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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Introdução ao CPC/2015: Sistema Multiportas


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INTRODUÇÃO AO CPC/2015: SISTEMA MULTIPORTAS

SISTEMA MULTIPORTAS

Faz parte da nossa cultura a visão de que quem resolve os nossos problemas é o judici-
ário, como se houvesse uma relação binária: estou com um problema e o judiciário é quem
vai resolvê-lo. Porém, nem sempre o judiciário é o local e modo adequado de resolução
do conflito.
Vale lembrar de um incidente de invasão ao código-fonte de um site de vendas, em que
algumas compras eram enviadas para outra conta. O caso foi judicializado, mas o juiz res-
ponsável por julgá-lo não tinha nenhum conhecimento técnico sobre computação. Nesse
caso, provavelmente o mais adequado seria um procedimento arbitral, desde que houvesse
uma cláusula compromissória entre as partes, a fim de resolver o conflito. No entanto, tratan-
do-se de alguém que invadiu um site, provavelmente não haveria espaço para diálogo entre
as partes, e houvesse mesmo necessidade de buscar o judiciário.
A realidade da arbitragem na década de 1990 no Brasil, quando ela começou a ser tra-
tada por lei, e a de atualmente, é bem diferente. Há centros muito bem estruturados espa-
lhados pelo país, a exemplo do Estado do Ceará. É uma realidade para buscar a solução de
conflitos.
Durante a construção de uma grande obra (ex.: uma arena da Copa, uma ponte etc.),
vários conflitos acontecem. Se cada disputa diária fosse judicializada e o juiz desse tutela
provisória ou efeito suspensivo, a obra não acabaria nunca, pois as discussões perduram por
longos anos. No caso de uma obra complexa, é possível instalar o dispute board, técnica em
que se estabelece um comitê, como se fosse um minicolegiado, para solucionar os conflitos,
em comum acordo entre todos. Trata-se da racionalização da solução do conflito.
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Durante o processo de separação de um casal que tenha um filho menor, a dissolução
do casamento é oficializada, com a separação dos corpos, a possibilidade de disputa sobre
a guarda e os alimentos. Se essas questões forem resolvidas somente com o juiz, é possível
que este decida por 3 mil reais em alimentos, que a guarda fique com a mãe e as visitações
sejam aos domingos, decisões que podem gerar brigas logo na implementação, devido aos
problemas entre a mãe e o pai, que não se falam, por exemplo, de modo que o conflito inicial
se desdobra em muitos outros. Para evitar novos conflitos, o meio é restabelecer o diálogo
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entre os pais. Cabe muito mais a um psicólogo, e não a um juiz, atuar nesse restabeleci-
mento do diálogo entre as partes. Nesse caso, deve haver uma mediação entre as partes.
Uma técnica polêmica é a constelação, em que, explicando de modo simplório, as partes
pedem desculpa, reconhecem seus erros e submetem-se aos erros do outro. Em situação de
violência doméstica, por outro lado, usar a técnica da constelação seria inapropriado e uma
nova forma de violência. Nesse caso, buscar-se-ia outra forma, como o sistema de portas,
em que o jurisdicionado chega ao fórum e olha para cada uma das portas abertas (jurisdi-
ção estatal, arbitragem, mediação, conciliação etc.), de modo que a melhor solução fosse
escolhida.
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A imagem acima representa a ideia do sistema multiportas, que busca pelo método mais
adequado para a solução do conflito.

ATENÇÃO
Os professores Hermes Zaneti Jr., Fredie Didier, Antônio do Passo Cabral e Leonardo Car-
neiro da Cunha argumentam que o uso do termo “métodos alternativos” para se referir à
conciliação não é adequado, uma vez que a palavra “alternativo” dá a ideia de que existe
um método prioritário (a jurisdição estatal) e a busca pelos métodos alternativos seria feita
por quem não quer a “solução principal”, depreciando assim os demais métodos. No en-

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tanto, não existe uma hierarquia entre os métodos, deve ser usado aquele que for o mais
adequado à situação.

Na heterocomposição, o método é construído a partir de um terceiro que vem solucionar


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o conflito. Logo, a solução não é encontrada pelas partes, mas imposta por um terceiro, que
pode ser, por exemplo, o juiz estatal, e que não decidirá pela vontade de ambas as partes,
mas segundo a lei.

