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Índice
4 I. Alterações do Potássio
71 V. Proteinúria e Hematúria
Alterações
do Potássio
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ALTERAÇÕES DO POTÁSSIO
1- Conceitos Básicos
Dieta
K+ plasmático células
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β2-adrenergicos. É o principal mecanismo de adaptação às alterações rápidas da
concentração do K+.
3- Homeostasia renal do K+
1. Mineralocorticóides
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1. Mineralocorticóides
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Os mineralocorticóides estimulam a secreção de potássio pelas células do
ducto colector por três mecanismos principais:
a. Aumentam a concentração intracelular de potássio por estimulação directa
da bomba Na+/K+-ATPase.
b. Aumentam a permeabilidade da membrana apical da célula principal ao K+.
c. Estimulam a reabsorção do sódio na membrana apical, o que despolariza a
célula relativamente ao lúmen tubular, aumentando o gradiente eléctrico,
favorecendo a secreção de K+. A reabsorção do sódio pela membrana
apical é feita por um canal de Na+ sensível ao amilorido.
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excreção renal de K+ e o seu valor plasmático são independentes do volume arterial
efectivo.
Só em determinadas condições patológicas é que a aldosterona e a chegada
de sódio ao túbulo distal actuam da mesma forma, tais como os diuréticos (provocam
depleção de volume provocando estimulação do eixo renina-angiotensina-aldosterona,
e aumentam a excreção de sódio estimulando a secreção de potássio no túbulo
colector).
No hiperaldosteronismo primário o defeito está no aumento da secreção de
aldosterona, que provoca aumento da reabsorção de água e sódio e excreção de
potássio; a hipervolémia consequente provoca também um aumento da excreção de
água e sódio renal e a chegada de iões sódio ao túbulo distal, que potencia a excreção
de potássio. O resultado final é a hipocaliémia. No hipoaldosteronismo o contrário
acontece, há depleção de volume e retenção de potássio (pelo défice de aldosterona e
pela menor chegada do sódio ao túbulo distal).
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Hipocaliémia
1. Mecanismos de hipocaliemia
Causas de Hipocaliémia
Ingestão diminuída
Caquexia
Anorexia
Redistribuição celular
Alcalose metabólica ou respiratória
Aumento de insulina
β2-agonistas
Paralisia periódica hipocaliémica
Intoxicação por cloroquina
Perdas extra-renais
Diarreia
Uso de resina permutadora de iões
Uso de laxantes
Perdas cutâneas (queimaduras)
Perdas renais
Diuréticos tiazídicos ou de ansa
Excesso de mineralocorticoides
Síndrome de Liddle
Síndrome de Gittelman ou Bartter
Hipomagnesiemia
Poliúria
Fármacos (anfotericina B, L-dopa)
É uma causa rara de hipocaliémia. Numa dieta sem K+ o rim mantém uma
excreção constante de cerca de 5-25 mEq/dia de K+. Esta incapacidade de o rim
diminuir a excreção do K+ para quase zero poderá reflectir a prioridade em proteger o
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organismo da hipercaliémia, mas que em situações de ingestão muito diminuída
associada ou não a outros factores (ex. diuréticos), em que o consumo é inferior às
perdas, pode levar a hipocaliémia.
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As resinas permutadoras de iões são usadas frequentemente no tratamento da
hipercaliémia; do consumo abusivo destas substâncias pode resultar hipocaliémia,
hipomagnesiemia e ocasionalmente alcalose metabólica.
NOTA: Os vómitos causam por vezes hipocaliémia mas não se deve a perdas GI
porque a concentração de K+ nas secreções gástricas é baixa (5-10 mEq/L). Os
vómitos aumentam a excreção de bicarbonato, desta forma aumentando a chegada de
NaHCO3 ao túbulo colector. O aumento do sódio no túbulo colector e o aumento de
aldosterona (pela depleção de volume) provocam espoliação renal de K+.
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No síndrome de excesso aparente de mineralocorticóides os níveis de renina e
aldosterona estão suprimidos. Trata-se de uma doença rara, autossómica recessiva. O
receptor mineralocorticoide é capaz de se ligar ao cortisol e à aldosterona com a
mesma afinidade. Em situações normais a ligação do cortisol a este receptor é
impedida porque é rapidamente degradado pela enzima 11β-hidroxiesteroide
desidrogenase tipo 2. Nesta patologia a actividade desta enzima está diminuída
permitindo a activação persistente destes receptores pelo cortisol.
2. Manifestações Clínicas
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Manifestações clínicas da hipocaliémia aguda
3. Diagnóstico
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[K+] urina
Diarreia
Baixo – Normal
Alto [HCO3-]
Diuréticos
Vómitos 2+
↓ Mg
Bartter
Fig 4. Diagnóstico Gittelman
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5. Tratamento
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No tratamento da hipocaliémia severa (<3 mEq/L) ou sintomática (arritmias, fraqueza
muscular, rabdomiólise):
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Hipercaliémia
1. Pseudohipercaliémia
2. Mecanismos de hipercaliémia
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2.2. Diminuição da Excreção renal
A- Doença Renal
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A heparina parece reduzir a secreção de aldosterona por inibição directa
glandular. A hipercaliémia pela heparina só é evidente quando existe um distúrbio
adicional, por exemplo, insuficiência renal.
Fig 4. Fármacos que interferem no sistema renina-angiotensina-aldosterona podendo desta forma alterar
a concentração de potássio plasmático.
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3. Manifestações Clínicas
Alterações electrocardiográficas
o Ondas T altas e pontiagudas
o Desaparecimento da onda P
o Alargamento do QRS
o Paragem cardíaca
4. Diagnóstico
5. Tratamento
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imediato englobando praticamente todas as abordagem descritas na seguinte
tabela:
Tratamento da hipercaliémia
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Cálcio
O cálcio antagoniza directamente as acções do K+ na membrana celular
cardíaca. O efeito é iniciado poucos minutos após a administração mas a duração de
acção também é curta (30 a 60 minutos), daí que esta terapêutica só está indicada nas
manifestações severas de hipercaliémia (arritmias) potencialmente letais não sendo
possível esperar 30 a 60 minutos até a insulina actuar.
O cloreto de cálcio tem o triplo da concentração de cálcio elementar do
gluconato de cálcio.
Doses:
- gluconato de cálcio: 10 mL de uma solução a 10% (1000 mg) infundida
durante 2-3 minutos sob monitorização cardíaca.
- cloreto de cálcio: 5-10 mL de uma solução a 10% (500 a 1000 mg) infundida
durante 2-3 minutos sob monitorização cardíaca.
As doses podem ser repetidas após 5 minutos se as alterações no ECG
persistirem.
Dose:
-10 unidades de insulina de acção rápida em 500cc de Soro glicosado a 10%.
Perfusão durante 1 hora.
- Alternativa: bólus de 10U de insulina seguida da administração de 50mL de
glicose a 50%. Este regime promove uma descida mais eficaz dos níveis de K+, no
entanto a hipoglicemia ocorre em cerca de 75% dos pacientes tipicamente 1 hora
após. Para evitar pode-se proceder à perfusão contínua de SG a 10% a 50-75 mL/h
com monitorização frequente dos níveis de glicemia.
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Agonistas beta-2 adrenérgicos
São eficazes na redução da concentração do K+ em cerca de 0,5 a 1,5 mE/L.
Habitualmente usa-se o salbutamol em concentrações cerca de 10 vezes superiores
às usadas como broncodilatador. O pico do efeito ocorre 90 minutos após a
nebulização.
Dose:
- Nebulização com 5-10 mg de salbutamol em 4cc de SF durante 10 minutos.
Bicarbonato de sódio
Este fármaco tem uma eficácia limitada, e portanto, não está recomendada a
sua administração como único tratamento nos doentes com acidose ligeira ou
moderada. Nos doentes com doença renal crónica avançada não tem mesmo efeito na
redução das concentrações do K+.
Deve ser usado quando coexiste acidose metabólica grave.
Dose:
- 50 mmoL endovenoso durante 5 minutos (precaução nos doentes
hipervolémicos)
Remoção do potássio
Diuréticos
O seu uso apenas tem interesse nas situações de hipercaliémia crónica
sobretudo se houver concomitantemente doença renal crónica.
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Dose: oral – 15g 3x/dia,
enema (se a via oral não é possível) – 50g em 150cc de água à
temperatura corporal, permanecendo pelo menos 30 a 60 min. O enema pode
ser repetido a cada 2-4 horas.
Diálise
Se as medidas já mencionadas forem ineficazes, se a hipercaliémia é severa e
se espera um aumento da concentração de potássio deve-se fazer hemodiálise. Com
a hemodiálise consegue-se remover cerca de 25 a 50 mEq de K+ por hora.
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II.
Alterações
do Sódio
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SÓDIO
BALANÇO DE ÁGUA
As membranas celulares são permeáveis à água e a manutenção da água dentro das células
depende da relação entre os solutos (proteínas, fosfatos, sódio, potássio) intracelulares e
extracelulares.
Uma partícula osmoticamente activa não atravessa livremente as membranas celulares e retém
água no local onde se encontra (intracelular, extracelular ou intravascular). O potássio e fosfatos
são as principais osmóis efectivos intracelulares enquanto que o sódio é o do espaço extracelular.
A água desloca-se livremente entre os vários compartimentos corporais de forma a manter a
osmolaridade sérica igual em todos os compartimentos.
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Mecanismos para manutenção da osmolaridade plasmática
Retirado Comprehensive Clinical Nephrology
HIPONATRÉMIA
Sódio <135meq/L
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A hiponatrémia representa um excesso relativo de água em relação ao sódio e pode estar
associada a tonicidade baixa, normal ou aumentada.
Em contraste com a resposta de indivíduos normais, os doentes que desenvolvem hiponatrémia
tipicamente tem uma incapacidade de excretar água, na maior parte das vezes, devido a uma
supressão insuficiente da secreção de ADH. A diminuição da perfusão tecidular é um potente
estímulo para a secreção de ADH e a redução do volume circulante efectivo pode ocorrer em
duas situações: depleção real do volume ou em doentes edemaciados (insuficiência cardíaca,
cirrose e síndrome nefrótico). Assim, a retenção de água e hiponatrémia podem ocorrer em
doentes com um distúrbio que cause redução do volume arterial efectivo.
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celulares (ex. ureia, etanol) estiverem retidos. As hiponatrémias não-hipotónicas podem ser:
hiponatrémias hipertónicas (ou translocacionais), hiponatrémias isotónicas ou
pseudohiponatrémias.
Pseudohiponatrémia
Ocorre em situações em que a concentração de sódio está artificialmente diminuída em
consequência da redução da fracção aquosa sérica por aumento de proteínas (mieloma múltiplo)
ou de lípidos. A determinação directa da concentração de sódio através de eléctrodos ião-
específicos eliminou quase por completo este artefacto.
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Abordagem diagnóstica de hiponatrémias
Achados no SIADH
o Osmolaridade sérica diminuída
o Osmolaridade urinária inapropriadamente elevada (acima de 100mosmol/kg e geralmente acima de
300mosmol/kg)
o Concentração do sódio urinário normalmente acima de 40meq/L
o BUN e acido úrico diminuídos
o Creatinina sérica normal
o Balanço acido-base e potássio sérico normais
o Funções tiroideia e adrenal normais
o Exclusão de uso de diuréticos
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níveis séricos de ADH tendem a variar com o grau de severidade destas situações, pelo que o
desenvolvimento de hiponatrémia é um sinal de mau prognóstico.
A hiponatrémia também pode ocorrer nos doentes com insuficiência renal crónica avançada.
Estes doentes podem parecer euvolémicos, mas se retêm sódio e água podem desenvolver
edema (hipervolémia)
Tratamento da hiponatrémia
A escolha do tratamento da hiponatrémia baseia-se na presença de sintomas neurológicos e na
causa e gravidade da hiponatrémia.
Em todos os doentes devemos seguir estas regras de segurança:
• Aumento do sódio sérico inferior a 10meq/L nas primeiras 24 horas
• Aumento do sódio sérico inferior a 18meq/L nas primeiras 48 horas
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doentes que parece não ter risco desta complicação são doentes com hiponatrémia hiperaguda
(corredores de maratona, doentes psicóticos, abuso de ecstasy) uma vez que, nestes casos, a
hiponatrémia desenvolveu-se num período de poucas horas devido à ingestão exagerada de água
e, por isso, o cérebro não teve tempo para desencadear os mecanismos de adaptação.
A desmielinização osmótica tipicamente ocorre nos doentes em que a concentração de sódio
aumentou mais de 10-12meq/L nas primeiras 24horas e mais de 18meq/L nas primeiras 48horas.
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A desmielinização osmótica afecta principalmente a ponte e daí também ser chamada de desmielinólise pôntica. Ocorre
em todas as idades. Os sintomas são bifásicos. Inicialmente há uma encefalopatia generalizada que se associa a uma
correcção demasiado rápida do sódio sérico. Dois a 3 dias após correcção surgem alterações comportamentais,
paralisia de nervos cranianos, fraqueza progressiva que culmina em tetraplegia e síndrome locked in. As lesões podem
não ter tradução imagiológica até duas semanas após o início do evento.
A maioria dos doentes com hiponatrémia tem uma evolução crónica apresentando um sódio
sérico acima dos 120meq/L e encontrando-se assintomática (em alguns doentes podem estar
presentes anormalidades neurológicas subtis quando o sódio sérico está entre 120 e 130meq/l). O
tratamento inicial tipicamente consiste na correcção lenta da hiponatrémia através da restrição
da ingestão de água ou soro isosalino ou diurético de ansa dependendo da situação. Em estados
edematosos (cirrose, ICC, síndrome nefrótico) e de SIADH (excepto em situações de hemorragia
subaracnoideia uma vez que a restrição de líquidos pode agravar o vasospamo), a restrição de ingestão de
líquidos é a primeira medida para correcção da hiponatrémia. Em geral, a ingestão de líquidos
diária deve ser inferior a 800ml. Se necessário podem utilizar-se diuréticos de ansa. No SIADH
pode, também, associar-se suplementos orais de sódio. Em casos de depleção de volume utiliza-
se soro fisiológico.
A maioria dos doentes com depleção de volume deve ser tratada com soro fisiológico pois, após
a normalização volémica, a libertação de ADH é adequadamente suprimida; isto pode conduzir a
uma correcção demasiado rápida da hiponatrémia ao se utilizarem soros hipertónicos. Deve
sempre respeitar-se as regras de segurança e as determinações do sódio sérico cada 2-3horas.
Se o doente apresenta sintomas de hiponatrémia grave (convulsões, doentes com lesões intra-
cerebrais que não toleram graus ligeiros de edema cerebral) é necessário uma intervenção
urgente com soro hipertónico (3%). Um regime eficaz é um bólus de 100ml de soro hipertónico
(pode aumentar o sódio sérico entre 1,5 a 2meq/L) reduzindo o edema cerebral. Se os sintomas
neurológicos persistem ou agravam-se, um novo bólus pode ser administrado (máximo 3 bólus
espaçados de 10min). Após este esquema inicial pode iniciar-se correcção com soro hipertónico
em administração contínua (1 a 2ml/h por quilo). A taxa de correcção nas primeiras horas pode,
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no máximo, atingir 2mmol/L e deve-se sempre respeitar as regras de segurança e as
determinações do sódio sérico cada 2-3horas. Nestes casos, não esquecer o uso de anti-
convulsivantes e a protecção da via área.
HIPERNATRÉMIA
Sódio >145meq/L
A hipernatrémia é um problema relativamente comum e pode ter origem na administração de
soros hipertónicos ou, muito mais vulgarmente, pela perda de água livre. Contudo, raramente a
ingestão de sal e a perda de água resultam em hipernatrémia, isto porque a elevação da
osmolaridade sérica estimula a libertação de hormona antidiurética e a sede, o que vai minimizar
a perda e aumentar a ingestão de água conduzindo a uma diminuição do sódio sérico. Assim, a
hipernatrémia é observada essencialmente em pessoas que não expressam sede: crianças e
adultos com alterações do estado mental. Os idosos são aqueles que parecem ter maior limitação
na ingestão de água devido a alterações mentais, grau de dependência e, por outro lado, por
aparente estimulação osmótica diminuída cujo mecanismo é desconhecido. Os doentes
hospitalizados, quer sejam jovens ou idosos, podem tornar-se hipernatrémicos como resultado
de uma prescrição inadequada de fluidos ou alteração do mecanismo da sede. Para além disso,
muitos idosos hospitalizados têm depleção de volume devido a perdas de água e sódio
secundárias a diuréticos, vómitos e diarreia. Em contraste, um doente ambulatório que se
encontre consciente, que não tenha sede e que apresenta um sódio sérico superior a 150meq/l
tem com certeza uma lesão hipotalâmica.
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Alteração do estado mental
Diabetes mellitus não controlada
Distúrbios poliúricos
Adapatado Comprehensive Clinical Nephrology
Hipernatrémia hipovolémica
Os doentes com hipernatrémia hipovolémica tem perdas sustentadas de água e sódio, mas com
uma perda relativamente maior de água. No exame objectivo tem sinais de hipovolémia
(hipotensão ortostática, taquicardia, veias colapsadas, diminuição do turgor cutâneo e, as vezes
alterações mentais). Estes doentes têm, geralmente, perdas hipotónicas pelos rins ou pelo tracto
gastrointestinal.
Hipernatrémia hipervolémica
A hipernatrémia com aumento do sódio corporal total é a forma menos comum de
hipernatrémia. Resulta da administração de soluções hipertónicas como NaCla3% (intra-amniótico
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-abortamentos, para tratamento de acidose metabólica, hipercaliémia e paragem cardio-
respiratória) e comprimidos de sódio.
Hipernatrémia euvolémica
A maior parte dos doentes com hipernatrémia secundária a perda de água estão euvolémicos
com sódio corporal total normal porque a perda de água sem sódio não provoca contracção de
volume. A perda de água por si só não provoca hipernatrémia a não ser que seja acompanhada
de diminuição da ingestão de água. Dado que a hipodipsia é pouco comum, a hipernatrémia
normalmente desenvolve-se em pessoas que não têm acesso á água (crianças, idosos
dependentes, hospitalizados). A defesa contra o desenvolvimento de hiperosmolaridade requer
a estimulação apropriada da sede e a capacidade de beber água.
As perdas de água extra-renais ocorrem através da pele e tracto respiratório/ gastrointestinal.
As perdas de água renais que conduzem a hipernatrémia euvolémica resultam de um defeito na
produção ou libertação da ADH (diabetes insipidus central) ou uma falência do túbulo colector
em responder ao estímulo da ADH (diabetes insipidus nefrogénica).
Manifestações clínicas
Tal como na hiponatrémia, as manifestações clínicas de hipernatrémia reflectem essencialmente
o comprometimento do sistema nervoso central e são mais notórias quando a concentração de
sódio é muito elevada ou ocorre rapidamente (período de horas).
