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EPIDEMIOLOGIA
O câncer de esôfago está entre as dez neoplasias malignas mais
incidentes no Brasil.
É um câncer que predomina no sexo masculino (escamoso = 3:1;
adenocarcinoma = 15:1), e geralmente se apresenta a partir dos 40
anos de idade (a maior taxa de mortalidade é vista entre 60-70 anos).
O tipo escamoso é mais comum em negros, ao passo que o
adenocarcinoma é raro neste grupo, sendo uma doença típica de
brancos.
Os países com maior incidência de Ca de esôfago são da Ásia e da
África, como China, Cingapura, Irã, Rússia e África do Sul. Nesses locais,
o tipo mais comum ainda é o carcinoma escamoso
TIPO HISTOLÓGICO
Atualmente, se reconhecem dois tipos histológicos principais de câncer de
esôfago: (1) carcinoma escamoso (ou epidermoide); e (2) adenocarcinoma.
Importante!! Os fatores de risco mais importantes para o carcinoma escamoso do esôfago são o tabagismo e o etilismo,
enquanto o principal fator de risco para o adenocarcinoma é a esofagite de refluxo (com formação do epitélio de Barrett).
Clinica
Os sintomas iniciais podem ser inespecíficos, tais como uma dor retroesternal mal definida ou queixas de
“indigestão”.
A principal manifestação clínica é a disfagia, que se inicia para sólidos e, após um período variável, evolui para
líquidos.
A perda ponderal é um achado clássico, sendo geralmente maior do que o esperado pelo grau de disfagia e de
evolução mais rápida, quando comparada às condições benignas (ex.: acalásia).
Lesões mais avançadas apresentam-se com halitose e, às vezes, tosse após ingestão de líquidos – a dificuldade de
ingestão de líquidos indica que o lúmen já foi quase completamente comprometido ou, menos comumente, indica a
formação de uma fístula esofagotraqueal ou esofagobrônquica.
A rouquidão por envolvimento do nervo laríngeo recorrente e a hematêmese são sintomas menos comuns.
Icterícia (infiltração hepática metastática) e dispneia (infiltração pulmonar metastática) são manifestações menos
prevalentes, e indicam doença extremamente avançada.
Infelizmente, para ter disfagia mecânica, o câncer já deve
ter envolvido grande parte da circunferência esofágica (em
geral > 2/3 do lúmen).
Diagnóstico
Os tumores de esôfago são mais bem diagnosticados pela
análise conjunta da Esofagografia Baritada
(preferencialmente com técnicas de duplo contraste) e
endoscopia digestiva alta (esofagoscopia) com biópsia.
No exame baritado, a diferenciação entre estenose péptica e câncer de esôfago não é difícil: neste último, é nítida a
irregularidade da mucosa e a súbita transição entre o esôfago normal e a obstrução (“sinal do degrau”), enquanto em
patologias benignas ocorre afunilamento progressivo.
Em relação à localização do tumor, cerca de 50% encontram-se no terço médio, 25% no terço superior e 25% no terço
inferior.
Pelo aspecto endoscópico, o Ca de esôfago pode ser classificado em três tipos: (1) polipoide exofítico (60% dos
casos); (2) escavado ou ulcerado (25% dos casos); e (3) plano ou infiltrativo (15% dos casos).
Estadiamento
O câncer de esôfago se caracteriza por ter um comportamento extremamente agressivo, disseminando-se localmente
e a distância. A disseminação estende-se do epitélio para a submucosa, muscular e linfonodos regionais. A ausência
de serosa facilita a disseminação para os linfonodos regionais e para os órgãos adjacentes!
Os tumores do terço superior e médio invadem a árvore traqueobrônquica, a aorta e o nervo laríngeo recorrente,
enquanto os tumores do terço distal avançam sobre o diafragma, pericárdio e estômago.
Cerca de 75% dos pacientes diagnosticados com Ca de esôfago já apresentam invasão linfática no momento do
diagnóstico.
Os tumores do terço superior ou médio drenam para linfonodos cervicais profundos (supraclaviculares),
paraesofágicos, mediastínicos posteriores e traqueobrônquicos. Os do terço distal, para os linfonodos
paraesofágicos, celíacos e do hilo esplênico.
As metástases à distância mais importantes
são: fígado e pulmão, ocorrendo também
para ossos e rins.
O estadiamento do Ca de esôfago se baseia
na escala TNM (T = tumor, N = linfonodos,
M = metástase a distância). Nos últimos
anos constatou-se que o tipo histológico
também influencia o prognóstico e, por
este motivo, o AJCC (American Joint
Committee on Cancer) possui dois sistemas
de estadiamento conforme o subtipo
histológico.
