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recomendações

Atualização de Condutas em Pediatria


nº 44 Departamentos Científicos da SPSP,
gestão 2007-2009.

Departamento de
Reumatologia
Doença de
Kawasaki
Departamento de Adolescência
Bullying: o lado
obscuro das
escolas
Departamento de
Oncologia e Hematologia
Sinais e sintomas do
câncer na infância

Sociedade de Pediatria de São Paulo


Alameda Santos, 211, 5º andar
01419-000 São Paulo, SP
(11) 3284-9809
recomendações
Departamento de Reumatologia

Doença de Kawasaki

A doença de Kawasaki
(DK) é a segunda
vasculite mais fre-
quente na faixa etária pediá-
trica, sendo considerada a
timento coronariano, com
aparecimento de aneurismas
em 15 a 25% dos casos não
tratados, podendo evoluir
para complicações graves,
principal causa de cardiopatia como doença cardíaca is-
adquirida e infarto agudo do quêmica, infarto agudo do
miocárdio em países como miocárdio e morte súbita.
Estados Unidos e Japão. Em Porém, quando o diagnós-
85% dos casos a doença aco- tico é feito precocemente,
Autores: mete crianças abaixo de cin- e o tratamento estabelecido
Ana Paola Navarrette Lotito,
Clovis Artur Almeida da Silva, co anos de idade e, em 50%, até o décimo dia de doença,
Maria Teresa R. A. Terreri, abaixo de dois anos de idade, o risco dessas complicações
Silvana B. Sacchetti
com discreto predomínio no diminui em 80%.
DEPARTAMENTO DE
REUMATOLOGIA
sexo masculino. A doença O diagnóstico da doença
Gestão 2007-2009 pode ocorrer em qualquer é eminentemente clínico, ba-
Presidente:
raça, sendo prevalente em seado nos critérios estabele-
Silvana B. Sacchetti crianças asiáticas. cidos em 1967, já submetidos
Vice-Presidente:
Roberto Marini A etiologia da doença é a inúmeras revisões (Quadro
Secretário: desconhecida. Acredita-se que 1). Para o diagnóstico da
Maria Teresa R. A. Terreri
Membros: ocorra uma resposta imune DK, é necessária a presença
Adriana Maluf E. Sallum, patológica desencadeada por de febre por mais de cinco
Ana Paola Navarrette Lotito,
Bernadete de Lourdes Liphaus, agentes ambientais ou infec- dias associada a quatro dos
Claudia G. Schainberg,
Claudia Saad Magalhães,
ciosos em indivíduos geneti- cinco critérios propostos.
Claudio Arnaldo Len, camente predispostos. Vários Os pediatras devem ter em
Clóvis Artur Almeida da Silva,
Eunice Mitiko Okuda,
fatores sugerem etiologia mente que a identificação
Gecilmara Cristina S. Pileggi, infecciosa, inúmeros relatos precoce da doença é funda-
Lucia Mª M. de Arruda Campos,
Luciana Tudech S. Pedro Paulo, têm sido realizados associan- mental, particularmente nos
Marcos V. Ronchezel, do a doença a agentes virais pacientes com exantema, fe-
Maria Helena B. Kiss,
Maria Odete E. Hilário, e bacterianos. Entretanto, até bre por mais de cinco dias e
Marilda Trevisan Aidar, o momento nenhum agente irritabilidade mantida.
Patrícia Corte Faustino,
Paulo Roberto S. Romanelli, causal foi identificado. A febre geralmente é
Sonia Maria Sawaya Hirscheimer,
Virgínia Paes L. Ferriani,
A complicação mais te- abrupta, com má resposta a
Wanda Alves de Bastos. mida da DK é o comprome- antipiréticos e com duração
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de 10 a 12 dias sem trata- das vesículas ou exsudados


