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JOGOS PSICOLÓGICOS

Aqui, entretanto, nos preocupamos com os jogos inconscientes feitos pelas pessoas
inocentes envolvidas em transações duplex, das quais elas não estão inteiramente
cientes, e que constituem o aspecto mais importante da vida social no mundo inteiro.

Eric Berne

Conceituação

Um jogo é "uma série de transações, em geral repetitivas, superficialmente plausíveis, com


uma motivação oculta'". Os jogos distinguem-se das outras formas de estruturar o tempo, por serem
um procedimento semi automatizado, não consciente de obter toques ou carícias negativos.
Substituem o relacionamento direto e aberto, assegurando, embora de forma negativa, uma maneira
de passar o tempo, de receber reconhecimento e de reforçar a posição existencial negativa.
"Todo o jogo é basicamente desonesto e o seu desfecho tem uma qualidade dramática". As
crianças aprendem desde muito cedo a jogar com seus progenitores, a selecionar seus jogos preferidos,
escolher seus parceiros, a representar papéis no grupo familiar, papéis esses que passam a ser
exercitados posteriormente em outros grupos na escola, com os amigos etc. Os jogos são situações
transacionais que envolvem não apenas motivações individuais, mas também grupais. Embora este
último aspecto não tenha sido suficientemente explorado do ponto de vista teórico, a prática indica a
importância dos jogos na compreensão da dinâmica organizacional e dos fatores humanos que
intervêm na produtividade e na qualidade dos resultados das empresas.
Berne ressalta que uma das características dos jogos é que as séries de transações ulteriores
que os compõem "levam a um resultado em geral bem encoberto, porém bem definido".

Características

Os jogos apresentam as seguintes características distintivas:

• Superficialmente parecem ser transações complementares plausíveis, se considerarmos apenas o


nível social ou manifesto.
• Na realidade são transações ulteriores ou ocultas, com uma mensagem psicológica subjacente que
constitui o convite para o jogo.
• O desenrolar das transações que constituem o jogo leva os interlocutores a mudarem os papéis que
representam inicialmente.
• O desfecho dos intercâmbios entre os interlocutores leva a um resultado negativo que é o real
objetivo do jogo, embora este não seja consciente.

Joines caracteriza um jogo através dos seguintes aspectos:


• Está fora da consciência do Adulto.
• Só se torna explícito quando os participantes comutam sua maneira de agir.
Resulta em todos os envolvidos sentirem-se confusos, incompreendidos e com vontade de pôr
a culpa no interlocutor.

Análise dos jogos

A análise da dinâmica dos jogos psicológicos é um aspecto da Análise Transacional que tem
absorvido a atenção de um grande número de estudiosos. Berne dedicou todo um livro a esse tema,
que contribuiu sobremaneira para a divulgação da sua teoria, descrevendo minuciosamente alguns
jogos em termos do que ele denominou tese, antítese, propósito, papéis, dinâmica, paradigma
transacional, lances e vantagens. Todos esses aspectos servem para esclarecer a base teórica dos jogos
psicológicos, a partir da qual o próprio Berne e seus seguidores desenvolveram métodos simplificados
para explicar a dinâmica seqüencial dessa forma de estruturar o tempo.

Triângulo dramático

Karpman, criador do Triângulo Dramático, afirma que "a análise dos papéis é parte da análise'
dos jogos e do script, ao definir as identidades envolvidas na ação". O triângulo dramático é um
diagrama que explica a dinâmica das transações que compõem o jogo, demonstrando a existência de
três papéis possíveis, Salvador, Perseguidor e Vítima, que são assumidos pelos jogadores. Durante o
jogo observa-se uma comutação de papéis, podendo cada participante assumir dois ou mais papéis no
desenrolar do "drama".
Cada indivíduo tem, em função de sua Posição Existencial predominante, um papel "preferido"
de entrada e de saída nos jogos psicológicos, sejam os iniciados por ele, sejam aqueles dos quais
"aceita" participar.

