, indiretamente, proteger. Ê de se
ponderar, contudo, que, se o cliente assim proceder, deve
arcar com as conseqüências de eventuais perdas
decorrentes de roubo ou furto dos objetos não protegidos,
não havendo falar, nesse caso, em inadimplemento
contratual por parte da instituição financeira. Aliás, o
inadimplemento contratual é do cliente que inseriu
objetosobre o qual recaía expressa vedação de guarda;
V - Recurso Especial improvido" (Resp 1163137
/ SP, T3 - TERCEIRA TURMA ,v Rei. Ministro MASSAMI
UYEDA.j. 14.12.2010).

"RESPONSABILIDADE CIVIL - COFRE DE


ALUGUEL EM BANCO - CLÁUSULA LIMITATIVA DE

Apelação n.° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo - Voto n° 5073


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USO - VALIDADE - DISTINÇÃO DA CLÁUSULA DE NÃO


INDENIZAR" (TJ/SP, APELAÇÃO N° 7.104.338-4,
Vigésima Segunda Câmara da Seção de Direito Privado,
Rei. Matheus Fontes, j . 27.11.2007).

Quanto aos honorários advocatícios fixados em


R$5.000,00, não merecem alteração, eis que são suficientes para
remunerar de forma condigna o patrono da parte.

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento aos


recursos. í***/'

Renato Rangel Desinano


Relator

Apelação n.° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo - Voto n° 5073


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l i s câmara de Direito Privado

Voto n°. 3705

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000
Comarca: São Paulo - 23 a V C
Ação: Indenização
Apte(s): Banco ABN Amro Real S/A. e Antônio Carlos Jorge
e outra
Apdo(a)(s).: Os mesmos

Declaração de voto vencido

INDENIZAÇÃO. Cofre bancário. Negócio


Jurídico que se realiza em razão da
segurança prometida pela casa bancária.
Aplicabilidade do Cód. de Defesa do
Consumidor (Súmula 297 do STJ).

Contrato atípico. Negócio bancário que não


se aperfeiçoa à locação de coisa móvel,
nem tampouco ao contrato de depósito.
Inexistência de legislação específica.

Declínio da teoria da vontade na criação d<


cláusula. Força obrigatória decorrente
cláusula que desequilibra o consumidor
face do banco. Inadmissibilidade. Nprrtfa
privada que importa em vai
desproporcional e exagerada em fav^r^da
instituição bancária e leva a avença a\
inutilidade prática.

Cláusula que restringe o uso à guarda ée


documentos, títulos e valores nominativos.

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Vedação à guarda de dinheiro, joias e


assemelhados. Disposição que nega a
própria essência do negócio jurídico.
Cláusula potestativa que é vedada pela
sistemática civil (art. 122 do Cód. Civil).
Abuso no exercício do direito caracterizado
(art. 187 do Código Civil).

Limitação de uso que é iníqua. Restrições


que tornam o negócio imprestável.
Disposição que acarreta a viva ilusão. Lesão
aos princípios da função social do contrato
e da boa-fé objetiva (arts. 421 e 422 do Cód.
Civil), os quais presidem qualquer
interpretação. Restrição antijurídica.

Consensualismo da adesão que deve ser


relativizado a favor do consumidor. Exegese
pró-consumidor (art. 47 do CDC). Restrição
de uso que importa em nulidade da
limitação inserida na cláusula e não da
própria cláusula. Quebra da base objetiva e
desequilíbrio contratual. Abuso no exercício
do direito evidenciado. Incidência da
equidade. Aplicabilidade dos arts. 7o, 51,
incisos I, IV, XV c/c § 1 o , inciso I, II e III dcfl
CDC. //

INDENIZAÇÃO. Responsabilidade--fÀ\
objetiva. Inexistência de culpa exclusiva ao
consumidor (art. 14, § 3°, II, CDC). Rwfco7
inerente à atividade bancária. Dinheiro
deixado na cápsula de segurança. Prova dai
titularidade. Alienação de imóvel de arear
privativa de 337,42 m2. Propriedade de luxo
localizada em bairro nobre de São Paulo.
Percebimento de quantia relevante/ e
anterior ao roubo do cofre. Lavratura de

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escritura pública. Quantia que se pode


vincular ao legítimo negócio imobiliário.
Plausibilidade. Inexistência de evidências
suscetíveis de suposta simulação
fraudulenta. Precedentes majoritários do C.
STJ nessa direção. Tese de vinculação ao
dólar. Inadmissibilidade.

