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quase 50% dos pacientes já apresentam uma cirrose

HEPATOPATIA preexistente ou possuem alto risco de desenvolver.


A dose ingerida é o fator mais importante. No homem,
sabe-se que doses de 40 a 80 g/dia podem levar à cirrose.
CIRROSE: As mulheres, apesar de consumirem menos álcool do que
os homens, têm um limiar menor de risco para o
È o estágio final de qualquer doença hepática crônica, é desenvolvimento de cirrose, de apenas 20 a 60 g/dia. Entre
um processo difuso, caracterizado por fibrose e diversos outros fatores para a maior suscetibilidade
transformação da arquitetura normal em nódulos feminina à lesão hepática, estão aumento na
estruturalmente anormais. Esses nódulos “regenerativos” permeabilidade do tubo digestivo para o álcool, menor
não apresentam organização lobular normal e são atividade da álcool desidrogenase gástrica (ADH) e
circundados por tecido fibroso. O processo acomete todo o diminuição na taxa de eliminação do álcool.
fígado e, em geral, é considerado irreversível. Classificada
em compensada ou descompensada. Definida, também,
EPIDEMIOLOGIA
pelo achado de ascite, sangramento varicoso, encefalopatia
ou icterícia, complicações decorrentes da: a hipertensão
portal e a insuficiência hepática. Acredita-se uma prevalencia de ao menos 1% em pacientes
dos EUA. Além disso, é estimado que seja a causa de 40%
das mortes por cirrose e 28% de mortes por causa hepática.
ETIOLOGIAS E PATOLOGIA: È a indicação de transplante de fígado nos EUA, ademais,
estima-se que a incidência aumente nos próximos anos.
A principal característica à fibrose hepática subjacente e Com o alcoolismo sendo responsável por cerca de 100 mil
cirrose é a ativação das células estreladas hepáticas, mortes por ano.
localizadas no espaço de Disse, entre os hepatócitos e as No Brasil é um dos grandes problemas de saúde pública,
células endoteliais sinusoidais. São o principal local de principalmente pelo consumo do destilado de cana.
armazenamento de retinoides, e em resposta a inflamação
são ativadas, perdem seus depósitos de vitamina A,
proliferam-se e desenvolvem um tecido fibroso. Além disso, BIOPATOLOGIA
transformam-se em miofibroblastos hepáticos contráteis.
Como principais causas: hepatites virais (sobretudo B e C), O etanol é absorvido por difusão simples seja pela mucosa
doença hepática alcoólica, doença hepática gordurosa, intestinal ou mucosa gástrica, a grande maioria desse (90%)
doença autoimune (colangite esclerosante primária, cirrose é metabolizado pelo fígado convertendo-o para
biliar primária, hepatite autoimune), obstrução biliar intra acetaldeído. Processo que ocorre por meio de 3 vias de
ou extra hepática, distúrbios metabólicos (ex. Deficiência metabolização: ADH em citosol, sistema oxidativo do etanol
de alfa-1-antitripsina), fármacos e toxinas, derivação no microssomo (MEOS) e catalise nos peroxissomos. No
intestinal... processo metabólico:
O etanol é convertido a acetaldeído, este, que converte
em acetado. Durante essas reações há a redução do NAD
HEPATITE ALCOOLICA para NADH, propiciando, um desbalanço energético entre
NAD:NADH. Consequentemente, ocorrem distúrbios
Junto a causa gordurosa é uma das mais comuns de doença metabólicos, como hiperlactacidemia, acidose, redução da
hepática, podendo evoluir para cirrose, cancer de fígado, capacidade renal de excretar ácido, que levam à
insuficiencia hepática e morte. Em ambas os hepatócitos hiperuricemia secundária, bloqueio da gliconeogênese.
caracterizam.se por esteatose macrovesicular, que Nesse contexto a esteatose hepática resulta: desvio de
consiste no acúmulo de triglicerídeos na forma de um substratos normais do catabolismo para a síntese de
grande glóbulo citoplasmático que desloca o núcleo. Na lipídeos em razão da geração de excesso de NADH + H+
esteatose microvesicular, ocorre acúmulo citoplasmático de pelas duas principais enzimas do metabolismo do álcool;
gordura na forma de múltiplos glóbulos pequenos com um aumento da mobilização da gordura periférica, piora da
cerne (intacto). secreção de lipoproteínas, aumento da captação de lípides
circulantes e, principalmente, por redução da oxidação de
ácidos gordurosos.
DEFINIÇÃO
Os mecanismos de lesão podem ser vindos direto dos
efeitos do álcool sobre os hepatócitos e outros mediados
Consumo de álcool excessivo provoca doença hepática pelas células de Kupffer. Os efeitos dos hepatócitos: estado
alcóolica e pode ser agravada por fatores externos como redox alterado induzido por álcool, reações aldeído
hepatites virais. Geralmente, a doença hepática é desidrogenase, estresse oxidativo e peroxidação lipídica por
encontrada em conjunto a doença gordurosa em 90% dos indução das CYP2E1, sistema de transferência de elétrons
casos. Certos fatores ambientais e genética entram como das mitocôndrias; o efeito do álcool etílico sobre os fatores
agravantes para o desenvolvimento da doença alcoólica, e de transcrição nuclear AMP quinase e SREBP-1c, a formação
