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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO................................................................................ 3

2. ENTENDENDO A SURDEZ............................................................ 4

3. OS NÚMEROS DA SURDEZ.......................................................... 9

4. CONSELHOS ÚTEIS NO APRENDIZADO E USO DA LIBRAS ... 11

5. BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS ................ 13

6. QUEM SÃO OS SURDOS? .......................................................... 15

7. O INTÉRPRETE DE LIBRAS NO BRASIL ................................... 17

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................... 27

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1. INTRODUÇÃO

Nessa apostila iremos retratar sobre o papel do Tradutor e Interprete de


Libras em sala de aula. E para entendermos esse papel, devemos entender
alguns conceitos referentes à Surdez.
Sendo assim, iremos iniciar essa apostila com os conceitos básicos sobre
a Surdez, tipo de deficiência auditiva, como é feito o diagnóstico da pessoa com
surdez, entre outros assuntos referentes a esse tema.
Continuando nossa apostila, iremos retratar ainda sobre o Tradutor e
Interprete de Libras em sala de aula, como deve ser a sua postura, entre outros.
Por isso, aproveite a leitura!

Fonte: agorams.com.br

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2. ENTENDENDO A SURDEZ

Como ouvimos o som?

O ouvido é dividido em três partes: Ouvido Externo, Ouvido Médio e


Ouvido Interno. O som é recebido primeiramente pelo ouvido externo (orelha), e
então percorre todo o canal auditivo até atingir o ouvido médio (tímpano). A
membrana é fina e muito sensível, o que faz com que ela vibre ao receber o som.
Esta vibração atinge três ossículos (bigorna, martelo e estribo), que passam a
vibrar também, chegando até o ouvido interno (cóclea e canal semicircular), onde
todas essas vibrações são transformadas em impulsos elétricos, chegando ao
cérebro pelo nervo auditivo. O cérebro por sua vez recebe esses impulsos
interpretando-os como o som que ouvimos.

Fonte: r7.com/data/files

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Surdez

É a incapacidade parcial ou total de ouvir. As principais causas podem


ocorrer durante a gravidez, no parto, na infância ou ao longo da vida por doenças
como: caxumba, rubéola, otites etc. As perdas auditivas ocorrem quando existe
problema em alguma das partes do ouvido, podendo ser divididas em quatro
grupos:
1. Condução: Ocorre no trajeto do som entre o ouvido externo e o ouvido
médio. Pode ser estimulada pela vibração sonora, ou seja, pode acontecer com
o aumento da intensidade do estímulo sonoro.
2. Neurossensorial: É uma impossibilidade de recepção do som por
lesão das células ciliadas da cóclea ou do nervo auditivo. Ocorre no ouvindo
interno.
3. Mistas: É a união dos dois grupos anteriores. Ocorre quando há uma
alteração na condução do som até o órgão terminal sensorial associado à lesão
do órgão sensorial ou do nervo auditivo.
4. Central: É uma dificuldade na compreensão das informações sonoras.
Ocorre através de alterações no processamento da informação sonora do
sistema nervoso central.

Tipos de deficiência Auditiva

A deficiência auditiva pode variar em diferentes graus, desde o grau leve


até o grau profundo.
Surdez Leve:

Neste caso, a pessoa quase nunca percebe a perda auditiva, que só


passa a ser conhecida através de um exame de Audiometria (teste de audição).
 Perda auditiva de 25 até 40 decibéis;
 A voz de longe não é ouvida;
 Não se percebe todos os fonemas das palavras;
 Causa dificuldade na escrita e na leitura, mas é possível obter
aquisição normal da linguagem.
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Fonte: encrypted-tbn0.gstatic.com/

Surdez Moderada:

Quando a pessoa sofre de surdez moderada, os sons parecem ficar


distorcidos, fazendo com que em uma conversa, as palavras fiquem abafadas e
mais difíceis de entender. Até mesmo o som de campainhas ou telefone passa
a ser difícil de ouvir, fazendo com que o deficiente auditivo peça sempre que as
pessoas ao seu redor falem mais alto ou repitam as palavras ditas.
 Perda auditiva entre 40 e 70 decibéis;
 Consegue ouvir, mas para entender as palavras precisa que a voz seja
dita com uma alta intensidade;
 Neste caso já apresenta atraso na linguagem, podendo ter também
problemas linguísticos graves;
 Grande dificuldade de entendimento em lugares com muitos barulhos;
 Percebe as palavras mais significativas, tendo maior dificuldade em
compreender alguns termos e fases gramaticais mais complexas;
 Usa a percepção visual para entender a linguagem.

Surdez Severa

Neste caso, a pessoa com a deficiência raramente se assusta com sons


altos, e o aprendizado, no caso de crianças se torna muito difícil, fazendo
também com que se tenha atraso no desenvolvimento da linguagem.
 Perda auditiva entre 70 e 90 decibéis;
 Percebe alguns ruídos familiares, e em alguns casos a voz forte;
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 Pode chegar até os cinco anos sem aprender a falar;
 A compreensão verbal depende da aptidão em usar a percepção visual
para entender todo o contexto.

Surdez Profunda

No caso da surdez profunda, o deficiente auditivo perde totalmente a


capacidade de ouvir qualquer som, diferente de alguns casos de surdez, que a
pessoa pode voltar a ouvir com o auxílio de aparelhos para surdez. Na surdez
profunda a única forma de passar a ouvir, é através de uma técnica
recentemente descoberta, chamada implante coclear.
 Perda auditiva superior a 90 decibéis;
 Não percebe a voz humana;
 A construção da linguagem oral é muito difícil e bastante complexa,
envolvendo várias aquisições, como por exemplo: conhecer o som, usar
todas as maneiras perceptivas para complementar a audição, e aprender
a expressar-se.

Fonte: encrypted-tbn3.gstatic.com/images

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Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico da provável causa da surdez é feito através da análise do


histórico familiar do paciente, exame de ouvido e testes com diapasões para que
se determine o grau e tipo de surdez (condução ou percepção), além de exames
com aparelhos especiais se necessário, para que se avalie melhor a audição,
sendo o mais importante a Audiometria. Quando a pessoa, além da surdez,
apresenta tonturas, verifica- se também o labirinto e o sistema nervoso central.
A ressonância magnética também se faz necessária, no caso de suspeita de
algum tumor.

Tratamento

O tratamento da surdez vai depender da sua provável causa.


