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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO


35ª Câmara de Direito Privado

Registro: 2022.0000353326

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação Cível nº


1030385-89.2016.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante
ELEANDRA DANIELA GARCIA DE OLIVEIRA SCOMPARIM, é apelado SOB
MEDIDA MONTAGENS E EVENTOS LTDA..

ACORDAM, em 35ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça


de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento em parte ao recurso. V.
U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores


MORAIS PUCCI (Presidente), FLAVIO ABRAMOVICI E MOURÃO NETO.

São Paulo, 9 de maio de 2022

MORAIS PUCCI
RELATOR
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
35ª Câmara de Direito Privado

Apelação Cível n° 1030385-89.2016.8.26.0506


Comarca de Ribeirão Preto - 10ª Vara Cível
Juiz de Direito Dr. Isabela de Souza Nunes Fiel
Apelante: Eleandra Daniela Garcia de Oliveira Scomparim
Apelado: Sob Medida Montagens e Eventos Ltda.

Voto nº 28148

Apelação Cível. Ação de despejo cumulada com cobrança de


multa contratual. Sentença de procedência. Apelo da ré.

Notificação extrajudicial premonitória válida. Informação de


rastreio no site da empresa Correios que comprova a entrega da
correspondência no endereço da ré.

Multa contratual pela não devolução do imóvel no fim do prazo


contratual. Nulidade de pleno direito, nos termos do art. 45 da
Lei. 8.245/91. Multa afastada.

Recurso parcialmente provido.

A r. sentença proferida à f. 464/467, declarada às f.


510/511 destes autos de ação de despejo cumulada com cobrança de
multa contratual movida por SOB MEDIDA MONTAGENS E EVENTOS
LTDA, em relação a ELEANDRA DANIELA GARCIA DE OLIVEIRA
SCOMPARIM, julgou procedentes os pedidos para: (a) condenar a ré ao
pagamento da multa contratual e (b) conceder à ré o prazo de 15 (quinze)
dias para desocupar voluntariamente o “stand”, sob de despejo. Pela

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sucumbência, condenou ainda a ré no pagamento das custas


processuais e de honorários advocatícios fixados em 10% do valor da
causa. Por incontroversos, deferiu ainda o imediato levantamento pela
autora dos valores depositados nos autos (f. 510).
Apelou a ré (f. 477/498) buscando preliminarmente, a
concessão de efeito suspensivo e no mérito, a improcedência do feito,
alegando, em suma, que: (a) a autora não cumpriu os requisitos formais
para pleitear o despejo por denúncia vazia; (b) a autora é parte ilegítima
para manter o espaço locado, ante o término da locação celebrada entre
a autora e o Grupo Pão de Açúcar, proprietário desse espaço; (c) a
sentença deverá ser anulada para que seja novamente oficiado às
locadoras para que informem se houve ou não renovação do contrato de
locação firmado com a autora; (d) a notificação é inválida para fins do art.
57 da Lei 8245/91; (e) a multa contratual é inaplicável e caso mantida,
deve ser reduzida proporcionalmente.
A apelação, preparada (f. 499/500, complementada às f.
637/638), foi contra-arrazoada (f. 532/554).
É o relatório.
A sentença foi disponibilizada no DJE em 09 de março de
2020, considerando-se publicada no primeiro dia útil subsequente (f.
472). A apelação, protocolada 30 de março de 2020, é tempestiva.
A autora alega que: (a) em 09/11/2015, sublocou para a ré
um espaço comercial com área de 8 m², localizado na área comercial do
Supermercado Extra de Ribeirão Preto, para instalação de um quiosque,
mediante pagamento de aluguel no valor mensal de R$ 2.260,00; (b) a
locação foi celebrada pelo período de 90 (noventa), com início em
01/12/2015 e fim em 29/02/2016, data que a ré estava obrigada a restituir
o imóvel, sob pena de multa diária; (c) a ré, porém, não restituiu o imóvel,
tendo a autora concordado que ela ficasse até 31/05/2016; (d) findo tal
prazo, novamente, a ré se recusou a sair, permanecendo no imóvel até o

