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Dois tratados sobre o

governo
John locke

Estado e relações de poder (BCH)


Profa. Dra. Vanessa Elias de Oliveira
John locke
• 1632-1704

• Fundador do empirismo

• Experiência absolutista (oposição a ela) = origem de Dois Tratados


sobre o Governo (1679-1680)
• Segundo Tratado = “ensaio sobre a origem, extensão e objetivo do
governo civil” (Os Clássicos da Política, p.84).
• “Nem a tradição nem a força, mas apenas o consentimento expresso
dos governados é a única fonte do poder político legítimo” (p.84)
• Individualista, fundador da mais completa formulação do Estado
Liberal (Bobbio).
Livro II - cap. II
do estado de natureza

• Para entender o poder político = entender o estado que todos os


homens estão = perfeita liberdade + igualdade (382).
• Situação real pela qual passaram, ainda que em diferentes épocas, a
maior parte da humanidade.
• Estado de relativa paz e harmonia.

• Estado de natureza tem para governá-lo uma “lei de natureza”,


que a todos obriga = “sendo todos iguais e independentes, ninguém
deveria prejudicar a outrem em sua vida, saúde, liberdade ou
posses” (384).
• Cada um está obrigado a preservar-se (...) e, tanto quanto puder,
preservar o resto da humanidade.
Livro II - cap. II
do estado de natureza

• “A responsabilidade pela execução da lei de natureza é,


nesse estado, depositada nas mãos de cada homem, pelo
que cada um tem o direito de punir os transgressores da
dita lei em tal grau que impeça sua violação” (385).
• Possibilidade de punição no estado de natureza: distinto
de Hobbes, para quem não há justiça nesse estado.
• Nesse estado, por não haver superioridade, aquilo que um
pode fazer, todos os outros têm igualmente o direito de
fazer.
Livro II - cap. II
do estado de natureza

• “E desse modo um homem obtém poder sobre outro no


estado de natureza” (386, grifos do autor).
• Ao transgredir a lei da natureza, o transgressor
desrespeita a regra da razão e da equidade (387*).
• Injúria: aquele que sofreu qualquer prejuízo por uma
punição injusta tem o direito de buscar reparação junto
àquele que a causou.
• Dois direitos: (a) de punir um crime (cabe a todos); (b)
de obter reparação (cabe à parte prejudicada). (389*).
Livro II - cap. II
do estado de natureza

• Punição = deve ser severa o bastante para ser temida e


evitada.
• Grande lei de natureza: aquele que derramar o sangue do
homem, pelo homem terá seu sangue derramado (389).
• Problema: os homens serão juízes em causa própria, gerando
confusão e desordem.
• Solução: “Admito sem hesitar que o governo civil é o remédio
adequado para as inconveniências do estado de natureza, que
certamente devem ser grandes quando aos homens é facultado
serem juízes em suas próprias causas” (392, grifo do autor).
Livro II - cap. II
do estado de natureza

• Monarcas absolutos: em nada diferem do estado de


natureza = “Muito melhor é o estado de natureza, no qual
os homens não são obrigados a se submeterem à vontade
injusta de outrem e no qual aquele que julgar
erroneamente em causa própria ou na de qualquer outro
terá de responder por isso ao resto da humanidade” (392).
• Sociedade (existe no E.N.) ≠ sociedade política (ou civil)

• Hobbes: sociedade civil surge com o Estado


Livro ii - cap. III
do estado de guerra

• Estado de guerra = estado de inimizade e destruição


(395*).
• Aquele que tenta colocar outrem sob seu poder absoluto
põe-se em estado de guerra contra ele: “(...) pois há razão
para se concluir que aquele que pretenda colocar-me sob
seu poder sem meu consentimento haverá de usar-me como
bem lhe aprouver quando o conseguir, e também me
destruirá se tal for seu capricho” (396).
• Diferença entre estado de natureza e estado de guerra:
para Hobbes o E.N. é a guerra de todos contra todos; para
Locke, este é o estado de guerra.
Livro ii - cap. III
do estado de guerra

• “A ausência de um juiz comum dotado de autoridade


coloca os homens em estado de natureza; a força sem
direito sobre a pessoa de um homem causa o estado de
guerra, havendo ou não um juiz comum” (398)
• Importante: no E.N. existem direitos tão fortes quanto
aqueles que existem numa sociedade política.
• Razão pela qual os homens se unem: evitar o estado de
guerra que, uma vez iniciado, dificilmente é brecado =
poder (político) é capaz de decidir controvérsias.
Livro ii - cap. IV
da escravidão