 No caso da surdez ter sido provocada pelo acúmulo de cera no canal
auditivo, será feita somente a remoção da mesma com material especial.
 No caso de haver perfuração no tímpano, ou lesões nos ossículos
(martelo, bigorna e estribo), o tratamento é somente cirúrgico.
 Se houver secreção acumulada atrás do tímpano (otite secretora) por
mais de 90 dias, sem que haja melhora na audição do paciente, o
procedimento cirúrgico também é indicado.
 Em caso de tumores, o tratamento é essencialmente cirúrgico,
radioterápico ou radio cirúrgico.
Muitos pacientes podem ser indicados ao uso dos aparelhos auditivos,
para que haja a ampliação do campo auditivo. Para pacientes que estão nos
grupos de surdez severa e profunda (vistas anteriormente), está indicado o
implante coclear, que são sistemas eletrônicos implantados cirurgicamente, com
a função de transmitir estímulos elétricos ao cérebro através do nervo auditivo,
que são interpretados como som.

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3. OS NÚMEROS DA SURDEZ

No Brasil

No Brasil, estima-se que existam cerca de 15 milhões de pessoas com


algum tipo de perda auditiva. No Censo de 2000, realizado pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 3,3% da população responderam
ter algum problema auditivo. Aproximadamente 1% declarou ser incapaz de
ouvir.
No Maranhão, de acordo com levantamentos realizados pelo IBGE/2000,
o número de surdos é de aproximadamente 200 mil pessoas, enquanto na ilha
de São Luís foram registrados 27.922 surdos.
Atualmente o Brasil atende a cerca de 700 mil pessoas com surdez nos
diversos níveis e modalidades de ensino, distribuídas entre escolas especiais
para surdos, escolas de ensino regular e ONGs.

Fonte: vidamaislivre.com.br/

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que


1,5% da população brasileira (2,25 milhões) são portadores de deficiência
auditiva. Em 1998, havia 293.403 alunos, distribuídos da seguinte forma: 58%
com problemas mentais; 13,8%, com deficiências múltiplas; 12%, com
problemas de audição; 3,1% de visão; 4,5%, com problemas físicos; 2,4%, de

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conduta. Apenas 0,3% com altas habilidades ou eram superdotados e 5,9%
recebiam "outro tipo de atendimento" (Sinopse Estatística da Educação
Básica/Censo Escolar 1998, do MEC/INEP).
No Brasil, empresas com mais de cem funcionários devem contratar 2%
de pessoas com deficiência, com 201 a 500 funcionários - 3%, de 501 a 1000%
- 4 % e de 1001 funcionários em diante, 5%.

Fonte: prograd.uff.br/sensibiliza/

No Mundo

Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que 10% da


população mundial apresentam algum problema auditivo.

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4. CONSELHOS ÚTEIS NO APRENDIZADO E USO DA LIBRAS

Fonte: dinet.tv/img/fotos/sinais

 Para que um sinal seja produzido corretamente, é necessário observar:


Configuração de mão, ponto de articulação, movimento e expressão.
 Focalize o rosto do usuário da LIBRAS, não as mãos. Como usuário da
LIBRAS, você aprenderá a ampliar seu campo visual.
 Caso não encontre um sinal para uma determinada palavra, lembre-se de
que somente a comunidade surda poderá criá-lo.
 Certifique-se de que haja claridade suficiente no momento da conversa em
LIBRAS.
 Não tenha receio de sinalizar e errar. O erro faz parte do processo de
aprendizagem.
 Pode ser que em sua cidade, devido ao regionalismo, os surdos utilizem
alguns sinais diferentes para a mesma palavra. Caso isto ocorra, busque
conhecê-los também com o próprio surdo.
 Nem sempre você encontrará um sinal que signifique exatamente a palavra
que deseja empregar. Caso isso ocorra, procure um sinal que mais se
aproxime. EX.: CONFECCIONAR (FAZER - sinal em LIBRAS).
 Os termos técnicos, possivelmente, não terão sinais específicos que os
represente exatamente.

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 Portanto, é recomendável digitá-lo para o surdo e tentar "interpretá-lo", até
que ele, entendendo o contexto, crie o sinal correspondente.
 Informe aos surdos sobre o que acontece ao seu redor.
 Procure dar ao surdo o máximo de informações visuais. Ex.: campainha
luminosa para início e término de qualquer atividade.
 Se você quiser chamar a atenção de um surdo, procure tocá-lo no ombro se
estiver próximo, ou acene com os braços se estiver distante.
 O contato com a comunidade surda é fundamental nesse processo de
aprendizado da língua, pois além do grande exercício que se pode fazer, é
uma preciosa oportunidade de se conhecer também a cultura dessa
comunidade.

Fonte: librasjosenetoculturasurda.blogspot.com.br

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5. BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS

Fonte: portal.rac.com.br/

A história da educação dos surdos é cheia de controvérsias e


descontinuidades. A primeira notícia que temos é do século XII, quando os
surdos não eram considerados humanos, não tenham direito à herança, não
frequentavam nenhum meio social e eram proibidos de se casarem.
Na Idade Média, com o feudalismo, os surdos começaram a ter atenção
diferenciada pelo clero (Igreja), que estava muito preocupado com o que tais
pessoas faziam e por que não vinham se confessar. As pessoas não iam se
confessar porque não apresentavam uma língua estruturante para seu
pensamento. Mas a igreja também estava muito preocupada, pois nasciam
muitos surdos nos castelos dos nobres, devido à frequência dos casamentos
consanguíneos, comuns na época, visto que a nobreza não queria dividir sua
herança com outras famílias e acabavam casando-se entre primos, sobrinhas,
tios e até irmãos.

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Como nos mosteiros da Igreja havia padres, monges e frades que
utilizavam de uma língua gestual rudimentar, porque nesses ambientes existia o
voto do silêncio, esses religiosos foram deslocados para esses castelos com a
missão de educar os filhos surdos dos nobres em troca de grandes fortunas.
Quanto ao método utilizado na época não temos registros, mas sabe-se
que alguns acreditavam que deveriam priorizar a língua falada, outros, a língua
de sinais e outros, ainda, o método combinado.
Em 1880, aconteceu o Congresso Mundial de Professores de Surdos em
Milão, na Itália, onde foi discutido qual seria o melhor método para a educação
dos surdos. Nesse congresso ficou resolvido que o melhor método era o oral
puro, sendo proibida a utilização da língua de sinais a partir desta data.
A partir daí as crianças surdas, muitas vezes, tinha suas mãos amarradas
para trás e eram obrigadas a sentarem em cima das mãos ao irem para a escola,
para que não usassem a língua de sinais.
Tal opressão perdurou por mais de um século, trazendo uma série de
consequências sociais e educacionais negativas. No Brasil, a primeira lei que
viabiliza o uso da Língua Brasileira de Sinais como a primeira língua dos surdos
foi assinada em novembro de 2002 pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso.

