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Jano Alves de Souza

Neurologista
Prof. Adjunto de Neurologia da UFF

Farmacologia da enxaqueca
Fisiopatologia da enxaqueca

Ativação do
Depressão
Predisposição sistema Sensibilização
cortical
genética trigêmino- para a dor
alastrante
vascular
Depressão
cortical
alastrante
Ativação do
sistema
trigêmino-
vascular
Sensibilização
para a dor
Ward T N. Migraine Diagnosis and Pathophysiology. Headache p. 753-763August 2012, 18: 753-763
MacGregor E. A. Clinical Medicine Insights: Therapeutics 2011:3 301–314
Modificado de Russo AF. Annu. Rev. Pharmacol. Toxicol. 2015.55:533-552.
Tratamento da enxaqueca

Tratamento Tratamento
Tratamento não
farmacológico farmacológico
farmacológico
agudo (das crises) profilático
Tratamento da enxaqueca
Afastamento dos fatores desencadeadores, mudanças do estilo
1 Tratamento não farmacológico
de vida

Analgésicos comuns, AINEs, bloqueadores


Tratamento farmacológico Fármacos inespecíficos
dopaminérgicos, corticoides
2 agudo
Ergóticos, triptanos, ditanos, antagonistas do
(tratamento das crises) Fármacos específicos
CGRP (gepantes)

Tratamento farmacológico Betabloqueadores, antidepressivos tricíclicos, drogas


3 profilático antiepilépticas, flunarizina, anticorpos monoclonais
Tratamento farmacológico agudo
Fármacos inespecíficos
Analgésicos comuns

1) Inibição da COX no SNC; 2) aumento


Elevação das transaminases;
dos canabinoides endógenos; 3) aumento
Paracetamol da atividade da via serotoninérgica
hepatotoxicidade (na
superdosagem)
descendente; 4) inibição da NO sintase

1) inibe fracamente COX-1 e COX-2 em Anafilaxia, anemia hemolítica,


tecidos periféricos; 2) Inibição das COX anemia aplástica, agranulocitose,
Dipirona cerebrais; 3) inibição da COX-3 no corno pancitopenia, trombocitopenia,
dorsal da medula espinhal hipotensão arterial

Os analgésicos comuns são moderadamente eficazes nas crises de migrânea e podem


ser suficientes nas crises leves. Podem também ser utilizados como coadjuvantes de
outras medicações contra a enxaqueca
Anti-inflamatórios não esteroides
Aspirina Inibição da síntese de
Ibuprofeno prostanoides, que medeiam
sensibilização central e periférica.
Naproxeno A PGE2 e PGI2 reduzem o limiar Erosão, ulceração, perfuração,
de estimulação dos nociceptores hemorragia gástrica; eventos
Diclofenaco e a excitabilidade do corno vasculares; dano renal; interação
Celecoxibe posterior da medula; a inibição com anticoagulantes; alergia
da COX e consequente inibição da
Cetorolaco síntese de prostaglandinas
Cetoprofeno confere efeito antinociceptivo

Os AINEs são moderadamente eficazes nas crises de migrânea e podem ser suficientes nas crises leves a
moderadas. Podem também ser utilizados em associação com os triptanos

https://www.uptodate.com/contents/acute-treatment-of-migraine-in-adults
Bloqueadores dopaminérgicos
Metoclopramida 10 mg IV Acatisia, distonia, sonolência,

0,1 mg IV (máximo 1 mg/ minuto; Prolongamento QT, torsades de pointes,


Clorpromazina máximo 25 mg / dia) sonolência, hipotensão arterial

Haloperidol 5 mg IV Acatisia, distonia

20 a 30 mg VO – na fase
Domperidona prodrômica da enxaqueca

O mecanismo de ação dos bloqueadores dopaminérgicos nas crises de enxaqueca não é


plenamente compreendido, mas medicações sem ação sobre os receptores D2 não mostram
eficácia no tratamento das crises. A metoclopramida, a clorpromazina e o haloperidol por VO
podem ser usados como coadjuvantes

https://www.uptodate.com/contents/acute-treatment-of-migraine-in-adults
Corticoide

Dexametasona 10 a 25 mg / IV

O uso da dexametasona está indicado para reduzir o risco de recorrência em


até 72 horas de uma crise de enxaqueca tratada com outras medicações. As
meta-análises não demonstram eficácia na eliminação da dor

https://www.uptodate.com/contents/acute-treatment-of-migraine-in-adults
Tratamento farmacológico agudo
Fármacos específicos
Tratamento farmacológico agudo
Fármacos específicos

Rimegepant*
Ergóticos
Efeitos adversos: náusea e vômito
Agonistas dos receptores de serotonina
Ergotamina 5-HT1B, 5-HT1D e 5-HT1F e consequente
(agonismo 5-HT1A e D2), disforia
(agonismo 5-HT1A) vasoconstrição
efeito inibidor da
periférica (agonismo 5-HT2A
inflamação neurogênica e da transmissão
e alfa-adrenérgico. A DHE
nociceptiva, no
Di-hidroergotamina núcleo caudal do trigêmeo
apresenta menos efeito
vasoconstritor e emético