de produtos de adição (adutos) de proteína; e a alteração
do metabolismo da metionina e do folato, com hiipomagnsemia, hipocalemia e hipofosfatemia, além da
consequente estresse do retículo endoplasmático. perda substancial da massa muscular.
O uso crônico de álcool aumenta a permeabilidade
intestinal e ativa as células de Kupffer por meio da CURSO DA DOENÇA:
endotoxemia. Por meio dessas células são ativados 1. Fibrose limitada à zona 3
diversos mediadores pró-inflamatórios, incluindo o TNF, 2. Envolvimento mais extenso dos lóbulos partindo
IL1, IL6, IL8 e IL10, fator de crescimento de plaquetas, da lesão perilobular
fator transformador de crescimento B1. O TNF-α 3. Acentuada alteração estrutural com esboço de
apresenta multiplicidade de efeitos biológicos e provoca nódulos
apoptose dos hepatócitos, enquanto o fator transformador 4. Cirrose
de crescimento β1 e o fator de crescimento derivado das
plaquetas desempenham importantes papéis na ativação
das células estreladas, produção de colágeno e fibrose DIAGNÓSTICO
hepática.
FATORES DE RISCO: volume de álcool ingerido, sexo Depende do relato do consumo excessivo de bebida
feminino, destilados são mais hepatóxicos do que o vinho, alcóolica e de existência de doença hepática. As
hispânicos e indígenas, obesidade e desnutrição. Quanto a anormalidades laboratoriais não são específicas dessa
aspectos genéticos: polimorfos associados os metabolismo doença, podem ser sugestivas sobre a quantidade do
dos lipídios, a produção desregulada de citocinas (p. ex., o consumo alcóolico. Uma razão AST/ALT de mais de 2 é
TNF-α) também podem influenciar a suscetibilidade típica na doença hepática alcoólica, e níveis de ALT
genética. Os genes candidatos à cirrose relacionada com superiores a 150 a 200 UI/ℓ são muito raros na doença
álcool etílico incluem PNPLA3, TM6SF2, MBOAT7, MARC1 e hepática alcoólica.
HNRNPUL1.2.
È importante averiguar a coexistência de uma infecção por
hepatite viral. Em alguns casos é necessário a entrevista
COMPLICAÇÕES: ascite, peritonite bacterina espontânea, familiar para avaliar o consumo de álcool, exames como
encefalopatia, varizes esôfago-gástricas, uremia, níveis séricos e urinários de etil glicuronídio e etil sulfato
sangramento das varizes, hemorragia digestiva, circulação são marcadores sensíveis e específicos de consumo recente
colateral visível em abdome síndrome hepatorrenal, de álcool etílico, mas pouco usado na prática clínica.
osteoporose e síndrome hepatopulmonar. Além da Exames de imagem como USG, TC ou RM revelam
propensão para o desenvolvimento do carcinoma alterações compatíveis com esteatose hepática ou formas
hepatocelular. mais avançadas da doença, como cirrose e hipertensão
portal. Importantes para afastar hipótese de doença
maligna ou obstrução biliar. Os achados de imagem
MANIFESTAÇÕES CLINICAS específicos de doença hepática alcoólica incluem aumento
do lobo caudado, maior visualização da incisura hepática
Os sintomas incluem: eritema palmar, nevos posterior direita e preservação da gordura focal na
aracneiformes, ginecomastia bilateral, atrofia testicular, distribuição geográfica da gordura.
aumento das glândulas parótidas e contraturas Para a diferenciação etiológica da doença hepática e
Dupuytren. Em fases iniciais tendem a ser assintomáticos, estadiamento da doença é necessário, sobretudo, a
mas podem apresentar, anorexia, fadiga, desconforto no realização da biopsia. s características histológicas da
quadrante superior direito do abdome e hepatomegalia esteatose hepática alcoólica incluem esteatose
dolorosa à palpação. Esses pacientes também podem exibir macrovesicular, de natureza predominantemente
evidências bioquímicas de alcoolismo e doença hepática centrolobular (zona 3). Na hepatite alcoólica, a biopsia é
alcoólica com macrocitose, bem como níveis elevados de mais marcante e revela esteatose macrovesicular,
aspartato aminotransferase (AST) e gamaglutamil infiltração neutrofílica lobular, hialina de Mallory,
transpeptidase. Normalmente, os pacientes com doença degeneração com balonização dos hepatócitos e fibrose
hepática alcoólica não têm icterícia, ascite ou perivenular. Em geral, os pacientes com hepatite alcoólica
esplenomegalia. também apresentam evidências histológicas de lesão
Em quadros mais graves é observado mal-estar intenso, hepática crônica na forma de fibrose mais avançada
fadiga, anorexia, febre, sinais de desnutrição proteico- (fibrose periporta ou coalescente ou cirrose).
calórica e manifestações de doença hepática
descompensada, incluindo icterícia, coagulopatia, ascite e
encefalopatia. Em exame físico é possível observar: TRATAMENTO
icterícia, esplenomegalia; geralmente, os achados
laboratoriais, predomínio de neutrófilos, anemia Abstinência do álcool, geralmente, realizada por meio de
macrocítica, trombocitopenia, prolongamento do tempo de apoio interdisciplinar caso necessário pode entrar com