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6. QUEM SÃO OS SURDOS?

Fonte: ebc.com.br/

São aquelas pessoas que utilizam a comunicação espaço- visual como


principal meio de conhecer o mundo, em substituição à audição e à fala. A
maioria das pessoas surdas, no contato com outros surdos, desenvolve a Língua
de Sinais. Já outros, por viverem isolados ou em locais onde não exista uma
comunidade surda, apenas se comunicam por gestos. Existem surdos que por
imposição familiar ou opção pessoal preferem utilizar a língua oral (fala).

Deficiência Auditiva

Termo técnico usado na área da saúde e, algumas vezes, em textos


legais. Refere-se a uma perda sensorial auditiva. Não designa o grupo cultural
dos surdos.

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Surdo-Mudo

Fonte: 3.bp.blogspot.com/

Provavelmente a mais antiga e incorreta denominação atribuída ao surdo,


e infelizmente ainda utilizada em certas áreas e divulgada nos meios de
comunicação, principalmente televisão, jornais e rádio.
O fato de uma pessoa ser surda não significa que ela seja muda. A mudez
é uma outra deficiência, totalmente desagregada da surdez. São minorias os
surdos que também são mudos. Fato é a total possibilidade de um surdo falar,
através de exercícios fonoaudiólogos, aos quais chamamos de surdos
oralizados.
Também é possível um surdo nunca ter falado, sem que seja mudo, mas
apenas por falta de exercício.
Por isso, o surdo só será também mudo se, e somente se, for constatada
clinicamente deficiência na sua oralização, impedindo-o de emitir sons. Fora isto,
é um erro chamá-los de surdo-mudo. Apague esta ideia!

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7. O INTÉRPRETE DE LIBRAS NO BRASIL

Fonte: ebc.com.br/educacao/

A presença de intérprete, na mediação entre surdos e ouvintes, deve ser


tão antiga quanto à existência das pessoas surdas pelo mundo. Aqui, no Brasil,
temos notícia da convocação oficial de intérprete, por órgão judicial, ao então
Instituto Nacional de Surdos-Mudos, ainda no final do século XIX, conforme
documentos existentes na biblioteca do INES 25.
Na década de 80, quando ingressei no quadro de profissionais dessa
instituição, havia um funcionário técnico-administrativo (inspetor de aluno),
chamado Francisco Esteves, que era reconhecido e respeitado pela comunidade
escolar como sendo o único profissional com domínio da língua de sinais,
denominada, na época, de mímica. O sr. Esteves, como era conhecido,
sinalizava livremente com os alunos surdos nos vários ambientes do INES
(corredores, pátio, refeitório e dormitórios), mas não tão livremente em eventos
no auditório da instituição, onde, oficialmente, não era permitido. Utilizava a
língua de sinais na comunicação com os alunos desempenhando o papel de
intérprete, de maneira informal, pois a língua de sinais não era reconhecida como
tal, não sendo tolerada por sucessivas direções dessa instituição e pela maioria
dos professores, por longas décadas. Essa informação foi validada pelo
professor Geraldo Cavalcanti, já citado anteriormente, em comentários
realizados nos cursos que ministrava, através de declarações de ex-alunos do

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INES, e por mim própria, pois sou testemunha do fato quando do meu ingresso
na instituição no ano de 1984.
Por ocasião da constituinte que preparou a Constituição Brasileira de
1988 surgiram as comissões 26 de luta das pessoas portadoras de deficiência.
No Rio de Janeiro, a representação dos surdos foi constituída por Ana Regina e
Souza Campello e João Carlos Carreira Alves, que tinham como intérprete nos
eventos a jovem pernambucana, Denise Coutinho, que se encontrava nessa
cidade para estudar. Era ela já conhecedora da língua de sinais e, portanto,
assumia, corajosamente, a tarefa de interpretar em público em uma época que
nenhum incentivo existia para o exercício dessa função, muito pelo contrário, era
uma atuação considerada por profissionais da área, como sendo um retrocesso
à imagem social dos surdos e das pessoas que assim, por ventura procedessem,
sendo, severamente. Criticadas e desprestigiadas. A estudante Denise Coutinho
foi a primeira pessoa a assumir a interpretação da LIBRAS publicamente, em
evento coletivo, podendo ser considerada a primeira
Intérprete de LIBRAS no Rio de Janeiro, Quiçá no Brasil.
Outro profissional que se destacou, nesse início de trabalho de
interpretação, foi Ricardo Sander, sendo o primeiro a apresentar o Hino Nacional
em LIBRAS, em eventos oficiais da FENEIS, no final da década de 80. Vale
registrar que João Carlos Carreira Alves, já citado, foi o primeiro intérprete de
LIBRAS atuando em sala de aula no Rio de Janeiro. Em 1988, a Secretaria de
Educação do Estado do Rio de Janeiro organizou a primeira experiência com
turma de alunos surdos no Ensino Médio com a presença de intérprete. Essa
experiência se deu na Escola Estadual “Alceu Amoroso Lima”, em Laranjeiras,
próximo ao INES.

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Fonte: abcdoabc.com.br/images/

No INES, a interpretação voltou a ser realizada, publicamente, no início


dos anos 90, por iniciativa pessoal desta pesquisadora, em eventos diversos no
auditório do INES e, posteriormente, fora em reuniões do movimento de greve
dos servidores públicos federais e posteriormente por ocasião do movimento
estudantil do “Fora Collor”, marcando com isso a inclusão dos alunos do INES
nesse cenário de luta que se tornou nacional. Nessa ocasião os alunos surdos
se conscientizam da necessidade de se organizarem politicamente e fundam o
Grêmio Estudantil do INES, quando passam a reivindicar, através de
movimentos internos e externos (movimento estudantil junto a AMES –
Associação Municipal de Estudantes), o uso da LIBRAS; outro profissional do
INES que também se interessou pela aprendizagem da LIBRAS e sua
interpretação foi o professor de desenho José Maria Domingues, o qual
interpretava as missas realizadas nessa instituição.

