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NOÇÕES GERAIS

CONCEITO TRADICIONAL DE OBRIGAÇÃO: é a relação jurídica pessoal e transitória 1 que


confere ao credor o direito de exigir do devedor o cumprimento de determinada prestação.
Obs.: nos contratos por prazo indeterminado, os contratantes não assumem obrigação perpétua, pois a
qualquer momento uma das partes pode resilir o contrato (resilição: extinção do contrato por vontade
unilateral – ex.: direito do trabalho, contrato de prestação de serviço2).
Crítica: é um conceito que foca no núcleo da relação jurídica obrigacional, ou seja, o dever jurídico do
devedor de realizar em favor do credor uma prestação de caráter econômico de dar, fazer ou não fazer.
Ele não aborda os deveres anexos das obrigações decorrentes da boa-fé objetiva, que são destinados a
ambas as partes e não precisam de previsão expressa no contrato.

CONCEITO ATUAL: a obrigação é um processo, ou seja, é uma série de atos exigíveis do credor e do
devedor para que as suas pretensões sejam satisfeitas. O Prof. desenhou a relação jurídica como se fosse
um “sistema com satélites, átomos”, movimentando-se o tempo todo:

Posteriormente, os alemães criaram a ideia de “violação negativa” e “positiva” do contrato:


 Violação negativa: consiste no inadimplemento obrigacional, isto é, no descumprimento dos deveres
nucleares (CC, art. 389 e ss.).
 Violação positiva: consiste na hipótese em que há o cumprimento dos deveres nucleares e o
descumprimento dos deveres anexos, extraíveis do art. 422 (interpretação da boa-fé objetiva). Ex.: celebra
contrato de compra e venda de um carro com 10.000 km e se compromete a entregar o carro após visitar a
sua família, sem informar que é de Manaus. Ele vai para lá e, quando volta, entrega o carro de maneira
adequada quanto aos demais requisitos, mas com 20.000 km. Ou seja, ele cumpriu os deveres nucleares,
mas não os deveres anexos.
A interpretação da boa-fé objetiva permite ao juiz chegar à melhor solução do caso concreto, permitindo
que ele decida acerca de reparação de danos, resilição de contrato, revisão, etc. A boa-fé objetiva, assim, é
uma cláusula geral (há quem diga conceito legal indeterminado).

Cláusula geral x conceito legal indeterminado: ambos os institutos preconizam uma redação aberta,
influenciadas pelas ideias do pós-positivismo (não precisa alterar o texto da lei, bastando a alteração da
interpretação). Ex.: STF reconheceu a união homoafetiva, sem a necessidade de alterar a redação da CF.
Miguel Reale foi influenciado pelo pós-positivismo para o Projeto do CC, a partir de 3 princípios: (i)
princípio da socialidade; (ii) princípio da eticidade; e (iii) princípio da operabilidade, este último com 2
vertentes: simplicidade e efetividade. Enquanto a simplicidade busca a redação mais simples, a
efetividade significa porosidade, deixa-se espaços abertos para preenchimento do juiz no caso concreto.

1
Não há perpetuidade no D. das Obrigações (“as obrigações são como as pessoas: nascem, vivem e morrem”), sob pena de se
configurar uma situação de escravidão convencional. O D. das Coisas tende à perpetuidade (ex.: propriedade, pois, mesmo
quando o titular morre, passa-se para seus herdeiros e legatários e, se não houver, para o Estado na sucessão irregular: herança
jacente e depois herança vacante).
2
O prazo máximo de contrato de prestação de serviço por prazo determinado é de 4 anos, podendo ser prorrogável. Passado o
prazo, o contrato passa a ser indeterminado, mas com a sua eficácia limitada.
Segundo Miguel Reale, a atual codificação está baseada em três princípios fundamentais:
a) Socialidade: O CC distancia-se do caráter individualista do CC/16. O “nós” prevalece sobre o “eu”.
Todos os institutos civis têm função social (ex.: contrato e propriedade).
b) Eticidade: O CC preocupou-se precipuamente com a ética e a boa-fé, sobretudo com a boa-fé
objetiva, a que existe no plano da conduta de lealdade dos participantes negociais.
c) Operabilidade: O princípio tem 2 sentidos - 1) o de simplicidade dos institutos jurídicos, como
ocorreu com a prescrição e decadência; 2) o de efetividade, por meio do sistema de cláusulas gerais e
conceitos indeterminados adotado pela atual codificação.

Cláusula geral: é um dispositivo legal que não define o conceito/conteúdo de um instituto e nem prevê as
consequências de sua violação. Ex.: arts. 421 (função social do contrato) e 422 (boa-fé objetiva)3.

Conceito legal/jurídico indeterminado: é o dispositivo legal que não define o conteúdo/conceito do


instituto, mas define as consequências de sua violação. Ex.: art. 927, p. u. (atividade de risco). Assim,
cabe ao juiz reconhecer se se trata de atividade de risco e, reconhecendo, o legislador já impôs a
consequência jurídica. Ex. 2: os arts. 156 e 157 trazem o conceito de onerosidade excessiva. Ninguém
sabe do que se trata, cabendo ao juiz determinar no caso concreto, mas a partir do momento que
determinar, já há consequência prevista.

ESTRUTURA/ELEMENTOS DA OBRIGAÇÃO CIVIL:

 Elemento subjetivos: são as partes. O sujeito ativo é o credor, e o passivo é o devedor.

a) Quem pode ser credor/devedor?


- Quanto às pessoas naturais, não importa se são capazes, maiores ou menores de idade, nascidas ou
concebidas (até mesmo os nascituros podem ser credores e devedores).
- Quanto às PJs, podem ser nacionais ou estrangeiras, de D. Público ou Privado, regularmente constituídas
ou não (ente despersonalizado, como a massa falida e o condomínio edilício4).

b) É válida uma obrigação em que há indeterminabilidade subjetiva? Sim, desde que seja temporária e
cesse até o momento de cumprimento da obrigação. Ex.: promessa de recompensa; arrematante do imóvel
em alienação judicial (leilão).

 Elemento objetivo: o objeto da obrigação é a prestação, que pode ser de dar, fazer ou não fazer.

Obs.: Conteúdo patrimonial: para o D. Tradicional, o objeto tem cunho econômico. Para o D. Atual, não
precisa ter esse conteúdo patrimonial, basta que o interesse seja digno de tutela. Ex. 1: devolver uma carta
de amor recebida por engano. Ex. 2: citação bibliográfica.

 Elemento imaterial, virtual ou espiritual: é o vínculo jurídico, o liame entre credor e devedor.

a) Teoria monista: defende a existência de um só vínculo entre credor e devedor (o débito, que é o dever
jurídico de cumprir espontaneamente uma prestação). Se não cumprir, sai-se do âmbito da obrigação para
o da responsabilidade civil. O que caracteriza a T. Monista é que ela trata a responsabilidade civil do lado
de fora (Carnelutti dizia que uma era a sombra da outra).

b) Teoria dualista (A. Brinz): o vínculo jurídico é composto por 2 elementos:


 Débito (Schuld): é o dever jurídico de cumprir espontaneamente uma prestação.
Responsabilidade (Haftung): é a consequência jurídica e patrimonial do descumprimento do débito. Nasce a
pretensão ao credor de ir a juízo poder exigir coercitivamente o cumprimento da prestação (dever jurídico
primário ou obrigacional) e/ou reparação por perdas e danos (dever jurídico sucessivo ou secundário). O

3
V. https://www.migalhas.com.br/arquivo_artigo/art_03_01_05.htm.
4
Apesar de ter CNPJ, ainda é considerado despersonalizado por falta de previsão legal, o que é criticável à luz do pós-
positivismo.
credor tem um prazo (prescricional) para exercer a pretensão (CC, art. 189). Se não houver mais nenhum
tipo de pretensão5, a prescrição fulmina a responsabilidade civil.

Obs.: como ainda permanece o débito, fala-se em obrigação natural (é um débito sem responsabilidade
civil – ex.: dívida prescrita). Ex.: sujeito vai ao restaurante e não paga a conta. O restaurante tem até 1 ano
para cobrar o débito (art. 206, § 1º, I). Se passar 1 ano, a dívida prescrever e o devedor pagar de forma
espontânea, por que não cabe ao devedor pedir de volta? Porque com o pagamento não há mais o débito
(soluti retentio) e não é mais possível ajuizar ação de repetição de indébito.

Atenção: o dano não é um requisito para se propor uma ação alegando enriquecimento sem causa, de
modo que uma ação neste caso seria responsabilidade civil extracontratual (aquiliana).

Obs. 2: na fiança, o fiador pode ter responsabilidade civil sem ter o débito. Nela, a regra é a
subsidiariedade6. Ex.: fiador que tem responsabilidade civil se o locatário não pagar o aluguel.

Obs. 3: pela literalidade do art. 391, todos os bens do devedor respondem pela dívida, mas na realidade
preserva-se um patrimônio mínimo, em atenção ao princípio constitucional da dignidade da pessoa
humana (ex. impenhorabilidade do salário e do bem de família).

CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES

 Quanto à sua natureza:


a) Civil: é a que pode ser cobrada judicialmente, pois gera débito + responsabilidade civil.
b) Natural: não pode ser cobrada judicialmente, pois gera débito, mas não responsabilidade civil. Ex.:
dívida prescrita, dívida de jogo (para MHD, é sempre uma obrigação natural; para o STJ, se o jogo é
lícito7 - ex.: jockey club - a obrigação é civil, mas se é ilícito, é natural).
c) Moral/Religiosa: fruto da consciência. Não gera débito, nem responsabilidade civil. Ex.: ser educado,
não trair namorada (não se pode falar cônjuge, por conta dos deveres matrimoniais). Ex. 2: dou dinheiro a
um mendigo. Posso cobrar posteriormente? Não, pois houve doação, que é uma obrigação civil.

 Quanto à prestação: dar, fazer e não fazer.

OBRIGAÇÃO DE DAR

A obrigação de dar é aquela em que o devedor se compromete a entregar ao credor uma coisa
determinada ou determinável. No Brasil, a obrigação de dar não transfere a propriedade (mais do que
isso: nenhum contrato transfere propriedade). O devedor apenas se compromete a transferir, pois se segue
a doutrina do título e modo. O contrato é apenas título (D. das Obrigações), dependendo do modo (D. das
Coisas - registro: imóvel; tradição: móvel) para ocorrer a transferência. Ex.: art. 481 (“se obriga a
transferir”).

OBRIGAÇÃO DE DAR COISA CERTA: é aquela em que o objeto está completamente


individualizado. Não é necessária escolha futura; o objeto já está escolhido. São suas regras:

 Princípio da gravitação jurídica (ou acessoriedade): é a regra pela qual, na obrigação de dar coisa certa,
o acessório segue a sorte do bem principal. Exceção: as pertenças (ou seja, os pertences): são os bens que,
não constituindo parte integrante do principal, destinam-se ao seu uso ou aformoseamento. Ex.: os móveis
existentes no imóvel. Em regra, não seguem a sorte do principal. Excepcionalmente, podem seguir a sorte
do principal: quando existir cláusula em sentido contrato (ex.: venda a porteira fechada) ou quando a
natureza do NJ indicar que estão incluídas (ex.: “vende-se cinema” – não é só o imóvel, mas todos os
bens que nele se encontram, como a tela, cadeiras, etc.; “vende-se escola”).
5
Lembrando que muitos títulos de crédito, caso ultrapassado o prazo de execução, podem ser objeto de monitória. Ex.: cheque
(6 meses + 30 dias da apresentação – pretensão executória); mas, há 5 anos de pretensão monitória.
6
A exceção é a solidariedade. Vale sempre comparar a fiança com o aval, que impõe responsabilidade solidária.
7
Caso de Vanderlei Luxemburgo: no local onde jogou (Las Vegas), o jogo era lícito.
 Coisa devida: o credor não pode ser forçado a receber coisa diversa daquela que é devida, ainda que
ela seja mais valiosa (art. 313).

Obs.: se o credor aceitar a substituição do objeto no momento do pagamento, ocorrerá uma dação em
pagamento. Ex.: deve-se um fusca e entrega-se uma Ferrari. Como essa dação em pagamento envolve, de
certo modo, uma surpresa ao credor, se houver a evicção da coisa dada, o credor pode cobrar a prestação
originária, pois o que se troca não é o objeto da obrigação (a prestação), mas o objeto do pagamento.

* Evicção: é uma perda, que pode ser parcial ou total, de um bem por motivo de decisão judicial ou ato
administrativo (art. 447) que se relacione a causa preexistente ao contrato. Uma forma de se lembrar a
origem latina da palavra: evincere = ex vincere, vencer pondo fora, tirando, afastando = perda.

Obs. 2: A dação em pagamento não se confunde com a novação da obrigação real: nesta, a substituição do
objeto ocorre em momento anterior ao pagamento. Ex.: deve-se um fusca e oferece-se antes uma Ferrari,
novando o contrato.

 Cômodos obrigacionais: é todo melhoramento ou acréscimo, qualitativo ou quantitativo, da coisa


verificado entre o momento da celebração do contrato e o momento da entrega da coisa. Ex.: se a vaca
fica prenhe entre o momento da celebração e o momento da entrega da coisa. Por um lado, o vendedor
poderá exigir a complementação do preço. Por outro, o comprador não pode ser forçado a pagar mais do
que se comprometeu. Se as partes não chegarem a um acordo, a solução será a resolução involuntária do
contrato (= não culposa), de modo que as partes retornam ao status quo ante. Como não há culpa e como
a regra do CC é a responsabilidade civil subjetiva, não há perdas e danos.