A “desidratação” cerebral induzida pela hipernatrémia pode causar ruptura vascular, com
hemorragia cerebral subaracnóideia e lesões neurológicas permanentes ou morte. Se a
hipernatrémia se desenvolve lentamente o cérebro tem capacidade de se adaptar, primeiro
através da entrada de electrólitos para as células e, posteriormente, pela acumulação nas células
cerebrais de solutos orgânicos que retêm água. Se a hipernatrémia se desenvolve rapidamente,
este mecanismo adaptativo não é activado oportunamente e surgem sintomas.
A maioria dos doentes não hospitalizados são crianças ou idosos. Os sintomas mais frequentes
nas crianças são taquipneia, fraqueza muscular, irrequietude, insónia, letargia e mesmo coma.
Geralmente não ocorrem convulsões excepto em caso de sobrecarga inadvertida de sódio ou
rehidratação intensa. Ao contrário das crianças, os idosos geralmente têm poucos sintomas até
que o sódio exceda os 160mmol/L. Inicialmente pode estar presente sede intensa, mas esta
dissipa-se à medida que o distúrbio progride e está ausente em doentes com hipodipsia. O nível
de consciência correlaciona-se com a gravidade da hipernatrémia. Fraqueza muscular, confusão e
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coma são muitas vezes manifestações de patologias concomitantes, além da própria
hipernatrémia.
A hipernatrémia pode ocorrer em doentes hospitalizados de todas as faixas etárias. As
manifestações clínicas são ainda mais difíceis de valorizar quando existem alterações
neurológicas prévias. Tal como nas crianças, a administração rápida de sódio nos adultos pode
provocar convulsões e coma. A prescrição de soros em doentes hospitalizados deve ser revista
em intervalos regulares de acordo com o estado clínico do doente e os dados laboratoriais.
Tratamento da hipernatrémia
O tratamento da hipernatrémia implica a correcção da causa subjacente e administração de água
e soros, quando necessário.
Deve preferir-se, quando possível, a via oral para administração de fluidos. Se for necessária a
correcção por via parenteral, devem-se usar soros hipotónicos (soro glicosado a 5% ou soro
heminormal). Caso se trate de uma situação de hipernatrémia hipovolémica pode utilizar-se soro
fisiológico até correcção da volémia. Em situações de hipernatrémia hipervolémica, os diuréticos
de ansa estão indicados.
O ritmo de correcção deve ser proporcional ao ritmo de instalação da hipernatrémia e depende
da presença de sintomas neurológicos.
Em todos os doentes devemos seguir esta regra de segurança:
• Diminuição do sódio sérico inferior a 10meq/L nas primeiras 24 horas
• Diminuição do sódio sérico máxima de 2meq/L nas primeiras duas horas
É fundamental a determinação do sódio sérica cada 2-3horas numa primeira fase e o ritmo de
administração do soro deve ser tanto mais lento quanto mais hipotónico for o soro.
Bibiliografia
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Parikh C, Berl T. Disorders of Water Metabolism. Comprehensive Clinical Nephrology: 8:100-116
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III.
Alterações
do equilíbrio
ácido base
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ALTERAÇÕES DO EQUILÍBRIO ÁCIDO BASE
Objectivos:
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Neste capítulo propomos uma forma sistematizada de analizar e abordar um doente
com alteração do equilibrio ácido base:
História clinica
Antecipação dos desequilibrios ácido-base
Há perigo eminente?
Estado hemodinâmico
oxigenação
Electrólitos
A compensação é adequada?
As alterações do equilibrio ácido base podem ter na sua origem uma causa respiratória
ou metabólica (desequilíbrio primário).
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A hipoventilação de causa respiratória ou central, leva a uma retenção primária de CO2
e a consequente diminuição do pH. Daqui resulta uma acidose respiratória. A
compensação renal consiste no aumento de bicarbonato. A hiperventilação tem o efeito
oposto.
Quando há um aumento da produção de ácidos ou perda de bicarbonato o pH também
diminuí, resultando acidose metabólica. A compensação pulmonar consiste na
hiperventilação de forma a diminuir a Pa CO2.
A alcalose metabólica terá o efeito oposto, ou seja, hipoventilação e retenção de CO2.
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Níveis de compensação
Uma
regra simples para a acidose e alcalose metabólica é que a PaCO2 esperada é igual
aos 2 últimos dígitos do pH.
Quando a compensação não é a esperada, significa que há um distúrbio misto. Isto
pode acontecer por patologia respiratória ou renal associada que impede a
compensação ideal do dísturbio, ou se coexistem situações patológicas que
proporcionam mais que um distúrbio, por exemplo um doente com intoxicação alcoólica
e vómitos pode apresentar uma acidose metabólica (cetoacidose alcoólica) e uma
alcalose metabólica pelos vómitos.
É importante notar que a compensação respiratória ou renal do desequilíbrio não
conduz à correcção do valor do pH, portanto se tivermos uma alteração do HCO3- ou da
PaCO2, com pH normal, isso significa que há um distúrbio misto.
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ACIDOSE METABÓLICA
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Acidose Metabólica
Na Na 4 Bicabornato Na
Bicabornato
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Acidose metabólica com GAP normal Acidose metabólica com GAP aumentado
Hiperclorémica Normoclorémica
Ac. Metabólica com GAP aumentado Ac. Metabólica com GAP normal
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Conjugando o valor do GAP aniónico e os dados da história clinica, a etiologia da
acidose metabólica é clara na maioria dos casos.
A excepção, são as acidoses tubulares renais, que podem não ter uma história clinica
clarificadora. Estas acidoses são habitualmente moderadas (excepto a tipo I que pode
ser mais grave) e crónicas, permitindo uma análise mais atempada e detalhada para a
sua etiologia.
Segue-se um resumo das características principais de cada uma das acidoses
tubulares renais e das patologias associadas mais frequentes.
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Acidose tubular renal
Função
Normal Anormal
túbulo proximal
Aumentado Diminuído
2. Correcção da causa
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2.2. O tratamento das acidoses metabólicas com GAP normal faz-se corrigindo o
disturbio primário e administrando bicarbonato para repor o défice. O objectivo é
manter o HCO3- maior que 20mEq/L.
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ALCALOSE METABÓLICA
Objectivos:
Definição
Compensação respiratória
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Gastrointestinal
Vómitos
Drenagem gástrica
Tratamento com antiácidos
Renal
Diuréticos da ansa e tiazidas
Hipercalcémia
Hipocalémia
2. Ganho de HCO3-
Administração de bicarbonato
Pós-hipercapnia
3. Hiperaldosteronismo primário
Contracção de volume
Insuficiência renal
Deplecção de Cl- ou K+
PaCO2 elevada
Hiperaldosteronismo
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mecanismo mais importante, já que a diminuição da TFG isolada, como a
insuficiência renal crónica, habitualmente não cursa com alcalose.
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É o tipo mais comum. Normalmente a causa é a perda de ácido pelo tubo
digestive em consequência de vómitos ou drenagem gástrica. Estes doentes
apresentam aumento da reabsorção de bicarbonato no túbulo proximal em
resposta à deplecção de volume. A deplecção de volume leva ao aumento da
aldosterona que estimula a secreção de H+ e K+ no tubo colector, contribuindo
para perpetuar a alcalose.
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bicarbonato administrado contribui para o excesso de bicarbonato, podendo
provocar alcalose metabólica.
Alcalose pós-hipercápnia
Há perigo iminente?
Como está o K+?
Como está o pH?
Qual é a alteração primária?
A compensação é adequada?
Há aumento do gap aniónico?
NPNN 2020 52
Em seguida vamos calcular o gap aniónico. Se há aumento do gap aniónico,
calculamos a variação do bicarbonato. Se a variação do gap aniónico for maior
que a variação do bicarbonato é porque há acidose metabólica.
Na+
Cl- urina K+ urina pH urina
urina
NPNN 2020 53
O tratamento da alcalose metabólica deve considerar o tratamento da causa e
a correcção dos mecanismos que perpetuam a alcalose, ou seja corrigir o
défice de volume e Cl- e o défice de K+, o que começa pela administração de
soro fisiológico e cloreto de potássio.
A acetazolamida também pode ser usada nos doentes com edemas por cor
pulmonale e hipercapnia crónica. A correcção da alcalose é particularmente
importante nestes doentes porque o aumento do pH é em si próprio depressor
do centro respiratório. O uso de acetazolamida tem que ser cauteloso e
monitorizado de forma estricta pois pode agravar a acidose nestes doentes.
NPNN 2020 54
IV.
Exames
complementares
de diagnóstico
em Nefrologia
NPNN 2020 55
EXAMES
EXAMES COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO
COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO EM
EM NEFROLOGIA
NEFROLOGIA
A medição da TFG é complexa, morosa, e pouco exequível na prática clínica, pelo que esta
é habitualmente estimada a partir de marcadores séricos – TFG estimada (TFGe). O
marcador de filtração ideal para estimar a TFG seria um soluto que fosse livremente filtrado
no glomérulo, não tóxico, não secretado nem reabsorvido nos túbulos renais e não
modificado durante a excreção pelo rim.
O gold-standard de marcadores de filtração exógenos é a inulina, que se trata de uma
substância inerte fisiológica (polissacarídeo) que preenche os critérios enunciados
anteriormente. Sendo assim, a quantidade de inulina filtrada é igual à quantidade de inulina
excretada na urina, podendo ser medida.
NPNN 2020 56
TFG x SIn = UIn x V <-> TFG=(UIn x V)/SIn
SIn- concentração sérica de inulina UIn- concentração urinária de inulina V-volume de inulina
O clearance da inulina (Clin) reflecte com precisão a TFG, mas não é usado na prática
clínica por ser complicado, moroso e caro.
As últimas duas equações (MDRD e CKD-EPI) têm sido crescentemente utilizadas. Tanto a
medida do clearance de creatinina como as equações para estimativa da TFG usadas
na prática clínica usam a creatinina como marcador de função renal.
A creatinina deriva do metabolismo da creatina no músculo esquelético e da ingestão diária
de carne, sendo libertada na circulação a uma taxa relativamente constante. É livremente
filtrada pelo glomérulo e não é reabsorvida nem metabolizada pelo rim, mas cerca de 10-
40% da excreção da creatinina urinária é derivada da secreção tubular.
A SCr apresenta limitações como marcador da TFG, o que obriga a uma interpretação
cautelosa dos resultados de acordo com as características do doente, em particular
de acordo com a massa muscular e estado nutricional. Como exemplos:
- A relação entre a TFG e a SCr é dependente da produção de SCr, que é função da massa
muscular do doente. Assim, um mesmo valor SCr representa TFG muito diferentes num
jovem de 80Kg ou numa idosa de 40Kg.
- A destruição muscular está associada a aumento desproporcional da SCr, com
consequente redução da TFG estimada mas não se traduzindo necessariamente em
alteração verdadeira da TFG (risco de subestimar TFG).
- Nos doentes desnutridos ou com insuficiência hepática pode ocorrer uma diminuição da
produção de creatinina levando a valores de SCr anormalmente baixos (risco de
sobrestimar TFG).
NPNN 2020 57
A forma da curva que relaciona a TFG com a SCr tem uma importante implicação clínica:
na doença renal ligeira (TFG> 60ml/min/1,73m2) um declínio significativo na TFG pode
conduzir apenas a um discreto aumento na SCr, enquanto na doença renal avançada um
pequeno declínio da TFG corresponde a um aumento marcado na SCr. Isso acontece
porque à medida que a TFG cai até valores de ~60ml/min/1,73m2 ocorre aumento
progressivo da secreção tubular de creatinina.
O resultado é que doentes com TFG de ~60 ml/min/1,73m2 (medidas pelo clearance de um
marcador de filtração verdadeiro como a inulina) podem continuar a ter uma creatinina
sérica ≤1 mg/dl. Assim, uma SCr de valor normal ou próximo do normal (SCr<1,5mg/dl)
relativamente estável não implica necessariamente que a doença renal esteja estável. No
entanto, quando a SCr é superior a 1,5-2,0 mg/dl, o processo secretor está efectivamente
saturado, a partir daí, um pequeno declínio da TFG corresponde a um aumento marcado na
SCr, logo um valor estável de SCr representa habitualmente uma TFG estável.
A SCr só deve ser usada para estimar a TFG em doentes com função renal estável,
altura em que a excreção de creatinina iguala a produção de creatinina. Quando há redução
da TFG, há retenção de creatinina com consequente aumento progressivo do seu nível
sérico até a creatinina filtrada voltar a ser igual à excretada. Daí que a SCr só deva ser
usada para estimar a TFG em doentes com função renal estável.
NPNN 2020 58
Há dois erros major que podem limitar a precisão do ClCr:
Uma colecção de urina das 24h incompleta
A colecção correcta pode ser avaliada pela excreção diária de creatinina, que deve
ser de 20-25mg/Kg de massa corporal magra no homem e 15-20mg/kg na mulher.
Se a quantidade de creatinina na amostra de urina das 24h for inferior ao valor
calculado, significa que foi efectuada uma colheita incompleta.
Aumento da secreção de creatinina
O aumento na secreção de creatinina à medida que a TFG desce pode limitar a
interpretação do ClCr. Como exemplo, se a TFG cair para um valor entre 80 a
60ml/min/1,73m2 e a quantidade absoluta de creatinina secretada aumentar em
mais de 50%, a secreção de creatinina corresponderá a mais de 35% da creatinina
urinária. Sendo assim, em alguns doentes com doença renal crónica, a excreção de
creatinina pode ser muito maior que a carga filtrada, resultando numa sobrestimação
significativa da TFG quando o clearance de creatinina é usado para avaliar o nível
de TFG.
A equação de Cockcroft-Gault (CG) é uma das equações mais usadas, mesmo entre os
idosos, embora tenha sido originalmente derivada sobretudo a partir de indivíduos jovens.
Esta equação permite estimar o ClCr, que não é igual à TFG, dado o efeito da secreção
tubular de creatinina. Além disso, esta equação não está ajustada à superfície de área
corporal, usando em vez disso o peso corporal como “substituto” da massa muscular.
Sendo assim, sobrestima o clearance de creatinina nos estados edematosos e tem mau
desempenho nos indívíduos com peso corporal extremo.
Estudos revelam que a equação CG subestima a TFG nos idosos (>65anos), especialmente
para valores mais altos de TFG. Contudo, a maioria dos valores estimados por esta
equação não divergem mais do que 30% do valor da medição da TFG, o que é um
desempenho aceitável e superior à SCr isoladamente.
NPNN 2020 59
A equação MDRD study foi desenvolvida usando a informação de 1628 doentes
(recrutados para o MDRD study), de meia-idade com TFG inferior a 60ml/min/1,73m2, não
diabéticos, para a estimativa da TFG ajustada à área de superfície corporal. Tem sido
recomendada pelo KDOQI Study Group para diagnóstico e classificação da doença renal
crónica (DRC).
Fórmula MDRD TFG, em mL/min per 1.73m2= 175 x SCr (exp(-1,154)) x idade
(exp(-0,203)) x (0,742 se sexo feminino) x (1,21 se raça negra).
A equação CKD-EPI foi desenvolvida para fornecer uma estimativa mais precisa da TFG
em indivíduos com TFG normal ou próxima do normal (≥ 60mL/min/1,73m2). Nos restantes
doentes (TFG ≤ 60mL/min/1,73m3) esta equação tem uma precisão semelhante à da
MDRD. Actualmente sugere-se o uso da equação CKD-EPI.
Fórmula CKD-EPI
Vantagens - Ajustada à area de superfície corporal (ao contrário da CG);
- Adequa-se melhor a níveis de TFG superiores (≥
60mL/min/1,73m2) e a subgrupos definidos por sexo, raça,
diabetes, status transplante, nos idosos e em níveis elevados de
índice de massa corporal.
Desvantagens - Menor precisão em doentes com baixa TFG e com baixos
NPNN 2020 60
índices de massa corporal (IMC<20Kg/m2) – MDRD superior
nestes casos.
Exemplo de sites www.kidney.org/professionals/kdoqi/gfr_calculator.cfm.
disponíveis para
cálculo por esta
fórmula
O BUN (blood urea nitrogen), embora varie inversamente com a TFG, é geralmente
menos útil que a creatinina sérica dado que também varia independentemente da TFG.
- A taxa de produção de ureia não é constante, aumentando com a elevada ingestão
proteica e com aumento do catabolismo muscular devido a hemorragia, trauma ou terapia
com glucocorticóides.
- Aproximadamente 40-50% da ureia filtrada é passivamente reabsorvida no TCP.
- Na depleção de volume há aumento da reabsorção proximal de água e sódio e
aumento simultâneo na reabsorção de ureia.
A medição do clearance da ureia é útil apenas na DRC avançada (por exemplo, com
SCr>2,5mg/dl). Nesses doentes, o clearance de ureia subestima significativamente a TFG e
o clearance de creatinina sobrestima a TFG, logo um método para estimar a TFG é a média
dos clearances de creatinina e de ureia (Estimativa da TFG= (CCr+CUr)/2).
NPNN 2020 61
Contudo, a análise sanguínea para a cistatina C não está universalmente disponível e pode
ser dispendiosa.
O exame de urina é um teste básico para avaliar a doença renal. É acessível, não invasivo
e informativo. Deve ser pedido sempre que se suspeite de doença renal. A amostra de
urina deve ser apropriadamente colhida para permitir a obtenção de achados fidedignos
e maximizar a sua utilidade diagnóstica:
- Evicção de exercício físico extenuante nas 72h prévias à colheita, para evitar a
proteinúria, hematúria ou cilindrúria induzidas pelo exercício.
- Na mulher, a colheita não deve ser efectuada durante a menstruação.
- Lavagem cuidadosa dos orgão genitais externos.
- Usar a primeira ou segunda amostra de urina da manhã;
- A amostra deve ser examinada à temperatura ambiente até 2 horas após colheita.
Se isso não for possível, as amostras devem ser refrigeradas a 2 a 8º celsius.
NPNN 2020 62
de metileno (urina azul), metronidazol, metildopa e cilastatina-imipenem (urina
escura com o tempo).
A alimentos: beterraba (urina vermelha), ruibarbo (urina amarelo-acastanhada ou
vermelha) e carotenos (urina castanha).
A urina é normalmente transparente. Pode tornar-se turva devido ao aumento da
concentração de qualquer partícula na urina. As causas mais frequentes de turbidez são
infecção, hematúria marcada e contaminação por secreções genitais.
O odor da urina é normalmente sui generis. Nas infecções pode haver um odor fétido devido
à produção de amónia, enquanto que na presença de corpos cetónicos na urina está
habitualmente presente um odor frutado.