• Liberdade natural x liberdade do homem em sociedade

• Liberdade natural do homem: estar livre de qualquer


poder superior e não estar submetido à vontade ou
autoridade legislativa do homem, tendo por regra a lei de
natureza (401)
• Liberdade do homem em sociedade: não estar
submetido a nenhum outro poder legislativo senão aquele
estabelecido no corpo político mediante consentimento
(401).
Livro ii - cap. IV
da escravidão

• Homem não pode, nem por pacto nem por consentimento,


escravizar-se, pois não pode “ceder mais poder que o que
ele mesmo detém; e, assim como não pode tirar a própria
vida, tampouco pode colocá-la sobre o poder de outrem”
(403).
• Escravidão: estado de guerra constante entre um
conquistador e um conquistado.
Livro ii - cap. V
da propriedade

• Propriedade como fruto do trabalho: tudo que é fruto do trabalho


pertence àquele que trabalhou (409*).
• “(...) é pelo trabalho que o retira [o peixe] desse estado comum em
que o deixou a natureza, transformando em propriedade daquele
que para tal dedicou seus esforços” (411).
• Não é o pacto que dá origem à propriedade (410*).

• Sendo uma instituição anterior à sociedade, é um direito natural do


indivíduo que não pode ser violado pelo Estado.
• A mesma lei de natureza que concede a propriedade, também limita
a propriedade: aquilo que não é fruto do seu trabalho, pertence aos
outros.
Livro ii - cap. V
da propriedade

• E sendo a principal questão não os frutos da terra, mas


sim a própria terra?
• “A extensão da terra que um homem pode arar, plantar,
melhorar e cultivar e os produtos que dela é capaz de
usar constituem sua propriedade. Mediante o seu
trabalho, ele, por assim dizer, delimita para si parte do
bem comum” (412-413).
• Recursos escassos: racionalidade impõe limites ao apetite
dos homens (itens 34/36/37/48*).
Livro ii - cap. VII
da sociedade política ou civil

• Primeira sociedade: entre o homem e sua mulher => pais


e filhos => senhor e servidor.
• Sociedade conjugal = pacto voluntário entre homem e
mulher. Permanecem unidos para que possam “criar o
rebento”.
• Mulher tem a liberdade para separar-se do marido se o
contrato entre eles permitir.
• Sociedade entre pais e filhos é distinta da sociedade
política (cap.VI).
Livro ii - cap. VII
da sociedade política ou civil

• Senhor e servidor:

• Servidor vende temporariamente o serviço que se dispõe;


“cabe ao senhor um poder apenas temporário sobre ele,
e não maior do que o estabelecido no contrato entre
ambos”.
• Escravos: prisioneiros capturados em uma guerra,
sujeitos ao domínio absoluto e poder arbitrário de seu
senhor (pelo direito de natureza).
Livro ii - cap. VII
da sociedade política ou civil

• “Tendo esses homens, tal como digo, perdido o direito à


vida e com ela as liberdades, bem como suas
propriedades, e estando no estado de escravidão, não
sendo capazes de posse nenhuma, não podem pois ser
considerados parte da sociedade civil, uma vez que o
principal fim desta é a preservação da propriedade” (85,
p.456, grifos meus).
• Chefe da família tem um poder limitado em relação às
pessoas que fazem dela parte, com exceção do escravo =
“ele não tem nenhum poder legislativo de vida e morte
sobre nenhum dos membros da família” (86, p.457).
Livro ii - cap. VII
da sociedade política ou civil

• Nenhuma sociedade política pode existir sem ter o poder de


preservar a propriedade = punir todos os delitos dos membros
dessa sociedade => só existirá sociedade política onde os seus
membros renunciaram esse poder natural, transferindo-o ao corpo
político.
• Quem está na sociedade política?

• “Aqueles que estão unidos em um corpo único e têm uma lei


estabelecida comum e uma judicatura à qual apelar, com autoridade
para decidir sobre as controvérsias entre eles e punir os infratores,
estão em sociedade civil” (87, p.458).
• Aqueles que não possuem tal possibilidade de apelo, estão no estado
de natureza.
Livro ii - cap. VII
da sociedade política ou civil

• Sociedade política =
a) poder de elaborar leis (estabelecer punições às transgressões
cometidas pelos membros dessa sociedade).
b) poder de guerra e paz (poder de punir os danos cometidos contra
qualquer um de seus membros por alguém que não pertence à
sociedade).
• Essa é a origem dos poderes legislativo e executivo da sociedade
civil.
• “E isso retira os homens do estado de natureza e os coloca no de
uma sociedade política, estabelecendo um juiz na Terra, investido
de autoridade para resolver todas as controvérsias e reparar os
danos que possam advir a qualquer membro dessa sociedade”
(89, p.460).
Livro ii - cap. VII
da sociedade política ou civil