 Res perit domino: a coisa perece para o dono. Ou seja, quem sofre a perda é o dono.

 Consequências do inadimplemento por perda da coisa antes da tradição : o inadimplemento pode se dar
pela destruição total da coisa ou pelo seu desaparecimento. Para se aferir as consequências jurídicas do
inadimplemento, é necessário observar a conduta do devedor para verificar se ele agiu com ou sem culpa.

Obs.: é muito importante nesta matéria o entendimento sobre o princípio da equivalência das prestações:
ligado ao princípio da igualdade, que procura, dentre outras coisas, evitar a desproporcionalidade em
prejuízo de um dos contratantes. Em suma, a equivalência material busca harmonizar os interesses das
partes envolvidas, e realizar o equilíbrio real das prestações em todo o processo obrigacional.

Ex.: contrato de compra e venda de um automóvel de valor de mercado de R$ 50k. O vendedor, para
vender rapidamente, dá um desconto de R$ 4k.

a) Perda fortuita (ex.: o automóvel foi roubado): como não houve culpa do devedor, a obrigação será
considerada extinta para ambas as partes (aplicação da regra res perit domino). Não há que se falar em
responsabilidade civil e, portanto, em indenização. Caso já tenha sido pago o preço da coisa, contudo,
deve-se restituir os valores.

b) Perda culposa (ex.: perda total no carro por dirigir embriagado e vender o carro para terceiro): como há
culpa, há responsabilidade civil, devendo pagar o equivalente, mais perdas e danos.

* Atenção: “equivalente” advém do fato de a coisa ter equivalência em dinheiro. Não necessariamente se
confunde com o valor que foi atribuído no contrato, p. ex., se foi conferido algum tipo de desconto. O
equivalente é o valor atual e real da coisa. O pagamento do equivalente serve para evitar que o credor
lucre com o inadimplemento do contrato e compensar a outra parte pelo benefício econômico que teria.
Assim, no ex., além de devolver o preço recebido deverá indenizar o comprador por lucros cessantes
(portanto, R$ 50k) e outros prejuízos suportados. Se nada houvesse sido pago ainda e o vendedor tivesse
vendido para terceiro, o credor poderia pedir R$ 4k de indenização, que é quanto ele teria de benefício.
 Consequências do inadimplemento pela deterioração da coisa : deterioração significa uma destruição
parcial da coisa. Também deve-se analisar se o devedor agiu com ou sem culpa.

c) Deterioração fortuita (sem culpa – ex.: terceiro bateu no automóvel): como foi sem culpa, não há que
se falar em responsabilidade civil e, portanto, em perdas e danos. O credor pode escolher entre ficar com
a coisa com abatimento proporcional no preço e resolução contratual.

Obs.: o abatimento proporcional funda-se ao princípio da equivalência das prestações.

d) Deterioração culposa (com culpa – ex.: vendedor bateu o carro): como foi culposo, há responsabilidade
civil. O credor poderá escolher entre ficar com a coisa com abatimento mais perdas e danos e o
recebimento do equivalente em dinheiro mais perdas e danos.

OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR: é uma espécie de obrigação de dar coisa certa (arts. 238 a 242). A
diferença é estrutural, isto é, na obrigação de dar coisa certa, o dono da coisa e quem tem o dever de dar é
o devedor (ex.: compra e venda); na obrigação de restituir, o dono da coisa é o credor (ex.: comodato e
locação) e quem tem o dever de restituir é o devedor.

 Perda fortuita (sem culpa): o devedor não responderá pela perda da coisa; o prejuízo será do dono (a
coisa perece para o dono). Há quem diga que se trata de uma regra injusta, pois o devedor, além de
emprestar, ainda pode ter prejuízo. Contudo, se o contrato é oneroso (ex.: locação), o credor poderá
cobrar os valores devidos até o momento da perda.

 Perda culposa: responderá pelo equivalente (deve-se buscar o valor do bem no momento da perda),
mais perdas e danos.

 Responsabilidade pela deterioração da coisa: na destruição parcial da coisa, pode-se ter a deterioração
sem culpa, caso em que o credor receberá a coisa no estado em que se encontra sem poder reclamar
perdas e danos. Por outro lado, se a deterioração for com culpa, o credor poderá escolher o equivalente ou
receber a coisa e, em ambas as hipóteses, com perdas e danos (Enunciado 15 do CJF).

 Cômodos obrigacionais: acréscimo qualitativo ou quantitativo antes da entrega da coisa. Ex.: peguei o
trator emprestado e a suspensão do trator quebrou na minha mão. Ocorrendo o acréscimo sem despesa ou
trabalho do devedor da coisa, lucrará o credor sem que tenha que pagar indenização ao devedor. Ex.: a
égua emprestada ficou prenha no pasto. Entretanto, se o acréscimo foi fruto do trabalho do devedor ou à
sua custa, deverão ser observadas as regras presentes no CC relativas à indenização de benfeitorias. Ex.: o
devedor pagou o conserto do trator emprestado – aquele que agiu de má-fé só tem direito à indenização
pela benfeitoria necessária; aquele que agiu de boa-fé tem direito à indenização pelas benfeitorias
necessárias e úteis (mais retenção) e direito de levantar as benfeitorias voluptuárias.

OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA: é a aquela em que o objeto é determinável.

 Determinável: há 2 correntes doutrinárias que definem


a) 1ª corrente: é a obrigação na qual ausente qualidade do objeto, sendo o mínimo a indicação de gênero e
da quantidade;
b) 2ª corrente: é a obrigação que depende de uma escolha futura, isto é, da prática de um ato de
concentração, que pode dizer respeito à qualidade, mas pode ser de outros atributos, salvo indicação de
gênero e quantidade. Nesse sentido, a obrigação de dar coisa incerta não seria caracterizada pela ausência
da qualidade, mas pela necessidade de um ato de escolha. Para o Prof., é a corrente mais correta, pois a
diferença entre a obrigação de dar coisa certa e incerta é a dependência da prática de um ato de escolha.
Obs.: na obrigação de dar coisa incerta, não pode faltar o gênero e quantidade; se faltar, o objeto é
indeterminado ou indeterminável e a obrigação é nula (caso contrário, seria uma condição puramente
potestativa, que se revela arbitrária). Ex.: partes pactuam obrigação de dar arroz na quantidade que se
quiser. Ex. 2: dar 10 kg do que se quiser.
 Quem escolhe: deve-se ver o conteúdo contratual; na omissão do contrato, a concentração competirá
ao devedor. Regra geral do CC: quando a lei conferir escolha, em regra será do devedor. A escolha não é
livre, mas segue o princípio do meio-termo, também denominado princípio da qualidade média, segundo
o qual “o devedor está proibido de entregar o objeto da pior qualidade, mas não está obrigado a entregar o
da melhor”. Se a escolha couber ao credor, para fins de concurso, recomenda-se defender a aplicação da
mesma regra, por conta do princípio da igualdade (no fundo, é aplicação por analogia).

 Responsabilidade pela perda da coisa: para que se possa determinar a responsabilidade civil, deve-se
fazer uma distinção, que não se encontra expressa no CC, entre coisas incertas com gênero limitado e com
gênero ilimitado.
a) Coisas incertas com gênero limitado: a escolha é limitada a um grupo certo de coisas (ex.: a obrigação
de dar uma garrafa de vinho proveniente de uma adega particular).
b) Coisas incertas com gênero ilimitado: a escolha é ampla (ex.: a obrigação de dar uma garrafa de
vinho).

Obs.: Quando se tratar de coisa incerta com gênero ilimitado, havendo a perda da coisa, deve ser aplicado
o princípio genus nunquam perit (= gênero nunca perece), de modo que o devedor não poderá alegar a
perda ou a deterioração da coisa para deixar de cumprir a obrigação. Em outras palavras, isso significa
dizer que o devedor não poderá alegar até mesmo caso fortuito ou força maior para deixar de cumpri-la.
Por outro lado, na obrigação de dar coisa incerta que tiver por objeto coisa incerta com gênero limitado, se
houver a perda ou a deterioração de todo o gênero, a obrigação:
(i) será extinta sem responsabilidade do devedor, se a perda ou deterioração de todo o gênero ocorrer sem a
sua culpa, ou
(ii) com responsabilidade, se por culpa do devedor (os portugueses chamam de “obrigação quase-
genérica”): equivalente + perdas e danos.

OBRIGAÇÃO DE FAZER

É a obrigação em que o devedor assume o compromisso de desempenhar determinada atividade física ou


intelectual a favor do credor ou de outrem. É toda ação, que não seja a entrega de uma coisa. É possível
estar-se diante de uma situação que cumule obrigações de fazer e de dar – ex.: obrigação de pintar um
quadro e entregá-lo ao comprador.

OBRIGAÇÃO DE FAZER FUNGÍVEL (IMPESSOAL): fungível é algo substituível. É a obrigação


que pode ser cumprida por qualquer pessoa no lugar do devedor. A figura do devedor não é importante,
ou seja, interessa o fazer e não quem a faz. Ex.: lavagem do carro, pintura da parede da casa, etc.
Ex. 2: outorga da escritura definitiva de compra e venda. O compromisso/promessa de compra e venda é
um contrato preliminar, que contém uma obrigação de fazer fungível. O comprador pode ajuizar ação de
adjudicação compulsória, através da qual o juiz fixa prazo para o vendedor celebrar a escritura definitiva.
Caso este descumpra, o juiz profere a sentença, substituindo a vontade do vendedor, pois a obrigação é
fungível. O registro do compromisso de compra e venda faz a seguinte diferença: o direito passa a ser
real, e não mais apenas direito pessoal.

Atenção: os contratos de empreitada e de prestação de serviço não se confundem e se diferem pela


espécie de obrigação assumida e pela forma de pagamento.
a) Contrato de empreitada: o devedor assume obrigação pelo resultado em troca de pagamento pela
finalização do objeto da prestação (ex.: construção de uma casa em troca do pagamento no início e no
fim). Em regra, os contratos de empreitada contêm obrigação de fazer fungível. A subempreitada é, em
regra, autorizada nestes contratos. Pode-se inverter, excepcionalmente, por cláusula em sentido contrário.
b) Prestação de serviço: o devedor assume obrigação de meio e remuneração por dia de trabalho (ex.:
obrigar-se a trabalhar todo dia para a construção da casa). Em regra, a prestação de serviço envolve uma
obrigação de fazer infungível (salvo disposição em contrário no contrato).

OBRIGAÇÃO DE FAZER INFUNGÍVEL (PESSOAL OU INTUITU PERSONAE): é aquela


contratada em atenção a determinadas características/qualidades do devedor. Ex.: obrigação de certo
arquiteto em realizar o projeto; show da Ivete Sangalo. O credor não pode ser forçado a aceitar o
cumprimento da prestação por terceiros (ex.: a Ivete não aparece para o show e sim a Claudia Leite). Se o
credor aceitar, depois não poderá cobrar indenização ou abatimento proporcional, pois a aceitação mudou
a natureza da obrigação (de infungível passou a ser fungível). Contudo, se a aceitação da substituição pelo
credor se der por um motivo de urgência ou emergência, depois ele poderá cobrar indenização.

INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER


 Sem culpa do devedor: a obrigação se extingue, sem perdas e danos. O devedor deve restituir ao credor
as quantias já recebidas, pois as partes retornam ao status quo.
 Com culpa do devedor: o devedor responde por perdas e danos (tutela genérica), mas o Direito cria
mecanismos para a obtenção da própria prestação descumprida.
o Art. 249: sendo obrigação fungível, o credor pode pedir que outra pessoa realize a prestação às custas
do devedor. Excepcionalmente, no caso em que o fazer for urgente, o credor pode realizar a prestação,
e depois cobrar judicialmente o devedor. É hipótese excepcional de autotutela (art. 249, p. u.).
o Sendo a obrigação fungível ou infungível, permite-se a cobrança de multa cominatória ou astreinte. Isso
porque o devedor não pode ser compelido fisicamente a prestar um fato. A astreinte pode decorrer de
contrato ou decisão judicial, mas de um modo ou de outro, o juiz poderá aumentá-la ou reduzi-la para
garantir a sua efetividade. O valor da astreinte pertencerá ao credor da obrigação de fazer. É possível
que o contrato cumule cláusula penal e astreinte, porque a 1ª tem natureza indenizatória, e a 2ª
coercitiva.

OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER

É a única obrigação negativa, ou seja, obrigação na qual o devedor se compromete a não desempenhar
determinada atividade. Pode ter origem em um contrato (ex.: cláusula de exclusividade – ex.:
exclusividade de certo ator com a emissora) ou na lei (ex.: a obrigação geral de não causar dano a outrem
– neminem laedere; cláusula de não-concorrência no contrato de trespasse).

ESPÉCIES:
a) transeunte: é aquela irreversível, pois não deixa um resultado concreto que possa ser desfeito em caso
de descumprimento da obrigação (ex.: Prof. tem exclusividade com o Damásio e dá aula em outro
cursinho, sendo impossível desfazer essa violação).
b) permanente: é aquela reversível, pois o descumprimento deixa um resultado concreto, que pode ser
desfeito (ex.: não construir muro acima de determinada altura).

EFEITOS DO INADIMPLEMENTO:
a) sem culpa do devedor: não responde por perdas e danos e, em alguns casos, a obrigação se extingue.
Ex.: por contrato, o vizinho se obriga a não construir muro divisório, mas em razão de mudança de lei, o
Município o obriga a construir.
b) com culpa do devedor: responde por perdas e danos e o credor pode pedir judicialmente o
desfazimento ou cessação daquilo que está sendo feito, inclusive com a imposição de astreintes. Havendo
urgência, o credor pode desfazer sem prévio processo judicial (art. 251 p. u.).