2.2.1 pH da urina
A concentração de iões hidrogénio na urina, medida como pH, reflecte o grau de
acidificação da urina. O pH urinário varia de 4,5 a 8, dependendo do equilíbrio ácido-base
sistémico. A resposta renal apropriada à acidémia é aumentar a excreção urinária de
ácidos, com o pH urinário a cair abaixo dos 5. Um valor alto de pH pode indicar a presença
de acidose tubular renal.
2.2.2 Gravidade específica
A densidade relativa pode variar de 1,000 a 1,060. Um valor de 1,000-1,003 é consistente
com diluição urinária marcada (ex. diabetes insípidus), um valor de 1,010 corresponde a
uma urina isostenúria dado à sua gravidade específica e osmolalidade serem semelhantes
à do plasma, sendo observado em condições nas quais a concentração urinária está
comprometida (ex. necrose tubular aguda e doença renal crónica); e um valor >1,040 quase
sempre indica a presença de algum agente osmótico extrínseco (ex. agentes de contraste).
2.2.3 Detecção do heme
Uma tira-teste positiva para heme pode resultar não só de hemoglobina livre ou mioglobina
livre, mas também de hematúria (heme originário de eritrócitos intactos). Sendo assim, uma
tira-teste positiva para heme não estabelece a presença de eritrócitos na urina, e o
diagnóstico de hematúria requer confirmação por microscopia.
2.2.4 Glucose
NPNN 2020 63
A glucose é detectada por tira-teste em concentrações de 0,5-20g/L. Os falsos positivos
podem resultar da presença de detergentes oxidantes (lixívia) e os falsos negativos de ITU.
2.2.5 Proteínas (albumina)
Uma proteinúria fisiológica não excede 150mg/24h em adultos. As tiras-teste são altamente
sensíveis para albumina, mas apenas para albuminúria na faixa ≥300mg/dia, enquanto
apresentam uma sensibilidade muito baixa para outras proteínas como proteínas tubulares
e cadeias leves de imunoglobulinas.
Ocorrem falsos positivos na presença de urina pigmentada (hemoglobinúria, mioglobinúria,
hematúria) e na presença de urina alcalina. Podem ocorrer falsos negativos na presença de
urina muito diluída.
Trata-se de apenas uma medida semi-quantitativa da albumina na urina, pelo que pode ser
requerida a quantificação precisa da proteinúria. Para tal, recorre-se a um de 2 métodos:
- Proteinúria na urina de 24h: continua a ser o método gold standard.
- Ratio proteína-creatinina numa amostra ocasional de urina: é uma alternativa
prática à colecção de urina das 24h, uma vez haver uma forte correlação entre o resultado
dos dois exames. Contudo, embora um ratio proteina-creatinina seja suficiente para excluir
proteinúria patológica, um ratio elevado deve ser confirmado e quantificado com a colecção
de urina das 24h.
2.2.6 Detecção de esterase leucocitária
A esterase leucocitária é libertada por neutrófilos e macrófagos lisados e é um marcador da
presença de leucócitos. Pode ser positiva quando a microscopia é negativa, quando os
leucócitos são lisados. A lise leucocitária pode ocorrer devido a baixa densidade (urina
excessivamente diluída), pH alcalino e demora na entrega da amostra da urina para análise.
Ocorrem falsos positivos quando é usado formol como produto para preservação da urina.
A piúria (leucócitos na urina) está frequentemente associada a bacteriúria.
2.2.6 Nitritos
A tira-teste para nitritos detecta bactérias que reduzem nitratos a nitritos, pela actividade da
enzima nitrato reductase. Essa enzima está presente em várias enterobacteriaceae, que
frequentemente são causa de ITU. Contudo, bacteriúria ou ITU podem estar presentes na
ausência de positividade para nitritos.
2.2.7 Corpos cetónicos
A tira-teste avalia ainda a presença de acetoacetato e acetona que são excretados na urina
durante cetoacidose diabética, jejum, vómitos ou exercício extenuante.
NPNN 2020 64
O exame microscópico do sedimento urinário é uma parte essencial do exame de urina,
uma
vez que permite a confirmação e clarificação dos achados da tira-teste e permite a
identificação de estruturas que não são avaliáveis pela tira-teste. O sedimento urinário pode
conter células, lípidos, cilindros, cristais, microorganismos e contaminantes.
Para a realização do exame do sedimento urinário, são centrifugados pelo menos 10ml de
urina durante 5 minutos.
2.3.1 Células
NPNN 2020 65
uroepiteliais uroepitélio que cobre o tracto litíase, obstrução, stents ureterais,
urinário dos cálices à bexiga algaliação prolongada.
nas mulheres, e à uretra
proximal nos homens.
Células Origem na uretra ou genitália Contaminação por secreções genitais.
escamosas externa.
2.3.2 Lípidos
Os lípidos na urina são típicos de doenças glomerulares associadas a proteinúria na faixa
nefrótica.
2.3.3 Cilindros
Os cilindros são estruturas cilíndricas que são formadas no lúmen tubular (tubo contornado
distal e ductos colectores). Vários fatores favorecem a formação de cilindros: estase
urinária, pH baixo e aumento da concentração urinária. Os cilindros assumem a forma e o
tamanho do túbulo no qual são formados.
Todos os cilindros têm uma matriz orgânica composta primariamente pela glicoproteína de
Tamm-Horsfall, que constitui a arquitectura básica de qualquer cilindro. Os cilindros são
definidos pela natureza das células ou outros elementos que estejam fixados na matriz do
cilindro. Alguns cilindros podem ser encontrados em indivíduos normais.
NPNN 2020 66
células tubulares renais)
Finos (resultam da agregação de
proteínas dentro da matriz do
cilindro).
Céreos - Aparecem na doença renal crónica.
(Parecem feitos de cera; em geral grandes
e largos)
Eritrocitários - Hematúria glomerular, sugerindo GN
subjacente
Leucocitários - Indicam inflamação renal, que pode ser
infecciosa (pielonefrite) ou não infecciosa
(GN proliferativa, nefrite interticial).
De células epiteliais tubulares renais - Ocorrem em qualquer quadro onde ocorra
descamação do epitélio tubular.
2.3.4 Cristais
A correta identificação de cristais na urina requer conhecimento da morfologia dos cristais,
do pH urinário, e aparência sob luz polarizada. Várias formas diferentes podem ser
observadas em doentes saudáveis e em doentes com alterações definidas:
Cristais de ácido úrico
Cristais de fosfato de cálcio ou de oxalato de cálcio
Cristais de cistina: Apresentam forma hexagonal característica; são diagnósticos de
cistinúria.
Cristais de fosfato de magnésio-amónio (estruvite) e de carbonato de cálcio (apatite)
são constituintes dos cálculos de estruvite.
A observação de cristais na urina é útil em doentes com litíase renal suspeita ou conhecida
e é um fator de risco para formação recorrente de cálculos.
Os cristais de ácido úrico, oxalato de cálcio e fosfato de cálcio são comuns e podem não ter
importância clínica uma vez que podem refletir supersaturação transitória da urina devido à
ingestão de alguns alimentos (carne, espinafres/ chocolate, ou lacticínios, respetivamente)
NPNN 2020 67
ou a desidratação ligeira. Alguns cristais são sempre patológicos como é o caso dos de
cistina, que são marcadores de cistinúria.
Um grande número de estudos imagiológicos são usados para avaliar o paciente com
doença renal.. Os estudos imagiológicos usados incluem: ecografia, radiografia simples do
abdómen, tomografia axial computorizada (TAC), ressonância magnética (RMN), urografia
intravenosa (UIV), angiografia renal e venografia renal, pielografia retrógrada ou
anterógrada, cistouretrografia e cintigrafia renal (radionuclídeos em medicina nuclear).
Dada a sua segurança, facilidade de uso, informação fornecida e baixo custo, a ecografia
renal é o exame imagiológico mais frequentemente usado em doentes com doença renal.
Ecografia renal
Ecografia renal é o exame de escolha para excluir obstrução do tracto urinário, pois na
maioria dos doentes afectados detecta hidronefrose e, em muitos casos, identifica a causa
(cálculos, massas renais). Dado não necessitar de agentes de contraste, evita as
complicações tóxicas e alérgicas associadas.
A ecografia é frequentemente usada para avaliar o tamanho, a forma e a diferenciação
parenquimo-sinusal dos rins. Rins de pequenas dimensões e aumento da ecogenicidade
estão associados a DRC.
Embora menos sensível que a TAC, pode ser útil na diferenciação entre um simples quisto
benigno de um quisto mais complexo ou de um tumor sólido. Também é comummente
utilizada para rastrear e diagnosticar doença renal poliquística.
O Doppler renal permite a avaliação do fluxo vascular renal, determinante em casos de
trombose da veia renal, enfarte renal e estenose da artéria renal.
A ecografia é um exame altamente dependente do operador. As limitações da ecografia
renal são a não visualização do sistema colector, incapacidade de distinguir uma dilatação
obstrutiva de uma não obstrutiva e dificuldade em avaliar anormalidades não litiásicas do
aparelho urinário (neoplasias, coágulos, necrose papilar).
NPNN 2020 68
TAC
Frequentemente fornece informação complementar à obtida por ecografia. Distingue quistos
renais simples de complexos, identifica neoplasias e diagnostica alterações da vasculatura
renal (angioTAC). Além disso, a TAC não contrastada é o gold standard para diagnóstico
imagiológico de cálculos renais.
RMN
RMN é o gold-standard para o diagnóstico de trombose da veia renal (angioRMN), a par
com a venografia renal e com a TAC, e tem um papel fundamental na avaliação de doentes
com suspeita de hipertensão renovascular em detrimento da angiografia renal.
Contudo, é recomendado que o gadolínio seja evitado em doentes com TFG
<30mL/min/1,73m2 dado o risco marcado de fibrose sistémica nefrogénica.
Angiografia renal
Esta é usada menos frequentemente dada a disponibilidade de testes não invasivos como
TAC ou RMN. Actualmente, a angiografia é realizada mais frequentemente para
intervenções terapêuticas, tais como embolectomia, angioplastia e colocação de stents,
precedida por angiografia diagnóstica para avaliar possível estenose das artérias renais.
Contudo, continua útil em certos quadros como em doentes com suspeita de poliarterite
nodosa, demonstrando múltiplos aneurismas e constrições irregulares em grandes vasos.
NPNN 2020 69
contraste e é realizada quando a pielografia retrógrada não é possível. Tanto a pielografia
retrógrada como anterógrada são exames invasivos pelo que só devem ser realizados
quando os outros estudos são inadequados.
Cistouretrografia
Uma cistografia é obtida quando é requerida avaliação radiográfica mais detalhada da
bexiga. A cistografia miccional é realizada para avaliar a função da bexiga e a anatomia da
uretra. É colocado um catéter na bexiga e a urina é drenada; é infundido material de
contraste e a bexiga é preenchida sob controlo fluoroscópico.
Cintigrafia renal
Utiliza radioisótopos como technetium Tc-99m succimer (DMSA) destinados a acumularem-
se em tecidos ou orgãos com base na função subjacente desse tecido ou orgão, fornecendo
informação acerca da anatomia e da função do órgão em estudo. Possibilita a detecção
precoce de refluxo vesicouretral e cicatrizes (é mais sensível que a UIV a detectar cicatrizes
renais). É o exame escolhido para avaliação de transplantes renais e da obstrução funcional
(especialmente quando a ecografia é equívoca).
NPNN 2020 70
V.
Proteinúria
e Hematúria
NPNN 2020 71
Proteinúria e hematúria
1. Proteinúria
Nos adultos a excreção urinária normal de proteínas é inferior a 150mg/24h.
Destas, a mais abundante é a proteína de Tamm-Horsfall, que é secretada a nível das
células tubulares renais. A albumina (<10mg/24h) assim como outras proteínas
(imunoglobulinas, cadeias leves e outras) estão também presentes, mas em muito
pequena quantidade.
Medição da proteinúria
NPNN 2020 72
A microalbuminúria (ou albuminúria moderadamente aumentada, como tem
sido mais recentemente designada) corresponde a uma excreção aumentada de
albumina na urina, mas em quantidade inferior ao limiar de deteção das tiras-teste. A
excreção normal de albumina é inferior a 10mg/dia. Um teste é positivo se revelar
valores entre 30 a 300 mg/dia. Em pessoas com Diabetes Mellitus, isto permite a
identificação de risco aumentado de nefropatia diabética estabelecida e, na população
geral, de risco aumentado de DRC, morbilidade cardiovascular e mortalidade global. A
pesquisa de microalbuminúria pode ser também efetuada através da razão
albumina:creatinina numa amostra de urina ocasional. Neste caso, por exemplo, um
resultado de 100 mg/g é equivalente a 100 mg/dia de albuminúria.
Etiopatogenia
A proteinúria pode ter causa glomerular, tubular, pós-renal ou ser por overflow.
(tabela 1)
NPNN 2020 73
serem pequenas, são livremente filtradas, excedendo a
capacidade de reabsorção normal dos túbulos
• Ex: cadeias leves no mieloma múltiplo (proteinúria de Bence
Jones)
• As tiras-teste são negativas
Pós-renal
• Resulta da inflamação do trato urinário (ex.: ITU, nefrolitíase,
tumores)
• Constituída por IgA, IgG
NPNN 2020 74
nomeadamente identificando a presença de doenças sistémicas com envolvimento
renal. Nas doenças glomerulares primárias só a biopsia renal permite o diagnóstico
preciso da lesão glomerular subjacente.
Síndrome nefrótico
O síndrome nefrótico é caracterizado pela presença de proteinúria maciça
(>3.5g/24h) acompanhada por hipoalbuminemia, edema, hiperlipidemia e lipidúria. A
presença de síndrome nefrótico é patognomónica de doença glomerular que pode ser
primária ou secundária à presença de uma doença sistémica.
SN secundário
• Nefropatia Diabética
• Amiloidose
• Doenças auto-imunes (ex.: LES)
• Infeções (Hepatite B, Hepatite C, HIV)
• Neoplasias (mama, pulmão, trato GI)
NPNN 2020 75
focal e segmentar e a doença das lesões mínimas. No síndrome nefrótico de causa
primária a realização de biópsia renal é mandatória, permitindo estabelecer o
diagnóstico etiológico, o prognóstico e a terapêutica.
Das causas de síndrome nefrótico secundário, sem dúvida a mais frequente é a
nefropatia diabética. Outras doenças que podem cursar com síndrome nefrótico são a
amiloidose, doenças do tecido conjuntivo (LES, AR), infeções crónicas (hepatite B,
HIV) e neoplasias (adenocarcinomas, linfoma de Hodgkin).
O tratamento dos doentes com síndrome nefrótico envolve, por um lado, o
tratamento das complicações do síndrome e, por outro, e em determinados casos, a
instituição de tratamento “específico”. No caso das glomerulonefrites primárias, o
tratamento “específico” depende do padrão histológico encontrado na biópsia. Nos
casos de síndrome nefrótico secundário o tratamento é dirigido à doença sistémica
implicada.
NPNN 2020 76
diálise é uma forma eficaz de tratamento de substituição da função renal, muitas vezes
mais segura que cursos prolongados e repetidos de tratamentos tóxicos, quando sem
aparente beneficio.
2. Hematúria
Tabela 3.
Infeções trato urinário
cistite, prostatite, tuberculose
Litíase
Neoplasias do trato urinário
>40 anos, fumadores, exposição ocupacional, ciclofosfamida, abuso
analgésicos, cistite crónica
Doenças glomerulares (predomínio de micro-hematúria):
Nefropatia de IgA
Doença da membrana basal fina
GN membranoproliferativa
GN pós-infeciosa
Vasculites
Nefropatia lúpica
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Abordagem do doente com hematúria
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Em todos os indivíduos com hematúria macroscópica deve ser considerada a
realização de cistoscopia. Esta também deverá ser efetuada nos indivíduos com
hematúria microscópica caso a avaliação imagiológica não aponte para o diagnóstico,
particularmente quando estão presentes fatores de risco para neoplasias do trato
urinário.
São considerados fatores de risco para neoplasia do trato urinário a idade >35
anos, sexo masculino, tabagismo, exposição profissional a químicos e corantes, cistite
crónica, radioterapia pélvica prévia, tratamento prévio com ciclofosfamida e abuso de
analgésicos.
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Tabela 4. Caracteristicas principais do síndrome nefrótico e nefrítico
Proteinúria ++++ ++
Edema ++++ ++
Normal / ligeiramente
Albumina Baixo reduzida
NPNN 2020 80
VI.
Insuficiência
renal
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INSUFICIÊNCIA RENAL
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o achado de cálcio baixo e fósforo elevado são habituais na insuficiência
renal, mas não permitem a distinção entre LRA e DRC.
O doseamento de hormona paratireodeia (PTH) se elevado favorece o
diagnóstico de DRC
Insuficiência renal
história clinica
antecedentes : DM , HTA, doença aterosclerótica, função renal
prévia
fármacos: Nefrotóxicos, AINE’s, IECA / ARA, diuréticos
contexto clinico em que surge
duração dos sintomas
hx familiar de doença renal
hx genésica
exame físico
oliguria / anúria
HTA / hipotensão
estado de hidratação/ avaliação da volémia
Pele: rash, púrpura, microenfartes
exames laboratoriais
anemia
relação ureia/creatinina (N:20)
cálcio e fósforo
PTH
ecografia renal
Aguda/rapidamente Crónica
progressiva
A LRA é um problema clínico comum. Não é uma doença única mas sim um
síndrome causado por uma multiplicidade de doenças e mecanismos
fisiopatológicos.
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Esta classificação é útil porque permite uma base lógica para a investigação e
tratamento da LRA.
As causas pré e pós renais podem ser facilmente diagnosticadas e além de
serem as causas mais frequentes de LRA, permitem após o seu diagnóstico , o
estabelecimento de um plano terapêutico que rapidamente pode conduzir à
restauração da função renal.
Na prática, a avaliação clinica da LRA faz-se respondendo às seguintes
questões:
Trata-se de LRA ou DRC agudizada?
Há obstrução do tracto urinário?
Há redução do volume circulante efectivo?
Há nefrotóxicos que possam ser implicados?
Há evidência de oclusão de grandes vasos?
Há doença parenquimatosa renal diferente de necrose tubular aguda?
Hipovolémia
Pré-renal Redução do volume intravascular efectivo
Glomérulos
Renal Parênquima Glomerulonefrite aguda ou rapidamente progressiva
Túbulos
NTA isquémica
NTA tóxica: toxinas endógenas, toxinas exógenas
Interstício
Nefrite intersticial aguda
NPNN 2020 84
LRA pré-renal
Redução do volume
intravascular efectivo
Alteração da
autorregulação renal
NPNN 2020 85
Se a perfusão renal não é reestabelecida há lesão isquémica dos tubulos
renais e desenvolvimento de necrose tubular aguda (NTA). Nestes casos, os
mecanismos de retenção de Na+ estão comprometidos pela lesão tubular,
razão pela qual o Na+ urinário não é baixo (>20mEq/L).
