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Seleção de Pessoas – Parte I

A competitividade organizacional é sinônimo de recursos tecnológicos, processos racionais de trabalho,


uma adequada estrutura organizacional, produtos e serviços excelentes e clientes satisfeitos.
Porém, com todas estas ferramentas, a empresa não estará capacitada para desafiar e vencer a
concorrência. O calcanhar-de-aquiles das organizações – o seu principal ponto nevrálgico – é a qualidade
das pessoas que nela trabalham.

São as pessoas que lidam com a tecnologia, criam e utilizam processos de trabalho, compõem a estrutura
organizacional, fazem produtos e serviços e atendem os clientes. São elas que proporcionam
produtividade, qualidade e competitividade para as organizações. Sem as pessoas, as organizações não
funcionam. Sem as pessoas, não há dinâmica organizacional, nem resultados e nem sucesso. A
competitividade organizacional depende das competências das pessoas.

As organizações estão sempre agregando novas pessoas para integrarem seus quadros, seja para substituir
funcionários que se desligaram, seja para ampliar o quadro de pessoal em épocas de crescimento e
expansão. Quando elas perdem funcionários e precisam substituí-los ou quando crescem e sua expansão
requer mais pessoas para tocar as atividades, ocorre o processo de agregar pessoas.

A Seleção de Pessoas integra o processo de agregar pessoas e funciona logo após o recrutamento. Ambos,
o Recrutamento (assunto de nossas aulas passadas) e a Seleção de Pessoas, fazem parte de um mesmo
processo: a introdução de novos elementos humanos na organização.

Enquanto o Recrutamento é uma atividade de atração, divulgação e comunicação – portanto, uma


atividade tipicamente positiva e convidativa – a Seleção é, ao contrário, uma atividade de escolha, de
classificação e de decisão e, portanto, restritiva e obstativa (possui obstáculos).

O Conceito de Seleção de Pessoas

A seleção de pessoas funciona como uma espécie de filtro, que permite que apenas algumas pessoas
possam ingressar na organização: aquelas que apresentam características desejadas pela organização.

Há um velho ditado popular que afirma que a seleção constitui a escolha exata da pessoa certa para o lugar
certo. Em termos mais amplos, a seleção busca, dentre os vários candidatos recrutados, aqueles que são
mais adequados aos cargos existentes na organização, visando manter ou aumentar a eficiência e o
desempenho do pessoal, bem como a eficácia da organização. No fundo, está em jogo o capital intelectual
da organização que a Seleção deve preservar ou enriquecer.

Se não houvesse as diferenças individuais, e se todas as pessoas fossem iguais e reunissem as mesmas
condições individuais para aprender e trabalhar, a seleção de pessoas seria totalmente desnecessária.

Acontece que a variabilidade humana é enorme: as diferenças individuais, tanto no plano físico (estatura,
peso, compleição física, força, acuidade visual e auditiva, resistência a fadiga, etc.), como no plano
psicológico (temperamento, caráter, inteligência, aptidões, habilidades mentais, etc.), levam as pessoas a
se comportarem diferentemente, a perceberem situações de maneira diferente e a se desempenharem
diferentemente, como maior ou menor sucesso nas organizações.

As pessoas diferem entre si na maneira de se comportar, nos relacionamentos, na capacidade para


aprender uma tarefa como na maneira de executá-la após a aprendizagem, na história pessoal, na bagagem
biológica, na inteligência e nas aptidões, no potencial de desenvolvimento, etc. A estimação apriorística
(aceitação de um ou mais elementos) dessas variáveis individuais é um aspecto importante da Seleção de
pessoal.
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Quando completo, o processo seletivo deve fornecer não somente um diagnóstico atual, mas
principalmente um prognóstico futuro a respeito dessas variáveis. Não apenas uma idéia atual, mas uma
projeção de como elas se situarão no longo prazo.

Existem duas alternativas para fundamentar o processo seletivo: o cargo a ser preenchido ou as
competências a serem preenchidas. Assim, de um lado, o processo seletivo baseia-se em dados e
informações sobre o cargo a ser preenchido ou, de outro lado, em função das competências desejadas pela
organização. As exigências dependem desses dados e informações para que a seleção tenha maior
objetividade e precisão para preencher o cargo ou agregar as competências.

