Você está na página 1de 3

Estratégias para gerenciamento do risco de manter estoques

I - Introdução

O gerenciamento do risco associado à posse e manutenção de estoques ao longo do


tempo é um importante conceito a ser aplicado no gerenciamento de cadeias de
suprimentos. Basicamente, este risco decorre cada vez mais (1) de ciclos de vida
de produtos cada vez mais curtos, (2) da proliferação de SKUs, implicando na
pulverização da demanda original agregada em razão da introdução de novos
produtos de mais difícil previsão e (3) da segmentação crescente de mercados,
implicando possivelmente na abertura de novos centros de distribuição ou
armazéns como garantia de nível de serviço. Todos estes fatores contribuem
favoravelmente para que ocorram equívocos nas decisões de alocação (localização)
e reposição (quanto, quando e como) dos estoques.

Normalmente o grau de risco associado à manutenção de estoques é mensurado


através da variabilidade da demanda de um determinado produto e/ou canal de
distribuição, calculado como seu desvio-padrão e coeficiente de variação².
Atualmente existem diversas ações em curso nas cadeias de suprimentos para
aumentar o grau de previsibilidade da demanda e, consequentemente reduzir seu
desvio-padrão, através do acesso e compartilhamento da informação de vendas
obtida em tempo real junto aos consumidores. São exemplos neste sentido os
programas de resposta rápida entre varejistas e fabricantes, como o ECR (Efficient
Consumer Response) e outras iniciativas de ressuprimento Just-in-Time.

Os reflexos de uma maior variabilidade da demanda são percebidos imediatamente


nos níveis de estoque de segurança, parcela dos estoques destinada à garantia dos
níveis desejados de disponibilidade de produto sob condições de incerteza da
demanda e do lead-time de ressuprimento. Estes níveis constituem uma reserva
estratégica de produto, não fornecendo suporte direto ao planejamento e execução
das operações comerciais, de distribuição ou de manufatura num determinado
estágio da cadeia de suprimentos.

1- Peter Wanke, M. Sc.


2- Quociente entre o desvio-padrão e a demanda média

Além do acesso à informação em tempo real como forma para reduzir a


variabilidade calculada da demanda num determinado estágio da cadeia, existem
outras três formas de atingir este determinado objetivo, tendo como pressuposto
básico a utilização de informações recentes de vendas como mecanismo acionador
de atividades de logística e produção que tenham tempo de execução relativamente
mais curto que o tempo de resposta exigido pelo mercado:
• agregando a demanda através de diversas localizações, implicando num
maior grau de centralização dos estoques. Ao centralizar os estoques,
retarda-se de certa maneira sua movimentação com relação ao destino final,
dando origem às políticas de postergação (postponement) da distribuição
física. A figura 1 ilustra estas políticas.
• agregando a demanda através da linha de produtos, implicando numa maior
proporção de produtos semi-acabados em estoque. Manter uma maior
parcela de produtos semi-acabados, implica em retardar a diferenciação final
dos produtos através de operações simples de adição de valor como
montagem, embalagem, pintura, colocação de acessórios etc. Esta decisão
dá origem às políticas de postergação (postponement) na manufatura. A
figura 2 ilustra estas operações.
• através de combinação das duas medidas anteriores.
Simplificadamente com relação à postergação da distribuição através da
centralização física, deve ser avaliado se a redução nos níveis de estoque de

1
segurança mais do que compensará eventuais aumentos nos gastos com
transporte e nos níveis de estoque em trânsito, além das reais possibilidades de
serem eliminados gastos fixos com a operação e manutenção de instalações.
Por outro lado, com relação à postergação de operações finais de produção,
deve ser avaliado se a redução nos níveis de estoque de segurança de produto
acabado compensará eventuais aumentos nos custos de execução das
operações finais de manufatura e perdas de economias de escala, uma vez que
pode aumentar a proporção da parcela de gastos variáveis comparativamente
aos gastos fixos. Os parágrafos a seguir comentam alguns pontos críticos que
devem ser observados na implementação de políticas de postergação.