A história clinica associada a uma avaliação cuidadosa do estado de volemia
do doente (fig. 5) , permitem a maior parte das vezes o diagnóstico.
A LRA pós renal resulta da obstrução do sistema colector urinário. Tal como a
LRA pré-renal, ocorre sem existir dano estrutural do parênquima renal e por
isso pode ser rapidamente reversível quando se resolve a causa. A obstrução
pode ocorrer em qualquer local do tracto urinário desde os tubulos renais ao
meato urinário (fig. 6).
Causas ureterais
Litíase
Coágulos
Tumores (pélvicos, retroperitoneais)
Causas uretrais
Estenoses uretrais (pós-instrumentação, pós-infecciosas,
pós-trauma)
Válvulas uretrais posteriores
Causas prostáticas
Hipertrofia benigna da próstata
Carcinoma da próstata
Causas vesicais
Tumores da bexiga
Cálculos
Schistosomiase
Bexiga neurogénica (trauma ou deficiência medular,
diabetes, esclerose múltipla, AVC, paramiloidose)
Fig. 6 – causas de obstrução do tracto urinário
NPNN 2020 86
As causas mais comuns são habitualmente sugeridas pela história clinica:
história de prostatismo, antecentes de litíase renal ou doentes com contexto
para bexiga neurogénea. A LRA obstrutiva cursa habitualmente com anúria se
a obstrução for total, ou com diureses “flutuantes” (poliúria alternando com
oligúria) se a obstrução for parcial.
NPNN 2020 87
Condição proteinúria sedimento
eritrócitos leucócitos cilindros
Vasos +/- + - -
Glomérulos +++ +++ +/- eritrocitários
Interstício ++ + ++ leucociários
Fig 8- exame sumário de urina na LRA de causa parenquimatosa renal não NTA
NPNN 2020 88
Hipovolémia Suspender diuréticos
Redução do volume intravascular efectivo Administrar coloides/cristaloides/sangue
Pré-renal Inotrópicos
Antibióticos se sépsis
Vasos
SHU/PTT Imunossupressão
Plasmeferese
Ateroembolismo Tx suporte
Glomérulos
Glomerulonefrite aguda Tx de suporte de pós-infeciosa
Antibióticos se endocardite
GNRP Imunossupressão
Renal Parênquima
Túbulos
NTA isquémica Tx de suporte
Restaurar perfusão renal
NTA tóxica Suspender nefrotóxicos
Obstrução intratubular
Mieloma múltiplo Quimioterapia/ plasmaferese
NPNN 2020 89
DOENÇA RENAL CRÓNICA
outras Glomerulonefrite
9% 13%
Indeterminada
19%
Hipertensão
Diabetes
9%
38%
Pielonefrite crónica
Doenças císticas
7%
5%
NPNN 2020 90
Causas de agravamento da função renal na DRC
Desidratação Obstrução
Diminuição da perfusão renal (ICC, Hipercalcemia
sépsis) Hipertensão
Alteração da autoregulação renal Nefrite intersticial
(AINE’s, IECA, ARA) Infecção
Nefrotóxicos Recidiva da doença de base
Dieta
NPNN 2020 91
Há mais de 50 anos, Addis especulou que a gravidade da doença renal
crónica poderia ser melhorada se se reduzisse a carga azotada a excretar,
através da redução das proteinas ingeridas.
Em animais de laboratório a restrição proteica diminui a progressão da DRC.
A confirmação do efeito benéfico da restrição proteica em ensaios clínicos tem
sido discutível. No entanto, é comummente aceite fazer restrição proteica
moderada na doença renal. Uma meta análise recente de 5 ensaios
randomizados e controlados de restrição proteica na progressão da DRC não
diabética mostra haver benefício com este tipo de intervenção.
Controlo da HTA
O primeiro grande estudo a demonstrar e efeito renoprotector dos IECAs, no
caso na Nefropatia Diabética tipo 1, foi o estudo Colaborativo Americano
publicado em 1993.
Depois deste estudo sucederam-se um grande número de outros tendo como
finalidade demonstrar se os IECAs e os ARA II, seriam capazes de diminuir a
progressão da doença renal, e se esse efeito renal era independente do
controlo tensional.
Dessa multitude de estudos podem-se tirar as seguintes conclusões:
- o bloqueio do sistema renina-angiotensina é benéfico na maior parte das
nefropatias crónicas
- os IECAs e os ARA II são superiores aos outros tratamentos anti-
hipertensores na prevenção da progressão da DRC
- a redução da tensão arterial é benéfica nos doentes com nefropatia
Redução da proteinúria
A proteinúria por si só poderá contribuir para a progressão da lesão renal.
Achados experimentais e clínicos dão suporte à hipótese que a filtração
excessiva de proteinas séricas através de capilares glomerulares doentes
contribui directamente para a progressão do dano renal.
A forte associação entre redução da proteinúria e a renoprotecção nos estudos
clínicos implica que a redução da proteinúria seja um objectivo terapêutico
importante nas estratégias de renoprotecção.
Tratamento da hiperlipidémia
A doença renal crónica está frequentemente associada a anormalidades dos
lipídeos plasmáticos, caracterizadas por níveis elevados dos triglicerídeos, das
VLDL e LDL e por níveis baixos das HDL.
Para além de aumentar o risco de doença cardiovascular, estas anormalidades
lipídicas podem acelerar a progressão da doença renal.
Aguardam-se resultados de grandes ensaios em curso, no entanto, os
resultados de estudos mais pequenos e o facto do elevado risco e mortalidade
cardiovascular dos doentes com insuficiência renal, justificam uma intervenção
dietética e farmacológica para a correcção da hiperlipidemia
NPNN 2020 92
Terapêutica de Renoprotecção Específica
IECA ou ARA II para: Proteinúria < 0,5 gr/dia e declínio na TFG < 2 ml/m/ano
NPNN 2020 93
VII.
Lesão
renal aguda
no doente
internado
NPNN 2020 94
LRA NO DOENTE HOSPITALIZADO
INTRODUÇÃO:
A LRA carateriza-se por um declínio abrupto da TFG, suficiente para diminuir a eliminação de
produtos nitrogenados (ureia e creatinina) e de outras toxinas urémicas.
Pode definir-se como uma redução da função renal em 48h, demonstrada por:
Todos os doentes que apresentem LRA devem ser avaliados cuidadosamente, tanto para
despiste de causas reversíveis, como hipotensão, depleção de volume ou obstrução, como pela
presença de eventuais complicações. A avaliação inicial do doente com LRA deverá ser
criteriosa, direcionada para a determinação da causa e para a identificação de alterações que
possam requerer intervenção imediata; deverá incluir a avaliação da volémia e a medição dos
eletrólitos séricos, em particular potássio, bicarbonato, fosfato, cálcio e albumina.
EPIDEMIOLOGIA:
Estima-se que a incidência da LRA em doentes hospitalizados seja cerca de 1,9%, com
tendência crescente nas últimas décadas. Atualmente sabe-se que esta complica 5 a 7% de
todas as admissões hospitalares e mais de 40% das admissões em unidades de cuidados
intensivos. A LRA associa-se a um aumento do risco de morte em doentes internados,
constituindo um fator preditor de mortalidade independente.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:
NPNN 2020 95
ETIOLOGIA:
NPNN 2020 96
INVESTIGAÇÃO ETIOLÓGICA:
A revisão detalhada da história clínica com identificação do timing de início da LRA sugere
frequentemente a etiologia subjacente. A análise crítica do histórico analítico do doente (e a
sua evolução), nomeadamente da creatinina sérica e do exame de urina, é parte essencial da
investigação. Um pequeno apontamento para os doentes que sofrem ressuscitação volémica
agressiva, que podem ter um aumento analítico da creatinina sérica falseado pela diluição num
volume de distribuição maior.
Uma revisão cuidadosa dos fármacos é também fundamental. Muitas vezes, os nefrotóxicos
foram iniciados antes do início da LRA (exemplo: AINE e aminoglicosídeos), o que pode por si
só sugerir uma etiologia. Além disso, mesmo fármacos de longa data (como IECA ou ARA II)
podem tornar os doentes vulneráveis à LRA pré-renal ou à NTA.
EXAME OBJETIVO:
Achados no exame objetivo podem revelar a etiologia. Exemplos comuns incluem: sinais de
depleção de volume (LRA pré-renal); rash cutâneo após início de um novo fármaco (NIA); blue
toes (ateroembolismo); hipervolémia / sinais de insuficiência cardíaca (síndrome cardio-renal).
EXAME DE URINA:
A avaliação inicial deve incluir um exame de urina, sempre que possível com avaliação do
sedimento e quantificação da proteinúria (razão proteínas-creatinina em amostra de urina
ocasional). Nos doentes que apresentem hematúria e/ou proteinúria deverá ser despistada
doença glomerular ou vasculite sistémica. Na presença de piúria estéril deve ser considerada a
possibilidade de nefrite intersticial.
ECOGRAFIA RENAL:
Deve ser realizada essencialmente para exclusão de componente obstrutivo, sobretudo nos
casos em que a causa da LRA não é imediatamente aparente.
NPNN 2020 97
AVALIAÇÃO DO ESTADO DE VOLUME NA LRA:
Deverá realizar-se uma avaliação rigorosa do estado de volume em todos os doentes que
apresentem LRA, uma vez que a correção adequada do mesmo poderá melhorar ou até
mesmo reverter a lesão renal.
HIPOVOLÉMIA:
A menos que contraindicado, num doente com história de perda de fluídos (exemplo: vómitos,
diarreia) e um exame objetivo consistente com hipovolémia (hipotensão e taquicardia) o
primeiro passo é iniciar fluidoterapia imediata para reposição volémica. Múltiplos estudos têm
demonstrado que a rápida reversão da depleção de volume pode prevenir ou limitar a lesão
renal por NTA isquémica. Como nota, alguns doentes com depleção de volume relativamente
ligeira podem não possuir uma história óbvia de perda de volume. Além disso, a hipovolémia
pode ser difícil de detetar no exame objetivo, especialmente em doentes idosos e obesos.
Por outro lado, é importante alertar que a administração de fluídos está contraindicada em
doentes com quadros óbvios de congestão / sobrecarga de volume.
Os fluídos a administrar podem ser cristalóides ou colóides. As soluções cristalóides, tais como
a solução salina isotónica, são preferidas para a terapia inicial, uma vez que estudos
demonstraram que as soluções colóides não proporcionam nenhum benefício adicional e são
mais dispendiosas. Soluções cristalóides contendo potássio, como o lactato de Ringer, devem
ser evitadas, já que no doente com LRA podem resultar em hipercalémia.
HIPERVOLÉMIA:
Os diuréticos não têm papel na prevenção nem tratamento da LRA, mas estão indicados no
caso da hipervolémia. Nestas situações o doente deve ser regularmente avaliado para ver se a
diurese está a ser eficaz. Se não houver aumento na produção de urina, então terapias
NPNN 2020 98
alternativas como a diálise devem ser consideradas. Os diuréticos de ansa (furosemida) são os
agentes preferidos, uma vez que proporcionam um efeito natriurético maior em comparação
com os tiazídicos.
Não existem dados precisos sobre a frequência com que os eletrólitos séricos devem ser
monitorizados. Assume-se que o potássio deverá ser obrigatoriamente doseado em doentes
oligúricos ou hemodinamicamente instáveis, sendo igualmente importante o registo do peso
diário, da ingestão hídrica e do débito urinário.
HIPERCALÉMIA:
Em todos os doentes com LRA, a ingestão de potássio dietético deve ser limitada a
aproximadamente 2g por dia. Os doentes com hipercalémia grave (>6,5mEq/L) ou potássio
sérico rapidamente aumentado não devem receber qualquer potássio dietético até que a
hipercalémia possa ser tratada (seja por diálise ou terapêutica médica).
ACIDOSE METABÓLICA:
NPNN 2020 99
tenham LRA podem ter acidose metabólica resultante da perda de bicarbonato, da diarreia ou,
menos comumente, de acidose tubular renal.
Nos doentes com LRA, a escolha da terapia depende da ausência ou presença de sobrecarga
de volume e da causa subjacente e da gravidade da acidose.
A diálise está geralmente indicada na LRA oligoanúrica grave com sobrecarga de volume e
acidose metabólica grave (pH <7,1), independentemente da causa da acidose. A diálise é
preferida à administração de bicarbonato nos doentes com sobrecarga de volume, uma vez
que a administração de bicarbonato resulta numa grande carga de sódio. Em geral, aa diálise
também está indicada em doentes com LRA e acidose láctica ou cetoacidose e pH <7,1, mesmo
que não estejam hipervolémicos e especialmente se estiverem oligoanúricos. No entanto, nos
doentes com LRA que não têm sobrecarga de volume e não têm nenhuma outra indicação
para diálise aguda, o bicarbonato pode ser administrado em vez de diálise nas seguintes
situações:
Um objetivo razoável para doentes com acidose metabólica devido à perda de bicarbonato por
diarreia é atingir um bicarbonato sérico entre 20 e 22mEq/L e pH >7,2. Nesses doentes, a
quantidade total de bicarbonato que será necessária pode ser estimada a partir do défice
calculado de bicarbonato. A taxa de administração de bicarbonato depende da gravidade da
acidose e do estado de volume do doente.
Não se dialisam doentes com acidose orgânica ligeira (isto é, pH ≥7,1), a menos que tenham
outra indicação. O tratamento destes doentes é dirigido essencialmente para a reversão das
causas subjacentes da produção excessiva de ácido. Isto inclui o tratamento da sépsis, a
otimização da ventilação e da perfusão sanguínea para redução da produção de ácido láctico e
a administração de insulina na presença de cetoacidose diabética. Fontes exógenas de ácidos
(tais como salicilatos) devem ser removidas.
HIPOCALCÉMIA:
Os níveis séricos de cálcio devem ser seguidos de perto nos doentes com LRA. A hipocalcémia
é comum nestes doentes e está principalmente relacionada com aumento dos níveis séricos de
fósforo causados pela redução da TFG. Outros fatores que contribuem para a hipocalcémia
incluem a resistência à hormona paratiroideia e a diminuição da síntese de 1,25(OH)2D3.
O cálcio sérico ionizado deve ser medido adicionalmente ao cálcio sérico total. A concentração
total de cálcio sérico não reflete com precisão a concentração de cálcio ionizado nos doentes
com valor alterado de albumina sérica, uma vez que o cálcio se liga a esta proteína. Além disso,
uma vez que a ligação do cálcio à albumina é dependente do pH, a quantidade de cálcio livre
pode ser alterada por desequilíbrios ácido-base ou pela rápida correção dos mesmos.
HIPERFOSFATÉMIA:
SUPORTE NUTRICIONAL:
A perda de energia proteica é comum entre doentes com LRA e contribui de forma significativa
para a mortalidade; a necessidade proteica aumenta com a gravidade da doença subjacente e
com o início da diálise. Considerando que os doentes não dialisados com doença ligeira a
moderada necessitam apenas de 0,8 a 1,2g/kg por dia, os doentes críticos ou doentes em
diálise necessitam geralmente de 1,2 a 1,5g/kg por dia ou mais. Atualmente considera-se que a
nutrição entérica deve ser, sempre que possível, preferida à nutrição parentérica devido ao
seu menor custo, complicações menos frequentes e graves, menor permeabilidade da mucosa,
maior cicatrização e menores taxas de infeção.
PONTOS-CHAVE A RETER:
Substituição
da função renal:
A Diálise e o
transplante
1. INTRODUÇÃO
Com a evolução da doença renal crónica (DRC), a função dos rins torna-se insuficiente
para assegurar a vida ou um estado aceitável de saúde e torna-se fundamental recorrer a técnicas
que procuram a sua substituição.
A função renal é essencialmente depuradora e homeostática, mas existem outras funções
de carácter metabólico, como a síntese de eritropoetina ou a activação da vitamina D que têm um
papel fisiológico importante. As técnicas de substituição da função renal (TSFR) de que dispomos
são a diálise e a transplantação renal.
O transplante renal, que substitui integralmente a função dos rins nativos, é a terapêutica
ideal para quase todos os doentes, mas não é possível para todos. A diálise tem uma função
essencialmente depuradora e são necessárias terapêuticas adjuvantes para suprir as funções de
síntese, que naturalmente não são asseguradas pela diálise, como os fattores estimuladores da
eritropoiese e os análogos da vitamina D.
No Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho, todos os doentes com DRC a partir do
estádio 4 têm uma Consulta de Esclarecimento de Doença Renal Crónica, de acordo com a norma
da DGS nº 017/2011 de 29/09/2011 atualizada a 14/06/2012, dada por um nefrologista e um
enfermeiro de Nefrologia, na qual são explicadas as opções de substituição da função renal e
fornecida a possibilidade de contactarem com outros doentes que já estão em diálise, observando
na prática as especificidades de cada modalidade.
A escolha entre estas 2 modalidades é feita pelo doente e familiares. O papel dos médicos
e enfermeiros é o de auxiliar nesta escolha e identificar situações que possam contra-indicar a
opção do doente. Na ausência de contra-indicações (Tabela I), ambas devem ser apresentadas
para permitir uma opção consciente. É explicado ao doente que, não havendo contra-indicação,
ele pode mudar de uma modalidade para outra em caso de falência ou não adaptação à técnica
que escolheu.
Tabela I
Contra-indicações às modalidades de Diálise
Diálise peritoneal
Absolutas Relativas
Perda da função peritoneal Prótese aórtica abdominal recente
Clearance inadequado Shunt ventriculoperitoneal
Aderências que prejudicam a drenagem do líquido Intolerância ao líquido intraperitoneal
Hérnia abdominal não corrigível Grande massa muscular
Estoma na parede abdominal Obesidade mórbida
Fuga de líquido peritoneal Malnutrição severa
Inaptência em executar a técnica e ausência de
Infecção cutânea
ajuda de terceiros
Doença intestinal
Hemodiálise
Absolutas Relativas
Acesso vascular difícil
Fobia de agulhas
Acesso vascular não possível
Insuficiência cardíaca grave
Coagulopatia
Ultrafiltração
• Movimento de água através da membrana
semi-permeável através de um gradiente de
pressão (hidrostática, osmótica ou oncótica)
Convexão
• Movimento de solutos durante a ultrafiltração
• Enquanto a difusão é eficaz na remoção de
moléculas de pequeno tamanho, a convexão
permite o movimento de moléculas de
pequeno e médio tamanho
Figura 1
4.1. A Hemodiálise
Figura 3 – Dialisador
Para a realização da HD, o sangue tem que ser extraído da circulação do doente a uma
velocidade que é impossível de se conseguir com o calibre das veias periféricas. Assim, é
essencial assegurar um acesso ao sistema vascular. Os acessos vasculares podem ser divididos
em dois grandes grupos: os provisórios e os de longa duração. Os primeiros são utilizados em
situações de falência renal aguda. Há 3 tipos de acessos de longa duração: a fístula arteriovenosa
(FAV) de Cimino-Brescia, as próteses vasculares e os catéteres venosos centrais (CVC)
tunelizados.
a. Fístulas arteriovenosas
Os catéteres venosos centrais (CVC) podem ser provisórios (ou de curta duração) ou
tunelizados (ou de longa duração).