Exemplo: Conversa entre dois gerentes de uma empresa:


A: Não sei mais o que fazer para dar conta do trabalho!
B: Tenho notado que você anda muito estressado. O que está acontecendo?
A: Com os novos cortes, a equipe está com o trabalho atrasado, e o Diretor vive no meu pé, como se eu
pudesse fazer milagres!
B: Por que você não procura uma forma de reorganizar o trabalho para render mais?
A: Já analisei e reanalizei, mas não há nada a fazer.
B: Por quê você não discute essa questão com a equipe? Talvez o pessoal tenha alguma sugestão.
A: Mas não temos tempo nem para atender o telefone, quanto mais para reuniões!
B: Por que você não conversa com o seu Diretor sobre isso?
A: Olha, as coisas não são tão simples assim como você pensa. O melhor é mudar de assunto porque
esta conversa não vai resolver nada mesmo.
Figura 69. Triângulo Dramático de Karpman

Análise do jogo

"A" assume o papel de Vítima e convida "B" a assumir o papel de Salvador. "B" aceita o
"convite" e inicia-se o jogo conhecido como "Por que você não ... , Sim, mas ... ''. O jogo encerra-se
quando "A" desqualifica as tentativas de ajuda de "B" dando a entender que este não é capaz de ajudá-
lo. O resultado é um certo sentimento de frustração e incapacidade de "B" e de onipotência e solidão de
"A".
No início do jogo: A - Vítima, B - Salvador
No decorrer do jogo: A - Vítima B - Salvador (tentando solucionar o problema sem sucesso).
Encerramento do jogo: A - Perseguidor B - Vítima (fracassou)
A - Perseguidor, B - Vítima
Cada papel no triângulo dramático corresponde a um determinado estado de Ego e a uma
Posição Existencial.
Vítima (CAS-) -/+
Salvador - (PP-) +/-
Perseguidor (PC-) +/-
O papel assumido no encerramento do jogo reforça a Posição Existencial de cada um dos
parceiros. No caso do gerente A, a posição no final do jogo é +/- (Só eu sou capaz de resolver o meu
problema, ou os outros só dão palpites furados) e do gerente B é -/+ (procuro ajudar e ainda recebo
desaforo de troco!).
Figura 70. Diagramação do jogo no Triângulo Dramático

Fórmula "J" de Berne

Berne criou uma fórmula sequencial para identificar os jogos psicológicos que é a seguinte:

C + G => R => S => X => P


C = "con" (isca)
G = "gimmik" (fraqueza)
R = "response" (resposta)
S = "switch" (comutação ou mudança)
X = "crossup'' (confusão)
P = "payoff" (compensação ou benefício final)
Em português, a fórmula J (jogo) original de Berne pode ser apresentada da seguinte forma:

I + F => R => M => C => CF

Tomando-se o exemplo do diálogo entre os gerentes A e B, a isca (I) lançada pelo primeiro é
um pedido de ajuda indireto (transação ulterior) e a fraqueza (F) do segundo é gostar de solucionar os
problemas dos outros, daí sua aceitação imediata do convite para jogar. O indício da aceitação é a
resposta (R) que vem em forma de sugestões para resolver o problema do colega, sugestões essas que
são recusadas através de argumentos que as invalidam. Finalmente, A desqualifica as tentativas de B ao
recusar-se a continuar o assunto. Nesse momento do diálogo, dá-se a mudança ou comutação de
papéis (M) no triângulo dramático, gerando uma confusão (C) momentânea e cada participante obtém
a compensação final (CF) ou reforço da Posição Existencial predominante.

Descrição dos jogos

Berne classificou e descreveu em torno de trinta jogos, podendo cada um deles ser analisado
através do triângulo dramático ou da fórmula J de Berne.
Os mais freqüentemente observados em ambientes de trabalho são:
Agora te peguei, seu ....

Esse jogo tende a ser iniciado por pessoas que sentem necessidade de recriminar ou criticar os
outros. Nas empresas, os indivíduos que utilizam esse jogo estão sempre atentos aos erros dos outros
para poder acusá-los ou controlá-Ias, ou então, criam situações ambíguas (armadilhas) ao sonegar
informações, fazer pressão, criar confusões e situações propícias para que alguém incorra em algum
tipo de erro. Quando isso ocorre, assume o papel de Perseguidor (acusando, denunciando,
responsabilizando, provocando acontecimentos desfavoráveis).
Exemplo: Um gerente de vendas compromete-se com um cliente importante a entregar um grande
volume de um produto especial num prazo exíguo. Antes de fazê-Io, entretanto, conversou
rapidamente com o gerente de produção indagando sobre a possibilidade de fabricação do produto,
sem, porém, mencionar prazo ou volume. Quando o gerente de produção recebe o, pedido e verifica a
impossibilidade de aprontar o volume solicitado do produto no prazo estipulado, comunica-se com o
gerente de vendas:

Gerente de produção: "Fulano, recebemos a solicitação do produto X, mas não dispomos da matéria-
prima suficiente em estoque para atendê-lo neste prazo."
Gerente de vendas: "Quando conversamos, antes de fechar o pedido, você me informou que podia
fazer esse produto sem problemas."
Gerente de produção: "Claro que podemos fazê-lo, só que não no prazo e na quantidade solicitados."
Gerente de vendas: “Vocês nunca têm capacidade de produzir nada na hora certa! É por isso que esta
empresa está ficando cada dia mais para trás enquanto nossos concorrentes vão de vento em popa!
Vou comunicar isso para o meu Diretor hoje mesmo.”

Sim, mas ...

Comumente utilizado por pessoas com tendências autocráticas a rebaixar, desvalorizar e


desrespeitar colegas e subordinados, tentando provar a sua própria competência, superioridade,
esperteza etc. (ver exemplo do triângulo dramático).

Acossado

Em geral jogado por pessoas que assumem papel de Vítima, do indivíduo sempre disposto a
sacrificar-se pelo chefe, pela família, colegas e amigos e por isso não lhe sobra tempo para cuidar de si
mesmo. Suas tentativas de ajudar os outros são malsucedidas e acaba sendo o coitado que apesar de
ser bonzinho é incompetente para "descascar os abacaxis que aceita".

Veja o que me fez fazer

Um jogo bastante comum nos ambientes de trabalho feito por pessoas que colecionam
ressentimentos e procuram culpados para os seus erros.
Exemplo: Um funcionário pede informações a um colega, mas erra ao anotar os dados. Em seguida
passa a informação para o gerente que percebe o erro. Este vai reclamar com o subordinado que, por
sua vez vai reclamar com o colega dizendo: "por sua culpa passei informações erradas para o gerente
que acabou achando que o erro foi meu!"

Por que sempre eu?

Esse jogo é feito por pessoas que tendem a assumir o papel de Vítimas e de injustiçadas.
Exemplo: Gerente: Srta. Marta, o relatório anual da empresa está atrasado e vamos precisar de toda a
equipe para preparar as tabelas até segunda-feira.
Srta. Marta: Por que o senhor não pede para alguém do outro setor?
Afinal já trabalhei no fim de semana passado.
Gerente: Vamos precisar de todos, pois o Presidente viaja na segunda-feira e vai apresentar o relatório
ao Conselho de Administração.
Srta. Marta: Por que sempre eu? Será que não tenho direito a um fim de semana em paz?

Briguem vocês dois

Esse é um dos jogos preferidos por pessoas que têm fantasias de onipotência ou que usam
métodos escusos para atingir seus próprios objetivos.
Exemplo: Um funcionário diz ao colega: "Você se lembra daquele problema que surgiu com as
fundações do edifício X? Pois é, na última reunião da Diretoria o Fulano estava comentando o caso e
disse que o responsável pelo erro foi você. Eu acho que isso merece um esclarecimento, pois do
contrário ele vai acabar por "fritá-Io" aqui na empresa. Se eu fosse você, iria conversar com o Fulano,
porque ele gosta muito de acabar com a reputação das pessoas. Estou lhe contando isso em segredo,
afinal somos colegas há tantos anos!"
O suposto acusado fica alarmado com o que ouve e vai logo conversar com o Fulano. Segue-se uma
discussão violenta e o suposto acusado pede demissão. O iniciador do jogo reforça sua fantasia de que
é capaz de manipular as pessoas, fazê-Ias brigar, eliminando assim a concorrência de um colega que
poderia impedir ou dificultar sua própria promoção.

Chute-me

Jogado por pessoas que têm tendência a chamar a atenção de forma negativa. Fazem o papel
de desastrados, esquecidos, inconvenientes, incompetentes, dependentes, inoportunos, dizendo ou
fazendo coisas que provocam críticas, rejeição, ironia, falta de credibilidade.

Outros Jogos:

• Gritaria
• Tribunais
• Se não fosse por você
• Você é maravilhoso
• O meu é melhor do que o seu
Classificação dos jogos

• Em função do papel de saída do triângulo dramático

Os jogos podem ser classificados em função do papel preferido de saída do triângulo


dramático ou pela Posição Existencial que o reforça. É possível, também, classificá-los combinando
esses dois critérios que são complementares. (Quadro 8)

• Em função da intensidade

Na classificação dos jogos, Berne utiliza, entre outros, o critério de intensidade.