Obs.: na responsabilidade civil contratual, a culpa é presumida, cabendo ao réu comprovar que cumpriu a
obrigação ou que, no inadimplemento, agiu sem culpa. Ou seja, há inversão do ônus da prova.

Obs. 2: ato emulativo (= abuso de direito em relação ao vizinho). Ex.: construir um muro para prejudicar
a luz solar de vizinho com piscina. Foi a origem do instituto do abuso de direito.

CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES


SEGUNDO SEUS ELEMENTOS

OBRIGAÇÃO SIMPLES/MÍNIMA: é a que apresenta todos os seus elementos no singular (1 credor, 1


devedor e 1 prestação). Ex.: na compra e venda, há duas obrigações (pagar o preço e entregar a coisa),
mas apenas uma prestação para cada uma dessas obrigações. Todo contrato bilateral/sinalagmático gera
obrigações para ambos os contratantes, de modo que sempre há pluralidade de obrigações.

Obs.: a obrigação complexa não se confunde com a relação jurídica obrigacional complexa (= pluralidade
de obrigações, ainda que cada uma seja simples).

OBRIGAÇÃO COMPOSTA/COMPLEXA: é a obrigação em que pelo menos um de seus elementos se


encontra no plural (+ de 1 credor/devedor ou + de 1 prestação). Se for + de 1 prestação, fala-se em
obrigação composta/complexa objetiva; se for + 1 de um credor/devedor, em obrigação
composta/complexa subjetiva.

OBRIGAÇÕES OBJETIVAS

OBRIGAÇÃO CUMULATIVA/CONJUNTIVA (“E”): é a obrigação em que ambas as prestações são


devidas e ambas devem ser cumpridas. Ex.: A deve a B o carro e a moto. Caso o devedor não cumpra
todas as prestações, estará inadimplente. Se o devedor quiser entregar apenas o carro, o credor não pode
ser forçado a receber uma ou apenas alguma(s) das prestações (nestas obrigações, o inadimplemento
parcial pode ser interpretado como inadimplemento total). Contudo, se o credor aceitar, poderá protestar
pela cobrança da outra prestação. É encontrada na doutrina (e apenas indiretamente na Lei).

OBRIGAÇÃO DISJUNTIVA/ALTERNATIVA (“OU”): é a obrigação prevista nos arts. 252 a 256,


em que ambas as prestações são devidas, mas o devedor se exonera cumprindo apenas uma delas. Está.
Ex.: A deve a B o boi ou o cavalo. Obs.: pagamento em cheque ou $, à vista ou a prazo, não significa
obrigação alternativa, pois a prestação é única (= dar dinheiro).

 Escolha da prestação (concentração): em regra, o ato de escolha cabe ao devedor, mas as partes podem
convencionar diferente no contrato e transferi-la ao credor. Obs.: a concentração pode ser in solutione
(escolha do devedor) ou in petitione (escolha do credor). Se um deles falecer, o direito de escolha
transfere-se aos seus herdeiros.

 Inaplicabilidade do princípio do meio-termo ou da qualidade média : tal princípio não se aplica à


concentração específica das obrigações alternativas (ou seja, o devedor pode escolher o de pior
qualidade). Há uma diferença se a coisa for certa (Fusca com a placa X, Fusion com a placa Y ou Ferrari
com a placa Z) ou incerta (um Fusca ou um Fusion ou uma Ferrari):
a) Coisa certa: o devedor pode escolher qualquer uma das coisas.
b) Coisa incerta: a 1ª escolha é livre do devedor, mas na 2ª escolha aplica-se o princípio do meio termo
(está-se proibido de entregar o Fusca, p. ex., que é da pior qualidade).
 Fracionamento do cumprimento: no art. 252 § 1º, proíbe como regra que o credor seja forçado a
receber parte em uma prestação e parte em outra, pois estar-se-ia criando prestação estranha ao vínculo,
em afronta ao art. 313 (aliud por alio invito creditori solve no potest). Ex.: 10 kg de arroz ou feijão; o
credor não pode ser obrigado a receber 5 kg de arroz e 5 kg de feijão.
Exceção: quando a obrigação estabelecer prestações periódicas (art. 252, § 2º). Neste caso, admite-se que
a escolha seja realizada a cada período – ex.: no 1º mês, o devedor escolhe arroz; no 2º mês, feijão, e
assim sucessivamente. Isso se chama balanceamento das obrigações.

 Pluralidade de optantes (art. 252, § 3º): se houver pluralidade de optantes (mais de um credor ou
devedor), a decisão quanto à prestação deve ocorrer por unanimidade. O juiz fixa um prazo para que
ocorra o consenso, e se isso não ocorrer, ele indica a prestação a ser cumprida. Isso porque o direito de
escolha representa também um dever, que permite que a obrigação chegue ao fim (adimplemento).

 Inadimplemento: devem ser observados 2 critérios: (i) se a escolha competia ao devedor (in solutione)
ou ao credor (in petitione); e (ii) se a perda é de uma (impossibilidade ou inexquibilidade parcial) ou de
ambas as prestações (impossibilidade ou inexequibilidade total).

Impossibilidade parcial Impossibilidade total


Sem culpa Obrigação complexa vira simples (“tese A obrigação se extingue, se resolve sem
da redução do objeto”). O devedor deve perdas e danos.
entregar a coisa subsistente.
Com culpa8 Credor pode escolher entre exigir a O credor escolhe o equivalente de qualquer
In petitione coisa subsistente ou o equivalente da uma das prestações mais perdas e danos.
perdida, sempre com direito a perdas e
danos.
Com culpa O devedor deve entregar a prestação O credor pode exigir o equivalente da
In solutione subsistente (tese da redução do objeto)9 prestação que se impossibilitou por último
mais perdas e danos10.

OBRIGAÇÃO FACULTATIVA/DE FACULDADE ALTERNATIVA: as premissas são estabelecidas


pela doutrina. É aquela em que apenas uma das prestações é devida e pode ser cobrada pelo credor. A
outra prestação é facultativa (pelo devedor) e nunca pode ser cobrada pelo credor. A construção
contratual é feita, p. ex., pela expressão “A reserva-se o direito de”. Giselda Hironaka e Flávio Tartuce
dizem que a obrigação facultativa não é espécie de obrigação complexa, mas sim de obrigação simples.

1 prestação devida  Dever jurídico (Débito + Responsabilidade civil)


1 prestação facultativa  Faculdade/Direito

 Inadimplemento: se a prestação que é devida se perder, o credor não pode pedir a facultativa, que é
direito à qual se reservou o devedor. Deve-se, então, analisar a presença ou não de culpa:
a) sem culpa do devedor: resolve-se a obrigação, sem perdas e danos;
b) com culpa do devedor: o devedor deve pagar o equivalente, mais perdas e danos.

Em suma, na obrigação facultativa, o perecimento/perda da prestação facultativa é irrelevante para o


credor, pois tem o direito de cobrar a prestação devida. Por outro lado, se ocorrer a perda da devida, não
poderá cobrar a facultativa, pois a sua entrega é uma faculdade do devedor. Se a perda da prestação
devida for fortuita, a obrigação será extinta; se a perda da prestação for culposa, poderá cobrar o
equivalente, mais as perdas e danos (desde que o devedor não tenha cumprido espontaneamente a
facultativa).

OBRIGAÇÃO COMPOSTA SUBJETIVA


8
ex.: o devedor vende para 3º o melhor bem
9
Observe-se que quando a escolha é do devedor e há perda parcial, o devedor cumpre a prestação que restou. O motivo da
perda é irrelevante, pois era dele o direito de escolha. Há uma concentração involuntária.
10
Explica-se: quando perece a 1ª prestação, o devedor exerce seu direito de escolha (ato lícito) e não pode ser punido por isso.
Já quando ocorre a perda da 2ª prestação, pratica ato ilícito e, portanto, responde por seu valor mais perdas e danos.
É a obrigação na qual há pluralidade de sujeitos (no polo ativo: credores; no passivo: devedores).

OBRIGAÇÃO NÃO-SOLIDÁRIA: é a regra do DCV, pois o art. 265 dispõe que a solidariedade nunca
se presume. Quando a obrigação for não-solidária, deve ser observado se a prestação é divisível ou não.

Obs.: a classificação das obrigações/prestações em divisíveis e indivisíveis é autônoma e essencial para as


obrigações não-solidárias. Porém, também possui importância, excepcionalmente, para as obrigações
solidárias.

 Prestação divisível: é aquela que não pode ser fracionada sem a perda de sua substância (art. 257).
Nela, cada credor/devedor poderá cobrar/ser cobrado a sua quota-parte (concursu partes fiunt: a prestação
deve ser dividida pelo nº de credores/devedores). Obs.: presume-se que a prestação será dividida em
partes iguais, mas se trata de presunção relativa, que pode ser afastada por lei ou contrato. Ex. divisão de
despesas e frutos do bem em condomínio que se dá de acordo com o quinhão na propriedade.

 Prestação indivisível: é aquela que não pode ser fracionada em razão de sua natureza, por motivos
econômicos ou pelas razões determinantes do negócio. Nela, cada credor/devedor poderá cobrar/ser
cobrado a totalidade da prestação. Ex.: entrega de um touro.

a) Pluralidade de devedores: cada devedor responde pelo objeto como um todo (Haftung), mas só deve
parte dele (Schuld). Assim, o devedor que paga a prestação tem direito de regresso (CC fala em sub-
rogação) contra os co-devedores quanto às suas quotas na dívida. Ex.: A e B respondem pelo touro, mas
só devem meio cada um.

b) Pluralidade de credores: o credor tem direito a parte da dívida, mas pode exigi-la por inteiro em razão
da indivisibilidade. Ao receber o todo, paga (indeniza) proporcionalmente os demais co-credores as suas
cotas em dinheiro. Ex.: o credor recebe o touro e indeniza proporcionalmente os demais co-credores em
dinheiro.

Atenção: No caso de perda da coisa que configure prestação indivisível, se não houver culpa do devedor
(ex.: raio mata o touro), a obrigação é extinta. Porém, havendo culpa (ex.: morreu por falta de comida):
(i) se todos os devedores forem culpados, todos responderão pelo equivalente, mais perdas e danos. Neste
caso, a obrigação, que era indivisível, torna-se divisível, decorrendo as seguintes consequências: em
regra, o credor poderá cobrar de cada devedor a sua quota-parte;
(ii) se a culpa, porém, for de só de um dos devedores, a ele competirá o pagamento da indenização,
ficando exonerados os demais devedores.

OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA: é a exceção, pois solidariedade decorre da lei ou de contrato, ou seja, já


está prevista para determinados contratos (ex.: entre locadores e entre locatários; entre fiadores) ou as
partes convencionam isso por meio de cláusula contratual.

CONCEITOS OPOSTOS
Obrigação solidária Obrigação não-solidária
Responsabilidade solidária Responsabilidade subsidiária

Obs.: a Lei de Locações veda a existência de mais de uma espécie de garantia. A garantia pode ser fiança,
caução e fiança bancária.

Locadores A e B Locatários C e D
(credores solidários) (devedores solidários)
Tem Schuld e Haftung
Fiadores E e F11
(responsáveis12 solidários “entre si”)
11
Os fiadores possuem relação com os locadores, e não com os locatários. Se os fiadores pagarem no lugar dos locatários, eles
se sub-rogam (art. 346), mas não há relação contratual com os locatários.
Só tem Haftung. Entre eles, a responsabilidade é
subsidiária13
RC Primária: locatários.
RC Subsidiária: fiadores

Atenção: o fiador que assumir expressamente responsabilidade solidária estará renunciando tacitamente
ao benefício de ordem. Da mesma forma, o fiador que renuncia expressamente ao benefício de ordem,
estará assumindo tacitamente responsabilidade solidária.

 Obrigação solidária ativa: é aquela em que a solidariedade é entre credores (arts. 267 a 274). A
principal regra é que qualquer um dos credores pode cobrar sozinho a totalidade da prestação, não
importando se é divisível ou indivisível (ex.: A e B podem cobrar sozinhos R$ 200k ou o touro, devendo
indenizar depois o outro credor). Outras regras relevantes:

i. Pagamento: O pagamento parcial feito a qualquer um dos credores solidários provocará a extinção
parcial da dívida. A solidariedade subsiste para o restante da dívida. Se o pagamento da dívida for total, a
obrigação será extinta.

ii. Perda culposa da prestação: converte-se em perdas e danos, mas a solidariedade subsiste (ou seja,
qualquer um pode cobrar a totalidade do dinheiro do devedor).

iii. Perdão da dívida: o credor que tiver remitido (= perdoado) ou recebido o pagamento a totalidade,
responderá aos outros pela parte que lhes cabia.

iv. Morte de um dos credores solidários (art. 270): nesta hipótese, cada um dos herdeiros dele só terá
direito a exigir e a receber a quota do crédito que corresponder ao seu quinhão hereditário, salvo se a
obrigação for indivisível. Ex.: A e B são credores solidários de C por R$ 100.000. Se B morre, deixando 2
herdeiros (B1 e B2). A continuará podendo cobrar a totalidade, mas B1 e B2 só R$ 50.000 cada um. Por
outro lado, se a prestação for indivisível (ex.: 1 touro), A, B1 e B2 podem cobrar o touro, devendo
indenizar os demais.

