Você está na página 1de 5

Asma CAPÍTULO 136 907

CAPTULO 138
Asma
Definição e epidemiologia
A asma e' uma síndrome caracterizadapor obstrução do fluxo de ar que varia tanto
espontaneamente quanto com o tratamento específico. A inflamação crônica das
vias respiratórias causa hiper-responsividade dessas vias a ampla variedade de agen-
tes desencadeantes (gatilhos),
resultando em obstrução ao fluxo aéreo e sintomas
respiratórios que consistem emdispneia e sibilos. Normalmente, os asmáticos pos-
suem períodosde funçãopulmonar normal com obstrução intermitente ao fluxode
ar, porém um subgrupo de pacientes desenvolve obstrução crônica ao fluxo de ar.
A prevalênciada asma aumentou acentuadamente no transcorrer dos últimos
30 anos. Nos países desenvolvidos, cerca de 10% dos adultos e 15% das crianças
sofrem de asma. Na maioria dos casos, a doença tem inicio na infância. A maioria
dos asmáticos tem atopia, e os asmáticos costumam ter dermatite atópica (eczema)
e/ou rinite alérgica.Uma pequena parcela
de pacientes asmáticosnão apresenta ato-
pia (teste cutâneo negativo aos alérgenos
comuns e níveis séricos totais normais de

IgE). Esses indivíduos, denominados ocasionalmente asmáticos intrínsecos, costu-


mam apresentar a doença no início da vida adulta. A asma ocupacionalpode resul-
tar de ampla variedade de substâncias químicas, como o tolueno diisocianato e o
anidrido trimelítico, podendo também ter início na vida adulta.
Os asmáticos podem desenvolver maior obstrução ao fluxo de ar e sintomas
respiratórios em resposta a uma grande variedade de desencadeantes diferentes.
Os alérgenos inalados podem ser poderosos gatilhos para a asma nos indivíduos
com sensibilidadeespecífica a esses agentes. As ITRS virais induzem com frequên-
cia a exacerbações da asma. As medicações bloqueadoras B-adrenérgicas podem
agravar muito os sintomas asmáticos, devendo ser evitadas nesses indivíduos. Com
frequência, o exercício acarreta o agravamento dos sintomas, que começa habitual-
mente após o término do exercício. Outros desencadeantes do agravamento dos
sintomas asmáticos são poluição do ar, ar frio, exposições ocupacionais e estresse.

Avaliação clínica do paciente


Os sintomas respiratórios comuns na asma consistem em sibilos, dispneia e tosse.
Com frequência, esses sintomas variam bastante em determinado indivíduo, po-
dendo modificar-se espontaneamente seja com a idade, a época do ano e o trata-
mento. Os sintomas podem piorar à noite, constituindo os despertares noturnos um
indicador de controle inadequado da asma. A gravidade dos sintomas asmáticos
assim como a necessidade de tratamento com esteroides sistêmicos, de hospitaliza-
ção e tratamento em unidade intensiva devem ser averiguadas. Os tipos de desenca-
deante da asma para determinado paciente e sua exposição recente a eles devem ser
determinados. Cerca de l a 5% dos asmáticos têm sensibilidadeà aspirina e outros
inibidores da cicloxigenase; eles, de maneira geral, não são atópicos e apresentam
pólipos nasais. O tabagismo causa mais internações hospitalares e um declínio mais
rápido na função pulmonar; a cessação do fumo é essencial.
908 SEÇÃO 8 Pneumologia

Exame físico
É importante avaliar os sinais de angústia respiratória, como taquipneia, uso dos
músculos respiratórios acessórios e cianose. Ao exame dos pulmões, pode haver
sibilos e roncos em todo o tórax, em geral mais proeminentes na expiração que na
inspiração. Os sibiloslocalizados podem indicarlesão endobrônquica. Deve ser de-
terminada a evidênciade doença alérgica nasal, sinusal ou cutânea. Quando a asma
é devidamente controlada, o exame físico pode ser normal.