Os catéteres provisórios (Figura 6) são apropriadamente colocados nos doentes que se
apresentam com falência renal aguda e devem ser colocados nas veias femorais ou jugulares
internas. Não devem permanecer > 5-7 dias nas veias femorais e para além das 3 semanas nas
veias jugulares internas. Não devem ser colocados nas veias subclávias, pelo maior risco de
trombose, podendo condicionar a futura construção de um acesso vascular definitivo bem
sucedido.
Cuff
Figura 6 – CVC provisórios ou de curta duração Figura 7 – CVC tunelizados ou de longa duração
O carácter contínuo deste tratamento faz com que todas as variáveis bem como o estado
metabólico do doente tenham um padrão mais constante relativamente à HD. A complicação mais
típica e mais alarmante da DP é a peritonite, que requer tratamento rápido. Outras complicações
possíveis são infecções do orifício de saída ou do túnel, hérnias, fugas de líquido peritoneopleural
ou peritoneoinguinal, descontrolo glicémico, obesidade e a dislipidemia. O elevado risco CV a
longo prazo é, tal como na HD, o problema principal.
5. O TRANSPLANTE RENAL
Em 2018, 2.634 doentes iniciaram TSFR: 90.3% HD, 8.7% DP e em 1.0% dos doentes o
primeiro tratamento foi o transplante renal. Em 2018, encontravam-se a realizar HD 12.227 doentes,
distribuídos por 124 centros de HD e 787 doentes em DP, distribuídos por 25 unidades. No que
respeita à transplantação renal, existem em Portugal 8 centros capacitados para a sua realização.
Em 2018, foram efetuados 505 transplantes renais (446 de dador cadáver e 59 de dador
vivo) e cerca de 2000 doentes estavam em lista de espera. O número de transplantes renais de
dador vivo tem aumentado nos últimos anos, mantendo-se contudo ainda aquém da realidade de
outros países. Nesse sentido, nas últimas décadas verificou-se um esforço crescente dos
profissionais na sensibilização da população geral para a esta temática.
7. BIBLIOGRAFIA
1. Jurgen Floege, Richard J. Johnson and John Feehally. Comprehensive Clinical Nephrology. 5th edition, 2014
2. Scott Gilbert and Daniel E. Weiner. National Kidney Foundation Primer on Kidney Diseases. 6th edition, 2014
3. John T. Daugirdas, Peter Gerard Blake and Todd S. Ing. Handbook of Dialysis. 5th edition, 2015
http://www.spnefro.pt/tratamento_da_doenca_renal_terminal/2018/tratamento_da_irct/305
Alterações renais
nas doenças
Sistémicas
Os rins são frequentemente envolvidos em diversas doenças sistémicas quer estas tenham
natureza inflamatória, infecciosa, secundárias à deposição de proteínas anómalas
(disproteinemias) ou microangiopatias trombóticas - síndrome hemolítico urémico (SHU).
Na maior parte das doenças sistémicas o glomérulo é a estrutura do parênquima renal
envolvida e a sua lesão traduz-se pelo aparecimento de hematúria e/ou proteinúria.
Contudo outras zonas do parênquima ou interstício renal também podem estar
envolvidas.
O reconhecimento da doença renal (alteração no exame de urina, azotemia) é, muitas
vezes, o primeiro achado que nos aponta o diagnóstico de doença sistémica, sobretudo na
presença de outra sintomatologia (sintomas constitucionais marcados e envolvimento de
outros órgãos e sistemas) não justificada pela doença renal isolada. Por outro lado, em
determinadas patologias sistémicas é obrigatório o despiste de envolvimento renal.
1. Doenças inflamatórias
1.Quadro resumo
Idade Sexo Síndrome Atingimento de outros orgãos
Nefrológico
Vasculite 5ª-7ª M>F • IRRP/LRA - Sintomas inespecíficos: astenia,
ANCA década • Hematoproteinúria mal-estar, febre, emagrecimento
- Artralgias
- Púrpura palpável
- Anemia NN
- Tracto respiratório superior:
estenose subglótica, sinusite,
rinite, otite média e inflamação
ocular
- Pulmonar: hemorragia pulmonar,
nódulos, cavitações
LES Jovens F>M • Hematoproteinúria Praticamente todos os órgão e
• IRRP/LRA sistemas
• Síndrome nefrótico • Sintomas inespecíficos: mal-estar,
• DRC febrícula, anorexia, perda de peso
• Alopecia
• Ulcerações nasais ou orais
• Artralgias ou artrite não
deformativa
• Fotosenssibilidade
• Fenómeno de Raynaud
• Rash malar
• Envolvimento neuropsiquiátrico:
cefaleias, coreia, coma e psicose
• Serosite: pleurite e pericardite
• Esplenomegalia e linfoadenopatia
• Anormalidades hematológicas:
anemia, leucopenia e
trombocitopenia.
O Lúpus Eritematoso Sistémico (LES) é uma doença auto-imune que pode virtualmente
afectar qualquer órgão. Tipicamente tem um curso clínico com períodos de actividade da
doença seguidos de períodos de remissão.
A Nefropatia Lúpica (NL) é uma das manifestações mais graves do LES. O glomérulo está
geralmente atingido. Em alguns casos os vasos e os túbulos renais também podem
apresentar lesões.
Os doentes com nefropatia lúpica têm tipicamente autoanticorpos dirigidos contra dsDNA,
antigénio Sm e C1q, mas o papel patogénico destes autoanticorpos e dos imunocomplexos
que surgem têm sido debatido.
O LES é mais frequente nos indivíduos de raça caucasiana. Na raça negra as manifestações
são, em geral, mais graves. O sexo é o maior factor de risco para o desenvolvimento de LES,
sendo o sexo feminino atingido em 90% dos casos.
Cerca de 30 a 50% dos doentes com LES têm atingimento renal na apresentação da
doença. Contudo, o envolvimento renal pode manifestar-se mais tarde. Os achados mais
importantes são proteinúria, microhematúria e cilindros eritrocitários, hipertensão e IR
progressiva.
Muitos doentes apresentam-se com sintomas inespecíficos como mal-estar, febrícula,
anorexia, perda de peso. Podem também surgir alopécia, ulcerações nasais ou orais,
artralgias ou artrite não deformativa e vários achados cutâneos incluindo
fotosenssibilidade, fenómeno de Raynaud e o clássico rash malar. O envolvimento
neuropsiquiátrico é um dos mais importantes e pode manifestar-se por cefaleias, que
podem ser persistentes e muitas vezes migratórias, coreia, coma e psicose. A serosite pode
estar presente sob a forma de pleurite e pericardite e afecta mais de 40% dos doentes.
Esplenomegalia e linfoadenopatia estão presentes em ¼ dos doentes. As anormalidades
hematológicas são comuns nos doentes com lúpus e incluem anemia, leucopenia e
trombocitopenia.
2. Rash Discoide
3. Fotosensibilidade
5. Atrite Não-erosiva
6. Pleuropericardite
7. Doença Renal
trombocitopenia)
10. Células LE positiva, aumento dos títulos de dsDNA, anti-SM presente, teste para o
2. Doenças Infecciosas
Uma GN pode ocorrer em várias doenças causadas por bactérias, vírus, fungos e helmintas.
Em alguns casos o atingimento é subclinico e transitório; noutros conduzem a IR crónica
terminal (IRCT). A maioria das doenças renais associada a infecção é mediada por
imunocomplexos.
2. A. Hepatite B
A infecção aguda pelo HBV pode estar associada a uma doença do soro de curta duração:
urticária ou rash maculopapular, neuropatia, artralgias ou artrite, hematúria microscópica
e proteinúria não nefrótica. Geralmente este quadro resolve-se quando a hepatite melhora.
A associação de hepatite B crónica e doença glomerular está bem documentada. Os
portadores crónicos podem apresentar envolvimento glomerular e histologicamente
podem ser encontradas 2 tipos de lesão: Glomerulopatia Membranosa (GM), GN
Membranoproliferativa (GNMP).
A GNMP é a lesão glomerular mais observada nos adultos. Hematúria microscópica está
frequentemente presente, 53% dos casos têm hipertensão arterial e 20% IR. O AgHBs e o
anti-HBs estão sempre presentes. No momento da apresentação, os doentes podem não ter
história de doença hepática, mas geralmente têm transaminases elevadas. Se realizada a
biopsia hepática mostra hepatite crónica activa ou persistente e ocasionalmente cirrose.
2.B. Hepatite C
Há relação forte e causal entre a infecção crónica pelo vírus da hepatite C (VHC) e doença
glomerular. Três tipos principais de doença renal têm sido reconhecidos: Glomerulonefrite
associado a crioglobulinemia, GN Membranoproliferativa e Glomerulopatia Membranosa.
A maior parte destes doentes têm evidência de doença hepática reflectida pela elevação
das concentrações de aminotransferases. Contudo, as aminotransferases séricas são
normais em alguns casos e uma história de hepatite aguda está muitas vezes ausente.
Assim, uma função hepática normal não excluiu a presença de VHC.
3.Quadro resumo
No momento do diagnóstico mais de 50% dos doentes com MM têm evidência de alteração
da função renal traduzida pela elevação dos níveis séricos de creatinina. Os doentes com
MM de cadeias leves e IgD apresentam um risco acrescido de doença renal.
A maior parte dos doentes, após o tratamento ou eliminação dos factores precipitantes da
IR (suspensão de nefrotóxinas, hidratação, tratamento da hipercalcemia, tratamento da
sépsis) e redução da carga de CL através da quimioterapia apresenta uma resposta
favorável com recuperação da função renal. Contudo, cerca de 10% evoluem para IRCT.
3.B. Amiloidose
Amiloidose AL
A idade média de apresentação da AL ocorre em média aos 64 anos de idade, com
predomínio no sexo masculino.
As manifestações renais incluem proteinúria, síndrome nefrótico e pode ocorrer IR.
Tipicamente, não cursa com hematúria.
As queixas principais são fraqueza e perda de peso. A amiloidose AL pode infiltrar
qualquer órgão com excepção do cérebro. Quando ocorre envolvimento cardíaco podemos
encontrar uma cardiomiopatia restritiva ou dilatada, arritmias e doença do nó auricular. A
patologia cardíaca é responsável por cerca de metade das mortes ocorridas nestes
doentes. Macroglosia, distúrbios da motilidade, má absorção, hemorragia e obstrução
surgem quando ocorre infiltração do tracto gastrointestinal. O envolvimento do sistema
nervoso periférico é responsável por uma neuropatia sensitiva dolorosa seguida de
deficits motores. A neuropatia autonómica é responsável por hipotensão ortostática,
ausência de sudorese, distúrbios gastrointestinais e vesical e impotência. Podem ocorrer
alterações cutâneas como púrpura (em redor dos olhos), equimoses, pápulas, nódulos e
placas na face e região superior do tronco.
O diagnóstico de amiloidose AL deve ser considerado em qualquer doente que se
apresente com proteinúria nefrótica com ou sem IR, cardiomiopatia, neuropatia periférica,
hepatomegalia ou neuropatia autonómica.
A AL é uma das complicações mais graves da discrasias de células plasmáticas. A sobrevida
média é de cerca de 10 meses. O envolvimento cardíaco com insuficiência cardíaca
congestiva e arritmias contribui para cerca de 40% das mortes.
O objectivo do tratamento é a eliminação do clone de células plasmáticas. Os doentes com
AL devem ser submetidos a quimioterapia dada a melhoria da sobrevida nos
respondedores. A resposta terapêutica baseia-se na resposta hematológica
(desaparecimento de proteína monoclonal do soro e urina, normalização da razão das
cadeias leves livres séricas e menos de 5% de células plasmáticas na biopsia da medula
óssea) e dos órgãos envolvidos.
Amiloidose AA
A AA desenvolve-se em cerca de 5% dos doentes com elevação sustentada da proteína
amilóide sérica A. Os doentes em risco são aqueles com doenças inflamatórias ou
4.Quadro resumo
Na maior parte das situações, não é efectuada biópsia renal pela trombocitopenia
associada
Bibliografia:
Hawkins P e tal. Natural History and Outcome in Systemic AA Amyloidosis. N Eng J Med; 356:2361-71; 2007
Arthur Gillmore, J.D. and Hawkins, P.N. Nat Rev Nephrol. 9, 574-586; 2013
Greenberg ed. Primer on Kidney Diseases 4th. Elsevier, 2005
Daugirdas John et al. Handbook of Dialysis, 4th Edition, Lippincott Williams and Wilkins, 2007
Richard J. Johnson John Feehally . Comprehensive Clinical Nephrology, 4rd ed, Elsevier, 2010
Up toDate 2013
Norma DGS 011/2012 actualizada a 30.04.2015
Nefropatia
Diabética
Nos últimos anos tem sido, no entanto, proposta outra entidade de doença renal associada à Diabetes
Mellitus que não cursa com proteinúria e que parece associar-se a lesões de caráter principalmente
vascular e a alterações histopatológicas ainda não totalmente estabelecidas, mas com menor tradução
no glomérulo.
Neste âmbito, tem sido aplicado o termo “Doença Renal Diabética” para englobar quer a via
albuminúrica quer a via não albuminúrica da nefropatia, uma vez que a expressão Nefropatia Diabética
tende a remeter classicamente para a primeira entidade.
Neste capítulo, abordaremos a ND na sua conceção clássica, para a qual as guidelines atuais se
dirigem na generalidade.
Epidemiologia
A ND é a principal causa de doença renal crónica, incluindo a DRC estadio 5. Em Portugal é a etiologia
em cerca de 30 a 34% dos doentes que iniciam terapêutica de substituição da função renal (TSFR).
O risco de desenvolver ND parece ser igual na DM tipo 1 ou tipo 2 mas dada a elevada prevalência da
DM tipo 2 (90%), a maior parte dos doentes com ND tem DM tipo 2. Contudo, apenas 20 a 40% dos
doentes diabéticos irão desenvolver nefropatia.
Factores de Risco
Estão descritos vários factores de risco para o desenvolvimento de ND, dos quais se salientam:
▪ Factores genéticos: a incidência da ND está aumentada na raça negra e noutros grupos raciais o que
sugere a existência de diferenças genéticas. Por outro lado também parece haver agregação familiar
dos casos de ND. Doentes com DM que tenham familiares em primeiro grau com ND tem um risco
aumentado de desenvolver ND em relação a doentes sem familiares afetados. Estão em curso estudos
que procuram identificar os fatores genéticos envolvidos no desenvolvimento da ND, mas tem sido difícil
a sua identificação até porque provavelmente estarão envolvidos múltiplos genes e estes poderão ser
diferentes entre populações diferentes.
▪ Controlo Glicémico: a ND tem maior probabilidade de ocorrer em doentes com pior controlo glicémico.
▪ Obesidade: um índice de massa corporal elevado está associado a risco de doença renal crónica.
▪ Tabagismo: o tabagismo está associado a uma variedade de efeitos adversos na DM que incluem
evidência de aumento da albuminúria e risco de DRC 5.
Patofisiologia
Embora existam vários fatores envolvidos na patogénese da ND, esta resulta principalmente das
alterações provocadas a longo prazo pela hiperglicemia. A concentração elevada de glicose está
A hiperfiltração glomerular é comum nas fases iniciais da DM e deve-se ao aumento de fluxo a nível da
arteríola aferente e vasoconstrição da arteríola eferente, que são provocadas por mediadores
vasoativos. entre os quais o TGF β, insulin-like growth factor 1 (IGF-1), vascular endotelial growth factor
(VEGF), óxido nítrico, prostaglandinas e glucagon. A importância da hiperfiltração e hipertensão
glomerular na ND é reforçada pelos efeitos benéficos do bloqueio do SRAA na história natural da
doença.
Histopatologia
A história natural da nefropatia diabética na DM1 e na DM2 parece ser semelhante. No entanto, está
melhor caracterizada nos doentes com DM1, uma vez que na maior parte das vezes não se identifica o
momento preciso do início da DM2 e por isso, estes doentes podem permanecer com hiperglicemia não
diagnosticada durante vários anos. Daí que no momento do diagnóstico, cerca de 5 a 20% dos doentes
com DM2 têm já uma excreção anormal de albumina.
A microalbuminuria reflete disfunção endotelial generalizada, e está não só associada a risco de lesão
renal progressiva como se associa também a maior risco cardiovascular e de mortalidade, sendo esse
A história natural da ND (Figuras 3 e 4), tal como foi descrita antes da implementação da terapêutica
atual, pode ser dividida em 5 estadios, de acordo com a excreção de albumina urinária, pressão arterial
sistémica e taxa de filtração glomerular.
Fig. 3.
Estádio 2: Fase silenciosa: neste estádio surgem alterações histopatológicas (proliferação mesangial
e espessamento da MBG ), contudo a excreção de albumina e a pressão arterial (PA) são ainda
normais.
Estádio 3: Nefropatia incipiente: ocorre em geral 5 anos após o início da DM. Caracteriza-se pela
excreção persistente de albumina entre 30 a 300mg/dia (microalbuminúria). A TFG geralmente tem
valores normais. Em alguns doentes cursa com HTA. As lesões glomerulares tendem a ser mais
graves, Neste estádio também já se podem verificar outras complicações da DM como retinopatia,
doença vascular periférica, doença coronária e doença cerebrovascular.
Estádio 4: Nefropatia estabelecida: ocorre entre 10 a 20 anos após o início da DM. A ND
estabelecida surge quando a excreção de albumina é superior a 300mg/dia. Pode evoluir para
sindrome nefrótico. A HTA está presente em 75% dos doentes e a dislipidemia é comum. A TFG declina
cerca de 10ml/min/ano. Esta taxa de declínio está fortemente correlacionada com a presença de HTA.
Estádio 5: Insuficiência renal crónica terminal: Ocorre cerca de 5 a 15 anos após o desenvolvimento
da proteinúria estabelecida.
Dados de estudos mais recentes sugerem que, pelo menos na DM tipo 1 e possivelmente também na
DM tipo 2, alguns dos indivíduos que desenvolvem microalbuminuria podem reverter para uma
excreção normal de albumina na urina (fig. 5). Além disso, a progressão para DRC estadio 5 é,
atualmente, menos frequente e a taxa de progressão mais lenta.
Diagnóstico
Para fazer o diagnóstico de Nefropatia Diabética (na sua conceção “clássica”) é necessária a presença
de excreção aumentada de albumina em pelo menos duas a três amostras ocasionais de urina,
espaçadas por 3 a 6 meses, tendo também em conta, pelo menos na DM tipo 1, a evolução temporal
descrita anteriormente.