• Monarquia absoluta = incompatível com a sociedade


civil => estado de natureza (90, p.461*)
• Sociedade civil = cada pessoa fica igualmente sujeita às
leis que ela mesma, como parte do legislativo, criou.
• “Nenhum homem, na sociedade civil, pode estar isento
de suas leis” (94, p.467) => nem mesmo o soberano.
Livro ii - cap. VIII
do início das sociedades políticas

• A única maneira pela qual um indivíduo pode abdicar de


sua liberdade natural e tornar-se parte da sociedade civil
é “concordando com os outros homens em juntar-se e
unir-se em uma comunidade” (consentimento).
• Legislação da sociedade civil = poder da maioria
(469*).
• “Quando qualquer número de homens consentiu desse
modo em formar uma comunidade ou governo, são, por
esse ato, logo incorporados e formam um único corpo
político, no qual a maioria tem o direito de agir e
deliberar pelos demais” (95, p.469).
Livro ii - cap. VIII
do início das sociedades políticas

• Todos os que abandonam o estado de natureza abdicam


em favor da maioria, que deve decidir pelo todo, como um
corpo único.
• Caso contrário, a sociedade política seria facilmente
dissolvida.
• O pacto (seu momento) não requer a união de todos os
indivíduos que a ele estarão submetidos. A maioria pode falar
em nome do todo, da sociedade política inteira (99, p.472*).
• Todas as sociedades políticas tiveram início a partir de uma
“união voluntária e no mútuo acordo de homens que agiam
livremente na escolha de seus governantes e formas de
governo” (102, p.474).
Livro ii - cap. VIII
do início das sociedades políticas

• Possibilidade de surgimento de novos governos (115*).


• Filhos são livres para se sujeitarem à sociedade política
que quiserem. Não estão amarrados às escolhas dos pais.
• “(...) apenas o consentimento de homens livres,
nascidos sobre um governo, que os torna membros
deste, sendo dado separadamente por cada um a seu
turno, no momento em que cada qual atinge a
maioridade, e não por todos reunidos em uma
multidão” (117, p.490).
Livro ii - cap. VIII
do início das sociedades políticas

• E como se dá tal consentimento?


• Consentimento expresso e consentimento tácito.
• Consentimento expresso: faz do homem, ao ingressar numa
comunidade política, perfeito membro desta.
• Consentimento tácito: relaciona-o à propriedade.
• “todo e qualquer homem que tenha alguma posse ou usufrua
de qualquer parte dos domínios de um governo dá, com isso,
o seu consentimento tácito e está tão obrigado à obediência
às leis desse governo, durante esse usufruto, quanto
qualquer outro que viva sobre o mesmo governo” (119,
p.492).
Livro ii - cap. VIII
do início das sociedades políticas

• E isso alcança também “o mero estar alguém nos


territórios desse governo” => ou seja, estar no território
significa seguir as leis nele válidas.
• Porém, submeter-se às leis de um país não faz de um
homem membro dessa sociedade = caso do estrangeiro.
• Ainda que possa se sentir obrigado a submeter-se à sua
administração, ainda que em consciência, não são
membros dessa sociedade => “direitos de cidadania”
(noção posterior).
Livro ii - cap. IX
dos fins da sociedade política e do governo

• Fim maior da submissão dos homens às sociedades políticas


= conservação de sua propriedade (124).
• Estado de natureza carece de alguns aspectos garantidos na
sociedade política:

a. Lei estabelecida, fixa e conhecida, recebida e aceita


mediante o consentimento comum;

b. Juiz conhecido e imparcial, com autoridade para solucionar


todas as diferenças de acordo com a lei estabelecida

c. Poder para apoiar e sustentar a sentença quando justa e dar a


ela a devida execução.
Livro ii - cap. X
das formas de uma sociedade política

• Democracia
• Oligarquia
• Monarquia (hereditária ou eletiva) (132*).
• Forma de governo depende de quem é o depositário do
poder supremo, isto é, o legislativo (poder de elaborar
leis).
Questão para discussão

• Apresente os principais argumentos de Locke


(exemplificando com passagens do texto) em relação
aos seguintes aspectos:

(a) Estado de natureza;

(b) Decisão de tornar-se membro de uma sociedade política;

(c) Direito de propriedade.

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