Jogos de 1º grau são considerados "socialmente aceitáveis" no círculo de relações do ator.
Suas conseqüências imediatas têm efeito apenas sobre os parceiros do jogo, não ferindo
diretamente os padrões de comportamento do grupo.
Posição Existencial
Papel +/- -/+ -/-
O meu é melhor do que o seu
Gritaria
Perseguidor Agora peguei você, seu ...
(PC-) Sim, mas ... Gritaria
Tribunais
Briguem vocês dois ...
Salvador Eu só queria ajudar
(PP-) O que você faria sem mim?
Vítima Por que sempre eu?
(CCA-) Chute-me Acuado
Quadro 8. Jogos por posição existencial e papel de saída do triângulo dramático

Jogos de 2° grau são aqueles que não redundam "em consequências permanentes e
irremediáveis, mas que os parceiros preferem esconder do conhecimento público".
Jogos de 3° grau redundam em conseqüências permanentes e acabam por terminar nos
tribunais, hospitais, necrotérios ou clínicas de doentes mentais.

• Em função da duração

Muitos jogos têm duração breve, não mais do que poucos minutos, já que se completam após
algumas transações. Outros se dão em vários capítulos ou episódios até atingir o seu clímax.
Finalmente existem os jogos de longa duração, como os que acontecem entre pais e filhos, marido e
mulher, sócios, chefe e subordinado que podem durar meses, anos e até toda uma vida.

Por que jogamos?

Uma das perguntas que surgem quando se aborda a questão dos jogos psicológicos é por que
nos envolvemos em interações que nos levam ao sentir-nos mal? Como já foi observado, a principal
razão, é a falta de consciência dessas ações, das suas causas e dos seus efeitos para as pessoas
envolvidas.
Berne indica as seguintes "vantagens" dos jogos:
• Vantagem Psicológica Interna:

Contribui para a estabilidade psíquica interna na medida em que continuamos pensando e


sentindo da maneira como aprendemos nos primeiros anos de vida.

• Vantagem Psicológica Externa:

Contribui para evitar situações que provocam ansiedade.


• Vantagem Social Interna:

Contribui para a estruturação do tempo em isolamento (fantasias, diálogos internos, reviver


episódios passados, sentimentos etc.).

• Vantagem Social Externa:

Fornece elementos para passatempos (comentários sobre incidentes com filhos, cônjuges,
vizinhos, trabalho, colegas de trabalho, chefes, subordinados etc.).
• Vantagem Biológica:

Refere-se aos toques negativos obtidos pelo jogo, atendendo assim à necessidade de
reconhecimento (embora seja sempre negativo no caso dos jogos psicológicos) e de estruturação do
tempo.

• Vantagem Existencial:

Uma forma de confirmar a Posição Existencial predominante. Por exemplo, o jogo Agora te
peguei, seu .... para provar que o outro é incompetente, reforça a Posição Existencial +/- de quem o
inicia e a -/+ de quem aceita a parceria.