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Sabemos que a interpretação sempre existiu com a atuação,
principalmente, de pessoas que tinham surdos na família, que, pela
necessidade, assim procediam (cf. Quadros, 2002:30). Mesmo que a família não
considerasse os sinais como uma forma de comunicação prestigiada
socialmente, viam-se obrigadas a traduzir, diante da premente necessidade de
comunicação da parte desses surdos, fora do ambiente familiar, como em
consultas médicas, compras em geral, em delegacias de polícia, bem como em
ligações telefônicas e outros. Historicamente, assim surgiram os primeiros
intérpretes, filhos ouvintes de pais surdos ou parentes de pessoas surdas (cf.
Cokely, 1980). Algumas das informações que aqui registro não estão em
documentos, mas as recupero de relatos de profissionais, aposentados, e,
também, de minha experiência pessoal.
É com a organização da FENEIS, portanto, que a atuação profissional de
intérpretes de língua de sinais tem seu início e se estabelece no Brasil. São os
próprios surdos, que não mais suportando o bloqueio da comunicação, a falta
total de acesso às informações, e, por total omissão dos órgãos governamentais,
deflagram não só um movimento reivindicando o reconhecimento dessa
atividade profissional, como também promove o início desse trabalho em todo o
Brasil.

Fonte: kellycanuto.com/kelly-canuto-o-papel-do-interprete-de-libras/

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Atualmente, a FENEIS possui, em seu quadro funcional, profissionais
intérpretes capacitados em cursos livres de curta duração, organizados e
promovidos por ela mesma, em todos os estados em que já implantou sua
representação, contando, no momento, com uma dezena de regionais. Possui
uma tabela básica com valores a serem cobrados pelo trabalho de interpretação.
Essa, é uma tabela de referência, respeitada pela comunidade ouvinte, que
passou a valorizar e a solicitar esse trabalho remunerado à FENEIS. Tal fato
muda, totalmente, o antigo cenário de atuação do intérprete, de caráter
filantrópico até então, muito forte, no imaginário da sociedade em geral, dos
usuários surdos, bem como da própria pessoa que se propunha a desempenhar
essa função.

Fonte: nogueirense.com.br/wp-content/uploads/2012/10/IMG_00141.jpg

O próprio INES passa a utilizar dos serviços de intérpretes capacitados


pela FENEIS, a partir do final da década de 90. Entretanto, os intérpretes que
continuam a surgir não dispõem de um curso de formação, nem em nível médio,
nem em nível superior, em todo o Brasil, contando apenas com cursos livres de
curta duração que a FENEIS se empenha em manter realizando.
Em 1988, a FENEIS realiza, no Rio de Janeiro, o I Encontro Nacional dos
Intérpretes em Língua de Sinais. Nesse mesmo ano, publica uma espécie de

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manual com o título “A Importância dos Intérpretes da Linguagem de Sinais”,
note-se que nesse tempo, a comunidade surda não utilizava, ainda, uma
denominação própria para a língua de sinais. Havia, sim, uma denominação
utilizada pelas linguistas Lucinda Ferreira Brito e Tanya Amara Felipe que se
referiam, em seus artigos, no final da década de 80, como Língua de Sinais dos
Centros Urbanos Brasileiros – LSCB.
O documento da FENEIS, mencionado anteriormente, registra em sua
apresentação, o pensamento da época sobre o que era esperado do intérprete
de língua de sinais: “Trata-se de um tradutor que se coloca entre os que ouvem
e se expressam de viva voz e os que se comunicam por meio de gestos, de
sinais e do alfabeto manual. Esse intérprete facilita em muito a comunicação, a
informação e a compreensão dos surdos” (1988: 07). No ponto dedicado às
atribuições do intérprete, o documento esclarece que o “intérprete desempenha
um número incontável de ações, na rua, no lar, em ocasiões imprevisíveis”.
Essa publicação, que possui características de um manual, tem como
preocupação destacar os lugares onde se considera necessária a presença do
profissional intérprete de língua de sinais: (...) nos meios de comunicação de
massa sonoros (rádio, cinema, televisão); em palestras, conferências,
seminários, simpósios e outras formas de reunião; atuando como intermediário
na transmissão de informações em hospitais, repartições públicas, portos,
aeroportos, estações ferroviárias e rodoviárias; em igrejas, escolas, atendimento
telefônico e em situações de emergência e de lazer (FENEIS 1988:13).
Em 1992 é realizado o II Encontro Nacional de Intérpretes, também no Rio
de Janeiro, ocasião em que foi aprovado o código de ética, em vigor até a
presente data. Outro documento que trata das questões relacionadas ao trabalho
profissional dos intérpretes de LIBRAS foi “O Surdo e a Língua de Sinais”,
produzido por uma Câmara Técnica, organizada pela CORDE - Coordenadoria
Nacional de Apoio à Pessoa Portadora de Deficiência – em 1996. Nesse
documento, o intérprete é caracterizado da seguinte maneira: “O intérprete é um
profissional bilíngue, que efetua a comunicação entre: surdo x ouvinte; surdo x
surdo; surdo x surdo - cego; surdo - cego x ouvinte. ”

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Fonte: paginapopular.com.br

Mais adiante, no item relativo aos requisitos para o exercício da função, o


mesmo documento, diz: O intérprete deve ser um profissional l bilíngue;
reconhecido pelas associações e/ou órgãos responsáveis; intérprete e não
explicador; habilitado na interpretação da língua oral, da língua de sinais, da
língua escrita para a língua de sinais, e da língua de sinais para a língua oral (cf.
CORDE, 1996:08).
É com a realização do Programa Nacional de Apoio à Educação dos
Surdos que o MEC publica, através da SEESP, no ano de 2002, “O tradutor e
intérprete de língua brasileira de sinais e língua portuguesa”, autoria de Ronice
Müller de Quadros, intérprete e pesquisadora da LIBRAS. Essa publicação trata
a confiabilidade, imparcialidade, discrição, distância profissional e fidelidade
como papéis reservados ao intérprete ao realizar a interpretação da língua falada
para a língua sinalizada e vice-versa (cf. 2002: 28). É nesse emaranhado de
descrições, perfis e requisitos que o intérprete de LIBRAS entra em cena no
contexto da sala de aula, aqui no Brasil.
Diante do exposto, julgo ser necessário compreender, na realidade da
interpretação, isto é, em um encontro real interpretado, quais os papéis
assumidos pelo intérprete de LIBRAS, principalmente, quando atua em um
cenário diferente e complexo como é a interação em uma sala de aula onde
convivem alunos surdos e ouvintes, falando diferentes línguas. É necessário,
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portanto, verificar os caminhos percorridos pelo saber teórico no campo da
tradução/interpretação, revendo, discutindo e selecionando a base teórica que
me permitirá alcançar os objetivos traçados para esta pesquisa, conforme
mencionado no parágrafo anterior.