Provas de função pulmonar


A espirometria mostra com frequência obstrução do fluxo de ar, com uma redução
do volume expiratório forçado em 1 s (VEFI) e da relação VEFl/capacidadevital
forçada (CVF). Entretanto, a espirometria pode ser normal, em especial se os sin-
tomas estão sendo devidamente tratados. A reversibilidadeaos broncodilatadoresé
demonstrada por um aumento no VEF] de 2 200 mL e 2 12% em relação ao VEF¡
15 a 20 min após a administração de um B-agonista de ação curta (comumente, 2
jatos ou 180 ug de albuterol dosimetrado). Muitos asmáticos demonstram signifi-
cativa reversibilidadeaos broncodilatadores;contudo, o tratamento farmacológico
ideal pode reduzi-la. A hiper-responsividade das vias respiratórias é caracteristica
da asma; ela pode ser avaliada pela exposição a broncoconstritores diretos, como
metacolinaou histamina. Uma responsividade maior das vias respiratórias está as-
sociada a aumento dos sintomas de asma. O pico de fluxo expiratório (PFE) pode
ser usado pelo paciente para rastrear objetivamente o controle da asma em casa. A

mensuração dos volumes pulmonares não costuma ser feita, mas podem ser obser-
vados aumentos na capacidadepulmonar total e no volume residual. A capacidade
de difusão para o monóxido de carbono costuma ser normal.

Outros exames laboratoriais


Os exames de sangue não costumam ser úteis. O hemograma completo pode
demonstrar eosinofilia. As mensurações da IgE específicas dos alérgenos inalados
(RAST) ou os testes de alergia cutâneos podem ajudar a determinar os desencade-
antes alérgicos. A IgE sérica total apresenta-se acentuadamenteelevada na aspergi-
lose broncopulmonaralérgica (ABPA). Os níveis exalados de óxido nítrico podem
fornecer uma avaliação da inflamação eosinofílica das vias respiratórias.

Achados radiográíicos
A radiografia de tórax costuma ser normal. Nas exacerbações agudas, pode-se iden-
tificar um pneumotórax. Na ABPA, podem ser observados infiltrados pulmonares
eosinofílicos. A TC de tórax não é realizada de rotina na asma, mas pode mostrar
bronquiectasia central na ABPA.
Diagnóstico diferencial
O diagnóstico diferencial da asma inclui outros distúrbios que podem causar sibilos
e dispneia. A obstrução da via respiratória superior por tumor ou edema laríngeo
pode simular asma, porém o estridor nas grandes vias respiratórias é observado no
exame físico. Os sibiloslocalizados no tórax podem indicar um tumor endobrón-
quico ou corpo estranho. A ICC pode causar sibilos, porém é acompanhada por
estertores bibasilares.As pneumonias eosinofílicas e a síndrome de Churg-Strauss
podem manifestar-se com sibilos.A disfunção das cordas vocais pode simular asma
grave e tornar necessária a realização de laringoscopia como método de avaliação.
Asma CAPÍTULO 136 909

Quando a asma envolve uma obstrução crônica ao fluxo de ar, pode ser muito difícil
distingui-la da doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC).

Se um agente desencadeante específico dos sintomas asmáticos puder ser iden-


tiflcado e eliminado, esta será uma parte ideal do tratamento. Na maioria dos
casos, será necessário recorrer à terapia farmacológica.As duas principais clas-
ses de fármacos são os agentes broncodilatadores,que proporcionam alívio sin-
tomático rápido graças ao relaxamento do músculo liso das vias respiratórias,
e os controladores, que limitam o processo inflamatóriodas vias respiratórias.

