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Abstract: The aim of this scientific article is to address the constitutional right to
housing and, concomitantly, the right to property, embodied in the use of the
repossession action. It is, above all, a relationship of conflict between these
fundamental rights. It is certain that many citizens do not have the financial conditions
to acquire a property and, therefore, they resort to acts of occupation of land and
private properties. In this framework, one can observe, on the one hand, the acts of
occupation by those who have the right to decent housing and, on the other hand,
those who are the owners of such invaded lands, who have the right to be
repossessed. As a result of the highlighted theme, the judge must carry out a weighting
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Acadêmica do curso de Direito do Centro Universitário UNA- Campus Bom Despacho/MG.
renatakakabarbosa@gmail.com. Artigo apresentado como requisito parcial para a conclusão do curso
de Graduação em Direito do Centro Universitário UNA. 2021. Orientador: Prof. Gilberto de Andrade
Pinto. Mestre em Teoria do Direito, professor universitário e advogado.
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of values, rights and principles, so that an equitable decision can be made. Likewise,
it is essential to consider the so-called “defensive function of fundamental rights”,
looking at the most vulnerable part of the legal situation experienced. Furthermore, if
it is found that the property under discussion does not fulfill its social function, which
proves to be unproductive, it should be destined for those who can make good use of
it. Regarding the methodology, this article was carried out through bibliographical,
doctrinal and jurisprudential research, given that it is a purely theoretical theme.
1 INTRODUÇÃO
como direito social, através da Emenda Constitucional nº. 26, de 2000. Neste esteio,
consoante Gilmar Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco (2012), a Carta
Constitucional estabelece como direitos sociais a educação, saúde, alimentação, o
trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, previdência social, proteção à maternidade
e à infância, e a assistência aos desamparados.
Assim dispõe o art. 6º da Constituição Federal: “São direitos sociais a
educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social,
a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma
desta Constituição” (BRASIL, 1988).
Desta forma, o direito à moradia é um direito social, e como tal, integra às
liberdades públicas (direitos individuais), sendo assim, são direitos subjetivos. Assim,
“não são meros poderes de agir, como ocorre nas liberdades públicas, mas sim
poderes de exigir constituindo, assim, verdadeiros direitos de crédito” (OLIVEIRA;
FERREIRA, 2014).
Destaca-se, ademais, que o direito à moradia estabelece a competência
comum entre os entes da Federação com vistas à promoção de programas de
construção de moradias e de melhorias das condições de habitação e de saneamento
da população (FERNANDES, 2011).
Nas palavras do autor supramencionado:
Isso significa que todos têm direito à uma residência – não importando a
forma física que assuma (se uma casa, um apartamento, etc.), para nela
habitar. Não pode ser confundido com o “direito à casa própria “, mas apenas
a garantia de um teto capaz de abrigar o indivíduo sozinho ou com sua família.
Para muitos autores, todavia, fica claro que tal direito deve ser lido à luz dos
parâmetros fixados pela dignidade humana, sendo implícito, em seu espectro,
que tal edificação tenha dimensões adequadas para abrigo do indivíduo e
familiares, bem como proporcione as mesmas condições de higiene,
privacidade e conforto mínimos (FERNANDES, 2011, p. 491).
Neste contexto, observa-se que a diretriz preconizada no art. 23, inciso IX, da
CF/88, não pode ser considerada “uma pauta retórica, antes é um dever constitucional
atribuível a todos os entes federados” (RANGEL; SILVA, 2011).
Em tom supletivo, compreende-se que, ao tratar do direito à moradia, parte da
ideia de dignidade da pessoa humana prevista no art. 1.º, III, direito à intimidade e à
privacidade e de ser a casa asilo inviolável, previstos no art. 5.º, X e XI,
respectivamente. Portanto, não existe dúvida ao assegurar o direito à moradia, a
Constituição busca consagrar não apenas a habitação em si, mas também, que seja
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digna e adequada, sendo por este motivo, atribuição de todos os entes da federação
o combate da pobreza e da marginalização, conforme prevê o art. 23, X, com objetivo
precípuo de integrar socialmente aos menos favorecidos (LENZA, 2018).