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momento; (d) promoveu a notificação extrajudicial da ré para


desocupação, porém, sem êxito; (e) a ré permanece indevidamente no
imóvel, contra sua vontade, e está depositando o valor dos aluguéis no
Banco do Brasil, por meio de depósitos em consignação.
Com a presente demanda, buscou a autora a liminar de
despejo e ao final (a) a declaração da rescisão do contrato de locação e
(b) a condenação da ré no pagamento de multa contratual prevista na
cláusula 2.1 do contrato.
A liminar de despejo foi indeferida (f. 44/45), decisão
mantida por esta Eg. Câmara, considerando que a notificação
extrajudicial enviada pela autora não concedeu à ré a antecedência
mínima de 30 (trinta) dias para a desocupação, nos termos do art. 59, § §
1º, inciso VIII da Lei de Locação (f. 88/92).
A ré, na defesa, alegou, em suma, que: (a) a autora não
comprovou que ocorreu notificação premonitória do art. 57 do Lei de
Locação, pois não foi juntado o aviso de recebimento; (b) o contrato vige
por prazo indeterminado; (c) tem direito a renovação do contrato, pois
permanece no local por prazo superior a três anos; (d) caso ocorra o
despejo sofrerá prejuízos e deverá ser indenizada pela autora; (e) no
mesmo local existe outra loja no ramo de “capinha e acessórios de
celular” e o verdadeiro objetivo da autora é beneficiar a loja concorrente.
Às f. 193/198 a ré noticiou que entre os dias 17 e 18 de
novembro de 2017, a autora, arbitrariamente, procedeu a desmontagem
e retirada do quiosque/stand e de todos os seus pertencentes do local,
requerendo liminarmente, a ordem de remontagem do quiosque, sob
pena de multa.
Foi deferida a liminar pleiteada pela ré (f. 224) e a autora
foi intimada a dar cumprimento a liminar em 28/11/2017 (f. 249).
Às f. 239/242, a autora peticionou nos autos alegando que
desconhecia tal fato, não tinha mais operações no imóvel e a

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desocupação foi realizada pelo Grupo Pão de Açúcar, locador.


Às f. 253/255 a autora notícia que o prazo de vigência do
contrato de locação celebrado entre ela e o locador, Grupo Pão de
Açúcar, expirou em 31/12/2017, portanto, não possui mais legitimidade
para sublocar o espaço, requerendo, novamente, em caráter liminar, o
despejo da ré.
Na decisão de f. 339 foi rejeitada a preliminar de nulidade
da notificação extrajudicial e determinado a expedição de ofícios a
Companhia Brasileira de Distribuição, Sé Supermercado Ltda e Sendas
Distribuidoras S/A solicitando informações sobre eventual renovação do
contrato de locação.
Os ofícios não foram respondidos.
Sobreveio a sentença de procedência.
A r. sentença julgou procedentes os pedidos, entendendo
que: (a) no que diz respeito a renovação do contrato ou indenização por
suposta concorrência desleal ou pelos danos decorrentes da retirada de
seu stand, deverá a ré ajuizar ação autônoma; (b) desnecessária a
expedição de ofícios para o julgamento da lide, pois o fato de ter havido
ou não a renovação do contrato de locação entre o Grupo Pão de Açúcar
e a autora em nada influenciará no resultado da presente lide; (c)
contrato firmado entre as partes estipula prazo determinado de
01/12/2015 a 29/02/2016; (d) a ré teve autorização para permanecer no
local até 31/05/2016 nos mesmos termos que o contrato anterior; (e)
tanto a notificação quanto o ajuizamento da presente ação deram ciência
inequívoca à ré da pretensão da autora pela desocupação do local e,
portanto, sua permanência até os dias atuais está contrária à lei e ao
contrato; (f) desmerece acolhida a alegação da ré de que está no local
por mais de 3 (três) anos, pois se permanece até os dias atuais, se deve
em razão do processo, período que não pode ser computado; (g) ainda
assim a somatória dos períodos não atinge o prazo legal nos termos do

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art. 51 da lei nº 8.245/91.


O inconformismo da ré prospera em parte.
O contrato denominado de “Contrato de Cessão
Temporária de Espaço a Título Oneroso e outras Avenças” estabeleceu o
prazo determinado de 91 dias, com início em 01/12/2015 e término em
29/02/2016. A autora informa ter autorizado a permanência da ré até o 31
de maio de 2016, porém, a ré se recusou a entregar o imóvel.
Ainda que se entenda que, com a permanência da ré no
imóvel a partir de 29/02/2016, houve prorrogação do contrato por prazo
indeterminado, tem direito à autora denunciar o contrato e requerer
desocupação do imóvel pela ré, nos termos do art. 57 da Lei 8245/91.
Como bem entendeu o douto Magistrado, é irrelevante
para a relação negocial existente entre as partes, o fato de a autora ter
renovado ou não seu contrato com o Grupo Pão de Açúcar.
No mais, a notificação premonitória é válida (f. 36/38).
Tal notificação não tem formalidade prescrita em lei, e
portanto, é válida a notificação por carta entregue pelos correios. Nesse
aspecto, apesar de não haver o aviso de recebimento nos autos, há
informação do site da empresa Correios no sentido de que a
correspondência foi entregue em 20/06/2016 (f. 38).
A notificação extrajudicial faz prova da ciência inequívoca
da ré sobre a intenção da autora de reaver o imóvel. Ademais, os
depósitos em consignação para pagamento dos aluguéis, efetuados logo
após o recebimento da notificação, em 22/06/2016, só corroboram que a
ré já estava ciente da intenção da autora de resilir o contrato.
Assim, estando a autora ciente da ausência de interesse
da autora na continuidade da locação, não há razão de direito para
compelir a locadora a se manter jungida a relação locatícia contra seu
interesse.
Por outro lado, resguardado o entendimento do douto

