Você está na página 1de 7

recomendações

Atualização de Condutas em Pediatria


nº 57 Departamentos Científicos SPSP - gestão 2010-2013
Junho 2011

Departamento
de Emergências
Síncope no
paciente
pediátrico
Departamento de Aleitamento Materno
Primeira consulta
ao pediatra após
alta da maternidade
Grupo de Saúde Oral
Hábitos de
sucção da criança

Sociedade de Pediatria de São Paulo


Alameda Santos, 211, 5º andar
01419-000 São Paulo, SP
(11) 3284-9809
recomendações
Departamento de Emergências

Síncope no
paciente pediátrico

S íncope é a perda repen-


tina da consciência e do
tônus postural, resultan-
te de uma disfunção cerebral
difusa, devido à má perfusão
vasomotor, com resultante
hipotensão sistêmica (respos-
ta vaso depressora), acompa-
nhada de bradicardia signifi-
cante ou assistolia. A maioria
encefálica. O episódio sinco- dos episódios ocorre quando
pal é transitório e seguido de o paciente fica em pé, duran-
recuperação espontânea da te um longo período nesta
consciência. Cerca de 15% das posição, ou quando há uma
crianças e adolescentes, entre mudança rápida da postura
8 e 18 anos, apresentam pelo supina para a posição em pé.
menos um episódio. Mais pre- Pode associar-se à ansiedade.
valente em adolescentes entre A perda de consciência é
15 e 19 anos (20% a 50%) e repentina e geralmente não
Autores: no sexo feminino, a síncope dura mais do que 2 minutos.
Hany Simon Junior, André
Pacca Luna Mattar, Gaby Cecília responde por cerca de 2% das Em situação normal, a pos-
Yupanque Guerra de M. Barboza
consultas de serviço de emer- tura ortostática prolongada
DEPARTAMENTO gência pediátrica e 1% do to- resulta em represamento de
DE EMERGÊNCIAS
Gestão 2010-2013 tal de internações. sangue, com diminuição do
As causas são categoriza- retorno venoso sistêmico
Presidente:
Hany Simon Junior das de acordo com o meca- e da pré-carga ventricular.
Vice-Presidente: nismo fisiopatológico, em seis A diminuição da pré-carga
Marcelo Conrado dos Reis
Secretário: grupos: autonômica (80% a induz a um aumento com-
Milena de Paulis
Membros:
90%), cardiogênica (2,5%), pensatório de catecolaminas
Adriana Vada S. Ferreira, Amélia neurológica (9%), respirató- circulantes e do tônus simpá-
Gorete da C. Reis, Anarella P.
Meirelles de Andrade
ria, psiquiátrica e metabólica. tico, resultando em aumento
André Pacca Luna Mattar, Andrea no inotropismo cardíaco e na
de M. A. Fraga, Anna Julia
Sapienza, Bianca Seixas Soares, Síncope frequência cardíaca, manten-
Emilio Carlos E. Baracat, Fernando autonômica do a pressão arterial e débito
Belluomini, Gabriela B. Castelo,
Graziela de Almeida Sukys, José Também denominada cardíaco normais.
Carlos Milare, Maria Luisa F. vaso vagal, é a causa mais co- Nos pacientes propensos
Miranda, Mariana Spadini dos
Santos, Paula Cristina Ranzini, mum de desmaio em crianças à síncope, há uma respos-
Rodrigo Locatelli Pedro Paulo,
Sulim Abramovici, Tânia M. R.
e adolescentes. Caracteriza-se ta anormal aos mecanismos
Zamataro, Tania M. S. Sakano. por perda repentina do tônus compensatórios. Em respos-
2
recomendações
Departamento de Emergências

