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Poder Judiciário da União

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS


TERRITÓRIOS

Órgão Terceira Turma Recursal DOS JUIZADOS ESPECIAIS DO DISTRITO


FEDERAL

Processo N. RECURSO INOMINADO CÍVEL 0726611-26.2023.8.07.0016

RECORRENTE(S) REJANE BATISTA AVEIRO PORTO

RECORRIDO(S) NU PAGAMENTOS S.A.


Relator Juiz DANIEL FELIPE MACHADO

Acórdão Nº 1769770

EMENTA

CONSUMIDOR E BANCÁRIO. GOLPE DO FALSO ATENDENTE – AUSÊNCIA DE


CAUTELA DO CONSUMIDOR CONJUGADA COM FALHA DO SISTEMA DE
SEGURANÇA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA – INDENIZAÇÃO PROPORCIONAL.
INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO – DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS.RECURSO
CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por vício na prestação de
serviços, consoante o disposto no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, ressalvada a culpa
exclusiva do consumidor ou de terceiro (§ 3º, II).

2. A pretensão da parte autora é de obter a nulidade do contrato de empréstimo (R$ 3.750,00), das
transferências via pix (R$ 3.750,00 e R$ 4.980,00) e da compra realizada mediante utilização de cartão
de crédito virtual (R$ 4.055,51), decorrente de fraude perpetrada por terceiros. Pede ainda a
condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00.

3. A sentença julgou improcedentes os pedidos, o que ensejou a interposição de recurso pela parte
autora.

4. A parte autora foi vítima de golpe praticado por organização criminosa de estelionatários que atua
com engenharia social. O golpe, na modalidade de phishing, permitiu a instalação de um aplicativo no
celular da vítima, que o controlou à distância a partir de então. Assim, a vítima que supostamente
estaria ajudando o sistema de segurança do Banco, instalando o programa, na verdade deu acesso ao
estelionatário para utilizar o aplicativo do Banco que também estava instalado em seu celular.

5. Apesar de reconhecer que a conduta anterior da parte autora contribuiu para que houvesse a fraude,
porque não houve interferência da instituição financeira, especialmente diante da inexistência de
documentos que ateste que a ligação fraudulenta se originou de número oficial do banco, a exemplo de
prints do histórico de ligações recebidas, meu convencimento é de que o golpe também foi executado
pelos baixos de níveis de controle das operações de crédito realizadas pelo meio do aplicativo do
Banco.

6. É de se ver que a ré não apresentou os dados contidos na ficha de cadastro da instituição bancária
que possibilitaria a verificação de que o aparelho utilizado para a contratação do empréstimo
fraudulento é o mesmo apontado na contestação (ID 50502048, fls. 6 e 7).

7. Não basta a prova da realização de cadastro por aplicativo do celular seguindo o passo-a-passo do
requerido para concluir que o negócio seja legítimo quanto a quem o tenha executado. É ônus da ré,
com toda a sua expertise e, com o mesmo empenho devotado a proporcionar aos consumidores
facilidade na contratação, adotar medidas de segurança suficientes para evitar burlas ao seu sistema ou
mesmo fraudes.

8. A contratação do empréstimo foi executada pelos baixos de níveis de controle das operações de
crédito realizadas à distância, via eletrônica, pelo Banco, formalizado por uma contratação digital que
não oferece segurança adequada a esse fornecimento de serviço ou produto.

9. A instituição financeira ao facilitar o acesso ao crédito permitindo a contratação de empréstimo por


meio eletrônico deve estar ciente dos riscos que envolvem o negócio (e seu alto custo – a precarização
da segurança). E esses riscos estão relacionados não só com a identificação da pessoa que executa a
contratação naquele momento, mas também à exposição dos consumidores ao ataque de organizações
criminosas por meio dessas tecnologias.

10. Quanto à transferência via pix, no valor de R$ 4.055,51 (ID 50502014), e a compra realizada via
cartão de crédito virtual, de R$ 4.980,00 (ID 50502013), em coerência a dinâmica dos fatos, impõe-se
também reconhecer a existência da culpa concorrente, porquanto a autora contribuiu para a fraude ao
instalar o programa que permitiu o acesso remoto ao aplicativo do banco, mas a fraude contou também
com aausência de maior rigor do sistema de segurança e vigilância das operações bancárias
comandadas por meio digital, permitindo que a fraude se concretizasse.