Observa-se também que há uma proteção do bem de família, conforme a Lei
n. 8.009/90, que encontrou fundamento no art. 6.º da Constituição Federal. “Entre as
ressalvas da referida lei, ou seja, não proteção mesmo em se tratando do único bem
imóvel, está a figura do fiador em contrato de aluguel (art. 3.º, VII)” (LENZA, 2018, p.
1184).
Sobre o bem de família, Gilmar Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco
dissertam:
O direito à moradia também foi tratado no rol de direitos humanos, e foi inserido
no rol garantidor destes direitos a partir da Declaração Universal dos Direitos
Humanos de 1948, o que inovou, trazendo uma dimensão de direitos sociais de forma
inovada, visto que estabelece a valorização e a promoção de uma vida de qualidade
e com dignidade, para todas as gerações.
Segundo a Defensoria Pública do Estado de São Paulo (2012, p. 03): “A
moradia deve resguardar o bem estar e a saúde do indivíduo, com infraestrutura
básica, além de estar em local que permita acesso ao emprego, serviços de saúde,
educação e outros serviços de assistência social.”
Nesse contexto, complementa Fachin:
O direito à moradia, não é apenas o direito a uma casa própria, mesmo que
este seja o principal elemento que efetive este direito. É muito mais complexo, pois
mesmo que exista a habitação, pode não existir qualidade de vida, condições
apropriadas de higiene e conforto, e que naquele ambiente, seja favorável à
preservação da intimidade de cada pessoa integrante da família, bem como a
privacidade da família como um todo.
Diante disto, a Constituição Federal estabeleceu inúmeras garantias, no que se
refere ao direito de moradia. Desta maneira, o legislador infraconstitucional criou leis
para tentar dirimir o problema das invasões indiscriminadas em propriedades alheias,
bem como do grande número de famílias que não têm onde morar.
A atual proteção à propriedade (art. 5º, XXII, e art. 170, II, da CR/88) é
abrangente, incluindo o patrimônio e sob esse título os direitos reais, os
direitos pessoais e as propriedades literárias e artísticas, as invenções e as
descobertas.[954] Mas, a noção de patrimônio inclui ainda o conjunto, não
apenas de direitos, mas ainda de obrigações de um indivíduo. Coligado
também ao direito de propriedade está a proteção constitucional à herança
(art. 5º, XXX, da CR/88) (FERNANDES, 2011, p. 320).
Pelo exposto, pode-se entender que sobre o direito de propriedade não existe
força absoluta, visto que o art. 5º, XXIII, da Constituição lhe retira a noção
individualista típica do século XVIII. Desta forma, a propriedade não pode ser
entendida como um direito absoluto, visto que, caso não seja respeitada a sua função
social, serão tomadas as medidas restritivas previstas em nosso ordenamento jurídico
(FERNANDES, 2011).
Neste sentido, expõe Cynthia Siqueira de Rezende Souza:
social que atenda aos interesses públicos, poderá incorrer na perda da sua
propriedade.
evitar a violência e assegurar a paz social, visto que a situação fática se delineia como
situação de direito.
Em caráter supletivo, deduz-se que “em razão de ter sido acolhida a teoria
objetiva, é possível que várias pessoas, sob títulos diversos, exerçam a posse sobre
um mesmo bem. Afirma-se, então, que a posse pode ser desdobrada em posse direta
e posse indireta.” (TARTUCE; SARTORI, 2014).
Será direta se for exercida por quem estiver com a coisa em seu poder. E
indireta quando quem exercer um dos poderes inerentes à propriedade, não estiver
com a coisa em seu poder. Desse modo, o proprietário que aluga o seu bem, transfere
a posse direta ao locatário, mas conserva para si a posse indireta, visto que pode
dispor da mesma ou reivindicá-la.