Existem fatores confundidores que podem causar albuminúria transitória e que devem ser excluídos,
nomeadamente:
- febre,
- exercício físico vigoroso,
- infecção do trato urinário
- insuficiência cardíaca descompensada,
- HTA não controlada,
- hiperglicemia não controlada.
Os doentes com DM1 geralmente apresentam retinopatia antes do início da nefropatia (85-99%). Desta
forma, os doentes com DM1 com ND quase sempre apresentam retinopatia, apesar de o contrário poder
não ocorrer (um número importante de doentes com retinopatia não terá envolvimento renal). A relação
entre nefropatia e retinopatia é menos previsível na DM2; aqui a retinopatia estará presente em apenas
cerca 60 a 65% dos doentes com ND, pelo que a sua ausência não exclui o diagnóstico.
Num doente diabético a presença de proteinúria nem sempre traduz a presença de ND. A exclusão de
outras glomerulopatias (nomeadamente por biópsia renal) deve ser considerada nas seguintes
situações:
• DM1 com proteinúria, na ausência de retinopatia;
• Início agudo da doença renal, síndrome nefrótico abrupto ou evolução atípica;
• Pesença de hematúria macroscópica ou de um sedimento urinário activo
Para uma detecção precoce da nefropatia e estabelecimento de um programa de prevenção eficaz está
recomendado avaliar anualmente a albuminúria e creatininémia / TFGe com início:
• na DM1 com ≥5 anos de duração;
• na DM2 ao diagnóstico.
Tratamento e Prevenção
Intervenções não farmacológicas que implicam alterações no estilo de vida devem ser encorajadas e
são fundamentais no tratamento da diabetes. Estas incluem o seguimento de um plano alimentar
adequado, a promoção de exercício físico regular, a obtenção e manutenção de um índice de massa
corporal adequado e a cessação tabágica.
Controle glicémico
Vários estudos mostraram o efeito benéfico do controlo apertado da glicemia na redução do risco e na
diminuição da progressão das complicações microvasculares da diabetes, não só da nefropatia mas
também da retinopatia e neuropatia.
O controlo apertado da glicemia não só reduz a ocorrência de proteinúria como mostrou estabilizar ou
mesmo poder reverter a microalbuminúria, efeito que pode demorar vários anos a ter expressão clínica.
A principal evidencia relativa à efecácia do controle glicemico no desenvolvimento da nefropatia na DM
1, surge a partir do estudo Diabetes Control and Complications Trial (DCCT) que comparou 2 grupos de
doentes: um com controle intensivo da glicemia (obj: HbA1c < 6.05%) versus um grupo com controle
“convencional” da glicemia (HbA1c média de 9%). O grupo com controle intensivo teve uma redução do
risco relativo de desenvolvimento de microalbuminuria de 39% e uma redução do risco relativo de
desenvolvimento de macroalbuminúria de 56%. Na DM 2 o controle intensivo da glicemia (obj. HbA1c de
7%) também mostrou ser benéfico na prevenção da nefropatia, tal como foi demonstrado no estudo UK
Prospective Diabetes Study (UKPDS).
Em geral, o valor alvo de HbA1c deve ser inferior a 7%,. Valores alvo mais baixos (<6.5%) podem ser
apropriados se forem conseguidos sem um risco elevado de hipoglicemia, em doentes jovens, com DM
de curta duração, esperança de vida elevada e sem DCV significativa
Por outro lado, um alvo mais conservador, de HbA1c <8%, deve ser considerado em indivíduos mais
idosos, com história de episódios de hipoglicemia grave, com complicações micro e macrovasculares
avançadas, esperança de vida reduzida e comorbilidades significativas. Este é assim o valor alvo na
maioria dos doentes com DRC avançada.
O resultado dos estudos recentes com inibidores do SGLT2 parecem tornar esta classe de
medicamentos altamente promissora na prevenção e/ou redução progressão da nefropatia diabética,
efeitos estes que parecem ser diretos , isto é independentes do .efeito glicémico.
Dados do estudo EMPA – REG e do estudo CANVAS sugerem que quer a empagliflozina quer a
canagliflozina parecem reduzir o risco relativo de agravamento ou aparecimento de nefropatia diabética
e ter efeito benéfico na diminuição da redução da TFG em comparação com o placebo. Mais
recentemente dados do estudo DECLARE-TIMI 58 com a dapagliflozina mostraram também uma
redução da progressão da doença renal diabética.
Embora estes resultados sejam notáveis, é preciso ter em conta que por um lado a maioria dos doentes
incluídos nestes estudos não tinha evidência de doença renal diabética (definida com TFG < 60ml/m
e/ou albuminúria) e por outro são outcomes secundários. Daí que seja preciso esperar pelos resultados
dos estudos já em curso em doentes com doença renal estabelecida, para se tirarem conclusões
Também resultados de estudos com os agonistas GLP1 (LEADER e SUSTAIN-6) sugerem beneficio
destes fármacos na progressão da nefropatia diabética. Mais uma vez são outcomes secundários que
necessitam ser confirmados.
Em face destes resultados é atualmente recomendado que em doentes com doença renal diabética seja
considerada a utilização de um inibidor da SGLT2 ou de um agonista do GLP1, em associação com a
metformina, se possível o uso desta e se necessário para obter um controle glicémico adequado, com o
objetivo de reduzir o risco ou a progressão da doença renal diabética.
Inibidores da DPP-4 podem ser usados com segurança na DRC em todos os seus estadios. A
linagliptina não necessita de ajuste de dose à função renal, as restantes sim.
inibidores da SGLT2 – a canagliflozina e a empagliflozina podem ser usadas em doentes com TFG >
45ml/m, devendo a dose ser ajustada. Não devem ser iniciadas com TFG < 45ml/m. O uso de
dapagliflozina não é recomendado em doentes com TFG < 60ml/m. Existe risco de cetoacidose e de
ITU associado a estes agentes, bem como de candidiase vulvovaginal. Por provocarem diurese
osmótca, em doentes idosos, doentes medicados com diuréticos ou inibidores do sistema RAA podem
causar hipotensão sintomática.
Agonistas dos recetores da GLP há pouca experiência na DRC. O exenatide e o lixisenatide não
devem ser usados em doentes com TFG < 30ml/m.
Meglitinidas (glinidas) – nateglinida – são fármacos secretagogos de insulina com mecanismo de ação
mais rápida e breve que as sulfonilureias e menor risco de hipoglicemia. Estão desanconselhadas na
DRC por haver experiência limitada.
O bloqueio do SRA com IECA ou ARA II confere renoproteção que é independente da redução da TA.
De facto a medida isolada mais eficaz para atrasar a progressão da ND é o bloqueio do SRAA.
Nos doentes com “macroalbuminúria” e7ou redução da TFG há forte evidência de que os IECA na DM1
e os ARA II na DM2 conferem benefício quer em termos de progressão da nefropatia, redução da perda
de TFG e evolução para DRCT.
Apesar do efeito renoprotetor dos fármacos inibidores do SRAA estar melhor estabelecido para os IECA
na DM1 e para os ARA II na DM2, as guidelines internacionais têm preconizado o início de IECA ou
ARA II indistintamente, seja na DM1 ou na DM2, na presença de macrolbuminúria ≥300mg/g
(recomendação forte) mesmo em doentes normotensos, como medida renoprotetora. Nos casos de
microalbuminúria (≥30-299mg/g), o início de IECA/ARA II em doentes normotensos também está
recomendado, dados os benefícios potenciais e o baixo risco.
Embora a combinação de agentes que atuam no SRAA (IECA + ARA II) tenha demonstrado uma
redução significativa da albuminúria em comparação com qualquer um dos agentes isoladamente, esta
não está recomendada nos doentes diabéticos, por não haver evidência de maior benefício a longo
prazo, quer cardiovascular quer na progressão da DRC, e por serem maiores os afeitos adversos
associados – hipercaliémia, síncope e disfunção renal.
O inicio de farmacos inibidores do SRAA não está recomendado na prevenção primária da DRC nos
doentes diabéticos normotensos, normoalbuminúricos e com TFGe normal.
Controlo lipídico
O início de estatina deve ser instituído de acordo com o risco CV e está recomendado como prevenção
primária (cardiovascular) em praticamente todos os DRC em estadios precoces. O início de estatina em
estadios mais tardios (DRC 5 pré-diálise) deve ser considerado, mas após início de diálise não está
indicado instituir estatina como prevenção primária.
A manutenção da estatina após o início de TSFR em doentes previamente medicados com o fármaco
deve ser avaliada caso a caso. A combinação estatina + ezetimibe pode ser útil na redução alvo de risco
CV, e pode ser usada na DRC em todos os estadios.
Os fibratos podem ser considerados nas situações em que a hipertrigliceridemia é mais preponderante,
mas apresentam potencial de toxicidade renal e são em geral desaconselhados na DRC.
Referências
• American Diabetes Association. Standards of Medical Care in Diabtes – 2019. Diabetes Care. 2019;
Jan; 42(Supplement 1):S124-S138.
• Uptodate on Diabetic Nephropathy: Core Curriculum 2018, AJKD XX(XX) 1-12, 2017
• Comprehensive Clinical Nephrology, 6th Edition
Diuréticos
TIPOS DE DIURÉTICOS
Os diuréticos são divididos em quatro classes principais, tendo em conta o local de ação, onde
eles diminuem a reabsorção de sódio:
2. DIURÉTICOS DE ANSA
Equivalência de dose 40 mg 20 mg 1 mg
1.Tempo de ação
Furosemida e bumetanida - tempo de ação curto (cerca de 6 horas), após o qual segue-se um
período longo de retenção salina (~18h). Deve ser administrado 2 vezes/dia.
Torasemida – tempo de ação longo, pode ser administrado 1 vez/dia.
2.Biodisponibilidade
Furosemida – Absorção gastrointestinal variável e consequentemente biodisponibilidade
pouco previsível. Por este motivo a dose endovenosa equivale a metade da dose oral.
Torasemida e bumetanida – óptima biodisponibilidade oral (80-100%).
Na análise post-hoc do estudo “Effect of Nesiritide in Patients with Acute Decompensated
Heart Failure” os doentes com Insuficiência Cardíaca (IC) que tinham alta com torasemida
apresentavam menor mortalidade. Pensa-se que efeito esteja relacionado com a maior
biodisponibilidade e tempo de ação da torasemida, no entanto, são necessários estudos controlados
e randomizados para comprovar estes dados.
Os diuréticos de ansa apresentam um baixo volume de distribuição uma vez que > 95% se
encontra ligado a albumina.
Hipoalbuminemia severa diminui a eficácia diurética:
- Aumenta o volume de distribuição – menos fármaco chega ao local de ação.
- No caso do síndrome nefrótico, o diurético liga-se à albumina presente no fluido
tubular renal e torna-se inativo.
A infusão de furosemida com albumina, não tem benefício.
4.Eliminação
Princípios de utilização
A dose utilizada tem que ultrapassar o threshold (limiar a partir do qual o diurético aumenta
a excreção fracionada de sódio) para ter efeito diurético [Fig.2];
Após ter sido atingido o ceiling (limite máximo a partir do qual não há resposta) não há
resposta mesmo que a dose seja aumentada [Fig.2].
Fig 4. – Diurético endovenoso vs oral nos estados edematosos como IC e Síndrome Nefrótico (Referência 2)
Incumprimento terapêutico
Ingestão elevada de sal e/ou líquidos
Dose não otimizada
Dose máxima ineficaz
Diminuição da absorção
Uso de Anti – Inflamatórios Não Esteróides
Uso de tiazolinedionas (glitazonas)
Outra causa de edema – hipotiroidismo?
Perfusão ou bólus?
Esquema de perfusão
Efeitos adversos
Reações de hpersensibilidade
Depleção de volume extracelular
Otoxicidade
3. DIURÉTICOS TIAZIDICOS
Farmacocinética
Acção na HTA
A curto prazo:
a diminuição inicial da tensão arterial é devida à redução dos volumes extracelular e
plasmático, o que leva a uma diminuição do débito cardíaco;
ativação do sistema renina angiotensina aldosterona (SRAA) como mecanismo
compensatório. Por isso, a sua ação anti-hipertensora é potenciada pela administração de um
IECA/ARA.
A longo prazo:
mecanismo menos esclarecido, mas pensa-se que há uma diminuição da resistência sistémica
por vasodilatação periférica;
têm um efeito residual após suspensão – a suspensão das tiazidas leva a uma expansão
rápida da volémia, ganho de peso e diminuição dos níveis de renina, mas a TA sobe
lentamente.
Mostram-se altamente eficazes:
No controlo da HTA
Na prevenção do AVC, da doença coronária e da insuficiência cardíaca
Efeitos adversos
Reações de hipersensibilidade
Dislipidemia
Hipercalcémia
Hiperglicémia
Hiperuricémia
Alcalose metabólica hipocalémica
Utilização de ARM na IC
- em doentes com IC e FEVE ≤ 35% (já medicados com IECA ou ARA ou inibidor da niprisilina), mas
monitorizar cuidadosamente a função renal e ionograma;
Efeitos adversos
Reações de hpersensibilidade
Hipercalémia
Acidose Metabólica
CASOS PARTICULARES
B. Insuficiência Cardíaca
C. Síndrome Nefrótico
Os casos de Síndrome Nefrótico devem ser seguidos pela Nefrologia devido à especificidade da
patologia e exigência de monitorização mais frequente pelas doses de diuréticos necessárias. Há uma
diminuição da resposta do nefrónio aos diuréticos, principalmente pela diminuição da ligação à
albumina plasmática (afeta a secreção tubular de diuréticos) e pela ligação dos diuréticos às
proteínas do fluido tubular, com descrito previamente.
Abordagem:
Administrar doses mais elevadas (dose máxima eficaz de furosemida 120 mg) para conseguir
concentração mais elevada de furosemida livre no fluido tubular;
Aumentar a frequência de administração;
Usar associações de diuréticos com locais de ação diferentes.
REFERÊNCIAS
Síndrome
Cardio-renal
1. DEFINIÇÃO:
Condição clínica que resulta da interação entre coração e rim, na qual a disfunção aguda ou
crónica de um órgão induz disfunção aguda ou crónica do outro.
2. CLASSIFICAÇÃO:
As diferentes interações que podem ocorrer conduziram à seguinte classificação de
Síndrome Cardiorrenal (SCR):
SCR tipo 1
Esta subcategoria de SCR é caracterizada por uma rápida deterioração da função cardíaca
que leva à LRA. O cenário clínico do SCR tipo 1 mais frequente é o de um doente internado
por ICC descompensada que experimenta um agravamento da função renal durante o
internamento.
A IC aguda é uma condição clínica muito heterogénea, com diversas apresentações e
múltiplos fatores precipitantes, variando de insuficiência cardíaca descompensada por
infeção ou por não adesão à terapêutica com diuréticos, edema pulmonar hipertensivo,
choque cardiogénico com hipotensão grave. Embora a hipotensão e diminuição do débito
cardíaco (com a ativação do sistema nervoso simpático e do sistema renina-angiotensina-
aldosterona [SRAA]) sejam as explicações tradicionais para o processo fisiopatológico da
LRA, atualmente as atenções têm-se virado para o papel do aumento da pressão venosa e
aumento da pressão intra-abdominal que condicionam congestão venosa renal, como
contribuintes igualmente importantes na diminuição da função renal (figura 3).
SCR tipo 2
SCR tipo 3
SCR tipo 4
Caracteriza-se por uma situação de DRC primária (exemplo: doença glomerular crónica,
nefropatia diabética), contribuindo para deterioração da função cardíaca, hipertrofia
cardíaca, disfunção diastólica e/ou risco aumentado de eventos cardiovasculares.
Os doentes com DRC têm um risco CV extremamente elevado, sendo que mais de 50% das
mortes em doentes com DRC estádio 5 são de causa cardiovascular. No entanto, estádios
menos avançados de DRC estão também associadas a um aumento do risco CV
4. TRATAMENTO:
É um desafio clínico dado o processo fisiopatológico tão heterogéneo e complexo.
O clínico deve ter sempre em conta que não existem guidelines que garantam o sucesso do
tratamento e que estas devem ser sempre adaptadas ao doente em causa.
Diuréticos
• 1ª linha no tratamento do SCR tipo 1
• Alívio dos sintomas associados à congestão
• Promovem a natriurese e a ↓ sobrecarga hídrica
• Controlo da HTA
• Os mais usados: diuréticos da ansa (furosemida)
Bloqueadores do SRAA
• Apesar do seu uso estar altamente recomendado na terapêutica crónica da IC
(associados a uma melhoria dos sintomas, redução das hospitalizações por insuficiência
cardíaca e aumento de sobrevivência), o seu uso na descompensação aguda da IC deve
ser altamente vigiado e nas seguintes situações deve ser descontinuado:
o Hipotensão arterial
o Lesão renal aguda
o Hipercaliémia
• Os doentes que não são cronicamente medicados com estes fármacos, também não
devem iniciá-los em situações de descompensação aguda (podem ficar mais hipotensos
e haver um agravamento adicional da função renal) e o seu início deverá ser protelado
para uma fase de estabilidade do quadro
Beta-bloqueadores
• Têm benefício comprovado em termos de sobrevida, especialmente na doença cardíaca
isquémica
• O seu uso nos quadros de descompensação cardíaca aguda também é controverso,
principalmente nos doentes com disfunção sistólica nos quais a taquicardia é necessária
para manter o débito cardíaco
Antagonistas da aldosterona
• Benefício na sobrevida
• Promovem a natriurese e diminuição da sobrecarga hídrica e o controlo tensional
• Efeitos adversos principais: hipercaliémia e agravamento da FR
Nitratos
• Promovem o alívio dos sintomas de congestão, através da sua ação de diminuição da pré
e pós-carga
• Recomendados nos doentes com sobrecarga hídrica sintomática, mas não devem ser
usados se hipotensão arterial
Ultrafiltração isolada
• Nos últimos anos, alguns grupos de Cardiologistas têm sugerido a realização de
ultrafiltração isolada (remoção apenas de água por máquinas de diálise ou semelhantes)
nos doentes com síndrome cardiorrenal com alguma refractariedade aos diuréticos. A
opinião da Nefrologia é discordante dado que os 2 estudos que mostraram haver
vantagem da ultrafiltração isolada versus terapêutica diurética endovenosa (Rapid-CHF
de 2005 e o Unload de 2007) não utilizaram esquemas com doses de diuréticos
escalonadas e elevadas. Um estudo posterior, o Caress-HF publicado em 2012, que
comparou ultrafiltração isolada e diuréticos com escalonamento de dose e doses mais
elevadas em doentes com IC descompensada, não verificou haver diferenças entre os 2
grupos no que diz respeito à diminuição de volume às 96h e o endpoint primário
(elevação da creatinina) foi pior no grupo que fez ultrafiltração. Para além disso, este
grupo também teve mais efeitos adversos, nomeadamente mais eventos hemorrágicos,
anemia, trombocitopenia, alterações eletrolíticas, sépsis e IC e uma maior tendência de
morte.