protrombina, AST e ALT (função hepática), fosfatase medicação, antagonistas de opioides, como a naltrexona
alcalina, gamaglutamil transpeptidase e bilirrubina total (50 mg/dia durante até 6 meses ou mais), o nalmefeno (20
alterada, com diminuição de albumina. Pode haver mg/dia como manutenção) e o acamprosato (comprimidos
anormalidade eletrolítica sérica com: hipopotassemia, de 333 mg, 2 comprimidos, 3 vezes/dia, durante 1 ano)
podem ajudar a promover a abstinência. Existem estudos Como avalição de diagnóstico o padrão ouro é a
sobre redução de mortalidade não significativa com uso de endoscopia, enquanto a estratificação de risco é dada por
N-acetilcisteína IV, associado a um soro glicosado a 5%. diversos escores Glasgow Blatchford, Rockall, Rockall pós-
O transplante de fígado é uma opção razoável em pacientes endoscopia...
com cirrose alcoólica descompensada, e dados TRATAMENTO: Ressuscitação, estabilizar P.A, restaurar
observacionais sugerem que o transplante de fígado volume intravascular, avaliar sinais de choque, dispneia,
precoce pode melhorar a sobrevida em pacientes com ansiedade, torpor. Uso de cristaloides, transfusão de
hepatite alcoólica grave refratária a medicamentos. hemácias, plasma fresco, aplicar vitamina K, usara fatores
pró-coagulantes (fatores II, VII, IX e X), varfarina. Não
TRATAMENTO DAS COMPLICAÇÕES: administrar anti-inflamatórios em fase aguda.
Reposição de plasma, uso de vitamina K, monitorização de Como medicação de escolha para a hemorragia derivada da
pressão intracraniana para pacientes com encefalopatia, cirrose é a terlipressina, outras opções: somatostatina e
uso de antimicrobiana terapia para pacientes que octreotide. A administração precoce de terapia
apresentem algum quadro de infecção. Uma das farmacológica com análogos da somatostatina pode levar à
complicações mias frequentes é o sangramento parada temporária de sangramento, facilitar a execução do
gastrointestinal, para avalição de suporte deve-se exame endoscópico e reduzir a necessidade transfusional
monitorar o ph gástrico por sonda e uso de medidas em pacientes com sangramento de varizes esofágicas.
profiláticas para pacientes com ph diminuído.
Para as varizes a escolha mais adequada é a obliteração
Expansão volêmica adequada para evitar queda endoscópica de varizes gástricas com o uso de adesivos de
hipotensão, manter PAM acima entre 50-60 mmHg, tecido, tais como N-butil-2-cianoacrilato, é mais eficaz do
soluções cristaloides balanceadas como Ringer-lactato são que a ligadura endoscópica no controle e na prevenção de
a primeira escolha. O uso de vasopressores, como hemorragia inicial e de ressangramento, ao contrário das
noradrenalina, pode ser necessário. O uso de vasopressina varizes esofágicas; não é recomendada a repetição da
e terlipressina para essa indicação não parece apropriado, terapia endoscópica. O tamponamento com balão é outra
pois estudos demonstram aumento de fluxo cerebral com alternativa terapêutica para os sangramentos não
potencial de aumento da pressão intracraniana, ainda resolvidos.
assim alguns autores sugerem associar a vasopressina caso
as necessidades de norepinefrina > 0,2-0,3 mcg/kg/min.Se A terapia endoscópica pode ser repetida no primeiro
insuficiência renal recomenda-se o uso de procedimentos episódio de ressangramento no caso de varizes esofágicas,
contínuos como a hemodiálise, monitorização nutricional. mas não oferece benefício em varizes gástricas. Após esta
se deve considerar tamponamento por balão como terapia
Em pacientes com insuficiência hepática, sistemas de de resgate e ponte para uma abordagem definitiva, como a
suporte e substituição hepática podem ser úteis e incluem passagem de derivação portossistêmica transjugular (TIPS)
plasmaférese, hemodiálise e hemoperfusão com carvão ou cirurgia. O TIPS é eficaz para ambas as situações, varizes
ativado. Nos casos de insuficiência hepática grave em esofágicas e gástricas, e segundo os achados de um estudo
pacientes com hepatite fulminante, o transplante hepático randomizado, sua taxa de sucesso na recorrência do
é indicado. sangramento foi de 93%, sendo maior do que a da
Local de manejo: A maioria segue em tratamento repetição do procedimento endoscópico.
ambulatorial. Obs: Administrar um antibiótico IV se risco de varizes
Pacientes com função hepática avaliada pelo INR esofágicas (p. ex., ceftriaxona ou fluoroquinolona)
(international normalized ratio, ou seja, é a razão entre o O TIPS consiste na formação de um shunt entre a veia
tempo de ação da protrombina do paciente e a referência, hepática e porção intra-hepática da veia porta. Todo
elevada pelo index sugerido) ou pelo fator V ou com paciente com hemorragia digestiva alta deve ser tratado
encefalopatia devem ser internados. Pacientes com em UTI, embora a profilaxia de varizes esofágicas
complicações como sangramento, encefalopatia grave, decorrentes de cirrose tenha acompanhamento
disfunção renal e com indicações de transplante hepático laboratorial.
têm indicação de internação em UTI.