O chamado câncer de esôfago precoce é
aquele que invade até a submucosa (T1 ou
Estágio I). Infelizmente, esta é uma
apresentação rara deste câncer (FIGURA 5).
“LINFONODOS”
N0 Ausência de envolvimento nodal
N1 1-2 linfonodos regionais acometidos
N2 3-6 linfonodos regionais acometidos
N3 ≥ 7 linfonodos regionais acometidos
“METÁSTASES”
M0 Ausência de metástase a distância
M1 Presença de metástase a distância
“Grau histológico”
G1 Bem diferenciado
G2 Moderadamente diferenciado
G3 Pouco diferenciado
G4 Indiferenciado
ESTÁGIO T N M G LOCALIZAÇÃO
Zero Tis N0 M0 G1 Qualquer
IA T1 N0 M0 G1 Qualquer
IB T1 N0 M0 G2-3 Qualquer
T2-3 N0 M0 G1 1/3 inferior
IIA T2-3 N0 M0 G1 1/3 superior, médio
T2-3 N0 M0 G2-3 1/3 inferior
IIB T2-3 N0 M0 G2-3 1/3 superior, médio
T1-2 N1 M0 Qualquer Qualquer
IIIA T1-2 N2 M0 Qualquer Qualquer
T3 N1 M0 Qualquer Qualquer
T4a N0 M0 Qualquer Qualquer
IIIB T3 N2 M0 Qualquer
IIIC T4a N1-2 M0 Qualquer Qualquer
T4b Qualquer M0 Qualquer Qualquer
Qualquer N3 M0 Qualquer Qualquer
IV Qualquer Qualquer M1 Qualquer Qualquer
ESTÁGIO T N M G
Zero Tis N0 M0 G1
IA T1 N0 M0 G1-2
IB T1 N0 M0 G3
T2 N0 M0 G1-2
IIA T2 N0 M0 G3
IIB T3 N0 M0 Qualquer
T1-2 N1 M0 Qualquer
IIIA T1-2 N2 M0 Qualquer
T3 N1 M0 Qualquer
T4a N0 M0 Qualquer
IIIB T3 N2 M0 Qualquer
IIIC T4a N1-2 M0 Qualquer
T4b Qualquer M0 Qualquer
Qualquer N3 M0 Qualquer
IV Qualquer Qualquer M1 Qualquer
Os exames utilizados para o estadiamento são:
Sequencial: diagnóstico de Ca de esôfago por biópsia endoscópica (precedida ou não pela realização de esofagografia),
posterior TC toracoabdominal para determinar a presença de metástases a distância – cuja existência já classifica o doente
no Estágio IV, independente de outros fatores. Na ausência de metástase a distância, um Ultrassom Endoscópico (USE) é
realizado para avaliar a penetração do tumor na parede esofagiana, bem como avaliar a extensão da doença para os
linfonodos locorregionais. A laparoscopia é considerada “opcional”, sendo, contudo, fortemente recomendada em
pacientes com adenocarcinomas localizados na porção intra-abdominal do esôfago ou próximos à junção
esofagogástrica, bem como nos pacientes com suspeita de disseminação intraperitoneal.
Prognóstico e tratamento
A sobrevida em cinco anos do Ca de esôfago, de acordo com o estadiamento final (clínico + cirúrgico) é a seguinte:
Estágio I: 60% Estágio II: 30% Estágio III: 20% Estádio IV: 4%
Em pacientes com razoável estado geral (nutridos, com albumina próximo ao normal) e sem comorbidades
preocupantes (cardiopatia, pneumopatia, hepatopatia, nefropatia), a cirurgia curativa pode ser tentada na ausência
de metástases a distância (incluindo linfonodos a distância) e de um T4 irressecável.
Em pacientes no Estágio T1 sem metástases (Ca de esôfago precoce), inclusive, pode-se optar pela ressecção
endoscópica da lesão
No pré-operatório, em pacientes desnutridos por disfagia, sempre que possível deve-se dilatar a estenose com a
implantação endoscópica de um stent esofagiano, e inserir um cateter de Dobb-Hoff para garantir aporte
nutricional de pelo menos 2.000 kcal/dia, postergando a cirurgia até a melhora nutricional. Indivíduos com perda
ponderal > 10% do peso habitual, bem como aqueles com níveis séricos de albumina < 3,4 g/dl, encontram-se com
risco muito aumentado de complicações pós-cirúrgicas (ex.: deiscência de anastomose).
