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CONVULSÃO NEONATAL

Dra. Jerusa Karoline Rodrigues Nogueira


Pediatra e Neonatologista
¨ Convulsões ocorrem com maior frequência no período neonatal
do que em qualquer outra fase da vida e são a principal
emergência neurológica nos recém-nascidos (RN);
¨ Além disso, crises epilépticas são um dos poucos sinais
neurológicos identificáveis nos RN com lesões no SNC;
¨ Uma causa sintomática deve ser sempre descartada pois
epilepsias primárias são doenças relativamente raras nessa
faixa etária;
¨ Elas podem causar ou refletir alteração funcional no cérebro
em desenvolvimento e poderão determinar consequências
permanentes desde o período neonatal até as fases
posteriores na vida;
¨ Pode refletir doença primária cerebral ou sistêmica;
¨ As neonatais, são aquelas que ocorrem em até 44
semanas de idade gestacional pós-concepcional
(idade gestacional mais o tempo em semanas de
vida pós-natal);
¨ A maior ocorrência de convulsões no período
perinatal deve-se a uma maior excitabilidade do
cérebro neste período da vida, como será descrito
em seguida;
Epidemiologia
¨ 1 a 3 casos para 1000 nascidos –RN a termo;
¨ 58 a 132 para 1000 nascidos – RN pré termo;
¨ 20% dos RNs internados em UTI neonatal;
¨ A mortalidade relatada no RN com convulsão gira em torno
de 40% e 1/3 dos RN sobreviventes apresentam sequelas
neurológicas.
¨ A atividade convulsiva não controlada e persistente no RN
acarreta alterações metabólicas que diminuem a síntese
proteica, podendo levar a lesão cerebral progressiva.
Fatores de risco

Rodrigues, Marcelo Masruha – Tratado de Neurologia Infantil / Marcelo Masruha


Rodrigues, Luiz Celso Pereira Vilanova. – 1. ed. – Rio de Janeiro : Atheneu, 2017
Fisiopatologia
¨ No RN, o sistema excitatório se desenvolve antes do
sistema inibitório.
¨ O principal sistema excitatório, mediado pelo
glutamato, potencializa-se durante o período
neonatal.
¨ Por outro lado, também o sistema gabaérgico
(principal sistema inibitório cerebral) se apresenta
paradoxalmente excitatório em RN, principalmente
nos prematuros;
¨ Restrição relativa dos receptores das DAES;
¨ Prováveis mecanismos geradores de crises epilépticas
no RN:
a- Falência da bomba de sódio e potássio decorrente
da diminuição de ATP, o que ocorre na hipóxia, isquemia
e hipoglicemia;
b- Excesso de neurotransmissores excitatórios que ocorre
na hipóxia, isquemia e hipoglicemia;
c- Deficiência de neurotransmissores inibitórios
dependentes de piridoxina;
d- Aumento na permeabilidade ao sódio na membrana
neuronal, ocorre na hipocalcemia e na
hipomagnesemia.
Diagnóstico
¨ Crises epilépticas neonatais podem ser difíceis de
identificar.
¨ Dissociação eletroclínica - expressão clínica
discreta e até inexistente
¨ Interconectividade regional, incluindo inter-
hemisférica imatura
¨ Imaturidade corticoespinhal
¨ Mielinização incompleta
TIPOS DE CONVULSÃO
¨ 1. CrisesSutis: mais frequentes e de reconhecimento difícil, são alterações
comportamentais paraxísticas, não claramente clônicas, tônicas ou
mioclônicas, mais comum em prematuros, apresentando fenômenos
oculares (desvio horizontal do olhar, olhar fixo), orolinguais (movimentos
mastigatórios e da língua, caretas), automatismos de extremidades
(pedalar, dar socos), apneias e fenômenos autonômicos (aumento de
pressão arterial e frequência cardíaca)
¨ 2. Crises tônicas: extensão das extremidades, podendo ser focais
(localizado em uma parte do corpo) ou generalizadas (postura de
decorticação ou descerebração, mais em RN PT – HIC maciças),
geralmente em RNPTs e, na maioria das vezes, associadas a
comprometimento neurológico grave
¨ 3. Crises clônicas: movimentos rítmicos, de 1 a 3 abalos por segundo,
comumente focais (que ocorrem em uma área de um hemicorpo e são
abalos clônicos localizados observados em RN a termo com
tocotraumatismo, distúrbio metabólico e infartos cerebrais) ou multifocais
(clônicos de extremidades, migratórios).