 Obrigação solidária passiva: a solidariedade é entre devedores (arts. 275 a 285). Principais regras:

i. responsabilidade: qualquer um dos devedores pode ser cobrado sozinho da totalidade da prestação, não
importando, em regra, se a prestação é divisível ou indivisível.

12
Eles não possuem obrigação, mas apenas responsabilidade solidária.
13
A exceção seria uma cláusula em que os fiadores assumem responsabilidade solidária entre fiadores e locatários.
ii. pagamento ou perdão (remissão) parcial: havendo pagamento ou remissão parcial, os demais devedores
somente aproveitarão em parte a quantia paga ou perdoada.
Ex.: A é credor de R$ 300 em face de B, C e D, que são devedores solidários. Se B pagar R$ 100, A só
pode cobrar R$ 200 de qualquer um deles. Se A perdoou R$ 100 ao B, só pode cobrar R$ 200 dos demais.
Ex. 2: se o bem for indivisível, mesmo perdoado de um, continua a obrigação dos demais.

iii. oposição de exceções: o devedor demandado pode opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais
e as comuns a todos, não lhe aproveitando as exceções pessoais a outro codevedor.

Obs.: Apresentar exceção é sempre um argumento de defesa – (a) exceção comum (ex.: a dívida já foi
paga), que pode ser apresentada por qualquer um dos devedores; ou (b) pessoal (ex.: a prescrição a favor
de um dos devedores), que não poderá ser alegada por todos os devedores.

iv. renúncia da solidariedade (art. 282): o credor pode renunciar à solidariedade em favor de um, alguns ou
de todos os devedores. Ex.: A renúncia à solidariedade em favor de B. A só pode cobrar R$ 100 de B (= a
sua quota parte), mas pode cobrar R$ 200 de C e D, tendo em vista que a solidariedade permanece entre
eles.

Atenção: Contudo, no caso de rateio entre os codevedores (art. 284), contribuirão também os exonerados
da solidariedade pelo credor, pela parte que na obrigação incumbia ao insolvente. Ex.: no mesmo
exemplo anterior, C se torna insolvente. Neste caso, entre B (exonerado) e D continuam respondendo pela
quota do insolvente, dividindo entre eles o prejuízo (cada um fica devendo R$ 150.000).

(v) morte de um dos devedores solidários (art. 276): se um dos devedores solidários falecer deixando
herdeiros, nenhum destes será obrigado a pagar senão a quota que responder ao seu quinhão hereditário,
salvo se a obrigação for indivisível; mas todos reunidos serão considerados como um devedor solidário
em relação aos demais devedores.
Ex.: D falece e deixa como herdeiros D1 e D2. A pode cobrar R$ 50 de D1 se ajuizar ação apenas contra
este. Contudo, A pode cobrar R$ 100 de D1 e D2 se ajuizar ação contra ambos (perante o credor não há
solidariedade do conjunto). Se B pagou R$ 300, B tem direito de regresso contra C, D1 e D2, podendo
cobrar R$ 100 de C e R$ 100 de D1 e D2, reunidos. Se C for declarado insolvente, B pode cobrar R$ 100
+ R$ 50 de D1 e D2, reunidos.
Ex. 2: se a obrigação for indivisível, A poderá cobrar o touro de D1, p. ex.

 Obrigação solidária mista: é aquela verificada em ambos os polos da relação obrigacional (é uma
construção doutrinária, sem previsão no CC). Principal regra: qualquer um dos credores solidários pode
cobrar de qualquer um dos devedores solidários a totalidade da prestação, não importando se esta é
divisível ou indivisível. A doutrina diz que se aplicam as regras das obrigações solidárias ativa e passiva.
Ex.: A, B e C são credores de D, E e F (solidários entre si) pela quantia de R$ 300. C ingressa com uma
ação contra F. Quanto ele pode cobrar? R$ 100. Dica: dividir a obrigação em dois lados: credores e
devedores.

PAGAMENTO

CONCEITO: é o cumprimento ou adimplemento de toda e qualquer espécie de obrigação, seja de dar,


fazer ou não fazer (assim, é sinônimo exato de cumprimento ou adimplemento).

REQUISITOS DE VALIDADE DO PAGAMENTO:


1) Existência de uma obrigação válida (dívida), sob pena de caracterizar pagamento indevido. O pagamento
indevido pode ser restituído através da ação de repetição de indébito e pode ser: (a) subjetivamente
indevido: o devedor pagou para a pessoa errada; (b) objetivamente indevido: o devedor nada devia ou pagou
em excesso.
2) Animus solvendi: é a intenção de pagar. Como toda manifestação de vontade, o pagamento deve ser
realizado de forma consciente e livre de vícios.
NATUREZA JURÍDICA DO PAGAMENTO: há divergência. Para alguns, é ato jurídico strictu sensu;
para outros, é NJ14. A posição mais moderada é a que diz ser ato jurídico s.s. ou NJ, de acordo com a
situação concreta. Ex.: pagamento simples é ato jurídico s. s.; pagamento consignado é NJ unilateral;
novação é NJ bilateral. Quem diz que é ato jurídico s. s. alega que não se anula pagamento por vício da
vontade (ex.: se pagou com erro, dolo ou coação, não dá para ajuizar ação anulatória, mas ação de
repetição de indébito). O legislador deu a feição de ato jurídico s. s. para o pagamento simples e de NJ
para os demais.

CUMPRIMENTO DA PRESTAÇÃO:
a) pagamento direto: é o pagamento exato;
b) pagamento indireto: o ato é bilateral e deve haver acordo de vontade (ex.: novação);
c) regras especiais de pagamento: o ato é unilateral e não há acordo de vontade, de modo que o pagador
(solvens) tem suporte na lei (ex.: consignação em pagamento, em que o devedor não concorda com o
valor que o credor está cobrando e decide depositar em juízo).

SUJEITOS: ativo: solvens (pagador) x passivo: accipiens (recebedor).


Atenção: O Credor e o devedor são sujeitos da obrigação, mas não necessariamente serão os sujeitos do
pagamento, pois outra pessoa pode realizar ou receber o pagamento.

 Quem pode ser o sujeito ativo do pagamento


a) Devedor: titular do débito (Schuld) na relação jurídica base (ex.: locatário).
b) Terceiro interessado: é quem tem interesse jurídico e patrimonial no cumprimento da obrigação, pois
tem alguma forma de responsabilidade (Haftung) – ex.: fiador, adquirente de imóvel hipotecado.
c) Terceiro não-interessado: é quem tem interesse moral no cumprimento da obrigação, sem
responsabilidade civil. Ex.: pais em relação aos filhos maiores.

Obs.: 1) na fiança, é possível que o fiador imponha cláusula de limitação do valor da fiança (ex.: fiador se
responsabiliza pelos aluguéis, mas não por eventuais prejuízos que o locatário possa causar ao imóvel).
2) na hipoteca, é possível que o proprietário do imóvel hipotecado aliene o bem (a cláusula que veda é
nula). O problema, na verdade, não é jurídico, mas prático: quem adquire um imóvel hipotecado fica
numa situação de incerteza, pois pode perder o bem, caso o devedor não cumpra a obrigação.
3) quando o terceiro interessado faz o pagamento, ocorre a sub-rogação legal (art. 346), ou seja, ele
assume a posição do credor originário com todos os privilégios, ações, garantias, direitos potestativos, etc.
Como ela está prevista na lei, ela opera de forma automática, de pleno direito, isto é, não é preciso que ele
se manifeste neste sentido (metáfora: “ele veste a roupa do credor”).
4) se o pagamento é feito por terceiro não-interessado, podem ocorrer as seguintes consequências:
a) se o pagamento foi feito em nome do devedor: o terceiro não-interessado nada poderá cobrar, pois não
tem prova de que foi ele quem pagou;
b) se o pagamento foi feito em nome próprio: o terceiro não-interessado terá direito de regresso do devedor;
c) se o pagamento foi feito em nome próprio e com cláusula expressa de sub-rogação: o terceiro não-
interessado se sub-roga de forma convencional no lugar do credor (art. 347).

Atenção: direito de regresso vs. sub-rogação: no direito de regresso, o direito é limitado, compreendendo
apenas o valor pago; na sub-rogação, o terceiro assumirá os direitos do credor originário (privilégios,
ações, garantias, direitos potestativos, etc).

 Quem pode ser o sujeito passivo do pagamento


a) Credor: é o titular do crédito na relação jurídica base (ex.: locador). O credor deve ser capaz e ter
legitimidade. Se ele for incapaz, deve-se reter o pagamento e pagar ao seu representante, pois o incapaz
não pode dar quitação15. Atenção: a quitação pode ser só da parcela paga, protestando o credor pelo
recebimento das anteriores, de modo a evitar que se estabeleça a presunção de que foram pagas as
prestações pretéritas.
14
No ato jurídico s. s. e no NJ, há manifestação de vontade, mas no ato jurídico s. s. os efeitos jurídicos são impostos por lei
(eficácia ex lege) - ex.: reconhecimento de filho -, ao passo que, no NJ, as partes podem autorregrar o conteúdo e os efeitos
jurídicos (eficácia ex voluntate). Assim, apenas no NJ a pessoa exerce autonomia da vontade (= possibilidade de escolher o
conteúdo e os efeitos do NJ), conceito muito mais amplo do que a mera manifestação da vontade.
15
A quitação é o instituto jurídico que extingue a obrigação, enquanto o recibo é só a materialização da quitação.
b) Representante: (i) legal (pais, tutor e curador); (ii) judicial (é o representante para certo procedimento –
ex.: administrador judicial no caso de falência, inventariante, etc.); e (iii) convencional (é aquele nomeado
por procuração/mandato).
c) Credor putativo: é a mesma coisa que credor aparente (é um falso credor, que se apresenta perante o
pagador como o verdadeiro credor).

Obs.: 1) procuração vs. mandato: o CC limita-se a afirmar que a procuração é o instrumento do mandato,
não dispondo diferença relevante. É a doutrina que cuida da diferença. Para alguns autores, os institutos
são diferentes: o procurador age em nome do devedor, ao passo que o mandatário age em prol do
mandante, não necessariamente em seu nome. O mandato seria, assim, mais abrangente, englobando a
procuração.
2) O credor putativo pode estar de boa-fé ou de má-fé. O importante é analisar a conduta de quem pagou:
(i) se pagou de boa-fé, o pagamento será considerado válido, restando ao verdadeiro credor cobrar
daquele que recebeu em seu lugar. Para o devedor, a obrigação será considerada extinta. A boa-fé a que se
refere aqui é a boa-fé subjetiva, que é um estado psicológico de firme crença ou de ignorância.
(ii) se pagou sem boa-fé, o devedor terá que pagar novamente: “quem paga mal, paga duas vezes”. Por
isso, em situação de dúvida, o devedor deve fazer o pagamento por consignação, pois a dúvida sobre o
sujeito passivo é uma das hipóteses de cabimento. A consignação não é um dever, mas uma faculdade,
isto é, nunca se está obrigado a consignar, é um direito que se tem para evitar um risco de, no futuro, ter
que pagar mais.

LUGAR DO PAGAMENTO: pode ser livremente convencionado pelas partes. Na omissão do contrato,
o pagamento deve ser feito no domicílio do devedor. Assim, em regra, a obrigação é a quesível. Se houver
previsão no contrato, as partes podem definir que será paga no domicílio do credor ou em qualquer outro
lugar – em ambos os casos, a obrigação é portável (portar significa que o devedor deve levar ao credor).

Atenção: se o contato prever dois ou mais lugares do pagamento, a escolha cabe ao credor (***exceção
no DCV brasileiro).

Obs.: se o pagamento for efetuado pelo devedor reiteradamente em local diverso daquele estipulado no
contrato e sem oposição do credor, será presumida a renúncia deste quanto ao disposto no contrato.
Ocorre a supressio em relação ao credor (= o credor perde o direito de cobrar no lugar previsto no contrato)
e a surrectio em relação ao devedor (= o devedor adquiriu o direito de fazer o pagamento no lugar diverso).

PAGAMENTO INDIRETO/REGRAS ESPECIAIS DE PAGAMENTO: o CC aparentemente os trata


como sinônimos, mas não são. O pagamento indireto é um NJ bilateral, pois há um acordo de vontades (é
NJ contratual-convencional, exige consenso). Exs.: novação, dação em pagamento e pagamento com sub-
rogação convencional (art. 347). Já nas regras especiais de pagamento, a manifestação de vontade é
unilateral, de modo que o pagador (solvens) impõe um ato ao recebedor (accipiens) com base na lei. Ex.:
pagamento em consignação, em que o pagador discorda do valor cobrado e decide depositar em juízo, e o
pagamento com sub-rogação legal (art. 346), que se opera de pleno direito.

PAGAMENTO EM CONSIGNAÇÃO

CONCEITO: é uma faculdade concedida ao devedor ou a um terceiro consistente no depósito da coisa


devida, de forma judicial ou extrajudicial, com o objetivo de extinguir a obrigação.

NATUREZA JURÍDICA: é uma regra especial de pagamento. Nunca é uma obrigação ou um dever.

RATIO: utiliza-se a consignação em pagamento para afastar a caracterização da mora e suas


consequências (perdas e danos, juros, atualização monetária e honorários advocatícios - art. 389 e ss.). Ou
seja, é uma forma do devedor de se proteger, de mostrar ao juiz que está de boa-fé e que quer fazer o
pagamento.