INDENIZAÇÃO. Jóias. Embora aceitável a


posse das preciosidades, cabia aos
apelantes a exibição de declaração de
Imposto de Renda. A respeitabilidade
presumida do ser humano não lhe rende
crédito apenas por presunção. A boa-fé é
presumida, mas o crédito decorrente da
titularidade das jóias deve ser comprovado.
Se não se pode exigir a prova do absurdo
de alguém deter por anos e anos notas
fiscais, ou recibos de aquisição, igualmente
não cabe homologar a teórica titularidade
de jóias de alto valor que não são
declaradas à Receita Federal. Incerteza
quanto à própria existência das jóias que
poderia ser alvo de comprovação que
estava ao alcance dos apelantes. Dano
moral. Análise prejudicada. Sucumbência
não alterada. Provimento parcial do recurso.

Trata-se de ação de indenizaçj


julgada improcedente pela r. sentença apelada, a qual reconheOefa
a eficácia da cláusula inserida em contrato bancário de locaçãolJe
cofre e excluíra a responsabilidade civil do apelado.

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo


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Os apelantes sustentam o não


cabimento da cláusula nova do contrato bancário, disposição que
entendem nula e que fere os princípios do Código do Consumidor.
Ressaltam a responsabilidade civil do apelado e que não se pode
admitir a cláusula que torna a avença inviável. Afirmam que são
antigos correntistas do apelado e que este, de acordo com o
inquérito policial, não tinha nenhuma atenção ou providência com a
segurança do cofre alugado. Requerem a procedência da ação.

O recurso foi regularmente preparado,


processado e contrariado.
O eminente Desembargador Relator
sorteado, RENATO RANGEL DESINANO, votara pela manutenção
da r. sentença monocrática, entendendo que deve prevalecer a
cláusula firmada entre as partes.

É o relatório.

As partes firmaram o denominado


"Contrato de Locação de Cofre" (fls. 30/31), por meio do qual o
apelado recebera bens móveis dos apelantes, guardando-os nos
cofres identificados sob números 32 e 34.

Tais cápsulas, escaninhos, ou gavetasO


são individuais e fechadas, compondo-se normalmente de 6bave
dupla, sendo certo que uma fica com o cliente da casa bancária/eYa
outra com esta (MARIA HELENA DINIZ, Tratado Teórico e Prático
dos Contratos, RT, vol. IV, pág. 449).

Nele, sua cláusula nona estabelece que:,

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 4


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"No cofre à sua disposição, o(s)


LOCA TÁRIO(S) somente poderá(ão) guardar
documentos e títulos e valores mobiliários
nominativos, sendo expressamente vedada a
guarda ou depósito de títulos e valores
mobiliários ao portador, dinheiro, jóias e outros
assemelhados, inclusive tudo quanto seja ou
possa ser perigoso, ou inconveniente à
segurança das pessoas e coisas, e à saúde
daquelas. Além das penas da lei pela
inobservância desta cláusula, o(s)
LOCA TÃRIO(S) serâ(ao) civilmente
responsável(is) pelos danos dela decorrentes".

Com efeito, o núcleo da controvérsia


reside na admissibilidade legal ou não do conteúdo da referida
norma contratual e dos efeitos daí resultantes.

Antes de tudo, o referido negócio


bancário não se caracteriza, à luz do direito positivo, enquanto
avença de natureza locatícia, nem tampouco se qualifica como
contrato de depósito.

É que locação de móvel não


aperfeiçoa porque no trato bancário cabe ao locador-bai
custódia da coisa locada, o que o desfalca do regime jurídico
da locação mobiliária, na qual o locatário está na posse da res.

Igualmente, não se cuida de contrato de


depósito, particularmente porque o banco depositário não detém
nenhum poder fático sobre os bens deixados no cofre.

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo


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Mesmo por isso, a doutrina pátria não é


harmoniosa.