Na autocomposição, são as partes que chegam à solução. Na conciliação, o conciliador


ajuda as partes dando-lhes soluções, mas quem resolve no fim são as partes, o conciliador
não pode impor nada. Na mediação, o mediador restabelece o diálogo.
Nos procedimentos de mediação e conciliação exitosos, ocorridos nos CEJUSTs (Cen-
tros Judiciários de Solução de Conflitos), o mediador ou conciliador redige a termo o que foi
acordado e assinado entre as partes, em comum acordo. Posteriormente, se as partes qui-
serem constituir o acordo como título executivo judicial, submetem ao juiz e este homologa a
sentença que, se não for obedecida, caberá ser executada. Perceba que o conciliador orga-
niza o debate e o mediador media a conversa, mas a solução é dada pelas partes.
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Se o autor renunciar ao direito ou o réu reconhecer o pedido, a solução não foi imposta
pelo juiz, mas trazida pela submissão de uma das partes ao direito da outra. O inciso III do
art. 487 estabelece que a decisão é de mérito e que o juiz vai homologá-la, pois quem resolve
não é ele, mas as partes, detentoras da vontade soberana.
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Tendo problemas recorrentes com a empresa VIVO, tenho a possibilidade de judicia-
lizar a questão ou resolver buscando a Anatel, a ouvidoria da VIVO ou o consumidor.gov,
plataforma online e oficial de resolução de conflitos (ODR – online dispute resolution). Das
7 queixas submetidas à plataforma, todas foram resolvidas. A ODR veio da experiência com
compras online. Se alguém compra no Mercado Livre, o vendedor não entrega o produto e
o comprador faz a reclamação na plataforma, o vendedor conversa com o consumidor e o
Mercado Livre vira apenas o elo de conversação e mediação entre as partes. Se o vende-
dor não cumprir as obrigações e o consumidor negativar o vendedor, este cai de prestígio,
diminui as vendas e o Mercado Livre pode esconder o perfil negativado na hora de hierar-
quizar as sugestões de vendas, como forma de punição. Da mesma forma, o consumidor é
ameaçado se abusar do que foi cumprido. Assim, a online dispute resolution é uma forma de
autocomposição.

Obs.: o rol presente na ilustração é exemplificativo do sistema multiportas.

O círculo restaurativo, a exemplo da constelação, está atualmente sendo tema de discus-


são e crítica sobre sua funcionalidade.

1. ARBITRAGEM

Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.


§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.

A referência à arbitragem no CPC é uma forma de dar status para ela. A realidade da
resolução de conflitos apenas para grandes empresas tem mudado, pois se antes o proce-
dimento arbitral era muito caro, com o desenvolvimento das CAMS pelo Brasil, a arbitragem
tornou-se extremamente acessível, inclusive às vezes mais barata que as custas do judiciário
e com soluções teoricamente mais céleres.
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E se houver necessidade de concretizar práticas da arbitragem através da ajuda do judi-


ciário (modelo cooperativo)? Se estabeleceu no código a possibilidade de expedição de carta
arbitral, que ocorre quando o árbitro pede para um juiz estatal que o ajude, seja ouvindo uma
testemunha, em um procedimento que corre no Ceará, mas a testemunha mora em Porto
Alegre, ou concretizando a tutela provisória de bloqueio à conta de uma empresa que não
esteja realizando pagamento, de modo que uma carta arbitral seja expedida para que o juiz
estatal determine o bloqueio. Além disso, segundo as regras de confidencialidade, é possível
pedir que a carta arbitral ocorra sob segredo de justiça para proteger determinada informação
de uma empresa.

Art. 189. Os atos processuais são públicos, todavia tramitam em segredo de justiça os pro-
cessos: (...)
IV – que versem sobre arbitragem, inclusive sobre cumprimento de carta arbitral, desde que a
confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo.
Art. 237. Será expedida carta: (...)
IV – arbitral, para que órgão do Poder Judiciário pratique ou determine o cumprimento, na área de
sua competência territorial, de ato objeto de pedido de cooperação judiciária formulado por juízo
arbitral, inclusive os que importem efetivação de tutela provisória.

A efetivação de uma tutela provisória concedida é um modo de prestigiar a arbitragem,


pois o código reconhece a existência do sistema multiportas, meio de retirar da cabeça do
brasileiro a ideia de que tudo é resolvido pelo juiz.
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2. CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO

Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. (...)