A biodisponibilidade da ergotamina por via oral é de 1% e da DHE é ainda menor. As drogas sofrem efeito de primeira
passagem. A DHE possui metabólitos ativos que atingem concentrações maiores que a da droga original. A DHE tem
efeito vasoconstritor arterial menor que a ergotamina, porém, mantém o efeito venoconstritor. Ergotamina e DHE
provocam constrição coronariana in vitro. No Brasil, não se dispõe dessas medicações para administração
intravenosa, intramuscular, subcutânea, nasal ou retal. São contraindicadas em qualquer forma de doença vascular,
hipertensão grave, função hepática diminuída, função renal diminuída, gravidez, septicemia. O uso frequente pode
ocasionar ergotismo. Estão relacionadas também com cefaleia por uso excessivo de medicação.

Devido à eficácia menor e perfil de tolerabilidade e segurança menos favorável, têm sido cada vez menos utilizadas.
Seu uso se restringe hoje, principalmente, aos casos que não respondem aos novos fármacos específicos e quando a
recorrência é um problema significativo
Triptanas
Oral 50 mg e 100mg, Agonistas seletivos
Sumatriptana nasal 10 mg. SC 6 mg dos receptores
Devido ao efeito
agonista 5HT1B, as
Oral 2,5 mg; oral serotoninérgicos
Zolmitriptana dispersível 2,5 mg 5HT1B, 5HT1D.
triptanas possuem
efeito vasoconstritor,
Alguns possuem
Rizatriptana Oral 10 mg
efeito agonista
sendo contraindicadas
em indivíduos com
5HT1F. Inibem a
Naratriptana Oral 2,5 mg inflamação
doença vascular arterial.
Os efeitos adversos
neurogênica e a
Eletriptana* transmissão
mais comuns são
tontura, sonolência,
nociceptiva;
Almotriptana* Indisponíveis no Brasil
bloqueiam a produção
sensação de fraqueza
muscular e opressão no
do CGRP e reduzem a
Frovatriptana* liberação do glutamato
peito ou garganta

Naratriptana e frovatriptana possuem início de ação mais lento, menor recorrência e melhor tolerabilidade
Antagonistas do CGRP – Gepantes*

Moléculas pequenas que bloqueiam a ação do CGRP em seu


Ubrogepant receptor. Atuam na enxaqueca, diminuindo a inflamação
neurogênica e a transmissão dos impulsos nociceptivos. Por
não possuírem ação vasocontritora, são particularmente
úteis em pessoas que têm contraindicação ao uso dos
Rimegepant triptanos, devido a doença vascular arterial

*Ainda indisponíveis, no Brasil


Ditanos – agonistas seletivos do receptor 5HT1F*

Lasmiditano

O Lasmiditano é o único representante da classe aprovado. Tem a possibilidade de


atravessar a barreira hemato-encefálica e atuar nos receptores periféricos e centrais
expressos nos neurônios trigeminais. O agonismo 5HT1F inibe a condução dos impulsos
nociceptivos. Inibe a liberação de CGRP. Perfil de tolerabilidade bom

*Ainda indisponíveis, no Brasil


Tratamento farmacológico profilático
Tratamento profilático da enxaqueca
Principais indicações
Pacientes com 3 ou mais crises ao mês; pacientes com frequência menor que 3 x ao mês, porém,
com grande incapacidade; falência da medicação abortiva (ineficácia, uso excessivo,
intolerância); subtipos especiais de migrânea (basilar, hemiplégica, com aura prolongada, com
auras frequentes e atípicas e infarto enxaquecoso)

Benefícios
Redução da frequência das crises; redução da intensidade das crises; melhor resposta às
medicações sintomáticas, melhora da qualidade de vida

Principais classes de medicações com efeito profilático


Betabloqueadores, antidepressivos tricíclicos, medicações antiepilépticas, flunarizina, toxina
botulínica, anticorpos monoclonais contra o CGRP
Betabloqueadores
• Propranolol (40 a 240 mg / dia) Possíveis mecanismos na profilaxia da
• Atenolol (25 a 150 mg / dia) enxaqueca: inibição da No sintase; ação
• Metoprolol (25 a 200 mg / dia) no sistema serotoninérgico, inibição dos
• Nadolol (40 a 120 mg/dia) neurônios talâmicos; inibição da
• Timolol * sensibilização central para a dor

Efeitos adversos: Hipotensão arterial, bradicardia, Sonhos vívidos, astenia,


broncoespasmo, disfunção sexual, depressão

Contraindicações: asma; DPOC; bloqueio AV 2º e 3º graus; insuficiência cardíaca


descompensada; cuidado no DM (mascara hipoglicemia)
Betabloqueadores com atividade agonista intrínseca, como o pindolol, não têm
eficácia demonstrada
Antidepressivos tricíclicos
Possíveis mecanismos na profilaxia da
enxaqueca: inibição da recaptura da
• Amitriptilina (10) 25 mg a 75 mg/dia
serotonina e noradrenalina, facilitação
• Nortriptilina (10) 25 mg a 75 mg / dia
dos mecanismos endógenos de
controle da dor
Principais efeitos adversos: sonolência, taquicardia, ganho de peso, constipação,
secura das mucosas, hipotensão postural, redução da libido, retenção urinária,
redução do limiar para crises epilépticas