Se de um lado temos o cargo a ser preenchido ou as competências desejadas, temos, de outro, candidatos
profundamente diferentes entre si, disputando a mesma posição. Nesses termos , a seleção passa a ser
configurada basicamente como um processo de comparação e de decisão.

Seleção Como um Processo de Comparação

A melhor maneira de conceituar seleção é representá-la como uma comparação entre duas variáveis: de
um lado, os requisitos a serem preenchidos (requisitos que o cargo exige de seu ocupante) e, de outro lado,
o perfil das características dos candidatos que se apresentam para disputá-lo.
A 1º variável é fornecida pela descrição e análise do cargo, enquanto a 2º é obtida por meio de aplicação
das técnicas de seleção. A 1º variável será denominada X e a 2º será variável Y conforme a figura abaixo.

Especificações do Características do candidato


cargo ou
competências
desejadas

O que o cargo requer ou O que o candidato oferece


Versus
competências desejadas

Análise e descrição do cargo para Técnicas de seleção para saber


saber quais os requisitos que o quais as condições pessoais para
cargo exige de seu ocupante ou ocupar o cargo ou a competência
definição da competência desejada

Quando X e Y são iguais, dizemos que o candidato reúne as condições ideais para tanto e, portanto, é
aprovado. Quando a variável Y for maior do que X, o candidato reúne mais do que as condições exigidas
pelo cargo, e, portanto, torna-se superdotado para aquele cargo.

Na realidade, essa comparação não se concentra em um único ponto de igualdade entre as variáveis, mas
sobretudo em uma faixa de aceitação, que admite certa flexibilidade a mais ou menos ao redor do ponto
ideal. Isso equivale aos limites de tolerância admitidos nos processos de controle de qualidade.
Geralmente, essa comparação exige que a descrição e análise do cargo ou a definição da competência
desejada seja transformada em uma ficha de especificações, que funcionará como o instrumento de
medida, a partir da qual se possa estruturar o processo seletivo como maior rigor.

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Seleção Como Processo de Decisão e Escolha

Após a comparação entre as características exigidas pelo cargo ou competências desejadas, e as


características oferecidas pelos candidatos, pode acontecer que vários destes apresentem condições
aproximadamente equivalentes para serem indicados para ocupar a vaga.

O órgão de seleção não pode impor ao órgão requisitante a aceitação dos candidatos aprovados no
processo de comparação. Pode apenas prestar o serviço especializado, aplicar as técnicas de seleção e
recomendar aqueles candidatos que julgar mais adequados ao cargo. No entanto, a decisão final de aceitar
ou rejeitar os candidatos é sempre de responsabilidade do órgão requisitante. Assim, a seleção é
responsabilidade de linha (de cada chefe ou gerente), e função de staff (prestação de serviço pelo órgão
especializado).

Modelo de Colocação, Seleção e Classificação de Candidatos

Freqüentemente, a organização se defronta - através do consultor interno de RH ou através de seus


gerentes e respectivas equipes – com o problema de tomar decisões a respeito de um ou mais candidatos.

Cada decisão sobre um candidato envolve o indivíduo em um determinado tratamento. Tratamento


significa o tipo de resolução a ser tomada. O número de tratamentos e de indivíduos pode variar de uma
decisão para outra.

As restrições mais comuns são: número de tratamentos por pessoas e números de pessoas por tratamento.
De acordo com o tratamento, podemos distinguir três modelos de decisão sobre candidatos: colocação,
seleção e classificação de candidatos. Assim, a Seleção de Pessoas comporta três modelos de tratamento, a
saber:

1. Modelo de colocação: Há um só candidato e uma só vaga a ser preenchido por aquele candidato. Este
modelo não inclui a alternativa de rejeitar o candidato. O candidato apresentado deve ser admitido sem
sofrer qualquer rejeição.

2. Modelo de seleção: Há vários candidatos e apenas uma vaga a ser preenchida. Cada candidato é
comparado com os requisitos exigidos pelo cargo que se pretende preencher, ocorrendo duas alternativas,
apenas: aprovação ou rejeição. Se aprovado, o candidato deverá ser admitido. Se reprovado, o candidato é
dispensado do processo seletivo, pois existem vários outros candidatos para o cargo vago e apenas um
deles poderá ocupá-lo.