¨ 4. Crises mioclônicas: abalo musculares rápidos e intensos, erráticos,


fragmentados ou generalizados - em flexão ou extensão (apendicular ou
axial); raras no período neonatal, frequentemente associadas a doenças
graves do SNC. Não podendo ser confundida com Mioclonia Benigna do
Sono.
RECONHECIMENTO DO PAROXISMO NEUROLÓGICO
(EPILÉPTICO OU NÃO EPILÉPTICO)

¨ Algumas observações podem auxiliar na diferenciação dos


paroxismos epilépticos e não epilépticos, entre eles podemos citar :
- o quadro não epiléptico não é acompanhado de desvio ocular ou
fixação dos olhos, os movimentos são provocados por estímulos, os
movimentos primariamente são classificados como tremores e
ocasionalmente clônus, e eles cessam com flexão passiva do membro e
não há alterações disautonômicas.
- as convulsões apresentam desvio e/ou fixação dos olhos, os
estímulos não alteram a frequência e amplitude dos movimentos (que
podem ser clônicos, mioclônicas, tônicas, sutis), a flexão passiva do
membro não altera o movimento e importantíssimo as crises convulsivas
são acompanhadas de alterações disautonomicas (frequência
cardíaca, pressão arterial, alterações na saturação e frequência
respiratória)
SUTIL
¨ Mais comum tanto no RNT como no PT.
¨ fenômenos oculares: desvio conjugado dos olhos,
olhos abertos com olhar fixo, movimentos repetitivos
de piscar, tremular de pálpebras;
¨ movimentos de boca: mastigatórios, sucção, engolir;
SUTIL
¨ movimentos extremidades: nadar, pedalar,remar,
postura tônica de um membro;
¨ alterações vasomotoras: mudança de cor da pele;
¨ apnéias: geralmente precedidas de outras
manifestações convulsivas. São sutis e não
associadas à bradicardia.
Diagnóstico diferencial

¨ * Síndrome de hiperexcitabilidade (Hx): Tremores da Hx são frequentes


no período neonatal e são confundidos com
crises convulsivas clônicas; A diferença deve ser realizada no exame
clínico, no qual encontra-se: ausência de desvios oculares, presença de
tremores e cessa com reposicionamento do membro.

¨ - Diagnósticos diferenciais: Tremores por excitabilidade, Mioclonias


neonatais benignas do sono, Apneia, Movimentos distônicos, Movimentos
oculares, Soluços e Fasciculações de língua.
IMPORTANTE:
Caracterizar e descrever a crise e diferenciar CONVULSÃO de TREMOR
SEMIOLOGIA CONVULSÃO TREMOR
¨ Desvio ocular ou Sim Não
Mov. oculares
¨ Mov. Dominantes abalos clônicos com um igual em frequência
Comp. Rápido e um e amplitude
lento

¨ Sensibilidade a Não Sim


Estímulos
¨ Mov. Cessam com Não Sim
Suave pressão
CAUSAS
As crises epilépticas neonatais geralmente são
sintomáticas agudas.

¨ Asfixia perinatal
¨ Hemorragias intracranianas
¨ Infecção do SNC
¨ Metabólicas
¨ Policitemia
¨ Encefalopatia bilirrubínica
¨ Doenças congênitas
¨ Retirada de drogas
Causas
¨ Infartos (AVCI)
¨ Cromossomopatias
¨ Doenças neurodegenerativas
¨ Intoxicação exógena ou abstinência
¨ Deficiência de piridoxina
¨ A História Clínica deve aprofundar o conhecimento da:
história familiar, consanguinidade, história gestacional,
condições de nascimento etc.
¨ No exame físico não pode ser esquecido a descrição
do fácies, perímetro cefálico, avaliação da musculatura
(trofísmo, tônus), descrição dos movimentos espontâneos,
dismorfias, disrrafias, pares cranianos, fundoscopia.
¨ A causa mais frequente de crises epilépticas neonatais
é a EHI.
¨ Dependência de piridoxina - apresenta como crises
neonatais precoces refratárias que só respondem à
administração parenteral da vitamina.
ASFIXIA PERINATAL (Encefalopatia
Hipóxico-Isquêmica)
¨ Mais comum;
¨ Mecanismos:
Hipóxia, hipoglicemia, hipotensão, hemorragia
intracraniana,dist. eletrolítico.
HEMORRAGIAS INTRACRANIANAS
¨ subaracnóide - RNT;
¨ subdural - lateralização de manifestações;
¨ intraventricular - menores de 34 sem;
¨ periintraventricular;
¨ fossa posterior cerebelo por parto pélvico ou
traumático.
METABÓLICAS
¨ hipoglicemia, hipocalcemia, hipomagnesemia;
¨ hipo ou hipernatremia;
POLICITEMIA
¨ hematócrito > 65% e Hb>22g/dl
INFECÇÕES
¨ meningite bacteriana, viral ou fungica;
¨ encefalites.
DOENÇAS CONGÊNITAS