A estratégia cirúrgica curativa proposta pela maioria dos autores envolve a realização de esofagectomia + linfadenectomia
regional, com margens de segurança de pelo menos 8 cm. Vale ressaltar que a reconstrução do trânsito deve ser, sempre
que possível, com o estômago! Um estômago normal bem dissecado alcança prontamente o pescoço em todos os
pacientes. A interposição do cólon tem a desvantagem de requerer três anastomoses (coloesofagostomia,
colojejunostomia e colocolostomia), sendo uma cirurgia de maior morbimortalidade. Só é indicada em pacientes com
gastrectomia total ou parcial prévia ou quando o tumor avança sobre o estômago.
As duas técnicas mais utilizadas para esofagectomia pelos cirurgiões torácicos são: (1) Esofagectomia Transtorácica;
e (2) Esofagectomia Trans-Hiatal.
o Esofagectomia Transtorácica: uma toracotomia lateral posterior é realizada, bem como uma laparotomia
mediana superior; o mediastino é examinado quanto à presença de metástases irressecáveis; se possível, o
esôfago é ressecado com a margem tumoral adequada, juntamente com os linfáticos periesofágicos,
linfonodos paratraqueais, pleura adjacente, veia ázigos e ducto torácico. O estômago é dissecado
(juntamente com seus vasos) e “suspenso” para a cavidade torácica, para ser anastomosado no espaço
paravertebral do mediastino posterior. A anastomose é realizada com grampeador. Para evitar uma
obstrução gástrica pós-vagotomia, uma piloroplastia ou pilorotomia deve sempre ser confeccionada. O
principal risco desta cirurgia é a deiscência da anastomose intratorácica (abaixo da clavícula), que leva à
mediastinite grave, sepse e óbito em 50% dos casos. Muitos pacientes evoluem com problemas pulmonares
nos pós-operatórios, decorrentes da toracotomia prolongada. Outra complicação comum é a esofagite de
refluxo (do remanescente esofágico). A mortalidade operatória varia entre 7-20%.
o Esofagectomia Trans-Hiatal: nesta cirurgia, não há incisão torácica: ela é executada através de uma incisão
abdominal e outra cervical. Pelo abdome, o estômago é mobilizado pela secção dos vasos gastroepiploico
esquerdo e gástrico esquerdo, preservando as arcadas gastroepiploica direita e gástrica direita. A
piloroplastia é realizada. O esôfago torácico inteiro
(independente do nível do tumor), desde as clavículas
até a cárdia, é dissecado pelo dedo do cirurgião,
utilizando-se os acessos cervical e trans-hiatal (pelo
hiato diafragmático). A monitoração da pressão arterial
deve ser cuidadosa nesse momento, devido ao
deslocamento cardíaco. O estômago, então, é
transposto para o mediastino posterior e anastomosado
com o esôfago cervical. As vantagens deste
procedimento são: (1) evita-se uma toracotomia; (2)
evita-se uma anastomose intratorácica, bem como o
risco de uma mediastinite – a deiscência da
anastomose cervical é de mais fácil controle; (3) reduz
bastante a chance de refluxo gastroesofágico; (4)
mortalidade operatória de 4-8%. As desvantagens da
cirurgia são o risco de hemorragia mediastinal
incontrolável no peroperatório e a incapacidade de
realizar a dissecção completa dos linfonodos
mediastínicos, para fins de estadiamento e cura.
o Esofagectomia en-bloc (retirar o esôfago com todos os linfonodos de drenagem, incluindo os celíacos e por
vezes os cervicais, baço e diafragma adjacente, também chamada de esofagectomia “tri-incisional”, por
realizar toracotomia, laparotomia e cervicotomia) e a cirurgia toracoscópica. A cirurgia en- -bloc tem uma
morbimortalidade maior, embora alguns estudos sugiram maior sobrevida em 5 anos. Também foram
descritas técnicas de esofagectomia minimamente invasiva e esofagectomia com preservação do nervo vago.
Terapia Paliativa
O uso de dilatadores esofágicos ou stents permite a reconstituição do trânsito alimentar por um período curto.
A terapia fotodinâmica utiliza uma substância sensibilizadora por via venosa seguida pela aplicação do laser. A
obstrução é cedida após necrose do tumor, com os fragmentos retirados na endoscopia.
A radioterapia é um excelente método paliativo, aliviando a disfagia em diversos pacientes durante alguns meses.
A fístula esofagotraqueal ou esofagobrônquica contraindica a radioterapia, e deve ser paliada com a colocação de
stents no esôfago e na árvore traqueobrônquica (melhor do que colocar o stent em apenas um local).
Nos casos mais difíceis ou refratários, uma gastrostomia ou jejunostomia pode ser necessária.