A atipicidade jurídica, portanto, à míngua


de legislação específica, é a marca distintiva desse trato bancário.

É a doutrina de ARAMY DOMELES DA


LUZ, Negócio bancários, São Paulo, Ed. RT, 1996, pág. 277 e de
VILSON RODRIGUES ALVES, Responsabilidade civil dos
estabelecimentos bancários, Campinas, Ed. Bookseller, 1996, pág.
219.
Excluí-se, assim, a exegese que parte
da incidência das normas civis pelo tino da locação de coisa móvel
e do depósito.
Aplicar-se-á ao caso dos autos a parte
geral do Código Civil, em comunhão com a incidência do Código de
Defesa do Consumidor.

Nesse padrão, examinar-se-á o valor


legal da referida disposição convencional, primeiramente através
das disposições do Código do Consumidor, aplicável aos negócios
bancários, nos moldes da Súmula 297 do C. STJ.

Vencida a questão relativa à natureza


jurídica do atípico vínculo, passa-se à verificação do conteúdo ò&
anotada cláusula nova. , //

Assim, deve-se ponderar e aferiru a


eventual juridicidade, razoabilidade e a proporcionalidade do
conteúdo da frase (cláusula 9a) que declara que é: "... expressamente
vedada a guarda ou depósito de títulos e valores mobiliários ao portador,

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo /6

*
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dinheiro, jóias e outros assemelhados...", sob pena de responsabilidade


civil do infrator-consumidor.

O transcrito trecho encerra uma


concreta limitação de uso do cofre e contém, na inobservância do
consumidor, a sanção de parcial não responsabilidade civil do
banco-apelado.
Não se trata, pois, de disposição de
completa irresponsabilidade.

A circunstância peculiar existente no


aludido pacto de adesão traduz, em verdade, um traço fortemente
limitativo do dever de responsabilidade civil da casa bancária.

É lícito limitar, ou restringir a


responsabilidade civil, desde que tal se dê dentro do jogo
equilibrado da respectiva avença.

Aquilo que sobejar à normalidade,


razoabilidade e a proporcionalidade do conjunto negociai, por
conseguinte, é ilegal.

A responsabilidade civil do banco


assim, pode ser restrita e limitada à dada e determinada hipótese,/a
bem da liga onerosa do negócio e de sua correlata equação
econômico-financeira. pJ

No entanto, é inócuo que um pacto-de


adesão de cofre bancário contenha dispositivo que implique numa
correlata renúncia à indenização, ou que praticamente exonere d
banco de sua responsabilidade civil, sobretudo à luz do Código do
Consumidor. /

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 7


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113 câmara de Direito Privado

Impossível idealizar, então, que o banco


'alugue' um cofre e declare que não é responsável exatamente por
aquilo que leva o consumidor com ele a ajustar o referido e atípico
negócio jurídico.

Preparar uma cláusula que dispõe que a


instituição financeira não tem responsabilidade se o cliente
depositar na cápsula de segurança dinheiro e jóias, motriz causai
que leva à avença, é ilegal e imoral.

É o mesmo que prestar um serviço, cuio


atrativo é a garantia de segurança, e convencionar que por este,
naquilo que é de sua essência, o prestador não é civilmente
responsável.

Juridicamente inviável, pois, que se


admita a eficácia de tal limitação da qual resulte, no hora da
subjunção do fato à norma contratual, ao nada.

Inconcebível que se tenha por eficaz o


ato de deixar valores guardados em caixa de segurança no interior
de um banco, fora do alcance e do acesso da maioria d©s
funcionários e do público em geral, sem que essa custódia te/pa
efeito constitutivo sobre sua responsabilidade civil. //

Essa ressalva, tanto por tanto, tem o


porte de estrangular o próprio sentido prático da avença.

Claramente iníquo lançar e deixar é


consumidor em tamanha vantagem exagerada. /

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 8

i
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l l ^ câmara de Direito Privado

Há, concretamente, lesão ao artigo 51,


o
incisos I, IV, XV c/c § 1 , inciso I, II e III, do Código do Consumidor.

Se não é possível guardar no cofre


dinheiro e jóias, à viva evidência, o contrato bancário é patético,
notadamente porque o consumidor contrata algo que não lhe serve,
o que tromba com o senso de Justiça.