ta ao aumento normal das mento ou enchimento ven-


expediente
catecolaminas, aumenta ex- tricular podem associar-se
cessivamente a contratilida- a síncopes: estenose aórtica Diretoria da Sociedade de
Pediatria de São Paulo
de do ventrículo esquerdo. grave e cardiomiopatia hiper- Triênio 2010 – 2012
Há uma resposta inibitória trófica obstrutiva, estenose Diretoria Executiva
contra esta contratilidade via pulmonar, estenose mitral, Presidente:
Clóvis Francisco Constantino
tônus vagal; se ela for exacer- tamponamento cardíaco, ou 1º Vice-Presidente:
bada, resultará em suspensão hipertensão pulmonar primá- Mário Roberto Hirschheimer
2º Vice-Presidente:
do tônus simpático (hipo- ria. A síncope pode ocorrer Eraldo Samogin Fiore
tensão) e aumento do tônus quando a obstrução ao fluxo Secretário Geral:
Maria Fernanda B. de Almeida
parassimpático (bradicardia). ventricular diminuir o débito 1º Secretário:
Há consequente hipoperfu- cardíaco e a perfusão cere- João Coriolano Rego Barros
2º Secretário:
são cerebral e síncope. bral, ou se houver diminuição Ana Cristina Ribeiro Zollner
1º Tesoureiro:
Podem ocorrer situações no fluxo de oxigênio ao mio- Lucimar Aparecida Françoso
específicas. Em atletas com cárdio, causando isquemia, 2º Tesoureiro:
Aderbal Tadeu Mariotti
tônus vagal aumentado, discinesia ou arritmias.
pode haver síncope, quan- ►►Arritmias: Na presença Diretoria de Publicações
Diretor:
do há aumento adicional no ou não de lesão cardíaca estru- Cléa Rodrigues Leone
Editor Revista Paulista Pediatria:
tônus vagal: atividade física tural. Os dois grupos são de Ruth Guinsburg
intensa, manobra de Valsal- risco para arritmias cardíacas Editores executivos:
Amélia Miyashiro N. Santos
va, ou outras atividades que semelhantes: TSV, TV, bra- Antônio A. Barros Filho
aumentem a atividade paras- dicardia grave e bloqueio AV. Antônio Carlos Pastorino
Celso Moura Rebello
simpática. Síncope reflexa No coração estruturalmente Mário Cícero Falcão
pode ocorrer após situações normal, as arritmias ocorrem Sônia Regina T.S. Ramos

clínicas diferentes: micção ou na presença de síndromes Departamentos Científicos


Diretor:
evacuação, tosse profunda, como Wolf-Parkinson-White, Rubens Feferbaum
hiper-extensão do pescoço síndrome do QT longo, mio- Membros:
Ciro João Bertoli
(espreguiçar) e deglutição, re- cardite, medicações e outras. Sérgio Antônio B. Sarrubbo
sultado do aumento do tônus A síncope, nos dois grupos,
vagal associado a estas mano- ocorre pela diminuição do
bras e síncope ortostática débito cardíaco, com conse-
com hipotensão exagerada quente diminuição do fluxo
Produção editorial:
relacionada a graus leves de sanguíneo cerebral. Na sín- L.F. Comunicações Ltda.
desidratação. cope ocorrida durante exer- Editor:
Luiz Laerte Fontes
cícios físicos, uma avalia- LLFontes@LFComunicacoes.com.br
Síncope ção cardiológica completa Revisão:
Otacília da Paz Pereira
cardiogênica deve ser feita, para afastar Arte:
►►Lesões obstrutivas: Le- ou confirmar a presença de Lucia Fontes
Lucia@LFComunicacoes.com.br
sões que obstruam o esvazia- arritmias cardíacas.
3
recomendações
Departamento de Emergências

Síncope Síncope
neuropsiquiátrica metabólica
►►Epilepsia: Os distúrbios Os distúrbios metabólicos
convulsivos devem ser consi- como causas de síncope são
derados quando houver ativi- extremamente incomuns. A
dade motora focal ou tônico- hipoglicemia é rara, embora
clônica generalizada, e na fase em pacientes diabéticos a hi-
pós-ictal de letargia e confu- poglicemia seja um fator etio-
são prolongada. O tempo de lógico importante de perda de
inconsciência costuma ser consciência. Os sintomas que
mais prolongado. Avaliar se precedem o evento sincopal
há presença de anormalidade incluem: fome, sudorese, ton-
neurológica residual após a tura e agitação não relaciona-
síncope. das à postura corporal.
►►Enxaqueca: A aura pre-
monitória pode anteceder Síncope
espasmo vascular vertebro- respiratória
basilar, que parece ocorrer As doenças respiratórias
em pacientes com síncope podem precipitar síncope
associada à enxaqueca. Geral- devido à hipoxemia e baixa
mente, a perda de consciên- oferta de oxigênio ao SNC
cia tem início e duração mais ou vasoconstrição cerebral
longos. Pode haver deficiên- secundária a hipocapnia de-
cia neurológica residual e ce- corrente de hiperventilação
faleia após a síncope. pulmonar.
►►Distúrbios psiquiátri-
cos: Pânico, ansiedade ou Avaliação inicial
personalidade histriônica ►►História: A história de-
podem gerar síncope após talhada é fundamental. Na
hiperventilação. A hipocap- maioria dos casos, a histó-
nia induz vasoconstrição ce- ria por si é suficiente para a
rebral. A síncope acontece elucidação diagnóstica e a
porque há hipoperfusão ce- escolha racional dos exames
rebral secundária à constri- subsidiários.Deve haver uma
ção arteriolar local. Há relato descrição detalhada do am-
de sentimento de sufocação, biente onde ocorreu a sínco-
fôlego curto, parestesia, enri- pe, incluindo atividade física
jecimento das extremidades e e posição do paciente antes
alterações visuais. da perda de consciência, bem
4
recomendações
Departamento de Emergências