Como e por que diminuir a freqüência dos jogos

A primeira medida para diminuir a freqüência e a intensidade dos jogos que iniciamos ou dos
quais aceitamos participar não conscientemente como parceiros é aprender a reconhecê-Ios. Isso
poderá ser feito a partir do diagnóstico do papel que assumimos preferencialmente no triângulo
dramático que, por sua vez, está ligado aos estados de Ego que usamos predominantemente. Os seres
humanos aprendem a jogar desde o seu nascimento. Os primeiros parceiros dos jogos psicológicos são
as figuras parentais, principalmente os progenitores ou substitutos, que têm seus jogos preferidos.
Com isso, a criança é treinada a utilizar determinados estados de Ego com maior freqüência, assumindo
assim um ou mais papéis no triângulo dramático. Alguns exercitam-se mais no papel de Salvador,
Perseguidor ou Vítima, outros são mais versáteis, no sentido de assumirem, com relativa facilidade,
qualquer um dos três papéis. Estes últimos tendem a ser exímios jogadores e estruturam a maior parte
de seu tempo em jogos, evitando assim relacionamentos autênticos e espontâneos, e criando à sua
volta um clima tóxico, no qual prevalece a troca de toques negativos.
Uma outra forma de distinguir um jogo, esta a posteriori, é dar-se conta da repetição de
situações já vivenciadas anteriormente. Quando alguém aceita inadvertidamente jogar Sim, mas ... ,
provavelmente sentir-se-á incapaz de ajudar alguém, de ver suas sugestões rejeitadas e mais,
injustiçada, desrespeitada e incompetente no momento em que o jogo terminar.
Os jogos são transações que podem ser interrompidas por qualquer um dos parceiros,
evitando-se assim relacionamentos interpessoais tensos, desgastantes e improdutivos que prejudicam
todos os envolvidos. Por exemplo, não assumir o papel de conselheiro de quem não está disposto a
aceitar conselhos, como é o caso de quem gosta de jogar Sim, mas ..., isto é, não assumir o papel de
Salvador. Não perseguir os que gostam de ser Vítimas, não julgar pendências entre pessoas que têm
capacidade para resolvê-Ias, não ajudar quem não está disposto a participar da solução dos próprios
problemas. Nesse sentido, é importante distinguir o modo de agir do Salvador (falso) do triângulo
dramático daquelas pessoas que contribuem para que o indivíduo ajude a si mesmo.
Dizemos que o Salvador falso (PP-) se propõe a salvar 100%, isto é, envia a quem pede auxílio
uma mensagem ulterior do tipo "você não é capaz". O Salvador autêntico (PP+) propõe-se a "salvar"
parcialmente, ou seja, dando oportunidade a quem precisa de ajuda de utilizar o seu potencial para
contribuir na solução de seu próprio problema, estabelecendo assim uma relação de parceria voluntária
e consciente.
O Salvador do triângulo dramático necessita, para manter sua autoestima elevada, que as
pessoas precisem e dependam dele, o Perseguidor necessita que o temam e a Vítima necessita ser
dependente, perseguida ou desprezada para manter sua autoestima baixa. Portanto, todo o jogo, diz
Berne!', "é basicamente desonesto" pois aproveita-se da fraqueza do parceiro com finalidades espúrias
de extorquir deste o tipo de reconhecimento de que necessita para manter sua Posição Existencial
negativa ( +/-, -/+ ou -/-).

Os pontos a serem considerados para diminuir a freqüência dos jogos são:


• diagnosticar seu papel preferido no triângulo dramático;
• reduzir o uso do (PC-) e (PP-), deixando de ressaltar as limitações dos outros;
• reduzir o uso da (CA-), deixando de ressaltar as próprias limitações; dar toques positivos autênticos
toda vez que houver oportunidade e adequação;
• aceitar e incorporar os toques positivos autênticos que receber;
• pedir toques positivos quando necessitar;
• recusar os toques negativos inadequados que receber;
• recusar convites para jogar, estimulando o uso do (A).
Quanto menor a proporção do tempo despendida em jogos, mais elevada tenderá a ser a
qualidade de vida do indivíduo e o seu grau de autonomia. Este tema será retomado no capítulo sobre
Script.

Os jogos na organização

Segundo Summerton, os jogos grupais ou organizacionais são caracterizados pelos seguintes


aspectos:
• São jogados de forma repetitiva e costumeira pelos membros de um grupo.
• São recompensados pelo próprio grupo.
• São apoiados pela cultura do grupo.
• As características da cultura fornecem o ambiente, as oportunidades, os recursos e as justificativas
para o avanço dos jogos e suas compensações/benefícios finais.
• A etiqueta vigente fornece diretrizes a respeito de quais os jogos aceitáveis e assim a cultura
organizacional propicia a racionalização para as aberrações psicossociais resultantes.
• Nas organizações, a maneira como as pessoas estruturam o seu tempo determina, em grande parte,
os resultados alcançados. A cultura de qualquer organização estabelece um conjunto de padrões
formais e informais de comportamento, estimulando o uso de determinadas transações. Quanto
maior for o número de transações ulteriores, maior será a probabilidade de ocorrerem jogos
psicológicos.