Há quebra da equidade (art. 7o do CDC)

Ainda nessa análise, admitir-se que o


cliente não pode deixar nas cassette di sicurezza (caixas de
segurança), denominação do art. 1839 do Cód. Civil Italiano,
valores mobiliários ao portador, dinheiro e jóias, eqüivale que se
pense que o consumidor celebre um contrato que lhe é inútil.

Esse paradoxo não se nutre.

A cláusula, por isso, encerra disposição


contratual abusiva, com real desequilíbrio contra o cliente-
consumidor. É antiiurídica. sobretudo porque rende vantagem
exagerada à instituição bancária (art. CDC).

De mais a mais, já na seara de


incidência do Código Civil, a cláusula nona sob exame é potestativa
pura, cuja desvalia jurídica é reconhecida alhures. ri

E é potestativa pura a referida cláusula


destacada linhas atrás, porquanto dentre as condições defesas se
incluem aquelas que sujeitam o contratante ao puro arbítrio de uma
das partes (art. 122, segunda parte, do Código Civil), tal e qual >o
caso aqui tratado. /

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 9


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11^ câmara de Direito Privado

Nesse sentido, o poder do banco, que


se traduz na elaboração da cláusula aqui examinada, porque
exercido com desbordo e na base do exagero, desfaz qualquer
possibilidade de valia da respectiva disposição negociai negativa.

Essa é a doutrina de vários clássicos do


nosso direito pátrio, a saber: MIGUEL MARIA DE SERPA LOPES
(Curso de Direito Civil - Introdução, Parte Geral e Teoria dos
Negócios Jurídicos, Rio de Janeiro, 1966. Livraria Freitas Bastos,
pág. 494); WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO (Curso de
Direito Civil, São Paulo, 1983, Ed. Saraiva, pág. 287); CAIO MÁRIO
DA SILVA PEREIRA (Instituições de Direito Civil, Rio de Janeiro,
1983, Ed. Forense, Vol. I, pág. 481); CLÁUDIO BONATTO (Código
de Defesa do Consumidor - Cláusulas Abusivas nas Relações
Contratuais de Consumo, Porto Alegre, 2004, Livraria do Advogado
Editora, págs. 76/77).

Aliás, SERPA LOPES, ao citar


EDUARDO ESPÍNOLA e FRANCESCO FERRARA, sublinha que é
nula a obrigação sob condição potestativa, "por acarretar fantasia,
uma ilusão" (Curso de Direito Civil, Rio de Janeiro, 1966, Livraria
Freitas Bastos, pág. 495, g.n.). I\

A lição incide e se subsume sutilmente à


hipótese dos autos. /J ^

A referida limitação pré-estabelecida,


porquanto negativa à essência volitiva do sentido oneroso daquilo
que se visa proteger, também fere a lealdade contratual e a boa/fé
objetiva (art. 422 do Código Civil), as quais hão de presidi/ a
interpretação de qualquer negócio jurídico. '

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 10


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l i a Câmara de Direito Privado

Boa-fé objetiva essa que chama a ética


para dentro do conteúdo contrato, na apropriada lição de TERESA
NEGREIROS (Teoria do Contrato: Novos Paradigmas, Rio de
Janeiro, 2002, Ed. Renovar, pág. 115) e executa "a função corretora
do desequilíbrio contratual", ressalta JUDITH MARTINS-COSTA (A
boa-fé no direito privado, São Paulo, 1999, RT, pág. 59).

É a correttezza de que fala a doutrina


italiana do conceituado Prof. GUIDO ALPA (Instituzioni di Diritto
Privato, Torino, 2001, UTET Giuridica, pág. 64).

Lealdade e probidade são o norte.

Crave-se que o serviço prestado pela


casa bancária tem por atrativo exclusivo a garantia de segurança,
de modo que a desqualificação causai que levara à formação do
vínculo tem também o condão de maltratar o princípio legal da
função social dos contratos (art. 421 do Código Civil).

A função social, na autorizada doutrina


do eminente ROGÉRIO FERRAZ DONNINI (Revisão Contratual
sem imprevisão, Revista do Advogado, n. 98, pág. 218), "serve âe
fundamento para que se efetive entre os contratantes um equilíomo,
uma relação equânime, sob pena de ser revista a avença", o/que
abraça o caso em tela.