• Para além não ter sido demonstrada a vantagem clínica da ultrafiltração isolada, também
há o problema das punções venosas periféricas repetidas para a obtenção de um acesso
vascular adequado para este tratamento, o que pode levar a um esgotamento do
património venoso para a construção de fistulas arteriovenosas de diálise caso sejam
necessárias
• O tratamento do SCR tipo 3 deve ser dirigido à causa de LRA primária (retenção urinária,
glomerulonefrite aguda, nefrite intersticial aguda, nefropatia de cilindros, vasculite..), que
normalmente é iniciado pela Nefrologia
• O tratamento do SCR tipo 5 também deve dirigir-se à doença sistémica que causa a
disfunção de ambos os órgãos (sépsis, amiloidose AL, diabetes, LES)
5. BIBLIOGRAFIA
1. Scott Gilbert and Daniel E. Weiner. National Kidney Foundation Primer on Kidney
Diseases. 6th edition, 2014
2. Hatamizadeh P et al. Cardiorenal syndrome: pathophysiology and potential targets
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3. Bart AB et al. Ultrafiltration in Decompensated Heart Failure with Cardiorenal
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4. Dalzell, J. R. Diuretic strategies in patients with acute heart failure. N Engl J Med
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5. www.uptodate.com
1. DEFINIÇÃO:
Condição clínica que resulta da interação entre coração e rim, na qual a disfunção aguda ou
crónica de um órgão induz disfunção aguda ou crónica do outro.
2. CLASSIFICAÇÃO:
As diferentes interações que podem ocorrer conduziram à seguinte classificação de
Síndrome Cardiorrenal (SCR):
A Hipertensão
arterial de
causa renal
Introdução
A hipertensão arterial (HTA) é comum nos países industrializados e tende a aumentar com a idade.
É um factor de risco muito poderoso para doença cardiovascular. Em cerca de 89-95% dos casos a
etiologia é desconhecida pelo que se chama HTA primária ou essencial (Quadro 1).
Quadro 1
CAUSA %
Essencial 90
Contraceptivos Orais 2
Aldosteronismo Primário 2
Coartação da Aorta 0,2
Feocromocitoma 0,1
Outras 0,5
O estudo inicial de qualquer doente hipertenso deve incluir história clinica detalhada que avalie os
factores de risco cardiovascular, e dirigida para avaliar sinais ou sintomas de HTA secundária. Não
esquecer os fármacos que intereferem com controlo da TA como os AINEs e pesqueisar
sinais/sintomas compativeis com síndrome obstrutivo de apneia do sono. Dos meios
complementares de diagnóstico fazem parte:
Deste modo simples avaliamos o grau de HTA, os factores de risco cardiovasculares associados, a
lesão de orgão alvo e se estamos perante uma causa secundária.
As situações clínicas major sugestivas de HTA secundária são:
Apenas nestes casos devem ser investigadas as causas secundarias. Assim, se um doente apresenta
HTA refractaria e hipocalemia o diagnóstico de hiperaldosteronismo secundário deve ser estudado.
Não é necessário excluir sistematicamente todas as doenças secundárias. A procura deve ser
dirigida em função do doente.
O rim é o principal responsável pela HTA secundária. Pode ter origem no parênquima renal ou na
artéria renal.
Quadro 2
Glomerulopatias
Doença Tubulointersticial
Doença Poliquística
Nefropatia Obstrutiva
Assim, perante uma insuficiência renal aguda ou crónica, hematúria e/ou proteinuria, ou alterações
ecográficas, a HTA associada designa-se de parenquimatosa renal.
Na doença renal parenquimatosa o controlo da HTA deve ter como objectivo valores inferiores a
130/80 mmHg, principalmente se a proteinúria for superior a 1g/dia e na nefropatia diabética. Nos
restantes casos sem proteinúria o alvo é 140/90 mmHg.
O SPRINT trial (estudo randomizado de 2015, NEMJ) comparou doentes com mais de 50 anos o
controlo da TA sistólica mais agressivo <120 mmHg versus < 140 mmHg, e concluiram que o grupo
de tratamento mais intensivo rediziu os eventos cardiovasculares fatai e não fatais. Foram excluídos
deste estudo os doentes com diabetes mellitus, doença renal poliquistica, TFG < 20 ml/min,
proteinuria > 1g/dia, AVC ou IC.
A HTA acelera o agravamento da função renal provocado pela doença original, gerando um ciclo
vicioso. O tratamento da HTA previne não só a progressão da doença cardiovascular como a
progressão da insuficiência renal. Por isso é importante a medição regular e frequente da TA como
meio de prevenir, e também detectar precocemente, o agravamento da função renal.
HTA refractária
Despiste de HTA de bata branca ou mascarada
HTA não controlada mas sem lesão de orgãos alvo
Sinais sugestivos de hipotensão
Na maioria dos doentes com DRC a expansão do volume e a sensibilidade ao sal são os mecanismos
predominantes na fisiopatologia da HTA.
Nos doentes com doença parenquimatosa renal, qualquer classe de anti-hipertensores pode ser
usada, mas existem algumas particularidades no tratamento que ajudam à sua optimização:
• O controlo da HTA nos doentes com DRC implica frequentemente o uso de diuréticos:
- diuréticos de ansa se creatinina sérica > 1,5 mg/dl ou TFG < 30 ml/min
- espironolactona: contra-indicado se TFG < 30 ml/min
O controlo da TA na população idosa, em que o alvo não está definido, tem aspectos que devem ser
tidos em conta:
1. Incentivar medição da TA domicilio
2. Evitar sintomas de hipotensão ortostática
3. Vigiar função renal com controlo tensional
4. Ajustar valor da TA em função da idade
5. Atenção iECA/ARA II
6. Diurético fármaco escolha no idoso
As manifestações clínicas associados a EAR variam de doente para doente e podem variar no
mesmo doente ao longo do tempo, e incluem:
A doença aterosclerótica da artéria renal está na base de mais de 90% das EAR e da HTRV. Tem
tendência a aumentar com o envelhecimento da população e a sobrevivência a eventos vasculares
cardíacos e centrais. Existe estenose superior a 50-60% em 6.8% da população geral com mais de 65
anos (mais nos homens - 9.1% - que nas mulheres - 5.8%) e em cerca de um terço da população
com doença aterosclerótica significativa nos territórios coronário, aórtico ou periférico, ou nos
doentes com insuficiência cardíaca classe II-IV com mais de 65 anos de idade. Por outro lado as
estenoses renais podem não ter significado funcional e não provocarem qualquer sinal/sintoma.
A displasia fibromuscular, responsável por <10% das causas de estenose da artéria renal, é uma
doença que afecta as artérias de pequeno e médio calibre, mais frequentemente a carótida e a
artéria renal. A HTRV é a manifestação mais comum, e geralmente apresenta-se em mulheres dos
30-50 anos. A progressão da estenose é lenta e a função renal geralmente está preservada.
Então a primeira pergunta perante um doente com elevada probabilidade de HTA renovascular é
se é candidato a intervenção de revascularização para corrigir a estenose. Estes critérios estão
representados no quadro 3. Apenas nestes casos é que avançamos para um método imagiológico
para avaliar se existe tal estenose.
Quadro 3
Início da HTA < 30 anos, com história familiar negativa e sem outros factores de risco para HTA
Aparecimento de HTA estádio II ou HTA severa (TA > 160/100) após 55 anos
Aumento agudo da creatinina plasmática pós iniciar terapêutica com iECA’s e/ou ARA’s
HTA severa em doente com rim atrófico não explicado, ou com assimetria no tamanho renal >1,5 cm.
HTA moderada/severa em doente com doença aterosclerótica difusa, particularmente > 50 anos
HTA moderada a severa em doentes com EAP recorrente (Flash Pulmonar) ou IC não explicada.
Dada a elevada especificidade dos métodos anteriores, o teste do captopril, o renograma com
captopril ou a medição da renina plasmática, actualmente, são exames pouco utilizados para o
diagnóstico de lesão estenótica.
4. Tratamento de revascularização
Após a suspeita clínica de HTRV o desafio que se coloca ao clínico é decidir quais os doentes em que
se deve fazer diagnóstico definitivo e revascularização. Não é possível definir com segurança se
quais os doentes que beneficiarão com revascularização.
Na aterosclerose, globalmente não existe diferença entre os resultados do tratamento médico e a
revascularização. O último estudo randomizado ASTRAL, que comparou a revascularização versus
tratamento médico, mostrou igual sobrevida em ambos os grupos ao longo de 5 anos de "follow-
up", e no subgrupo de revascularização ocorreram maior número de complicações graves. Está em
curso um grande estudo randomizado CORAL (Cardiovascular Outcomes in Renal Artery Lesions),
que irá provavelmente definir melhor o papel da revascularização na HTRV aterosclerótica. O
grande desafio é seleccionar os doentes que mais beneficiarão com cada uma das estratégias
terapêuticas.
Os doentes com DRC grave (Scr > 3-4mg/dl) ou rins de tamanho diminuído (7-8cm), têm menor
probabilidade de beneficiarem com revascularização. A avaliação nos doentes com insuficiência
renal deve ser apenas realizada se existir doença renal isquémica potencialmente reversível.
A. Doença Aterosclerótica
A EAR pode ser um achado acidental (por exemplo durante a realização de estudo angiográfico
cardíaco, periférico, etc.) num doente assintomático. Nestes casos não está indicada terapêutica de
revascularização. De referir no entanto que a lesão estenótica pode progredir, pelo que é
importante um seguimento regular.
A revascularização cirúrgica está indicada quando existem múltiplas pequenas artérias renais,
quando é necessário reparação da aorta perto das artérias renais (aneurisma, dissecção) ou quando
há insucesso da angioplastia. Pode consistir numa pontagem, na endarterectmia ou na
vascularização extra-anatómica. A melhoria da TA é observada em 70-90% dos casos. No entanto a
mortalidade é de 3-6%. Comparando os resultados da revascularização por angioplastia ou
cirúrgica, parece não haver diferença na sobrevida.
B. Displasia fibromuscular
Fármacos
e rim
A doença renal pode afetar a forma de prescrição e os fármacos usados. Os rins recebem cerca
de 1 litro de sangue por minuto (1/4 do débito cardíaco), por isso são expostos a grandes
quantidades de fármacos circulantes. Têm elevada atividade metabólica e consumo de oxigénio,
possuem múltiplos sistemas enzimáticos e a maior superfície de endotélio por grama de tecido
do organismo. Além disso, muitos fármacos acumulam-se no epitélio e no interstício, outros
atingem grandes concentrações no tubo colector distal, favorecendo a sua criatalização e
provocando obstrução tubular. Por isso, os rins são muito suscetíveis a agressões por fármacos e
vários podem ser nefrotóxicos.
Os doentes com insuficiência renal são frequentemente polimedicados, o que exige muita
atenção em relação às interações medicamentosas. Por outro lado, os rins são a principal via de
excreção de muitos fármacos e como consequência a prescrição requer frequentemente um
ajuste posológico de acordo com a função renal.
No entanto, a insuficiência renal não deve nunca inibir a prescrição de fármacos fundamentais.
A prescrição (dose e/ou intervalo) de fármacos com eliminação renal deve ser ajustada ao grau
de disfunção renal, sob risco de acumulação e toxicidade importante. Nunca devemos prescrever
um fármaco a um doente com insuficiência renal sem ter a certeza de que não é necessário
ajustar a posologia. Por outro lado, nunca devemos deixar de prescrever um fármaco essencial
pelo facto de o doente ter insuficiência renal.
Existem duas formas de ajustar a posologia dos medicamentos com eliminação renal: reduzir a
dose ou aumentar o intervalo entre as tomas.
A dose de carga não é alterada de forma a se atingir mais rapidamente uma concentração
plasmática do fármaco estável. Como a IRC pode prolongar a semivida, simplesmente
reduzindo a dose pode ser um erro terapêutico, pois esta estratégia só irá atrasar o atingimento
de uma concentração de fármaco estável. Por este motivo as doses de carga não requerem
modificação nos doentes com insuficiência renal. A dose dos aminoglicosídeos poderá ter que
ser aumentada nos doentes com um aumento do volume de distribuição (hipervolemia ou
sépsis).
As doses de manutenção devem ser reduzidas proporcionalmente à disfunção renal e à
proporção de eliminação renal do fármaco. Nos fármacos em que é importante o pico de
concentração (p. ex. aminoglicosídeos) deve manter-se a dose e o intervalo entre as doses deve
ser prolongado. Nos fármacos em que o objetivo é manter concentrações constantes é mais
apropriado reduzir a dose e manter o intervalo entre as tomas.
Nos doentes sob técnicas dialíticas a depuração dos fármacos pela diálise pode reduzir a eficácia
deste. Há duas situações em doentes em hemodiálise que tem que se ter em consideração:
muitos estudos reportam resultados de uma altura em que se usavam filtros de baixo fluxo, que
são menos eficientes a remover fármacos e atualmente é quase generalizado o uso de filtros de
alto fluxo, e que embora muitas recomendações indicam o uso de doses suplementares no fim
da diálise estas são raramente usadas sobretudo se menos de 30% do fármaco é removido
Para o cálculo das doses nos insuficientes renais crónicos, incluindo aqueles sob terapêutica
dialítica convencional ou técnicas contínuas, existem tabelas disponíveis para determinar a dose
inicial e dose de manutenção do fármaco. Deve-se avaliar também a necessidade de monitorizar
os níveis séricos dos fármacos para ajustar a posologia. A monitorização é sobretudo útil nos
doentes com LRA em que a função renal é instável, mas deve também fazer-se nos tratamentos
crónicos com fármacos de eliminação renal (digoxina, carbamazepina, fenitoína, valproato, lítio,
etc). O doseamento pode ser feito em pico (após a toma) ou, em vale (antes da toma).
O bem-estar do doente deverá ser primordial em detrimento do ajuste de dose à função renal.
Doses acima do recomendado podem ser apropriadas quando houver uma indicação clínica. Por
exemplo, nas infeções graves que põem em risco a vida do doente e as consequências da
falência da terapêutica são maiores que as da sua toxicidade.
Uma variedade de fármacos podem ser nefrotóxicos e podem estar envolvidos diferentes
mecanismos.
1- A nefrotoxicidade idiossincrásica (ex. nefrite intersticial) é imprevisível e independente
da dose. Este tema será falado noutro capítulo.
2- Nefrotoxicidade por alterações hemodinâmicas
Podem ocorrer com os inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA), inibidores do
receptor da angiotensina (ARA), AINES, diuréticos e anti-hipertensores.
3- Toxicidade tubular direta
Pode ser desencadeada pelo uso de aminoglicosídeos, vancomicina, anfotericina, cisplatina,
inibidores da calcineurina e meios de contraste.
4- Uropatia obstrutiva
Pode ocorrer com agentes tais como aciclovir.
5- Glomerulonefrite imuno-mediada e microangiopatia trombótica, são raras mas ocorrem
também com o uso de fármacos
B. AINE´s
São dos fármacos mais usados na prática clínica. Embora a probabilidade de toxicidade renal
não seja muito alta (1-5%), o uso alargado destes fármacos faz com ela seja encontrada
frequentemente na prática clínica. A lesão renal pode ocorrer com qualquer classe de AINE
desde os não selectivos aos inibidores da COX-2. Os inibidores da COX-2 têm perfil
nefrotóxico em tudo idêntico aos AINES não selectivos.
A LRA vasomotora ou hemodinâmica dos AINES ocorre quando a manutenção da função renal,
isto é, da TFG, é criticamente dependente das prostaglandinas vasodilatadoras. Quando há
diminuição do volume circulante efectivo ou situações em que há aumento da produção de
vasoconstritores intra-renais (agentes de contraste, obstrução urinária, glomerulonefrite aguda),
o fluxo sanguíneo renal mantém-se por vasodilatação compensadora da arteríola aferente
provocada por aumento da síntese de prostaglandinas (PGs). Para além deste efeito glomerular,
o aumento de prostaglandinas renais provoca vasodilatação de outros vasos sobretudo nestas
situações em que há síntese aumentada de angiotensina II, NA, vasopressina ou endotelina,
impedindo a isquemia por vasoconstrição. A inibição da síntese de PGs pelos AINES leva à
diminuição da TFG por provocar diminuição da pressão de perfusão glomerular e por
vasoconstrição intrarenal.
O risco de LRA pelos AINES é também superior nos idosos, com o uso concomitante de
IECAS/ARA II e diuréticos.
Retenção hidrossalina- Em 25% dos doentes que tomam AINES há retenção hidrossalina,
provocada pela inibição das PGs e do seu efeito compensador na excreção de água e sódio. O
edema ocorre em 2.1% das pessoas medicadas com AINES.
A retenção hidrossalina interfere, agravando, o controlo da tensão arterial e pode também
provocar HTA de novo.
Hipercaliemia- associam-se a hipercalemia, mesmo em doentes com função renal normal. Nos
diabéticos, bem como nos idosos, este risco aumenta pela maior frequência de
hipoaldosteronismo-hiporreninémico.
Síndrome nefrótico associado a nefrite intersticial aguda (NIA)- Os AINEs que mais
frequentemente associados a NIA são o ibuprofeno, naproxeno e fenoprofeno. Podem surgir ao
fim de meses, até 1 ano de administração, associam-se a proteinúria nefrótica em cerca de 90%
e as manifestações extra-renais como febre, rash ou artralgias são muito raras. Cursa com
remissão espontânea com a retirada do fármaco. A recuperação da função renal pode demorar
dias a semanas e há um risco considerável de lesão renal permanente, o maior entre todos os
agentes causadores de NIA.
Insuficiência renal crónica- O uso prolongado de AINES está associado a um risco aumentado
de IRC provavelmente devido a necrose papilar ou NTI crónica idêntica ao observado com
outros analgésicos. O risco parece ser maior com os AINEs com longa duração de ação (> 4
horas).
Acontece por lesão tubular direta aquando da eliminação renal do fármaco, como no caso dos
aminoglicosídeos, vancomicina, anfotericina B ou cisplatina. Manifesta-se com instalação
progressiva de IRA não oligúrica. Geralmente há recuperação da função renal com a retirada do
agente, mas ela pode ser só parcial. O tempo de recuperação pode ir até várias semanas. Se ao
fim de 4 semanas não houver recuperação da função renal, deverá ser confirmada a toxicidade,
geralmente com biópsia renal, ou procurada outra causa para a insuficiência renal. Insuficiência
renal irreversível pode acontecer se houver exposição repetida ao tóxico tubular.
A. Aminoglicosídeos
A ocorrência de nefrotoxicidade varia entre 10 a 20% e aumenta com a dose e duração da sua
administração (risco de 50% se superior a 14 dias de terapêutica).