¨ mal formações, erros inatos do metabolismo


¨ infecções congênitas (TORCHS)
RETIRADA DE DROGAS

¨ narcóticos analgésicos; sedativos hipnóticos;


¨ álcool; heroína;
DEFICIÊNCIA DE PIRIDOXINA

¨ convulsões refratárias ao tratamento habitual


CONVULSÃO FAMILIAR BENIGNA
¨ Primária ou idiopática
¨ Início no primeiro, segundo até décimo quinto dias
de vida
INVESTIGAÇÃO
¨ História;
¨ glicemia;
¨ LCR
¨ dosagem de cálcio, sódio, potássio, magnésio, fósforo,
bilirrubinas amônia, ureia ,creatinina e gasometria;
¨ sorologias para infecções congênitas;
¨ RX de crânio;
¨ EEG;
¨ USG de crânio;
¨ Tomografia de crânio;
¨ Ressonância magnética.
TRATAMENTO
Cuidados gerais:
• Manter vias aéreas permeáveis e débito cardíaco.

• Testar e tratar distúrbios metabólicos básicos e/ou

infecção.
• Iniciar vídeo-EEG contínuo ou aEEG ou pelo menos

fazer um EEG de rotina (na dependência do que é


disponível na unidade).
• Realizar neuroimagem — ultrassonografia ou
ressonância magnética (preferencialmente).
TRATAMENTO

Uso de anticonvulsivantes:
¨ Fenobarbital:

Ataque: 20mg/Kg E.V. LENTAMENTE


Repetir 10mg/Kg, até o máx. 40mg/kg (se
necessário)

Cuidado: hipotensão e apneia.


Manutenção: 3 a 5 mg/Kg/dia 12/12h V.O. ou E.V.
TRATAMENTO

¨ Difenil hidantoína:
Ataque: 20mg/Kg E.V. LENTAMENTE
Cuidado: FC
Vida média: 18 a 54h
Manutenção: 5 mg/kg/dia E.V., suspender 4 a 5 dias
após controle das crises.
Outras opções

¨ Midazolam – 0,05 a 0,2mg/Kg E.V. em bolus ou


0,1 a 0,4 mg/Kg/h E.V. em infusão contínua
¨ Suspender após 24 h sem crises

Reações secundárias: hipotensão, depressão


respiratória e movimentos mioclônicos semelhantes a
convulsão podem ocorrer após infusão rápida.
Outras opções
¨ Diazepínicos – DEVE SER EVITADA. Atua
sinergicamente com o fenobarbital podendo
provocar apneia. Interfere na ligação
bilirrubina/albumina.

¨ Lorazepam:
Ataque: 0,05-0,1 mg/kg EV/IO lento (máx.
4mg/dose)
¨ Levetiracetam: 40-60 mg/kg/dose VO (2-3x/dia)
¨Topiramato: 1-2mg/kg/dia 12/12h (máx.
10mg/kg/dia)
¨ Piridoxina: Usado nos casos resistentes a terapia
convencional na dose de 100 mg EV, se boa
resposta: 15mg/kg/dia VO/Sonda (máx. 500mg)
PROGNÓSTICO
¨ Depende da etiologia das crises e da resposta ás
drogas e pode ser correlacionado aos achados
encontrados em EEG seriados.
Obrigada!!!!

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