Caracterizando a interpretação

Fonte: abrapt.files.wordpress.com

Historicamente, a tradução e a interpretação têm sido tratadas como


atividades correspondentes. Frishberg (1990) argumenta que os termos
tradução e interpretação podem ser considerados como sinônimos um do
outro. As concepções tradicionais sobre interpretação tratavam, basicamente, a
tradução da fala como equivalente à tradução da escrita. Conforme essa
tradição, pesquisas em interpretação têm estabelecido uma correspondência
entre “texto fonte” e “texto alvo” como fornecidos oralmente (cf.Wadensjö,
1998:276). Na visão de Meteor. (1999a) tanto a tradução como a interpretação
consistem na interpretação de um dado texto em uma outra língua.
Em Frishberg (1990) encontramos duas distinções básicas para a
compreensão do tema. Segundo ela, o termo tradução pode ser usado em
sentido amplo para referir-se à troca de mensagens de uma língua para outra,
sendo que a forma dessa língua pode ser escrita, oral ou sinalizada, podendo ter
ortografia oficial, formas escritas ou não. Em um sentido restrito, técnico, o termo

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tradução refere-se ao processo de trocas da mensagem escrita de uma língua
para outra, enquanto que a interpretação se refere a um processo de troca
imediata de mensagens produzidas de uma língua para outra. Essas línguas
podem ser escritas, orais ou sinalizadas, mas com uma característica distinta em
relação ao discurso: a transmissão imediata e ao vivo.

Quem é o Intérprete: Pessoa que transmite o que foi dito de uma língua
(língua fonte) para outra (língua alvo).

Quem é o Tradutor: Pessoa que traduz de uma língua para outra. Refere-se ao
processo envolvendo pelo menos uma língua escrita. Assim tradutor é aquele
que traduz um texto escrito de uma língua para a outra (seja ela escrita ou oral).

Intérprete de Língua de Sinais - LIBRAS:


O intérprete de Língua de Sinais - LIBRAS é a pessoa que interpreta a
mensagem de uma dada língua para a língua de sinais e vice-versa, sem perder
o seu sentido original.
É importante lembrar que a interpretação entre duas línguas é bidirecional
(como uma via de mão dupla).

O que envolve o ato de interpretar?

Fonte: blogdareitoria.ufscar.br

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 Envolve um ato cognitivo-linguístico (atenção, percepção, memória,
raciocínio, juízo, imaginação, pensamento e linguagem). Intenções
comunicativas específicas/línguas diferentes.
 Está envolvido na interação comunicativa (Social e Cultural).
 Processa informações dadas na língua fonte e faz escolhas (o tempo
todo) para a língua alvo.
 Desafio: a modalidade e/ou meio de comunicação entre a Língua de
Sinais - LIBRAS e a Língua Oral são muito diferentes (Oral-Auditivo x
Sinal-Visual).
Além disso, o intérprete deve respeitar seu Código de Ética, onde os itens
a seguir são os mais importantes: confiabilidade (sigilo), imparcialidade (neutro),
discrição (limites na atuação), fidelidade (fiel às informações).

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BIBLIOGRAFIA

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Resolução CNE/CEB 2/2001. Diário Oficial da União, Brasília, 14 de setembro
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(org.) O método e o dado no estudo da linguagem. Campinas: Editora da
Unicamp, 1996, pp. 15-29.

27
PINHEIRO, O. G. Entrevista: uma prática discursiva in SPINK, M. J. (org)
Práticas Discursivas e produção de sentidos no cotidiano – Aproximações
teóricas e metodológicas. São Paulo: Cortez Ed., 1997.

SÁ, Nídia Regina Limeira de. Os Estudos Surdos. 2004.

SILVA. Tomaz.T. Contrabando, incidentes de fronteira: ensaios de estudos


culturais em educação. Porto Alegre. 1998.

SKLIAR, Carlos. A Surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre:


Editora Mediação, 1998.

28
ARTIGO PARA REFLEXÃO

Fonte: 2.bp.blogspot.com/-

A ESCOLA INCLUSIVA PARA SURDOS: A

SITUAÇÃO SINGULAR DO

INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS

DISPONÍVEM EM: http://www.anped.org.br/reunioes/27/gt15/t151.pdf

AUTORES: LACERDA, Cristina B. F. de - UNIMEP

POLETTI, Juliana E. - UNIMEP

GT: Educação Especial /n.15

ACESSO EM: 02/06/2016

29
O intérprete de língua de sinais é uma figura pouco conhecida no âmbito
acadêmico.
Os estudos existentes no Brasil e no cenário mundial são escassos, tanto
no que diz respeito ao intérprete de maneira ampla, quanto a pesquisas que
remetam ao intérprete educacional especificamente.
Na busca de solucionar os problemas de comunicação enfrentados pelos
alunos surdos, quando de sua inserção no ensino regular surgem propostas de
reconhecimento de que estes necessitam de apoio específico, de forma
permanente ou temporária, para alcançar os objetivos finais da educação e,
então, devem ser oferecidos, apoios tecnológicos e humanos que contemplem
suas possibilidades (Volterra, 1994). Um desses apoios humanos é o intérprete
de língua de sinais, o qual foi incorporado há vários anos no espaço educacional
em vários países (Cokely, 1992).
Apesar da relevância que este assunto possui, há escassez de material a
esse respeito especialmente quando o foco é o ensino fundamental. Quando se
insere um intérprete de língua de sinais na sala de aula abre-se a possibilidade
do aluno surdo receber a informação escolar em língua de sinais, através de uma
pessoa com competência nesta língua. Ao mesmo tempo, o professor ouvinte
pode ministrar suas aulas sem preocupar-se em como passar a informação em
sinais, atuando em sua língua de domínio. Na medida em que a condição
linguística especial do surdo é respeitada, aumentam as chances de ele
desenvolver-se e construir novos conhecimentos de maneira satisfatória, em
contraponto a uma ‘inclusão escolar’ sem qualquer cuidado especial (Lacerda,
2000 a).
Por outro lado, a presença de um intérprete de língua de sinais não
assegura que questões metodológicas, levando em conta os processos próprios
de acesso ao conhecimento, sejam consideradas ou que o currículo escolar sofra
ajustes para contemplar peculiaridades e aspectos culturais da comunidade
surda (Shaw e Jamieson, 1997; Antia e Stinson, 1999; Lacerda, 2000c). Por fim,
não há garantia de que o espaço sócio educacional em um sentido amplo seja
adequado, já que criança surda poderá permanecer, de certa forma, às margens
da vida escolar (Lacerda, 2000b e Antia, Stinson and Gaustad,2002).