A gentamicina, a tobramicina e a netilmicina parecem ter efeitos nefrotóxicos similares e a
amicacina poderá ser a menos nefrotóxica. A Neomicina que tem alta afinidade para o receptor
no TCP, é o mais nefrotóxico dos aminoglicosídeos.
A nefrotoxicidade por estes agentes pode ser minimizada:
- Selecionar se possível o aminoglicosídeo menos nefrotóxico
- Corrigir hipocalemia e hipomagnesiemia previamente à administração dos fármacos
- Evitar o seu uso em doentes com depleção de volume (ou optimizar a volemia previamente à
administração), ajustar a dose à função renal, limitar o tratamento a 7-10 dias e evitar
medicações nefrotóxicas concomitantes
- Vigiar níveis plasmáticos sobretudo em doente de risco e optar por toma única diária
Embora se tenham estudados vários agentes com potencialidade para prevenir a nefrotoxicidade
dos aminoglicosídeos, tais como polioaminoácidos aniónicos e agentes antioxidantes, nenhum
foi ainda adoptado clinicamente.
B. Vancomicina
C. Anfotericina B
A anfotericina atua pela ligação aos esteróis das membranas celulares, quer dos fungos
(ergosterol), mas também das células dos mamíferos (colesterol). Desta ligação resulta um
aumento da permeabilidade da membrana, aumento do influxo de Na+ e consequentemente da
atividade do transportador Na+K+ATPase, com depleção das reservas energéticas celulares.
A nefrotoxicidade da anfotericina B relaciona-se com a dose cumulativa, ocorrendo após a
administração de 2 a 3 g.
Os primeiros sinais da toxicidade renal são a perda de capacidade de concentração da urina por
lesão tubular distal (poliúria, hipocalemia, hipomagnesiemia, acidose tubular distal), seguida de
declínio da TFG. A insuficiência renal é progressiva e não-oligúrica, e a recuperação muito
lenta com a suspensão farmacológica, podendo no entanto persistir as lesões tubulares distais.
Uma forma de prevenção é manter débitos urinários altos durante o uso deste fármaco, com
administração de soro salino, e o uso da forma lipossómica que reduz o risco de LRA na ordem
dos 50%.
Doses elevadas, cursos prolongados ou exposições repetidas podem causar DRC.
E. Anti-neoplásicos
Vários anti-neoplásicos podem ser nefrotóxicos (tabela 2). Os mais frequentes são cisplatina,
ciclofosfamida e metotrexato.
IL-2 LRA
Interferon-alfa Glomerulosclerose segmentar e focal. NTA
4- Uropatia obstrutiva
Vários fármacos podem causar obstrução intra-tubular por cristais. Dos agentes mais frequentes,
contam:
- Aciclovir
- Sulfonamidas
- Metotrexato
- Inibidores da protéase
A. Aciclovir
A deterioração da função renal ocorre nas 24-48 horas após a terapêutica. Podem ser observados
na urina cristais em forma de agulha, birrefringentes.
A alteração da função renal na maioria dos casos é ligeira e há recuperação total cerca de 4 a 9
dias depois da descontinuação do fármaco.
Como prevenção pode-se usar uma solução salina isotónica a 125 mL/h pelo menos 1 hora antes
da toma do aciclovir, mantendo esta perfusão 6 horas depois do término da perfusão do
fármaco, de forma a manter o débito urinário cerca de 75 mL/h.
O tratamento é apenas de suporte (fluidos e.v. + furosemida) como já descrito. Embora a
hemodiálise seja eficaz em remover o aciclovir, não demonstrou alterar o curso da apresentação
clínica da LRA e portanto não é usada com este objetivo, estando apenas recomendada em
alguns doentes com neurotoxicidade e se houver presença de critérios urgentes para hemodiálise
(hipervolemia, hipercalemia, acidose grave, etc).
C. Indinavir
Alguns fármacos não apresentam um efeito adverso direto na função renal mas quando usados
em doentes com insuficiência renal podem agravar as consequências metabólicas da DRC ou
aumentar o risco para outras toxicidades. Como exemplos comuns temos os diuréticos
poupadores de potássio, os antagonistas da aldosterona e os bloqueadores do sistema RAA que
podem agravar ou desencadear hipercalemia; fármacos com sódio na sua composição poderão
provocar retenção hidrossalina e hipertensão.
Outros agentes de interesse no uso nos doentes renais crónicos são a metformina, os fibratos e a
colchicina.
A. Metformina
Todos os doentes medicados com metformina, mesmo com função renal normal, e sobretudo os
que têm DRC, devem ser instruídos para que, em caso de desidratação (diarreias), de outras
doenças intercorrentes de alguma gravidade ou de exames contrastados suspendam as tomas de
metformina, pois a insuficiência renal secundária à desidratação ou nefropatia de contraste pode
levar à acumulação de metformina.
O fenofibrato e o genfibrozil são fibratos muito usados na prática clínica. A dose do fibrato deve
ser ajustada à função renal e deve ser evitado nos doentes com disfunção renal severa.
Estão associados a toxicidade muscular sobretudo quando associados às estatinas e podem
interferir com o metabolismo da varfarina.
Em estudos randomizados, demonstrou-se que os fibratos provocam aumento dos valores da
creatinina plasmática sobretudo em doentes idosos. Embora o aumento dos níveis de creatinina
sejam motivo observação e intervenção, é pouco claro se esta elevação reflete lesão renal. O
aumento da creatinina plasmática é habitualmente revertida com a suspensão do tratamento.
O mecanismo para o aumento da creatinina plasmática não é muito claro.
Várias explicações foram propostas nomeadamente: pela interferência dos fibratos nos métodos
analíticos nos valores da creatinina, por aumento da produção da creatinina ou por redução do
clearance da creatinina. Vários estudos comprovaram que o valor da creatinina é real e não
dependente do método de análise. Há quem sugira que reflete uma diminuição da síntese de PG
vasodilatadoras pelos fibratos e quem sugira ser devida a alterações hemodinâmicas intrarenais
(aumentam a natriurese e levam a depleção de volume).
O aumento de produção da creatinina poderá ser a explicação mais plausível dado a que o
aumento da creatinina plasmática não se acompanhava de uma diminuição da creatinina urinária
e o cálculo da TFG pela inulina não se altera, e portanto o aumento da creatinina plasmática não
refletia uma verdadeira “lesão” renal.
Embora o papel dos fibratos no aumento da creatinina ainda não esteja totalmente esclarecido,
os seus potenciais efeitos deletérios na função renal obrigam a reconsiderar o seu uso nos
doentes de risco para DRC.
Na população em geral, o tratamento de eleição são os AINEs, p.ex. naproxeno 500 mg bid ou
indometacina 50 mg tid. Pode ser usado o celecoxib 800 mg seguido de 400 mg bid.
No entanto, como os AINEs podem agravar a insuficiência renal, não devem ser usados em
doentes com taxa de filtração glomerular menor que 60 ml/min.
A dose de colchicina deve ser ajustada em doentes com TFG inferior a 45 ml/min, sendo
habitualmente 50% da dose recomendada. Não deve usar-se em doentes em hemodiálise nem
com insuficiência hepática. A colchicina não é removida pela hemodiálise.
Assim, nos doentes com insuficiência renal moderada ou severa a corticoterapia é o tratamento
mais seguro. É pelo menos tão eficaz como os AINEs ou a colchicina. A escolha da via, oral, IV
ou intra-articular depende das características do doente, do número de articulações atingidas e
da experiência do médico.
Nos doentes já em diálise, e se já não tiverem função renal residual, podem usar-se AINEs.
Infecções do
tracto urinário
Objetivos
• Saber classificar as infeções urinárias consoante o local de infeção e as características
do hospedeiro
• Reconhecer os critérios de diagnóstico dos diferentes tipos de infeção
• Identificar os agentes microbianos mais frequentemente causadores de infeção
• Conhecer os critérios de requisição de exames complementares de diagnóstico
• Delinear e instituir um correto esquema terapêutico e o seu posterior follow-up
As infeções do trato urinário (ITUs) são das infeções bacterianas mais comummente
diagnosticadas, nomeadamente em ambulatório. A apresentação clínica é variável, desde a
cistite simples à urossépsis.
Na maioria dos casos, as ITUs não complicadas resultam da infeção por via
ascendente, com acometimento da bexiga (cistite) e/ou do rim (pielonefrite). A pielonefrite é
rara em mulheres com cistite não tratada e em homens e mulheres com bacteriúria
assintomática. Os fatores microbianos e do hospedeiro que contribuem para a progressão da
infeção vesical para renal, não totalmente esclarecidos, permanecem ainda em estudo.
Constituem fatores de risco para ITUs não complicadas: atividade sexual, uso de
espermicidas, novo parceiro sexual no último ano, obstipação (crónica), ITUs prévias e história
de ITUs em familiar de primeiro grau do sexo feminino. Este último fator aponta para uma
possível predisposição genética para o desenvolvimento deste tipo de infeções.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
O teste fita Combur (com ou sem exame microscópico de urina para a pesquisa de
piúria) é o teste mais frequentemente usado numa primeira abordagem perante uma
suspeita de cistite aguda. Este permite a identificação da esterase leucocitária, libertada pelos
leucócitos e portanto indicador de piúria, e de nitritos, refletindo a presença de
Enterobacteriaceas (bem como espécies de Pseudomonas), que convertem os nitratos
urinários em nitritos. A presença de esterase leucocitária e/ou nitritos positivos favorece o
diagnóstico de ITU, com uma sensibilidade de 75% e especificidade de 82%. No entanto,
quando a clínica é muito sugestiva, mesmo resultados negativos não excluem infeção. De
notar que determinadas bactérias (como é o caso do Haemophilus, do Staphylococcus e do
Streptococcus) não possuem capacidade de conversão de nitratos em nitritos.
A piúria constitui uma das evidências laboratoriais de ITU, pelo que a sua ausência
favorece um diagnóstico alternativo ou, no caso da pielonefrite aguda, sugere a presença de
obstrução do trato urinário. A piúria estéril pode estar presente em infeções causadas por
Chlamydia, Ureaplasma urealyticum e Mycobacterium tuberculosis. A presença de cilindros
leucocitários faz o diagnóstico de infeção do trato urinário superior. A presença de hematúria,
comum na ITU (mas não na uretrite ou na vaginite, ajudando no diagnóstico diferencial), não
indica infeção complicada e não requer terapêutica mais prolongada.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
TRATAMENTO
A cistite aguda não complicada raramente progride para doença grave, mesmo se não
tratada, pelo que o objetivo primário do tratamento é o alívio sintomático. A escolha do
tratamento deverá ter em conta não só a eficácia como também o efeito ecológico (seleção
de microrganismos resistentes).
NOTA: Na cistite aguda da grávida a DGS recomenda fosfomicina 3g, toma única, ou
amoxicilina - ácido clavulânico 625mg (500+125mg) de 8/8 horas durante 5 a 7 dias.
A maioria dos casos de pielonefrite aguda não complicada pode ser tratada em
ambulatório com antibioterapia oral: mulheres não grávidas, sem critérios de sépsis e com via
oral patente (nomeadamente na ausência de vómitos). Deverá ser efetuada a colheita de
urocultura com teste da suscetibilidade a antibióticos previamente ao início da terapêutica.
Não é necessário realizar urocultura de controlo após tratamento da cistite aguda não
complicada, desde que os sintomas se tenham resolvido. Uma exceção são as mulheres
grávidas, nas quais a presença de bacteriúria persistente deve ser tratada mesmo que
assintomática. Sintomas urinários que persistam ou recorram em 1 ou 2 semanas após
tratamento de uma cistite não complicada sugerem infeção por uma estirpe resistente ao
antibiótico ou, mais raramente, recidiva. Nestes casos, deve colher-se urocultura e iniciar-se
tratamento empírico com um antibiótico diferente. Episódios de cistite que ocorram após 1
mês de uma ITU tratada com sucesso deverão ser tratados com um regime de curta duração
de primeira linha. Se a recorrência se verificar num período de até 6 meses, deverá ser usado
um agente diferente do primeiro.
• Fatores biológicos ou genéticos: primeira ITU antes dos 15 anos de idade; mãe com
história pregressa de ITUs
• Fatores comportamentais: uso de espermicida e diafragma para contraceção; um novo
parceiro sexual no último ano
• Em mulheres na pós-menopausa: incontinência urinária; cistocelo; urina residual pós-
miccional
• Obstipação crónica
Existem estratégias não antimicrobianas para mulheres com cistites recorrentes que
podem ter alguns benefícios, desde o aconselhamento comportamental (evicção do uso de
espermicidas e diafragma, micção após a relação sexual, aumento da ingesta hídrica e o não
adiamento da micção) a uso de mediadores biológicos (estrogénio tópico vaginal em
mulheres na pós-menopausa com 3 ou mais ITUs ao ano, ao normalizar a flora vaginal).
Melhorar o trânsito gastrointestinal em doentes com obstipação crónica é outra medida
também importante.
• Mulheres com 3 ou mais episódios de ITU nos últimos 12 meses ou 2 ou mais ITU nos
últimos 6 meses (em que pelo menos uma foi confirmada em urocultura positiva) nas
quais as estratégias não antimicrobianas não foram eficazes
A profilaxia após a relação sexual pode ser um método mais eficiente que a profilaxia
contínua em mulheres cujas ITUs pareçam ter relação temporal com as relações sexuais,
permitindo a toma de menores quantidade de antimicrobianos. A profilaxia contínua deverá
ser realizada durante um período de 6 meses. No entanto, muitas mulheres voltam a ter o
padrão de ITUs recorrentes e sintomáticas com a suspensão da profilaxia. Alguns estudos
defendem a realização de profilaxia por 2 ou mais anos em mulheres que continuem a ter
infeções sintomáticas. Antes de se iniciar qualquer tratamento profilático, deverá assegurar-
se a erradicação da ITU prévia através de uma urocultura negativa 1 a 2 semanas após
término do tratamento. As estratégias antimicrobianas deverão ser revistas periodicamente
para avaliar se continuam a ser apropriadas. Deverão ser realizados exames de imagem
perante suspeita de anomalias funcionais ou anatómicas do trato urinário.
As ITUs complicadas, quer sejam localizadas no trato urinário superior quer inferior,
são as que mais se associam a aumento do risco de falência terapêutica.
MICROBIOLOGIA
CLÍNICA
Nas ITUs complicadas deve realizar-se exame sumário de urina (combur ou exame
microscópico), urocultura e hemoculturas (previamente ao início do tratamento). A piúria e
bacteriúria estão normalmente presentes, podendo contudo estar ausentes se o local da
infeção não comunicar com o sistema coletor ou se houver obstrução do trato urinário.
A avaliação imagiológica do trato urinário deve ser realizada. A ecografia renal permite
uma avaliação do trato urinário sem exposição a radiação ou contraste. Em casos
selecionados pode ser necessário recorrer à uro-TC; o exame sem contraste tem boa
sensibilidade na deteção de cálculos, infeção enfisematosa, hemorragia, obstrução e
abcessos.
TRATAMENTO
Os doentes com pielonefrite aguda complicada devem ser internados para tratamento
inicial. O tratamento empírico baseia-se em antibioterapia de largo espectro de administração
parentérica. A seleção deve ter em conta tratamento antimicrobiano prévio e os resultados
de uroculturas recentes.
O Staphilococcus aureus é mais comum nas ITUs complicadas que nas não
complicadas. Dada a elevada proporção de MRSA isolados, se houver suspeita de infeção por
este microrganismo, deve-se introduzir a vancomicina no regime terapêutico empírico
(vancomicina 1g de 12/12h). Outras preocupações nas ITU complicadas incluem o aumento
da prevalência da resistência a fluroquinolonas nas infeções associadas a cuidados de saúde,
bem como a maior frequência de infeções por Enterococcus (com necessidade de esquemas
com amoxicilina 500mg de 8/8h peros ou ampicilina 1g de 6/6h endovenosa). A duração do
tratamento é de 10 a 14 dias, embora dependendo das circunstâncias possa ser necessária
uma duração mais longa (até 21 dias). O tratamento pode ser completado com antibióticos
orais se o perfil de sensibilidades do agente infecioso e o estado clínico do doente o
permitirem: levofloxacina, ciprofloxacina ou TMP-SMX são antibióticos aceitáveis. Outras
intervenções devem ainda ser consideradas: os cateteres uretrais devem ser retirados ou,
quando não possível, substituídos. De salientar que os casos de ITU com obstrução do trato
urinário constituem uma emergência cirúrgica, sendo necessária a rápida desobstrução. As
coleções peri-renais necessitam de drenagem (percutânea ou cirúrgica).
• BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA
• ABCESSO RENAL
• PIELONEFRITE ENFISEMATOSA
• PROSTATITE
Litíase urinária
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Referenciação
à Nefrologia
A avaliação de um doente com patologia renal requer uma história clínica e exame físico
cuidados, alguns exames laboratoriais do sangue e da urina e uma ecografia reno-vesical.
(Quadro 1.) Os estudos analíticos prévios são muito úteis para clarificar a data e o modo de
início da lesão renal, a sua duração e evolução. Com estes dados geralmente é possível
classificar a lesão renal em aguda, rapidamente progressiva ou crónica e deste modo decidir
sobre a referenciação do doente a consulta de nefrologia ou ao Serviço de Urgência.
Exames Laboratorias:
Hemograma
Ureia, Creatinina, ionograma, glicose, cálcio, fósforo, ácido úrico,
TGO, TGP, albumina, colesterol e triglicerídeos
Exame sumário de urina com sedimento urinário
Relação Proteínas/creatinina em amostra ocasional urina
Ecografia Reno-vesical.
Exames laboratoriais prévios.
A consulta externa de nefrologia destina-se a estudar e tratar doentes com doença renal
crónica (DRC).
Ressalva-se o caso particular de doentes idosos que apresentam valores estáveis de creatinina
entre 1,4 e 1,6 mg/dl (e portanto, em alguns destes casos, TFG inferior a 30 ml/min) que são
enviados para a observação por nefrologia. Decorrente do normal envelhecimento há uma
perda progressiva de função renal. Por outro lado, as fórmulas actuais para cálculo da TFG,
como MDRD, não estão validadas para serem utilizadas nesta população, ou mesmo em
doentes com valores de creatinina normais. Consequentemente, estes valores de creatinina e
de TFG são esperados para a idade, e se estáveis, não necessitam de investigação etiológica
nem beneficiam com seguimento regular por nefrologia. É necessário a penas excluir a
3. Normas de referenciação
De modo a realizar um agendamento atempado e uma triagem eficaz dos pedidos de consulta,
a informação que acompanha a referenciação deve sempre incluir:
A informação sobre a duração e evolução temporal da lesão renal é essencial, é muitas vezes
difícil de obter junto do doente, e por isso não deve ser esquecida.
Sociedade Portuguesa
de Nefrologia