Se os dirigentes de uma empresa, por exemplo, dedicarem boa parte de seu tempo jogando
entre si, essa forma de relacionamento permeará a organização, gerando conflitos entre níveis
(verticalmente) e entre áreas (horizontalmente), problemas de comunicação, falta de integração e
coordenação das atividades, dificuldade de resolver problemas, de tomar decisões, podendo
comprometer a própria sobrevivência da empresa.
Da mesma forma como os filhos aprendem a jogar os jogos de seus pais e familiares, os
ocupantes dos diferentes níveis hierárquicos, por uma questão de sobrevivência no ambiente de
trabalho, tendem a aceitar convites para jogar e testam os seus próprios jogos com superiores, pares e
subordinados, num processo de adaptação a um meio ambiente em que o jogo é a forma predominante
de obter algum tipo de reconhecimento.
Organizações orientadas para resultados estruturam a maior parte de seu tempo em
atividades e em intimidade, entendida como relacionamentos honestos, transparentes e cooperativos,
que visam a integração das contribuições individuais e coletivas para a obtenção de resultados
qualitativos e quantitativos da empresa como um todo. Nessas empresas, as pessoas, equipes de
trabalho, áreas e níveis hierárquicos têm consciência da interdependência que existe entre elas, em que
todos são prestadores e consumidores de serviços internos. Na linguagem da qualidade todos são
clientes e fornecedores internos, co-responsáveis pela qualidade dos bens/serviços aí produzidos para
atender o cliente externo. São essas as condições ambientais que favorecem a maximização do
aproveitamento do potencial, da competência, do talento, da criatividade e da capacidade de contribuir
das pessoas que aí trabalham.
As organizações, sem ter consciência clara desse fato, criam condições que favorecem os
chamados jogos organizacionais, institucionalizados. Muitas regras, normas, procedimentos, controles
e a forma dúbia como são aplicados propiciam condições que favorecem jogos como "Agora te peguei,
seu ... ", "Briguem vocês dois", "Tribunais", "Veja O que me fez.fazer", "Sim, mas ... " etc.
Nas organizações em que prevalecem padrões de comportamento típicos de PC-, PP- e CA-
existem condições propícias à multiplicação de jogos psicológicos e aumento da carência de toques ou
carícias positivos autênticos, implicando baixa auto-estima das pessoas, dependência, produtividade
diminuída, clima organizacional tóxico, resistência à mudança, lentidão de resposta às alterações das
condições de mercado, à absorção de novas tecnologias etc.
Os fatores que indicam a freqüência e o grau de intensidade dos jogos numa organização são:

• Produtividade
Os jogos psicológicos afetam diretamente a produtividade, causando desgaste físico e
emocional, criando condições estressantes de trabalho e canalizando as energias para ações
improdutivas. Embora as pessoas estejam sempre "muito ocupadas", permaneçam além do expediente
normal de trabalho, produzem poucos resultados qualitativos e quantitativos. Exemplos típicos são as
reuniões em que não se veiculam informações, decisões não são tomadas, problemas não são
resolvidos, compromissos não são estabelecidos. Uma análise mais profunda indica que reuniões dessa
natureza nada mais são do que palcos para o desenrolar dramático de jogos, em que prevalecem os
toques negativos, as duplas mensagens, as manipulações de alguns e a passividade e indiferença da
maioria. Essas reuniões, muito freqüentes nas empresas, representam um custo elevado, pois na
maioria dos casos tendem a ser prolongadas, inúteis e frustrantes.
Embora as ciências da administração partam do pressuposto de que as empresas funcionam
segundo os princípios da lógica cartesiana, convém não esquecer que as ações humanas apresentam
outros componentes além da racionalidade. As influências culturais gerais e específicas, as vivências, as
necessidades emocionais pessoais e grupais não podem ser desprezadas, quando pretendemos
compreender o comportamento da organização como um todo, bem como dos grupos e das pessoas
que a compõem.
Um aspecto cada vez mais importante para o aumento da produtividade é o relacionamento
entre as diversas áreas das empresas produtoras de bens e serviços. Grande parte dos conflitos e da não
solução de problemas oriundos das interfaces é devida aos jogos que se instalam por causa da falta de
contratos claros e da definição de responsabilidades na obtenção dos resultados globais da empresa. O
movimento da qualidade, considerado por muitos como uma solução para os complexos problemas das
organizações na virada do milênio, entretanto, tem trazido resultados aquém dos esperados, por não
enfatizar suficientemente os aspectos comportamentais envolvidos no processo de mudança de
postura diante do trabalho.

• Nível de Motivação/Automotivação
Os grandes geradores de motivação/automotivação são o reconhecimento, através de toques
ou carícias positivos autênticos, a satisfação/identificação com os resultados do trabalho e a
autorrealização (fazer aquilo de que gosta e gostar do que faz).
Um ambiente de trabalho em que os jogos psicológicos tendem a ser a forma predominante
de estruturar o tempo é altamente deficitário em todos os aspectos anteriormente citados. Os toques
ou carícias negativos, as manipulações, o abuso. do poder geram mal-estar generalizado, passividade,
alienação, desinteresse e frustração que absorvem boa parte da energia humana. Daí a necessidade de
monitoração periódica do clima organizacional no sentido de detectar a intensidade e a freqüência dos
jogos psicológicos e tomar medidas adequadas para a sua minimização.