A função social, liame "que se liga à


solidariedade entre as partes contratantes" (CARLOS EDUARDOy
PIANOVSKI RUZYK, Direito civil Constitucional: situaçõ<
patrimoniais, obra coord. Carmem Lúcia Silveira Ramos, in ps
princípios contratuais: da formação liberal à noção contemporânea,

Apelação n°9122666-45.2003.8.26.0000-São Paulo 11


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Curitiba, 2002, Ed. Juruá, pág. 33), não deve ser esquecida por
parte das instituições financeiras.

Além disso, o contrato bancário,


sobretudo no século XXI, é e deve ser instrumento de colaboração
entre os contraentes.

Nesse sentido, discorre RICARDO LUÍS


LORENZETTI (Fundamentos do Direito Privado, RT, 1998, pág.
132).

As partes, conforme sublinha o saudoso


CLÓVIS VERÍSSIMO DO COUTO E SILVA, "devem comportar-se
como colaboradores e não indivíduos em posições antagônicas" (A
obrigação como Processo, Ed. Bushatsky, 1976, pág. 171, g.n.).

Deve haver, pois, comunicação e


cooperação entre os contraentes, o que, se presente, fará levantar
naturalmente a confiança e a lealdade de um em face do outro.

Não se trata de nada de mais. É simples


adequação e releitura de postura, a bem do chamado fairplay. .

Por isso, o festejado ENZO ROPRO


pontua que o contrato está sendo relançado e tem fortalecidooysfeu
papel de instrumento de mediação social (O Contrato, AlmeMa,
1988, pág. 337). V ^

Daí deságua que a função social dcy


contrato reforça o princípio de sua conservação do contrata
"assegurando trocas úteis e justas" (Conclusão 22 das Jornadas jao
STJ).

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 12


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Por esse diagrama fático, sem função


social nenhuma, longe do equilíbrio, utilidade, equidade (art. 7o do
Cód. de Defesa do Consumidor) e justiça, aprofunda-se a
inadmissibilidade da ressalva limitativa traçada pelo apelado.

Tal cláusula restritiva fere a necessária


harmonização das relações de consumo (art. 4 o , inciso III, do Cód.
do Consumidor), lesiona o consensualismo e sentido pragmático
que levara o consumidor à originária adesão.

É ainda peculiar reconhecer-se que tal


limitação representa a quebra da base objetiva do negócio (KARL
LARENZ, Base Del negocio jurídico y cumplimiento de los
contratos, Madrid, 1956, Civitas, pág. 254), ou da base eficiente dos
contratos.
Representa o exercício abusivo de
direito, ainda mais porquanto a limitação ao exercício dos direitos
tem por fundo "o respeito aos direitos alheios e aos princípios e
valores do sistema", na precisa nota da Professora TERESA
ANCONA LOPES (Responsabilidade Civil - Estudos em
homenagem ao professor Rui Geraldo Camargo Viana, São Paulo,
2009, pág. 555). A

Com esse balanço, observando^sa^esie


conhecido desequilíbrio cognoscitivo entre o profissionalismo
bancário e o consumidor, aquele cada vez mais escasso|f o
legislador disciplinara que a interpretação faça-se em favor do deste
(art. 47 do Cód. do Consumidor).

Nessa exata dimensão, é ilegal retirar do


contrato bancário a sua própria razão de existir. /

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 13


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Inidônea, portanto, a referida cláusula.

Afastada a legalidade da limitação


abusiva, adentrar-se-á no pleito indenizatório.

A ação criminosa é incontroversa (art.


334, III, do CPC), sendo certo que a responsabilidade civil do banco
é objetiva e apenas desaparece diante de culpa exclusiva do
consumidor (art. 14, § 3o, inciso II, do Código do Consumidor),
peculiaridade inocorrente.

Outrossim, acresça-se que o fortuito


interno e o fato imprevisível e inevitável não geram
irresponsabilidade, posto que a atividade bancária normalmente é
de risco.
É o risco inerente, sabido e conhecido
da instituição bancária. Sua assunção não lhe pode exonerar do
dever elementar de reparar o prejuízo suportado pelo consumidor.