Seguindo este raciocínio, observa-se as lições de Coelho:
Uma primeira, de direito fundamental, visto que se insere no rol dos direitos
fundamentais, na companhia inseparável do direito de propriedade (art. 5º,
XXII e XXIII); a segunda, de princípio norteador da atividade econômica, pois
esse princípio, além de trazer em si um cunho social, também apresenta
repercussão econômica (RANGEL; SILVA, 2011).
Diante disso, caso a função social da propriedade não seja atendida, o Poder
Público tomará medidas com o intuito de garantir a necessidade, utilidade pública e o
interesse social, o que será revertido para a coletividade, principalmente aqueles que
não possuem moradia.
A lei que trata da desapropriação por interesse social, traz o seguinte:
1988 no mesmo sentido das anteriores, assegura o direito à herança (art. 5.º, inciso
XXX). Os bens que pertenciam à pessoa falecida serão transferidos para os herdeiros
e na forma estabelecida em lei” (FACHIN, 2012, p. 291).
Destarte, caso a propriedade pertença a pessoa já falecida, caberá aos seus
herdeiros dar a destinação ao bem de acordo com os preceitos constitucionais, em
que se destaca a função social da propriedade (FACHIN, 2012).
Portanto, para realizar uma efetiva justiça social, que atenda aos princípios
basilares da nossa Constituição Federal, é mister que exista um planejamento urbano
que englobe de forma primordial a função social da cidade e da propriedade, para que
assim, seja possível o desenvolvimento saudável e com a estrutura suficiente para
proporcionar a qualidade de vida de toda a coletividade, principalmente, os mais
carentes.
3 A REINTEGRAÇÃO DE POSSE
Na legislação civil, a disposição que trata dos aspectos materiais das ações
possessórias, encontra-se no art. 1.210, nos §§ 1º e 2º:
Art. 560. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação
e reintegrado em caso de esbulho.
Art. 567. O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de ser
molestado na posse poderá requerer ao juiz que o segure da turbação ou
esbulho iminente, mediante mandado proibitório em que se comine ao réu
determinada pena pecuniária caso transgrida o preceito (BRASIL, 2015).
• Possuir o imóvel com a intenção de ser dono, ou seja, ocupar com a certeza
de que aquele imóvel lhe pertence. Por isso, não é possível usucapir imóvel
emprestado, por exemplo.
• Possuir o imóvel de forma contínua, sem interrupção. Isto é, é necessário
ocupar o imóvel todo o período, não sendo possível abandoná-lo e depois de
algum tempo voltar a morar nele. Caso isso aconteça, o tempo exigido pela
lei começará a ser contado da data do retorno ao imóvel.
• Que não tenha havido nenhum questionamento sobre a sua posse do imóvel
(carta do fórum, notificação do proprietário).
• Tempo de posse: o tempo de posse exigido depende para cada tipo de
usucapião (DEFENSORIA PÚBLICA DE SÃO PAULO, 2012, p. 07).
Neste sentido, aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e
cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem
oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o
domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural (art.
183) (FACHIN, 2012, p. 292).
Aquele que não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como
seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, localizada em
zona rural, não superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu
trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a
propriedade (art. 191) (FACHIN, 2012, p. 293).
[…] partindo da ideia de dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) direito à
intimidade e à privacidade (art. 5º, X) e de ser a casa asilo inviolável (art. 5º,
XI), não há dúvida de que o direito à moradia busca consagrar o direito à
habitação digna e adequada, tanto é assim que o art. 23, X, estabelece ser
atribuição de todos os entes federativos combater as causas da pobreza e os
fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores
desfavorecidos (LENZA, 2018, p. 201).
Aqueles que não possuem uma habitação adequada buscam-na por meio de
invasões a propriedades alheias com objetivo de pressionar os poderes
públicos para que os terrenos invadidos sejam repassados para a construção
de moradias para pessoas de baixa renda e atentá-los para a difícil situação
em que vivem, ante a insuficiência de políticas públicas e as obrigações
atribuídas ao Estado brasileiro para consolidar a proteção ao direito à
moradia, como o dever de assegurar a dignidade da pessoa humana - por ser
um Estado Democrático de Direito - e de executar as obrigações que lhe são
devidas pelos tratados internacionais dos quais faz parte (NEVES, 2016, p.