BRONCODILATADORES A classe de broncodilatadoresmais usada é represen-


tada pelos agonistas BZ-adrenérgicos, que relaxam o músculo liso das vias res-
piratórias por ativarem os receptores Bz-adrenérgicos. Dois tipos de agonistas
B¡ inalatórios são muito usados no tratamento da asma: de ação curta (BAAC)
e de ação prolongada (BAAL). Os BAAC, que incluem o albuterol, exibem um
início de ação rápido, e sua duração é de até 6 h; são medicações de "resgate"
efetivas, porém sua utilizaçãoexcessiva indica um controle inadequado da asma.
Os BAAC poderão prevenir a asma induzida pelo exercício se forem adminis-
trados antes da realização desse exercício. Os BAAL, que incluem salmeterol e
formoterol, possuem um início de ação mais lento, porém tal ação dura mais de
12 h. Os BAAL substituíram os BAAC com horário fixo, mas eles não controlam
a inflamação das vias respiratórias e não devem ser usados sem corticosteroides
inalatórios (CI). As combinações de BAAL com CI reduzem as exacerbações
asmáticas e proporcionam excelente opção de tratamento a longo prazo para a
gravidade da asma de grau persistente moderado ou maior.
Os efeitos colaterais comuns dos agonistas BZ-adrenérgicos consistem em
tremores musculares e palpitações, sendo mais proeminentes com as formula-
ções orais que, em geral, não devem ser usadas. Há uma constante preocupação
quanto aos riscos de mortalidade associados aos agonistas BZ-adrenérgicos, ain-
da não eliminada completamente. Os BAAL tomados sem tratamento concomi-
tante com esteroides inalatórios podem aumentar esse risco.
Outras medicações broncodilatadorasdisponíveis são os anticolinérgicos e
a teofilina. Os anticolinérgicos,disponíveis nas formulações inaladas de ação
curta e prolongada, em geral são usados na DPOC. Parecem ser consideravel-
mente menos efetivos que os agonistas Bz-adrenérgicos, e eles costumam ser
considerados como opção de tratamento adicional somente quando as outras
medicações para asma não proporcionam um controle adequado da afecção. A
teofilinapode exercer efeitos tanto broncodilatadoresquanto anti-inflamatórios;
não é muito usada por causa das toxicidades potenciais associadas aos altos ni-
veis plasmáticos. Doses baixas de teofilina podem ter efeitos aditivos aos CI em
níveis abaixo da faixa terapêutica padrão, e isso pode ser uma opção de trata-
mento útil na asma grave.

TERAPIAS DE CONTROLE Os CI são o tratamento de controle mais efetivo para


a asma, sendo administrados habitualmente 2x/dia; estão disponiveis várias me-
dicações CI. Apesar de não proporcionarem alívio sintomático imediato, com
910 SEÇÃO 8 Pneumologia

bastante frequência os sintomas respiratórios e a função pulmonar começam a


melhorar alguns dias após o inicio do tratamento. Os CI reduzem os sintomas
induzidos pelo exercício, os sintomas noturnos e as exacerbações agudas. O tra-
tamento corn CI costuma levar a uma redução na hiper-responsividade das vias
respiratórias.
Os efeitos colaterais dos CI são rouquidão e candidíase oral, os quais podem
ser minimizados pelo uso de um dispositivo espaçador e enxaguando a boca
após sua aplicação.
Outra terapia de controle disponível para a asma são os corticosteroides sis-
têmicos. Apesar de bastante úteis no controle das exacerbações agudas da asma,
o uso dos esteroides orais ou IV deve ser evitado, se isso for possível no controle
crônico da asma, em razão dos múltiplos efeitos colaterais potenciais. Os anti-
leucotrienos, como o montelucaste e o zañrlucaste, podem ser bastante benéfi-
cos em alguns pacientes. O cromoglicato sódico e o nedocromil sódico não são
muito usados por sua ação de curta duração e efeitos modestos. O omalizumabe
é um anticorpo bloqueador que neutraliza a IgE; com a injeção subcutânea,pa-
rece reduzir a frequência das exacerbações agudas da asma nos asmáticos com

doença grave. Entretanto, trata-se de um produto caro, só devendo ser conside-


rado em pacientes altamente selecionados com níveis séricos totais de IgE eleva-
dos e sintomas asmáticos refratários apesar de terapia máxima com broncodila-
tadores inalatórios e CI.
ABORDAGEM A0 TRATAMENTO GLOBAL Além de limitarem a exposição aos
seus desencadeantes ambientais para a asma, os pacientes devem receber uma