A raiz causai da responsabilidade civij


do banco é evidentemente o risco profissional por este assumido.

Além do mais, é de rigor cravàNaòe


nesse tipo de contrato nem o cliente declara aquilo que deposiflado
na caixa-cofre, nem tampouco o banco interessa-se em formalizar
recibo.

É o que é comum. É o que se tem poj


costume, ou prática reiterada.

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 14


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Por essa lente, os contratantes, banco e


consumidor, assim procedem, por meio de um elo de confiança.

O consumidor confia que deixa seus


valores e jóias em lugar seguro, os quais ficam incólumes dos
amigos alheio. O banco percebe a remuneração que entende justa.
Daí a comutatividade e o sinálagma.

Já no que tange ao terreno dos


precedentes jurisprudenciais, sem desconhecer a existência de V.
Aresto em sentido diferente, verifica-se que é maioritário o
entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça na direção do
dever de indenizar dos bancos nos casos de subtração do conteúdo
de cofre bancário.

Nesse sentido, confiram-se nos V.


Acórdãos, a saber: REsp 1.093.617/PE, Rei. Min. JOÃO OTÁVIO
DE NORONHA, REsp 947.994/SP, Rei. Min. NANCY ANDRIGHI,
REsp 767.923/DF, Rei. Min. CÉSAR ASFOR ROCHA; REsp
1.133.111/PR, Rei. Min. SIDNEI BENETI; REsp 994.040/PE, Rei.
Min. RAUL ARAÚJO; REsp 151.060/RS, Rei. Min. EDUARDO
RIBEIRO. ,
Por adequação, cite-se o extrato da
ementa daquele produzido no REsp 767.923/DF, verbis: /

"Os bancos depositários são >


responsáveis pelo ressarcimento dos danos materiais e morais^
causados em decorrência do furto ou roubo dos bens colocados sob ]
sua custódia em cofres de segurança alugados aos seus clientes, /
independentemente da prévia discriminação dos objetos ali/
guardados. Recurso especial não conhecido" (Rei. Min. CÉSAR
ASFOR ROCHA). /

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo . 15


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Pois bem.

Resta apreciar os limites devidos aos


apelantes pelo desaparecimento do inteiro conteúdo existente no
cofre devassado.

Quanto ao pleito na quantia equivalente


a US$ 127.000,00, o caderno probatório revela que os apelantes
formalizaram no dia 11/02/2000, por negócio jurídico particular, a
alienação do imóvel situado na Rua Horácio Lafer n° 555, apt° 71,
Itaim Bibi, com área privativa de 337,42m2, pela quantia de
R$1.520.000,00 (fls. 34/36).

Trata-se de propriedade de valor


significativo e localizado em bairro nobre de São Paulo.

Perceberam, naquela ocasião, bem


antes do roubo à casa bancária, a importância líquida de
R$152.000,00.

Tal promessa de venda e compra não


positiva, porque não há nenhum subsídio probante - e mesmo
indiciário -, que tenha havido eventual simulação fraudulenta, ou k
'farsa' afirmada pelo apelado. //

Sobreviera, ademais, a lavratura[pa


escritura pública definitiva (fls. 358/363), não se constalfee-
nenhuma disparidade, ou deformidade fática.

Comprovada, em harmonia com a época


do sinistro, a existência da legítima receita, nada assalta /a

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 16


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admissibilidade do reparo indenizatorio, ainda mais se a tese da


instituição financeira veio apoiada na mera alegação e sem
nenhuma base probatória, como lhe cabia (art. 333, II, do CPC).

Nada indica convicção diferente, sendo


certo que a má-fé deve ficar comprovada, enquanto a boa-fé é
presumida, sopesando-se, caso a caso.

A indenização, contudo, não será na


quantia postulada pelos apelantes.

É não pode ser assim, vez que a


conversão do ativo financeiro comprovado (R$ 152.000,00), dividida
pela cotação da moeda americana do dia do pagamento desse sinal
(na falta de outro critério objetivo), de 1 (um) US$ igual a R$ 1,085,
tem-se o valor resultante correspondente a US$ 82.000,00.