como presença ou não de ►►Exame físico: O exame


aura. Avaliar circunstâncias físico completo e detalhado,
ambientais, fatores desenca- especialmente na avaliação
deantes e pródromos. Escla- cardiológica e neurológica.
recer se ocorreu durante as A ausculta cardíaca para de-
atividades físicas. Determinar tecção de sopro irradiado
o tempo de duração da perda para o pescoço, aumento da
da consciência e se houve a 2ª bulha, presença de sopro
recuperação completa do pa- diastólico longo no ápice do
ciente. Avaliar os anteceden- coração e ritmo de galope. A
tes familiares de morte súbita, palpação do precórdio pode
arritmias, epilepsia, doença sugerir doenças cardíacas es-
cardíaca congênita, doença truturais. Qualquer deficiên-
metabólica, uso de medica- cia focal ou anormalidade
ções e drogas ilícitas. Os an- no exame neurológico deve
tecedentes pessoais e clínicos alertar o clínico para a possi-
do paciente devem ser relata- bilidade de convulsão, ou ou-
dos: presença de doença car- tra doença neurológica como
díaca ou neurológica. causa da síncope.

Testes diagnósticos

►► Testes laboratoriais – A coleta de exames laboratoriais de rotina é de


utilidade limitada. A coleta de glicemia, hemograma e eletrólitos séricos tem
pouca utilidade.
►► Eletrocardiograma – Todos os pacientes com síncope têm necessidade
de realizar um ECG que é útil no diagnóstico de síndrome de Wolf-Parkinson-
White, síndrome do QT-longo, bloqueio cardíaco, isquemia miocárdica e
outras formas de doenças cardíacas congênitas. Deve ser realizado em
todos os pacientes no primeiro episódio de síncope. O holter se impõe.
Pacientes com história de síncope aos exercícios podem se beneficiar
do teste de esforço sob supervisão médica. Não há indicação de realizar
ecocardiograma de rotina.
►► Tilt-teste – O exame pode ser útil no diagnóstico de síncope autonômica.
O teste é considerado positivo quando houver alterações hemodinâmicas, de
ritmo cardíaco ou síncope após realização do exame.
►► Eletroencefalograma – O EEG, bem como a tomografia ou a ressonância
magnética do encéfalo são testes não elucidativos do diagnóstico de síncope,
a menos que a história e exame físico apontem para uma causa neurológica.