30
De acordo com o Artigo 12, § 2º da Resolução CNE/CEB nº 2
(11/09/2001): «deve ser assegurada, no processo educativo de alunos que
apresentam dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos
demais educandos, a acessibilidade aos conteúdos curriculares, mediante a
utilização de linguagens e códigos aplicáveis, como o sistema Braille e a língua
de sinais (...)»
Posteriormente, a Lei nº 10.436 (24/04/2002) reconhece a legitimidade da
Língua Brasileira de Sinais – Libras e com isso seu uso pelas comunidades
surdas ganha respaldo do poder e dos serviços públicos. Essa lei também torna
obrigatório o ensino da Libras aos estudantes de Fonoaudiologia e Pedagogia,
aos estudantes de magistério e nos cursos de especialização em Educação
Especial, o que amplia as possibilidades de, futuramente, o trabalho com os
alunos surdos ser desenvolvido de forma a respeitar sua condição linguística
diferenciada. Consta do artigo segundo: Deve ser garantido, por parte do poder
público em geral e empresas concessionárias de serviços públicos, formas
institucionalizadas de apoiar o uso e difusão da Língua Brasileira de Sinais -
Libras como meio de comunicação objetiva e de utilização corrente das
comunidades surdas do Brasil.
Estas leis sugerem a importância do intérprete, mas não preveem
explicitamente sua presença, o que implica na organização da comunidade
surda e ouvinte para a obtenção desse recurso. Poucos são os locais no Brasil
que têm experiência com a prática de intérpretes em sala de aula, especialmente
no ensino fundamental. Pela política de inclusão e pela recente oficialização da
Libras, torna-se essencial discutir a importância, o papel e as possibilidades de
atuação deste profissional em nossa realidade.

O papel do intérprete na escola: refletindo sobre diferentes


experiências
Stewart and Kluwin (1996) interessados em conhecer melhor os trabalhos
de intérpretes educacionais realizaram um estudo bibliográfico e examinaram
manuais confeccionados por escolas para orientar intérpretes, nos Estados
Unidos. Na formação de intérpretes pouco é discutido em relação a sua atuação

31
como intérprete educacional. Não se conhece muito sobre o que é feito em sala
de aula e quais são os efeitos destas práticas.
Nas décadas de 1980 e 1990 aumentou muito o número de crianças
surdas incluídas em escola regulares nos EUA e, consequentemente, a procura
por intérpretes educacionais.
Todavia, por não haver número suficiente de profissionais formados,
qualquer pessoa que soubesse língua de sinais e se dispusesse ao trabalho era
potencialmente um intérprete educacional, ou seja, não sendo exigida nenhuma
formação ou qualificação especifica, em muitos casos.
Alguns estudos encontrados pelos autores referem que muitos intérpretes
usam pidgin, ou variações locais e não a língua de sinais propriamente, já que
muitos atendem uma população que nem sempre domina bem a língua de sinais.
Em relação à recepção e interpretação da mensagem, os autores discutem que
vários surdos referem não entenderem boa parte do que o intérprete traduz, mas
que preferem a sua presença, apesar das dificuldades, porque sem ele
acompanhar as aulas é ainda pior. Além disso, indicam que as necessidades dos
alunos nem sempre são claras para os intérpretes.
Em relação ao papel do intérprete em sala de aula, se verifica que ele
assume uma série de funções (ensinar língua de sinais, atender a demandas
pessoais do aluno, cuidados com aparelho auditivo, atuar frente ao
comportamento do aluno, estabelecer uma posição adequada em sala de aula,
atuar como educador frente a dificuldades de aprendizagem do aluno) que o
aproximam muito de um educador. Assim, defendem que ele deva integrar a
equipe educacional, todavia isso o distancia de seu papel tradicional de
intérprete gerando polêmicas. Os autores reafirmam a necessidade de mais
pesquisas nesta área, esclarecendo melhor as semelhanças e diferenças entre
o intérprete e o intérprete educacional.
Chico; Williams and Bolster (1999) analisam a formação de intérpretes
que trabalham em escolas públicas nos Estados Unidos. Referem que a
formação de intérpretes não tem atendido a necessidade crescente de
intérpretes educacionais, já que, tradicionalmente, se ocupa dos serviços
destinados a adultos surdos, e os profissionais são avaliados em sua
competência para este tipo de trabalho. Nos EUA, apenas 3 programas dos 45

32
oferecidos, têm a preocupação com a preparação específica do intérprete
educacional.
Estes autores discutem que o intérprete mal formado pode dar ao aluno
informações imprecisas causando mais problemas do que o auxiliando. Em sua
pesquisa, avaliaram um grupo de intérpretes educacionais e os resultados
indicam que os conteúdos são frequentemente distorcidos e inadequados em
relação à informação desejada. O vocabulário é, em geral, muito melhor que o
desempenho dos intérpretes em aspectos gramaticais e discursivos.
Argumentam que este modelo de inclusão favorece que um intérprete trabalhe
em uma escola isolada, e que não tenha possibilidades de trocas frequentes. O
que ocorre na escola não é avaliado por ninguém, e todos os problemas
escolares apresentados podem erroneamente ser atribuídos a dificuldades da
criança.
Shaw and Jamieson (1997) encontraram que crianças surdas incluídas
raramente se comunicam com seu professor, e se comunicam com muito mais
frequência com seu intérprete. Afirmam que no Canadá a inclusão cresce
rapidamente e a demanda por intérpretes também, todavia, apesar disso, poucos
são os estudos sobre o impacto do intérprete em sala de aula no ensino
fundamental e sobre o modo como ele atua neste espaço discursivo.
Os autores comentam que há uma participação diferenciada do aluno
surdo (quando o professor pergunta algo para a classe o aluno surdo não
participa igualmente pois, até que o intérprete traduza a pergunta algum aluno
ouvinte já a respondeu ou quando ocorrem atividades que envolvem ver e ouvir
ao mesmo tempo, o aluno surdo perde parte da tarefa); que a tradução encurta
caminhos, indo diretamente ao conteúdo principal; que a tradução focaliza
conteúdos acadêmicos (não sendo traduzidas discussões entre pares,
comentários irônicos, etc.); atitudes esta que resultam numa certa forma de
exclusão do aluno surdo.
A relação com o intérprete é na maior parte do tempo iniciada por ele,
criando um modo de relacionar-se muito diferente daquele construído pelos
demais alunos que precisam esperar sua vez de se colocar e, às vezes, se impor
para poder falar. Em relação a essa realidade a criança surda vive uma situação
muito ‘artificial’. Assim, os autores apontam para uma redução do potencial para