mento, podendo durar até amigdalianos. A conjuntivi- expediente
4 semanas. O exantema da te ocorre em 85% dos pa- Diretoria da Sociedade de
DK ocorre em mais de 90% cientes, sendo bilateral, não Pediatria de São Paulo
Triênio 2007 – 2009
dos pacientes, é polimórfico, exsudativa, podendo ocor-
sendo mais frequentemente rer uveíte assintomática em Diretoria Executiva
Presidente:
macular ou máculo-papular mais da metade dos casos, José Hugo Lins Pessoa
e raramente vesicular ou evoluindo sem sequelas. 1º Vice-Presidente:
João Coriolano Rego Barros
bolhoso. É bastante típica a Em relação às alterações 2º Vice-Presidente:
confluência em região peri- de extremidades (80%), são Mário Roberto Hirchheimer
Secretário Geral:
neal, seguida de descamação precocemente observados Maria Fernanda B. de Almeida
1º Secretário:
do local. edema do dorso de mãos e Sulim Abramovici
As alterações orais ocor- pés, acompanhados de erite- 2º Secretário:
Fábio Eliseo F. Álvares Leite
rem em 80-90% dos pacien- ma palmo-plantar. A partir 1º Tesoureiro:
tes, sendo frequentes lábios de 10 dias de doença, habi- Lucimar Aparecida Françoso
2º Tesoureiro:
eritematosos e fissurados, tualmente ocorre uma desca- Aderbal Tadeu Mariotti
língua em framboesa e eri- mação laminar que se inicia Diretoria de Publicações
tema difuso da orofaringe. na região periungueal, mui- Diretor:
Raramente são observa- tas vezes exuberante. Não se Cléa Rodrigues Leone
Editor Revista Paulista Pediatria:
Ruth Guinsburg
Editores executivos:
Amélia Miyashiro N. Santos
Quadro 1. Critérios diagnósticos Antônio A. Barros Filho
da doença de Kawasaki Antônio Carlos Pastorino
Mário Cícero Falcão
Sônia Regina T.S. Ramos
Critérios diagnósticos*
Departamentos Científicos
Febre** de duração maior do que cinco dias Coordenadores:
acompanhada de quatro dos seguintes sinais: Ciro João Bertoli
Mauro Batista de Moraes
→→ Hiperemia conjuntival bilateral Sérgio Antônio B. Sarrubbo

→→ Alterações orais (eritema labial e/ou fissura labial e/


ou eritema difuso em orofaringe e/ou língua em
framboesa)
→→ Alterações de extremidades (edema de mãos e
pés e/ou eritema palmo-plantar e/ou descamação
Produção editorial:
periungueal) L.F. Comunicações Ltda.
→→ Exantema polimorfo Editor:
Luiz Laerte Fontes
→→ Adenomegalia cervical com diâmetro superior a 1,5 cm LLFontes@LFComunicacoes.com.br
Revisão:
* Na presença de quatro ou mais critérios, o diagnóstico pode ser feito no 4º dia de Otacília da Paz Pereira
doença, podendo ser estabelecido o tratamento. Arte:
** Caso haja doença coronariana pelo ecocardiograma, não são necessários 5 dias de
febre para se estabelecer o diagnóstico. Lucia Fontes
Lucia@LFComunicacoes.com.br

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deve aguardar a presença de (> 8 mm de diâmetro) são


descamação para se realizar bastante temidos, pois têm
o diagnóstico e o tratamen- maior chance de obstrução e
to, visto que esta ocorre tar- isquemia.
diamente. Outras manifestações clí-
A linfadenopatia é o sinal nicas associadas à DK podem
clínico menos comum (50%), ser observadas, tais como: ar-
habitualmente é unilateral e tralgia, artrite, miosite, diar-
com regressão em três a qua- reia, dor abdominal, icterícia
tro dias de doença, muitas obstrutiva, vesícula hidrópi-
vezes passando despercebida. ca, miocardite, pericardite,
Um achado bastante caracte- insuficiência mitral aguda,
rístico da DK é a irritabilida- uretrite, induração do local da
de, que pode ser decorrente aplicação da vacina BCG etc.
de quadro de cefaleia por me- Na maioria das vezes a
ningite asséptica. diferenciação entre a DK e
Em relação ao compro- as doenças exantemáticas da
metimento cardíaco, a maio- infância é difícil, em parti-
ria dos pacientes cursa com cular nos primeiros dias de
miocardite em diferentes doença e nas crianças com
graus, acompanhada de ta- quadro clínico incomple-
quicardia no período febril, to. O diagnóstico diferen-
podendo ocorrer arritmias e, cial inclui infecções virais
mais raramente, pericardite e (adenovirose, enterovirose,
endocardite com insuficiên- sarampo, mononucleose),
cia valvar. Os aneurismas co- estreptococcias, estafilococ-
ronarianos são complicações cias, reações de hipersensibi-
que ocorrem precocemente, lidade a drogas, entre outras.
raramente são observados Alterações laboratoriais
novos aneurismas após as da DK são inespecíficas,
duas primeiras semanas de ocorrendo elevação das pro-
doença. Quando ocorrem, vas de atividade inflamatória,
cerca de 50% dos aneuris- (como a velocidade de he-
mas pequenos regridem ao mossedimentação e proteína
ecocardiograma, mas podem C reativa), em mais de 90%
ainda persistir alterações dos casos, com retorno à
funcionais devido ao pro- normalidade em seis a 10 se-
cesso de cicatrização vascu- manas. Pode ocorrer anemia
lar. Os aneurismas gigantes aguda, leucocitose com des-
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vio à esquerda. A plaquetose 10 dias de doença, preferen-