PROGNÓSTICO
HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA:
Em geral seria reversível com abstinência, a sobrevida
A classificação é feita tomando em vista a quantidade de melhorou nos últimos anos, mas ainda há uma
sangue perdida, % volemia, FC, diurese, SNC e ressuscitação porcentagem de cerca de 20% dos pacientes que morrem
volêmica. após 6 meses do diagnóstico.
ESCORE CLIF-C AD idade, sódio sérico, leucócitos,
creatinina sérica e INR). Uma pontuação CLIF-C AD igual ou
inferior a 45 previu uma taxa de mortalidade de 90 dias
muito baixa (2%) e uma pontuação de 60 ou superior foi
associada a taxa de mortalidade em 90 dias de 31%. Uma
forma simplificada do escore CLIF-SOFA foi desenvolvida,
que é a pontuação CLIF-C OF, formulada por pontuação de
cada sistema de órgãos usando um intervalo de 3 pontos

OUTRO MÉTODO DE AVALIAÇÃO É O ESCORE MELD:


Variáveis: Bilirrubina, creatinina, INR e etiologia
Fórmula: 3,8 x log (BT mg/dL) + 11,2 x loge (INR) + 9,6 x loge
(Cr mg/dL) + 6,6 x (etiologia: 0 se biliar ou alcoólica, 1 se
outras)

CLASSIFICAÇÃO DE CHILD-PUGH

 6 pontos – Child A, bem compensados


 7 a 9 pontos – Child B, comprometimento
funcional importante
 10 a 15 pontos – Child C, descompensados

PROFILAXIA

Parar com o uso de álcool, estratégias de saúde coletiva.


Para a prevenção das varizes esofágicas, ainda controversa,
pode ser usado beta bloqueadores, sobretudo, naquelas
pacientes de alto risco Child B ou C. Ademais, uso de
caverdilol associado a ligadura endoscópica de varizes.
Obs.: Uso de ciprofloxacina ou ceftriaxona para prevenção
de infecção após sangramento.

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