CONSIGNAÇÃO FEITA POR TERCEIRO: o terceiro interessado se sub-roga automaticamente e de


pleno direito no lugar do devedor. Já o terceiro não-interessado só consigna em nome do devedor (não
haverá direito de regresso ou sub-rogação legal/convencional, pois é um ato forçado por terceiro). No
fundo, o terceiro não-interessado está agindo como gestor de negócio, isto é, como um representante sem
mandato.

HIPÓTESES DE CABIMENTO: estão no art. 335, em rol exemplificativo:

I - se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o pagamento, ou dar quitação na devida
forma. Ex.: credor incapaz sem representante conhecido. Se o devedor fizer o pagamento para quem não é
representante ou não tenha capacidade para receber, ele corre o risco de ter que repetir o pagamento. Ex.
2: o credor está cobrando quantia maior ou indevida. Em relações complexas, isso não é tão fácil de ser
verificado, pois o contrato pode não ser claro quanto ao método de cálculo (ex.: Sicredi x Vivo).

II - se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e condição devidos. Ex.: obrigação
quesível (domicílio do devedor). Neste caso, a mora se chama “accipiendi”, “credendi” ou “creditoris”.

Atenção: a responsabilidade extracontratual e contratual baseia-se na teoria da culpa, mas na


extracontratual é simples, ao passo que na contratual é presumida. Para o Prof., o fato de a
responsabilidade contratual ser presumida significa inversão do ônus da prova. Assim, se o devedor
apenas esperar o credor ir receber e não fizer prova, poderá se dar mal se for demandado no futuro, pois
não terá como fazer prova negativa de que foi o credor quem não foi receber o pagamento.

Obs.: no CC/16, a mora correspondia só ao atraso (aspecto temporal). O CC, por influência do BGB,
incluiu lugar e condição devidos.

III - se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado ausente, ou residir em lugar incerto
ou de acesso perigoso ou difícil. Ex.: o credor faleceu e o devedor procura saber quem são os seus
herdeiros. Se não descobrir, o devedor pode ajuizar ação de consignação em pagamento em face do
espólio (haverá discussão sobre a possibilidade de se ajuizar ação contra o espólio). Ex. 2: no caso do
ausente, a consignação deve ser feita se ele não tiver curador nomeado para os seus bens.

Obs.: no CC/16, o ausente era considerado incapaz (representado por um cura personae); no CC, não é
causa de incapacidade, mas de curadoria dos bens do ausente (representado por um cura rei).

Atenção: o procedimento de ausência é marcado por 3 fases (curadoria dos bens do ausente  sucessão
provisória  sucessão definitiva).

IV - se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento. Esta hipótese é
chamada tecnicamente de “dúvida subjetiva”. O risco nesta hipótese é de pagar errado, pois “quem paga
mal, paga duas vezes”. A partir do momento que foi formada a dúvida, não é cabível mais a alegação de
pagamento de boa-fé, sendo melhor pagar em consignação para que o juiz decida quem deve receber.

V - se pender litígio sobre o objeto do pagamento. O risco nesta hipótese também é de pagar errado,
tendo que pagar novamente, pois não é possível alegar pagamento de boa-fé (subjetiva) se já sabia do
litígio. Ex.: empresa ganha licitação e não sabe a quem deve pagar, pois está havendo litígio sobre o ente
federal responsável pela concessão da ferrovia.

REQUISITOS SUBJETIVOS

 Sujeito ativo:
a) Devedor,
b) Terceiro interessado: há sub-rogação legal (art. 346);
c) Terceiro não-interessado: paga em nome do devedor;
d) Excepcionalmente, até o credor pode ser sujeito ativo: se a dívida vencer, pendendo litígio entre
credores que se pretendem mutuamente excluir, qualquer um deles poderá requerer a consignação. A
ratio é evitar o pagamento putativo ao outro credor. Ex.: um espólio tem crédito a receber de um devedor.
O espólio é composto por um irmão reconhecido e um não-reconhecido. O credor pagará provavelmente
apenas ao reconhecido. Por isso, o filho não-reconhecido ajuíza ação de consignação, requerendo que o
devedor pague em consignação, para que o valor fique depositado em juízo até que se finalize a ação de
investigação de paternidade. Nesta hipótese, é impossível a consignação extrajudicial.

 Sujeito passivo: credor.

REQUISITOS OBJETIVOS: pode ser depositado em juízo quantia ou qualquer objeto móvel ou
imóvel. Na consignação de um imóvel, deposita-se a chave em juízo. Só se admite o pagamento em
consignação nas obrigações de dar (é naturalmente incompatível nas obrigações de fazer e de não fazer).

Atenção: na obrigação de dar coisa incerta, a escolha (concentração) pode ser do devedor (em regra) ou
do credor. Nesta hipótese, o consignante irá requerer ao juiz que cite o credor para exercer o direito de
escolha (concentração), em 5 dias, se outro prazo não constar de lei ou do contrato, ou para que o devedor
o faça, devendo o juiz, ao despachar a inicial, fixar dia, lugar e hora em que se fará a entrega, sob pena de
depósito. Quanto à coisa certa, só pode ser consignado o objeto exato e nenhum outro, ainda que mais
valioso. Cf. o STJ, o devedor não pode realizar a consignação em dinheiro no valor equivalente ao da
coisa devida16.

REQUISITOS SUBSTANCIAIS: a consignação deve respeitar todas as cláusulas e condições previstas


no contrato no que diz respeito ao pagamento.

 Local: cf. o art. 337, a consignação deve ser feita no lugar do pagamento (no mesmo sentido dispõe o
art. 540 do CPC). Se o contrato for omisso sobre o lugar do pagamento, é no domicílio do devedor.

 Temporal: a consignação deve levar em consideração a seguinte distinção:


a) se o prazo para pagamento for estipulado em favor do credor, a consignação só será admitida após o
seu vencimento. Nem sempre é melhor para o credor receber antes. Ex.: consignação de um gado, em que
o credor não quer correr os riscos de cuidar do gado, apenas quando for explorá-lo economicamente. Ex.
2: mercado de valores futuro. Nestes casos, não se pode forçar o credor a receber antes.
b) se o prazo para pagamento for estipulado em favor do devedor, a consignação pode ser feita antes do
vencimento da obrigação. Isso porque, eventualmente, ele pode ter direito a abatimento de juros. Ex.: o
devedor pode fazer a consignação em pagamento nos financiamentos e mútuos feneratícios (é o mútuo
com intuito lucrativo, advindo dos juros remuneratórios).

Atenção: se o pagamento estiver subordinado a alguma condição, a consignação só será admitida após o
implemento desta. A ratio é que se o pagamento depende de uma condição, ele não é exigível, pois a
condição suspende o exercício e a exigibilidade. Há apenas expectativa de direito.

FORMAS/ESPÉCIES DE CONSIGNAÇÃO

EXTRAJUDICIAL: consiste no depósito de quantia certa realizado em um banco oficial (ex.: CEF). Se
não existir um banco oficial no local, o depósito pode ser feito em instituição bancária privada.

 Cabimento: só se envolver dinheiro. Não cabe consignação extrajudicial nas hipóteses em que houver
necessidade de “decisão” (o que /a quem/como/quando), pois o gerente do banco não decide nada.

 Processamento: (i) faz-se de um depósito em uma simples conta especial e o banco expede uma carta
com AR, assinalando o prazo de 10 dias para o credor manifestar a sua recusa;
(ii) o credor pode sacar o valor, silenciar (neste caso, o valor ficará depositado em nome do credor, que
poderá sacá-lo posteriormente) ou recusar o valor (a recusa não precisa ser justificada e, se for, não
compete ao gerente analisar as justificativas);
(iii) havendo a recusa, a obrigação não será considerada extinta e a solução é que o devedor poderá propor
dentro de um mês a ação de consignação, instruindo-se a inicial com a prova do depósito e da recusa (art.
539, § 3º do CPC). Se a ação não for proposta dentro desse prazo, o depositante poderá levantar a quantia
depositada, pois a consignação (judicial) nunca é uma obrigação.
16
STJ, REsp 1.194.264.
Atenção: a consignação extrajudicial não é um requisito para a propositura da judicial. Ambas são meras
faculdades, sendo a extrajudicial mais simples e sem necessidade de advogado. Há quem use a
extrajudicial para tentar forçar o recebimento do depósito pelo credor, dado que o credor tem apenas 10
dias para decidir, pois, se permanecer em silêncio, a consignação será considerada válida.

JUDICIAL: é a ação de consignação em pagamento. Pode ser para qualquer objeto, e não apenas para
quantia em dinheiro. No caso dos imóveis, há um símbolo: a entrega das chaves do imóvel. Poder ser
ajuizada com base em qualquer hipótese prevista no rol do art. 335, pois o juiz tem poder de decisão.

PAGAMENTO COM SUB-ROGAÇÃO

CONCEITO: é o pagamento efetuado por terceiro, no lugar do devedor, com a transferência dos direitos
creditórios titularizados pelo credor originário.

EFEITOS:

(i) liberatório: libera o credor originário da relação jurídica obrigacional.

(ii) translativo: transfere a condição de credor ao terceiro que pagou a dívida. Transfere-se o crédito mais
os direitos potestativos (ex.: direito de escolha/concentração), os privilégios e garantias (ex.: crédito com
garantia real) e ações (as mesmas medidas judiciais disponíveis ao credor originário17).

ESPÉCIES:

PAGAMENTO COM SUB-ROGAÇÃO LEGAL (art. 346): é o pagamento feito por terceiro que
independe da vontade das partes, operando-se de pleno direito (= automática). Ex.: fiador.

 Natureza jurídica: é uma regra especial de pagamento, pois a base é a lei.

 Extensão: o art. 350 dispõe que o sub-rogado não poderá exercer os direitos e as exceções do credor,
senão até a soma que tiver desembolsado para desobrigar o credor.

Obs.: pagamento com sub-rogação vs. assunção de dívida:


a) pagamento com sub-rogação: é forma de extinção de obrigação. Não tem intuito lucrativo/especulativo,
pois o terceiro não pode cobrar do devedor mais do que pagou, permitindo-se apenas atualização
monetária.
b) assunção de dívida (= cessão de débito): é forma de transmissão da obrigação. É permitido o intuito
lucrativo/especulativo. Ex.: antecipação de recebíveis18 no cartão de crédito e de precatório (neste último,
na verdade, tem-se cessão de crédito, mas é válido para ilustrativo).

 Hipóteses:

I - Credor que paga a dívida do devedor comum: versa sobre a hipótese em que há pluralidade de
credores com o mesmo devedor. Isso é muito comum no procedimento da falência. O credor aumenta o
seu prejuízo para controlar o procedimento. Não precisa de cláusula de sub-rogação com o outro credor,
pois a sub-rogação é legal, bastando ele ter um recibo de que pagou a dívida.

II - Adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário, bem como do terceiro que efetiva o
pagamento para não ser privado de direito sobre o imóvel: o terceiro quer evitar o risco de evicção, isto

17
O requisito de se ter 2 testemunhas para tornar o contrato um título executivo extrajudicial é requisito de direito processual e
não de direito material, de modo que descabido perquirir sobre qual plano está da escada ponteana.
18
Esse método permite o adiantamento de valores relacionados a compromissos de compra e venda a prazo, duplicatas, vendas
parceladas no cartão de crédito ou no carnê e cheques pré-datados de clientes em caixa. Antecipar recebíveis permite que o
empreendedor arque com as obrigações financeiras de curto prazo do negócio.
é, a perda do bem por força de decisão judicial decorrente de fato anterior (evincere = ser vencido =
perder).

III - Terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em parte.
Ex.: fiador, avalista e co-devedores solidários (atenção: não é um simples direito de regresso, mas sub-
rogação no lugar do credor, com todos os direitos e exceções).

Obs.: fiança vs. aval: ambos são espécies do gênero “garantia pessoal”, mas há diferenças entre eles:
a) fiança: é a garantia pessoa inserida em contrato, tendo o fiador benefício de ordem.
b) aval: é a garantia pessoal que se insere em título de crédito, tendo o avalista responsabilidade solidária,
sem qualquer espécie de benefício de ordem.

PAGAMENTO COM SUB-ROGAÇÃO CONVENCIONAL (art. 347): é o pagamento que depende de


acordo de vontade, ou seja, depende de cláusula expressa.

 Natureza jurídica: é pagamento indireto (NJ bilateral).

 Hipóteses: sempre com terceiro não-interessado.


I - Quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe transfere todos os seus direitos.
II - Quando terceira pessoa empresta ao devedor a quantia precisa para solver a dívida, sob a condição
expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos direitos do credor satisfeito.

 Efeitos: cf. o art. 348, na hipótese I acima, vigorará o disposto quanto à cessão do crédito (arts. 286 a
298), ou seja, equiparou-se a sub-rogação convencional à cessão de crédito. Atenção: como o art. 348
dispõe que, na sub-rogação convencional prevista no art. 347, I, devem ser observadas as regras da cessão
de crédito (arts. 286 a 298), pode ser gabaritado a possibilidade de caráter lucrativo/especulativo nesta
forma de sub-rogação. Já quanto ao II, é mais seguro defender a impossibilidade de caráter
lucrativo/especulativo. Na doutrina, este tema é absolutamente controverso.

IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTO

CONCEITO: é a indicação de qual dívida está sendo paga, quando, entre uma pessoa e outra, há mais de
uma obrigação a ser cumprida, mas o devedor não tem condição de quitar todas (art. 352). Ex.: A compra
2 carros da fábrica B, pagando, por mês, R$ 300 do carro 1 e R$ 500 do carro 2.