(plaquetas entre 400.000 e cialmente entre o 5° e o 7°
3.000.000/mm3) é um acha- dia) reduz a incidência dos
do bastante característico, aneurismas coronarianos de
especialmente a partir da 20 a 30% para 4 a 5%. O
segunda semana da doença, ácido acetilsalicílico deve ser
com normalização em qua- utilizado em dose anti-in-
tro a oito semanas nos casos flamatória (80-100 mg/kg/
não complicados. Podem ser dia, fracionado em quatro
encontradas alterações uri- tomadas, com dose máxima
nárias, lipídicas e elevação de 500 mg a cada seis horas).
das transaminases. A hipoal- Utiliza-se dose anti-inflama-
buminemia é comum, estan- tória até que o paciente esteja
do associada à doença mais afebril, habitualmente até 24
grave e prolongada. a 72 horas após administra-
É importante ressaltar, ção da gamaglobulina. Neste
entretanto, que 10-36% dos momento, deve-se diminuir
pacientes não preenchem a dose para 3-5 mg/kg/dia
todos os critérios diagnós- (dose antiagregante plaque-
ticos, principalmente no tária), com posterior manu-
grupo mais jovem, muitas tenção até que se comprove
vezes cursando com altera- a ausência de anormalidades
ções coronarianas. Portanto, coronarianas, habitualmente
é recomendada a realização entre seis e oito semanas de
de ecocardiograma em todas seguimento. Nos casos com
as crianças menores de seis alterações coronarianas, esta
meses que cursarem com fe- dose deve ser mantida inde-
bre de mais de uma semana finidamente.
de duração, com evidência Apesar do tratamento,
laboratorial de inflamação e 5% dos casos irão desen-
sem outra causa conhecida. volver ao menos dilatações
Apesar da etiologia ainda coronarianas transitórias, e
ser desconhecida, a DK pos- cerca de 1% dos pacientes
sui terapêutica estabelecida apresentarão aneurismas gi-
com o uso da gamaglobulina gantes (acima de 8 mm de
intravenosa (2 g/kg em infu- diâmetro). Aproximadamen-
são contínua de 10 horas) e te 10% dos casos são refratá-
ácido acetilsalicílico. A tera- rios ao esquema habitual de
pia precoce (nos primeiros gamaglobulina e ácido acetil-
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salicílico. A falha terapêutica terações coronarianas, os


é definida pela manutenção esquemas terapêuticos para
ou recorrência da febre após prevenção de tromboses
36 horas do término da in- dependem da gravidade do
fusão. Nesses casos, pode-se comprometimento corona-
repetir uma ou duas vezes a riano e incluem: terapia com
infusão da gamaglobulina. ácido acetilsalicílico (3-5 mg/
Nos casos persistentemente kg/dia, uma vez ao dia) as-
refratários, indica-se a pul- sociado ou não a dipiridamol
soterapia com metilpredni- (2-6 mg/kg/dia, dividido em
solona na dose de 30 mg/ três vezes ao dia) ou clopido-
kg/dia, administrada por via grel (1 mg/kg/dia, uma vez
intravenosa em duas horas, ao dia); terapia anticoagulan-
uma vez ao dia, por três dias te com dicumarínico (0,05-
consecutivos. Outros trata- 0,34 mg/kg/dia, uma vez ao
mentos propostos nos casos dia, ajustando-se a dose com
refratários são a utilização o objetivo de manter o INR
de anticorpos monoclonais entre 2 e 2,5) ou heparina de
anti-TNFα (infliximabe, 5,0 baixo peso molecular (1-1,5
mg/kg/dose) e/ou agentes mg/kg/dia, fracionado em
citotóxicos como metotrexa- duas doses ao dia, via sub-
te ou pulsoterapia intraveno- cutânea) ou ainda a combi-
sa com ciclofosfamida. nação de antiplaquetários e
Nos pacientes com al- anticoagulantes.

Tratamento da doença de Kawasaki

1. Gamaglobulina endovenosa (2 g/kg)


2. Ácido acetilsalicílico (80-100 mg/kg/dia) → na fase febril
3. Ácido acetilsalicílico (3-5 mg/kg/dia) → enquanto
persistir a plaquetose, ou se houver aneurismas
coronarianos
4. Se não houver resposta → repetir infusão de
gamaglobulina e se persistir febre → pulsoterapia com
metilprednisolona na dose de 30 mg/kg/dia por 3 dias
5. Casos refratários → agentes anti-TNF e/ou citotóxicos
6. Anticoagulantes (em caso de aneurismas gigantes)

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