• Acidentes de trabalho
As pessoas que assumem preferencialmente o papel de Vítima são as mais sujeitas a
acidentes. Pesquisas na área de segurança do trabalho indicam que a maior parte dos acidentes é
provocada por pessoas que já estiveram, direta ou indiretamente, envolvidas em outros acidentes.
Ambientes tensos, conflitivos, de ansiedade e insatisfação tendem a afetar mais intensamente
pessoas com baixa autoestima, contribuindo para aumentar ainda mais seus sentimentos de
incompetência e insegurança,

• Capacidade de resolver problemas e tomar decisões


O bom desempenho e o sucesso de uma organização dependem, em grande parte, da
velocidade e eficácia com que consegue resolver problemas e tomar decisões.
Resolver problemas e tomar decisões são ações que se apóiam em capacidade de observação,
flexibilidade, informações, criatividade, racionalidade, sensibilidade e intuição. Em termos de estados
de Ego, a utilização do A, CL+, Peq.Prof+, PP+ e PC+.
Uma empresa na qual os jogos psicológicos são freqüentes, os estados de Ego mais
estimulados serão o PP-, PC- e CA-, impedindo que a energia psíquica flua para aqueles estados de Ego
adequados para a solução de problemas e tomada de decisão.

• Nível de absenteísmo
Esse é um fenômeno comum em empresas nas quais os jogos psico- lógicos são freqüentes. O
clima torna-se tão tóxico e opressivo que as pessoas sentem necessidade de afastar-se dele para
recuperar, de alguma forma, seu equilíbrio interno.
As causas mais comuns do absenteísmo são o alcoolismo, a dependência de drogas, as
doenças psicossomáticas, acidentes fora do trabalho etc. Índices altos de absenteísmo pelos motivos
citados poderão estar sinalizando a presença de jogos de segundo grau na empresa.
• Rotatividade
As empresas que apresentam índices de rotatividade acima da média das suas congêneres,
apesar de proporcionarem condições de trabalho e salários que acompanham o mercado, tendem a ser
tóxicas e provavelmente a reter em seus quadros os que se engancham nas iscas apresentadas ou cujos
jogos preferidos coincidem com os da empresa. É o caso do Acossado que "gosta" de trabalhar em
empresas q e exigem longas horas de expediente, trabalhos em fins de semana, mas cuja produtividade
é baixa, já que está mais preocupado com as tarefas do que com os resultados. Como afirma
Summerton, "os principais benefícios resultantes da análise dos jogos incluem a descoberta de dados
sobre o que está acontecendo e a geração de opções para a modificação do comportamento dos
indivíduos e grupos, a fim de minimizar os efeitos negativos e maximizar o seu efetivo funcionamento".
Quanto mais as pessoas, grupos e organizações desenvolverem suas capacidades de detectar
os jogos existentes, mais eficazes poderão ser as intervenções curativas e preventivas que visem o
desenvolvimento de um clima organizacional compatível com os princípios de qualidade de vida no
trabalho e da justiça social. Para tanto será necessário que cada um se conscientize, primeiramente,
dos jogos que inicia e daqueles que aceita participar e perceba o quanto esta forma de estruturar o
tempo social é prejudicial para todos os envolvidos.

Referências bibliográficas:
Retirado do Livro Trabalhabilidade – Capítulo IV – KRAUZ R. Rosa – São Paulo: Nobel, 1999.

BERNE, E. Carnes people play. New York: Grave Press, 1967,


BERNE, E. Games people play. New York: Grove Press. 1964.
BERNE, E. Principies of group treatment. Ncw York: Grave Press, 1966.
BERNE, E. O que você diz depois de dizer olá? São Paulo: Nobel, 1988, p. 35.
KARPMAN S. Contos de Fada e análise do drama dos scripts. In Prêmios Eric Berne, São
Paulo: UNAT-Brasil, 1983.
STEWART, I., JOINES, V. TA today. Chapcl Hill, Lifespace Publishing, 1987.
SUMMERTON, O. Carnes in organizations. Transactional Analysis Journal, v. 23, n. 2, p. 102,
1993.

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