Prevalece, portanto, o dever legal de


indenizar os apelantes na quantia de R$ 152.000,00, sem nenhum
atrelamento à moeda americana.

Já no que toca ao pedido de


indenização na quantia equivalente a US$ 528.000,00, à título das
inúmeras jóias desaparecidas, ao revés, o álbum probatória/é
precário. "^C/

Com efeito, os apelantes restringiranfrse


a anexar catálogos e algumas fotografias anunciando o uso dà
parte do extenso rol de jóias contido na inicial. j

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 17


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Esses elementos, evidentemente, não


traduzem a necessária segurança processual destinada ao
provimento condenatório.

Mesmo que se compreenda que não se


pode exigir de ninguém a prova do absurdo, o que para a espécie
dos autos seria que se apresentassem notas fiscais, ou recibos de
jóias adquiridas anos e anos atrás, é igualmente inaceitável que a
boa-fé dos aoelantes, em si e por si mesma, tenha o condão de
suprir o dever de provar a existência daquelas preciosidades.

Sobressalta, pois, a dúvida em torno da


real existência, á ocasião do roubo, das aluídas jóias.

A respeitabilidade presumida dos


apelantes, à míngua sequer da exibição das respectivas
declarações de imposto de Renda (IRPF), não é o bastante para
lhes render o crédito por simples presunção.

A boa-fé, já se disse, se presume, mas o


crédito precisa e deve ser cabalmente comprovado.

Em conseqüência, inadmissível a
indenização decorrente do, resta prejudicado o pleito de oèmd
moral, vez que apenas por meio da análise do efeito dessa especial
perda é que poder-se-ia suscitar o exame de natureza da le&lo
moral.

Com esses fundamentos, ouso divergir


do nobre Desembargador RENATO RANGEL DESINANO, a quem
rendo meu apreço e minhas homenagens. /

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 18


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Por esses fundamentos, voto pelo


parcial provimento da apelação para condenar o apelado no
pagamento da quantia de R$ 152.000,00, incidindo correção
monetária a partir do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ), fluindo os
juros moratórios desde a citação (art. 219, caput, do CPC).

do princípio da causalidade,
tendo os apelantes decaído de parte substancial da pretensão
originária, mantém-se o crtjvo condenatq>rio constante da r. sentença
apelada.

Apelação n° 9122666-45.2003.8.26.0000 - São Paulo 19


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Declaração de Voto n° 21.204

Apelação com Revisão n° 9122666-45.2003.8.26.0000


Comarca: São Paulo - 23 a Vara Cível do Foro Central
Apelante(s) e reciprocamente Apelado/a(s): Banco ABN Amro Real
S.A. e Antônio Carlos Jorge e outro
Juiz de 1 a Instância: Dr. Gustavo Santini Teodoro

Pedi vista dos autos em razão do debate jurídico que o


caso encerra.

A excelência do voto condutor e o que abriu a


divergência não me permitiria deixar de consignar, por escrito, o
fundamento da minha convicção.

Ademais, não é possível esquecer o brilhantismo das


ponderações constantes dos memoriais que as partes ofereceram
respaldada em jurisprudência de qualidade jurídica indubitável.

Não posso deixar de consignar que em outras


passagens me debrucei em casos semelhantes entendendo pela
responsabilidade objetiva dos bancos em razão da relação de consumo
e pela inerente segurança que tal contrato deve infundir na pessoa do
locatário do cofre.

Sem dúvida o banco que aluga cofres para seus clientes


incute neles a crença de que ali teriam boa segurança dos seus
pertences, muito melhor do que nas suas residências.

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m-
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11 a Câmara de Direito Privado

Tal crença não deveria ser frustrada.

Entretanto, apesar da relação de consumo, não se pode


esquecer que o contrato vedou expressamente a guarda ou depósito de
títulos e valores mobiliários ao portador, dinheiro, jóias e outros
assemelhados.

Por isso, sabiam os locatários da exclusão e assumiram


o risco ali deixando pertences de tal natureza. Por isso mesmo no meu
sentir a cláusula limitativa do uso, juridicamente válida, obstou o direito
postulado.

Nessas condições o meu voto acompanha o Relator para


negar provimento ao recurso.

th.
Moura Ribeiro
3 o Desembargador

-2-

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