11. Sobressai a ausência de impugnação específica pela parte ré (art. 341 do CPC) quanto à alegação de
quebra do perfil bancário da consumidora, que sobre tal argumento não teceu uma linha sequer em sua
defesa, atraindo, assim, a presunção de veracidade de tal afirmativa. Observo que as faturas do cartão
de crédito acostadas pela autora (ID 50502015) reforçam o argumento da consumidora de que as
transações fraudulentas não se enquadram dentro de seu perfil de consumo.

12. Com efeito do cotejo das alegações de ambas as partes e das provas documentais carreadas
sobressai que a conduta da autora e do requerido foram determinantes para as fraudes. Nessas
condições, é de se ver que os eventos danosos (concesão do empréstimo de R$ 3.750,00, transferência
via pix no valor de R$ 4.055,51e compra realizada via cartão de crédito virtual, de R$ 4.980,00 ) se
deram pela culpa conjugada tanto da consumidora, quanto instituição financeira que descuidou da
segurança de seus sistema. Feitas essas considerações, conclui-se que o banco deve responder pela
metade do prejuízo experimentado pela autora (R$ 12.785,51, o que perfaz a quantia de R$ 6.392,75).

13. Guardadas as particularidades do caso, aplicáveis as mesmas razões de decidir utilizadas para a
solução da controvérsia em processos cujo objeto é o denominado “golpe do motoboy”, onde tem lugar
a utilização da Súmula 28 da Turma de Uniformização dos Juizados Especiais do Distrito Federal
dispôs que “As instituições financeiras respondem pelos danos decorrentes de fato do serviço nas
fraudes bancárias conhecidas como “golpe do motoboy”, em que o consumidor, supondo seguir
instruções de preposto do banco, e utilizando-se dos instrumentos de comunicação por ele fornecidos,
entrega o cartão de crédito/débito a terceiro fraudador que o utiliza em saques e compras. Em caso de
culpa concorrente, a indenização deve ser proporcional".

14. Importante consignar que a transferência efetuada, via pix, no valor de R$ 3.750,00 foi realizada
com a utilização dos recursos obtidos mediante o empréstimo fraudulento, não cabendo compensação
destes valores à autora sob pena de enriquecimento ilícito.
15. Diante desse cenário, comprovada a culpa concorrente quanto as fraudes ocorridas e, partilhada a
responsabilidade do prejuízo observando o percentual de 50%, não há fundamento para impor a
compensação por danos morais.

16 RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO

Para reformar a sentença para condenar a ré ao ressarcimento demetade do prejuízo


experimentado pela autora (R$ 12.785,51, o que corresponde ao valor de R$ 6.392,75), atualizado
monetariamente pelo INPC desde o efetivo desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao
mês desde a citação.

17. Decisão proferida na forma do art. 46, da Lei nº 9.099/95, servindo a ementa como acórdão.

18. Sem custas adicionais e sem condenação em honorários advocatícios à ausência de recorrente
vencido

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Juízes da Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal do
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, DANIEL FELIPE MACHADO - Relator,
MARCO ANTONIO DO AMARAL - 1º Vogal e MARGARETH CRISTINA BECKER - 2º Vogal,
sob a Presidência do Senhor Juiz DANIEL FELIPE MACHADO, em proferir a seguinte decisão:
CONHECIDO. PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME., de acordo com a ata do julgamento e
notas taquigráficas.

Brasília (DF), 17 de Outubro de 2023

Juiz DANIEL FELIPE MACHADO


Presidente e Relator

RELATÓRIO

A ementa servirá de acórdão, conforme inteligência dos arts. 2º e 46 da Lei n. 9.099/95.

VOTOS
O Senhor Juiz DANIEL FELIPE MACHADO - Relator

Decisão proferida na forma do art. 46 da Lei 9.099/95, servindo a ementa como acórdão.

O Senhor Juiz MARCO ANTONIO DO AMARAL - 1º Vogal


Com o relator
A Senhora Juíza MARGARETH CRISTINA BECKER - 2º Vogal
Com o relator

DECISÃO

CONHECIDO. PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME.

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