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Os direitos fundamentais sociais na estrutura da Constituição – Ernst-Wolfgang

Bockenforde

Duas questões:
- Ideia dos direitos fundamentais sociais como direitos constitucionais
- Incardinação jurídico-prática desta ideia na estrutura de uma constituição
democrática e fundamentada no princípio do Estado de Direito.

I
Sobre os direitos fundamentais sociais como direitos constitucionais
Ideia antiga

O ponto de referência sistemático-material para a ideia dos direitos


fundamentais sociais é a forma de organização da liberdade individual e social no
Estado de Direito liberal-burguês e suas consequências sociais.
Característica dessa organização: esfera pré-estatal de direito e liberdade,
localizada nos direitos fundamentais e assegurada diante de ataques estatais.
Núcleo: liberdade de opinião e religiosa, igualdade jurídica, liberdade geral de
ação e aquisição e a garantia de propriedade
Quando regulações e limitações são necessárias, dependem do
consentimento da representação popular. Estado e sociedade estão separados.
Liberdade natural e pré-estatal.
Consequências: antagonismo social na comunidade determinado pela posse,
isto é, classes sociais, e a pauperização social de alguns assalariados crescentes
em número.
A igualdade jurídica não relativiza a desigualdade natural e econômica dos
indivíduos, senão que permite que se desenvolve por completo. São, ainda,
incrementadas e consolidadas pelas gerações.
Da atuação da liberdade jurídica geral para todos resulta necessariamente a
desigualdade social, que se converte em uma não-liberdade social.

Nessa situação jurídica e social sobre a qual encontra sua necessidade e


justificação a ideia dos direitos fundamentais sociais, e não como contra-princípio
frente aos direitos fundamentais de liberdade, senão a partir do próprio princípio do
asseguramento da liberdade.

Se a liberdade jurídica deve poder se converter em liberdade real, seus


titulares precisam de uma participação básica nos bens sociais materiais; inclusive
esta participação nos bens materiais é uma parte da liberdade, da que é um
pressuposto necessário para sua realização.

Os direitos fundamentais sociais tendem, de acordo com sua ideia, ao


asseguramento desta participação nos bens materiais: trabalho, vivência, educação,
atenção em caso de enfermidade etc.

Pretensão de realização pelo Estado.

A liberdade deve possibilitar-se e assegurar-se realmente mediante


prestações sociais e garantias estatais.

Se trata da garantia (aseguramiento) da liberdade, não da superação da


liberdade em benefício de formas coletivas de vida. É a manifestação de que a
liberdade já não tem e encontra sua realidade ante vinculações sociais e relações
jurídicas, como âmbito de autonomia, senão nas tais vinculações e relações
jurídicas.

II
Como realizar a incardinação desta ideia na estrutura de uma constituição
democrática e fundamentada no princípio do Estado de Direito

É muito comum a ideia de incluir simplesmente os direitos fundamentais


sociais na constituição ao lado dos direitos fundamentais de liberdade, dotá-los da
mesma aplicabilidade que têm estes e deixar o resto à concretização através do
legislador, da Administração e dos Tribunais.

Assim, contudo, são deixadas de lado as diferenças estruturais entre os


direitos fundamentais de liberdade e os direitos fundamentais sociais de prestação,
diferenças que devem levar, consequentemente, a outra forma de garantia jurídica e
de asseguramento.

Os DL pretendem impor ataduras à ação do Estado e estabelecer limites.


A liberdade aqui é algo anterior, não criada por regulação legal, mas proteção
e ou limitada por ela.

Os DS não partem de algo antecedente já dado. Para assegurar esses DS se


necessita, com anterioridade à garantia de proteção jurídica, uma ação estatal ativa,
positiva. Necessita medidas do legislador, da administração, que procurem o acesso
aos bens materiais e à participação nestes.

Os direitos de liberdade se impõem por si mesmos, são realizáveis


diretamente no nível da constituição pela via de pretensões jurídicas concretas;
existem por si mesmos, não precisam ser produzidos e pode ser protegido de forma
jurídica imediata.

DS – a pretensão constitucional neles contida é tão geral que não se pode


deduzir pretensões jurídicas concretas pela interpretação.
Tudo isso, num ordenamento constitucional democrático baseado no princípio
da articulação de poderes, são tarefas que correspondem em primeiro lugar ao
legislador legitimado democraticamente de maneira direto e em segundo lugar à
administração e não podem ser resolvidos pela via da interpretação do enunciado
constitucional que formula o DS.

DS – não podem fundamentar diretamente em si pretensões jurídicas; não


representam direito imediato para os cidadãos quando estão na CF e antes de sua
conformação pelo legislador.
Se dirigem com aplicabilidade imediata aos órgãos estatais legisladores e
administrativos.

O resultado não é outro quando a ideia dos direitos fundamentais não se


pretende implantar mediante DS expressamente formulados, mas fazendo com que
os DL tenham reconhecida uma vertente social, prestacional, de modo que, no seu
âmbito de proteção, contenham ao mesmo tempo DL e DS.

Segundo o autor, os problemas de estrutura continuam, com consequências


mais amplas.

A liberdade de imprensa – obrigação estatal de manter a pluralidade de


imprensa
A liberdade de religião – obrigação estatal de garantir base econômica
existencial das comunidades
Etc

A política se transforma em execução judicialmente controlada da


Constituição.

Não é porque os direitos fundamentais não devem ter caráter de direitos


fundamentais em sentido estrito como aplicabilidade imediata e pretensão subjetiva,
que podem ser simples proposições programáticas e não vinculantes

A incardinação jurídico-prática da constituição que é adequada é a forma de


mandato constitucional.

Mandato constitucional – deveres jurídico-objetivos que têm como


destinatários os órgãos estatais na legislação e na administração, deveres de atuar
para a realização do fim ou do programa formulado no mandato através das
medidas apropriadas, com o que se deixam ao parecer e entender do juízo político
do órgão atuante, e com isso, ao processo político, a via, a dimensão e as
modalidade de realização.
A vinculação jurídica desses mandatos consiste em três coisas:
O fim ou programa é algo posto;
É inadmissível a inatividade ou desatenção evidente e grosseira do fim pelo Estado;
As regulações e as medidas, uma vez estabelecidas, se mantem
constitucionalmente de maneira que a via da relação do mandato nelas descrita está
protegida frente a uma supressão definitiva ou frente a uma redução drástica.
Efeito estimulante do mandato

Podem conter uma faceta jurídico-subjetiva: pretensões de defesa frente a


uma inatividade, desatenção grosseira ou supressão definitiva das medidas
adotadas

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