3. Modelo de classificação: Existem vários candidatos para cada vaga e várias vagas para cada candidato.
Cada candidato é comparado com os requisitos exigidos pelo cargo que se pretendem preencher. Ocorrem
duas alternativas para o candidato: ser aprovado ou rejeitado para aquele cargo.

Se aprovado é admitido. Se rejeitado, passa a ser comparado com os requisitos exigidos por outros cargos
que se pretende preencher, até se esgotarem os cargos vacantes (que estão vagos) e as alternativas
restantes. Daí, a denominação classificação.

Para cada cargo a ser preenchido ocorrem vários candidatos que o disputam, sendo que apenas um deles
poderá ocupá-lo, se vier a ser aprovado. O modelo de classificação parte de um conceito ampliado de
candidato: a organização não o considera interessado em um único e determinado cargo, mas como
candidato da organização e que poderá ser posicionado no cargo mais adequado as suas características
pessoais. É a abordagem mais ampla e eficaz.

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O modelo de classificação é superior aos modelos de colocação e de seleção, pois aproveita os candidatos
disponíveis, permite maior eficiência do processo seletivo, por envolver a totalidade de cargos vacantes a
serem preenchidos e proporciona redução dos custos operacionais, por evitar duplicidade de comparações
ou repetição de despesas com o processo.

A Identificação das Características Pessoais do Candidato

Identificar e localizar as características pessoais do candidato é uma questão de sensibilidade. Requer um


razoável conhecimento da natureza humana e das repercussões que a tarefa impõe à pessoa que irá
executá-la. Quando o cargo não foi ainda preenchido, a situação se complica, pois requer uma visão
antecipada da interação entre pessoa e tarefa. Quase sempre, as características individuais estão
relacionadas com três aspectos principais:

1. Execução da tarefa em si. A tarefa a ser executada exige certas características humanas ou aptidões
como: atenção concentrada ou aptidão para detalhes, atenção dispersa ou visão ampla e abrangente das
coisas, aptidão numérica ou facilidade para lidar com números e cálculos, aptidão verbal ou facilidade para
lidar com palavras ou se expressar verbalmente, aptidão espacial ou facilidade de perceber figuras ou
símbolos, aptidão auditiva ou facilidade de lidar com sons ou ritmos, etc.

2. Interdependência com outras tarefas. A tarefa a ser executada depende de outras tarefas para iniciar ou
terminar, e exige certas características ou aptidões humanas, como : atenção dispersa e abrangente,
facilidade de coordenação, resistência à frustração e a conflitos, etc.

3. Interdependência com outras pessoas. A tarefa a ser executada exige contatos com pessoas, estejam
elas situadas acima, lateralmente ou abaixo na hierarquia da organização. Assim, a tarefa pode exigir
características pessoais como: colaboração e cooperação com outras pessoas, facilidades em trabalhar em
equipe ou em conjunto com outras pessoas, relacionamento humano, iniciativa, liderança de pessoas,
facilidade de comunicação e de expressão pessoas, etc.

As características pessoais quase sempre estão relacionadas com a tarefa, mas sempre considerando o
entorno social e as condições tecnológicas existentes. A abordagem sociotécnica constitui uma importante
base para a identificação das características pessoais do candidato.

As Bases Para a Seleção de Pessoas

A seleção de pessoal é um sistema de comparação e de escolha (tomada de decisão). Para tanto, ela deve
necessariamente apoiar-se em algum padrão ou critério para alcançar uma certa validade na comparação.

O padrão ou critério de comparação e escolha deve ser extraído a partir de informações sobre o cargo a ser
preenchido (como variável independente) ou as competências desejadas, e sobre os candidatos que se
apresentam (como variável dependente).

Assim, o ponto de partida para o processamento da seleção de pessoal é a obtenção de informações


significativas sobre o cargo a ser preenchido ou a definição das competências desejadas pela organização. É
o que veremos a seguir.

Coleta de Informações Sobre o Cargo

As informações a respeito do cargo a ser preenchido podem ser colhidas através de cinco maneiras
distintas :

1. Descrição e análise do cargo. A descrição e análise do cargo constituem o levantamento dos aspectos
intrínsecos (conteúdo do cargo) e extrínsecos (requisitos que o cargo exige do seu ocupante, também

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chamados fatores de especificações) do cargo. A descrição e a análise do cargo proporcionam informações
a respeito dos requisitos e das características, que o ocupante do cargo deverá possuir para ocupá-lo
adequadamente.
Com essas informações, o processo de seleção poderá concentrar-se na pesquisa e avaliação desses
requisitos e nas características dos candidatos que se apresentam. A colheita de informações baseadas na
descrição e análise do cargo é muito superior em qualidade e quantidade às demais outras maneiras.