NATUREZA JURÍDICA: é regra especial de pagamento (NJ unilateral, pois é ato de imposição do
devedor).

REQUISITOS:

a) pluralidade de dívidas: entre o credor e o devedor, deve existir mais de uma obrigação a ser cumprida.

b) identidade de partes: as obrigações devem estar relacionadas aos mesmos credores e devedores. Caso
contrário, o instituto aplicável seria a compensação.

c) fungibilidade entre as dívidas: as dívidas devem ter a mesma natureza. Ex.: duas dívidas em dinheiro;
duas dívidas de laranja.

d) as obrigações devem ser líquidas e vencidas.


1) Líquida é a obrigação quanto à sua existência e determinada quanto ao seu objeto/valor. Tal conceito é
importante, porque só se pode haver mora ex re se a obrigação for líquida.
2) Vencida é a obrigação exigível, que pode ser cobrada. Este requisito é essencial só quando a imputação
é realizada pelo credor das dívidas. Se a escolha competir ao devedor (regra), prevalece na doutrina o
entendimento de que ele é livre para escolher entre o pagamento da dívida vencida ou da não-vencida.
Obs.: a não-vencida pode ser mais onerosa (ex.: com multa mais pesada, juros elevados, etc.). Este
mesmo raciocínio explica a razão pela qual não se confere ao credor o direito de escolher entre a dívida
vencida e a não-vencida. Ele deixaria em aberto a dívida mais onerosa

e) suficiência do pagamento para solver mais de uma dívida, mas não todas. Se o valor só for suficiente
para quitar uma das prestações, não há imputação, pois o credor não pode ser forçado a receber coisa
diversa da que era devida, mais ou menos valiosa (art. 313).

REGRAS DA IMPUTAÇÃO: a principal regra quanto à imputação é a do art. 352, que atribui a escolha
ao devedor. No silêncio deste, cabe ao credor imputar qual dívida está recebendo (exceção).

a) Imputação pelo devedor: caso o credor recuse a imputação realizada pelo devedor de forma
injustificada, restará ao devedor a opção da consignação em pagamento. A consignação em pagamento
será o meio de concretizar a imputação. Hipóteses em que a imputação NÃO pode ser realizada pelo
devedor:

I - pagamento parcial: o credor não pode ser forçado a receber o pagamento parcial imputado pelo
devedor (arts. 313 e 314).

II - pagamento de dívida ainda não vencida com prazo estipulado em benefício do credor (ex.: entrega de
boi – não necessariamente ele receber antes será bom, pois terá que gastar para criá-lo).

Obs.: toda vez que o prazo de pagamento é estipulado em benefício do credor (exceção), haverá restrição
ao pagamento antecipado (pois isto lhe causará prejuízo). Consequentemente, não será possível ao
devedor realizar a imputação, escolhendo a dívida não vencida.

Atenção: na situação comum (estipulação de prazo para pagamento em benefício do devedor), o


pagamento poderá ser sempre antecipado e, por esta razão, também será possível imputar o pagamento
tendo por objeto dívida não vencida.

III - pagamento de capital e juros: o credor de uma obrigação tem o direito de receber primeiro os juros
(bens acessórios) e depois o capital (bem principal). Contudo, nada impede que aceite receber primeiro a
dívida de capital (art. 354). A lógica é facilmente compreendida: a dívida de capital produz juros e a
dívida de juros, em regra, nada produz, pois a cobrança de juros sobre juros (anatocismo) é vedada pelo
ordenamento jurídico brasileiro, salvo disposição em sentido contrário (ex.: bancos).

Isso ocorre porque os juros são calculados com base no capital. Assim, se o devedor pudesse pagar o
capital, e não os juros, os juros ficariam congelados. É por isso que nas dívidas internacionais, é comum
ouvir que certo país pagou apenas “os juros da dívida”.

Ex.: dívida de R$ 100 e pagamento em 10 parcelas, com juros de 1% a. m. No 1º mês, paga-se R$ 10 +


R$ 1 = R$ 11. No 2º mês, paga-se R$ 10 + R$ 0,9 = R$ 10,9. E assim sucessivamente.

b) Imputação pelo credor: é exceção. Não tendo o devedor declarado em qual das dívidas líquidas e
vencidas quer imputar o pagamento, se aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a reclamar contra
a imputação feita pelo credor, salvo provando haver ele cometido violência (= coação) ou dolo (art. 353).

c) Imputação pela lei: se o devedor não fizer a indicação prevista no art. 352 e a quitação não indicar qual
dívida foi paga, a lei determina a imputação nas dívidas líquidas e vencidas em primeiro lugar. Se as
dívidas forem todas líquidas e vencidas ao mesmo tempo, a imputação far-se-á na mais onerosa. A mais
onerosa é aquela que, vencida, gera mais prejuízo. Também é hipótese de imputação legal a regra prevista
no art. 354, pelo qual, se a dívida for de capital e juros, a imputação far-se-á primeiro nos juros vencidos,
e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor aceitar receber primeiro a dívida de
capital.
Atenção: se as dívidas não forem de capital e juros e ambas forem líquidas, vencidas e tiverem a mesma
onerosidade, o CC não traz solução. A doutrina sugere como solução a aplicação de uma regra presente
no revogado art. 443 do Código Comercial de 1850, que dispunha que se pagam as duas em devida
proporção. Esta solução é adotada em Portugal, Itália e França.

DAÇÃO EM PAGAMENTO

CONCEITO: é a entrega de coisa diversa da que era devida com o objetivo de extinguir a obrigação.

NATUREZA JURÍDICA: é uma forma de pagamento indireto (NJ bilateral, pois depende de consenso).
A dação em pagamento só pode ser realizada com o consentimento do credor.

ELEMENTOS:
a) Existência de uma obrigação válida;
b) Oferecimento de coisa diversa pelo devedor;
c) Aceitação pelo credor da obrigação: é a aplicação do art. 313, que dispõe que o credor não pode ser
forçado a receber coisa diversa, ainda que mais valiosa.

OBJETO: a dação em pagamento pode ser realizada em qualquer espécie de obrigação (dar, fazer e não
fazer). A dação pode ser realizada mantendo-se a mesma natureza da obrigação (dar – dar) ou alterando-a
(dar – fazer ou não fazer).

 Valor: não é necessário que as prestações tenham o mesmo valor. Quando as prestações tiverem
valores distintos, é possível que as partes acordem o pagamento parcial da dívida.

Obs.: Em regra, o efeito liberatório na dação em pagamento é total, mas nada impede que o efeito
liberatório seja parcial, o que depende de uma disposição expressa.

Atenção: a emissão de um TC pode ser forma de dação em pagamento? Nas obrigações pecuniárias, não
deve ser considerada dação em pagamento a entrega de cheque, a expedição de uma ordem de pagamento
(LC, Duplicata, etc.) ou o depósito da quantia em conta corrente. Por outro lado, todas essas condutas
serão caracterizadas como dação em pagamento, quando a dívida não é pecuniária. Assim, a emissão de
um TC pode ser sim uma forma de dação em pagamento.

 Poder de disposição: é essencial para a validade da dação em pagamento que o devedor possa dispor
da coisa dada (G. R. U. D. – gozar, reaver, usar e dispor da coisa). Ou seja, deve ser titular da
propriedade. O nu proprietário tem poder de disposição, ao passo que o usufrutuário não tem.

FORMA: a dação em pagamento não exige, como regra, qualquer formalidade ou solenidade (art. 107).
Porém, se a dação em pagamento tiver por objeto um bem imóvel, haverá formalidade e não-solenidade
no caso de bem imóvel com valor até 30 salários mínimos (ou seja, deve ser apenas escrito) e haverá
solenidade no caso de bem imóvel com valor superior a 30 salários mínimos (ou seja, deve haver escritura
pública).

Obs.: Instrumento particular = escritura particular


Instrumento público = escritura pública.

REGRAS DA DAÇÃO EM PAGAMENTO:

a) Regramento subsidiário: como a dação em pagamento constitui-se, em regra, como verdadeiro contrato
de alienação, o art. 357 determina que, atribuído o preço da coisa dada em pagamento, deverão ser
aplicadas de forma subsidiária as regras da compra e venda.

Obs.: a compra e venda é contrato consensual (= formado/concluído/aperfeiçoado por meio do consenso,


ou seja, está no plano da existência). A entrega da coisa é a execução do contrato (plano da eficácia).
No caso da dação em pagamento, trata-se de um contrato real, pois a formação ocorre por meio da entrega
da coisa (plano da existência). Assim, ela é sempre uma obrigação de dar. Por outro lado, o “se
comprometer a dar” (contrato consensual) é uma novação.

Na dação em pagamento, a substituição da coisa ocorre no momento do pagamento vs. na novação


objetiva (real), a substituição da coisa ocorre em momento anterior ao pagamento.

b) Título de crédito: se o objeto da dação for um TC, a sua transferência importará cessão de crédito. O
caráter dessa cessão de crédito é pro soluto (o cedente responde pela existência e legalidade do crédito,
mas não responde pela solvência do devedor; se não ocorrer o pagamento, o cessionário deve executar o
TC). Na cessão de crédito pro solvendo, o pagamento do TC é requisito para o cumprimento da obrigação
e o seu inadimplemento gera extinção do contrato. Neste caso, pode-se exigir a obrigação originária.

c) Evicção: se o credor for evicto da coisa recebida em pagamento, restabelecer-se-á a obrigação


primitiva, ficando sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros (evincere = ser vencido
= perder). Há um defeito relativo ao direito. Ex.: dação em pagamento feita a non domino (o verdadeiro
dono – evictor - ajuíza ação contra o adquirente - evicto - e este, se perder, terá direito de
regresso/indenização contra o falso dono, cf. art. 450). Assim, em regra, ocorrendo a evicção na dação em
pagamento, haverá o efeito repristinatório19 da prestação originária: o credor poderá cobrar a prestação
originária.

Exceção: o credor não poderá reclamar a prestação originária se ela tiver sido adquirida do devedor por
um terceiro de boa-fé. Neste caso, o problema será resolvido em perdas e danos. Se o adquirente não for
terceiro de boa-fé (ex.: agiu em conluio), o bem poderá ser reclamado.

d) Vício redibitório: é o defeito oculto da coisa. O Capítulo do CC relativo à dação em pagamento não
regulamenta a questão do vício redibitório, mas devem ser aplicadas as regras presentes no art. 441 e ss.,
tendo em vista que a dação em pagamento é um contrato comutativo e oneroso.

NOVAÇÃO

CONCEITO: consiste na criação de uma obrigação nova com o objetivo de substituir e extinguir uma
obrigação anterior. Há, assim, uma ordem: cria-se a obrigação nova e depois se extingue a obrigação
anterior.

NATUREZA JURÍDICA: trata-se de um pagamento indireto (NJ bilateral, com base em consenso).
Obs.: a novação tem caráter não-satisfativo, pois extingue a obrigação sem o credor nada receber.

REQUISITOS DE VALIDADE:

a) Existência de uma obrigação anterior (obligatio novandi).

Atenção: essa obrigação deve ser válida, pois a anterior é a causa da posterior.
- Se ela for inválida: (i) se a obrigação for nula, não pode ser novada (obs.: as partes podem fazer um
novo NJ, mas não se aplicam as regras da novação); e (ii) se a obrigação for anulável, pode ser novada
(trata-se, aqui, de uma forma de convalidação).
- Se a obrigação for extinta, ela não pode ser novada, mas nada impede que as partes celebrem novo NJ.
- Se a obrigação for natural (= não exigível), a doutrina é divergente. O entendimento majoritário é o de
que, em regra, a obrigação inexigível não pode ser novada, criando-se uma obrigação exigível, porque
isso permitiria inúmeras fraudes à lei. Ex.: dívida de jogo (bastaria uma novação para poder ser cobrada).
Porém, com relação às dívidas prescritas, tem prevalecido o entendimento de que podem ser objeto de
novação. A intenção de novar é compreendida como uma renúncia tácita à prescrição pelo devedor. Tal
situação tem base legal no art. 191 (se a pessoa pode renunciar, ela pode novar).
19
A palavra escolhida (“repristinação”) foi infeliz, pois repristinação tem um significado específico no D. Constitucional.
b) Criação de uma obrigação nova (aliquid novi) com substancial diferença: a obrigação criada deve
conter elemento novo (pode ser nova prestação, sujeito ativo, sujeito passivo, etc.). Se forem alterados
apenas elementos secundários, não estará caracterizada a novação (ex.: parcelamento no preço, moratória:
é a concessão de um prazo adicional para realizar o pagamento; exclusão de garantia).

Atenção: renegociação de dívida: a princípio, seria uma novação, o que agrada muito aos bancos. Porém,
quanto aos bancos, há decisões afastando o reconhecimento da novação e há decisões reconhecendo a
novação, mas não a considerando como um fato impeditivo de revisão de contratos anteriores.
Atualmente, os bancos não têm tido muitos problemas com revisão contratual, pois prevalece no STJ o
entendimento de que os juros bancários são abusivos e devem ser revistos só quando ultrapassada a taxa
média de mercado.

c) Intenção de novar (animus novandi): para que seja reconhecida a novação, deve ser inequívoca a
intenção dos contratantes e não pode ser presumida (o animus novandi pode ser expresso ou tácito – art.
361). Vale lembrar que a natureza do NJ independe do nome que foi dado ao instrumento.

Obs.: em regra, a novação é de forma livre. Porém, excepcionalmente, pode ser necessária uma
formalidade (ex.: imóvel cujo valor é até 30 salários mínimos) ou solenidade (ex.: imóvel cujo valor seja
superior).