2. Postergação da Distribuição

Conforme mencionado, a centralização dos estoques pode reduzir os níveis de


estoque de segurança e consequentemente o nível médio de estoque em todo o
sistema. Intuitivamente espera-se que quando a demanda de uma determinada
região de mercado estiver acima da média, em outra região a demanda poderá
estar abaixo da média, permitindo que itens alocados a um determinado armazém
sejam realocados para outros. O processo de realocação ou transferência de
estoques entre armazéns, contudo, pode não ser economicamente viável num
sistema de distribuição descentralizado, considerando-se o valor do produto vis-à-
vis os custos unitários de transporte. A menos que os custos de transferência
apresentem um caráter marginal, já havendo fluxo de produtos entre as
instalações, e levando-se em consideração que num sistema descentralizado os
produtos normalmente são de baixo valor agregado, não se justifica a viabilidade
econômica desta operação.

Além disto, quanto maior for o coeficiente de variação, maiores serão os benefícios
obtidos com a centralização física dos estoques. Isto ocorre por que os níveis de
estoque médio envolvem dois componentes: um proporcional à demanda média
esperada entre dois ressuprimentos consecutivos e o outro proporcional ao desvio
padrão ou variabilidade esperada da demanda neste intervalo de tempo.

Finalmente, os benefícios da centralização física dos estoques dependem


fortemente do comportamento da demanda de uma determinada região de
mercado em relação às demais. Por exemplo, as demandas em dois mercados
quaisquer apresentam correlação positiva se for bastante plausível que a demanda
ao aumentar num determinado mercado, também aumente no outro mercado. De
modo análogo, quando a demanda cai abaixo da média num determinado mercado,
no outro também ocorre a mesma situação. Intuitivamente, o benefício da
centralização dos estoques é proporcionalmente menor na medida que a correlação
entre as demandas dos dois mercados torna-se cada vez mais positiva.

[...]

Postergação da Manufatura

Um dos conceitos mais difundidos em gestão de estoques é o fato da informação


agregada da demanda ser sempre mais precisa que a desagregada. Desta forma, a
demanda pode ser prevista com maior precisão para um país que para uma cidade,
para uma linha completa de produtos que para um único modelo etc. Infelizmente,
no ambiente de planejamento e tomada de decisão na manufatura previsões
agregadas não são empregadas com facilidade ou freqüência, já que o gerente de
manufatura deve saber exatamente a quantidade de cada item antes de iniciar a
produção. Na adoção de políticas de postergação da manufatura é possível utilizar
informações mais agregadas da demanda no planejamento das operações. Para
isto, torna-se necessário redesenhar o processo de manufatura (e eventualmente o

2
projeto do produto) de forma a que decisões sobre quais produtos específicos
devem ser produzidos sejam retardadas pelo menos até que os produtos semi-
acabados tenham sido concluídos

[...]

É importante notar que se algumas etapas da manufatura são postergadas, os


produtos semi-acabados terão um menor valor adicionado que os acabados,
implicando, portanto, em menores custos de oportunidade de manter estoques. Em
alguns casos, impostos e taxas a serem recolhidas são menores para produtos
semi-acabados ou não configurados que para produtos acabados. Ao completar o
processo de manufatura num centro de distribuição próximo ao local de consumo
dos produtos, pode ser possível reduzir a carga tributária incidente. Entretanto,
nem sempre é possível implementar a postergação da manufatura. Os lead times
de produção podem ser demasiadamente longos, ou talvez seja necessário
aproveitar economias de escala no transporte e na produção, sobretudo quando os
produtos são de baixo valor adicionado.

[...]

Fonte
WANKE, Peter. Estratégias para gerenciamento do risco de manter estoques.
Disponível em: < http://www.ilos.com.br/web/estrategias-para-gerenciamento-do-
risco-de-manter-estoques/>. Acesso em: 27 ago. 2015.

Você também pode gostar