2. Técnica dos incidentes críticos. Consiste na anotação sistemática e criteriosa que os gerentes devem
fazer a respeito de todos os fatos e comportamento dos ocupantes do cargo, considerando que produziram
um excelente ou péssimo desempenho no trabalho.

Essa técnica visa localizar as características desejáveis (que melhoram o desempenho) e as indesejáveis
(que pioram o desempenho) que deverão ser investigadas no processo seletivo dos futuros candidatos ao
cargo. A técnica de incidentes críticos é subjetiva pelo fato de basear-se no arbítrio do gerente ou de sua
equipe de trabalho, quando aponta as características desejáveis e indesejáveis do futuro ocupante. Mas
constitui um excelente meio de colheita de dados a respeito de cargos, cujo conteúdo depende,
basicamente, das características pessoais que o ocupante do cargo deverá possuir para um desempenho
bem-sucedido.

3. Requisição de Pessoal. A requisição de pessoal (RP), constitui a chave de ignição para o processo
seletivo. Constitui uma ordem de serviço que o gerente emite para solicitar uma pessoa para ocupar um
determinado cargo vacante. A requisição de pessoal dispara o inicio do processo seletivo que trará um
novo funcionário para o cargo a ser preenchido. Em muitas organizações, em que não existe um sistema
estrutural de descrição e analise dos cargos, a RP é um formulário que o gerente preenche e assina e no
qual existem vários campos em que se solicita que se anotem quais os requisitos e características
desejáveis do futuro ocupante. Nessas organizações, todo o processo seletivo se baseará nessas
informações sobre os requisitos e características apontados na RP.

4. Análise do cargo no mercado. Quando a organização não dispõe das informações sobre os requisitos e
características essenciais ao cargo a ser preenchido, por se tratar de algum cargo novo ou cujo conteúdo
esteja fortemente atrelado ao desenvolvimento tecnológico, ela lança mão da pesquisa de mercado. Por
outro lado, em um mundo em constante mudança os cargos também mudam e, muitas vezes, é preciso
saber o que estão fazendo as outras organizações no mercado.

Nesses casos, utilizam-se as pesquisas e a análise de cargos comparáveis ou similares no mercado para
colheita e obtenção de informações a respeito. O cargo comparado chama-se cargo representativo ou
cargo de referência (benchmark job). Modernamente, as empresas estão fazendo benchmarking, isto é,
comparando os seus cargos com a estrutura dos cargos das empresas bem- sucedidas no mercado, no
sentido de desenhá-los melhor e adequá-los às novas demandas do mercado.

5. Hipótese de trabalho. Caso nenhuma das alternativas anteriores possa ser utilizada para obter
informações a respeito do cargo a ser preenchido, resta o emprego de uma hipótese de trabalho, ou seja,
uma previsão aproximada do conteúdo do cargo e de sua exigibilidade em relação ao ocupante (requisitos
e características) como uma simulação inicial. Trata-se de estabelecer hipóteses ou idéias antecipadas a
respeito do cargo a ser preenchido.
Quando o processo seletivo se baseia em competências desejadas pela organização, a colheita de dados se
limita à definição dessas competências. Quanto melhor definida a competência, mais ela se torna um
instrumento viável de medida para comparar os candidatos.
Com as informações a respeito do cargo a ser preenchido, o processo seletivo tem sua base de referência
estabelecida. A partir dessas informações, o processo de seleção tem condições de convertê-las para sua
linguagem de trabalho. As informações sobre o cargo e o perfil desejado do ocupante são transferidas para
uma ficha de especificações do cargo ou ficha profissiográfica, que deve conter os atributos psicológicos e
físicos necessários ao desempenho do ocupante no cargo considerado.

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Com a ficha de especificações, pode-se estabelecer quais as técnicas de seleção mais adequadas para
pesquisar tais atributos psicológicos e físicos que o cargo impõe ao seu futuro ocupante.
A ficha de especificações constitui uma codificação das características que o ocupante do cargo deverá
possuir. Através dela, o selecionador poderá saber o que pesquisar nos candidatos no decorrer do processo
seletivo.

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