14).
não vem dando vasão a demanda gigantesca por moradia, prova disso são
os exemplos aqui relatados, nos quais milhares de famílias viram-se
obrigadas a invadir propriedades alheias na tentativa de ter onde morar, sem
mencionar o número de pessoas que vivem em condição de rua.
Portanto, conclui-se que, de fato, a não efetividade do direito social e
constitucional à moradia leva, por muitas vezes, a prática de atos violentos
contra os legítimos possuidores, desembocando na imensa demanda judicial
de ações de reintegração de posse (OLIVEIRA, 2020).
Da mesma maneira, aduz Lenza (2018) que, para fins de solucionar tal impasse
em casos de ocupação, faz-se necessário, além da ponderação de direitos, que o
julgador analise a finalidade do imóvel, ou seja, de que forma ele será mais bem
utilizado. Trata-se, nesse prumo, de um conflito de direitos em âmbito constitucional.
Ademais, acrescenta o referido autor (LENZA, 2018) que uma propriedade,
quando cumpre com toda a função social, assegura a existência da justiça social, em
consonância com os valores e preceitos jurídicos. Nesse sentido, observa-se que uma
propriedade sem cumprir com tais elementos devem ser destinada à ocupação
daqueles que dela necessitam. Em outras palavras, garante-se a destinação de uma
propriedade improdutiva para aqueles que irão fazer um bom uso da mesma.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
ocorrem, sobretudo, pelo fato de o ente estatal não garantir condições de vida digna
aos cidadãos. Destarte, vislumbra-se que milhares de famílias se encontram
desamparadas e sem qualquer perspectiva de melhoria de vida. Trata-se, sobretudo,
de uma grave falha ainda presente no Estado Democrático de Direito, ou seja,
ausência de cumprimento dos direitos sociais e garantias previstas no texto
constitucional.
Ao adentrar na esfera jurídica, observa-se a existência de milhares de ações
possessórias e, dentre tais ações, compreende -se que o magistrado, ao julgar tais
questões, deverá se valer de uma ponderação de direitos e princípios fundamentais.
Em outras palavras, analisa-se a prevalência do direito à moradia ou de ações em
defesa da posse e propriedade. Aduz-se, no mesmo sentido, que o julgador deverá
analisar cada caso de maneira individual, levando-se em consideração todos os
elementos precípuos.
Dentre tais elementos, tratou-se acerca da função social da propriedade. Dessa
forma, coaduna-se com o pensamento da doutrina majoritária. De outra forma, pode-
se dizer que, em casos onde a propriedade se mostrar improdutiva, sem cumprir com
a sua função social, compreende-se que essa deverá destinar-se à moradia daqueles
que necessitam, em consonância com os direitos sociais previstos na Magna Carta
de 1988.
REFERÊNCIAS
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Editores, 2009.
BRASIL. Lei nº. 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em: http://
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 22 ago. 2021.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil – Direito das Coisas. 4. ed. São
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Paulo: Saraiva, 2019.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 22. ed. São Paulo: Saraiva,
2018.
OLIVEIRA, Kamilee Lima de. Direito Social à Moradia: Análise sobre as ações de
reintegração de posse em tempos de pandemia. Revista de Direito, Viçosa, v.2, n.
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RANGEL, Helano Márcio Vieira; SILVA Jacilene Vieira da. O Direito Fundamental à
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Cidade. 2011. Disponível em:
http://www.domhelder.edu.br/revista/index.php/veredas/article/viewFile/77/132.
Acesso em: 30 ago. 2021.
SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de Direito Constitucional. 8.ed. São Paulo: Saraiva,
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TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 4. ed. São Paulo: Método, 2014.