33
atuação independente e um acréscimo de ações dirigidas pela instrução do
intérprete (a maior parte das perguntas é formulada pelo intérprete oferecendo
alternativas de respostas entre as quais a criança escolhe uma, sem ter que
refletir mais a fundo sobre os problemas colocados). Os autores destacam que
estas questões são particularmente preocupantes no ensino fundamental, que
atua com crianças que estão adquirindo conceitos fundamentais, valores sociais
e éticos, além de estarem em pleno desenvolvimento de linguagem.
Teruggi (2003) relata a experiência de uma escola regular que assume
vários alunos surdos e procura implementar uma prática inclusiva bilíngue na
pré-escola e no ensino fundamental, em uma escola pública italiana. Os
intérpretes têm um papel fundamental e apontam que as crianças surdas ao
entrarem na escola conhecem pouco a língua de sinais e que os intérpretes
precisam estar atentos para usar uma língua que seja acessível a elas.
Essa realidade vai se modificando à medida que as crianças vão
ampliando seus conhecimentos em língua de sinais, e o intérprete deve ir
modificando sua produção. Outro ponto importante é a atuação do intérprete
frente às relações da criança surda com seus pares ouvintes, suas atitudes
podem favorecer ou dificultar os contatos e a integração efetiva do aluno surdo.
A autora destaca ainda, que o intérprete precisa estar inserido na equipe
educacional, ficando claro qual é o papel de cada um dos profissionais frente à
integração e aprendizagem da criança. Suas opiniões são tão importantes
quanto às de qualquer outro, pois ele conhece bastante a criança, a língua de
sinais e tem também responsabilidade como educador frente a ela.
Ao mesmo tempo, é importante que o professor regente de classe
conheça a língua de sinais não deixando toda a responsabilidade da
comunicação com os alunos para o intérprete. Os intérpretes referem também a
falta de uma formação mais adequada à realidade que enfrentam. É pela reflexão
sobre sua prática que percebem uma série de erros e acertos e se orientam, mas
destacam que seria desejável ter uma formação continuada.
No Brasil, pesquisas sobre intérpretes de línguas de sinais em sala de
aula são escassas, já que este trabalho, quando é realizado, tem ainda um
caráter experimental na maioria dos estados e municípios. A formação de
intérpretes em Libras é algo recente e só aqueles que frequentam os grandes

34
centros têm acesso a essa formação, promovida pelas associações de surdos.
Entretanto, tal formação focaliza quase que exclusivamente o trabalho do
intérprete tradicional e aspectos das práticas educacionais fundamentais, que
são menos conhecidos e tematizados pelos próprios surdos, não são
focalizados.
Ferreira (2002) em sua dissertação de mestrado, relata a atividade de uma
intérprete que acompanha um grupo de alunos surdos no ensino médio, em uma
sala especial, e aponta vários problemas semelhantes àqueles já levantados
pelos autores estrangeiros.
Refere que muitas são as dificuldades enfrentadas pelo intérprete: a tarefa
de posicionar-se entre duas línguas que exige um amplo conhecimento das
línguas alvo; a constância dos improvisos utilizados, para poder possibilitar o
acesso a informação, indicando a necessidade de se repensar os recursos
pedagógicos empregados; a falta de conhecimento teórico do intérprete frente a
algumas disciplinas o que dificulta seu trabalho e a aprendizagem dos alunos; o
reconhecimento dos alunos surdos de seu trabalho, pois sem sua atenção e
colaboração, o intérprete não consegue desempenhar sua tarefa
adequadamente; e fundamentalmente a clareza na definição de papeis pois ele
se vê obrigado a desempenhar tarefas que nem sempre lhe dizem respeito, pois
se espera que ele seja um recurso mecânico de comunicação que não censura
e nem transforma as informações, mas, que na realidade, precisa atuar como
educador, muitas vezes.
Lacerda (2000 a 2000b, 2002) desenvolveu pesquisa com uma criança
surda inserida no ensino regular acompanhada por intérprete de língua de sinais,
por vários anos, em uma cidade do interior de São Paulo. Trata-se de uma escola
da rede privada de ensino, e a criança foi seguida da pré-escola até a quarta
série do ensino fundamental, com filmagens semanais. A autora afirma que o
intérprete educacional, muitas vezes, precisa atuar como um educador, uma vez
que, se fizer uma 'interpretação' no estrito sentido da palavra, poderá apenas ter
como resultado a não compreensão por parte do aluno surdo.
Todavia, a autora enfatiza que a responsabilidade pela educação do aluno
surdo não pode recair sobre o intérprete, já que seu papel principal é interpretar.
É preciso que haja parceria com o professor, propiciando uma atitude