Principais contraindicações: glaucoma, hipertensão intraocular, hiperplasia


prostática, arritmias cardíacas
Medicações antiepilépticas
Divalproato sódico Topiramato
500 a 1000 mg/dia 50 a 200 mg/ dia

Potenciais mecanismos de ação na Bloqueio dos canais de sódio voltagem-


profilaxia da enxaqueca: Bloqueio dos dependentes, inibição dos canais de cálcio
canais de sódio voltagem-dependentes, de alta voltagem do tipo L, inibição da
bloqueio dos canais de cálcio de baixo neurotransmissão glutamatérgica,
limiar tipo T, inibição da transmissão facilitação da inibição GABA, inibição da
glutamatérgica, diminuição da expressão anidrase carbônica, diminuição da
de CGRP liberação do CGRP

Principais efeitos adversos: parestesias,


Principais efeitos adversos: ganho de peso,
comprometimento cognitivo, miopia
tremor, queda de cabelos
aguda, perda de peso
Flunarizina
Potenciais mecanismos de ação na profilaxia da enxaqueca: bloqueio dos canais
de sódio voltage-dependentes, redução da excitabilidade neuronal e
normalização da hiperexcitabilidade cortical (inibição da depressão alastrante
cortical, antagonismo D2

Principais efeitos adversos: parkinsonismo secundário, depressão, ganho de


peso, sonolência

Devido ao risco de desenvolvimento de parkinsonismo, a medicação tem sido


restrita a crianças ou adultos com menos de 50 anos e em doses baixas,
preferencialmente, 5 mg / dia
Candesartana - 8 a 16 mg / dia
Potenciais mecanismos de ação na profilaxia da enxaqueca: promoção da
degradação de fatores inflamatórios, modulação do sistema opioide endógeno,
modulação do sistema renina-angiotensina cerebral, influenciando a atividade
endotelial, astrocítica e neuronal

Principais efeitos adversos: hipotensão arterial


Onabotulinumtoxina A

Potencial mecanismo de ação na profilaxia da enxaqueca: bloqueio da


sensibilização periférica e central

Indicada na enxaqueca crônica (15 ou mais dias de dor por mês, por pelo menos
3 meses), quando não há resposta aos demais tratamentos
Anticorpos monoclonais contra o CGRP
Novartis Lilly Teva Lundbeck
MAB Erenumab Galcanezumab Fremanezumab Eptinezumab
Aimovig®, Emgality ® Ajovy ®
Pasurta®
Tipo Humano Humanizado Humanizado Humanizado

Origem Camundongo Camundongo Camundongo P. Pastoris yeast

Tipo MAB/CGRP IgG2 IgG4 IgGK IgG1

Especificidade Receptor Ligante CGRP α Ligante CGRP α Ligante CGRP α

Via / dose SC mensal SC mensal SC mensal IV a cada 3 meses

Indicações ME, MC ME, MCr, CSE, ME, MF, MC, CSE MF, MC
estudadas CSC
MF - migrânea frequente; MC – migrânea crônica; ME – migrânea episódica; CSE – cefaleia em
salvas episódica
Diferenças entre os antagonistas do CGRP
e os Mabes
Propriedade Molécula pequena mAb
Molécula pequena
entidade química Alvo1 Intracelular ou extracelular Extracelular
500 Da
(Mais) baixa; mais probabilidade Alta; menos probabilidade de ter
Especificidade1
de ter atividade fora do alvo atividade fora do alvo
Anticorpo IgG2
Imunoglobulina Metabolismo1 Hepática/renal SER
150.000 Da
Interações medicamentosas1 Mais provável Menos provável
Atravessa a BHE1 Possível* Mínima
Administração1 Geralmente oral IM, SC, ou IV
Meia-vida2 ~ Horas Dias a semanas
Dosagem1 Geralmente diária Tipicamente menos frequente
Síntese química; relativamente Produzido dentro de linhagens únicas
Produção1,3 simples de fazer e reproduzir de de células vivas modificadas; difícil de
Adaptado de Foltz1 e Zhao4. forma confiável fazer e reproduzir com precisão

*Depende do grau de solubilidade lipídica.


BHE = barreira hematoencefálica; IM = intramuscular; IV = intravenosa; mAb = anticorpo monoclonal; SER = sistema reticuloendotelial; SC = subcutâneo.. 1. Foltz IN, et al. Circulation. 2013;127:2222-2230. 2. Silberstein S, et al.
Headache. 2015;55:1171-1182 3. Kleinberg M, et al. Am J Health Syst Pharm. 2004;61:695-708. 4. Zhao L, et al. Acta Pharmacologica Sinica. 2012;33:1339-1347.

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