5
recomendações
Departamento de Emergências

Morte súbita Tratamento


Embora na maioria das O tratamento descrito a
vezes a etiologia da síncope seguir é proposto para a sín-
seja benigna, há risco de morte cope autonômica.
súbita em pacientes com sín- Um esforço inicial deve
cope secundária à doença car- ser feito para ensinar o pa-
díaca. Síncopes relacionadas ciente com síncope vasova-
a exercícios alertam para gal a reconhecer os fatores
investigação de doença desencadeantes destes episó-
cardíaca. Cerca de 16% das dios. Devem-se evitar situa-
crianças e adolescentes com ções que possam, sabidamen-
morte súbita tem relato de sín- te, desencadear síncope. O
cope associada a exercícios. paciente tem que reconhecer
Apesar da morte súbita em os pródromos e ser instruído
crianças e adolescentes ser in- a assumir a posição sentada
frequente (1.3 casos/100.000 ou supina, se estes ocorrerem.
por ano), 1/3 dos casos tem Embora se possa encorajar
causa cardíaca bem definida e estes pacientes a aumentarem
mais 1/4 dos casos etiologia a ingestão de sal e líquidos,
cárdica provável. Assim, pa- os rins anulam estes esforços
ciente com síncope e que tem por meio do débito urinário.
cardiopatia estrutural, cirur- O tratamento medica-
Referências bibliográficas
gia cardíaca prévia, doenças mentoso inicia-se com a ex-
Task Force on Syncope: Guidelines sistêmicas que possam cursar pansão de volume. Ela é feita
on Maneagement (Diagnosis and
Treatment) of Syncope. Europace 2004; com doença cardíaca ou sín- com uso do mineralocorti-
6:467-537. cope relacionada a exercícios coide fludrocortisona. O
Scarabelli CC, Scarabelli TM:
Neurocardiogenic Syncope. BMJ 2004; devem ter avaliação cardioló- aumento do volume vascular
329:336-341.
gica completa. permite que o paciente man-
Mace S, Schrieber DH: Syncope in
Pediatric Patient. Pediatr Emerg Med Pacientes com o coração tenha a pressão sanguínea
Report 2010; 15:13-24.
Lewis DA, Dhala A: Syncope in the
estruturalmente normal po- cerebral, mesmo que ocorra a
pediatric patient. The cardiologist´s dem apresentar síncope se- venodilatação parassimpático
perspective. Pediatr Clin North Am
1999; 46:205-19. cundária à arritmia cardíaca. mediada.
Massin MM, Bouguignont A et al:
Syncope in pediatric patients presenting
A incidência de morte súbita Fármacos betabloquea-
to an emergency department J Pediatr é relatada em até 10% dos dores são usados no controle
2004; 145:223-228.
Johnsrude CL: Current Aproch to
pacientes portadores de sín- da síncope neurocardiogênica.
pediatric syncope. Pediatr Cardiol 2000; drome do QT longo. Desta A resposta hormonal inicial à
21:522-31.
Feit LR: Syncope in the pediatric forma, impõe-se a realização diminuição do enchimento
patient: diagnosis, pathophysiology,
and treatment. Advances Pediatr 1996;
de ECG em todos os casos do VE é o aparecimento de
43:469-493. de síncope, na emergência. catecolaminas na circulação,
6
recomendações
Departamento de Emergências

com resultantes taquicardia e Especialista


aumento no inotropismo. Os Encaminhar o paciente ao
betabloqueadores impedem a cardiologista ou neurologista
resposta ao tônus adrenérgi- (ver Figura 1) quando houver:
co aumentado e, assim, pre- • Síncope desencadeada por
vinem a cascata patológica de exercícios;
bloqueio simpático e bradi- • Síncope associada à dor no
cardia mediadas pelo vago. O peito ou palpitações;
atenolol e o propranolol são • Qualquer anormalidade car-
os mais comumente usados. díaca detectada no exame fí-
Os fármacos alfa-agonis- sico ou ECG;
tas estimulam a frequência • História familiar de morte
cardíaca e aumentam o tônus súbita;
vascular periférico, prevenin- • História familiar de epilepsia;
do a bradicardia reflexa e va- • Qualquer anormalidade neu-
sodilatação. A eficácia de ago- rológica aguda ou residual;
nistas da serotonina (sertralina) • Episódio inexplicável de
tem sido relatada em pacientes síncope;
com síncope refratária. • Síncope recorrente.

Figura 1 – Abordagem da síncope em Pediatria

Síncope

Postura ortostática
História familiar Fome, sudorese,
prolongada,
de morte súbita, hiperventilação,
Perda prolongada reflexo vagal
doença cardíaca, ingestão de
da consciência, exacerbado,
palpitação, dor medicações, coma,
convulsão, letargia, desencadeantes
torácica, exercício diabetes, doença
déficit neurológico de resposta vagal
físico, ausência de metabólica na
(tosse, perda de
pródromo família
fôlego)

Glicemia
ECG EEG
Eletrólitos
Holter TC crânio Tilt-test
Análise
ECO RNM
toxicológica

ECG: eletrocardiograma ECO: ecocardiograma EEG: eletroencefalograma


TC: tomografia computadorizada RNM: ressonância nuclear magnética

Adaptado de Massin MM. J Pediatr 2004;145:223-228. 7

Você também pode gostar