ESPÉCIES:

 Novação objetiva/real: há substituição do objeto, isto é, se substitui a prestação devida. A nova


obrigação pode ter a mesma natureza (ex.: fusca por Ferrari) ou pode ter natureza distinta (ex.: fusca por
dinheiro).

Atenção: não confundir a novação objetiva/real com a dação em pagamento.

Novação objetiva/real Dação em pagamento


A substituição da obrigação ocorre antes A substituição da obrigação ocorre no momento do
do pagamento pagamento
Não é satisfativa É satisfativa
Há a responsabilidade pela evicção Há a responsabilidade pela evicção, mas só aqui há a
regra do efeito repristinatório

 Novação subjetiva/pessoal: há substituição dos sujeitos da obrigação. Pode ser:

(i) novação subjetiva ativa (substitui o credor da obrigação). Não se confunde com a cessão de crédito,
pois, enquanto a novação é uma forma de pagamento e, portanto, de extinção obrigacional, a cessão de
crédito é uma forma de transmissão da obrigação. O mais importante é que na novação se cria algo novo,
com a possibilidade de se excluir algo (garantia, vícios, etc.).

(ii) novação subjetiva passiva (substitui o devedor da obrigação). Há 2 subespécies e ambas são válidas:
a) por delegação: age-se por autorização, ou seja, com o consentimento do devedor originário.
b) por expromissão: o devedor originário sofre uma “expulsão”, ou seja, sem o seu consentimento. Ex.:
pai descobre dívida do filho e negocia com o credor em novos termos. Interessante: no perdão de dívida, é
preciso o consentimento do perdoado, mas na novação subjetiva passiva por expromissão não é
necessário.

Atenção: não confundir a novação subjetiva passiva com a assunção de dívida:

Novação subjetiva passiva Assunção de dívida


Pagamento indireto Transmissão da obrigação
Substituição do devedor e criação de nova obrigação Não há criação de uma nova obrigação
Gera a extinção dos acessórios, privilégios e Mantém os acessórios, privilégios e garantias
garantias

 Novação mista: é a que consiste na substituição de mais de um elemento do contrato. Substitui-se,


assim, os sujeitos e o objeto. Não tem previsão legal e devem ser aplicadas as regras das demais
modalidades.

COMPENSAÇÃO

CONCEITO: é modalidade de extinção da obrigação entre pessoas que são simultaneamente credoras e
devedoras entre si. A compensação pode ser total (coincidência do total da dívida) ou parcial (dívidas de
valores distintos).

NATUREZA JURÍDICA: é variável. Pode ser forma de pagamento indireto (compensação


convencional) ou regra especial de pagamento (compensação legal).

CLASSIFICAÇÃO:

 Compensação legal: é a que opera automaticamente (de pleno direito), quando presentes os requisitos
legais. Embora opere de forma automática, o seu reconhecimento deve ser solicitado por uma das partes
em juízo. A compensação pode ser arguida como matéria de ataque (ação declaratória) ou como matéria
de defesa (arguida em reconvenção, em embargos do devedor, etc.). Requisitos:

I) Reciprocidade das obrigações: devem ser simultaneamente ou reciprocamente credoras ou devedoras


entre si (art. 368). Assim, não admite participação de terceiros, interessados ou não. Há apenas 1 exceção:
os fiadores podem alegar perante o credor a compensação que o afiançado (o devedor) teria a seu favor
(art. 371). Ex.: locatário deve R$ 2k ao locador a título de aluguéis e o locador deve R$ 1k ao locatário
por outra razão. O fiador pode alegar compensação e só pagar R$ 1k. O art. 376 determina que,
obrigando-se por terceiro, uma pessoa não pode compensar essa dívida com a que o credor dele lhe dever.
Este dispositivo é aplicável aos contratos de seguro: a seguradora (que se obrigou pelo segurado/terceiro)
não pode invocar eventual crédito do segurado perante o beneficiário (credor) para requerer a
compensação de sua dívida com a deste. Ex.: segurado gera prejuízo de R$ 2k ao beneficiário, que lhe
deve R$ 1k. A seguradora não pode alegar compensação utilizando-se da dívida entre segurado e
beneficiário.

II) Liquidez das dívidas: as obrigações devem ser certas quanto à sua existência e determinadas quanto ao
seu valor/objeto. Ex.: condomínio cobra os 3 últimos condomínios do condômino no valor de R$ 5k. Já o
condômino alega problemas em seu apartamento por conta de conduta do condomínio, tendo gasto R$ 4k
em reforma. Pode haver compensação? Não, pois a 1ª dívida é certa e determinada (isto é, dívida é
líquida), ao passo que a segunda não (dívida ilíquida). Para esta, deve haver ação de conhecimento para se
determinar responsabilidade e valor. A compensação só poderia ocorrer na fase de cumprimento de
sentença.

III) Exigibilidade das prestações/obrigações: ambas as obrigações devem ser vencidas. A exigibilidade da
prestação decorre de seu vencimento (art. 369). As obrigações puras (obrigações sem elementos
acidentais) são exigíveis desde a sua constituição. As obrigações condicionais ou a termo dependem do
implemento do elemento acidental para que sejam consideradas exigíveis. Quanto aos prazos de favor,
normalmente concedidos verbalmente (trata-se de uma espécie de moratória informal), o art. 372
determina que, embora consagrados pelo uso geral (costume), eles não obstam a compensação. O
requisito da exigibilidade também torna impossível a compensação legal de uma obrigação civil (pode ser
cobrada) com uma obrigação natural (não pode ser cobrada). Ex.: a dívida prescrita não poder ser
compensada com a não-prescrita – exceção: pode haver compensação convencional (depende de
consentimento).

IV) Fungibilidade das prestações: as dívidas devem ser homogêneas entre si (art. 369) – ex.: dinheiro com
dinheiro; laranja com laranja. Além da mesma natureza, as prestações devem ter a mesma qualidade, caso
este elemento esteja discriminado no contrato (art. 370). Ex.: arroz tipo 1 não pode ser compensado com o
arroz tipo 2. Não se compensam coisas com o equivalente em dinheiro. Esta regra também se aplica na
consignação em pagamento.

 Compensação convencionada: é aquela livremente acordada entre credores e devedores recíprocos. Por
ser fruto da liberdade das partes, em regra, não há requisitos, tais como a fungibilidade, exigibilidade, etc.
Porém, devem ser observados os requisitos e limites legais previstos nos NJs em geral. Ex.: art. 104
(objeto ilícito), art. 426 (herança de pessoa viva).

 Compensação judicial: é aquela imposta pelo juiz ao proferir uma sentença de improcedência da ação e
também da reconvenção. O juiz reconhece os valores na sentença, mas condena apenas pela diferença.

Obs.: o CPC dispõe expressamente que os honorários sucumbenciais constituem direito do advogado,
sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.

VEDAÇÕES À COMPENSAÇÃO: a compensação pode ser proibida pela vontade das partes (exclusão
convencional) ou pela lei (exclusão legal). Em razão da autonomia privada, as partes podem excluir a
possibilidade de compensação de modo unilateral ou bilateral por meio de cláusula vedando a compensação.
A renúncia ao direito de compensar é a exclusão convencional unilateral. A renúncia deve ser posterior à
formação da obrigação (contrato) e anterior ao preenchimento dos requisitos da compensação legal, já que,
neste caso, a compensação se opera de forma automática, independentemente da vontade das partes).
Portanto, não é admitida a renúncia ao direito de compensar antes da existência da obrigação e após a sua
extinção.

A exclusão legal encontra-se disciplinada no art. 373. A exclusão legal pode decorrer da causa da dívida
ou da qualidade do devedor. A exclusão pela causa da dívida encontra-se no inciso I do dispositivo: se a
obrigação provier de esbulho, furto ou roubo. Para a doutrina, esta regra deve ser aplicada em qualquer
hipótese de ilícito penal. Ex.: se o credor furta o devedor e pretende ver reconhecida a compensação.

O inciso II também trata de exclusão em razão da causa da dívida: se uma das dívidas se originar de
comodato, depósito ou alimentos. Logo, dívida de alimentos, p. ex., é incompensável.

Por fim, o art. 380 trata da impossibilidade da compensação em razão da qualidade do devedor. Ele veda a
compensação em prejuízo de direito de 3º. O devedor que se torne credor do seu credor, depois de
penhorado o crédito deste, não pode opor ao exequente a compensação de que contra o próprio credor
disporia.

Obs.: A proibição da compensação é assunto de muita importância no Direito Tributário. O art. 170 do
CTN veda, como regra, a compensação de créditos fiscais, salvo quando autorizados por lei. O art. 374 do
CC, que permitia amplamente a compensação, não fazendo distinção de tratamento entre créditos fiscais e
não fiscais, foi revogado pela Lei 10.677/03.

CONFUSÃO

CONCEITO: é a extinção da obrigação em virtude da reunião das qualidades de credor e devedor na


mesma pessoa. A obrigação será considerada automaticamente extinta, pois deixará de ter alguns de seus
elementos essenciais (não tem credor e devedor nem vínculo jurídico).

NATUREZA JURÍDICA: é uma regra especial de pagamento. Ex.: pai empresta 10 mil reais para o
filho. Pai é credor e filho é devedor. Ocorre que após algum tempo o pai morre: O filho, por ser herdeiro,
acabará virando credor dele mesmo. A confusão pode decorrer de um ato inter vivos (ex.: cessão de
crédito, fusão de empresas, casamento pelo regime da comunhão universal, etc.) ou mortis causa (ex.:
sucessão).

ESPÉCIES DE CONFUSÃO
a) Confusão própria ou total: é aquela que atinge a totalidade da dívida, provocando a extinção da
obrigação.

b) Confusão imprópria ou parcial: é a hipótese em que a dívida é extinta de forma parcial. Ex.: Pai era
credor de 10 mil reais do filho. Ao morrer, esse crédito é transferido aos dois filhos (5 mil para cada), de
modo que a compensação só atingirá metade da dívida (mesmo que existam outros bens na herança, cf.
regras do direito hereditário).

Obs.: em caso de obrigação solidária, a confusão será imprópria ou parcial (art. 383), somente diminuindo
o valor da dívida. Não haverá nem a extinção da obrigação nem a extinção da solidariedade. Assim, a
confusão não prejudica os demais credores e também não beneficia os demais devedores.

EFEITOS DA CONFUSÃO

1) A extinção da obrigação principal determina também a extinção das obrigações acessórias (princípio
da acessoriedade/gravitação jurídica). Ex.: Extinto o mútuo pela confusão, extingue-se a fiança (ex.: pai
empresta para o filho, que elege um amigo como fiador, e o pai morre). Porém, o inverso não ocorre: se
ocorrer a confusão dentro da obrigação/relação acessória, a obrigação principal não será extinta. Ex.:
extinta a fiança por confusão (fiador passou a ser credor), o mútuo não é extinto, permanecendo (ex.: pai
empresta para o amigo do filho, que elege o filho como fiador, e o pai morre).

2) Cf. o art. 384, “cessando a confusão, para logo se restabelece, com todos os seus acessórios, a
obrigação anterior”. Isso significa que a cessação da confusão pode ocorrer em virtude de uma situação
que era transitória (ex.: sucessão provisória na ausência) ou que foi considerada posteriormente inválida
ou ineficaz (ex. 2: anulação de uma partilha realizada, ao se descobrir que o autor da herança deixou um
testamento).

REMISSÃO DE DÍVIDA
CONCEITO: é a extinção a obrigação mediante a exoneração do devedor pelo credor. É o perdão da
dívida, uma liberalidade praticada pelo credor de forma expressa ou tácita, total ou parcial.

NATUREZA JURÍDICA: é um NJ bilateral, pois depende do consentimento do devedor, isto é, deve ser
aceito pelo devedor para que produza efeitos. Isso porque o ato de perdão pode representar uma situação
de humilhação (é uma proteção ao direito de personalidade do devedor - honra, imagem e dignidade). É,
assim, caso de pagamento indireto. Caso o devedor não aceite o perdão, ele pode constranger o credor a
receber o pagamento mediante consignação.

Obs.: enquanto a remissão é um NJ bilateral, que precisa ser aceito pelo devedor, a renúncia é um ato
abdicativo unilateral e, portanto, não precisa ser aceito pelo devedor. A remissão pode ter por objeto apenas
dívida (D. Obrigacional), ao passo que a renúncia, mais ampla, pode ter por objeto D. Obrigacionais e
Reais.

REQUISITOS

(i) Capacidade e legitimidade: o perdão e a sua aceitação devem ser praticados por quem tenha
capacidade e legitimidade para dispor/alienar e para adquirir. Cf. o art. 386, a devolução voluntária do
título da obrigação, quando por escrito particular, prova desoneração do devedor e seus co-obrigados, se o
credor for capaz de alienar, e o devedor capaz de adquirir.

(ii) Ânimo de perdoar: deve ser inequívoco, embora não seja necessário que seja expresso. O ânimo de
perdoar é expresso, quando o credor e o devedor celebrarem um NJ de remissão de dívida. É tácito,
quando ocorre por meio do comportamento, como na devolução do título da obrigação (ex.: devolução do
cheque).
(iii) Consentimento do devedor: é indispensável.

(iv) Inexistência de prejuízo de terceiro: ex.: hipótese em que o credor tem outros credores e se utiliza da
remissão de dívida para burlar a perda do crédito.