35
colaborativa, em que cada um possa sugerir coisas ao outro, promovendo a
melhor condição possível de aprendizagem para a criança surda. Destaca a
importância de discussões aprofundadas sobre a capacitação de intérpretes
educacionais, já que este ambiente de trabalho se constitui num espaço
diferenciado que requer formação e suporte técnico, nem sempre desenvolvidos
apenas com a prática. Tal capacitação envolve conhecimento sobre o processo
ensino/aprendizagem, sobre a formação de conceitos e a construção de
conhecimentos, além da formação linguística implicada no trabalho de
interpretação.
Outro aspecto ressaltado é que a criança que frequenta o ensino
fundamental, surda, filha de pais ouvintes, nem sempre tem aquisição plena de
língua de sinais, importantíssima para o seu desenvolvimento como um todo. A
autora argumenta que seria então mais adequado que esta criança frequentasse
uma escola para surdos, onde pudesse se desenvolver plenamente em língua
de sinais e nos conhecimentos básicos, e que recorresse a escolarização com
intérprete em etapas mais avançadas do ensino. A experiência discutida por
Lacerda revela limites da atuação do intérprete, também pelo fato da criança
estar iniciando sua vida escolar e consolidando seu conhecimento em língua de
sinais. A presença do intérprete em sala de aula e o uso da língua de sinais não
garantem que as condições específicas da surdez sejam contempladas e
respeitadas nas atividades pedagógicas. Se a escola não atentar para a
metodologia utilizada e currículo proposto, as práticas acadêmicas podem ser
bastante inacessíveis ao aluno surdo, apesar da presença do intérprete. Ë o
interesse pelo aprofundamento destas questões que motivou a presente
pesquisa que busca conhecer melhor, a partir de depoimentos de intérpretes
educacionais, a realidade vivenciada no espaço de sala de aula no ensino
fundamental.

Considerações Finais

Na revisão de literatura foi possível observar que apesar do processo de


inclusão com intérprete em outros países indicar uma condição geral melhor

36
preparada, são apontados problemas e limitações muito semelhantes aos
encontrados nos dados aqui apresentados, além de referir a necessidade de
mais pesquisas, especialmente no que se refere ao Ensino Fundamental.
As análises revelaram que a atuação do intérprete educacional é
complexa, trabalhosa e mais difícil de ser realizada por ser pouco clara. O
intérprete participa das atividades, procurando dar acesso aos conhecimentos e
isso se faz com tradução, mas também com sugestões, exemplos e muitas
outras formas de interação inerentes ao contato cotidiano com o aluno surdo em
sala de aula. Todavia, se este papel não estiver claro para o próprio intérprete e
professores o trabalho se torna pouco produtivo, pois se desenvolve de forma
insegura, com desconfiança e desconforto.
Assim, a questão central não é traduzir conteúdos, mas torná-los
compreensíveis, para o aluno. Nessa experiência, o interpretar e o aprender
estão indissoluvelmente unidos, e o intérprete educacional assume,
inerentemente ao seu papel, a função de também educar o aluno. Isso é
premente no ensino fundamental, onde se atendem crianças que estão entrando
em contato com uma série de conteúdos novos, e muitas vezes com a língua de
sinais.
A questão da falta de um planejamento conjunto, de um trabalho de
equipe e de uma concepção mais clara do que signifique aceitar um aluno surdo
em sala de aula também interferem significativamente no trabalho das
intérpretes. Discussões constantes sobre a tarefa de cada um no espaço
inclusivo, atribuições e trocas de percepções se mostram essenciais e são um
primeiro passo para uma convivência tranquila e que possa trazer ganhos
efetivos ao aluno surdo. Outro ponto fundamental é haver por parte da escola e
dos professores um maior conhecimento sobre as peculiaridades da surdez para
que haja uma maior compreensão de seu aluno surdo, sua realidade, suas
dificuldades de linguagem, etc.
As considerações presentes neste estudo indicam a importância de se
realizarem pesquisas direcionadas para a questão da inclusão de alunos surdos
com inserção de intérpretes de Língua Brasileira de Sinais em sala de aula, na
tentativa de avaliar como este processo vem ocorrendo, como sendo

37
implementado, avaliando os efeitos de tal processo especialmente nas séries
iniciais de escolarização.

REFERÊNCIAS

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uma sala de aula de alunos ouvintes- Relatório Final FAPESP Proc. nº 98/02861-
1, MELETTI, S.M.F O relato oral como recurso metodológico de pesquisa em
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NAPIER, J. University interpreting: linguistic issues for consideration. Journal of


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and Deaf Education, vol 1, 1996, pp. 29-39

TERUGGI, L. A Una Scuola, due lingue: l’esperienza di bilinguismo della scuola


dell’Infanzia ed Elementare di Cossato. Milano: FrancoAngelli, 2003
.
VOLTERRA, V. Linguaggio e sorditá – parole e segni per l’ educazione dei sordi.
Firenzi: La Nuova Itália, 1994.

39
DISPONÍVEM EM: http://revistaescola.abril.com.br/formacao/escolas-obrigadas-manter-

tradutor-libras-salas-aula-alunos-deficiencia-auditiva-inclusao-636408.shtml

AUTORA: Daniele Pechi

ACESSO EM: 02/06/2016

As escolas são obrigadas a manter um tradutor de libras


nas salas de aula para os alunos com deficiência auditiva? O
que fazer se a escola não tiver esse profissional?

Daniele Pechi (novaescola@fvc.org.br)

O Decreto Federal nº 5626, de 22 de dezembro de 2005, estabelece que


alunos com deficiência auditiva tenham o direito a uma educação bilíngue nas
classes regulares. Isso significa que eles precisam aprender a Língua Brasileira
de Sinais (Libras) como primeira língua e a Língua Portuguesa em sua
modalidade escrita como segunda língua. Por isso, a Língua Brasileira de Sinais
deve ser adquirida pelas crianças surdas o mais cedo possível - o que, em geral,
acontece na escola - preferencialmente na interlocução com outros surdos ou
com usuários de Libras.
Entre 2006 e 2009, o Ministério da Educação (MEC) certificou pouco mais
de 5 mil intérpretes pelo Pro libras - o Programa Nacional para Certificação de

40
Proficiência no Uso e Ensino da Língua Brasileira de Sinais - e, embora mais de
7,6 mil cursos superiores de Pedagogia, Fonoaudiologia e Letras ofereçam a
disciplina de Libras, ter o número de intérpretes necessário para atender a
demanda das escolas ainda é uma realidade distante.

Para se ter ideia, na rede municipal de São Paulo há apenas 19 intérpretes


cadastrados, para atender mais de 300 alunos. Estima-se que no Brasil todo
exista apenas 230 intérpretes capacitados em salas de aula.
Como medida paliativa, é importante que as escolas ofereçam aos surdos
recursos visuais que os ajudem em seu desenvolvimento. As disciplinas
precisam ser contextualizadas para que eles não fiquem de fora das atividades.
A escola deve oferecer também um apoio no contra turno, sempre com material
pedagógico ilustrado e com a maior quantidade possível de referências que
possam ajudar: caderno de vocabulários, dicionários, manuais em libras etc.

Fonte: poliglotabrasil.com.br

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