terapia por etapas apropriada à gravidade da sua doença (Fig. 138.1). Os asmá-
ticos com sintomas intermitentes leves são controlados de modo adequado com
BAAC quando necessário. O uso de BAAC mais de 3X/semana sugere que se
tornou necessária a terapia de controle com um CI 2x/dia. Se os sintomas não
forem adequadamente controlados com um CI, pode-se recorrer ao acréscimo
de BAAL. Não sendo os sintomas ainda adequadamente controlados, devem ser
consideradas doses mais altas de um CI e/ou terapias de controle alternativas.

CO

BAAL BAAL

BAAL
CI CI
Dose alta Dose alta
c¡ C¡
Dose baixa Dose baixa

BQ-agonista de ação curta conforme a necessidade de aliviar os sintomas


Leve e Leve e Moderada e Grave e Muito grave
intermitente persistente persistente persistente e persistente
FIGURA 138.1 Abordagem escalonada para o tratamento da asma de acordo com a gravidade da
doença e a capacidade de controlar os sintomas. CI, corticosteroides inalatórios; BAAL, pz-agonistas
de ação longa; C0, corticosteroides orais.
Doenças PulmonaresAmbientais CAPÍTULO 136 911

EXACERBAÇÕES DA ASMA
Manifestações clínicas
As exacerbações da asma consistem em períodos de piora aguda dos sintomas que
podem representar uma ameaça à vida. As exacerbações são desencadeadas comu-
mente por ITRS virais, embora outros desencadeantes também possam estar en-
volvidos. Com mais frequência, os sintomas consistem em aumento da dispneia,
sibilose opressão torácica. O exame físico pode revelar pulso paradoxal assim como
taquipneia, taquicardia e hiperinsuflaçãopulmonar. As provas de função pulmonar
revelam redução no VEF¡ e PFE, podendo resultar em hipoxemia; a Pco¡ em geral
é reduzida em razão da hiperventilação. Uma Pco¡ normal ou em elevação pode
indicar insuficiência respiratória iminente.

A base do tratamento nas exacerbações da asma são as altas doses de BAAC e os


corticosteroides sistêmicos. Os BAAC podem ser administrados por nebulizador
ou inalador com dosimetro junto com um espaçador; dosagens muito frequentes
(a cada 1 h ou menos) podem ser necessárias no inicio. Broncodilatadoresanti-
colinérgicos inalatórios podem ser acrescentados aos BAAC. Podem ser usados
corticosteroides injetáveis, como metilprednisolona(p. ex., 80 mg IV a cada 8 h),
mas também corticosteroides orais. O oxigênio suplementar deve ser fornecido
para manter uma saturação de oxigênio adequada (> 90%). Se ocorrer insuficiên-
cia respiratória, deve ser instituída ventilação mecânica com o devido cuidado de
minimizar as pressões nas vias respiratórias e auto-PEEP. Sabendo-se que as infec-
ções bacterianas raramente induzem a exacerbações da asma, os antibióticos não
devem ser administrados como rotina, a menos que haja sinais de pneumonia.
Em um esforço para tratar as exacerbações da asma antes de se tornarem
graves, os pacientes asmáticos devem receber planos de ação por escrito com
instruções para o autoinicio do tratamento com base nos sintomas respiratórios
e nas reduções no PFE.

Para uma discussão mais detalhada, ver Barnes PJ: Asma, Cap. 254, pág.
2101, do Medicina Interna de Harrison, 18g edição, AMGH Editora.

CAPTULO 139
Doenças PulmonaresAmbientais
A suscetibilidadea desenvolver muitas doenças pulmonares é influenciadapor fato-
res ambientais. Este capitulo concentra-se nas exposições ocupacionais e químicas
tóxicas. Entretanto, devem ser consideradas também várias exposições domésticas
não ocupacionais, como a exposição a fumaça de tabaco (câncer de pulmão), ao gás
radônio (câncer de pulmão) e ao cozimento de combustível de biomassa (doença

Você também pode gostar