ESPÉCIES DE REMISSÃO:
1) Quanto à sua extensão: a remissão pode ser total ou parcial. Total é o perdão integral da dívida. Parcial
é o perdão de parte da dívida.
2) Quanto ao objeto da prestação: a remissão pode ser objetiva ou subjetiva. A remissão objetiva se refere
à prestação. A remissão subjetiva se refere ao sujeito da relação obrigacional. Ex.: João tem um crédito de
R$ 300k contra A, B e C, devedores solidários. Se João perdoar R$ 300k: remissão objetiva. Se João
perdoar C, a remissão é subjetiva (nesse caso João só poderá cobrar de A ou de B o restante da dívida –
R$ 200k). Isso porque o art. 388 dispõe que a remissão concedida a um dos co-devedores extingue a
dívida na parte a ele correspondente; de modo que, ainda reservando o credor a solidariedade contra os
outros, já lhes não pode cobrar o débito sem dedução da parte remitida. É a mesma regra do art. 262.

TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES

A transmissão das obrigações pode ser feita por meio de cessão de crédito, assunção de dívida ou ainda
por meio de cessão contratual (simultaneamente crédito e débito).

CESSÃO DE CRÉDITO

CONCEITO: cessão de crédito é o NJ bilateral em que o credor de uma obrigação (cedente) transfere a
outra pessoa (cessionário) a totalidade ou apenas uma parte do crédito que possui em face de outra pessoa
(devedor/cedido). Atenção: O devedor NÃO é parte do NJ.

Em regra, cessão de crédito é um NJ oneroso. Mas, é possível a celebração de forma gratuita.

Obs.: Não há que se falar em compra e venda ou doação de crédito. Disposição é um gênero, do qual são
espécies: cessão e alienação. A cessão é a disposição de coisas incorpóreas (ex.: cessão de direitos
autorais). A alienação é a denominação que se dá à transferência de coisas corpóreas/tangíveis/materiais.
Ambos podem ser celebrados de forma gratuita ou onerosa.

ESPÉCIES:
a) Convencional (arts. 286 a 298): é a que que decorre de um acordo de vontade entre o cedente e o
cessionário. Natureza jurídica: NJ bilateral (é um contrato).
b) Legal: é aquela que decorre de previsão em norma jurídica. Ela é imposta por lei. Ex.: art. 287 – “Salvo
disposição em contrário, na cessão de um crédito abrangem-se todos os seus acessórios”: É o princípio da
acessoriedade/gravitação jurídica.
c) Judicial: é a que é determinada pelo juiz como forma de atribuir ao credor de uma execução o crédito
titularizado pelo devedor em uma outra obrigação.

REQUISITOS DE VALIDADE DA CESSÃO DE CRÉDITO: como a cessão é uma espécie de NJ, a


princípio, devem estar presentes todos os requisitos de validade previstos nos art. 104 e ss.
SUJEITOS: são partes da cessão de crédito o cedente e o cessionário (o cedido não). Ambos devem ser
capazes e legitimados. Se o cedente for incapaz, a cessão só será possível com prévia autorização judicial
(art. 1.691). O cedente também deve ter poder de disposição sobre o crédito (até porque ninguém pode
transferir mais do que dispõe). No que tange ao cessionário, em determinadas situações, certas pessoas
não podem receber o crédito de outra. Elas têm legitimidade negativa, haja vista que há conflito de
interesses. Ex.: O tutor com relação ao crédito do tutelado. Ex. 2: O crédito com relação ao crédito do
curatelado. Ex. 3: O testamenteiro não pode receber o crédito do testador. Ex. 4: O administrador de bens
ou direitos de outra pessoa. O NJ praticado com conflito de interesses será nulo.

Obs.: Legitimidade positiva: a pessoa pode praticar o ato com o consentimento de terceiro e o seu
descumprimento torna o ato anulável (ex.: vênia conjugal do art. 1.647; venda de bem para descendente);
Legitimidade negativa: o ato é proibido e o seu descumprimento gera a nulidade. Há conflito de
interesses. Ex.: venda de bens do curatelado.

Toda anulabilidade é estabelecida com limite temporal: prazo de decadência. A parte pode torná-lo
válido, p. ex., obtendo a vênia conjugal. Esgotado o prazo, o NJ será convalidado pelo decurso do tempo.
Por isso, o tabelião pode lavrar NJ anulável.

OBJETO: pode ser objeto de cessão a totalidade ou apenas parte de um crédito. Também podem ser
objeto de cessão créditos futuros, litigiosos e até mesmo aqueles representados por precatórios (art. 78 do
ADCT).

Quanto à natureza do crédito, em regra, todo e qualquer tipo de crédito pode ser objeto de cessão, mas há
exceções:

a) quando houver proibição legal à cessão de crédito. Ex.: crédito já penhorado (art. 298), para que ele
receba e consiga fraudar o seu próprio credor e o cessionário cobre o devedor. A sanção é a nulidade
virtual (toda vez que a lei fala que ato é proibido, mas não comina sanção, está-se diante de ato nulo);

b) quando houver proibição contratual à cessão de crédito (pactum de non cedendo). Ex.: no contrato que
deu origem à dívida proíbe-se a cessão de crédito. A cláusula proibitiva da cessão de crédito somente
pode ser oposta ao cessionário de boa-fé se constava do mesmo instrumento da obrigação originária.
Trata-se da boa-fé subjetiva, em que se ignora a existência da cláusula. Se constar expressamente do
mesmo instrumento, o devedor poderá opor a cláusula proibitiva como uma exceção/defesa. Se não sabia
da existência da cláusula, mas ela constava do NJ principal, o cessionário não poderá cobrar o crédito (é
difícil acreditar que era de boa-fé se constava do contrato principal). Agora, se a cláusula for estipulada
em outro NJ (instrumento apartado), o cessionário de boa-fé que não sabe da existência poderá cobrar o
crédito. Isso porque o cedente pode não ter mostrado o instrumento apartado.

Em resumo: se a cláusula constava do contrato originário, não poderá alegar boa-fé subjetiva e a cessão
de crédito será inválida. Por outro lado, a cláusula proibitiva não constava do contrato originário, mas de
instrumento apartado, o cessionário poderá alegar a boa-fé subjetiva. O poder da boa-fé subjetiva é tornar
válida a cessão de crédito (a cláusula proibitiva não produzirá efeitos).

c) quando a natureza da obrigação vedar a cessão de crédito (isto é, for incompatível): ex.: crédito
alimentar, relações personalíssimas, etc.

PRINCÍPIO DA GRAVITAÇÃO JURÍDICA (ACESSORIEDADE): a cessão do crédito principal


implica na transmissão dos direitos e garantias do credor originário (art. 287). Ex.: a previsão de juros e a
cláusula penal são transmitidas ao cessionário. No caso de crédito hipotecário (art. 289), a cessão de
crédito pode ser realizada, mas o cessionário deverá averbar a cessão de crédito no cartório de registro de
imóveis onde foi constituída a garantia. A ideia é dar publicidade.

FORMA DA CESSÃO: a cessão de crédito é, a princípio, um NJ informal (não exige formalidade ou


solenidade como requisito de validade). Essa é a regra. Excepcionalmente, pode ser exigida formalidade
ou solenidade se a exigência de forma for também um requisito de validade do NJ principal. Ex.: compra
e venda de um imóvel de mais de 30 salários mínimos; neste caso, é exigida a escritura pública como
requisito de validade do ato. A escritura pública, portanto, também será requisito de validade da cessão de
crédito.

EFICÁCIA DA CESSÃO: questiona-se quando o NJ vai produzir efeitos. A cessão de crédito ocorre
entre credor e novo credor e, não tendo requisito especifico de eficácia nessa relação, segue a regra geral:
o NJ que existe e é válido tem eficácia imediata. Mas, perante o cedido e terceiros ocorre da seguinte
forma:

(i) Eficácia perante o cedido (devedor): no CC/16, a notificação do devedor era um requisito de validade
da cessão de crédito. Já no CC, deixou de ser. Para a validade da cessão de crédito não é necessário que o
cessionário notifique o cedido. Atualmente, é requisito de eficácia, nos termos do art. 290. Há 2 objetivos:
1) A notificação deve ser feita para que o devedor (cedido) tome ciência da cessão e pague a pessoa
correta (cessionário), sob pena de ter que cobrar o cedente, já que o devedor não é obrigado a pagar
novamente.
2) A partir da notificação, o devedor (cedido) tem a obrigação de opor imediatamente as exceções
existentes. Ex.: exceção de pagamento (dívida já paga), exceção de prescrição (dívida prescrita) e exceção
de cláusula proibitiva. Qual o prazo para opor exceções? Não existe na lei. A resposta, porém, deve ser
rápida e imediata, sob pena de não poder fazê-lo depois (suppressio).

*Atenção: se o cedido (devedor) manifestar consentimento/anuência no instrumento da cessão de crédito,


não será necessária sua posterior notificação.

(ii) Eficácia perante terceiros: a preocupação é surgir credores do credor originário em juízo pleiteando a
penhora daquele crédito. Para proteger o NJ, deve-se conferir publicidade à cessão de crédito. Para tanto,
pode-se fazer a cessão de crédito por escritura pública ou fazer por instrumento particular e levar a
registro (Cartório de Registro de Títulos e Documentos) – art. 654, § 1º. O registro garante a
autenticidade de data (pois pode ser colocada qualquer data no instrumento particular). Essa publicidade
protege o cessionário com relação a dívidas futuras do credor (cedente) e do devedor (cedido). Porém,
não protegerá o cessionário com relação às dívidas pretéritas, sendo possível que a cessão de crédito seja
considerada fraude contra credores. Obs.: há outros requisitos além da anterioridade do crédito, vide arts.
158 e 159.

CLASSIFICAÇÃO QUANTO À ONEROSIDADE:


a) Cessão onerosa: é aquela que equivale a uma “compra e venda do crédito”. Há remuneração pelo NJ
realizado. Ex.: contratos de factoring para cheques (antigamente era comum em estabelecimentos que
recebiam muitos cheques) e antecipação de recebíveis (comum hoje com as máquinas de cartão de
crédito).

A característica principal da cessão onerosa é que o cedente tem responsabilidade pela existência do
crédito, mas não pela sua solvência. O crédito tem que existir no momento de celebração do contrato,
mas, se o devedor não pagou, o cedente, em regra, não responde. A cobrança deve ser direcionada ao
devedor. É possível, no entanto, que o cedente assuma, mediante cláusula expressa, a responsabilidade
pela solvência.

b) Cessão gratuita: é aquela que não há remuneração/contraprestação. Equivale a um contrato de doação.


Como regra, o cedente não responde pela existência do crédito e nem pela solvência.

CLASSIFICAÇÃO QUANTO À RESPONSABILIDADE:


(i) Cessão pro soluto: in veritas nominis. É a regra dentro da cessão de crédito: é aquela em que o credor
originário (o cedente) não responde pela solvência da dívida. Se o cedido não honrar o compromisso dele,
o cessionário deverá executá-lo. Isso ocorre tanto na cessão onerosa, quanto na gratuita.
(ii) Cessão pro solvendo: in bonitas nominis. É aquela em que o credor originário (o cedente) assume
responsabilidade pela solvência/pagamento da dívida.

ASSUNÇÃO DE DÍVIDA
CONCEITO: é o NJ bilateral ou trilateral em que o devedor de uma obrigação transfere a sua dívida a
uma outra pessoa com o consentimento do credor. É a cessão de débito. O credor será o cedido, o devedor
será o cedente e o novo devedor será o cessionário.

*Atenção: enquanto na cessão de crédito, o cedido não é parte no NJ, na cessão de débito ela só pode ser
realizada c/ o seu consentimento. Tecnicamente, quando o NJ é bilateral seria entre o cedido e o
cessionário (é polêmico). O consentimento do cedente não é um requisito para a validade da cessão de
débito. Por isso, alguns autores falam que a assunção de dívida pode ser realizada por delegação ou por
expromissão.
a) Por delegação: será com o consentimento do cedente (devedor originário).
b) Por expromissão: será realizada sem o consentimento do cedente.

VALIDADE DA ASSUNÇÃO DE DÍVIDA: devem estar presentes, em regra, os requisitos gerais de


validade do negócio jurídico (arts. 104 a 184). Há, porém, requisitos especiais:
a) Validade do NJ transmitido: se o NJ originário for inválido também será inválido o negócio
transmissivo (a cessão).
b) Consentimento expresso do cedido (credor): caso não tenha participado do NJ transmissivo (cessão),
ele deverá ser notificado para manifestar concordância expressa. É requisito de validade da assunção de
dívida. Ainda que seja estipulado prazo para resposta da notificação do cedido (credor), o seu silêncio
deverá ser interpretado como recusa. Aqui quem cala não consente.
*Exceção: admite-se, excepcionalmente, a aceitação tácita, quando a dívida é garantida por hipoteca e o
adquirente do imóvel não impugna a cessão dentro do prazo de 30 dias (art. 303).
c) Solvência do cessionário: a validade da assunção de dívida depende da solvência do cessionário (novo
devedor) no momento da celebração do NJ transmissivo (art. 299). Se o cessionário já era insolvente e o
cedido ignorava tal situação, o cedente (devedor originário) continuará responsável pelo cumprimento da
obrigação (solvência da dívida), não importando se agiu de boa-fé ou não.

CLASSIFICAÇÃO QUANTO AOS SEUS EFEITOS:


(i) Liberatória: é a verdadeira assunção de dívida: o cedente deixa de ter responsabilidade pela dívida.
(ii) Cumulativa: é a falsa assunção de dívida: não está regulamentada pelo CC. Ela provoca uma
ampliação do polo passivo da obrigação.

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