§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser
estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusi-
ve no curso do processo judicial.
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo lhe: (...)
V – promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliado-
res e mediadores judiciais;
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Fluxograma do procedimento comum:

PROCEDIMENTO COMUM CEJUSC

Conciliação
Mediação

PI – Dristib. → DESP.(Cite-se) → CITAÇÂO Audiência de – Contestação


Autocomposição

PI (petição inicial) → distribuição (registro) → despacho (cite-se) → citação → o réu


é citado para comparecer a uma audiência de autocomposição (pode haver mais de uma
sessão), valendo-se das técnicas de → conciliação ou mediação → prazo para que o réu
ofereça contestação.
O procedimento costuma ocorrer no CEJUST. Colocar a metodologia acima como regra é
um meio de prestigiar o sistema multiportas, em que nem tudo deve ser resolvido com base
em sentença de juiz estatal, pois muitas vezes a melhor forma de resolver o conflito com paz
é a autocomposição, já prestigiada no art. 165 do código.

SISTEMA MULTIPORTAS

Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis
pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de
programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.

O art. 165 dispõe sobre os auxiliares de justiça: conciliador e mediador. A conciliação e


mediação é tratada dos arts. 165 a 175, sinalizando que é preciso prestar atenção nos dois
sistemas de conciliação de conflitos.

§ 1º A composição e a organização dos centros serão definidas pelo respectivo tribunal, observa-
das as normas do Conselho Nacional de Justiça.
§ 2º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior
entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo
de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.
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§ 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as
partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo
que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções con-
sensuais que gerem benefícios mútuos.

O restabelecimento da comunicação envolve fazer com que as partes voltem a se falar


em situações como, por exemplo, a separação entre cônjuges, em que às vezes os filhos são
colocados como “telefone sem fio” dos pais. O mediador será o profissional que ajudará a
reconstruir o diálogo. O código reconhece esse profissional como diferenciado, ao dispor que
ele auxilia a restabelecer a comunicação e fazer com que as partes reflitam e identifiquem,
por si próprias, qual deve ser a solução adequada para a resolução do conflito.
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Art. 166. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da im-
parcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da
decisão informada.

Imparcialidade: o conciliador/mediador não pode ser amigo de nenhuma das partes.


Autonomia da vontade: a vontade é a das partes, não a do conciliador/mediador.
Confidencialidade: o que é dito ali morre ali.
Pergunta comum em prova concurso: a proposta feita no ambiente de conciliação e
mediação vincula as partes na fase de litígio? Não, pois existe a regra de confidencialidade.
Sem ela, as partes não se sentem seguras no ambiente de resolução.

§ 1º A confidencialidade estende-se a todas as informações produzidas no curso do procedimen-


to, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele previsto por expressa deliberação
das partes.
§ 2º Em razão do dever de sigilo, inerente às suas funções, o conciliador e o mediador, assim
como os membros de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos
oriundos da conciliação ou da mediação.
§ 3º Admite-se a aplicação de técnicas negociais, com o objetivo de proporcionar ambiente favo-
rável à autocomposição.
§ 4º A mediação e a conciliação serão regidas conforme a livre autonomia dos interessados, inclu-
sive no que diz respeito à definição das regras procedimentais.
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Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência
liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência
mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antece-
dência. (...)

O art. 334 reconhece que muitas vezes não é possível chegar à solução em apenas uma
sessão, principalmente nos casos de mediação.

§ 2º Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo exce-
der a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à compo-
sição das partes. (...)

O prazo estabelecido no § 2º não se aplica às ações de família. Nessas, podem ser ten-
tadas quantas conciliações/mediações forem necessárias.

§ 4º A audiência não será realizada:


I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual;
II – quando não se admitir a autocomposição.

O § 4º refere-se à audiência de autocomposição. Se o autor não se manifestar na petição


inicial dizendo se tem ou não interesse na audiência, é presumido que ele tem interesse, pois
o art. 334, em uma interpretação sistemática, estabelece que só não haverá audiência se as
partes demonstrarem expressamente o desinteresse.
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§ 5º O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o réu de-
verá fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da
audiência.
§ 6º Havendo litisconsórcio, o desinteresse na realização da audiência deve ser manifestado por
todos os litisconsortes.

�Este material foi elaborado pela equipe pedagógica do Gran Cursos Online, de acordo com a aula
preparada e ministrada pelo professor Mozart Borba Neves Filho.
A presente degravação tem como objetivo auxiliar no acompanhamento e na revisão do conte-
údo ministrado na videoaula. Não recomendamos a substituição do estudo em vídeo pela leitura
exclusiva deste material.
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