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Magistrado, não há que se falar em cobrança de multa contratual pela


não devolução do imóvel no fim do prazo contratual.
Primeiro, porque a própria autora admite ter concordado
com a prorrogação do contrato após seu término em 29/02/2016. A
autora só não conseguiu comprovar que a prorrogação também tinha
prazo determinado. E sendo verbal, a prorrogação deve ser considerada
por prazo indeterminado.
Segundo, porque a cláusula que estabelece multa para a
hipótese de não desocupação do imóvel ao final do prazo contratual é
nula.
A Lei n. 8.245/91 impõe a prorrogação do contrato ao final
do prazo contratual (arts. 46 e 47) e o seu art. 45 estabelece que “são
nulas de pleno direito as cláusulas do contrato de locação que visem a
elidir os objetivos da presente lei, notadamente as que proíbam a
prorrogação prevista no art. 47, ou que afastem o direito de renovação,
na hipótese do art. 51, ou que imponham obrigações pecuniárias para
tanto”.
Neste sentido, anotações do mencionado autor WALDIR
DE ARRUDA MIRANDA CARNEIRO, in Anotações à Lei do Inquilinato,
RT/2000, p. 293, nota 11 ao art. 45 da lei nº 8.245/91:

“É inexigível a multa prevista para o caso de o inquilino não


desocupar o imóvel ao cabo do prazo fixado no contrato, pois a
hipótese legal de prorrogação da locação assim configurada não pode
ser erigida à condição de infração contratual” (Ap. 176.472-9, 5ª Câm.
do 2º TACSP, j. em 21.11.84, rel. Menezes Gomes, RT 593/177).
“Locação. Desocupação do imóvel locado. Multa compensatória pela
não devolução do prédio ao fim do contrato. Inadmissibilidade.
Cláusula contratual nula. Considera-se abusiva, e por isso nula, a
cláusula contratual que estabelece multa a ser paga pelo locatário se
não devolver o imóvel ao término do prazo do contrato” (Ap.-rev.
423.793-00/7. 10ª Câm. do 2º TACSP, j. 22.2.95, rel. Euclides de
Oliveira, v.u., RT 725/275).

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Nesse sentido, também já se manifestou esta Eg. 35ª


Câmara em voto de minha relatoria:
Locação de imóveis. Ação de cobrança de encargos da locação.
Sentença de parcial procedência. Ausência de comprovação de que
alguns móveis (armário, varal e arara) foram deixados no imóvel
locado. Ausência de cláusula contratual com previsão de execução de
nova pintura no imóvel locado pela locatária. Comprovação nos autos
que o autor ajuizou ação consignatória para o pagamento dos débitos
do condomínio que não foram pagos pela locatária. Honorários
contratuais. Precedentes do STJ pela impossibilidade de reparação a
este título. Entendimento majoritário desta Câmara neste sentido, com
a ressalva do meu. Cláusula que estabelece multa para a hipótese de
não desocupação do imóvel ao final do prazo contratual. Nulidade.
Ausência de comprovação de uso irregular do imóvel locado. Multa
contratual indevida. Apelo da locatária parcialmente provido,
desprovido o do locador.
(TJSP; Apelação Cível 1026082-57.2014.8.26.0100; Relator
(a): Morais Pucci; Órgão Julgador: 35ª Câmara de Direito Privado;
Foro Central Cível - 39ª Vara Cível; Data do Julgamento: 20/08/2018;
Data de Registro: 28/08/2018)

Ante o exposto, é o caso de dar parcial provimento ao


recurso para afastar a condenação da ré no pagamento da multa
contratual.
Diante do novo desfecho, considerando que a autora foi
vencedora no pedido de rescisão contratual e de despejo e ficou vencida
no pedido relativo à multa contratual, reputo que as partes sucumbiram
em proporções assemelhadas. Assim, cada parte deverá pagar à outra a
metade dos valores gastos com custas e despesas processuais, bem
como, metade da verba honorária fixada na r. Sentença em 10% do valor
da causa (R$ 27.100,00 f. 13), devidamente corrigida desde a data do
ajuizamento da ação e acrescida de juros de mora de 1% ao mês a partir
do trânsito em julgado.

Morais Pucci
Relator
Assinatura eletrônica

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